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UM OLHAR DA INVENTTA:
O INOVAR AUTO e os investimentos em P&D no setor automotivoCarina Leão e Letícia Goulart
O Inovar Auto vem sendo amplamente discutido, tendo em vista que a indústria automobilística
brasileira é a sétima do mundo
1. Introdução
Em abril de 2012, o governo brasileiro anunciou a criação de um novo
regime para a indústria automobilística nacional em substituição ao
regime vigente de redução de alíquotas de IPI, denominado INOVAR
AUTO.
O “Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento
da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores - INOVAR AUTO” foi
apresentado pela Medida Provisória 563/2012 (regulamentada pelo
Decreto 7.716/12), convertida na Lei 12.715/12 (regulamentada pelo
Decreto 7.819/12) e entrará em vigor em Janeiro de 2013 com validade
até 2017.
Dentre os principais objetivos do INOVAR AUTO, podemos citar o estímulo
ao aumento do conteúdo regional na produção, medido pelo volume de
aquisições de peças e insumos estratégicos, a garantia do investimento
em P&D, o aumento do volume de gastos em Engenharia, Tecnologia Industrial Básica
e Capacitação de Fornecedores e o aumento da eficiência energética dos veículos,
através da etiquetagem veicular e redução da emissão de CO2, definindo níveis
aceitáveis.
O novo regime vem sendo amplamente discutido no setor, tendo em vista que a
indústria automobilística brasileira é a sétima do mundo, responsável por um elevado
número de empregos (cerca de 150 mil, relativos aos contratos de trabalho firmados
com as empresas associadas à Anfavea), e sua participação no PIB industrial
brasileiro é altamente significativa, equivalente ao valor de U$105.375 milhões de
dólares, representando cerca de 20%, do valor total do PIB1.
Em razão da relevância do tema, buscaremos demonstrar um comparativo entre os
benefícios fiscais do regime vigente (redução de alíquota de IPI) e do INOVAR AUTO
1 Dados do Anuário da Indústria Automobilísti ca Brasileira 2012 – Anfavea.
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(crédito presumido de IPI), abordando questões conceituais no que diz respeito aos
investimentos em P&D, com base na sistemática dos incentivos fiscais à inovação
tecnológica (Lei do Bem) e no Manual de Frascati.
2. Tipos de benefícios e requisitos
O regime em vigor para o setor automotivo consiste na redução de alíquota do IPI em
pontos percentuais, o que significa que o percentual aplicado sobre a base de cálculo
do IPI é reduzido de acordo com o estabelecido pelos decretos regulamentadores. O
crédito presumido, por sua vez, será gerado mediante cumprimento dos requisitos
determinados pela legislação, conduzindo à compensação dos pontos percentuais
que seriam aplicados. A seguir uma tabela resumo dos benefícios.
Tipos de Benefícios
Redução de Alíquota Crédito Presumido
LegislaçãoLei 12.546/11 e Decreto 7.567/11 (alterado pelos Decretos 7.604/11 e 7.725/12)
Lei 12.715/12 - Decreto 7.819/12 (MP 563 e Decreto 7.716/12)
BenefícioRedução das alíquotas do IPI em pontos percentuais de acordo com o NCM do produto
Crédito presumido de IPI em pontos percentuais sobre as aquisições de insumos estratégicos, ferramentaria e dispêndios em pesquisa, desenvolvimento tecnológico, inovação tecnológica, recolhimentos ao FNDCT, capacitação de fornecedores, engenharia e tecnologia industrial básica
VigênciaVigência prevista até 31 de dezembro de 2012.
Vigência prevista até 31 de março de 2017.
2.1 Redução de alíquota
Conforme disposto nos anexos do Decreto 7.567/11 (alterado pelos Decretos 7.604/11
e 7.725/12), a redução de alíquota do IPI em pontos percentuais terá sua vigência
até 31/12/2012, sendo elegíveis ao benefício determinados produtos, de acordo
com sua classificação NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul). Tal redução está
condicionada à observação de requisitos, tais como:
• Investimento de um mínimo de 0,5% da receita bruta total de vendas de bens e
serviços em atividade de inovação, de pesquisa e desenvolvimento tecnológico
de produto e processo no país,
• Agregação de conteúdo nacional (mínimo de 65%), e a realização de pelo menos
6 processos locais, de um total de 11, em pelo menos 80% da sua produção de
veículos.
O crédito presumido será gerado mediante cumprimento dos requisitos, conduzindo à
compensação dos pontos percentuais
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2.2 Crédito presumido
De acordo com o Decreto 7.819/12 que regulamenta o INOVAR AUTO, darão direito ao
crédito presumido os dispêndios relativos a:
• Insumos estratégicos e ferramentaria: apurado com base na multiplicação dos
valores dos dispêndios realizados por fator estabelecido no decreto, decrescente
a cada ano.
• Pesquisa, desenvolvimento tecnológico, inovação tecnológica e recolhimentos
ao FNDCT: o crédito corresponderá a 50% dos dispêndios, limitados ao valor
referente a aplicação de 2% da receita bruta total de venda de bens e serviços,
excluídos os impostos e contribuições incidentes sobre a venda.
• Capacitação de fornecedores, engenharia e tecnologia industrial básica: o crédito
corresponderá a 50% do valor dos dispêndios entre 0,75% e 2,75% da receita
bruta total de venda de bens e serviços, excluídos os impostos e contribuições
incidentes sobre a venda.
De acordo com o decreto regulamentador, farão jus ao crédito presumido, os
fabricantes de produtos classificados nos códigos 87.01 a 87.06 da TIPI (Tabela de
Incidência do IPI), conforme apresentado a seguir. Além disso, ao contrário da política
de redução de alíquotas, não haverá mais a exigência de conteúdo regional, tendo
sido a mesma substituída por um requisito de processos locais, que gradativamente,
ao longo dos 5 anos em que vigorará o novo regime, exige a realização de atividades
fabris e de infraestrutura e engenharia.
TIPI – NCMs enquadráveis no novo regime
Classificação NCM
Descrição
87.01 Tratores (exceto os carros-tratores da posição 87.09);
87.02 Veículos automóveis para transporte de dez pessoas ou mais, incluindo o motorista;
87.03Automóveis de passageiros e outros veículos automóveis principalmente concebidos para transporte de pessoas (exceto os da posição 87.02), incluindo os veículos de uso misto (station wagons) e os automóveis de corrida;
87.04 Veículos automóveis para transporte de mercadorias;
87.05
Veículos automóveis para usos especiais (por exemplo, auto-socorros, caminhões-guindastes, veículos de combate a incêndio, caminhões-betoneiras, veículos para varrer, veículos para espalhar, veículos-oficinas, veículos radiológicos), exceto os concebidos principalmente para transporte de pessoas ou de mercadorias;
87.06 Chassis com motor para os veículos automóveis das posições 87.01 a 87.05.
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Ainda, como requisitos, além da regularidade em relação aos tributos federais e
compromisso de atender níveis mínimos de eficiência energética, são exigidos da
empresa beneficiária o investimento em P&D, engenharia, tecnologia industrial básica
e capacitação de fornecedores, bem como a adesão ao Programa de Etiquetagem
Veicular de âmbito nacional, todos em percentuais crescentes, até 2017.
Destaca-se que as montadoras deverão cumprir obrigatoriamente a exigência
de quantidade mínima de atividades fabris e de atividades de infraestrutura de
engenharia, podendo optar, no caso dos veículos leves, por cumprir duas das três
exigências facultativas, e as fabricantes de veículos pesados, apenas uma de duas,
uma vez que não se aplica a exigência de etiquetagem nestes casos.
2.3 Comparativo
Abaixo um quadro comparativo das principais diferenças entre os dois benefícios.
Quadro Comparativo Redução de Alíquota VS. Crédito Presumido
Redução de IPI2012
Crédito Presumido de IPI2013-2017
Conteúdo Regional65%
-
Processos Locais (Atividades fabris e de infraestrutura de
engenharia)
6 atividades
6(2013), 7 (2014, 2015),8(2016, 2017) de 12 atividades (veículos leves); 8 (2013), 9 (2014,
2015), 10(2016, 2017) de 14 atividades (veículos pesados);. 5 (2013), 6 (2014, 2015), 7(2016, 2017) de 11 atividades (produção de
chassis com motor).
Investimento em P&D0,5% da receita bruta total
de vendas0,15% (2013), 0,30% (2014), 0,50% (2015 a
2017) da receita bruta total de vendas
Investimento em Engenharia e Tecnologia
-0,50% (2013) , 0,75% (2014), 1,00% (2015 a
2017) da receita bruta total de vendas
Etiquetagem -36% (2013), 49% (2014), 64% (2015),
81% (2016) e 100% (2017) adequação da produção de bens
3. Pontos de discussão do novo regime em relação à qualificação das atividades
de P&D
Conforme demonstrado, o INOVAR AUTO traz o benefício de crédito presumido de
IPI, condicionado ao atendimento de alguns requisitos, dentre eles o investimento em
P&D, engenharia, tecnologia industrial básica e capacitação de fornecedores.
São exigidos da empresa beneficiária o investimento em P&D, engenharia, tecnologia
industrial básica e capacitação de fornecedores e etiquetagem
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Além disso, apresenta conceitos já utilizados em outras legislações, como os
incentivos fiscais à inovação tecnológica previstos na Lei do Bem (Lei 11.196/05).
Os temas tratados nas legislações aproximam-se de tal forma, que o próprio decreto
regulamentador do novo regime dispõe que para a comprovação dos requisitos de
investimento em P&D, engenharia, tecnologia industrial básica e capacitação de
fornecedores, as empresas beneficiárias do INOVAR AUTO poderão considerar os
dispêndios realizados de acordo com a Lei do Bem.
Dessa forma, trataremos dos conceitos relacionados aos investimentos em P&D do
novo regime automotivo, comparativamente àqueles previstos na Lei do Bem e no
Manual de Frascati.
A Lei 11.196/05, regulamentada pelo Decreto 5.798/06 e disciplinada pela Instrução
Normativa 1.187/11 da Receita Federal, estabelece incentivos fiscais para as
atividades de inovação tecnológica, beneficiando o processo que leva à concepção
e ao desenvolvimento das inovações. O Manual de Frascati é um documento que
especifica a metodologia para a coleta e análise de dados de P&D nos países membros
da OECD, sendo que suas definições são internacionalmente aceitas e servem de base
para discussões sobre as diretrizes relacionadas ao assunto.
A Lei do Bem traz como definição de inovação tecnológica “a concepção de novo
produto ou processo de fabricação, bem como a agregação de novas funcionalidades ou
características ao produto ou processo que implique melhorias incrementais e efetivo
ganho de qualidade ou produtividade, resultando maior competitividade no mercado”.2
Para esta legislação, são atividades de pesquisa tecnológica e desenvolvimento de
inovação tecnológica cujos dispêndios são passíveis dos benefícios fiscais:
Pesquisa Básica Dirigida (PB)
Trabalhos executados com o objetivo de adquirir conhecimentos quanto à compreensão de novos fenômenos, com vistas ao desenvolvimento de produtos, processos ou sistemas inovadores.
Pesquisa Aplicada (PA)
Trabalhos executados com o objetivo de adquirir novos conhecimentos, com vistas ao desenvolvimento ou aprimoramento de produtos, processos e sistemas.
Desenvolvimento Experimental (DE)
Trabalhos sistemáticos delineados a partir de conhecimentos pré-existentes, visando a demonstração da viabilidade técnica ou funcional de novos produtos, processos, sistemas ou, ainda, um evidente aperfeiçoamento dos já produzidos ou estabelecidos.
Tecnologia Industrial Básica (TIB)
Aferição e calibração de máquinas e equipamentos, o projeto e a confecção de instrumentos de medida específicos, a certificação de conformidade, inclusive os ensaios correspondentes, a normalização ou a documentação técnica gerada e o patenteamento do produto ou processo desenvolvido.
Serviço de Apoio Técnico (SAT)
Aqueles que sejam indispensáveis à implantação e à manutenção das instalações ou dos equipamentos destinados, exclusivamente, à execução de projetos de pesquisa, desenvolvimento, bem como à capacitação dos recursos humanos a eles dedicados.
2 Decreto 5.798/06, art. 2º, I.
O decreto dispõe que para comprovação de requisitos poderão ser considerados os
dispêndios de acordo com a Lei do Bem
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Para o Manual de Frascati, as atividades de inovação tecnológica são o conjunto
de diligências científicas, tecnológicas, organizacionais, financeiras e comerciais,
incluindo o investimento em novos conhecimentos, que realizam ou destinam-se a
levar à realização de produtos e processos tecnologicamente novos e melhores3,
tendo como atividades:
Pesquisa básica orientada (dirigida)
Aquela que é realizada com a expectativa de que ela conduzirá à criação de uma ampla base de conhecimento que permita resolver os problemas e perceber as oportunidades que se apresentam atualmente ou possam vir a se apresentar em uma data posterior.
Pesquisa AplicadaConsiste em trabalhos originais empreendidos com a finalidade de adquirir conhecimentos novos. No entanto, ela é dirigida principalmente a um objetivo ou um determinado propósito prático.
Desenvolvimento Experimental
Consiste em trabalhos sistemáticos baseados nos conhecimentos existentes obtidos por pesquisa e/ou experiência prática, tendo em vista a fabricação de novos materiais, produtos ou dispositivos, para estabelecer novos processos, sistemas e serviços ou melhorar consideravelmente os já existentes.
Nota-se que o Manual não traz especificamente os conceitos de serviço de apoio
técnico e tecnologia industrial básica, uma vez que, para o mesmo, estas são
consideradas atividades de apoio ao P,D&I.
O regime automotivo vigente de redução de IPI utiliza-se dos mesmos conceitos da
Lei do Bem. Já o decreto que regulamenta o INOVAR AUTO, apesar de utilizar-se
dos mesmos conceitos, não considera a atividade de tecnologia industrial básica -
TIB como uma atividade de P&D, tendo sido inserida no critério de dispêndios em
engenharia e capacitação de fornecedores, como veremos a seguir:
3 Manual de Frascati. Proposta de Práticas Exemplares para Inquéritos sobre Investigação e Desen-volvimento Experimental p.23.
Redução de IPI
Fonte: Portaria MDIC nº 95 de 08.02.2012 Fonte: Decreto nº 7.819 de 03.10.2012
Crédito Presumido de IPI
Pesquisa básica dirigidaAtividades de P&D (PB, PA, DE e SAT)Pesquisa aplicada
Engenharia, TIB e Capacitação de Fornecedores
Desenvolvimento experimental
Serviço de apoio técnico
Tecnologia industrial básica
Investimentos em atividade de inovação, de pesquisa e de desenvolvimento tecnológico
Dispêndios em pesquisa e desenvolvimento e em engenharia, tecnologia industrial básica e
capacitação de fornecedores
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Nesse sentido, traremos algumas diferenças conceituais observadas na
regulamentação do INOVAR AUTO quando comparadas com as legislações anteriores
que tratam do tema:
• Dispêndios de P&D e Desenvolvimento de Engenharia: Conforme demonstrado,
a Lei do Bem caracteriza como atividades de inovação tecnológica, a pesquisa
tecnológica e o desenvolvimento de inovação tecnológica - P,D&I (atividades de
PB, PA, DE, TIB e SAT). Nesse sentido, o decreto determina que são atividades
de pesquisa e desenvolvimento (P&D) a PB, PA, DE e SAT e como atividade
de engenharia, tecnologia industrial básica e capacitação de fornecedores o
“desenvolvimento de engenharia”. Nota-se, no entanto, que o decreto utiliza-
se do conceito de inovação tecnológica da Lei do Bem para definir a atividade
de “desenvolvimento de engenharia”. Ou seja, o conceito de “desenvolvimento
de engenharia” quando comparado com a Lei do Bem, nada mais é do que a
definição de inovação tecnológica. Dessa forma, o INOVAR AUTO não explicita
quais as atividades que na prática serão consideradas para comprovação dos
dispêndios em “desenvolvimento de engenharia”. Essas diferenças conceituais
podem trazer dificuldades para a beneficiária no momento de operacionalizar a
comprovação dos requisitos.
• Tecnologia Industrial Básica (TIB): De acordo com a Lei do Bem, são atividades
de TIB a “aferição e calibração de máquinas e equipamentos, o projeto e a confecção
de instrumentos de medida específicos, a certificação de conformidade, inclusive
os ensaios correspondentes, a normalização ou a documentação técnica gerada
e o patenteamento do produto ou processo desenvolvido.” É de se notar que
dentro deste conceito estão inseridas várias referências que remetem ao próprio
conceito de inovação tecnológica4. Essas atividades de apoio são essenciais à
pesquisa, desenvolvimento e inovação, uma vez que garantem, por exemplo,
o bom funcionamento das máquinas e equipamentos exclusivos para P,D&I,
ensaios e certificação de conformidade, entre outros. O fato de a tecnologia
industrial básica ter sido desvinculada das atividades de P&D pelo INOVAR AUTO
pode também se tornar um dificultador para a beneficiária do regime na prática.
• Treinamento do pessoal dedicado à pesquisa, desenvolvimento e inovação:
No contexto da Lei do Bem, essa atividade caracteriza-se como apoio à P&D,
uma vez que encontra-se inserida no conceito de serviço de apoio técnico – SAT,
definido como “aqueles que sejam indispensáveis à implantação e à manutenção
das instalações ou dos equipamentos destinados exclusivamente à execução
4 Decreto 5.798/06 - Art. 2º , I,: “inovação tecnológica: a concepção de novo produto ou processo de fabricação, bem como a agregação de novas funcionalidades ou características ao produto ou processo que implique melhorias incrementais e efetivo ganho de qualidade ou produtividade, resultando maior competitividade no mercado”.
O decreto utiliza-se do conceito de inovação tecnológica da Lei do Bem para definir a
atividade de “desenvolvimento de engenharia”
O fato de TIB ter sido desvinculada das atividades de P&D pelo INOVAR AUTO pode
também se tornar um dificultador para a beneficiária do regime na prática
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de projetos de pesquisa, desenvolvimento ou inovação tecnológica, bem como
à capacitação dos recursos humanos a eles dedicados”5, sendo também uma
atividade essencial e indispensável à P,D&I. O INOVAR AUTO traz o treinamento
de pessoal dedicado a P,D&I como uma das atividades de “engenharia, tecnologia
industrial básica e capacitação de fornecedores”, gerando uma duplicidade de
conceitos para a mesma atividade.
• Desenvolvimento de Produtos e Desenvolvimento de Engenharia: O INOVAR
AUTO diferencia as atividades de inovação tecnológica (“desenvolvimento de
engenharia”) e as de “desenvolvimento de produtos, inclusive veículos, sistemas
e seus componentes, autopeças, máquinas e equipamentos”. Conforme já
mencionado, as atividades de desenvolvimento de produto já estão inseridas no
conceito de inovação tecnológica. O desenvolvimento de produtos envolve as
atividades inovativas e de desenvolvimento experimental (DE), tais como:
– Estudo de viabilidade técnica e econômica
– Simulação e testes em laboratório
– Desenvolvimento de protótipo
– Testes em escala piloto
– Testes em escala industrial
Não obstante, o conceito de desenvolvimento experimental do INOVAR AUTO,
determina que este será “constituído pelos trabalhos sistemáticos delineados a
partir de conhecimentos pré-existentes, visando à comprovação ou demonstração da
viabilidade técnica ou funcional de novos produtos, processos, sistemas e serviços
ou, ainda, um evidente aperfeiçoamento dos já produzidos ou estabelecidos”6. Ou
seja: o próprio conceito de desenvolvimento experimental está estritamente ligado
ao conceito de inovação tecnológica, que envolve o desenvolvimento de produtos.
Sendo assim, a separação entre as definições de inovação tecnológica (também
considerando o conceito de desenvolvimento experimental) e de desenvolvimento
dos produtos citados, torna complexa a definição conceitual.
• Terceirização de P&D: ainda, há a referência à possibilidade de realização de
atividades diretamente pela beneficiária do regime automotivo, por intermédio
de fornecedor contratado ou por intermédio de contratação de universidade,
instituição de pesquisa, empresa especializada ou inventor independente.
A Instrução Normativa 1.187/11 da Receita Federal, que disciplina os incentivos
fiscais da Lei do Bem, não permite o uso dos incentivos em relação às importâncias
empregadas ou transferidas a outra pessoa jurídica para a execução de pesquisa
5 Decreto 7.819/12, art.7º, §4, IV e Decreto 5.798, art. 2º, II, “e”.6 Decreto 7.819/12, art. 7º, §4º, III.
A separação entre as definições de inovação tecnológica e de desenvolvimento dos produtos citados, torna complexa a definição conceitual
9
tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica sob encomenda ou
contratadas, exceto quando se tratar de dispêndios com pesquisa tecnológica e
desenvolvimento de inovação tecnológica contratadas no País com universidade,
instituição de pesquisa ou inventor independente e as importâncias transferidas a
microempresas e empresas de pequeno porte7. Ou seja, é vedada a terceirização da
execução da P,D&I para médias e grandes empresas. No entanto, não há menção,
na Lei do Bem ou na IN sobre o conceito de empresa especializada tratado na
regulamentação do INOVAR AUTO.
Tendo em vista que o decreto regulamentador do novo regime disciplina que poderão ser
considerados para fins de comprovação dos gastos com pesquisa e desenvolvimento,
engenharia, TIB e capacitação de fornecedores os dispêndios realizados de acordo
com a Lei 11.196/05, verifica-se claramente uma grande controvérsia legislativa que
pode trazer dificuldades tanto para as empresas beneficiárias, quanto para os próprios
órgãos fiscalizadores.
Abaixo, a título ilustrativo, demonstramos as diferenças conceituais abordadas:
Além das questões tratadas, há outras dúvidas que vêm gerando certa insegurança
por parte das empresas, em razão da relativa proximidade do início de vigência do
INOVAR AUTO. Não está claro ainda, por exemplo, quais os dispêndios em P&D serão
considerados para atendimento do requisito de habilitação no regime, nem explicitado
o que será considerado como capacitação de fornecedores.
Ademais, o decreto regulamentador do regime traz, ainda, a pendência de eficácia
de vários atos complementares dos Ministérios da Fazenda, de Ciência, Tecnologia e
Inovação e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
7 Instrução Normativa 1.187/11, Art. 4º, §9º.
Dispêndios em P&D Dispêndios em Engenharia, TIB e Capacitação de Fornecedores
(1/2)
Dispêndios em Engenharia, TIB e Capacitação de Fornecedores
(2/2)
Fonte: Decreto nº 7.819 de 03.10.2012
Pesquisa básica dirigida
Desenvolvimento de engenharia(Inovação Tecnológica)
Capacitação de fornecedores
Pesquisa aplicada
Tecnologia industrial básica
Desenvolvimento experimental
Desenvolvimento de Produtos, inclusive veículos, sistemas e
seus componentes, autopeças, máquinas e equipamentos
Desenvolvimento de ferramental, moldes e modelos para moldes,
instrumentos e aparelhos industriais e de controle de qualidade, novos
e os respectivos acessórios, sobressalentes e peças de reposição,
utilizados no processo produtivo
Construção de laboratórios de desenvolvimento de estilo e design
Treinamento do pessoal dedicado à P,D&I
Serviço de apoio técnico
Construção de laboratórios de desenvolvimento de
tecnologias em segurança automotiva, ativa e passiva
Construção de laboratórios de desenvolvimento de novas
tecnologias de redução na emissão de gases poluentes
Não há menção, na Lei do Bem ou na IN sobre o conceito de empresa especializada tratado
na regulamentação do INOVAR AUTO
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4. Os impactos do novo regime para o setor
Alguns outros pontos vêm sendo amplamente discutidos antes mesmo da
implementação do INOVAR AUTO. Trazemos, em seguida, alguns dos principais
assuntos que vêm sendo debatidos desde o anúncio do novo regime.
4.1 Competitividade da indústria brasileira e novas montadoras
Ao fortalecer a indústria nacional, o país acaba elevando seu nível de competitividade.
No entanto, o INOVAR AUTO estabelece certas barreiras comerciais e inviabiliza a
inserção do mercado automobilístico brasileiro no atual contexto mundial, que é o de
fornecedores globais, com modernas tecnologias.
Fato é que com o novo regime, a instalação de novas fábricas no país será dificultada
(obras de montadoras que estavam em andamento foram interrompidas, aguardando
maiores definições acerca do assunto), impedindo o despontamento dos veículos
importados. As montadoras instaladas no país já atendem ao requisito de produções
locais, determinado pela nova legislação. As novas montadoras, estrangeiras, já
têm seus processos estabelecidos em locais diversos, de forma a manter o baixo
custo e a melhor tecnologia, atendendo aos avanços do mercado, o que dificulta o
estabelecimento num país onde só terá direito ao benefício fiscal quem tiver uma
maior produção local.
Há uma preocupação de que esta determinação legal pode impactar o avanço
tecnológico do Brasil, não permitindo a entrada de novos métodos e processos,
aumentando os custos de produção e atrasando o país em relação à competitividade
quanto ao restante do mundo, apesar dos cinco anos previstos para o regime.
4.2 Eficiência energética dos veículos e etiquetagem
O novo regime traz um requisito de adesão ao programa de etiquetagem, que mede a
eficiência energética dos veículos.
Segundo as montadoras, a determinação legal implicará em um investimento muito
além das reais possibilidades, sendo necessário mais tempo para adequação. E
de acordo com o discurso das potenciais beneficiárias, o aporte de investimento
para tal adequação seria tão elevado, dentre outros motivos, devido à utilização de
combustíveis diferentes do restante do mundo, o que afeta os níveis de emissão.
Entretanto em um contexto em que é necessário prezar pela sustentabilidade, é
complexo evoluir e estar apto à competição sem um esforço para redução de emissão
de gases, em sentido contrário à tendência mundial.
Há uma preocupação de que esta determinação legal pode impactar o avanço
tecnológico do Brasil
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4.3 Investimentos em P&D e seus conceitos
Algumas correntes defendem que é preciso atentar para as baixas exigências de
investimento em P&D e Engenharia: a maior parte das montadoras já instaladas
no país já atende aos percentuais estabelecidos, como já citado anteriormente. É
curioso notar que o Decreto 7.567/11, que regulamenta a redução do IPI em favor da
indústria automotiva, especificamente, determina que a redução de alíquota estará
condicionada à realização de investimentos em atividades de inovação, pesquisa
e desenvolvimento tecnológico de produto e processo no país, correspondentes a
pelo menos 0,5% da receita brutal total de venda de bens e serviços. O novo regime
exige 0,15% de investimento em P&D para o ano de 2013, chegando a 0,5% apenas
no ano de 2015. Para Engenharia, Tecnologia Industrial Básica e Capacitação de
Fornecedores, o máximo exigido durante o regime será de 1%.
Dessa forma, Acredita-se que empresas que já usufruem do benefício da redução
do IPI estarão aptas a usufruir do crédito presumido, considerando que houve uma
redução da exigência do investimento. No entanto, permanece a insegurança quanto
ao percentual determinado, já que não está claro ainda sobre quais atividades e quais
bases de gastos recairá a exigência.
5. Conclusões
Dentre os principais objetivos do novo regime, podemos citar o estímulo ao aumento do
conteúdo local na produção, o aumento dos investimentos em inovação tecnológica, o
capacitação de fornecedores e o aumento da eficiência energética dos veículos. Ainda
são poucos os dados que evidenciam que estes resultados serão atingidos. Abaixo,
algumas informações sobre o setor:
• O setor de fabricação de veículos automotores, reboques e carrocerias investe
em atividades internas de P&D, R$ 3.097 milhões, que representa 20,3% do total
de dispêndios realizados pelas empresas inovadoras do Brasil8.
• Se consideramos os dispêndios em P&D beneficiados pela Lei do Bem pelo
setor como uma referência, em 2010, o setor foi responsável por mais de R$ 2
bilhões de investimentos em P&D, resultando em cerca de R$ 700 milhões em
benefícios, o que representa mais de 40% do investimento total das empresas
beneficiárias da Lei do Bem9.
É visível a representatividade do setor automotivo na economia do país, bem como a
necessidade de aumento dos investimentos em tecnologia pelo setor.
8 Pesquisa de inovação tecnológica : 2008 / IBGE, Coordenação de Indústria. – Rio de Janeiro : IBGE, 2010.9 Análise Inventta- Relatório Anual Utilização da Lei 11.196/05- Ano Base 2010.
Acredita-se que empresas que já usufruem do benefício da redução do IPI estarão aptas a
usufruir do crédito presumido, considerando que houve uma redução da exigência do investimento
É visível a representatividade do setor automotivo na economia do país, bem como a necessidade de
aumento dos investimentos em tecnologia
12
Vale ressaltar que o incentivo ao investimento privado em P&D é uma medida que
demonstra o compromisso das nossas políticas públicas de aumento dos investimentos
privados em inovação, para que se continue ocupando uma das primeiras posições
no ranking da indústria automotiva, prezando pelo desenvolvimento tecnológico.
No entanto, para que este número esteja sempre crescente, há a necessidade de
uma regulamentação que atenda às reais necessidades das montadoras e que seja
adequada ao contexto mundial de desenvolvimento no setor, para que o Brasil se
mantenha competitivo e consiga manter-se como referência na produção de veículos.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANFAVEA -Anuário da Indústria Automobilística Brasileira 2012. Disponível em: http://www.anfavea.com.br/anuario.html
Decreto 5.798/06. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/Decreto/D5798.htm
Decreto 7.716/12. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivIl_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7716.htm
Manual de Frascati: Proposta de Práticas Exemplares para Inquéritos sobre Investigação e Desenvolvimento Experimental:
Gráfica de Coimbra, 2007.
Inventta. Análise - Relatório Anual Utilização da Lei 11.196/05- Ano Base 2010
Lei 11.196/05. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11196.htm
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Relatório Anual da Utilização dos Incentivos Fiscais. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, 2010. Disponível em: http://
www.abimaq.org.br/Arquivos/Html/IPDMAQ/Relat%20Anual%20Utiliz%20Incentivos%20Fiscais%20MCTI.pdf
AUTORAS
Carina Leão é coordenadora de projetos na Inventta+bgi há 4 anos. É graduada em Direito pela FUMEC, com especialização
em Gestão Corporativa de Tributos. Acumula amplo conhecimento em planejamento tributário e gestão dos incentivos fiscais à
inovação tecnológica, tendo trabalhado com a Algar, Arcelor, CNH, Cofap, Comau, Fiat Powertrain, Fibria, Iveco, Kraft Foods,
M Dias Branco, Philps, Scania, Siemens, Suzano, Telefônica, Votorantim Cimentos, Votorantim Metais, dentre outras. Também
desenvolveu estudos sobre o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
Letícia Goulart é analista de projetos na Inventta+bgi. É graduada em Direito pela UFMG, atua em projetos de incentivos fiscais
à inovação tecnológica e gestão da inovação em empresas como Teksid, Scania e OMR. Desenvolveu estudos sobre o Fundo
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
+ a Braithwaite Global Group member