Download - Catolicismo e Ciências Sociais No Brasil- Mudanças de Foco e Perspectiva Num Objeto de Estudo
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS354
Catolicismo e cincias sociais no Brasil: mudanas de foco e perspectiva num objeto de estudo1
Resumo
O presente artigo faz uma reviso crtica da gnese e desenvolvimento dos estudos sobre catolicismo na rea de cincias sociais no Brasil, tomando como eixo a tenso entre tradio e modernidade. Questiona o lugar do tradicional atribudo ao catolicismo nos escritos que o situam no plo da tradio a partir do sculo XX. Ao mesmo tempo, procura mostrar que, desde uma perspectiva das teorias da prtica, o catolicismo se apresenta permevel modernidade, adequando-se ativamente nova paisagem religiosa que se estabelece no pas com o processo de secularizao e diferenciao religiosa. Busca, ainda, apontar para os limites das abordagens tericas que associam o catolicismo a um Brasil encantado, as quais tm servido de pano de fundo para ressaltar os valores de uma nova ordem moderna que se estabelece como o contraponto de um passado imaginado que precisa ser superado. Na esteira dessa crtica terica, o artigo apre-senta, em ordem cronolgica, uma seleo de autores e escritos que marcaram os estudos do catolicismo no pas.
Palavras-chave: Catolicismo. Cincias sociais. Modernidade. Tradio. Mudana social e converso.
* Professor do Programa de Ps-Graduao em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.** Professora de Sociologa da Universidad de Valparaso Chile.1 Parte significativa da reviso bibliogrfica do artigo tem como referncia a tese de doutorado de Sonia Elizabeth Reyes Herrera (2004). A tese foi orientada por Enno Dagoberto Liedke Fi-lho, com a co-orientao de Carlos Alberto Steil, e defendida no Programa de Ps-Graduao em Sociologia da UFRGS.
Carlos alberto steil*sonia reyes Herrera**
INTERFACE
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 355
m olhar sobre a paisagem religiosa brasileira deixa trans-parecer mudanas significativas nos ltimos anos tanto no meio rural, onde as capelinhas de beira de estrada vo dar lugar aos pequenos templos de diversas denomi-naes pentecostais, quanto nos centros urbanos, onde
as catedrais catlicas e as igrejas paroquiais disputam em ostentao com novos e modernos templos neopentecostais. Esta impresso visual, por sua vez, reforada quotidianamente por notcias da mdia que destacam o crescimento dos evanglicos e a perda da hegemonia do catolicismo no interior do campo religioso brasileiro. A favor desta imagem concorrem os dados estatsticos dos ltimos censos que constatam a evaso constante de fiis catlicos para as religies pentecostais e para os sem religio2 . Mas, se esta observao da paisagem religiosa e os dados estatsticos apontam para um descompasso entre o catolicismo e as tendncias dominantes de configurao atual do campo religioso brasileiro, pesquisas etnogrficas fo-cadas nas prticas e experincias chamam a ateno para processos inter-nos ao prprio catolicismo que estariam conferindo-lhe um novo vigor, dis-putando com os evanglicos a mobilizao de multides em performances rituais, assim como a ocupao de espaos na mdia. Ou seja, se desde uma perspectiva geral pode-se observar que o catolicismo perde sua hegemo-nia, enquanto um sistema religioso e moral dentro da sociedade brasileira, no mbito das prticas ele se renova, configurando-se como um locus, en-tre outros, de produo de sentidos e crenas para indivduos e grupos que encontram a um contexto adequado para a experincia religiosa e moral.
2 A tabela abaixo vai mostrar uma tendncia de crescimento dos protestantes e dos sem religio e um decrscimo dos catlicos.
U
1980 1991 2000
Catlicos 89% 84% 74%
Protestantes 4% 9% 15%
Sem Religio 1% 4,8% 7%
Fonte: IBGE (Censo 1980/1991/2000).
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS356
Catolicismo e modernidade
O socilogo Ulrich Beck, em uma entrevista dada a Johannes Will-
ms e publicada em livro com o ttulo Liberdade ou capitalismo, define o
momento histrico atual como de passagem da Primeira Modernidade
para a Segunda Modernidade (BECK, 2003). J nas ltimas pginas da
entrevista, Beck (2003, p. 209), ao mesmo tempo em que reconhece a
inadequao da Igreja Catlica para lidar com a Primeira Modernidade,
v nessa mesma instituio, pela sua memria e pela sua bagagem, pela
sua noo de organizao tenhamos a serenidade de diz-lo, com certa
ousadia: pela sua ideologia, um global player muito bem preparado
para atuar, ao lado de agentes globalizados mais novos, como as ONGs,
na Segunda Modernidade. Continua o autor:
Em resumo a Igreja Catlica uma resposta pr-moderna para a Segunda Modernidade. Com mais cautela: ela tal-vez possa extrair de sua memria pr-moderna formas de organizao, idias, respostas para a Segunda Modernidade e, desse modo, oferecer algo que muitos consideram indis-pensvel para a ao e o pensamento nas condies de glo-balidade (BECK, 2003, p. 210).
Por outro lado, o mesmo autor chama a ateno para o perigo da
Igreja Catlica de se transformar em um zumbi nos pases centrais do
Ocidente, e completa a mesma afirmao dizendo que em parte ela j
se transformou (BECK, 2003, p. 213).
Gostaramos de chamar a ateno para a ambivalncia a que Beck
chega em sua reflexo sobre o papel da Igreja Catlica enquanto institui-
o inserida no contexto de globalizao e depositria de uma memria
e de uma bagagem pr-moderna (ideologia, crenas, modelo de organi-
zao). Uma ambivalncia que resulta da prpria perspectiva analtica
do autor num contexto em que a orientao predominante parece ser
a de tomar a modernidade como um processo universal e homogneo
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 357
que se realiza como destino inexorvel, ainda que comporte etapas su-
cessivas e diferenciadas no seu transcurso histrico e cronolgico. Nessa
perspectiva, a Igreja Catlica poder-se-ia estender sua referncia para o
prprio catolicismo, na medida em que esses termos esto inextrincavel-
mente articulados aparece como uma sobrevivncia de um momento
pr-moderno capaz, inclusive, de aportar respostas do passado para um
presente permanentemente perturbado por uma crise que constitutiva
da modernidade, enquanto projeto incompleto. Enfim, a Igreja Catlica,
assim como o catolicismo, acaba ocupando, nesse esquema narrativo,
lugar semelhante ao que as sociedades primitivas ocuparam na antropo-
logia funcionalista, espelhos invertidos das sociedades complexas.
Esse esquema narrativo, que serviu para legitimar, em termos ideo-
lgicos, a dominao dos pases centrais do capitalismo ocidental sobre
as suas colnias de alm-mar, em alguma medida, tambm serviu para
elaborar, nos pases colonizados, as narrativas nacionais que visavam justi-
ficar a necessidade de transformaes internas em vista da sua adequao
aos valores modernos e integrao subalterna ao sistema capitalista mun-
dial. Ou seja, para ingressar na modernidade do sculo XIX como naes
independentes, os pases ocidentais perifricos vo se situar no transfun-
do de um passado e de uma cultura pr-moderna, que urge ultrapassar.
Assim, desde uma perspectiva histrica, o catolicismo, com suas
prticas e rituais locais, com seus movimentos devocionais e milenaris-
tas, ser situado num passado imaginado de um feudalismo medieval
brasileira, fora de lugar e extemporneo, e tomado como uma forma de
ideologia das classes dominantes da sociedade senhorial escravocrata3.
3 Nelson Werneck Sodr, por exemplo, poderia ser citado como um representante dessa primeira perspectiva na medida em que v na histria da burguesia brasileira uma gradual evo-luo do modo de produo escravista para o modo de produo feudal (SODR, 1976). J as interpretaes que associam o catolicismo ideologia das classes dominantes foram elabo-radas na tese de Pedro Ribeiro de Oliveira, Religio e dominao de classe (OLIVEIRA, 1985).
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS358
A crena de que uma vez existiu um pas encantado, que sobrevive
nas prticas religiosas das comunidades rurais e nos movimentos milena-
ristas dos sertes, resulta do movimento romntico de construo de uma
identidade nacional que vai imaginar, em retrospectiva, um passado pr-
moderno, dominado pelo mito, pelo mgico e pelo sagrado. Essa imagina-
o idealizada do passado, por sua vez, torna-se essencial para a elabora-
o de uma narrativa capaz de oferecer nao brasileira um passaporte de
entrada, ainda que subalterna, na ordem capitalista. Uma ordem que tem a
ver no apenas com a consolidao de um sistema poltico fundado sobre
a constitucionalidade e a soberania ou com a construo de um parque in-
dustrial que incorpore novas tecnologias, mas sobretudo com uma maneira
diversa de habitar o mesmo pas, com a aquisio de novas sensibilidades,
de novas experincias de espao e tempo, de convivncia e violncia, de
trabalho e lazer, de dor e sade, de conhecimento e arte.
A perspectiva da modernizao parece no conseguir se desvencilhar
de uma teleologia que busca identificar nos processos histricos particulares
um sentido universal em direo ao desencantamento do mundo e a mo-
dernizao burocrtica da sociedade. Quer classificado entre as religies da
imanncia em oposio s religies da transcendncia que encontrariam
no protestantismo sua expresso mais avanada , quer entre as religies tra-
dicionais em oposio s religies de converso , o catolicismo tomado
como uma fora de resistncia emergncia da autonomia e consolidao
da sociedade dos indivduos4. Este lugar ocupado pelo catolicismo resulta em
grande medida da prpria relao intransigente que a Igreja Catlica assume,
no sculo XIX e primeira metade do XX, com a modernidade.
4 As religies afro-brasileiras podem ser includas dentro da categoria das religies tradicionais. No entanto, como nosso foco aqui o catolicismo, no vamos nos ocupar das religies afro-brasileiras a no ser na medida em que elas so um elemento central do sincretismo religioso.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 359
O catolicismo na formao da nao: 1900-1950
Caberia aqui, antes de uma discusso mais sistemtica da literatura
sociolgica que selecionamos sobre catolicismo no Brasil, uma referncia a
Talal Asad em relao crtica que ele faz ao conselho que Geertz d aos
estudantes de antropologia que pretendem iniciar seus estudos de religio.
Segundo Geertz, esses deveriam comear pela noo de cultura como uma
totalidade a priori de significados. Ao propor esse caminho, nos diz Talal
Asad, Geertz acaba remetendo os seus estudantes para uma metafsica da
religio que, partindo da autonomia dos smbolos e sentidos que se arti-
culam dentro de um sistema religioso particular, a divorcia dos processos
de formao histrica. O estudante de antropologia, diz Asad (1983, p.
238), deveria iniciar seu estudo da religio pelas possibilidades e condi-
es sociais da emergncia de determinadas prticas e discursos religiosos.
Na esteira deste autor, procuramos articular a produo sociolgica sobre
o catolicismo no pas com as mudanas sociais, polticas e culturais que re-
configuram o campo religioso brasileiro. Mudanas estas que acabam rede-
finindo a posio do catolicismo na sociedade brasileira, o qual perde a sua
posio de religio oficial e dominante diante da diversidade de alternativas
religiosas que se apresentam a partir do incio do sculo XX.
A idia de um campo religioso plural e diversificado, onde cada
denominao religiosa possui sua autonomia e identidade, contrasta com
a paisagem religiosa anterior, em que o catolicismo encompassava a di-
versidade dos grupos e tradies que, embora presentes desde a origem
da formao histrica da sociedade brasileira, eram como que invisibiliza-
dos pelo predomnio catlico. Ou seja, antes da diversificao do campo
religioso brasileiro, o catolicismo se apresentava como uma meta-religio
que incorporava mltiplas tradies de origem europia, indgena e afri-
cana. Neste contexto, o sincretismo, que se efetuava na prtica cotidiana
dos fiis, acabava sendo subsumido por um modelo religioso hegemnico
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS360
que se mantinha e se reproduziu graas a sua relao orgnica com o
Estado colonial e monrquico.
Os primeiros trabalhos sobre religio no Brasil, datados no perodo
de 1870 a 1920, como assinala Maria Isaura Pereira de Queiroz, j de-
nunciam o sincretismo do catolicismo brasileiro como um trao do atraso
cultural e social do pas. Esta viso, como mostra a autora, era partilhada
pelos intelectuais da poca e pelo novo clero, formado dentro de uma
mentalidade do catolicismo intransigente e romanizado:
a intelectualidade e o clero, em fins do sculo XIX, enten-diam tal variedade de cultos como prova de desenvolvimen-to cultural, social e econmico retardado do seu pas. Nas sociedades civilizadas julgavam eles no seriam encon-trados esses cultos brbaros, essas prticas extraordinrias, esses rituais arcaicos, essas cerimnias fora de poca que no Brasil faziam as delcias dos etnlogos e dos folcloristas (QUEIROZ, 1988, p. 68).
neste esprito anti-sincrtico, na viso desta mesma autora, que se
situa o primeiro estudo cientfico sobre religio no Brasil, A celebrao
da Paixo de Cristo entre os Guaranis (1842), de Jos Joaquim Macha-
do de Oliveira, publicado na Revista do Instituto Histrico, Geogrfico
e Ethnogrfico (peridico fundado em 1838) (QUEIROZ, 1989)5. Mas,
ser na passagem do sculo XIX para o XX, que tem incio um processo
mais sistemtico de reflexo acadmica sobre religio, quando sobressai
a figura de Nina Rodrigues, mdico legista maranhense e professor da Fa-
culdade de Medicina da Bahia, que incorpora em sua atuao na percia
mdica uma preocupao com questes raciais e sincrticas. Seguindo o
paradigma do sculo XIX de oposio entre o civilizado e o primitivo (ou
brbaro), Nina Rodrigues destaca a relao evolutiva entre as populaes
afro-brasileiras e os brancos. Em seu livro O animismo das religies afro-
5 Esse texto aborda o sincretismo entre a religio catlica e as prticas e cultos aborgines numa aldeia guarani, situada nos arredores de So Paulo (QUEIROZ, 1989).
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 361
brasileiras, segundo Wagner Gonalves da Silva, Nina Rodrigues mostra-
va as influncias sociais exercidas pela raa negra no Brasil, por meio do
estudo de sua mentalidade religiosa, considerada patolgica, atrasada
e incapaz de manipular as elevadas abstraes exigidas pela religio
monotesta (SILVA, 1993, p. 35)6.
Apesar do vis evolucionista de seu pensamento, Nina Rodrigues
foi um chefe de escola, tendo fixado os dois pontos de referncia do
estudo das religies afro-brasileiras para toda a primeira metade do sculo
XX: o psicologismo e a etnografia (BASTIDE, 1989, p. 33). A viso de
Nina Rodrigues tem sua importncia significativa na medida em que, ao
evidenciar as relaes entre os deuses africanos e os santos catlicos ele
aproxima as prticas catlicas devocionais do primitivo e do extico que
se apresentava como o contraponto do projeto moderno.
A dcada de 1930 est marcada por dois eventos centrais para a
constituio de um campo acadmico no pas. O primeiro refere-se ins-
titucionalizao da sociologia, onde se destacam a criao da Escola Livre
de Sociologia e Poltica de So Paulo, em 1933, e a Seo de Sociologia
e Cincia Poltica da Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas
da Universidade de So Paulo, em 1934. O segundo est associado
publicao de trs obras que sero consideradas como formadoras do
pensamento do brasileiro, a saber, Casa-grande e senzala, de Gilberto
Freyre (1933) (FREYRE, 1936), Evoluo poltica do Brasil, de Caio Pra-
do Jr. (PRADO JUNIOR, 1975) e Razes do Brasil, de Srgio Buarque de
Holanda (1936) (HOLANDA, 1979). Dos trs autores, Gilberto Freyre
quem vai destacar a importncia do catolicismo na formao da nao
brasileira, como um elemento integrador entre as trs raas que vo cons-
tituir a cultura brasileira. Nas palavras de Freyre (1936, p. 11),
6 Trata-se de uma obra de divulgao mdico-cientfica, publicada em 1900, em francs, dedicada Socit mdico-psychologique de Paris.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS362
foi esse cristianismo domstico, lrico e festivo, de santos compadres, de santas comadres dos homens, de Nossas Se-nhoras madrinhas dos meninos, que criou nos negros as pri-meiras ligaes espirituais, morais e estticas com a famlia e com a cultura brasileira.
Na esteira das mudanas que se iniciaram na dcada anterior no
pensamento brasileiro, Arthur Ramos publica O negro brasileiro, impri-
mindo um sentido anti-racista e antietnocntrico cultura e religio
afro-brasileiras (RAMOS, 1940). Principal discpulo de Nina Rodrigues,
Arthur Ramos tambm era mdico legista e dedicou toda sua vida ao
estudo dos grupos e culturas africanas no Brasil. Como nos lembra Roger
Bastide, embora utilizasse critrios semelhantes aos de Nina Rodrigues no
estudo do negro no pas, sua viso distinguia-se da do mestre na medida
em que se pautava fundamentalmente pelo principio da relatividade das
culturas e do antietnocentrismo (BASTIDE, 1989). Em consonncia com
a perspectiva culturalista de Gilberto Freyre, mas filiando-se idia do
pensamento pr-lgico das populaes primitivas, de Lvi-Bruhl, Arthur
Ramos faz a crtica ao evolucionismo e passa a ver o sincretismo em ter-
mos culturais, e no mais raciais.
As obras dessa primeira metade do sculo XX tm em comum uma
viso do catolicismo como um elemento integrante do sincretismo reli-
gioso, de forma que no vamos encontrar, nos estudos acadmicos, at
o final da primeira metade do sculo XX, trabalhos sobre o catolicismo
em si. Enquanto um elemento constitutivo e constituinte da cultura bra-
sileira em sua formao sincrtica, o catolicismo passa a fazer parte de
um discurso putativo da nao brasileira que elaborado em oposio
ao processo de mudana em direo urbanizao e industrializao,
segundo o modelo imaginado das naes modernas dos pases centrais.
As prticas religiosas em si, assim como a experincia dos sujeitos que se
encontram envolvidos com elas, esto ausentes desses estudos, uma vez
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 363
que a preocupao que os orienta a de estabelecer um padro cultural
tradicional que funciona como a imagem invertida dos novos valores e
prticas que seriam prprios da modernizao capitalista.
O catolicismo em contextos de mudana social: dcada de 1950
O primeiro trabalho acadmico, com foco exclusivo no catolicis-
mo, vai surgir apenas em 1953, quando Thales de Azevedo publica Ca-
tolicismo no Brasil7 (AZEVEDO, 1955). A proposta do autor era situar os
fenmenos religiosos como parte da psicologia coletiva, onde aparecem
as concepes populares acerca do sobrenatural e do divino. As manifes-
taes religiosas surgem, assim, como respostas s aspiraes e necessi-
dades humanas de ordem psquica, especialmente relacionadas busca
de segurana e de correspondncia afetiva. Sua inteno de fazer uma
sociologia que se diferenciaria da perspectiva at ento dominante nos
estudos sociais parece reforar nosso argumento de que o catolicismo
ocupava o lugar do extico na narrativa da nao brasileira. Como ele
mesmo afirma, tratava-se de assumir uma perspectiva diferente daquela
que via as prticas catlicas como coisas pitorescas ou exticas, ou como
aspectos depreciativos e ridculos da f popular, ou como esquisitices com
que o cientista social poder se distrair (AZEVEDO, 1955, p. 7). Mas o
prprio Azevedo acaba reduzindo a religio na sua forma popular fun-
o sucednea de resposta psicolgica s aflies humanas.
Pode-se, ainda, salientar no trabalho de Thales de Azevedo a pre-
ocupao com a mudana que vinha ocorrendo no perodo no campo
religioso brasileiro no sentido de um incio de diversificao. Ao fazer um
7 Esse texto foi publicado originalmente em ingls, na revista Thought, da Fordham University, Nova Iorque.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS364
levantamento das questes que seriam importantes de serem considera-
das pelas cincias sociais, ele elenca
a expanso e as caractersticas do protestantismo, do espi-ritismo, do ocultismo, da teosofia, como as implicaes so-ciais da indiferena religiosa e do prprio atesmo; do pecu-liar anti-clericalismo brasileiro; dos sincretismos encarados no somente do lado das religies africanas e do espiritismo mas do lado do catolicismo; dos surtos de fanatismo e de misticismo em torno de lderes carismticos, de taumatur-gos e at de sacerdotes catlicos como o padre Ccero e o padre Antnio de Urucnia (AZEVEDO, 1955, p. 6).
Assim, se Thales de Azevedo pode ser considerado o precursor dos
estudos de catolicismo no pas, ele tambm foi o primeiro a levantar a
preocupao em relao diversificao do campo religioso e a necessi-
dade das cincias sociais de investirem em estudos e pesquisas que pu-
dessem dar respostas a essas mudanas.
Outra vertente de estudos sobre o catolicismo que se inicia ainda antes
de 1960 de carter mais etnogrfico e situa-se no mbito dos estudos de
comunidade. Esses estudos caracterizaram-se por descries e interpreta-
es a partir da observao emprica de prticas e rituais religiosos locais,
ao mesmo tempo em que procuraram demarcar sua diferena em relao
aos estudos do folclore, que so dominantes no perodo. Assim, o modelo
de etnografia que se utiliza ser particularmente importante na descrio e
interpretao do papel da religio na vida das comunidades estudadas e na
constituio dos sujeitos sociais. As prticas, crenas e rituais, na sua comple-
xidade e entrelaamento com outras dimenses da vida social ganham um
lugar de destaque para a compreenso da cultura e da vida da sociedade
brasileira. Tendo presente que as comunidades estudadas so constitudas
majoritariamente por catlicos, decorre que o catolicismo, sobretudo na sua
forma popular, concentre especial interesse por parte dos pesquisadores.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 365
Entre os autores que marcaram esse tipo de abordagem do catoli-
cismo, podemos citar dois pioneiros. O primeiro, Eduardo Galvo, em
sua tese de doutorado, orientada por Charles Wagley, faz uma descrio
detalhada, no estilo etnogrfico, dos santos, visagens, a panema e
o boi-bumb (GALVO, 1976). Esse autor vai se tornar uma referncia
importante para os estudos do catolicismo no Norte do pas. O segundo,
Emlio Willems (1905-1998), atuou mais no Sul e Sudeste do pas. Seu
trabalho sobre Cunha, uma comunidade rural no interior do Estado de
So Paulo, publicado em 1948 e posteriormente em 1962, sob o ttulo
Uma vila brasileira: tradio e transio em uma cultura rural do Brasil,
desloca o foco dos estudos sobre religio das religies afro-brasileiras e
indgenas para o catolicismo, enquanto religio predominante na comu-
nidade por ele estudada (WILLEMS, 1961). Mas sua contribuio mais
importante est no pioneirismo dos seus estudos sobre pentecostalismo,
que abrangem Brasil e Chile. Seu livro Followers of the new faith: culture
change and the rise of protestantism in Brazil and Chile garantiu-lhe um
lugar entre os clssicos dos estudos do pentecostalismo na Amrica Latina
(WILLEMS, 1967). Seu mrito, em relao aos estudos do catolicismo,
foi o de ter chamado a ateno para as semelhanas e conexes entre
o catolicismo popular e o pentecostalismo. Sua anlise est referida
perspectiva da mudana cultural, onde o pentecostalismo se explica pela
sua funcionalidade insero dos indivduos no contexto urbano, como
conseqncia do processo de modernizao da sociedade. A esse mesmo
processo, Willems associa a perda da hegemonia da religio catlica no
continente e a instaurao do pluralismo religioso.
Na tentativa de fazer um inventrio das prticas e sentidos simbli-
cos e de apresent-los como um sistema integrado que possui autonomia
e coerncia interna, acaba-se dissociando essas prticas e esses sentidos
das experincias dos indivduos, assim como das condies materiais e
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS366
dos processos sociais que os produziram. Estabelece-se uma relao dire-
ta entre o sistema social e a cultura, como se esta fosse o espelho daquele.
Pode-se ainda destacar como um ponto de convergncia entre os
autores acima referidos a preocupao de associar a religio aos momen-
tos de crise na vida pessoal dos indivduos e da sociedade. Otvio Ianni,
ao fazer um balano da contribuio desse perodo ao pensamento socio-
lgico, afirma que
interessante observar que em vrios dos estudos sobre com-portamento e representaes religiosas est presente a pre-ocupao em compreender as relaes desses fenmenos com as situaes de crise ou transio nas quais se encon-tram as pessoas e os grupos sociais (IANNI, 1989, p. 29)
E, nesse esquema, o catolicismo vai aparecer como o plo da tra-
dio e de resistncia mudana, enquanto as religies de converso
sero percebidas como a resposta religiosa crise individual e social. Essa
percepo, ao mesmo tempo em que direciona as anlises e interpreta-
es dos estudos que procuram dar conta das mudanas que se iniciam
no sentido da pluralidade religiosa da sociedade brasileira, tambm se v
reforada por esses mesmos estudos.
O catolicismo e os movimentos de resistncia modernizao capitalista: 1960-1975
A literatura sociolgica sobre catolicismo nos anos 1960 e primeira
metade dos anos 1970 vai enfocar os movimentos religiosos de contes-
tao que emergem nos sertes brasileiros na segunda metade do sculo
XIX e se estendem at meados do sculo XX8. O foco aqui se desloca do
8 Convm citar aqui o exaustivo trabalho de reviso crtica e bibliogrfica sobre os movimentos religiosos milenaristas realizado por Emerson Giumbelli (GIUMBELLI, 1997).
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 367
cotidiano para o extraordinrio, do local para o transversal e do espacial
para o temporal. O catolicismo aparece ento como um movimento de-
positrio de uma tradio e de uma ideologia pr-modernas que vo se
expressar em formas polticas de resistncia ao capitalismo e suas conse-
qncias secularizadoras no campo das prticas sociais. Classificados como
milenaristas ou messinicos, esses movimentos sero associados violncia
decorrente do carter moral e das disposies interiores de indivduos que
no teriam ascendido ao nvel da racionalidade moderna que teria alcana-
do a sociedade brasileira como um processo natural e irreversvel.
Os estudos sobre os movimentos messinicos no catolicismo rural apa-
recem na dcada de 1960, no trabalho de Maria Isaura Pereira de Queiroz,
que vai se posicionar como um divisor de guas entre os estudos eventuais
e subsidirios sobre o catolicismo e a sua constituio como um objeto de
pesquisa em si. Formada na escola de Bastide, seu livro, O messianismo
no Brasil e no mundo, publicado em 1965, resultou de uma pesquisa bas-
tante abrangente, iniciada em 1948 (QUEIROZ, 1965). Imprimindo uma
perspectiva funcionalista sua anlise, Maria Isaura busca destacar as rela-
es que os grupos messinicos estabelecem com as instituies sociais e
polticas da sociedade inclusiva, em vista de sua adaptao s mudanas
que esto acontecendo na sociedade. Seu foco, no entanto, est mais no
movimento do que na religio, de modo que a religio aparece antes de
mais nada como um canal de ao poltica e social. A escolha dos movi-
mentos messinicos como objeto emprico de pesquisa dentro de um leque
diversificado de experincias que vai de Canudos de Antnio Conselheiro
na Bahia ao Padre Ccero do Juazeiro no Cear, passando pelo Contestado
no Sul do pas, e a sua classificao sob a categoria de messianismo acabam
por reforar uma viso do catolicismo como uma forma de resistncia tra-
dicional ao projeto moderno da nao brasileira.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS368
Os movimentos camponeses catlicos de resistncia modernizao
no pas ainda sero tema do trabalho de Rui Fac, mas agora no mais
numa abordagem estrutural-funcionalista, como a de Maria Isaura Pereira
de Queiroz, mas marxista. Como lembra Marcelo Camura, em seu livro
sobre Padre Ccero e o Juazeiro do Norte, o trabalho de Fac, se apresenta
como uma primeira interpretao sociolgica na linha marxista dos deser-
dados do campo. Pela primeira vez estas manifestaes no sero tratadas
como fanatismo e banditismo (CAMURA, 1994, p. 104). Nessa nova
abordagem, o catolicismo aparece como a nica ideologia possvel entre
aquelas camadas da populao sertaneja (FAC, 1976, p. 132). Uma ide-
ologia capaz de subverter o latifndio, na perspectiva do autor, mas inca-
paz de realizar a revoluo social, por se tratar de uma ideologia primria,
associada a um estgio pr-capitalista do desenvolvimento das foras pro-
dutivas, que Fac identifica como atraso medieval (FAC, 1976, p. 38).
Assim, na teleologia do marxismo brasileira, o catolicismo popular tradi-
cional surge como um estgio, pr-capitalista e feudal a ser superado pelo
esclarecimento das conscincias e o desenvolvimento das foras produtivas
no longo processo de gestao do socialismo cientfico e poltico.
Outro autor que deve ser citado no campo dos estudos sobre catoli-
cismo no contexto rural e dos movimentos messinicos Duglas Teixeira
Monteiro (1926-1978). Este autor teve um importante papel na formao
de uma nova gerao de pesquisadores na rea da religio no somen-
te em So Paulo, mas em todo o pas9. Sua obra principal, Os erran-
tes do novo sculo: um estudo sobre o surto milenarista do Contestado,
9 Duglas teve importante atuao no Centro de Estudos da Religio (CER) e na formao do Grupo de Trabalho Religio e Sociedade da Anpocs, assim como manteve uma estreita relao com o Instituto de Estudos da Religio (Iser), tendo sido um dos responsveis pela criao da revista Religio e Sociedade. Com a morte de Duglas Teixeira Monteiro, num acidente, na ci-dade de Olinda, em 1978, o catolicismo, enquanto tema, se eclipsa diante da importncia que as religies afro-brasileiras vo ocupar como objeto de estudos entre os participantes do CER.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 369
foi publicada em 1974 e resultou de sua tese de doutorado, defendida
em 1973, na Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas da USP
(MONTEIRO, 1974). Ao retomar o tema do milenarismo, no entanto, pro-
pe uma interpretao diferente daquela que havia sido apresentada por
Maria Isaura Pereira de Queiroz. Assim, enquanto Maria Isaura enfatiza os
aspectos gerais do evento do Contestado e toma a religio como um epi-
fenmeno que escondia o que era essencial ao movimento, Duglas Tei-
xeira Monteiro procura compreender o significado que as aes religiosas
e os rituais tinham para os atores sociais envolvidos com o movimento.
Seu argumento interpretativo segue uma estrutura que organiza o evento
numa seqncia lgica: a ordem pretrita, onde a unidade ideolgica
era dada pelo catolicismo rstico, o desencantamento, entendido como
secularizao que no chega a se institucionalizar na sociedade local e o
reencantamento, onde se reconstituem os valores ameaados pela crise.
A partir dessa estrutura lgica na compreenso da religio, segundo Carlos
Rodrigues Brando, Duglas Teixeira Monteiro passou do estudo de for-
mas religiosas de surtos milenaristas do mundo rural do passado, para o
estudo das formas eclesiais e sectrias de cura divina no mundo brasileiro
urbano e atual (BRANDO, 1979, p. 18). J deixando o contexto rural,
Duglas mostrou, no final de sua vida, um interesse especial pela ques-
to da sade e religio, tendo publicado, em 1977, um artigo intitulado
Cura por correspondncia, na revista Religio e Sociedade (MONTEIRO,
1977). Nesse artigo, formula uma interpretao dessa prtica religiosa a
partir do conceito de mercado religioso, que passa a ser usado com recor-
rncia no mbito da sociologia da religio.
O messianismo, tema central nos estudos de Duglas Teixeira Mon-
teiro, mantm-se como uma referncia entre os herdeiros de seu legado
como uma linha de pesquisa que aparece em trabalhos apresentados no
Grupo de Trabalho (GT) da Anpocs de 1981, 1985, 1989 e 2000 e, ainda
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS370
em 2000, com a publicao do livro O messianismo no Brasil contempo-
rneo (HERRERA, 2004, p. 171). No entanto, um rpido passar de olhos
sobre a relao de teses de mestrado e doutorado sobre religio, orien-
tadas pelos pesquisadores que foram formados por Duglas Monteiro na
USP e aqueles que passaram a orientar na PUC/SP, mostra que, se de um
lado constata-se uma continuidade do tema do catolicismo, por outro,
este quase que desaparece diante do predomnio dos temas relacionados
com as religies afro-brasileiras e protestantes10.
Se a primeira interpretao do milenarismo, seguida por Maria Isau-
ra Pereira de Queiroz, esteve inspirada pelo paradigma estrutural-funcio-
nalista, a segunda, seguida por Rui Fac, esteve baseada no marxismo, a
terceira, adotada por Duglas Monteiro, vai buscar nos estudos mediterr-
neos a sua principal referncia. Todas essas interpretaes, contudo, enfa-
tizaram a diferena e a distino cultural entre esse ambiente catlico, de-
nominado rstico ou popular tradicional, e o seu prprio, identificado
como moderno e secularizado. Tratava-se, na verdade, de demarcar a
alteridade em relao experincia cultural do cientista social, condio
indispensvel para legitimar a etnografia dentro do paradigma dominante
da poca. Essa nfase na diferena se estende como um trao recorrente
na anlise do catolicismo no pas (VELHO, 1997). Nesse sentido, uma re-
leitura da literatura dos estudos sobre os movimentos milenaristas poderia
revelar determinados traos decorrentes das condies de produo de
um conhecimento sobre o catolicismo que permanecem, ainda que in-
conscientes, nas anlises sociais atuais do catolicismo no pas.
H que se referir, nesse perodo, ainda que de uma forma bastante
rpida, contribuio dos estudos realizados pelos brasilianistas, entre
os quais se destaca a figura do historiador norte-americano Ralph Della
10 Para uma avaliao mais precisa desses dados em termos quantitativos, remeto o leitor tese de doutorado de Sonia Elizabeth Reyes Herrera (2004, p. 172-175).
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 371
Cava, que pesquisou na dcada de 1960 o movimento das romarias de
Juazeiro do Norte e a vida de seu fundador, Padre Ccero Romo Batis-
ta. Sua tese, Milagre em Joaseiro (DELLA CAVA, 1976), publicada nos
primeiros anos de 1970 nos Estados Unidos, se apresenta como uma im-
portante crtica tanto ao enfoque localista dado pelo funcionalismo quan-
to ao dualismo que interpretava os movimentos catlicos milenaristas a
partir da chave arcaico e moderno. Em contraposio a estes enfoques,
Ralph Della Cava busca compreender o movimento de Juazeiro do Nor-
te em sua articulao com questes nacionais que estavam em jogo nas
esferas polticas quanto com as mudanas que vinham acontecendo no
catolicismo romano internacional11. Depois da publicao de seu livro
sobre Juazeiro do Norte, a contribuio de Della Cava se estende para
a compreenso de outros aspectos do catolicismo brasileiro, com nfase
nas relaes entre a Igreja Catlica Romana e o Estado brasileiro. Em um
artigo publicado em 1975, ele faz um balano significativo da produo
dos brasilianistas sobre catolicismo, cobrindo o perodo que vai de 1919
a 1964 (DELLA CAVA, 1975)12.
11 Duas citaes do autor especialmente permitem perceber esses pontos de ruptura da sua interpretao em relao s interpretaes anteriores: em relao articulao do local com o nacional, diz Della Cava (1976, p. 21): Defende esse livro a tese de que os atores e os acontecimentos, nos quais o movimento de Joaseiro se originou e se desenvolveu, eram partes e parcelas de uma ordem social Nacional. Quanto a sua crtica ao dualismo, afirma: A viso dualista da sociedade brasileira ainda persiste amplamente. A atual monografia, entretanto, sugere que tal viso tem sido muito exagerada. No resta dvida de que em Joaseiro mesmo at o fim do sculo XIX a sociedade sertaneja estava integrada em muitos nveis importantes numa ordem social de mbito Nacional (DELLA CAVA, 1976, p. 20).12 Nesse artigo, Della Cava analisa sete monografias sobre o catolicismo no Brasil, sendo estas: Pastors, prophets and politicians. A study of the Brazilian Catholic Church 1916-1945 (Colum-bia University, 1971), de Margareth Patrice Todaro; The Brazilian Catholic Labor Movement (University of Massachussetes, 1969), de Howard J. Wiarda; Radicalismo cattolico brasiliano (Roma, 1968), de Ulisse Alessio Floridi; Catholic radicals in Brazil (Oxford University, 1970) de Emanuel de Kadt; Church and power in Brazil (University of Maryknoll, 1973), de Charles Anoine; The political transformation of the Brazilian Catholic (Cambridge University, 1974), de Thomas Bruneau; Leglise et le politique au Brsil (Fondation Nationale des Sciences Politiques, 1973), de Mrcio Moreira Alves.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS372
Della Cava faz, ainda, uma importante virada do estudo do catolicis-
mo agrrio para o da Igreja enquanto instituio, seguindo uma tendncia
mais geral que se pode observar no conjunto da produo sobre o catolicis-
mo na poca (ALVES, 1968; BRUNEAU, 1974; KADT, 1970). Esses autores
buscam compreender as formas pelas quais a instituio catlica procura
moldar sua atuao dentro de um quadro mais geral das mudanas que es-
to ocorrendo na sociedade brasileira. Destacam-se a as questes relativas
modernizao da poltica e da economia e o crescente processo de urba-
nizao num contexto de represso imposto pela ditadura militar no pas.
Em termos de uma avaliao dos estudos sobre catolicismo no pas
nesse perodo, Sonia Herrera menciona muito acertadamente que a re-
senha sobre Messianismo no Brasil, publicada por Alba Zaluar, em 1979,
no BIB (Boletim Informativo Bibliogrfico), poderia ser vista como um di-
visor de guas (HERRERA, 2004). Fechava-se, assim, um ciclo de estudos
do catolicismo associado ao meio rural, como resistncia ao processo de
modernizao e urbanizao, e iniciava-se um novo ciclo no qual a questo
da pobreza e dos Direitos Humanos vai ganhar relevo e destaque nas pes-
quisas sobre catolicismo (HERRERA, 2004). Os novos movimentos sociais,
com suas organizaes de base, entre as quais sobressai o papel das Comu-
nidades Eclesiais de Base (CEBs), sero o novo foco sobre o qual os cientis-
tas sociais concentram suas anlises. A Teologia da Libertao e a opo
preferencial da Igreja Catlica pelos pobres tornam-se, ento, o objeto
privilegiado de estudos sobre o catolicismo nas cincias sociais no pas.
O catolicismo entre o engajamento poltico e a identidade brasileira: 1975-1990
Entre os autores desse perodo, h que se destacar a contribuio
de Cndido Procpio Ferreira de Camargo (1922-1987). Ele teve sua atua-
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 373
o intelectual associada ao Centro Brasileiro de Anlise e Planejamento (Cebrap), fundado em 1969, como uma entidade privada sem fins lucra-tivos, especializada em pesquisas, estudos e assessoria tcnica no campo das cincias sociais. Seu livro Catlicos, protestantes e espritas, publicado em 1973, tinha como objetivo apresentar um panorama religioso brasileiro e suas relaes com o processo social inclusivo, ressaltando o pluralismo religioso como um novo fato social no Brasil, que at pouco tempo estava submetido ao monoplio do catolicismo. Imprimindo uma perspectiva we-beriana nos seus escritos, Procpio Camargo buscou ressaltar as mudanas na funo do cristianismo na sociedade brasileira especialmente em relao ao seu papel como um fator de individuao e democratizao. Assim, tanto por meio da diversificao interna do campo religioso, que produzia a possibilidade da opo religiosa racional para os indivduos, quanto das transformaes que ocorrem no mbito do catolicismo com o Conclio Vati-cano II (1965) e a Teologia da Libertao, que leva a Igreja Catlica a pregar a defesa dos Direitos Humanos e o compromisso com as classes populares, h uma transformao da religio que, segundo Procpio Camargo, precisa ser analisada e compreendida em seu desdobramento social e poltico.
Seu estudo do catolicismo, no entanto, particularmente no decorrer da segunda metade da dcada de 1970 e a primeira metade de 1980, quando se instaurou o conflito entre o governo militar e a Igreja Catlica, precisa ser situado num campo de relaes que se estabelece entre a pas-toral social da Arquidiocese de So Paulo e o Cebrap. Pode-se dizer que Procpio Camargo foi o elo principal, a partir de 1972, entre o Cebrap e a cria diocesana, que convidou o Cebrap para assessor-la na defesa dos Direitos Humanos e na reflexo sobre a pobreza no pas. Esse compro-misso fez com que ele redirecionasse suas pesquisas para o catolicismo, mas agora na sua forma engajada e poltica13. Assim, o Programa Bienal
13 importante lembrar aqui que essa parceria se deu especialmente pela mediao do cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, figura proeminente da hierarquia progressista da Igreja Catlica no Brasil.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS374
(1979-1980) do Setor de Religio do Cebrap, por ele coordenado, esta-
belecia como seu objetivo principal
estudar e avaliar a potencialidade poltica da tica social di-fundida pelos segmentos considerados progressistas da Igre-ja Catlica no Brasil; formas de sociabilidades emergentes nas CEBs e suas articulaes com a sociedade civil brasileira; formas populares de vida religiosa no catlicas, particular-mente as seitas pentecostais e os cultos afro-brasileiros, e a anlise de suas relaes com a sociedade civil, levando-se em conta a especificidade que a estrutura de classe assume na formao social brasileira (HERRERA, 2004, p. 152).
Resultaram desses vnculos entre o Cebrap e a Arquidiocese de So
Paulo duas publicaes importantes: So Paulo 1975: crescimento e po-
breza (CAMARGO, 1976) e So Paulo: o povo em movimento (SINGER;
BRANDT, 1981). As anlises produzidas pelos intelectuais do Cebrap no
s foram uma referncia importante para a elaborao do II Plano de
Pastoral da Igreja na Cidade de So Paulo, mas tambm possibilitou a
divulgao da sociologia da religio para alm das fronteiras acadmicas,
com especial difuso no meio dos agentes religiosos da Igreja Catlica.
Apesar de seu trabalho de assessoria e pesquisas junto Arquidioce-
se de So Paulo, Cndido Camargo Procpio estava longe de se identificar
com um militante religioso ou poltico, como atestam daqueles que o
conheceram e trabalharam com ele no Cebrap num nmero da revista
Novos Estudos Cebrap, publicado em sua memria, em 1987. Paul Sin-
ger, por exemplo, define a sua posio crtica e objetiva afirmando que
apesar de toda simpatia que sentia pela Igreja dos pobres, Procpio manteve, enquanto pesquisador, uma postura cr-tica e objetiva, o que nem sempre encontrou compreenso por parte dos pesquisados. []. Procpio reaproximou-se da Igreja nas circunstncias dramticas da resistncia a um regime repressivo ao extremo, mas sem voltar a se juntar ao rebanho, o que talvez tenha sido imperdovel para os membros dela que mais o amavam (SINGER, 1987, p. 23).
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 375
Nesse mesmo sentido, Fernando Henrique Cardoso observava que
o reencontro de Procpio com a Igreja, no mais a dos mis-trios e da transcendncia, mas a do protesto e do movi-mento social, ofereceu-lhe o momento de plenitude que todo intelectual engajado busca. No sei se o fervor com que Procpio voltou aos temas como o acesso das massas ao Direito, da religio como forma de conscincia liberta-dora do indivduo, da participao para valorizar represen-tao, apaziguou a angstia de quem parecia ter sempre uma dimenso voltada para a transcendncia e o infinito []. Mas, sei que a Igreja na qual repousava a esperana de uma ao pastoral que se confundia com a transformao radical do mundo, esta Procpio reencontrou a partir dos anos da resistncia (CARDOSO, 1987, p. 28)14.
Um outro tema presente nas preocupaes de Cndido Procpio
Ferreira de Camargo era a relao entre religio e doena, com especial
nfase nas terapias religiosas. Na Anpocs de 1986, um ano antes de sua
morte, ele apresenta um trabalho intitulado Terapias religiosas em So
Paulo. Num balano da contribuio de Cndido Procpio Ferreira de
Camargo, pode-se citar: a sua viso do pluralismo religioso que avana
sobre a hegemonia do catolicismo no campo religioso brasileiro e seu
conceito de internalizao, segundo o qual as religies deixam de ser
algo imposto externamente pela tradio e pela coero social e se tor-
nam uma opo racional e individual. Esse conceito foi fundamental para
compreender o movimento da religio num processo crescente de indivi-
dualizao e racionalizao da sociedade.
14 Convm lembrar aqui que Procpio manteve um estreito vnculo com a Igreja Catlica no perodo de sua juventude, tendo inclusive ingressado no noviciado dos dominicanos em So Paulo, aps ter se formado na Faculdade de Direito da Universidade de So Paulo em 1945 (PETRINI, 1992). Posteriormente ele perde a f e assume uma posio pessoal distanciada do catolicismo, embora, como afirma Brandt, Procpio era, no ntimo, o mais catlico dos catlicos, ou antes, por isso mesmo, buscava a verdade de cada qual, ao estudar a Umbanda, o Pentecostalismo e o Kardecismo (BRANDT, 1987, p. 37).
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS376
O reconhecimento da importncia dos dois ltimos pesquisadores,
Duglas Teixeira Monteiro e Cndido Procpio Ferreira de Camargo, ocor-
rer nas dcadas seguintes pela influncia que eles exerceram sobre a
gerao seguinte de socilogos brasileiros que vo trabalhar com o tema
da religio. Importncia essa que aparece no testemunho de Antnio Fl-
vio Pierucci sobre Cndido Procpio Ferreira de Camargo, apresentado
como mestre da sociologia da religio no Brasil (PIERUCCI, 1997, p.
117) e de Ralph Della Cava sobre Duglas Teixeira Monteiro, visto como
decano do estudo moderno da religio no Brasil (HERRERA, 2004, p.
162). Na esteira do pensamento desses dois autores podemos identificar,
em So Paulo, dois grupos de pesquisadores que vo dar continuidade s
linhas de pesquisa terica e emprica iniciadas por esses percussores nos
estudos sobre catolicismo. Assim, se podemos ver no CER e no Grupo de
Pesquisa de Sociologia da Religio na Anpocs, sob a liderana de Lsias
Nogueira, a institucionalizao do carisma de Duglas Teixeira Monteiro, o
setor de religio do Cebrap, liderado por Reginaldo Prandi e Antnio Fl-
vio Pierucci, mantm viva a memria e a herana intelectual de Cndido
Procpio Ferreira de Camargo (PIERUCCI; PRANDI, 1987)15.
O legado de Duglas Monteiro vai ainda permanecer de forma insti-
tucional atravs do Instituto de Estudos da Religio (Iser, 1970) que, tendo
se mudado para o Rio de Janeiro em 1981, vai reunir um corpo extenso
de cientistas sociais de todo o pas interessado no tema da religio. Em-
15 No texto Assim como no era no princpio: religio e ruptura, publicado em 1987 e reedi-tado em 1996, Prandi e Pierucci fazem o reconhecimento dessa herana intelectual em termos dos conceitos-chave e do aporte terico e metodolgico que orientam o seu pensamento. Embora estivesse trabalhando em diversas pesquisas sobre religio com Cndido Procpio Ferreira de Camargo, o doutorado de Reginaldo Prandi, defendido na USP, sob a orientao de Cndido Procpio, foi sobre o mercado informal de trabalho. O vis terico que Prandi imprime ao seu trabalho de carter marxista, dentro da tradio do Cebrap, sob a liderana de Fernando Henrique Cardoso, que fez o prefcio do livro que resultou de sua tese. Seu interesse pela religio vai ser retomado no final dos anos 1980, com a tese de livre-docncia que foi sobre candombl em So Paulo (PRANDI, 1991).
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 377
bora haja uma predominncia de antroplogos no instituto, a presena dos
socilogos significativa, especialmente na sua vertente marxista e engaja-
da com a Teologia da Libertao. Quanto aos estudos do catolicismo, o Iser
criou em 1982 o Grupo de Estudos de Catolicismo, coordenado por Pierre
Sanchis e em 1983 o Grupo de Assessoria do Iser, dirigido por Pedro Ribei-
ro de Oliveira16. Convm aqui observar que, enquanto o Grupo de Catoli-
cismo procurou imprimir em seus estudos um carter acadmico mais isen-
to em relao ao compromisso ideolgico e pastoral com a Igreja Catlica,
o Grupo de Assessoria se definia como a servio das organizaes de base
e do movimento popular, que eram representadas no horizonte do grupo
especialmente pelas CEBs e pelas pastorais sociais da Igreja Catlica17.
Os estudos empreendidos pelo Grupo de Catolicismo do Iser trou-
xeram uma importante inflexo em relao s pesquisas que vinham
sendo realizadas at este momento, que consistiu na tentativa reiterada
de definir uma identidade, uma estrutura ou uma cultura catli-
cas. Como bem expressaram Pedro Ribeiro de Oliveira e Flvio Lenz na
apresentao do nmero 22 de Comunicaes do Iser, sobre catolicismo,
a identidade catlica no pode ser encontrada no somatrio das suas diferentes forma particulares. Se certo que a sua busca deve necessariamente passar pela anlise cuidadosa das suas mltiplas formas, tambm certo que a identidade no uma espcie de mximo divisor comum dessas for-mas. Trata-se de saber o que torna catlico o catolicismo (OLIVEIRA; LENZ, 1986, p. 3).
16 Um dos resultados mais importantes do Grupo de Catolicismo do Iser foi a publicao, em 1992, de uma srie de trs volumes intitulados: Catolicismo: modernidade e tradio, Catolicismo: cotidiano e movimentos e Catolicismo: unidade religiosa e pluralismo cultural (SANCHIS, 1992a, 1992b, 1992c).17 importante salientar aqui que os participantes de um e de outro dos grupos se repetiam, embora fosse mais freqente a participao dos membros da Assessoria no Grupo de Catoli-cismo do que o inverso.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS378
Essa preocupao inaugurada pelo Grupo de Catolicismo do Iser
estabelece um importante debate que vai se estender pelas prximas d-
cadas, onde se destaca especialmente a contribuio de Pierre Sanchis
que, desde o seu artigo seminal Uma identidade catlica?, no mesmo
nmero de Comunicaes do Iser, vm buscando relacionar identidade e
cultura brasileira com catolicismo (SANCHIS, 1986, 1994, 2001)18.
De todo modo, alm dos pesquisadores que se posicionaram nesse
debate que procurara compreender a lgica do catolicismo e sua influn-
cia na constituio de uma cultura nacional, pode-se identificar, entre os
autores que esto escrevendo sobre a Igreja Catlica nesse perodo, um
nmero bastante expressivo de intelectuais que mantinham uma relao
de engajamento de f e compromisso com a instituio catlica, especial-
mente com os setores do clero que faziam oposio ao regime militar e que
defendiam os Direitos Humanos (GOMEZ DE SOUZA, 1978, 1982; LIMA,
1979; OLIVEIRA, 1985). Esses autores vo enfatizar particularmente as dife-
rentes linhas de atuao pastoral no interior da Igreja Catlica e os conflitos
que perpassam os diversos segmentos da hierarquia, relacionando-os com
interesses de classe e com as aspiraes presentes na sociedade como um
todo. Esses estudos, por sua vez, acabam evidenciando um deslocamento
da relao da Igreja Catlica com o Estado para a relao com a sociedade
civil, inserindo-se no campo de estudos dos movimentos sociais, no qual
a atuao dos catlicos se destaca por meio das Comunidades Eclesiais de
Base (CEBs) e das pastorais sociais. Juntamente com os telogos da liber-
tao, esses cientistas sociais partilham da idia de que a sociologia uma
mediao necessria entre a reflexo teolgica e a prtica pastoral, assim
18 Na seqncia desse debate iniciado por Sanchis, procurei compreender, a partir do artigo de Otvio Velho sobre a Besta-Fera (VELHO, 1995), a experincia dos romeiros de Bom Jesus da Lapa (BA): a cultura bblico-catlica, como uma sntese entre o pr-texto bblico e a teia de sentidos que os romeiros vo tecendo para sustent-los na difcil arte de viver (STEIL, 1996, p. 150-151).
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 379
como um instrumento indispensvel para se entender e avaliar a realidade
social e explicar as causas da pobreza na Amrica Latina19.
Pode-se falar, assim, de uma sociologia engajada com a Teologia da
Libertao que assume uma abordagem marxista com forte influncia de
Gramsci. O conceito teolgico de reino de Deus, elaborado em con-
traposio ao conceito de igreja, central para a Teologia da Libertao,
foi fundamental para uma universalizao do cristianismo como uma pro-
posta tica e poltica para a Amrica Latina. Assim, no mbito da prpria
teologia, o catolicismo libertador se transmuta numa tica secular e po-
ltica a ser incorporada no nvel das conscincias individuais, enquanto
o catolicismo tradicional, enraizado na cultura popular, representaria a
sobrevivncia de um passado a ser superado e extinto. Como afirma Mi-
chael Lowy em sua anlise do cristianismo de libertao, a Teologia da
Libertao poderia ser compreendida a partir de uma afinidade eletiva
entre tica religiosa e utopias sociais (LOWY, 2000, p. 63).
Ainda no campo da sociologia, h que se referir a contribuio dos
brasilianistas que pesquisaram o catolicismo da libertao e a experincia das
Comunidades Eclesiais de Base nesse perodo, entre os quais se poderia citar
Scott Mainwaring (MAINWARING, 1989). Afinado com a perspectiva dos
socilogos engajados da Teologia da Libertao, Mainwaring, vai interpretar
a mudana no catolicismo como um movimento que se processava de baixo
para cima e que resultaria da convergncia entre transformaes internas
Igreja Catlica, como o Conclio Vaticano II e as Conferncias do Conselho
19 importante salientar que, embora o trabalho dos autores aqui referidos revistam-se de caractersticas muito semelhantes quelas que observamos na atuao de Procpio Camargo Ferreira e dos pesquisadores do Cebrap, h uma diferena fundamental entre eles em relao ao lugar desde onde cada um deles faz sua anlise. Enquanto o grupo de So Paulo se posi-ciona desde o lugar do cientista que presta servio instituio religiosa, o do Rio de Janeiro se posiciona no interior da instituio, subordinando a tarefa do socilogo ao projeto eclesial da Igreja da Libertao.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS380
Episcopal Latino Americano Celam (Medelln e Puebla) e a emergncia dos movimentos sociais de resistncia ditadura militar. Nesse sentido, ele se afasta das abordagens anteriores sustentadas pelos brasilianistas, que enfatiza-vam a ao estratgica da Igreja Catlica por meio de sua elite clerical e laica, e vai centrar sua anlise na relao da Igreja com a sociedade civil.
Ao lado dos estudos de carter sociolgico, esse perodo conta com uma produo antropolgica sobre catolicismo que vai privilegiar o estu-do dos rituais e festas populares, enfatizando especialmente os encontros e desencontros entre as prticas do catolicismo popular tradicional e a es-trutura hierrquica da instituio. Assim, se o popular, na vertente sociol-gica enfocado em termos sociais e de classe, com nfase na experincia inovadora das CEBs (MACEDO, 1986; PETRINI, 1984), na perspectiva an-tropolgica ele abordado sobretudo em termos culturais (ALVES, 1980; BRANDO, 1980, 1981, 1985; FERNANDES, 1982; MAUS, 1995; ZALUAR, 1983). Na avaliao de Fernandes (1984), observa-se nesses estudos uma dicotomia entre religio popular e religio erudita que romanticamente qualificavam a primeira e desqualificavam a segunda.
Na tentativa de uma caracterizao das ltimas dcadas aqui apre-sentadas, poderamos dizer que, se nos anos 1960, desde a perspectiva da secularizao e da ideologia de classe, se buscou compreender a funo do catolicismo no processo da modernizao e seu lugar no contexto do plura-lismo religioso, nos anos 1970, a preocupao est colocada sobre o papel poltico que a instituio e as prticas catlicas vo desempenhar no mbito da sociedade civil frente ao autoritarismo da ditadura militar. J os anos 1980 foram marcados por uma crescente aproximao entre Igreja Catlica e movimentos sociais no Brasil, repercutindo, no campo acadmico, numa reordenao ideolgica das relaes entre o pensamento moderno e a in-telectualidade catlica. Como afirma Rubem Csar Fernandes,
o confronto dos tempos modernos, opondo liberais, radi-cais e socialistas ao pensamento dominante da Igreja Cat-lica Romana, reconsiderado por meio de um intenso tra-
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 381
balho intelectual e de inmeras atividades de ajuda mtua diante de um Estado opressor (FERNANDES, 1994, p. 47).
Uma ajuda mtua que assume diferentes conotaes e graus de in-
tensidade, dentro de uma linha contnua de maior ou menor engajamento
ideolgico em relao ao compromisso dos intelectuais com o catolicismo
de libertao. Essa diferenciao permanece na sociologia contempor-
nea no debate, por exemplo, sobre a contaminao da f dos cientistas
sociais na sua produo intelectual que foi provocado por Flvio Pierucci
(PIERUCCI, 1999) e retomado por Marcelo Camura num texto de res-
posta crtica, publicado em Religio e Sociedade (CAMURA, 2001).
Ainda no horizonte dos balanos realizados sobre o perodo, h que
se referir ao trabalho de Paula Montero que aponta para uma especiali-
zao dos estudos da religio no pas que deu origem a uma certa diviso
que se estabeleceu entre antropologia e sociologia (MONTERO, 1999).
Na avaliao da autora, coube
sociologia weberiana ocupar-se das religies protestantes, a marxista, das relaes entre Igreja catlica, Estado e so-ciedade, enquanto antropologia dedicar-se anlise dos ritos, crenas e prticas da religiosidade dita popular [] as religies afro-brasileiras [] e o catolicismo (MONTERO, 1999, p. 330).
A minha avaliao em relao ao perodo seguinte vai de certa forma
apontar para um esforo efetivo realizado pelos cientistas sociais que se
ocupam do tema da religio para a superao desse fracionamento disci-
plinar dos estudos da religio, especialmente por meio da criao de ins-
tncias e fruns de debate que vo colocar em contato socilogos e antro-
plogos no s do pas, mas tambm de outros pases da Amrica Latina20.
20 Gostaria de fazer referncia aqui Associao de Cientistas Sociais da Religio do Merco-sul, que alm das Jornadas, que renem a cada dois anos antroplogos e socilogos em fruns de intenso debate acadmico desde 2002, tambm criou e mantm a revista Ciencias Sociales y Religin/Cincias Sociais e Religio.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS382
O catolicismo em contexto de trnsitos e pluralismos: 1990-2005
Os anos 1990 e incio de 2000 marcam uma ruptura significativa com a sociologia engajada tanto em relao Teologia da Libertao quanto ao compromisso com as classes populares. A abertura poltica a reinstaurao da democracia no pas permitiram que a religio reaparecesse como um objeto de pesquisa em suas mltiplas formas e expresses, desvinculado de objetivos pastorais, de classe e ideolgicos. Nesse sentido, pode-se observar que, se importncia de que o catolicismo da libertao se revestia no pe-rodo anterior correspondeu uma concentrao de pesquisas, publicaes acadmicas e grupos de estudos em eventos na rea das cincias sociais, sua invisibilidade no contexto social e poltico da segunda metade da dca-da de 1990 e a primeira de 2000 corresponde uma significativa diminuio de interesse acadmico. Ou seja, as transformaes e o reordenamento do campo religioso desse perodo, ao mesmo tempo em que trouxeram para o centro da cena os grupos e instituies protestantes, especialmente os pentecostais e neopentecostais, tambm colocaram numa zona de sombra o que se passava no campo catlico, fazendo com que diminussem o inte-resse e os grupos de estudo sobre catolicismo.
Essa invisibilidade do catolicismo, no entanto, parece se romper pela emergncia da Renovao Carismtica Catlica (RCC) na cena p-blica e religiosa dos anos 1990, dando origem a um novo interesse pelo estudo do catolicismo. As primeiras pesquisas sobre a RCC destacavam o seu perfil ideolgico conservador dentro de uma disputa de espao po-ltico e institucional no interior do catolicismo brasileiro. So freqentes as comparaes entre a RCC e as CEBs, as quais representariam o plo oposto ao conservadorismo (OLIVEIRA et al., 1978; PRANDI, 1997). Ou-tros trabalhos, como o de Ari Pedro Oro, apontam para a concorrncia no campo religioso, assinalando o uso estratgico que a Igreja Catlica estaria fazendo desse movimento para reter os seus fiis e barrar o avano pente-
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 383
costal (ORO, 1996, p.108). Mais recentemente, especialmente na rea da antropologia, podemos registrar alguns trabalhos que, na perspectiva da an-tropologia fenomenolgica e do paradigma da corporeidade (embodiment) (CSORDAS, 1994, 1997), tm buscado relacionar a RCC com processos de construo da subjetividade e o lugar do corpo na experincia religiosa (MAUS, 2002; STEIL, 2004) ou ainda com outros movimentos emergen-tes no campo religioso catlico, como as aparies marianas (STEIL, 2001; STEIL; MARIZ; REESINK, 2003) ou mesmo de movimentos que transcen-dem as fronteiras denominacionais, como a Nova Era (STEIL, 1999).
Na rea da antropologia h uma mudana significativa a registrar nos estudos do catolicismo que se deslocam da anlise sistmica para a da pr-tica. Ao colocar o foco nas prticas dos atores, as fronteiras entre o cato-licismo popular e os demais subsistemas que compem o campo catlico se diluem e perdem seu sentido heurstico. Essa perspectiva vai aparecer, por exemplo, nos estudos que tomam as peregrinaes menos como uma forma de reproduo e resistncia do catolicismo popular e mais como uma arena ou vcuo religioso (EADE; SALLNOW, 1991) em que diferen-tes prticas, expresses e experincias podem se manifestar numa situao de negociao e de disputa de sentidos dentro do campo catlico (STEIL, 1996). Mas, desde a perspectiva da prtica, torna-se possvel perceber que os sentidos que so negociados e disputados em espaos e eventos catli-cos, na verdade, ultrapassam no somente o sistema catlico, mas o prprio campo religioso, na medida em que os sentidos e as experincias associa-dos a outras esferas da vida social so acionados pelos agentes sociais e amalgamados com os religiosos. Assim, a idia de sistema cede lugar pouco a pouco de trnsitos e fronteiras que remetem menos a uma totalidade in-tegrada e coesa e mais a uma situao definida por Jacques de Matre como de uma nebulosa de heterodoxias diversas (MATRE, 1987, p. 359)21.
21 Nessa fronteira porosa se equacionam e se mesclam elementos de diversas esferas sociais, desde a medicina e a psicologia at o turismo.
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS384
Nessa mudana de foco, muitos trabalhos e debates passam a en-fatizar as semelhanas que atravessam as religies, ao invs de demarcar as suas diferenas (VELHO, 1997). Para alm da diversidade religiosa que passa a caracterizar a sociedade brasileira colocando um fim domina-o e hegemonia catlica as anlises do campo religioso vo procurar caracterizar os modelos e configuraes comuns da experincia religiosa.
Em relao ainda a deslocamentos tericos comuns que ocuparam lugar central nos debates e na literatura sobre o catolicismo pode-se citar a perspectiva que vai destacar a idia de temporalidades diversas pr-moderna, modernidade e ps-modernidade que se articulam e se so-brepem na contemporaneidade, configurando diferentes formas e estilos de ser catlico (SANCHIS, 1997). Nesse sentido, a dicotomia tradicional e moderno passa a ser analisada dentro de uma nova chave de leitura que vai destacar a articulao entre estes plos que coexistem como tenses vividas na prtica por aqueles que se posicionam dentro do campo religioso. Essa perspectiva ter especial incidncia, por exemplo, nos estudos que buscam relacionar catolicismo e a Nova Era. O catolicismo se apresenta como lugar privilegiado para se observar a presena de diferentes formas de crer que vo dos rituais devocionais do culto aos santos e anjos s das experincias msticas segundo o modelo da Nova Era, passando pelo tipo-ideal das religi-es de converso, que se destaca nos catolicismos de libertao e carism-tico (CAMURA, 1998; STEIL, 2004). Passa-se, ento, a chamar a ateno para a pluralidade interna do catolicismo, capaz de compatibilizar prticas e rituais pr-modernos com experincias modernas de comunidades de base, com formas ps-modernas, centradas na religiosidade do self, espe-cialmente na experincia da Renovao Carismtica Catlica.
Um ltimo trao a assinalar dos estudos do catolicismo nesse per-odo se refere aos esforos empreendidos tanto por antroplogos quanto por socilogos para estabelecer pontos de comparao entre a prtica de catlicos e pentecostais a partir de recortes de gnero (MACHADO;
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 385
MARIZ, 2005; MARIZ, 2001; MARIZ; MACHADO, 2000)22. Esses estudos comparativos sobre o lugar que a mulher ocupa em diferentes contextos religiosos acabaram apontando para a necessidade de se superar uma vi-so que associa de forma imediata conscincia poltica com superao do machismo. Nesse sentido, as pesquisas empricas que privilegiaram um olhar sobre as relaes de gnero no mbito local tiveram um importante papel, assinalando os desencontros e as incongruncias entre os modelos discursos dos pentecostais e dos catlicos e as suas prticas efetivas. Enfim, esses estudos, ao enfocar a posio das mulheres na estrutura institucional das igrejas e grupos religiosos, terminam por mostrar que o exerccio da democracia e as relaes de igualdade entre os sexos nem sempre acom-
panham as ideologias e valores apregoados pelas instituies.
Concluso
guisa de concluso, gostaramos de chamar a ateno para uma
certa associao subjacente entre o pluralismo do campo religioso bra-
sileiro e o projeto moderno, de modo que a perda de hegemonia do
catolicismo e a conseqente diversificao religiosa sero tomadas por
algumas anlises sociais como critrios para se avaliar o grau de nossa
modernidade. Podemos identificar nestas anlises uma certa viso de que
a diversidade religiosa seria, parodiando Marcel Gauchet, a sada para
a modernidade. (GAUCHET, 1985; STEIL, 1994). Assim, a superao de
um habitus pr-moderno e de uma cultura tradicional, com os quais o
catolicismo era identificado em grande medida, se torna um projeto no
qual se engajam os missionrios das religies de converso, a hierarquia
catlica esclarecida ultramontana e os cientistas sociais.
22 Esses trabalhos de carter mais sociolgico de alguma forma se desenvolvem na esteira do debate inaugurado por Regina Novaes no perodo anterior na antropologia (NOVAES, 1985).
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS386
Enfim, a idia de que a converso s igrejas e grupos protestantes
produz uma ruptura com o passado em direo ao desencantamento
do mundo e modernizao tem sido constantemente colocada em
xeque por pesquisas etnogrficas em diferentes partes do globo. Essas
pesquisas, por sua vez, tm apontado com freqncia para situaes em
que as pessoas que se convertem no esto dando necessariamente um
passo em direo ao desencantamento do mundo. Ao contrrio, a expe-
rincia da converso com frequncia situa os conversos num mundo re-
pleto da presena de deuses, espritos, demnios, anjos, energias, onde
vivem como se j fossem tocados pela eternidade e tivessem entrado na
economia de uma ordem sobrenatural.
A paisagem religiosa brasileira que emerge com a diversificao do
seu campo religioso aponta menos para o desencantamento do mundo
e mais para a emergncia de novos padres e modos do religioso se
instituir tanto no espao pblico quanto na experincia dos indivduos.
Neste sentido, impe-se aos cientistas sociais a educao da sensibili-
dade e da percepo, assim como o aprimoramento do seu instrumen-
tar conceitual terico e metodolgico, para identificar para alm das
instituies religiosas muitas vezes em seu prprio mbito as novas
configuraes do religioso na sociedade.
Catholicism as an object of Social Sciences in Brazil
Abstract
This article critically revises the genesis and development of studies on Ca-tholicism in the field of Social Sciences in Brazil, using as a focal point the tension between tradition and modernity. The traditional place attributed to Catholicism in writings that would veer it towards the axis of tradition in the Twentieth Century is questioned. At the same time, the aim is to show that, using the perspective of theories of practice, Catholicism is permeable to modernity, actively adapting itself
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 387
to the new religious landscape that is being established in the country with the se-cularization process and religious differentiation. This work also aims at suggesting the limits of theoretical approaches that associate Catholicism with an Enchanted Brazil, theories that have served as a background to emphasize the values of a new modern order being established as a counterpoint to an imaginary past that must be overcome. With this theoretical critique in mind, the article presents, in chronological order, a selection of authors and writers who have marked Catholic studies in the country.
Keywords: Catholicism. Social Sciences. Modernity. Tradition. Social change and conversion.
Referncias
ALVES, Isidoro. O carnaval devoto: um estudo sobre a festa de Nazar em Belm. Petrpolis: Vozes, 1980.
ALVES, Mrcio Moreira. O Cristo do povo. Rio de Janeiro: Sabi, 1968.
ASAD, Talal. Anthropological conceptions of religion: reflections on Geertz. Man, 18(2), p. 237-259, 1983.
______. Formations of the secular: Christianity, Islam, modernity. Stanford, Calif.: Stanford University Press, 2003.
AZEVEDO, Thales de. O catolicismo no Brasil. Rio de Janeiro: Ministrio da Educao e Cultura. (Cadernos de Cultura), 1955.
BASTIDE, Roger. As religies africanas no Brasil: contribuio a uma sociologia das interpretaes de civilizaes. 3 ed. So Paulo: Pioneira, 1989.
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck Conversa com Johannes Willms. So Paulo: Unesp, 2003.
BRANDO, Carlos Rodrigues. De errantes a errados? Religio & Sociedade, n. 4, p. 17-24, 1979.
______. Os deuses do povo: um estudo sobre religio popular. So Paulo: Bra-siliense, 1980.
______. Sacerdotes de viola: rituais, religiosos do catolicismo popular em So Paulo e Minas Gerais. Petrpolis: Vozes, 1981.
______. Memria do sagrado: estudos de religio e ritual. So Paulo: Paulinas,
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS388
1985.
BRANDT, Vincius Caldeira. A verdade de cada qual. Novos Estudos Cebrap, n. 17, p. 36-37, 1987.
BRUNEAU, Thomas. Catolicismo brasileiro em poca de transio. So Paulo: Loyola, 1974.
CAMARGO, Cndido Procpio Ferreira de. So Paulo 1975: crescimento e po-breza. So Paulo: Loyola, 1976.
CAMURA, Marcelo. Marretas, Molambudos e Rabelistas: a revolta de 1914 no Juazeiro. So Paulo: Maltese, 1994.
______. Sombras na catedral: a influncia New Age na Igreja Catlica e o holismo da Teologia de Leonardo Boff e Frei Betto. Numen, v. 1, n. 1, p. 65-80, 1998.
______. Da boa e da m vontade para com a religio nos cientistas sociais da religio brasileiros. Religio & Sociedade, v. 21, n. 1, p. 67-86, 2001.
CANNELL, Fenella. The Christianity of anthropology. Journal of the Royal Anthro-pological Institute, v. 11, n. 2, p. 335-356, 2005.
CARDOSO, Fernando Henrique. Procpio um depoimento. Novos Estudos Ce-brap, n. 17, p. 26-28, 1987.
CSORDAS, Thomas J. The sacred self: a cultural phenomenology of charismatic healing. Berkeley: University of California Press, 1994.
______. Language, charisma, and creativity: the ritual life of a religious move-ment. Berkeley: University of California Press, 1997.
DELLA CAVA, Ralph. Igreja e Estado no Brasil do sculo XX: sete monografias re-centes sobre o catolicismo brasileiro 1919-64. Estudos Cebrap, n. 12, p. 5-52, 1975.
______. Milagre em Joaseiro. 2 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.
EADE, John; SALLNOW, Michael J. (eds.). Contesting the Sacred: the Antropolo-gy of christian pilgrimage. London: Routledge, 1991.
FAC, Rui. Cangaceiros e fanticos. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 1976.
FERNANDES, Rubem Csar. Os cavaleiros de Bom Jesus. So Paulo: Brasiliense, 1982.
______. Religies populares: uma viso parcial da literatura recente. Boletim In-formativo e Bibliogrfico de Cincias Sociais/BIB, n. 18, p. 3-26, 1984.
______. Privado porm pblico: o terceiro setor na Amrica Latina. 2 ed. Rio de Janeiro: Relume-Dumar, 1994.
FREYRE, Gilberto. Casa grande e senzala. 2 ed. Rio de Janeiro: Schmidt Editor,
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 389
1936.
GALVO, Eduardo. Santos e visagens: um estudo da vida religiosa de It, Baixo Amazonas. So Paulo: Editora Nacional, 1976.
GAUCHET, Marcel. Le dsenchantement du monde. Une histoire politique de la religion. Paris: Gallimard, 1985.
GIUMBELLI, Emerson. Religio e (des)ordem social: Contestado, Juazeiro e Canu-dos nos estudos sociolgicos sobre movimentos religiosos. Dados, v. 40, n. 2, 1997. Disponvel em: . Acesso em: 28 jun. 2007.
GOMEZ DE SOUZA, Luiz Alberto. Igreja e sociedade: elementos para um marco terico. Sntese, v. 13, n. 5, p. 15-29, 1978.
______. Classes populares e Igreja nos caminhos da histria. Petrpolis: Vozes, 1982.
HERRERA, Sonia Reyes. Reconstruo do processo de formao e desenvol-vimento da rea de estudos da religio nas Cincias Sociais Brasileiras. Tese, Programa de Ps-Graduao em Sociologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004.
HOLANDA, Srgio Buarque de. Razes do Brasil. 13 ed. Rio de Janeiro: Jos Olmpio Editora, 1979.
IANNI, Octavio. Sociologia da sociologia: o pensamento sociolgico brasileiro. 3 ed. So Paulo: tica, 1989.
KADT, Emanuel de. Catholic radicals in Brazil. London: Oxford University Press, 1970.
LEACH, Edmund Ronald. Repensando a antropologia. So Paulo: Perspectiva. (Coleo Debates 88), 1974.
LIMA, Luiz Gonzaga de Souza. Evoluo poltica dos catlicos e da Igreja no Brasil. Petrpolis: Vozes, 1979.
LOWY, Michael. A guerra dos deuses: religio e poltica na Amrica Latina. Pe-trpolis: Vozes, 2000.
MACEDO, Carmem Cinira. Tempo de gnesis: o povo das Comunidades Eclesiais de Base. So Paulo: Brasiliense, 1986.
MACHADO, Maria das Dores; MARIZ, Ceclia. Representaes e relaes de g-nero nos grupos pentecostais. Estudos Feministas, v. 13, n. 2, p. 387-396, 2005.
MAINWARING, Scott. Igreja Catlica e poltica no Brasil, 1916-1985. So Pau-
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS390
lo: Brasiliense, 1989.
MATRE, Jacques. Regulations idologiques officilles et nbuleuses dhterodoxies. A propos des rapports entre religion et sant. Social Compass, v. 34, n. 4, p. 353-364, 1987.
MARIZ, Ceclia Loreto. Pentecostalismo e Renovao Catlica e Comunidade de Base: uma anlise comparada. Cadernos Ceris, v. 1, n. 2, p. 11-28, 2001.
MARIZ, Ceclia; MACHADO, Maria das Dores Campos. Progressistas e Catlicas Carismticas: uma anlise do discurso das mulheres de Comunidade de Base na atualidade brasileira. Estudos de Poltica e Teoria Social, v. 3, n. 2, p. 8-29, 2000.
MAUS, Raymundo Heraldo. Padres, pajs, santos e festas: catolicismo popular e controle eclesistico. Um estudo antropolgico numa rea do interior da Ama-znia. Belm: Cejup. 1995.
______. Mudando de vida: a converso ao pentecostalismo catlico. Religio & Sociedade, v. 22, n. 2, p. 37-64, 2002.
MONTEIRO, Duglas Teixeira. Os errantes do novo sculo: um estudo sobre o surto milenarista do Contestado. So Paulo: Duas Cidades, 1974.
______. A cura por correspondncia. Religio & Sociedade, v.1, n. 1, p. 61-80, 1977.
MONTERO, Paula. Religies e dilemas da sociedade brasileira. In: MICELI, S. (org.), O que ler na Cincia Social brasileira (1970-1995). So Paulo: Sumar/Anpocs; Braslia: Capes. v. 1. p. 327-367, 1999.
NOVAES, Regina Reyes. Os escolhidos de Deus. Pentecostais, trabalhadores e cidadania. So Paulo: Marco Zero, 1985.
OLIVEIRA, Pedro Ribeiro de. Religio e dominao de classe: gnese, estrutura e funo do catolicismo romanizado no Brasil. Petrpolis: Vozes, 1985.
OLIVEIRA, Pedro Ribeiro de; LENZ, Flvio. Apresentao. Comunicaes do Iser, v. 5, n. 22, p. 3-4, 1986.
OLIVEIRA, Pedro Ribeiro de, et al. Renovao Carismtica Catlica: uma anlise sociolgica, interpretaes teolgicas. Petrpolis: Vozes, 1978.
ORO, Ari Pedro. Avano pentescostal e reao catlica. Petrpolis: Vozes, 1996.
PETRINI, Giancarlo. CEBs: um novo sujeito popular. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
______. Religio e modernidade atravs da obra de Cndido Procpio Ferrei-ra de Camargo. Tese, Programa de Ps-Graduao em Cincias Sociais, Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo, So Paulo, 1992.
PIERUCCI, Antnio Flvio. Reencantamento e dessecularizao: a propsito do
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 391
auto-engano em Sociologia da Religio. Novos Estudos Cebrap, n. 49, p. 99-117, 1997.
______. Sociologia da religio rea impuramente acadmica. In: MICELI, S. (org.), O que ler na Cincia Social brasileira (1970-1995). So Paulo: Sumar/Anpocs; Braslia: Capes. v. 2. p. 237-368, 1999.
PIERUCCI, Antnio Flvio; PRANDI, Reginaldo. Assim como no era no princpio: religio e ruptura na obra de Procpio Camargo. Novos Estudos Cebrap, n. 17, p. 29-35, 1987.
PRADO JUNIOR, Caio. Evoluo poltica do Brasil e outros estudos. 9 ed. So Paulo: Brasiliense, 1975.
PRANDI, Reginaldo. Os candombls de So Paulo. So Paulo: Hucitec/Edusp, 1991.
______. Um sopro do Esprito. So Paulo: Edusp, 1997.
QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. O messianismo no Brasil e no mundo. So-Paulo: Dominus Editora, 1965.
______. Identidade nacional, religio, expresses culturais: a criao religiosa no Brasil. In: VIOLA, S. (org.), Brasil & EUA: religio e identidade nacional. Rio de Janeiro: Graal, 1988.
______. Desenvolvimento das Cincias Sociais na Amrica Latina e contribuio europia: o caso brasileiro. Cincia e Cultura, v. 41, n. 4, p. 378-388, 1989.
RAMOS, Arthur. O negro brasileiro. So Paulo: Editora Nacional, 1940.
SANCHIS, Pierre. Uma identidade catlica? Comunicaes do Iser, v. 5, n. 22, p. 5-16, 1986.
______. Catolicismo: cotidiano e movimentos. So Paulo: Loyola. (Coleo Cato-licismo no Brasil Atual), 1992a.
______. Catolicismo: modernidade e tradio. So Paulo: Loyola. (Coleo Cato-licismo no Brasil Atual), 1992b.
______. Catolicismo: unidade religiosa e pluralismo cultural. So Paulo: Loyola. (Coleo Catolicismo no Brasil Atual), 1992c.
______. O repto pentecostal cultura catlico-brasileira. Revista de Antropolo-gia da USP, n. 37, p. 145-181, 1994.
______. O campo religioso contemporneo no Brasil. In: ORO, Ari Pedro; STEIL, Carlos Alberto (orgs.), Globalizao e religio. Petrpolis: Vozes, p. 103-115, 1997.
______. Religies, religio Alguns problemas do sincretismo no campo religioso
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS392
brasileiro. In: SANCHIS, P. (org.), Fiis & Cidados. Percursos de sincretismo no Brasil. Rio de Janeiro: Eduerj, p. 9-58, 2001.
______. (org.). Fiis & Cidados. Percursos de sincretismo no Brasil. Rio de Janei-ro: Eduerj, 2002.
SILVA, Wagner Gonalves da. O terreiro e a cidade nas etnografias afro-brasileiras. Revista de Antropologia, n. 36, p. 33-79, 1993.
SINGER, Paul. Cndido Procpio, o gentil combatente. Novos Estudos Cebrap, n. 17, p. 21-25, 1987.
SINGER, Paul; BRANDT, Vincius Caldeira. So Paulo: o povo em movimento. Petrpolis: Vozes, 1981.
SODR, Nelson Werneck. Histria da burguesia brasileira. Rio de Janeiro: Civi-lizao Brasileira, 1976.
STEIL, Carlos Alberto. Para ler Gauchet. Religio & Sociedade, v. 16, n. 3, p. 24-49, 1994.
______. O Serto das Romarias: um estudo antropolgico sobre o santurio de Bom Jesus da Lapa Bahia. Petrpolis: Vozes. (Religio e Pesquisa 1), 1996.
______. A igreja dos pobres: da secularizao mstica. Religio & Sociedade, v. 19, n. 2, p. 61-76, 1999.
______. Aparies marianas contemporneas e carismatismo catlico. In: SAN-CHIS, P. (org.), Fiis & Cidados. Percursos de sincretismo no Brasil. Rio de Janei-ro: Eduerj, p. 117-146, 2001.
______. Renovao Carismtica Catlica: porta de entrada ou de sada do cato-licismo? Uma etnografia do Grupo So Jos, Porto Alegre (RS). Religio & Socie-dade, v. 24, n. 1, p. 11-36, 2004.
STEIL, Carlos Alberto; MARIZ, Ceclia Loreto; REESINK, Msia Lins. Maria entre os vivos. Reflexes tericas e etnografias sobre aparies marianas no Brasil. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2003.
VELHO, Otavio. O cativeiro da Besta-Fera. In: VELHO, O. (org.), Besta-Fera: re-criao do mundo. Rio de Janeiro: Relume Dumar, p. 13-44, 1995.
______. Globalizao: antropologia e religio. In: ORO, Ari Pedro; STEIL, Carlos Alberto (orgs.), Globalizao e religio. Petrpolis: Vozes, p. 25-42, 1997.
WILLEMS, Emlio. Uma vila brasileira: tradio e transio. So Paulo: Difuso Europia do Livro, 1961.
______. Followers of the new faith, culture change and the rise of protestan-
-
Sociologias, Porto Alegre, ano 12, no 23, jan./abr. 2010, p. 354-393
SOCIOLOGIAS 393
tism in Brazil and Chile. Barcelona: Herder, 1967.
ZALUAR, Alba. Os homens de Deus: um estudo dos santos e das festas do cato-licismo popular. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.
Recebido: 05/06/2009
Aceite final: 20/06/2009