CICLO DE ENCONTROS:SAÚDE MENTAL E
DEFENSORIA PÚBLICA
INTERDIÇÃO: ASPECTOS JURÍDICOS, PSICOLÓGICOS E
SOCIAIS.06/09/2013
InterdiçãoMédico peritoA interdição vem do Direito romano antigo, e era um processodiscriminatório do ponto de vista social e político, isso porque,
na Roma antiga, somente tinha plena capacidade o pater família, ou seja, o cidadão nascido em Roma, de sexo masculino e que dirigia uma família.
Estavam excluídos da capacidade os estrangeiros, as mulheres, os prisioneiros de guerra, as crianças e os doentes, isto é, todos aqueles que não representavam o cidadão de Roma. Portanto, o início da história da incapacidade está intimamente ligado a um processo discriminatório
Código Civil1916 (Lei 3.071 de 01/01)
Art. 5º - São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:
I – os menores de 16 anos;II – Os loucos de todo o gênero;Os surdos-mudos, que não puderem exprimir a
sua vontade;IV – os ausentes, declarados tais por atos do
juiz.
Código Civil2003 (Lei 10.406/2002)
Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:
I – os menores de 16 anos;II – os que, por enfermidade ou deficiência
mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;
III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.
Foucault, saber/ relações de poder“A verdade e as formas Jurídicas”. O “exame”
como prova;
História em que as ciências – medicina e psicologia em particular – procuraram explica a loucura e explicando-a, silenciaram-na/ segregaram-na/ estigmatizaram-na/ violentaram-na;
Foucault e as relações de poderdiagnóstico médico. Seu alicerce filosófico é a
"posse" da razão como fundamento do direito e a consciência como a capacidade de entendimento e determinação para os deveres e direitos do homem. Este alicerce encontra-se abalado há muito na história do pensamento moderno. São pelo menos três os grandes nomes que obrigaram a remodelar este discurso iluminista: Marx, Freud e Nietszche. Mas a lei brasileira ainda pensa como os iluministas, pelo menos com relação à loucura...
Sobre a miséria da Psicologia“Formações de psicólogos e relações de
poder”(M. H. S. Patto, 2012 – org)
Laudos e perícias;Formação;Crítica.
Efeitos da InterdiçãoComo o indivíduo é (ou está) desarrazoado não se questiona os
efeitos que a interdição possa ter para o próprio interditado.
A relação entre o interditando e o futuro curador tem de ser avaliada tanto quanto a verdadeira necessidade de uma interdição.
Internações
E como fica este sujeito nomeado louco (ou doente) pela família em função de uma determinada história? Geralmente perde suas próprias referências e torna-se totalmente dependente e submisso ao curador. Paradoxalmente, o judiciário aceita pedidos de desinterdição feitos pelos próprios interditados. Talvez mea culpa.Entretanto, são muito raros estes pedidos e mais rara ainda a desinterdição.
Banalização da Interdição JudicialRelatórios, 2007, Brasília.Audiência Pública e Seminário Nacionalrealizados pela Comissão de Direitos Humanos
eMinorias em parceria com o Conselho Federal
dePsicologia, no ano de 2005, com o objetivo dedebater sobre o tratamento que a sociedade e ogoverno dispensam aos portadores de
sofrimentomental no Brasil.
Banalização da Interdição Judiciala partir da provocação do Conselho Federal dePsicologia, que nos trouxe a preocupação com a
relevância do tema e sua própria surpresa com o alto número de pessoas interditadas por familiares, e o quanto isso está criando uma anormalidade em um processo que deve ser tratado como uma exceção, e, como essa exceção,
pela ampliação de sua aplicação, está tornando-se uma regra e, com
isso, privando homens e mulheres de seus direitos básicos
Banalização da Interdição Judicial- condição de cidadania restrita, pois ela atinge suacondição pessoal de gestão de sua própria vida,
impedindo a conquista de direitos e reduzindo sua dignidade social.
Lutar contra o estigma que, na maioria das vezes, também
resulta da interdição, certamente evitará o isolamento ou mesmo a exclusão cada vez maior do indivíduo, conferindo-lhe a dignidade inerente à sua vida humana.
Banalização da Interdição Judicialgrande contradição entre o objetivo de todo o
trabalho da reforma psiquiátrica, que é a ressocialização das pessoas, a reinserção social, e a condição frequente de que pessoas, de modo geral bastante pobres, passaram a ser interditadas judicialmente, sobretudo a partir do recebimento do benefício previsto na Lei Orgânica da Assistência Social.
Banalização da Interdição Judicialgenocídio político de um determinado
grupo de brasileiros, aqueles que, sendo muito pobres e portadores de transtorno mental, fazem um percurso que tem, na interdição judicial, a condição para que recebam o benefício de prestação continuada previsto na LOAS prática de lesar a cidadania.
Banalização da Interdição JudicialO abuso em interdições está na contramão do
movimento dareforma psiquiátrica, que busca a reinserção
do doente mental na sociedade.A interdição retira a cidadania dessas
pessoas.
Banalização da Interdição Judicialdo laudo psiquiátrico, muitas vezes, cede
diante da insuficiência social que o candidato apresenta e faz um julgamento antecipado do direito ao benefício, e concede, pelo laudo, a avaliação de que o sujeito é incapaz para os atos da vida civil, e não apenas para os atos da vida laboral.
Banalização da Interdição Judicialperícias psiquiátricas, muito mais facilidade
de se obter um laudo que confirme que o sujeito é incapaz para a vida civil do que incapaz para a vida laboral
Essas interdições nem sempre são revistas, e seus curadores
nem sempre são acompanhados e avaliados
CFP: “Interdição Judicial: isso não é necessário” (2007)“BPC: Não abra mão da sua cidadania”;
“medida extrema só recomendada quando o beneficiário não tem a menor condição de exercer qualquer dos seus direitos civis”; “situação de extrema incapacidade”
Banalização das interdições judiciais no Brasil;
Raro emprego da interdição parcial;
CFP: “Interdição Judicial: isso não é necessário” (2007)Benefício (incapacidade para o trabalho) X
InterdiçãoTrabalhador x cidadão de direitos
Memorando-circular nº9 (INSS) de 23/02/2006
- IV – A interdição, seja total ou parcial, nunca deve ser exigida pelo INSS...
Na DPESP/ CAMFamiliares com pedido de interdição ou
outras queixas que acabam sendo entendidas como esta demanda;
Pessoas interditadas com diversas demandas, inclusive contra o curador;
Pessoas interditadas e sem contato com seu curador.
JUSTIÇA/ DIREITOS: Judicial X Extrajudicial
Estudo de CasoSra K (74 anos)InícioAtendimentos, contatos com rede, Visita
Domiciliar, Relatórios técnicos, JVD, análise de documentos, autos processo
Libano, histórico de violências;Cuidados com filho com trans. mental;Cotidiano; Renda e organização;Testes e Avaliações (cognitivos, de
inteligência, língua)
Estudo de Caso In casu, pelo exame do laudo pericial médico (v. fls. 284/288), depreende-se que
a interditanda é portadora de doença mental ("transtorno delirante") e se encontra, de forma permanente, sem condições de discernimento e de capacidade para gerir sua pessoa e administrar os seus bens. No mesmo sentido, confira-se o teor do parecer psicológico acostado às fls. 289/291, do qual se extrai que há "comprometimento da capacidade de gerir os atos da vida civil" (v. fls. 291). Exsurge, pois, a necessidade de ser representada legalmente, com o reconhecimento de sua condição de inapta para reger-se e administrar seus bens, conforme restou bem delineado pela prova técnica. Tratando-se de absolutamente incapaz, afigura-se imprescindível uma curadoria ampla (v. artigo 1.772 do Código Civil). Diferentemente do que alega a interditanda às fls. 325/327, não há necessidade nem de outro interrogatório tampouco de uma nova prova pericial. Não se podem desqualificar as conclusões a que chegaram os peritos simplesmente pelo fato de "a requerida ser estrangeira e apresentar uma leve dificuldade de comunicação em português" (v. fls. 326), até porque essa alegação parece não corresponder à realidade. Não se cuida, ademais, de perícia realizada "no bojo de processo criminal" (v. fls. 326), mas de exames técnicos realizados exclusivamente nos presentes autos
Tentando construir novas práticasNa DPESP: Deliberações e direcionamentos
para atendimento a pessoa com transtorno mental (interdisciplinar e intersetorial) – ESCUTA/ ACOLHIMENTO
Recentes discussões, posicionamentos e direcionamento da Assessoria - premissas de atuação institucional
DPESPNos locais onde a DPE faz o atendimento
inicial especializado (triagem), evitar a indicação de advogados dativos (do convênio com a OAB) para a judicialização imediata da demanda.
desconstruir a (des)informação feita pela grande mídia sobre esse tema
viabilizar à entidade familiar o atendimento interdisciplinar e melhor interlocução com a rede
Não cabe à Defensoria se antecipar e pedir a interdição dos cidadãos e pacientes.
Tentando construir novas práticas- Escutar é tarefa que se impõe atualmente para que
novas formas de intervenção possam ser construídas e propostas. Escuta deve ser CRITICA, caso contrário, corre-se o risco de cair na psicologização de todo ato considerado socialmente desviante;
Estar aberto a Multicausalidade do ato humano
INTERSETORIAL
INTERDISCIPLINAR
Hino de Duran - Chico BuarqueSe tu falas muitas palavras sutisSe gostas de senhas sussurros
ardísA lei tem ouvidos pra te delatarNas pedras do teu próprio lar
Se trazes no bolso a contravençãoMuambas, baganas e nem um
tostãoA lei te vigia, bandido infelizCom seus olhos de raios X
Se pensas que pensas estás redondamente enganado...
E se definitivamente a sociedade
só te tem desprezo e horrorE mesmo nas galeras és nocivo,és um estorvo, és um tumorA lei fecha o livro, te pregam na cruzdepois chamam os urubus
Se pensas que burlas as normas penais
Insuflas agitas e gritas demaisA lei logo vai te abraçar infrator
com seus braços de estivador
Sobre a Liberdade...O desenvolvimento tem que estar relacionado
sobretudo com a melhora da vida que levamos e das liberdades que desfrutamos. Expandir as liberdades que temos razão para valorizar não só torna nossa vida mais rica e mais desimpedida, mas também permite que sejamos seres sociais mais completos, pondo em prática nossas volições. (AMARTYA SEN, 2010, p. 29).
Paula Cavalcante
Psicóloga/ Agente de Defensoria
CAM – Centro de Atendimento Multidisciplinar
Regional Central/ Capital
Contatos:
[email protected](11) 3105-5799, ramal 255(11) 3104-1830
Site da DPESP: www.defensoria.sp.gov.br