Sónia Alexandra da Costa Enes Lima
Concepção, implementação e avaliação do Projecto Curricular
de Turma no 1º Ciclo do Ensino Básico:
dilemas e constrangimentos
Estudo Exploratório
Dissertação apresentada ao Instituto de Educação e Psicologia da
Universidade do Minho como requisito para a obtenção do grau de Mestre
em Educação, especialidade de Desenvolvimento Curricular, sob a
orientação do Doutor José Carlos Morgado
Universidade do Minho
Instituto de Educação e Psicologia
Braga, Outubro de 2006
Agradecimentos
A realização da presente investigação só foi possível graças ao valioso contributo
de várias pessoas, às quais não podemos deixar de expressar o nosso profundo
agradecimento.
Ao meu orientador, Doutor José Carlos Morgado, pelo apoio e dedicação que
manifestou ao longo da concretização deste trabalho, pelo apoio e incentivo que, em
muitos momentos, me encorajaram e tornaram possível a conclusão desta dissertação.
Aos professores do concelho de Barcelos que amavelmente colaboraram no
preenchimento do questionário e na realização das entrevistas.
Aos colegas e professores do curso de mestrado pelas experiências que partilhamos
e pelos conhecimentos e vivências que me permitiram adquirir.
Ao Tiago e ao Paulo, a quem dedico este trabalho.
Resumo
Este projecto de investigação centra-se numa análise sobre a forma como os
projectos curriculares de turma, no 1º Ciclo do Ensino Básico, têm estado a ser concebidos,
concretizados e avaliados, bem como alguns dos principais constrangimentos com que os
professores se têm deparado em todo esse processo.
Trata-se de um trabalho de índole exploratória que teve como população do estudo
os professores que, no ano lectivo 2005/2006, leccionaram em escolas do 1º ciclo do
Ensino Básico do concelho de Barcelos. Neste sentido, foi calculada uma amostra
representativa da população em causa, num total de 195 professores para a aplicação de um
questionário, tendo ainda sido seleccionada uma amostra de oito professores a desempenhar
cargos de direcção em agrupamentos do mesmo concelho, para a realização de entrevistas.
Com a utilização destes instrumentos de recolha de dados procurámos por um lado,
verificar que implicações têm, na acção dos professores do Ensino Básico (a
obrigatoriedade d)a concepção, implementação e avaliação de projectos curriculares de
turma e, por outro, identificar constrangimentos evidenciados em todo esse processo
A partir das diferentes posições assumidas pelos professores inquiridos, foi-nos
possível constatar que o processo inerente às diferentes fases do desenvolvimento de
projectos curriculares de turma é encarado de diversas formas. Em relação às implicações
que o projecto curricular de turma tem na sua acção, na sala de aula, há professores que
consideram que realmente se registaram alterações positivas a este nível, enquanto outros,
afirmam que apenas levam a cabo esta tarefa como resultado de uma imposição legal.
Pudemos, também, verificar que, dos vários constrangimentos referidos, as questões
relacionadas com a especificidade da constituição das turmas no 1º ciclo do Ensino Básico,
as condições de trabalho dos professores neste nível de ensino (monodocência) e com a
formação que têm recebido, ou falta dela, lideram a lista de dificuldades apresentada.
Abstract
This study is based on an analysis of the way class curricular projects, in primary
shcools, are being built, developed and evaluated, as same of the main restrictions that
teachers have been facing with all that process.
This is an exploratory work that had as it´s study population the teachers, that in the
school year of 2005/2006, worked in primary schools of Barcelos’ district.. A
representative sample of the population in question was calculated and a total of 195
teachers answered the questionnaire, it was still selected a sample of 8 teachers that were in
management jobs in schools of the same district, to conduct the interviews.
By using this instruments to collect the data we intended to verify what implications
the (oblige) of building, developing and evaluating class curricular projects have in the
primary teachers’ actions and, on the other hand, identify restrictions shown in all this
process.
From the different standings assumed by the teachers, it was possible to verify that
the process concerning the different stages of class curricular projects development is faced
in several ways. As regards to the restrictions that class curricular projects have in their
action, in the classroom, some teachers consider that there have been real and positive
changes at this level, although others, state thar only do this assignement as result of a legal
obrigation.
We could also verify that, of all the restrictions mencioned by the teachers, the ones
related to the primary classes specific constitution, to the working conditions of teachers in
this level of education (monodocência), and to the formation that have received, or the lack
of it, lead the list of difficulties presented.
ÍNDICE GERAL
Índice de Quadros …..….…………………………………………………………………VII
Índice de Gráficos …..……………………………………………………………………VIII
Índice de Tabelas ….………………………………………………………………………IX
Índice de Anexos ….……………………………………………………………………… IX
Introdução ………….………………………………………………..…………………… 10
Capítulo I – O problema ………………….……..………………………………………. 15
1. Problemática da investigação ………………………..…………………………. 16
2. Objectivos do estudo ………………………..……………..……………………. 18
3. Justificação do estudo ………………………..…………………………………. 18
4. Limitações do estudo ………………………..…………………………….……. 24
Capítulo II – A Centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de
ensino-aprendizagem ………………………..…………………..……………….………. 26
1. Conceito de currículo ………………………..……………………….…………. 27
2. Desenvolvimento curricular ………………………..………………..…………. 32
2.1. Contextos / Níveis de decisão curricular ………………………...……...……. 34
2.2. Modelos de desenvolvimento curricular …………………….….………...…. 36
2.3. Programação e planificação do processo de ensino-aprendizagem …………. 37
2.4. A avaliação no contexto da reorganização curricular ………...…….………. 43
3. Autonomia curricular do professor ………………………..……………….…. 48
Capítulo III – A importância da construção de projectos curriculares ………..….…. 52
1. Conceito de projecto ………………………..…………………….….…………. 53
2. Projectos de escola ………………………..…...………………….……….……. 56
2.1. Projecto educativo ………………………..……………………….…………. 57
2.2. Projecto curricular de escola/agrupamento ………………………..…...……. 60
2.3. Projecto curricular de turma ………………………..…………………..……. 62
Capítulo IV – O papel do professor na construção de projectos curriculares .…….... 64
1. A especificidade do 1º Ciclo do Ensino Básico ……………………..…...…….. 65
2. Culturas de escola ………………………………………………….....…...……. 71
3. O papel do Professor ………………………..…...…………………………...…. 78
4. Formação contínua e desenvolvimento profissional de professores …..…..…. 84
Capítulo V – Metodologia da investigação ……………………..…...……….……..…. 92
1. Caracterização do estudo ….……………………………..…...………...…...…. 93
1.1. A metodologia quantitativa ……………………..…...…………….……...…. 94
1.2. A metodologia qualitativa ……………………..…...……………...……...…. 96
2. Técnicas e instrumentos de recolha de dados ……………………..….…..…... 98
2.1. Inquérito por questionário ……………………..……………...…….…..…... 99
2.21. Estrutura do questionário ………………..…………………….….….. 100
2.2. Inquérito por entrevista ……………………..…………………………...….. 104
2.2.1. Estrutura da entrevista ……………..………..…………………....….. 106
2.3. Análise documental ……………………..…………………………..…..….. 107
2.4. Validação dos instrumentos de recolha de dados …………………….….…...
108
3. População e amostra ………………..………………………….………..….….. 110
3.1. Inquérito por questionário ………………..……………………….….….….. 110
3.2. Inquérito por entrevista ………………..……………………………..….….. 112
3.3. Procedimentos ………………..………………………….……….…..….….. 113
3.4. Caracterização da Amostra ………………..………………….……….…..... 114
3.4.1. Inquérito por questionário ………………..……….…………………. 114
3.4.2. Inquérito por entrevista ………………..……………………..…...….. 119
4. Técnicas de análise de dados ………………..………………………….………. 120
4.1. Análise estatística ………………..………………………………….………. 120
4.2. Análise de conteúdo ………………..………………………………………. 123
Capítulo VI – Apresentação e discussão dos Resultados …………………….………. 125
1. Inquéritos por Questionário ………………..………………………………….. 126
1.1. Projecto Curricular ………………..………………………………….……. 126
1.2. Desenvolvimento do Projecto Curricular de Turma ………………….……. 132
1.3. Constrangimentos e vantagens da utilização do Projecto Curricular de Turma ...
……………………………………………………………………………. 144
2. Inquéritos por Entrevista ………………..…………………………….………. 157
2.1. Projecto Curricular ………………..………………………………….……. 158
2.2. Desenvolvimento do Projecto Curricular de Turma ……...………..………. 162
2.3. Constrangimentos do Projecto Curricular de Turma …………..…..………. 172
Conclusão ………………..………………………………….………………………...…. 177
Bibliografia ………………..…………………………………………………….………. 182
Anexos (em CD Rom) ………………..……………………….……………….………. 194
ÍNDICE DE QUADROS
Quadro 1 - Itens do questionário – Dimensão 1 …………………………………………. 101
Quadro 2 - Itens do questionário – Dimensão 1 …………………………………………. 101
Quadro 3 - Itens do questionário – Dimensão 2 …………………………………………. 102
Quadro 4 - Itens do questionário – Dimensão 2 …………………………………………. 102
Quadro 5 - Itens do questionário – Dimensão 3 …………………………………………. 103
Quadro 6 - Matriz de análise de conteúdo das entrevistas ……………………...……….. 107
Quadro 7 – Alphas obtidos de acordo com as dimensões do questionário …………..….. 110
Quadro 8 – N.º de professores do 1º ciclo do Ensino Básico por Agrupamento – Concelho de
Barcelos – Ano lectivo 2005/2006 ………………….……………...……….. 111
Quadro 9 - N.º de professores entrevistados e os cargos que desempenham ……...…….. 112
Quadro 10 – Dados relativos ao(s) ano(s) de escolaridade leccionados …….……………...
118
Quadro 11 – Caracterização da amostra da entrevista …………………………………… 119
Quadro 12 – Dimensões estruturantes do questionário ……………………………..…… 126
Quadro 13 – Valores do desvio-padrão relativos à dimensão 1 …………………………. 129
Quadro 14 – Matriz de correlação relativa à dimensão 1 ……………...………………… 130
Quadro 15 – Valores do desvio-padrão relativos à dimensão 2 …………………………. 137
Quadro 16 - Matriz de correlação relativa à dimensão 2 ……………...……………….… 138
Quadro 17 – Dados resultantes da análise de conteúdo do item 12 ..………………….… 141
Quadro 18 - Valores do desvio-padrão relativos à dimensão 3 ………………………….. 149
Quadro 19 - Matriz de correlação relativa à dimensão 3 ……………...……………….… 150
Quadro 20 – Dados resultantes da análise de conteúdo do item 26 ..………………….… 152
Quadro 21 – Dados resultantes da análise de conteúdo do item 27 ..………………….… 154
Quadro 22 – Dimensões estruturantes da entrevista ……………………………………... 158
ÍNDICE DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Dados relativos ao Sexo ……..……………………………………………… 114
Gráfico 2 – Dados relativos à Idade ……..……………………………………………… 115
Gráfico 3 – Dados relativos ao Tempo de serviço …………………….………………… 115
Gráfico 4 – Dados relativos às Habilitações académicas …………………..…………… 116
Gráfico 5 – Dados relativos à Situação profissional ………………….………………… 117
Gráfico 6 – Projecto Curricular …………….…………………………………………… 127
Gráfico 7 – Projecto Curricular (média das respostas) ……………..…………………… 129
Gráfico 8 – Desenvolvimento do projecto curricular de turma ………….……………… 132
Gráfico 9 – Desenvolvimento do projecto curricular de turma ………….……………… 134
Gráfico 10 – Desenvolvimento do projecto curricular de turma (média das respostas) … 136
Gráfico 11 – Constrangimentos decorrentes da elaboração do projecto curricular de turma
……………………………………………………………………………………………. 144
Gráfico 12 – Possíveis vantagens resultantes da concepção e implementação do projecto
curricular de turma ……………………………………………………………………….. 146
Gráfico 13 – Constrangimentos e vantagens da utilização do projecto curricular de turma
(média das respostas) …………………………………………………………………….. 148
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 1 – Tabela de frequência relativa ao item 1 do questionário …………………….. 131
Tabela 2 – Tabela de frequência relativa ao item 2 do questionário …………………….. 131
Tabela 3 – Tabela de frequência relativa ao item 11 do questionário ………..………….. 140
Tabela 4 – Tabela de frequência relativa ao item 12 do questionário ………………..….. 141
ÍNDICE DE ANEXOS
Anexo 1 – Guião do questionário
Anexo 2 – Questionário
Anexo 3 – Guião da entrevista
Anexo 4 – Guião da entrevista entregue aos entrevistados
Anexo 5 – Requerimento ao Director Regional de Educação do Norte
Anexo 6 – Resposta ao Requerimento enviado ao Director Regional de Educação do Norte
Anexo 7 – Análise de conteúdo da questão 12 do questionário (Matriz inicial)
Anexo 8 - Análise de conteúdo da questão 26 do questionário (Matriz inicial)
Anexo 9 - Análise de conteúdo da questão 27 do questionário (Matriz inicial)
Anexo 10 - Análise de conteúdo das entrevistas: Dimensão 1
Anexo 11 - Análise de conteúdo das entrevistas: Dimensão 2
Anexo 12 - Análise de conteúdo das entrevistas: Dimensão 3
Anexo 13 – Transcrição da Entrevista 1
Anexo 14 – Transcrição da Entrevista 2
Anexo 15 – Transcrição da Entrevista 3
Anexo 16 – Transcrição da Entrevista 4
Anexo 17 – Transcrição da Entrevista 5
Anexo 18 – Transcrição da Entrevista 6
Anexo 19 – Transcrição da Entrevista 7
Anexo 20 – Transcrição da Entrevista 8
INTRODUÇÃO
Introdução
11
Numa altura em que somos confrontados com constantes mudanças sociais,
políticas e económicas, a educação apresenta-se como um meio fundamental para que a
sociedade se continue a desenvolver de forma equilibrada e sustentada. Contudo, para
encararmos a educação como prioridade, afirmam Vasconcelos e Brito (2006: 84),“é
preciso que todo o país a assuma como tal não só no discurso” e passe a olhar para a
escola como o espaço que permite concretizar essas intenções.
Embora a educação possa ser encarada como “um espaço de conflitos e de
compromissos” (Apple, 1998: 34), portanto propício à concretização de determinados
interesses, tal facto não deve ofuscar a necessidade de “encontrar meios e critérios para
assegurar a adaptação do trabalho das escolas num mundo de rápidas mudanças”
(Machado e Gonçalves, 1991: 30), bem como a implementação de uma estratégia de
desenvolvimento do currículo que acompanhe as transformações que atravessam o
mundo de hoje e que nos levam a repensar os conceitos de educação e educar.
Com efeito, perante a abundância de conhecimento e informação que é posta ao
alcance dos seus alunos, a escola vê-se confrontada com a necessidade de abandonar o
papel de instância transmissora que lhe coube durante muito tempo, vendo-se obrigada
a seleccioná-la e filtrá-la para procurar ir de encontro à resolução de problemas
concretos.
Nesta ordem de ideias, não podemos dissociar as incumbências com que a escola
se depara do papel do professor, peça-chave de qualquer intenção de mudança,
cabendo-lhe, em última instância, a tarefa de concretizar, junto dos alunos, aquilo que é
idealizado ao nível das estruturas da administração central e intermédia. Na verdade, ao
professor cabe o papel de ajudar a formar cidadãos autónomos e responsáveis, capazes
de triunfar numa sociedade em permanente transformação.
De facto, são grandes os desafios que se colocam hoje a qualquer professor,
nomeadamente “assumir que lhe compete gerir, inovadoramente, o curriculum,
considerado não como um conjunto de disciplinas, mas como um todo coerente”
(Freitas, 1998: 29). Todavia, nem sempre lhe são proporcionadas situações favoráveis
para o desenvolvimento do seu trabalho. Factores como a instabilidade profissional, as
deficientes condições de trabalho e a excessiva exigência são, entre muitos outros,
aspectos que podem gerar algum mal-estar entre os professores.
Introdução
12
Aliás, fruto das mudanças que se têm operado recentemente no sistema de ensino
português, nomeadamente através do processo de Reorganização Curricular do Ensino
Básico, o professor vê-se confrontado com a inevitabilidade de mudar a sua postura,
uma necessidade que se configura imprescindível para mudar a forma como se
concebem e realizam os processos de ensino-aprendizagem e, por consequência, para
melhorar a qualidade da educação.
Assim se compreende que, em Portugal, os diplomas legais1 publicados mais
recentemente apontem para uma nova forma de organizar as escolas do ensino básico,
assente na “necessidade de ultrapassar uma visão de currículo como um conjunto de
normas a cumprir de modo supostamente uniforme em todas as salas de aula” para um
conceito de currículo delineado como um conjunto aprendizagens a concretizar por
todos os alunos, processo só possível “no contexto da crescente autonomia das escolas e
[do] desenvolvimento de novas práticas de gestão curricular”(Lemos e Conceição,
2001:14), aspectos que indicam que as escolas se devem organizar num ensino baseado
em projectos.
Dos vários projectos que, hoje, a escola tem de organizar se quiser concretizar
uma efectiva reestruturação interna, decidimos focalizar este estudo na concepção,
implementação e avaliação do projecto curricular de turma no 1º ciclo do Ensino
Básico, uma vez que é na sala de aula, especificamente, ao nível dos processos de
ensino aprendizagem, que todas as intenções educativas se podem tornar realidade.
Assim, o estudo que nos propomos realizar reveste-se de significativa pertinência,
na medida em que o desenvolvimento do projecto curricular de turma no 1º ciclo do
Ensino Básico se apresenta como uma temática de crescente importância para a
comunidade educativa, mais concretamente para os professores, cujos
constrangimentos, dificuldades e, mesmo alegrias, merecem também ser partilhados.
Além disso, não podemos deixar de referir que este percurso se apresenta, também,
como uma possibilidade de reflectirmos e nos valorizarmos sobre tão importante
temática, respondendo assim a algumas dúvidas e anseios decorrentes da nossa própria
actividade profissional.
O presente trabalho estrutura-se em seis capítulos que, em conjunto, asseguram a
fundamentação teórica e a dimensão empírica do estudo.
1 Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro; Despacho-Normativo n.º 30/2001, de 19 de Julho.
Introdução
13
No primeiro capítulo, incidimos sobre a problemática da investigação, os
objectivos que delineámos para nortear este percurso de investigação, a justificação do
estudo e as suas limitações.
No segundo capítulo, o primeiro de três dedicados à revisão de literatura que
consubstancia o substracto teórico que fundamenta esta investigação, abordamos a
centralidade do currículo na organização e realização dos processos de ensino-
aprendizagem. Num primeiro ponto, analisamos o conceito de currículo nas suas
diferentes perspectivas, evidenciando não só a dualidade que gira em torno deste
conceito, mas também a sua importância e transformação ao longo das últimas décadas.
Num segundo ponto, fazemos referência ao processo de desenvolvimento curricular,
onde começamos por deslindar o conceito de desenvolvimento curricular, para depois
percorrermos os diferentes contextos/níveis de decisão curricular subjacentes a este
processo, bem como alguns dos diferentes modelos utilizados e as suas características.
Posteriormente, assinalamos alguns aspectos decorrentes da programação e planificação
do processo de ensino-aprendizagem e da avaliação no contexto da reorganização
curricular. Para finalizar o capítulo, realizamos uma breve análise dos aspectos que
dizem respeito às questões relacionadas com autonomia curricular, procurando clarificar
o conceito e evidenciar as relações que esta pode ter, ou não, com as práticas
curriculares dos professores na organização e realização dos processos de ensino
aprendizagem.
No terceiro capítulo, focalizam-se a necessidade e importância de construir
projectos curriculares nas escolas. O primeiro ponto é dedicado à clarificação do
conceito de projecto. No segundo ponto fazemos referência aos projectos que
actualmente se espera poderem ser elaborados nas escolas, nomeadamente o projecto
educativo, o projecto curricular de escola/agrupamento e o projecto curricular de turma.
No quarto capítulo, abordamos o papel do professor na construção do currículo.
Num primeiro ponto direccionamos a nossa atenção para a questão da especificidade do
1º ciclo do Ensino Básico, procurando incidir nas diferentes culturas e papéis dos
professores, bem como, nas diferentes culturas de escola e no seu papel no
desenvolvimento do currículo, nomeadamente ao nível da construção de projectos
curriculares. Num segundo ponto, questionamos o papel da formação contínua e do
desenvolvimento profissional dos professores, na medida em que se tratam de suportes
Introdução
14
essenciais para qualquer intenção de mudança, nomeadamente ao nível da construção
do currículo.
No quinto capítulo, apresenta-se a metodologia utilizada no decurso da
investigação, ao longo de quatro pontos principais: (i) caracterização do estudo; (ii)
técnicas e instrumentos de recolhas de dados; (iii) caracterização da população e
amostra em estudo; (iv) técnicas de recolha de dados.
No sexto capítulo, procede-se à apresentação e discussão dos resultados, em
primeiro lugar dos inquéritos por questionário, depois dos inquéritos por entrevista, de
acordo com as dimensões definidas ao longo do estudo, sendo estas o projecto
curricular, o processo de desenvolvimento do projecto curricular e os constrangimentos
e vantagens desse empreendimento.
Por último, a conclusão, onde identificamos alguns dos aspectos principais que
emergiram da realização deste trabalho.
CAPÍTULO I
O PROBLEMA
CAPÍTULO I – O Problema
16
1. PROBLEMÁTICA DA INVESTIGAÇÃO
Inserida numa estratégia de mudança mais ampla, a Reorganização Curricular
do Ensino Básico1 é um conjunto de medidas introduzidas no sistema educativo, em
Portugal, com o intuito de aumentar a eficácia da escola e de melhorar os processos de
ensino-aprendizagem que se desenvolvem no seu interior.
De acordo com o estabelecido no diploma que aprova tal mudança, é atribuída,
entre outras funções, ao professor titular de turma, no caso do 1º Ciclo do Ensino
Básico, a responsabilidade de participar nas várias fases de elaboração do projecto
curricular de turma, tendo a seu cargo a responsabilidade de o conceber, aprovar e
avaliar. Além disso, o mesmo diploma determina a criação de três novas áreas
curriculares não disciplinares - Estudo Acompanhado, Área de Projecto e Formação
Cívica -, introduzindo, ainda, com carácter transdisciplinar, a exploração de temas
como a educação para a cidadania, a valorização do domínio da língua portuguesa, a
valorização da dimensão humana do trabalho e a utilização das tecnologias de
informação e comunicação, aspectos que, não deixando de se reconhecerem como
determinantes para o desenvolvimento integral dos alunos, vêm colocar novas
exigências profissionais aos docentes do ensino básico.
A este respeito, Estrela (2001: 121) salienta que “ dadas as alterações
verificadas ao nível da concepção e funções da escola, as funções docentes, antigamente
restritas à sala de aula, não têm cessado de se alargar.” Exige-se do professor,
independentemente da fase da carreira em que se encontra ou da área de formação, o
desempenho de várias tarefas - educador moral, especialista do desenvolvimento e da
aprendizagem, técnico do desenvolvimento curricular, especialista de saberes de
ensino, avaliador, orientador escolar, inovador, investigador– que têm contribuído para
aumentar o leque de funções que lhe são atribuídas.
Esta situação de intensificação do trabalho docente marcada pela multiplicidade
de tarefas e pelo excesso de burocracia a que está sujeito, pode produzir alguns efeitos
secundários e gerar alguns problemas, principalmente pelo desfasamento entre o muito
que se pede aos professores e o pouco que se lhes dá (Estrela, 2001).
Verifica-se, portanto, que a construção, implementação e avaliação do projecto
curricular de turma no 1º Ciclo do Ensino Básico, contexto em que se incide o presente
1 Decreto-Lei n.º 6/2001 de 18 de Janeiro.
CAPÍTULO I – O Problema
17
estudo, aparece como mais uma das exigências decorrentes das mudanças que surgem
em sequência do processo de Reorganização Curricular do Ensino Básico.
Não deixando de reconhecer a importância subjacente à concepção,
implementação e avaliação de projectos curriculares, a verdade é que, por ser uma tarefa
que só recentemente foi incumbida à escola e aos professores, pode gerar alguns
constrangimentos. Daí o nosso interesse por esta temática.
Além do mais, a concepção, implementação e avaliação do projecto curricular
de turma decorre de duas lógicas distintas, podendo mesmo considerar-se antagónicas:
por um lado, trata-se de uma tarefa “imposta” pela administração central, tal como
determinam os recentes diplomas que estabelecem a organização curricular do Ensino
Básico 2; por outro lado, a construção de projectos pode ser uma via para a mudança das
práticas educativas e para a construção da autonomia da escola e do professor na sua
sala de aulas, se tal empreendimento resultar de uma necessidade sentida pelos
professores e pelas escolas, para darem resposta aos desafios e às solicitações que lhes
estão a ser constantemente colocadas, não devendo, por isso, cingir-se à mera prescrição
administrativa. Assim o facto de se poderem estar a exigir tarefas aos professores para
as quais, eventualmente, poderão não se sentir preparados, sobretudo pela falta de
formação que podem ter nesse domínio.
Foi com base nas ideias assinaladas que julgámos pertinente realizar um
trabalho de investigação que, no âmbito da Reorganização Curricular do Ensino Básico,
nos permitisse estudar a forma como os projectos curriculares de turma, no 1º Ciclo do
Ensino Básico, têm estado a ser concebidos, concretizados e avaliados, bem como
algumas das principais dificuldades com que os professores se têm deparado em todo
este processo.
Para o efeito, delineámos como problema de investigação: averiguar até que
ponto a concepção, implementação e avaliação de projectos curriculares de turma
é apenas uma mera intenção política (visível ao nível dos discursos e dos
normativos) ou, pelo contrário, tem influenciado a acção dos professores do 1º
Ciclo do Ensino Básico.
2 Decreto-Lei n.º 6/2001 de 18 de Janeiro
CAPÍTULO I – O Problema
18
2. OBJECTIVOS DO ESTUDO
Para tentar dar resposta ao problema definido e com o intuito de nortear o
processo de investigação, delineámos os seguintes objectivos, de carácter mais geral:
1. Verificar que implicações tem na acção dos professores do 1º Ciclo do
Ensino Básico (a obrigatoriedade d)a concepção, implementação e avaliação
de projectos curriculares de turma.
2. Identificar constrangimentos evidenciados pelos professores na concepção,
implementação e avaliação do projecto curricular de turma.
3. Aprofundar os conhecimentos relativamente à concepção, implementação e
avaliação de projectos curriculares;
4. Contribuir para o debate em torno da importância de construir projectos
curriculares ao nível da escola.
3. JUSTIFICAÇÃO DO ESTUDO
O âmbito do presente estudo situa-se ao nível do contexto de realização
curricular, último nível do design curricular, na medida em que é a este nível que a
concepção, implementação e avaliação de projectos curriculares de turma se pode [e
deve] enquadrar e concretizar, caracterizando-se por uma maior incidência no que
respeita à intervenção dos professores e dos alunos.
Nesta ordem de ideias, as tarefas que os professores desempenham assumem
uma grande importância e os seus papéis são decisivos tanto na forma como se estrutura
e desenvolve o currículo, como no processo de aprendizagem dos alunos.
Enquanto processo contínuo de tomadas de decisão, o currículo é uma
construção que se desenvolve em diversos contextos a que correspondem diferentes
fases e etapas de concretização, que se situam entre as perspectivas macrocurricular e
microcurricular (Gimeno, 1995; Pacheco, 2001). Consideram-se, por norma, três
contextos ou níveis de decisão curricular: o nível macrocurricular, designado
normalmente por nível político-administrativo, relacionado com a administração
central; o nível mesocurricular, também designado por nível de gestão, situando-se no
âmbito da escola e da administração regional; por último, o nível de microcurricular,
CAPÍTULO I – O Problema
19
isto é, o nível de realização do currículo, que congrega o contexto da sala de aulas
(Pacheco, 2001).
Relativamente ao primeiro nível, Pacheco (2001: 71) considera que um
currículo prescrito, oficial e formal é o resultado de uma decisão tomada ao nível do
contexto político-administrativo. É neste nível que é determinada a normatividade
curricular, isto é, que são propostas orientações programáticas, incluindo um conjunto
de normas sobre a elaboração dos materiais curriculares, os programas de ensino e os
critérios de organização curricular.
Posteriormente, o currículo é reelaborado ao nível do contexto de gestão, isto é,
ao nível da escola e da região. As escolas, tendo em conta tanto os objectivos
educativos de âmbito nacional, como as características, as necessidades e as
expectativas da região em que estão inseridas e dos alunos que as frequentam,
desempenham um papel activo na reelaboração do currículo proposto a nível nacional,
através da construção do seu projecto educativo e dos seus projectos curriculares, dentro
de um quadro específico de organização curricular e administrativa.
No que respeita ao contexto de realização, último nível do processo de
desenvolvimento curricular, “distinguem-se as fases do currículo planificado e do
currículo real, ou seja, o currículo em acção, operacionalizado através de um plano de
ensino – trabalhado individual ou em grupo pelos professores – que corresponde ao
projecto didáctico” (Pacheco, 2001: 101). Trata-se de um contexto muito importante,
uma vez que é a este nível que os processos de ensino aprendizagem acontecem.
Nesta perspectiva, o projecto curricular de turma e o projecto didáctico podem
traduzir-se num “microssistema curricular que tem por contexto a sala de aula com
todas as suas características e complexidades” Pacheco (2001: 103).
É por isso que, a este nível, o professor assume o papel de “árbitro de toda a
decisão curricular”, já que é visto como o “principal protagonista de uma cadeia de
decisões que, natural e logicamente, lhe pertence terminar”, acabando por moldar “à sua
‘medida’ o currículo sucessivamente prescrito, apresentado, programado e planificado”
(Pacheco, 2001:101). Daí o ser frequentemente associado a tudo quanto de positivo ou
negativo acontece na escola (idem).
O professor deveria agir, sempre que possível, de forma planificada e colegial,
articulando aquilo que é prescrito ao nível político-administrativo com a realidade, isto
CAPÍTULO I – O Problema
20
é, o meio em que a escola se insere e as características e necessidades dos alunos.
Contextualizando o que lhe é apresentado, produzindo, implementando e avaliando os
seus resultados e os dos seus alunos, o professor poderá desempenhar um papel activo
no desenvolvimento do currículo, evitando assim a assunção de um papel meramente
executor.
Na verdade, o professor é visto como um dos principais elementos no
desenvolvimento do currículo, uma vez que é “o mediador entre a proposta corporizada
no currículo e a concretização, pelos alunos, das aprendizagens visadas” (Roldão,
1999a: 55). Uma responsabilidade que exige que cada professor desenvolva novos
conhecimentos e atitudes e pressupõe uma actualização profissional constante.
Clarificado o papel do professor no processo de desenvolvimento curricular,
parece-nos pertinente fazer referência, ainda que de forma breve, aos conceitos de
currículo e de projecto, por se tratarem de conceitos estreitamente relacionados com o
estudo que pretendemos realizar e cuja clarificação nos ajudará a construir o quadro
conceptual que norteará este projecto de investigação. Um quadro assente em três
pilares conceptuais: professor, currículo e projecto.
Nesta ordem de ideias, Roldão (1999a: 49) considera o currículo como uma
construção necessariamente diferenciada:
“face a públicos cada vez mais heterogéneos cultural e socialmente, exigindo-se assim,para que a aprendizagem realmente ocorra e a escola não contribua mais para agravar opadrão dos excluídos, a diferenciação das propostas curriculares, o seu enfoque em metascomuns através de vias diferentes e a ancoragem do currículo em referentes significativospara cada em e para todos os que frequentam a escola, convertendo-se deste modo emprojecto apropriado pelos seus actores e gestores”.
Uma vez que a noção currículo tem subjacente a noção de desenvolvimento
curricular, isto é, o processo que permite que o currículo aconteça, Ribeiro (1990: 6)
define desenvolvimento curricular “como um processo dinâmico e contínuo que
engloba diferentes fases, desde a justificação do currículo até à sua avaliação e passando
necessariamente pelos momentos de concepção – elaboração e de implementação”.
Trata-se de uma ideia corroborada por Pacheco (2001: 25), ao afirmar que “o
termo desenvolvimento curricular é utilizado para expressar uma prática, dinâmica e
complexa, que se processa em diversos momentos e em diferentes fases, de modo a
formar um conjunto estruturado, integrando quatro componentes principais: justificação
teórica, elaboração/planeamento, operacionalização e avaliação”.
CAPÍTULO I – O Problema
21
No fundo, ao conceber-se o processo de desenvolvimento curricular como um
processo interactivo e dinâmico, que surge na confluência da intervenção de distintos
actores educativos, estamos perante uma concepção de desenvolvimento curricular que
idealiza o currículo como projecto.
Apesar de o termo projecto ser de uso frequente e nos mais variados âmbitos, a
verdade é que se trata de um conceito ambíguo e complexo, sendo utilizado com
diferentes significados em diferentes situações.
No âmbito da educação, o termo projecto surge frequentemente associado a
projecto educativo e a projecto curricular. Embora se trate de um termo muito utilizado
nos discursos sobre a educação, bem como nos normativos que organizam a escola e os
processos de desenvolvimento curricular, o facto é que, como evidenciam Alonso,
Peralta e Alaiz (2001: 63), “em nenhum documento consultado3 se explicita o que se
entende por Projecto Curricular, qual a sua diferença relativamente ao Projecto
Educativo, o que deve constar dele e a que questões deve dar resposta”.
Daí considerarmos oportuno este estudo, uma vez que esta ausência de
orientações também sucede em relação ao projecto curricular de turma, factor que
parece ter originado entre os professores, que têm a tarefa de os construir, alguns
constrangimentos, não só pela polissemia que gira em torno do conceito de projecto,
como também no significado que tal construção pode operar em termos de mudança e
melhorias das práticas curriculares.
O conceito de projecto surge, assim, associado ao reconhecimento de uma
melhor qualidade do ensino e da capacidade de responder aos problemas do dia-a-dia
através do “envolvimento das escolas e dos seus agentes em planos que trabalhem esses
problemas e que, por isso, criem condições para uma formação, com sentido, para
todos” (Cortesão, Leite, Pacheco, 2002: 23-24). Esta concepção de projecto “envolve
uma articulação entre intenções e acções, entre teoria e prática, organizada num plano
que estrutura essas acções” (idem, ibidem).
Para Pacheco e Morgado (2002: 12), “a noção de projecto congrega um
conjunto de intencionalidades resultantes de visões, crenças, perspectivas, juízos de
3 Análise dos textos programáticos e relatórios genéricos e análise de textos normativos no âmbito darealização do “Parecer sobre o Projecto de Gestão Flexível do Currículo”.
CAPÍTULO I – O Problema
22
valor e opções sobre os princípios orientadores do próprio fenómeno educativo.” Daí
que a noção de projecto se torne necessária no domínio da educação, “onde a ausência
pura e completa de um projecto cria vertentes de arbitrariedade processual
extremamente complexas de gerir e de negociar, tanto a nível macro, quanto ao nível
meso e micro” (Morgado, 2000: 83).
Conforme temos tido oportunidade de constatar, os recentes discursos relativos
à elaboração de projectos curriculares de turma referem-se sobretudo aos 2º e 3º ciclos
do Ensino Básico, sendo poucas as alusões relativas à elaboração de projectos
curriculares de turma no 1º Ciclo do Ensino Básico. Contudo, o 1º Ciclo do Ensino
Básico possui uma especificidade muito própria, à qual é necessário atender,
“adequando o desenho curricular às suas características organizacionais e curriculares,
marcadas pela monodocência e pela globalização, não se deixando enganar pela
convicção de que no 1º Ciclo já se faz a gestão flexível do currículo” (Alonso, Peralta e
Alaiz, 2001: 64). É que, só é possível concretizar, na prática, a noção de projecto se a
sua construção e implementação conduzir a uma flexibilização que permita adequar o
currículo aos alunos que o realizam.
Além disso, tais propósitos remetem-nos ainda para o domínio da autonomia da
escola e dos professores, em particular para a noção de autonomia curricular,
intimamente associada à construção de projectos, e que é conceptualizada por Morgado
(2003: 339) como sendo:
“a possibilidade dos professores tomarem decisões no processo de desenvolvimentocurricular, tanto no que diz respeito à adaptação do currículo proposto a nível nacional àscaracterísticas e necessidades dos estudantes e às especificidades do meio em que a escolainsere, como no que se refere à definição de linhas de acção e à introdução de temáticasque julguem imprescindíveis para a sua plena formação”.
Autonomia curricular e projecto interligam-se, assim, com o conceito de
autonomia de escola que, na opinião de Leite (2003: 92), é definida da seguinte forma:
“a autonomia de escola, enquanto unidade social, e não enquanto mera unidadeadministrativa, implica uma coesão entre os diferentes elementos dessa organização, ouseja, implica que alunos, professores, outros trabalhadores da escola, pais e outroselementos da comunidade educativa se envolvem num projecto que tem objectivoscomuns, embora com participações diferentes, por parte de cada um desses intervenientes”.
Em idêntica linha de pensamento, Roldão (1999b: 44) define projecto curricular
como sendo “a forma particular como, em cada contexto, se reconstrói e se apropria um
currículo face a uma situação real”, o que requer que se definam “opções e
intencionalidades próprias” e se construam “modos específicos de organização e gestão
CAPÍTULO I – O Problema
23
curricular, adequados à consecução das aprendizagens que integram o currículo para os
alunos concretos daquele contexto.” No fundo, uma forma de adaptar intenções de
âmbito mais geral aos interesses mais particulares dos estudantes.
Para que tal seja possível, Leite, Gomes e Fernandes (2001: 16), defendem que o
conceito de projecto curricular deve repousar na “crença de que a reconstrução do
currículo nacional”, para poder atender às situações e às características dos diversos
contextos, “tem mais probabilidades de gerar intervenções educativas adequadas a
induzir um processo formativo de melhor qualidade para todos os alunos”.
Apesar do projecto curricular de escola e do projecto curricular de turma
pretenderem adequar o currículo nacional à especificidade da escola e dos alunos, por
norma, o projecto curricular de escola define-se mais em função do currículo nacional e
do projecto educativo de escola, sendo ao nível do projecto curricular de turma que se
procura responder às especificidades dos alunos, permitindo um nível de articulação e
concretização que só as situações reais possibilitam.
É que, a consecução de tais pressupostos depende, em última análise, das
práticas curriculares dos professores, pois apesar de gozarem de alguma margem de
autonomia conferida legislativamente nem sempre fazem uso dela.
É em torno das questões expostas e da sua relação com a temática deste estudo
que se prende o nosso interesse. No fundo, pretendemos verificar como é que os
professores do 1º ciclo do Ensino Básico encaram os novos desafios educativos
decorrentes da construção, implementação e avaliação do projecto curricular de turma e
alguns constrangimentos que possuem relativamente a esse processo, tendo presente
que “qualquer mudança educativa depende, em essência, da capacidade dos professores
e das professoras conseguirem alterar as suas práticas curriculares” (Morgado, 2003:
339). Daí, o pretendermos também identificar alguns dos principais entraves à
modificação das práticas curriculares dos professores do 1º Ciclo do Ensino Básico,
nomeadamente ao nível dos problemas e dos desafios que o projecto curricular de turma
lhes coloca.
CAPÍTULO I – O Problema
24
4. LIMITAÇÕES DO ESTUDO
A escolha desta problemática de investigação prende-se essencialmente com
dois aspectos que consideramos importantes e que procurámos clarificar na introdução
deste trabalho: por um lado, as exigências que actualmente se colocam às escolas no
sentido de conceberem, realizarem e avaliarem projectos curriculares de turma; por
outro lado, o facto de nos identificarmos com esta temática, que nos toca bem de perto
no decurso da nossa actividade profissional. Assim, encaramos este percurso como uma
oportunidade de clarificar e aprofundar conhecimentos no âmbito do objecto de estudo
desta investigação.
Todavia, a realidade educativa, como objecto de estudo da investigação,
apresenta-se como um empreendimento enormemente complexo, pela sua constante
mudança e diversidade (Arnal, Latorre e Rincón, 1996). Neste sentido, foram várias as
limitações com que nos tivemos de defrontar no decorrer deste trabalho.
Em primeiro lugar, o facto de se tratar de uma primeira investigação, o que, por
si só, cria alguns obstáculos, cuja diluição requer um grande comprometimento e
empenho por parte dos actores envolvidos no processo. Porém, consideramos ter
conseguido obter ganhos significativos de conhecimentos e experiências e ter
contribuído, de alguma forma, para um maior aprofundamento em torno da temática em
análise, pelo menos ao nível do agrupamento onde decorreu o estudo.
Em segundo lugar, as limitações de tempo a que um trabalho desta natureza está
sujeito. Na verdade, dois anos é um período escasso quando se pretende, como foi o
nosso caso, realizar um estudo baseado numa pluralidade metodológica. Era nossa
intenção inicial desenvolver o estudo em três partes: primeiro, recolher a opinião dos
professores do 1º ciclo do Ensino Básico através do inquérito por questionário; depois,
ouvir os professores que ocupam diferentes cargos de gestão e coordenação nas escolas,
através do inquérito por entrevista; e por fim, dar também a voz aos professores através
do inquérito por entrevista. Porém, o tempo de trabalho no terreno que essa abordagem
implicaria não possibilitou ouvir o número de professores que desejávamos, pelo que
também não nos foi possível levar a cabo o terceiro passo que inicialmente tínhamos
previsto.
CAPÍTULO I – O Problema
25
Por fim, confrontamo-nos com a dificuldade de conciliar aspectos específicos
em torno do projecto curricular de turma, uma vez que o campo educativo é muito
complexo e resulta na confluência de elementos de vários quadrantes, o que nos leva,
com Arnal, Latorre e Rincón (1996: 48), a concluir que, de facto “a natureza da
realidade educativa torna difícil o seu conhecimento”.
CAPÍTULO II
A CENTRALIDADE DO CURRÍCULO NA CONCEPÇÃO E REALIZAÇÃO
DOS PROCESSOS DE ENSINO-APRENDIZAGEM
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
27
1. CONCEITO DE CURRÍCULO
Ao longo do tempo, o interesse pela clarificação do conceito de currículo tem sido
uma preocupação constante, tanto por parte de muitos investigadores em educação,
como de alguns responsáveis pela definição das políticas educativas e curriculares. No
entanto, por se tratar de um conceito polissémico, não tem sido possível encontrar uma
definição que reúna o consenso de todos os que se preocupam com os problemas da
educação.
As primeiras definições de currículo apontam para um conceito que corresponde
“a um plano de estudos, ou a um programa, muito estruturado e organizado na base de
objectivos, conteúdos e actividades e de acordo com a natureza das disciplinas”
(Pacheco, 2001: 16), o que demonstra uma noção restrita de currículo, mas ainda
recorrente nas concepções de muitos docentes.
Outras definições foram sendo propostas, deixando-nos perceber que o campo
curricular é um espaço abrangente, não podendo o conceito de currículo limitar-se a ser
idealizado, apenas, como um mero plano de estudos ou programa predefinidos, que os
professores devem implementar no interior da sala de aulas. É nesse sentido que
Pacheco (2001) defende que o currículo se deve abordar, pelo menos, em redor de duas
perspectivas principais: uma primeira, num plano mais formal, em que se entende
currículo como conjunto de conteúdos a ensinar e, ainda, como plano de acção
pedagógica, estruturado num sistema tecnológico; uma segunda, onde se inserem as
definições que concebem o currículo como um conjunto de experiências educativas e
como um sistema dinâmico, probabilístico e complexo, sem uma estrutura
predeterminada.
Numa perspectiva de análise semelhante, insere-se o pensamento de Ribeiro
(1990: 11-12): por um lado, considera o currículo como sendo “um conjunto estruturado
de matérias e de programas de ensino num determinado nível de escolaridade, ciclo ou
domínio de estudos”; por outro, idealiza-o como “uma listagem, esquema ou sumários
de temas ou tópicos”, que cada docente deve desenvolver de acordo com o contexto
específico de cada situação educativa, tendo, neste caso, um carácter menos rígido.
Também Pérez e Lopéz (1999: 20) consideram que a definição de currículo deve
processar-se numa dupla dimensão. Uma primeira, referente ao contexto, que considera
o currículo como “cultura social convertida em cultura escolar por intermédio dos
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
28
professores e das instituições escolares”; a segunda, no domínio do campo cognitivo,
onde o currículo é visto como “o modelo de ensino-aprendizagem no qual emanam os
programas escolares”.
Em idêntica linha de ideias, Formosinho (1991: 43) atribui ao conceito de
currículo dois sentidos, reiterando que “as definições tradicionais (estritas) de currículo
centram-se à roda do processo de ensino e das actividades educativas expressamente
planeadas para transmitir conhecimentos, valores ou atitudes”, perspectiva esta da qual
podem emergir duas possíveis definições:
“a) Currículo [como] elenco das disciplinas a leccionar – o que pode incluir apenas o nomeda disciplina, mas também pode abranger o programa e os métodos a utilizar.
b) Currículo [como] conjunto das actividades educativas programadas pela escola, ocorramelas na sala de aulas ou for a delas – incluindo assim as conferências, actividades teatrais eas desportivas, viagens de estudo, actividades de grupos criados pela escola, o jornalescolar, etc.” (idem, ibidem).
No entanto, o autor (idem: 44) não deixa de alertar para o facto de, na Sociologia
da Educação, se recorrer a uma terceira definição, mais ampla e centrada na
aprendizagem, alegando que “currículo é tudo o que é aprendido na escola pelos alunos,
seja ou não objecto de transmissão deliberada”. Uma definição que corporiza o que
vários autores (Jackson, 1998; Santomé, 1995; Zabalza, 2003) identificam como
currículo oculto ou currículo escondido. Sendo considerado como uma peça
fundamental no sucesso educativo dos alunos, não é “objecto de ensino formal na
escola, mas é aprendido através do contexto, do contacto com vários tipos de pessoas ou
é mesmo objecto do ensino informal dos colegas” (Formosinho, 1991: 44).
Esta dualidade nas diferentes concepções de currículo é também partilhada por
Rasco (1994: 18), para quem o termo currículo pode ser usado de duas formas distintas:
“para indicar um plano para a educação dos alunos e para identificar um campo de
estudos”. O primeiro sentido atribui ao conceito de currículo um significado prescritivo,
ou seja, “aquilo que deve ser levado a cabo pelas escolas, o plano ou a planificação, pela
qual se organizam os processos de ensino-aprendizagem” (idem: ibidem). O segundo
sentido encara o currículo como um fenómeno digno de ser estudado, já que depende
das condições da sua aplicação e estas são específicas de cada contexto.
Na verdade, o currículo não pode entender-se como algo predeterminado, isto é,
como um “produto” a ser disponibilizado segundo regras e normas específicas. Uma vez
que se trata de um processo que resulta das múltiplas relações que se estabelecem entre
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
29
diferentes actores, em contextos diversos, é um processo complexo, não sendo por isso
possível predeterminá-lo à partida. Daí a importância que o conceito de currículo como
projecto tem vindo a assumir nos tempos mais recentes. É neste sentido que Pacheco
(2001: 20) afirma que o currículo se afigura como:
“um projecto, cujo processo de construção e desenvolvimento é interactivo, que implicaunidade, continuidade e interdependência entre o que se decide ao nível do planonormativo, ou oficial, e ao nível do plano real, ou do processo de ensino-aprendizagem.Mais ainda, o currículo é uma prática pedagógica que resulta na interacção e confluência devárias estruturas (políticas, administrativas, económicas, culturais, sociais, escolares...) nabase das quais existem interesses concretos e responsabilidades compartilhadas”.
Como se depreende do conceito anterior, embora a noção de currículo não possa
alhear-se do que se decide ao nível do plano oficial (onde são definidos os planos
curriculares, elaborados os programas de ensino e decididas as normas que devem
nortear a sua aplicação), a verdade é que o currículo só acontece ao nível dos processos
de ensino-aprendizagem, onde aquelas intenções se concretizam. Assim se compreende
que, para Zabalza (2003: 12), o currículo seja entendido como:
“o conjunto dos pressupostos de partida, das metas que se deseja alcançar e dos passos quese dão para as alcançar; é o conjunto de conhecimentos, habilidades, atitudes, etc. que sãoconsiderados importantes para serem trabalhados na escola, ano após ano. E, supostamenteé a razão de cada um dessas opções”.
O mesmo autor (idem: 33-34) distingue cinco características cruciais na definição
de currículo: (i) centrado na escola – a escola age como o eixo vertebrador da
programação de adaptação das prescrições do programa às suas necessidades e
características sociais e culturais; (ii) relacionado com os recursos do meio ambiente – a
escola é tida como uma estrutura aberta, fazendo uso de todos os recursos que tiver à
disposição na sua zona, e sendo, simultaneamente utilizada como recurso cultural e
formativos pelos vizinhos e organizações da sua localidade; (iii) consensual – um
currículo baseado na programação a nível da cada escola, proporcionando assim meios
para uma verdadeira dinâmica de participação na comunidade educativa; (iv) com
incidência directa ou indirecta em todo o leque de experiências dos alunos – a escola
compromete-se com todo o conjunto de “oportunidades de formação” de um
determinado meio, integrando-as num projecto formativo que una e compatibilize o
escolar com o pré-escolar e extra-escolar, o cognitivo com o afectivo, etc.; (v)
“clarificador” para professores, pais, alunos, etc. – um currículo que estabelece uma
espécie de contacto mútuo onde figura o que cada parte tem para cumprir: o que deve, e
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
30
como ensinar o professor; que deve aprender o aluno; que recursos, experiências e
colaboração se devem esperar da colectividade social.
As diferentes definições de currículo podem, ainda, analisar-se à luz de diferentes
paradigmas educacionais, onde, segundo Gomes (2004), a concepção do currículo
assume diferentes contornos. Num paradigma racional-tecnológico, o currículo é um
processo técnico concretizado para obter resultados previamente definidos, exigindo-se
uma definição muito concreta do produto e das acções necessárias para o conseguir;
sendo assim, o essencial são os objectivos. Segundo o paradigma interpretativo-
simbólico ou prático, o currículo é concebido como uma práxis apoiada na reflexão,
dando grande relevo aos valores; centra-se nos processos; sendo um propósito flexível e
aberto, o currículo é considerado como uma hipótese a investigar e a confirmar ou
infirmar. No âmbito do paradigma sociocrítico, o currículo oficial é visto como um
instrumento para a reprodução das relações de poder e de desigualdade social; assim se
compreende que se apele aos actores educativos para desmontar os mecanismos do
currículo oculto, uma tarefa necessária para poder encarar o currículo como um espaço
dialéctico e um campo ideológico. Daí o considerar-se que o currículo tem como função
principal a libertação e a emancipação.
Com efeito, o currículo como conceito aberto necessita de uma base comum de
diálogo e discussão, a todos os que sobre ele se debruçam e que, necessariamente,
evidenciam um conjunto de relações que se estabelecem no seio do campo curricular –
“do Currículo com a Sociedade e seus valores inerentes e ainda com as concepções de
Homem, Mundo e Informação” (Pacheco, 2001: 18) – e que ajudam a compreender a
complexidade que o caracteriza.
Embora não exista um consenso em relação ao conceito do currículo, pode-se
dizer que “o currículo é sempre uma solução, ainda que provisória e discutível no seu
valor e nas suas formas de expressão, para um determinado problema educativo”
(Morgado, 2000: 32).
No contexto educativo português também se verificaram grandes mudanças,
sobretudo nas últimas três décadas, em particular no que ao percurso do currículo diz
respeito. De acordo com Leite (2003), a orientação curricular, em vésperas de Abril de
1974, assentava num paradigma tradicional de racionalismo académico, onde a
organização do currículo se centrava nas disciplinas, com uma orientação
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
31
multidisciplinar. O papel da escola e dos professores era, fundamentalmente, transmitir
saberes e preparar os alunos para a vida futura.
Nos primeiros tempos após a revolução de 74, começa a emergir um paradigma
pedagógico de índole humanista-social, que, a par de um paradigma técnico, permite o
domínio da didáctica geral, baseada numa relação triangular entre objectivos, conteúdos
e métodos. A organização do currículo, embora continuando centrada nas disciplinas,
não foi impeditiva de que estimulasse um maior recurso a práticas de pluri e
interdisciplinaridade. O papel do professor, mais do que transmitir, seria o de romper
com a concepção de educação bancária1 que predominava na altura, sem deixar de
contribuir para uma efectiva inserção dos alunos na sociedade.
No período de normalização, que emerge nos anos 80, continua a imperar um
paradigma técnico, com recurso a processos de planificação detalhados e estruturados
em torno de objectivos específicos, enquanto que em termos de organização do
currículo se estimula a dialéctica entre tradição e modernidade. Nesta perspectiva, o
professor continua a assumir-se como um técnico, isto é, como um consumidor de
currículo, recorrendo a procedimentos que favorecem a aprendizagem dos conteúdos
dos programas escolares.
Nos anos 90, assiste-se ao reconhecimento da inadequação de um currículo
construído apenas em função de um aluno médio-tipo e à necessidade de definir um
currículo nacional flexível, com possibilidade de territorialização local. A escola passa a
ser vista como um local de tomadas de decisão, e não apenas de implementação de
decisões externas, e o professor como um professor-investigador e/ou um professor-
reflexivo, isto é, como um “professor configurador do currículo”, de forma a contribuir
para adaptar as prescrições nacionais às realidades locais.
Contudo, em termos de decisões, nem sempre as pretensas mudanças de
concepções paradigmáticas e de papéis do professor e da escola se verificaram ao nível
das práticas. Aquilo que é prescrito no contexto político-administrativo, principalmente
no que se refere ao pensamento e à acção do professor, muitas vezes não produz efeitos
no contexto de realização. É por isso que Roldão (1999a: 21) considera que currículo é
“aquilo que os professores fizerem dele”. 1 A expressão educação bancária “configura a abordagem pedagógica pela qual o educador é agentetransmissor de informações e conhecimentos aos educandos. Nesta concepção, o único papel do educadoré o de expor/impor conhecimentos, não havendo espaço para discussão ou reflexão; a sua missão émeramente informativa” (Vasconcelos e Brito, 2006: 83).
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
32
Para fazer face ao elevado número elevado de definições propostas e para melhor
clarificar a noção de currículo, a mesma autora (Roldão, 1999a: 43) define-o como
sendo um “conjunto de aprendizagens consideradas necessárias num dado contexto e
tempo e à organização e sequência adoptadas para o concretizar ou desenvolver”,
definição que adoptamos neste trabalho, uma vez que permite mais facilmente
compreender a importância da elaboração de projectos curriculares, em especial a
elaboração do projecto curricular de turma. Aliás, trata-se de uma definição de currículo
que se sintoniza com o preceituado no Decreto-lei 6/2001, de 18 de Janeiro, onde se
define currículo como o “conjunto de aprendizagens e competências consideradas
necessárias a desenvolver pelos alunos no ensino Básico, de acordo com os objectivos
consagrados na Lei de Bases do Sistema Educativo para este nível de ensino”.
A esta dissonância que existe entre teoria e prática não é alheio o facto de o
currículo, desde que é concebido em termos de intenções, até que é realizado no campo
das práticas, ser fruto de distintas decisões, em contextos específicos, conduzindo-nos
ao conceito de desenvolvimento curricular, bem como para os diversos modos como
este processo se pode concretizar, aspectos a que nos referimos no ponto seguinte.
2. PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO CURRICULAR
A expressão Desenvolvimento Curricular é “utilizada para expressar uma prática,
dinâmica e complexa, que se processa em diversos momentos e em diferentes fases, de
modo a formar um conjunto estruturado, integrando quatro componentes principais:
justificação teórica, elaboração/planeamento, operacionalização e avaliação” (Pacheco,
2001: 25).
Na perspectiva de Kliebard (1985: 227), não existe “nada raro e misterioso sobre
o desenvolvimento do currículo, nem requer um elevado grau de especialização técnica
nem está reservado exclusivamente aos consagrados, mas representa, sem dúvida, uma
questão muito complexa”.
À semelhança do que acontece com a definição de currículo, a maior
complexidade reside na sua conceituação, ora pelas diferentes teorias curriculares, ora
pelas diferentes noções de currículo, pelo que Pacheco (2001: 64), apoiado em vários
autores (Taba, 1962; Sanders, 1985; Klein, 1985; Gay, 1991) destaca que o
desenvolvimento do currículo, pela sua natureza, pode/deve ser caracterizado através de
vários aspectos:
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
33
“a) é um processo interpessoal que reúne vários actores com diferentes pontos de vistasobre o ensino e aprendizagem e com poderes, explícitos ou implícitos, de decisãocurricular;
b) é um processo político que se traduz na tomada de decisões a nível nacional, regional elocal e que conta com a influência de vários grupos que dispõe de poder de negociaçãocurricular;
c) é um empreendimento social que envolve pessoas no desempenho de papéis – com aspotencialidades, disponibilidades e obstáculos inerentes – de acordo com diferentesinteresses, valores e ideologias;
d) é um processo de colaboração e cooperação entre os diversos intervenientes que tomamdecisões curriculares;
e) é um sistema desarticulado da prática de tomada de decisões: não é um processopuramente racional e cientificamente objectivo nem um processo nitidamente sequenciadoe sistemático; depende de um método prático e simples, pois as decisões curriculares sãofrequentemente tomadas através de movimentos pequenos e progressivos ou sobreproblemas específicos e não propriamente através de reformas globais”.
Na opinião de Ribeiro (1990: 6), e numa perspectiva mais abrangente, o
desenvolvimento curricular é um processo contínuo que compreende diferentes fases,
desde a justificação do currículo até à sua avaliação, passando necessariamente pela
concepção – elaboração e de implementação. Por outro lado, e num ponto de vista mais
restrito, o desenvolvimento curricular “identificar-se-ia apenas com a construção (isto é,
desenvolvimento) do plano curricular, tendo presente o contexto e justificação que o
suportam bem como as condições da sua execução” para se seguir “a fase da
implementação dos planos e programas na situação concreta de ensino e,
concomitantemente, o processo de avaliação da respectiva execução”.
Mais recentemente, a noção que tem vindo a prevalecer corresponde à perspectiva
mais abrangente, em que o desenvolvimento curricular é visto como um processo
“complexo e dinâmico que equivale a uma (re)construção de tomada de decisões de
modo a estabelecer-se, na base de princípios concretos, uma ponte entre a intenção e a
realidade, ou melhor, entre o projecto sócio/educativo e o projecto didáctico” (Pacheco,
2001: 65). Neste sentido, o desenvolvimento curricular requer diferentes momentos de
planeamento, realização e avaliação, que relacionados entre si constituem uma prática
activa e susceptível de ser considerada sob diferentes pontos de vista. Esta relação da
intenção com a prática deve ser vista como base para a definição de currículo, sem
prejuízo de ser questionada como os pontos de partida e de chegada do desenvolvimento
curricular.
Não pretendendo fazer uma análise pormenorizada das diferentes noções de
desenvolvimento curricular, consideramos que, em termos mais comuns a noção de
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
34
desenvolvimento curricular nos remete para um processo desenvolvido em várias fases,
em distintos contextos e com a intervenção de vários actores. Processo esse que
depende, em grande parte, da noção de currículo perfilhada e da forma como é
organizado nos diferentes contextos, e nos remete para diferentes modelos de
desenvolvimento curricular.
2.1. Contextos / Níveis de Decisão Curricular
Segundo Gay (1991), os elementos que estão envolvidos no processo de
desenvolvimento do currículo - poder, pessoas, procedimentos e participação –
envolvem uma série de questões sobre quem toma as decisões relativamente às questões
curriculares. A este propósito, o autor (idem: 66-69) refere que: em primeiro lugar, o
desenvolvimento do currículo se expressa como “uma dinâmica, vital e complexa rede
de interacções entre pessoas e forças sendo que todas elas ocorrem em quadros fluidos
ou contextos que estão em permanente mutação”; em segundo lugar, o desenvolvimento
curricular é um processo político, onde as instituições locais, regionais ou nacionais
reconhecem a política de programação de ensino; em terceiro lugar, o desenvolvimento
do currículo é um processo social, um “empreendimento de pessoas”; em quarto lugar, o
desenvolvimento do currículo tem por base princípios de cooperação, colaboração e
partilha de responsabilidade que variam em função do contexto e do nível de
envolvimento; em quinto lugar, o desenvolvimento curricular “não é um processo
puramente racional e cientificamente objectivo, nem um processo nitidamente
sequenciado e sistemático”.
Em suma, as decisões sobre o desenvolvimento do currículo podem ser tomadas a
diferentes níveis, pois “enquanto processo contínuo de decisão, o currículo é uma
construção que surge em diversos contextos a que correspondem diferentes fases e
etapas de concretização e que se situam entre as perspectivas macro e microcurricular”
(Pacheco, 2001: 68).
Neste sentido, Kirst e Walker (1971)2 consideram que, em geral, as decisões
curriculares são tomadas simultaneamente, em três níveis diferentes: “a) nível de
instrução ou do professor em classe; b) nível institucional ou da escola e/ou conjunto de
pessoas; c) nível societal ou dos quadros governamentais de educação e uma infinidade
de grupos de interesse”. 2 Citados por Gay (1991: 68).
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
35
Em idêntica linha de pensamento, Vilar (2000) identifica três níveis de decisão,
nos quais se definem as políticas curriculares que orientam o funcionamento de
qualquer sistema educativo: no primeiro nível de decisão decide-se o modelo curricular
a adoptar, optando-se entre um “currículo aberto” e um “currículo fechado”3; no
segundo nível de decisão, tem-se em consideração a organização interna com que se
dota o próprio currículo, optando entre um currículo organizado por disciplinas e/ou
áreas disciplinares e um currículo organizado por totalidades com significado para os
alunos; no terceiro nível de decisão, configura-se o espaço, onde se define o grau de
protagonismo dos diferentes agentes educativos na elaboração do currículo, optando
entre um currículo centralizado e rígido e um currículo descentralizado e flexível.
Por seu turno, Pacheco (2001) considera três níveis principais de decisão
curricular: i) o contexto político-administrativo, no âmbito da administração central, em
que se decide e apresenta o currículo formal4 ou oficial . É a este nível que se determina
a normatividade curricular, que se propõem as orientações programáticas, se definem
as normas para a elaboração dos materiais curriculares e enunciam os critérios de
organização curricular; ii) o contexto de gestão, no âmbito da escola e da administração
regional, onde o currículo é (re)adaptado em função das características e necessidades
de cada contexto específico. Fala-se, por isso, a este nível de currículo como prática e
como construção. As escolas, tendo em conta a região em que estão inseridas e as suas
condições internas, desempenham um papel activo na elaboração quer do projecto
educativo, quer dos projectos curriculares, dentro de um quadro específico de
organização curricular e administrativa; iii) o contexto de realização, no âmbito da sala
de aula. É o último nível de decisão do processo de desenvolvimento curricular, sendo
neste domínio que as acções, tanto do professor como do aluno, são mais marcantes e
decisivas em termos de ensino e aprendizagem.
3 A este respeito o autor refere-se a Róman e Diéz (1989) para identificar as características quecaracterizam os modelos aberto e fechado. Dessa análise salientamos as seguintes: no modelo aberto aaplicação do Currículo oficial é flexível, permite a criatividade do professor, é desenvolvido em funçãodo contexto, é globalizador e de mínimos, é (re)criado pelos professores, possui objectivos (terminais eexpressivos), é centrado no processo, privilegia a avaliação formativa, assenta num paradigma cognitivo,o professor é reflexivo e crítico, é centrado no pensamento do professor e proporciona uma aprendizagemsignificativa; no modelo fechado a aplicação do Currículo oficial é rígida e a sua aplicação na aula émecânica, é obrigatório para todos os contextos, é detalhado e rígido, é aplicado pelos professores, possuiobjectivos de conduta e operativos, é centrado no resultado, privilegia a avaliação sumativa, assenta numparadigma conceptual e propicia uma aprendizagem memorística4 “Os currículos formais são os que obtiveram aprovação oficial por parte das autoridades estatais oulocais e são adoptados, por escolha ou decreto, por uma instituição ou pelos professores”(Goodlad,1991:63)
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
36
De facto, quer no segundo, quer no terceiro nível de decisão, da esfera de
competências da escola e dos professores, é necessário que estes tomem decisões, tidas
como “condição necessária e suficiente de profissionalismo e intervenção [política] na
organização e desenvolvimento do currículo, para que as ideias/palavras, tanto da
L.B.S.E., como dos instrumentos jurídicos que têm vindo a regulamentá-la, não se
resumam a isso mesmo” (Vilar, 2000: 22).
2.2. Modelos de Desenvolvimento Curricular
Sendo o desenvolvimento curricular um processo que decorre de um conjunto de
decisões tomadas em diferentes momentos e contextos, a forma como se operacionaliza
tal processo pode ser diferente. Neste sentido, a generalidade dos autores conclui que,
subjacente ao processo de desenvolvimento curricular, podemos identificar três modelos
distintos: o modelo centrado nos objectivos, o modelo centrado no processo e o modelo
centrado na situação (Pacheco, 2001).
Facilmente se compreende que, na presença de um conceito de currículo igual a
produto/programa/plano previamente definido(s), o processo de desenvolvimento
curricular se limita, basicamente, a duas fases distintas: a concepção e a implementação,
sem prejuízo da existência de um terceiro elemento, a avaliação. Estamos em presença
do que atrás designámos como modelo de desenvolvimento curricular centrado nos
objectivos, um modelo que denota uma separação nítida entre teoria e prática. O
currículo é desenvolvido à luz do que vulgarmente se designa por perspectiva tyleriana,
dado que o processo de desenvolvimento curricular assenta num esquema racional e
tecnológico, baseando-se em quatro questões fundamentais que Tyler (1991: 93)
considera que devem ser respondidas quando se desenvolve o currículo:
“1 – Que objectivos educacionais deve a escola procurar atingir?
2- Que experiências educacionais podem ser proporcionadas para que seja possível atingiresses objectivos?
3 – Como podem essas experiências educacionais ser eficazmente organizadas?
4- Como podemos determinar se esses objectivos estão a ser alcançados?”
Neste contexto, a actuação do professor assemelha-se à de um técnico, um
executor a quem compete transmitir conhecimentos a destinatários receptivos – os
alunos –, a quem é consignado o papel de reprodutores mecânicos com base na
memorização”(Pacheco, 2001: 139). Professor e aluno assumem um papel passivo e
meramente reprodutor.
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
37
Num modelo de desenvolvimento curricular centrado no processo, o currículo é
perspectivado como um projecto, privilegiando-se a resolução de questões práticas. O
professor desempenha um papel central no âmbito da decisão curricular, uma vez que
lhe compete, de forma mais ou menos autónoma, adaptar o currículo proposto a nível
nacional à situação específica da escola e dos alunos, sendo-lhe proporcionada, também,
alguma liberdade para “elaborar e adaptar” materiais curriculares (Pacheco, 2001: 141).
A avaliação no modelo centrado no processo, afirma Stenhouse (1991: 200), não tem
uma função meramente quantitativa, já que deve ser vista como um instrumento de
melhoria das aprendizagens, remetendo o professor mais o papel de crítico do que de
um classificador.
Por último, no caso em que o currículo é perspectivado como um meio de
emancipação pessoal e profissional, surge o modelo de desenvolvimento do currículo
centrado na situação, ou modelo crítico de desenvolvimento do currículo, que se baseia
no trabalho cooperativo dos professores e de todos que intervêm no processo curricular,
bem como na sua capacidade de tomada de decisões. Este interesse emancipatório pode
ser tornado realidade pelo professor que adopte uma postura crítica e auto-reflexiva e
que “não agindo isoladamente, consagra a sua autonomia curricular perante a liberdade
de elaborar os programas e materiais e de propor as actividades e metodologia
didáctica” (Pacheco, 2001: 142).
Podemos considerar que em Portugal, neste momento, o processo de
desenvolvimento curricular assenta num modelo mais centrado no processo, pois, quer
os princípios inerentes à Reorganização Curricular do Ensino Básico, quer à Autonomia
das Escolas, que apontam para uma prática organizada por projectos, estão orientados
para o desenvolvimento de estratégias que permitam a resolução der situações concretas
da comunidade educativa.
2.3. Programação e planificação do processo de ensino-aprendizagem
Depois desta breve reflexão sobre o conceito de desenvolvimento curricular e os
modelos que podem estar na base desse processo, decidimos centrar-nos mais
detalhadamente no domínio da programação e planificação do processo de ensino-
aprendizagem, uma vez que são tarefas imprescindíveis para a realização do(s)
projecto(s) curricular(es) de turma, afinal o objecto de estudo deste projecto de
investigação.
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
38
No sistema educativo português, o currículo é concebido numa primeira etapa a
nível nacional, onde, fruto de uma orientação político-administrativa, são traçados os
programas, que congregam um conjunto de linhas orientadoras cuja finalidade é a de
orientarem a programação e planificação curriculares subsequentes, englobando ainda
alguns critérios de organização curricular. Assim se compreende, como refere Ribeiro
(1990), que esta dimensão macrocurricular inclua a construção de um currículo oficial,
tarefa que não pode ser alheia à concepção e delineamento de um modelo de
organização curricular mais global.
É nesta ordem de ideias que importa clarificar que nos referimos a Programa no
sentido que lhe é conferido por Zabalza (2003: 12), isto é, como “o documento oficial
de carácter nacional ou autonómico em que é indicado um conjunto de conteúdos,
objectivos, etc. a considerar a num determinado nível”. Dito de outra forma, uma série
de prescrições que resultam de uma decisão politíco-administrativa, o que pressupõe
que esta seja uma tarefa levada a cabo por especialistas e deva constituir “o ponto de
referência inicial para qualquer professor que deseje reflectir sobre o que deve ser o seu
trabalho”(idem:13).
À semelhança do que se passa no processo de desenvolvimento curricular,
também a programação e planificação do processo de ensino-aprendizagem têm
características próprias, em função do modelo educativo que se perfilha. De acordo com
a perspectiva de análise racional de Tyler (1991), são propostos alguns procedimentos
que devem presidir à elaboração de um currículo ou plano de ensino: i) os objectivos
educacionais que a escola deve procurar alcançar; ii) a selecção de experiências de
aprendizagem que possam ser úteis na consecução desses objectivos; iii) a organização
das experiências de aprendizagem para um ensino eficaz; iv) a avaliação da eficácia das
experiências da aprendizagem.
Deste ponto de vista, no currículo prescrito podem analisar-se cinco níveis de
concretização, como a elaboração de planos curriculares ou planos de estudos, a
elaboração de programas, a proposta de orientações programáticas, a produção e
selecção de materiais curriculares, a definição de normativos, modalidades e processos
de avaliação dos alunos. Sendo que, no caso do plano curricular é englobada a
organização das disciplinas e/ou áreas curriculares de um dado nível de ensino, a
organização dos grupos de docência, as condições de avaliação, a delimitação dos
materiais curriculares, nomeadamente os manuais escolares (Pacheco, 2001).
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
39
Não deixando de reconhecer que esta perspectiva determina, ainda, muito do que
se passa nas escolas, nem a importância do que é decidido a nível central, situamo-nos
mais numa perspectiva prática/crítica de concepção dos processos de ensino-
aprendizagem, em que a resolução de problemas e o desenvolvimento integral dos
alunos são os principais eixos estruturantes.
Ainda no que se refere a esta problemática, Vilar (2000) considera a existência de
três níveis de concretização da planificação curricular: o primeiro, que corresponde às
decisões [políticas] relativas da administração educativa; o segundo, que diz respeito
às decisões [políticas] tomadas em cada escola relativamente à adaptação ou
contextualização das propostas apresentadas pela administração educativa; o terceiro,
que se refere à intervenção que as equipas docentes e os professores tomam em relação
às decisões tomadas nos níveis anteriores, onde assumem as suas intervenções
educativas concretas.
No sistema educativo português regulado, pela Lei de Bases onde se postulam os
princípios que orientam a organização curricular do ensino, no que se refere ao ensino
básico, aceita-se como válida uma “escola básica integrada com um currículo comum a
todos os alunos, que tem uma finalidade de orientação e está dividido em ciclos ou
numa sequencialidade progressiva”(Pacheco, 2001: 80).
Portanto, é adoptado o modelo de organização curricular baseado em disciplinas
e/ou áreas disciplinares, que implica, no caso dos 2º e 3º ciclos, um regime de docência
em que há um professor por disciplina ou área curricular, especializado naquela área,
pertencendo a um grupo disciplinar específico. Já em relação ao 1º ciclo do ensino
básico, adopta-se um modelo integrado, globalizado ou globalizante, que, embora possa
ser coadjuvado em áreas especializadas, visa promover mais a “integração psicológica
que propriamente a estrutura formal e temática interna”, representando a “tentativa de
superar a atomização do conhecimento” (idem: 83).
O Programa deve, portanto, ser considerado como um primeiro passo do
desenvolvimento curricular, ao que se segue a programação, através da qual se
territorializam os pressupostos gerais nele inseridos, isto é, “reinterpretam-se, a partir
dos parâmetros de uma situação e de condições específicas, as previsões e
compromissos standard do Programa” (Zabalza, 2003: 18). Desta forma, compete à
programação completar e reinterpretar o Programa, aproximando-o da realidade do
contexto em que se vai desenvolver.
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
40
Desta forma, a programação diz respeito ao caminho que, em cada escola, é
percorrido a partir do Programa e à forma como dão resposta às necessidades educativas
dos seus alunos. Aliás, no contexto da Reorganização Curricular do Ensino Básico, a
programação é mais pensada em termos de escola, de comunidade escolar ou de equipa
de professores, que assumem a incumbência de elaborar os projectos de escola.
Pacheco (2001: 92) refere que programar “significa procurar uma orientação
curricular ajustada à escola e aos alunos, em função de um programa de ensino
previamente proposto pela administração central”. A programação realiza-se assim, ao
nível da gestão, sendo entendida como um projecto curricular que é elaborado com base
no projecto educativo, estebelecendo um elo de ligação entre o currículo prescrito e o
currículo planificado.
Por conseguinte, é no contexto de realização que se distinguem as fases do
currículo planificado e do currículo real, onde o professor intervém de forma
substantiva, na medida em que lhe cabe o papel de organizar e gerir a programação, que,
por sua vez, se transforma num projecto curricular de turma ou projecto didáctico, que o
professor concretiza a aula.
A este respeito, Zabalza (2003: 48) refere que se analisarmos um pouco o
processo de planificação encontramos:
“- um conjunto de conhecimentos, ideias ou experiências sobre o fenómeno a organizar,que actuará como apoio conceptual e de justificação de que se decide;
- um propósito, fim ou meta a alcançar que nos indica a direcção a seguir;
- uma previsão a respeito do processo a seguir que deverá concretizar-se numa estratégiade procedimento que inclui os conteúdos ou tarefas a realizar, a sequência das actividadese, de alguma forma, a avaliação ou encerramento do processo”.
Segundo o autor, pode haver dois modos diferentes de tratar a planificação: se,
por um lado, se pode centrar no pensamento do professor, isto é, na forma como
processa a informação a planificar, por outro lado, deve centrar-se, também, na sucessão
de condutas, nos passos que são dados durante o seu desenvolvimento.
Nesta ordem de ideias, a planificação é encarada como um processo de tomada de
decisões em três momentos – decisões pré-activas5, interactivas 6 e pós-activas –
5 Jackson (1986) referido por Pacheco (2001) considera que a decisão pré-activa envolve toda a tomadade decisão pelo professor na ausência de alunos, o que implica uma maior racionalidade.6 Jackson (1986) referido por Pacheco (2001) considera que as decisões interactivas dizem respeito àsdecisões tomadas num contexto de realização do currículo.
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
41
podendo explicar-se quer como uma actividade prática, quer como um processo
psicológico.
A este acto estão, pois, associados alguns aspectos que uma planificação engloba,
tais como, funções, factores, tipos e modelos de planificação didáctica.
Relativamente às funções da planificação, pode dizer-se que a principal função é a
de organizar e prever a interacção professor/aluno:
“o acto de planificar apresenta-se como uma competência específica e imprescindível doprofessor que lhe permite configurar, através de uma plano mental ou escrito, os várioselementos didácticos nos quais se baseará para estruturar o processo de ensino-aprendizagem, proporcionando-lhes uma redução de incerteza e insegurança”(Pacheco,2001: 105).
Contudo, o professor pode ser influenciado, ainda que indirectamente, por vários
factores que intervêm no processo de planificação e para os quais deve estar atento,
como é o caso das diferenças individuais entre processos, tais como as crenças
educativas, já que o professor desenvolve o currículo de forma pessoal, sendo os seus
valores e conhecimentos que mais pesam na tomada de decisões pré-activas. Outros
factores importantes são o da informação sobre os alunos com que o professor vai
trabalhar e que vai adquirindo de forma progressiva, as estratégias e materiais
instrutivos alternativos, as limitações institucionais e administrativas (organização da
escola, constituição das turmas, horário do professor, etc.), bem como as pressões
externas (económicas, ideológicas e académicas).
Dos factores assinalados, e reconhecendo que todos podem interferir na
planificação do professor, não podemos deixar de salientar a influência que os materiais
curriculares (alternativos) desempenham neste processo De facto, o papel dos
mediadores da planificação é muito importante, pois, se, por um lado, o professor é, ele
próprio, “um mediador entre o currículo prescrito e os alunos”, por outro lado, “está
dependente de materiais didácticos ou mediadores curriculares, que actuam como guias
para o ensino” (Pacheco, 2001: 107).
Zabalza (2003) assinala, ainda, que livros de texto, materiais comerciais, guias
curriculares, revistas e experiências são os mediadores mais frequentemente utilizados.
Contudo, os livros de texto e os manuais escolares são os privilegiados, até porque,
existindo a obrigatoriedade em adoptar um manual em cada disciplina, o programa está
sujeito à interpretação que cada editora faz dele, cabendo ao professor a decisão de
seguir o manual ou de trabalhar directamente com o programa. Infelizmente, o que se
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
42
tem verificado, em muitos casos, é que o professor, no momento de planificar, aceita o
que é proposto no manual adaptando a ele “as suas próprias previsões sobre o
ensino”(idem: 49).
No que concerne aos tipos de planificação, Vilar (2000) distingue três tipos de
planificação de escola: a planificação estratégica, onde são contextualizadas as opções
educativas e os princípios orientadores (o programa); a planificação táctica, que diz
respeito à planificação anual ou plurianual; e a planificação operativa, referente à
programação das unidades educativas.
Por sua vez, Pacheco (2001) considera diferentes tipos de planificação, que
servem distintas finalidades: a planificação anual, que partindo do programa, estabelece
o conteúdo geral e selecciona os recursos a usar a longo prazo; a planificação trimestral
e a planificação de unidade, onde é efectuada uma calendarização a médio prazo; a
planificação semanal e a planificação diária, mais próximas do dia-a-dia da sala de
aulas.
Finalmente, em relação ao modelos de planificação, costumam distinguir-se dois
modelos principais: o modelo por objectivos e o modelo processual. Enquanto o
primeiro se integra numa perspectiva tecnicista de ensino, onde os objectivos são
hipervalorizados, “chegando-se mesmo a uma atomização dos mesmos em níveis e
subníveis (taxonomias)” (Gomes, 2004: 105), o segundo modelo, apesar de os
objectivos também estarem presentes, dá mais relevo aos processos de aprendizagem e
não apenas aos resultados. A este respeito, Vilar (2000: 48) refere ainda um modelo de
planificação em função de actividades, como “conjunto lógico de actividades que,
tendo em vista determinadas finalidades, configuram uma prática educativa que
compromete os professores e os seus respectivos alunos”, inserindo-se mais no modelo
processual a que aludimos no período anterior.
Em suma, podemos considerar que a planificação do processo de ensino-
aprendizagem, em qualquer um dos diferentes níveis de decisão curricular, é algo mais
do que definir objectivos, conteúdos, métodos ou critérios de avaliação significa:
“pensar, valorizar e tomar decisões que valham a pena, entre outras coisas, sobre situaçõesquotidianas, sobre possíveis acontecimentos imprevisíveis, sobre um colectivo de pessoasagrupadas segundo a sua idade, num espaço chamado aula, pessoas que são rapazes eraparigas com um nome e um rosto que às vezes transmitem alegria, ou aborrecimento e,em ocasiões, cansaço”(Salinas, 1994: 137).
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
43
2.4. A avaliação no contexto da Reorganização Curricular do Ensino Básico
Dos vários componentes que configuram a programação, a planificação e, por
consequência, o próprio processo de ensino-aprendizagem, decidimos dedicar uma
atenção especial à avaliação, por ser um elemento muito importante, transversal a todo
este empreendimento.
Ao longo do tempo, avaliação tem abrangido os mais diversos níveis, aspectos e
elementos, que vão desde os alunos e professores até à própria avaliação.
No contexto da Reorganização Curricular a avaliação passa a ser vista, acima de
tudo, como um processo formativo que ajuda o aluno a perceber as suas dificuldades e a
encontrar meios de ultrapassá-las. Assim, deve ser feito um esforço no sentido de
trabalhar o processo avaliativo de um modo inovador, mostrando aos alunos e aos pais
que o importante é ser capaz de mobilizar os conhecimentos para os utilizar em contexto
e que a avaliação vai ajudar a perceber de que modo podem realizar esse processo. A
avaliação “não existe, pois, de um modo isolado nem tão pouco é um processo neutro”
(Leite e Fernandes, 2002: 11).
Mais recentemente, tem vindo a exigir-se à escola que ultrapasse o seu papel
tradicional de mera transmissão de conhecimentos e que se esforce por ajudar os alunos
a construí-los, uma mudança que se enquadra numa concepção de formação básica igual
para todos. A avaliação é assumida na dimensão do aluno, das práticas, dos
instrumentos e do clima de aprendizagem. Na dimensão do aluno ganha relevância o
conceito de metacognição7 como processo de auto-regulação e de consciencialização
dos saberes que vão adquirindo. Esta auto-regulação só será eficaz se os critérios de
avaliação forem previamente conhecidos, negociados e o clima de aprendizagem
propicie o conflito cognitivo no aluno, bem como a vontade de o ultrapassar.
A reorganização curricular, orientada pelos objectivos que a Lei de Bases do
Sistema Educativo estabelece para o Ensino Básico, dá particular relevância à avaliação
das aprendizagens, que deve ser entendida como “um processo regulador das
aprendizagens, orientador do percurso escolar e certificador das diversas aquisições
realizadas pelos alunos ao longo do ensino básico”.
7 Sousa (1995: 25) define metacognição como “ saber acerca do saber ” e reconhece três tipos deconhecimentos metacognitivos: ao auto-conhecimento; o conhecimento da tarefa; e o conhecimento deestratégias.
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
44
A Reorganização Curricular do Ensino Básico, aprovada pelo Decreto-Lei n.º
6/2001, de 18 de Janeiro, estabelece as linhas orientadoras do enquadramento e da
generalização da gestão flexível do currículo, que além de corroborar os propósitos da
Lei de Bases do Sistema Educativo, prevê que as medidas a aplicar em matéria de
avaliação das aprendizagens sejam aprovadas, posteriormente, por despacho ministerial.
Foi nesse âmbito que foi publicado o Despacho Normativo nº 30/2001, de 22 de Junho,
comportando alguns conceitos novos para a generalidade dos professores,
nomeadamente, o de competências definidas no currículo nacional para as diversas
áreas e disciplinas de cada ciclo e os de projecto curricular de escola e de turma.
Assim, se o conteúdo do Decreto-Lei n.º6/2001 se refere, essencialmente, ao
desenvolvimento do currículo, cuja orientação principal consiste na institucionalização
da liberdade concedida às escolas de adaptar uma estrutura curricular nacional a
diferentes contextos locais, o Despacho Normativo nº 30/2001 tem como principal
objectivo regular a avaliação, dando maior ênfase à avaliação formativa, valorizando os
processos de auto-avaliação regulada e sua articulação com os momentos de avaliação
sumativa.
Em qualquer dos casos, a avaliação formativa é apontada como a principal
modalidade de avaliação do ensino básico, assumindo um carácter contínuo e
sistemático e visando a regulação do ensino e da aprendizagem, incluindo para o efeito
uma vertente de diagnóstico, que tem em vista recolher elementos que facilitem a
elaboração e adequação do projecto curricular de turma.
Por outro lado, a avaliação sumativa consiste na síntese das informações
recolhidas sobre o desenvolvimento das aprendizagens e competências definidas para
cada área curricular e disciplina, no quadro do respectivo projecto curricular de turma,
concretizando-se no final de cada período lectivo, de cada ano lectivo e de cada ciclo.
Compreende-se, assim, a importância da avaliação como elemento fundamental e
estruturante do currículo.
Mas, compreender as práticas de avaliação é, no dizer de Pacheco (1995: 12),
“uma actividade fundamental para compreender o processo de ensino-aprendizagem.Porém, tal estudo só ganha sentido se tiver em conta o processo e o sistema em que aavaliação se inscreve: o processo é o da envolvência de toda a comunidade educativa namelhoria do ensino-aprendizagem e o sistema é o da concepção de um ensino básico (gerale obrigatório) que aponta para a não retenção dos alunos”.
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
45
Neste sentido, a avaliação deverá valorizar a componente reflexiva do processo de
ensino-aprendizagem e gerar uma maior sensibilidade dos docentes para esta temática.
Isto porque é “neste contexto de promoção e desenvolvimento do indivíduo que é
importante que, tanto o ensino como a avaliação, passem por consideráveis
transformações para se adaptarem às novas condições impostas pela própria sociedade,
não podendo ignorar-se que, cedo ou tarde, os alunos ingressarão numa actividade
profissional” (Alves, 2002a: 138).
A avaliação, de acordo com as finalidades definidas no Despacho Normativo n.º
30/2001, envolve interpretação, reflexão, informação e decisão sobre os processos de
ensino e de aprendizagem, tendo como principal função ajudar a promover ou melhorar
a formação dos alunos. Essa mesma avaliação assenta, de acordo com o mesmo
diploma, em cinco grandes princípios:
“- Consistência entre os processos de avaliação, as aprendizagens e as competênciaspretendidas, através da utilização de modos e instrumentos de avaliação diversificados, deacordo com a natureza das aprendizagens e dos contextos em que ocorrem;- Primazia da avaliação formativa, com valorização dos processos de auto-avaliaçãoregulada, e a sua articulação com os momentos de avaliação sumativa;- Valorização da evolução do aluno, nomeadamente, ao longo de cada ciclo;- Transparência do processo de avaliação, nomeadamente através da clarificação e daexplicitação dos critérios adoptados;- Diversificação dos intervenientes.”
Estes princípios apontam, ainda, para uma utilização variada de modos e
instrumentos de avaliação em cada ano e ciclo de ensino, atendendo às necessidades de
aprendizagem, percurso e evolução do aluno ao longo do ensino básico.
Com efeito, é colocada grande ênfase no carácter formativo da avaliação, uma vez
que esta modalidade de avaliação, refere Perrenoud (1993: 173), “ajuda o aluno a
aprender e o professor a ensinar”. No entender de Leite e Fernandes (2002: 41),
emergem três ideias-chave na concretização da avaliação formativa:
“regular (processos); reforçar (êxitos); remediar (dificuldades). Estes três eixos da avaliaçãoformativa implicam o recurso a procedimentos que permitam definir o que se consideraimportante aprender, situar o aluno face a essas aprendizagens, identificar a origem dessasdificuldades e os meios mais adequados para as remediar ou para enriquecer as suasaprendizagens”.
Mais do que uma avaliação-sanção, trata-se de uma avaliação que, como sustenta
Cortesão (1993), contribui para uma boa regulação das actividades de ensino e de
aprendizagem e que, segundo Allal, Cardinet e Perrenoud (1986: 132), se operacionaliza
através das seguintes etapas:
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
46
“- recolha de informações relativas aos progressos e às dificuldades de aprendizagemencontradas pelos alunos;- interpretação destas informações numa perspectiva de referência criterial e, na medida dopossível, diagnóstico dos factores que estão na origem das dificuldades de aprendizagemmanifestadas pelo aluno;- adaptação das actividades de ensino e de aprendizagem em função da interpretação feitaàs informações recolhidas”.
Nesta perspectiva, a avaliação formativa tem um carácter próprio e manifesta-se
de forma qualitativa, apresentando também uma vertente diagnóstica, que é posta em
forma de lei, no ponto 17, do Despacho Normativo 30/2001, ao referir que “a avaliação
formativa inclui uma vertente diagnóstica tendo em vista a elaboração e adequação do
projecto curricular de turma e conduzindo à adopção de estratégias de diferenciação
pedagógica”.
A avaliação formativa é, pois, uma concepção da avaliação que visa, sobretudo,
uma melhoraria dos processos de aprendizagem. Neste sentido, pressupõe “um conjunto
de práticas variadas que se integram no processo de ensino-aprendizagem e que
procuram contribuir para que os alunos se apropriem melhor das aprendizagens
curricularmente estabelecidas como importantes” (Cortesão, 1993: 15).
Por conseguinte, a avaliação formativa pressupõe uma avaliação diagnóstica dos
pontos de partida dos alunos e das situações relativas aos processos que conduzem à
aprendizagem.
Subjacente à modalidade de avaliação formativa, surge a concepção de avaliação
formadora que, não pondo em causa os pressupostos da avaliação formativa, define,
mais objectivamente, os papéis dos principais intervenientes no processo avaliativo
(professor e aluno). Aqui, o papel atribuído à auto-avaliação é central, de maneira que a
apropriação dos critérios de avaliação e dos objectivos do professor se constituem como
fundamentais neste processo.
Nas palavras de Abrecht (1994: 49), a avaliação formadora tem “como propósito
centralizar a perspectiva na regulação assegurada pelo aluno, distinguindo-se da
avaliação formativa, cuja regulação diz respeito, sobretudo, às estratégias pedagógicas
do professor”.
Por seu turno, subjacente às práticas avaliativas, formativa e formadora, a auto-
avaliação assume um papel determinante e central na concretização do processo de
avaliação e na identificação de problemas, contribuindo também para um
desenvolvimento mais integral do aluno. As práticas auto-avaliativas permitem “ao
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
47
aluno controlar em pequenos espaços a sua aprendizagem, consciencializar os seus
progressos e suas dificuldades, não acumular deficiências e lacunas, reflectir sobre os
seus erros para ensaiar outros caminhos” (Ministério da Educação, 1991: 34).
Todas estas nuances devem reflectir-se na qualidade de avaliação sumativa,
enquanto dimensão estruturante do processo de avaliação a nível escolar. Numa
perspectiva legal, a avaliação sumativa consiste na:
“formulação de uma síntese de informações recolhidas sobre o desenvolvimento dasaprendizagens e competências definidas para cada área curricular e disciplina, no quadro doprojecto curricular de turma respectivo, dando uma atenção especial à evolução do conjuntodessas aprendizagens e competências” (Despacho Normativo n.º 30/2001 de 19 de Junho,ponto 22).
Segundo Alves (2002a: 143), “a orientação dominante da avaliação sumativa
(pontual ou terminal) responde, assim, à lógica certificativa” e “conduz à atribuição de
uma classificação, numa escala de níveis de 1 a 5”, podendo ser “acompanhada, sempre
que isso se considere relevante, de uma apreciação descritiva sobre a evolução do
aluno”.
Neste sentido, a tomada de decisão deverá ser criteriosa e assente em princípios
objectivos e transparentes, que a par da apresentação dos resultados, num índice
quantitativo, seja fundamentada num relatório qualitativo, de forma a não lhe retirar a
sua função orientadora e construtiva, própria da avaliação educativa.
Esta objectividade e transparência assumem um papel primordial na progressão e
retenção do aluno, uma vez que, no ponto 35, do Despacho Normativo n.º 30/2001, se
determina que “a avaliação sumativa, realizada no final de cada ciclo, dá origem a uma
tomada de decisão sobre a progressão ou retenção do aluno, expressa através das
menções, respectivamente, de Aprovado(a) ou Não aprovado(a)”.
Objectividade, rigor e transparência são, pois, aspectos a ter em conta, uma vez
que a avaliação sumativa, responsável última pela progressão ou retenção, determina,
em muito, a vida futura do aluno. Assim se compreende a importância do papel do
professor em todo este processo, a quem está consignada essa responsabilidade, aspecto
que se relaciona com o grau de autonomia profissional que detém e que, de forma
directa ou indirecta, condiciona muito daquilo que decide ao nível da escola e da sala de
aulas.
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
48
3. AUTONOMIA CURRICULAR DO PROFESSOR
O contexto de realização, último nível do design curricular, caracteriza-se por uma
maior incidência no que respeita à intervenção dos professores e dos alunos. As tarefas
que os professores desempenham assumem grande importância e os seus papéis são
decisivos no desenvolvimento do currículo. De facto, a autonomia da escola, “que
claramente traduz (mais) um propósito político, tem tonificado a retórica actual que
desagua no sistema educativo, mexendo com actores nele directa ou indirectamente
implicados” (Paraskeva, 1998: 107).
No contexto da autonomia curricular o professor é encarado como um actor com
diversas facetas, pois, “pode ser, por um lado, um actor curricular que tem a tarefa
curricular da implementação e da execução de decisões prescritas” e, por outro, “goza
de uma autonomia funcional que lhe advém da existência (ou inexistência) de ineficazes
instrumentos de controlo curricular” (Pacheco, 2001: 101).
Nesta perspectiva, o professor assume um papel de árbitro da decisão curricular,
“sendo-lhe associado o que de positivo ou negativo se faz na escola, uma vez que é o
protagonista de uma cadeia de decisões que, natural e logicamente, lhe pertence
terminar, moldando à sua “medida” o currículo sucessivamente prescrito, apresentado,
programado e planificado.” (idem, ibidem)
Portanto, o professor age de forma planificada e colegial, articulando aquilo que é
prescrito ao nível político-administrativo com aquilo que é a realidade, isto é, o seu
trabalho na escola com alunos. É na contextualização do que lhe é apresentado,
produzindo, implementando e avaliando as suas performances e as dos seus alunos, que
o professor desempenha um papel activo no desenvolvimento do currículo.
É neste sentido que Morgado (2000: 95) defende que a autonomia curricular deve
ser vista como “a possibilidade dos professores tomarem decisões no processo de
desenvolvimento curricular, tanto no que diz respeito à adaptação do currículo proposto
a nível nacional às características e necessidades dos estudantes e às especificidades do
meio em que a escola se insere, como no que se refere à definição de linhas de acção e à
introdução de temáticas que julguem imprescindíveis para a sua plena formação”.
Segundo Pacheco (2001), o professor goza, em termos curriculares, de uma
autonomia de orientação dentro de referenciais que lhes são impostos, mas que não
determinam nem a sua acção, nem o seu pensamento. Analisando os elementos de
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
49
operacionalização do currículo à luz das práticas curriculares dos professores, o autor
(idem: 102) apresenta uma referencialização da autonomia curricular dos professores da
qual retira as seguintes ilações:
“a) Relativamente aos objectivos, o professor goza de uma autonomia colegial, trocada comos outros professores, na formulação de objectivos de aprendizagem ao nível da turma, deacordo com o referente dos objectivos curriculares de ciclo.
b) Quanto aos conteúdos, o professor não tem autonomia para os seleccionar e organizar,devido à existência de programas, traçados a nível nacional, mas já dispõe de totalautonomia, sempre no quadro da programação realizada no âmbito do grupo de docência,para a sua transformação didáctica, isto é, sequenciação e extensão de modo a que sejamcompreendidos pelo aluno. O grau de liberdade com que o professor “dá” os conteúdos fazparte integrante de uma autonomia subjectiva que é um dos aspectos fundamentais docurrículo oculto, mesmo perante a obrigatoriedade ou não de cumprir o programa.
c) No tocante às actividades e recursos didácticos o professor goza de uma amplaautonomia. Os programas contêm sugestões metodológicas que são meras recomendações esão filtradas ainda pelas sugestões dos manuais e/ou livros de texto. Primeiro, em grupo, e,depois, individualmente, o professor faz a gestão do tempo de aprendizagem sem que estejasubmetido a um referente prescritivo.
d) Poder-se-á falar de autonomia compartilhada para enquadrar a utilização do manual e /oulivro de texto por parte do professor dado que a escolha do manual pertence ao conjunto deprofessores e torna-se num material curricular de uso obrigatório. É evidente que a suautilização cai no foro íntimo da turma e não impede a produção e utilização de outrosmateriais curriculares.
e) Por último, no que se prende com a avaliação do rendimento dos alunos, o professordispõe tanto de uma autonomia colegial, na observação das modalidades e procedimentosavaliativos, como de uma autonomia subjectiva na aplicação dos critérios pelos quaisavalia”.
Portanto, é legítimo afirmar que a autonomia curricular dos professores pode ser,
por um lado, relativa, subjectiva, (com)partilhada, e, por outro, total, isto é, isenta de
quaisquer influências normativas. Aliás, para Estrela (2001), constrangimentos de
natureza institucional e toda a espécie de normativos gerais e locais, limitam mas não
anulam a autonomia, pois, apesar da sua existência, os professores sempre geriram a
sala de aula com alguma independência.
No fundo, autonomia diz respeito à “capacidade que qualquer organismo/
entidade, individual ou colectiva, detém de se reger por leis próprias, de actuar, de se
orientar, de resolver os seu problemas, sem ter necessidade de recorrer a outrem”
(Morgado, 2000: 49).
Na opinião de Alves (2002b), se considerarmos que autonomia só entra nos
discursos, quer da administração central, quer das escola em 1986, com a publicação da
Lei de Bases do Sistema Educativo, verificamos que é a partir desta data que se procura
caminhar no sentido de se transferirem poderes e decisões tomadas no contexto nacional
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
50
para o contexto local, de maneira a que se reconheça a escola como centro de decisões e
a comunidade escolar como parceira indispensável na tomada de decisões. Contudo, a
autora (idem) considera que esta descentralização, e consequente autonomia relativa das
escolas, pode ser sinónimo de evolução, na medida em que estas passam a poder tomar
decisões relativas às finalidades, à flexibilização curricular e às modalidades de ensino.
Nesta perspectiva, os professores devem procurar situar-se, compreender onde
estão os seus verdadeiros interesses e saber se eles estão salvaguardados. Todavia, o que
se tem verificado é que a retórica da autonomia, aparentemente virtual, não tem
conseguido implicar aqueles de quem, na verdade, ela depende. Aos professores é
exigida uma acção para a qual não se encontram minimamente motivados, o que
permite fruir uma autonomia decretada, encarada como uma mudança puramente
administrativa e não como algo desejado pelos professores.
Em contrapartida, Estrela (2001: 135) salienta que “os professores não podem
continuar a alimentar a imagem de funcionários públicos acomodados e têm de se
assumir não só como interpretes mas como actores da acção educativa, explorando as
margens de autonomia que os textos legais, tornam, hoje possível”.
Com efeito, nunca os normativos legais concederam à escola e aos professores
tanta autonomia, ainda que, muitas vezes, seja mais formal e discursiva do que real, o
que permite constatar que, por falta de meios de concretização, significa dar com uma
mão e tirar com a outra. Nesse sentido, entendemos que o professor deverá aproveitar
aquilo que lhe é facultado, assumindo as competências que detém em termos de
desenvolvimento do currículo, tanto em termos colectivos – pela concepção do projecto
curricular de turma – como em termos individuais – na construção do projecto didáctico
–, enquadrando a sua actuação no âmbito da interpretação e da decisão.
Segundo Pacheco (2001: 103), “um modelo didáctico, enquanto estrutura
conceptual e simbólica, é uma representação da realidade em que o professor intervém e
que a torna interpretativa e explicativa”. Partindo desse pressuposto, o currículo real,
enquadrado pelos elementos de um modelo didáctico, transforma-se num projecto
curricular de turma, ou num projecto didáctico quando o professor planifica e concretiza
a aula, sendo a esse nível que princípios como a diferenciação curricular e adaptação
curricular se enquadram.
CAPÍTULO II – A centralidade do currículo na concepção e realização dos processos de ensino-aprendizagem
51
Na tomada de decisões por parte do professor, quer estas sejam pré-activas –
quando planifica, independentemente dos diferentes modelos, tentando prever, orientar
e perspectivar a sua acção e a dos alunos –, quer sejam interactivas – incidindo sobre o
currículo realizado, dando, regra geral, espaço para o surgimento de um currículo oculto
ou informal – há sempre espaço para que professores e alunos modelem a organização
do processo de ensino e aprendizagem na base das suas crenças, atitudes e saberes.
A questão da autonomia curricular apresenta-se, assim, como lembram Morgado e
Paraskeva (1998: 119), como uma “ferramenta ideológica” que, embora utilizada numa
lógica descentralizadora que pretende conferir às escolas e aos professores poderes de
decisão a nível local, “se socorre das mesmas práticas que tonificam o discurso da
centralização precisamente porque ambos possuem a mesma paternidade ideológica que
é a burocracia”.
Convém lembrar que, em Portugal, este problemática surge em 1998, com a
publicação do Decreto-Lei n.º 115/A, de 4 de Maio, atribuindo-se às escolas uma maior
autonomia, no quadro de uma gestão descentralizada. Neste sentido, entende-se que a
autonomia da escola se concretiza pela elaboração de um projecto educativo,
implicando e responsabilizando os diversos intervenientes na vida escolar, adequando as
características e recursos da escola à comunidade em que se insere.
Por conseguinte, passa a ser necessário o domínio de competências próprias em
vários domínios, particularmente ao nível da gestão de currículos, de programas e de
actividades de complemento curricular, da gestão de espaços e tempos de actividades
educativas, da orientação e acompanhamento dos alunos. Competências essas que
permitem compreender que a autonomia curricular é o que os professores “extrapolam
das suas próprias práticas para a construção do seu próprio quadro teórico. Ou seja, é a
realidade que extrapolam para a concepção do currículo como projecto, como prática
deliberativa, como processo colegial” (Morgado e Paraskeva, 2000: 31).
CAPÍTULO III
A IMPORTÂNCIA DA CONSTRUÇÃO DE PROJECTOS CURRICULARES
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
53
1. CONCEITO DE PROJECTO
Nos dias de hoje o emprego da palavra projecto vulgarizou-se tanto ao nível
pessoal como profissional. Nos nossos discursos quotidianos, cada vez mais, utilizamos
expressões como, projecto de vida, projecto de férias, projecto de uma casa, área de
projecto, projecto educativo, projecto curricular, entre outras. E, se estamos perante um
conceito cuja utilização pode, em certos casos parecer “abusiva”, a verdade é que o seu
uso recorrente deixa transparecer que o conceito de projecto está impregnado de uma
significativa de políssemia.
Geralmente, um projecto pode congregar um conjunto de actividades ou acções,
minimamente coordenadas, onde estão previstos pontos de partida e de chegada com o
intuito de alcançar determinados objectivos, definidos em função de uma qualquer
necessidade sentida.
O termo projecto pode assim ter várias conotações e ser utilizado com os mais
variados sentidos. Normalmente associamo-lo a um plano, um propósito, um desígnio
ou, até mesmo, a um esboço de uma acção futura, significado bem expresso em
qualquer dicionário de uso comum. Existe, pois, uma certa pretensão de realizar uma
acção futura, neste sentido, Llavador e Alonso (2000: 72) referem que “na sua acepção
mais frequente, o projecto significa dar um sentido à acção transformadora do aqui e
agora, mediante uma representação ou esboço antecipatório da obra a realizar.”
Por outro lado, das variadas acepções que actualmente existem em relação ao
conceito de projecto,- “dos projectos individuais, aos projectos de grupo e aos projectos
das organizações; dos projectos profissionais, aos projectos de formação; dos projectos
de uma vida, aos projectos, mais prosaicos, para uma férias ou fim-de-semana”-, todas
elas se relacionam num mesmo denominador comum - que o projecto se transforme
“num ritual que acreditamos ser capaz, só por si, de dar um sentido ao nosso
destino”(Barroso, 1992: 17).
No fundo, um projecto pode, também, ser encarado como “um conjunto de
intenções” e que, na sua acepção comum, não deve ser compatível com a ideia de
improvisação, sendo que a sua função é “servir de guia ao curso da acção” (Morgado,
2000: 82).
Contudo, estas acções nem sempre “decorrem conforme os desígnios
preestabelecidos, uma vez que, devido à natureza multidisciplinar e heterogénea do
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
54
próprio discurso social, é impossível prever todas as suas implicações e consequências,
sobretudo quando estas são de carácter educativo”(Llavador e Alonso, 2000: 73). O
projecto pode ser entendido como fundamento para “acções logicamente encadeadas e
racionalmente orientadas para alcançar determinados fins específicos e assumidos por
todos”(idem: 74-75).
Com efeito, é legitima a assunção de que o projecto pode ter um vertente
antecipatória, ideia que é corroborada quer por Barbier (1993: 49), ao afirmar que “o
conteúdo de um projecto não tem a ver com acontecimentos ou objectos pertencendo ao
ambiente actual ou passado do actor que o elabora, mas com acontecimentos ou
objectos ainda não verificados”, quer por Boutinet (1990: 99), para quem o projecto
“deverá apoiar-se sobre a previsão para melhor conhecer o estado esperado do
ambiente” sendo que, neste contexto, a previsão tem um dimensão prospectiva. No
fundo, afirma Barbier (1993: 49), o projecto “não se debruça sobre factos, mas sobre
possíveis”.
O conceito de projecto não é novo no domínio da educação, nos últimos tempos
“fala-se de ‘projecto educativo de escola’, de ‘área de projecto’, de ‘projecto
tecnológico’, de ‘projecto curricular de escola’, do ‘projecto’ em que estamos
envolvidos, da ‘metodologia de projecto’ que nos orienta, etc.” e, embora todos esses
projectos tenham significados diferentes, “todos eles têm em comum a característica de
serem um ‘projecto’”(Cortesão, Leite e Pacheco, 2002: 22).
No campo educativo, o termo projecto tem uma referência fundamental na
pedagogia de projecto que, para Vasconcelos (1999: 37), “reflecte uma nova visão do
aluno enquanto construtor do seu próprio saber, saber-fazer e saber ser, associando-se a
esta corrente pedagógica uma visão de escola autónoma, participada e pluricultural”.
Nesta perspectiva, Carvalho (1998: 144) afirma que os projectos trazem para o
terreno dos fenómenos educativos, na sua globalidade, “uma coerência que assenta,
sobretudo, na sua capacidade de atracção, reguladora e selectiva, dos conceitos - e das
inter-relações conceptuais - que lhe são mais favoráveis”.
Assim, o termo projecto apresenta-se como designação de um conceito que
procura unificar vários aspectos do processo de ensino-aprendizagem. Podendo ser
definido de diversas formas, há, contudo, um conjunto de características que lhe estão
geralmente associadas:
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
55
- um projecto é uma actividade intencional, pois o seu desenvolvimento
pressupõe que os diferentes actores nele envolvidos formulem um objectivo
que norteará as actividades e está associado a um produto final que, por sua
vez, pode ter várias formas mas sempre reflexo do objectivo inicial e do
trabalho realizado;
- um projecto requer a existência de uma margem considerável de iniciativa e
autonomia, de todos que nele estão envolvidos, sendo também importante que
exista cooperação entre os co-responsáveis pelo trabalho e escolhas levadas a
cabo nas diferentes fases do seu desenvolvimento;
- um projecto deve possuir autenticidade, o que requer alguma originalidade
para que este não se torne uma imitação de trabalhos já feitos por outros ou de
um trabalho de natureza livresca;
- um projecto envolve complexidade e incerteza devido à natureza das tarefas
que precisam ser ‘projectadas’;
- por último, um projecto deve ser prolongado e faseado, ou seja, a sua própria
natureza supõe que seja desenvolvido ao longo de um período mais ou menos
longo, decorrendo em fases distintas, que vão desde a formulação do objectivo
central, o planeamento, a execução e a apresentação dos resultados (Ponte et al,
1998).
Nesta perspectiva, “o currículo, enquanto projecto, exprime uma arte de
construir intenções, construção essa regida colegialmente, sem que, contudo seja
impermeável a conflitos e tensões, uma vez que deve constituir-se num documento de
confluência” (Morgado e Paraskeva, 2000: 18).
A este respeito, Zabalza (1992: 88) refere que “uma escola centrada no currículo
é uma escola que consegue definir com clareza em que tipo de projecto educativo se
encontra empenhada”. O projecto de escola constitui, assim, a concretização prática do
currículo. Para o autor, uma escola baseada em projectos deve ser uma escola diferente
das outras escolas.
Embora o projecto possa ser entendido como “uma acção, com intenções bem
definidas, e que resulta de uma relação entre o que se deseja fazer e o que, de facto, se
pode e vai fazer” (Cortesão, Leite e Pacheco, 2002: 37), também requer que seja
precedido de uma planificação e sejam respondidas algumas questões, tarefa essa que
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
56
deve ser flexível, aberta e capaz de abranger situações imprevistas que se demonstrem
interessantes.
O surgimento da necessidade de elaborar projectos de escola leva,
inevitavelmente, a “uma ruptura nas formas de gestão do currículo por parte dos
professores”(Teodoro, 2006: 65), proporcionando-lhes uma maior autonomia e uma
responsabilidade acrescida em relação a vários aspectos como a qualidade das
aprendizagens, nomeadamente ao nível de decisão da sala de aula, onde a concepção e
implementação do projecto curricular de turma assume um papel central.
2. PROJECTOS DE ESCOLA
Como resultado da autonomia da escola, o uso da noção de projecto, passa pela
elaboração e realização dos projectos educativo e curriculares, que pressupõem, por um
lado, “enquanto sentido abstracto a ideia global de uma autonomia possível, dentro de
um quadro organizacional e, por outro, como síntese e coorporização de projectos a que
correspondem actividades de natureza formativa, instrutiva e administrativa” (Pacheco,
2001: 89).
Estes projectos situam-se quer ao nível de decisão curricular intermédia da
escola, no caso dos projectos educativo e curricular de agrupamento/escola, e ao nível
concreto do conselho de turma e da sala de aula, no caso do projecto curricular de
turma, constituindo assim o prolongamento das decisões tomadas ao nível político-
administrativo.
Os projectos de escola assumem o papel de “instrumento que sustenta a
mudança e preserva a autonomia, define a identidade de uma escola e confere coerência
à acção dos diferentes intervenientes” (Gomes, 1997: 27).
Será portanto nos projectos de escola – projecto educativo, projectos
curriculares de escola e de turma -, que centraremos a nossa atenção neste ponto, uma
vez que as mudanças que se pretende introduzir não poderão alhear-se dos benefícios
resultantes da concepção e utilização destes instrumentos.
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
57
2.1. Projecto Educativo
O projecto educativo da escola faz parte da agenda educativa há já alguns anos1,
no entanto, só em 1989 com a publicação do Decreto-Lei 43/89, de 3 de Fevereiro, foi
formalmente instituído, ao estabelecer o “Ordenamento Jurídico da Autonomia das
Escolas do 2º e 3º Ciclos do Ensino Básico e Secundário”. Este instrumento legal “visa
fundamentalmente inverter a lógica que se foi cristalizando na administração do sistema
educativo, a lógica top down, caracterizada por uma gestão demasiado centralista”
(Morgado, 2000: 91), concedendo às escolas a possibilidade de tomarem decisões
acerca dos processos de ensino-aprendizagem que desenvolvem.
Neste sentido, articulando os conceitos de projecto educativo, autonomia e
participação, o referido diploma começa, no seu preâmbulo por preconizar que “ a
autonomia de escola concretiza-se na elaboração de um projecto educativo próprio,
constituído e executado de forma participada”, referindo depois no Artigo 2º, ponto 1,
que se entende por autonomia de escola “a capacidade de elaboração e realização de um
projecto educativo em benefício dos alunos e com a participação de todos”.
Por sua vez, o Decreto-Lei 172/91, de 10 de Maio, que aprova o Novo Modelo
de Direcção, Administração e Gestão dos Estabelecimentos de Ensino Básico e
Secundário, possibilita o “enquadramento institucional do projecto educativo ao
possibilitar a concretização dos princípios da autonomia – descentralização -
participação”(Vasconcelos, 1999: 40). Aliás, é nestes princípios que o diploma se
fundamenta, quando, no preâmbulo, apresenta como objectivos “a prossecução de
objectivos educativos nacionais e a afirmação da diversidade através do exercício da
autonomia local e formação de projectos educativos próprios”.
Com a intenção de reforçar a autonomia da escola, e revogando o diploma
anterior2, é publicado Decreto-lei n.º 115-A/98, de 4 de Maio, que estabelece “O
Regime de Autonomia, Administração e Gestão dos Estabelecimentos Públicos de
Educação Pré-escolar e dos ensinos Básico e Secundário” e dos agrupamentos de
escolas, realçando “o papel crucial da escola enquanto local estratégico de decisão 1 Vasconcelos (1999) encontra as primeiras referências oficiais sobre projecto educativo nos“Documentos Preparatórios I e II” e “Proposta Global da Reforma” da C.R.S.E., de 1996.2 O Decreto-Lei 172/91, de 10 de Maio, apenas se aplica a um conjunto de escolas que se enquadram noNovo Modelo de Direcção, Administração e Gestão dos Estabelecimentos de Ensino Básico e Secundárioa título experimental. Este diploma não chega a ser generalizado porque, entretanto, foi revogado peloDecreto-Lei 115-A/98, de 4 de Maio.
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
58
educativa” (Morgado, 2000: 94). Este quadro legal fundamentado nos princípios da Lei
de Bases do Sistema Educativo e da Constituição da República Portuguesa, pressupõe o
desenvolvimento integral e equilibrado do aluno e continua assente em princípios que
valorizam à identidade de cada escola/agrupamento de escolas, bem como o seus
projectos educativos e curriculares.
O projecto educativo, realizado ao nível meso, é da competência de cada
instituição educativa e engloba a “definição das opções de formação por parte da escola
– observáveis nas intenções e nas práticas de dinamização do plano global de formação
– entendida como uma comunidade integrada num território educativo” (Pacheco, 2001:
90). Trata-se, portanto, de um projecto que estabelece a “definição dos vectores
fundamentais que orientam a realização do projecto formativo do que é proposto aos
alunos” (Morgado, 2000: 96).
Embora no campo das intenções o conceito de projecto educativo possa ser
considerado como “um dos instrumentos fundamentais para a mudança da escola de
serviço local do Estado para Comunidade Educativa, isto é, para uma escola com
autonomia e rosto próprios” (Rocha, 1996), nem sempre esse objectivo é
completamente operacionalizado no campo da prática.
Como refere Alves (2003), o projecto educativo pode-se tornar num mito, pois,
apesar de as escolas terem, regra geral, através de um grupo de trabalho, redigido e
aprovado o seu projecto educativo, foram poucas as escolas que levaram a cabo
esforços persistentes e continuados no sentido de redigir um projecto educativo que
realmente dê sentido estratégico e unificador à sua acção, as razões para a existência
deste mito residem, na maioria dos casos, na especificidade de modelo e da organização
escolares, mas é precisamente desta especificidade que nasce a necessidade de um
projecto educativo que “aumente a visibilidade dos processos de escolarização, que
reforce a legitimidade da escola pública, que globalize e unifique a acção educativa, que
mobilize e federe vontades e recursos”(idem: 72).
Neste quadro, a noção de projecto educativo de escola pode ser assumida numa
dupla asserção. Enquanto uns defendem que o projecto de escola é um meio
privilegiado de levar a democracia ao interior das escolas, onde “a inovação, o diálogo,
a concentração e a tomada de decisões colectiva, ligadas a uma maior circulação de
informação, a avaliação do próprio projecto levaria à passagem de uma democracia
representativa (muitas vezes apenas formal) a uma democracia participativa”, uma
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
59
democracia mais adequada ao tipo de organização da escola, outros consideram que “ a
generalização dos projectos de escola significa um primeiro passo para a
descentralização, ou apenas, desconcentração mais forte do sistema educativo”
(Fontoura, 1999: 107).
Em idêntica linha de pensamento, Barroso (1992: 28) salienta que a existência
de um projecto de escola decorre de duas lógicas distintas, que por vezes podem ser
conflituais, mas que “há toda a vantagem em conciliar: a lógica do desejo e a lógica da
acção. A primeira, assenta no primado da “ideologia” e valoriza a dimensão simbólica
do projecto; a segunda assenta, no primado da “racionalidade técnica” e valoriza a sua
dimensão operatória”.
Para Loureiro (2005: 53), o projecto educativo de escola apresenta-se “como um
documento de cariz pedagógico, que deve ser construído com a participação e recurso
da comunidade educativa, estabelecendo uma identidade própria, em conformidade com
o quadro legal”.
Numa linha de análise mais abrangente, Llavador e Alonso (2000: 89) partem de
três ideias, que consideram elementares para caracterizar o projecto educativo de escola:
”a) simplicidade; b) curto período de realização; c) não partir do zero, mas da
experiência acumulada na escola”. Para estes autores, se não forem tomados em
consideração estes requisitos básicos, “o trabalho de elaboração será tão enfadonho e o
resultado final tão desordenado que acabará por cansar a classe docente e, o que ainda é
mais grave, não servirá absolutamente de nada”.
Com efeito, a concepção, concretização e avaliação de um projecto educativo
pode apresentar-se como um desafio de grande exigência para as escolas, uma vez que
inerentes a este processo podem estar vários princípios. A esse respeito, Alves (2003:
73) indica que o projecto educativo:
“Estabelece linhas orientadoras do tipo de educação (instrução/ socialização/estimulação), que se quer proporcionar às gerações jovens; Resulta da reflexão, diálogo,posições, contraposições dos elementos da escola; Determinados os valores que devemser trabalhados no currículo explícito e oculto; Reconhece as ilusões, os interesses dosmembros da comunidade escolar; Unifica os critérios de actuações tendo em vista umamaior coerência; Reconhece os alunos como sujeito e principais interessados naeducação; Torna distintiva, singular a organização educativa; Introduz uma direcçãocentrada na escola-comunidade educativa; Apela à participação substantiva de todos osmembros da escola, salvaguardando as competências técnico-pedagógicas dosprofissionais da educação; Pressupõe uma liderança participativa, aberta, mobilizadora;Pressupõe a adopção de tecnologias educativas adequadas às necessidades doseducandos, dos problemas, dos contextos; Impõe uma estratégia de inovação; Esclareceas metas a atingir, os modos de avaliação dos processos e dos produtos (o quê, quem,
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
60
para quê, como…); Exige estruturas organizativas (concepção, monitorização,avaliação…)”.
Embora, a construção do projecto educativo de escola não tenha de obedecer
necessariamente a esquemas rígidos, raramente parte de “uma situação de tábua rasa”
(Fontoura, 1999: 118). Todavia, esta situação não impede que se tenham de se
“estabelecer objectivos coerentes com os objectivos nacionais”, nem que “as acções
nele previstas” sejam pertinentes (Gomes, 1997: 27). Na verdade, os dispositivos e os
recursos utilizados têm de ser eficazes e os procedimentos adoptados têm de ser
eficientes (idem).
Em suma, o projecto educativo de escola pode constituir “uma imagem
antecipada do caminho a seguir para intervir positivamente numa dada realidade”,
devendo, por isso, “expressar a intenção do que se deseja” e, ao mesmo tempo,
“conceber-se em torno de um plano que clarifique modos de operacionalização dessas
intenções” (Leite, Gomes e Fernandes, 2001: 13).
2.2. Projecto Curricular de escola/agrupamento
Sendo o projecto educativo o símbolo máximo da autonomia da escola, para
fomentar esta noção, no contexto da Reorganização Curricular do Ensino Básico, surge
o projecto curricular de escola que, por sua vez, privilegia o papel central da escola e
dos professores na gestão do currículo, sendo que “as estratégias de desenvolvimento do
currículo nacional, visando adequá-lo ao contexto de cada escola, são objecto de um
projecto curricular de escola, concebido, aprovado e avaliado pelos respectivos órgãos
de administração e gestão” (Decreto-Lei n.º 6/2001, Artigo 2º, ponto 3).
Assim, o projecto curricular de escola “é visto pela administração central como
um projecto que deverá ter como referente os limites estabelecidos a nível nacional, a
organização das diversas áreas e disciplinas do currículo, as cargas horárias e a
distribuição do serviço docente” (Pacheco e Morgado, 2002: 34).
É, portanto, ao nível de decisão do contexto de gestão, que se tomam medidas
com respeito à elaboração de projectos curriculares, isto é, “à modelação dos conteúdos
pelos professores atendendo à particularidade da escola, dos alunos e da comunidade de
professores” (Pacheco, 2001: 91). Nesta linha de ideias, o projecto curricular de escola
caracteriza-se, principalmente, pela sua adequação ao currículo nacional e à
especificidade da escola e dos alunos (Pacheco e Morgado, 2002).
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
61
A escola passa, assim, a ser vista não como um local onde se implementam
decisões curriculares prescritas pela administração central, mas como um local de
construção do currículo, e onde o currículo, por seu turno, “é um projecto antropológico
de crenças, valores atitudes e saberes que configuram um sistema, uma estrutura que
molda a aprendizagem” (idem: 27).
Apesar de, através do projecto curricular de escola, se pretender facilitar a
organização de dinâmicas de mudança que proporcionem aprendizagens com sentido
numa escola de sucesso para todos (Leite, Gomes e Fernandes, 2001: 17), a construção
do projecto curricular de escola não é tarefa fácil, pois deve resultar do consenso entre
os professores, pressupondo a existência de uma cultura de colegialidade num contexto
fortemente dominado pelo individualismo, para que sejam tomadas as decisões acerca
de uma série de elementos inerentes ao desenvolvimento curricular e aos processos de
ensino-aprendizagem.
Com efeito, “a concepção e operacionalização de um projecto curricular na
escola não se articula com iniciativas ocasionais ou que dependam do voluntarismo
pessoal e/ou esforço individual dos professores” (Freitas, 2001: 26).
Todavia, para se desenvolver a dinâmica do projecto curricular, importa ter em
mentes alguns princípios: “ adequação (à matriz nacional, ao contexto sociocultural e
aos alunos); exequibilidade; diferenciação; flexibilização; integração e globalização;
unidade na diversidade; coordenação e avaliação” (Alves, 2006: 79). Por outro lado, o
mesmo autor assinala que para além destes princípios, pode haver certas questões que
funcionem como roteiros de acção:
“ I) Como construir uma ambição e propósitos comuns na escola e em cada turma?;
ii) Como construir uma relativa unidade de acção, o máximo/mínimo denominadorcomum a todos os que interferem nos processos educativos?;
iii) como motivar e animar, federar vontades e recursos?;
iv) Como organizar pedagogicamente a escola: uma equipa docente para determinadoagrupamento de alunos; uma gestão flexível de tempos tendo em conta as necessidadesconcretas dos alunos…”
Por conseguinte, devem ser compreendidas diferentes as fases de elaboração de
um projecto curricular, que, Pacheco (2001: 95) resume nos seguintes passos:
“1.º - Identificação de necessidades curriculares, compaginando as necessidadesnacionais com as necessidades locais e regionais.
2.º - Agrupamento de professores e alunos: constituição de equipas didácticas detrabalho em função do projecto organizativo.
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
62
3.º - Integração curricular: busca da interdisciplinaridade.
4.º - Contextualização do projecto educativo.
5.º - Elaboração de um projecto curricular: construção de uma visão de conjunto.
6.º - Realização do projecto curricular: projecto didáctico no âmbito da turma.
7.º - Avaliação: ponto de partida para a identificação de necessidades curriculares.”
Em suma, o projecto curricular de escola, elaborado em função do projecto
educativo, pressupõe a “reconfiguração (recontextualização) do currículo nacional às
características da escola onde o currículo vais ser vivido”(Leite, Gomes e Fernandes,
2001: 15). Nesse sentido, é através dos projectos curriculares de escola que o currículo
adquire a sua expressão mais próxima do trabalho escolar (Zabalza, 1992).
2.3. Projecto Curricular de turma
À semelhança do projecto curricular de escola, o projecto curricular de turma
surge no contexto educativo português em sequência da Reorganização Curricular do
Ensino Básico. Contudo, este tem como função primordial adequar, ao contexto de cada
turma, as estratégias de concretização e desenvolvimento do currículo nacional e do
projecto curricular de escola, sendo concebido, aprovado e avaliado pelo professor
titular de turma, em articulação com o conselho de docentes, ou pelo conselho de turma,
consoante os ciclos.
Embora os conceitos de projecto curricular de escola e projecto curricular de
turma sejam de natureza muito idêntica, a verdade é que o projecto curricular de turma é
o instrumento que permite incorporar, na prática, as condições que proporcionem aos
alunos de cada turma específica a realização/concretização de determinadas
aprendizagens e, por consequência, o seu sucesso educativo.
Assim, é ao nível de decisão de realização que o professor, ao desempenhar um
papel mais activo e empreendedor, no contexto da sala de aula, pode criar condições e
encontrar estratégias que lhe permitam adequar o currículo à especificidade da turma.
Nesta ordem de ideias, os projectos curriculares de turma, relacionados de forma
directa com o projecto educativo de escola e o projecto curricular de escola,
“constituem um dispositivo de gestão curricular importantíssimo para a concretização
de uma educação de qualidade, que seja significativa para os diversos alunos e que lhes
permita desenvolver competências para enfrentar os desafios da sociedade” (Leite,
Gomes e Fernandes, 2001: 21).
CAPÍTULO III – A importância da construção de projectos curriculares
63
Para concluir este ponto de análise e com o intuito de clarificar, ainda que
resumidamente, as características dos projectos de escola referidos, apresentamos o
seguinte quadro síntese.
Projecto educativo de escola
É um documento que consagra a orientação educativa daescola. É nele que se contextualiza o core curriculum,adequando-o a cada escola. É um instrumento queconsubstancia as opções da escola relativamente à formacomo selecciona e organiza a cultura e formação a seroferecida aos alunos, com actividades e experiências quepropiciem uma educação de qualidade para todos.
Projecto curricular de escola
Contempla as articulações, a interdisciplinaridade e atransversalidade das competências e dos saberes. Define, emfunção do currículo nacional e do projecto educativo deescola, o nível de prioridades da escola, as competênciasessenciais e transversais em torno dos quais se organizará oprojecto e os conteúdos que serão trabalhados em cada áreacurricular.
Projecto curricular de turma
Tem como referência o projecto curricular de escola e éelaborado para adequar as metas curriculares às diferentesturmas. Pode ser norteado por alguns objectivos, tais como, apromover o trabalho colaborativo dos professores, centrar aacção educativa na aprendizagem dos alunos; facilitar aarticulação horizontal dos conteúdos do ensino e a integraçãode saberes, adequar estratégias de ensino às características dosalunos, partindo das suas motivações e interesses.
Fonte: Dantas, Lopes e Miranda (2001).
A análise do quadro permite reforçar a importância consignada à construção e
operacionalização de projectos de escola, tanto como a forma de articular a acção
educativa e formativa de cada instituição, quanto como meio de assunção da sua
autonomia. Além disso, torna evidente o papel que o projecto curricular de turma
desempenha em todo esse processo, uma vez que é no interior da sala de aulas que
grande parte das intenções educativas se transformam em realidade.
CAPÍTULO IV
O PAPEL DO PROFESSOR NA CONSTRUÇÃO DO CURRÍCULO
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
65
1. A ESPECIFICIDADE DO 1º CICLO DO ENSINO BÁSICO
Nas últimas três décadas, a escola primária em Portugal sofreu grandes
alterações. De uma instituição com características eminentemente elitistas e selectivas,
pois apesar ter sido determinado que o ensino primário seria gratuito e obrigatório a
todas as crianças, faltar à escola ou abandoná-la precocemente era muito usual, passou a
centrar a sua actuação na aprendizagem das crianças e nas suas necessidades,
demonstrando especial preocupação pelas crianças mais desfavorecidas, que noutras
circunstancias enfrentariam, muito provavelmente, situações de absentismo, trabalho
infantil ou analfabetismo1. Assim, após a revolução de Abril de 1974 foram tomadas
medidas que vieram alterar consideravelmente este panorama, não só em relação aos
alunos, mas também em relação ao estatuto dos professores, que viram a sua vida
profissional alterar-se de forma significativa.
Portugal apresenta, hoje, em todos os níveis escolares, taxas de frequência muito
próximas das do resto da Europa, factor que Teodoro (2006: 50) atribui à existência, no
seio da sociedade portuguesa, de um grande consenso relativamente à prioridade
educativa. Em primeiro lugar, porque no período que se segue à revolução, a prioridade
da educação é encarada como uma “instância de democratização e equidade social” e,
depois, com o intuito de integrar a comunidade europeia, esta é assumida como “espaço
decisivo de formação dos recursos humanos necessários a um rápido desenvolvimento
económico, no novo contexto gerado pelo próprio processo de integração europeia”.
Quanto ao período subsequente ao 25 de Abril de 1974, o clima acelerado de
mudança vivido em todas os níveis da sociedade também se reflectiu na educação,
sendo que a nova Constituição da República Portuguesa, aprovada em 1976, a par de
conferir a todos “direito ao ensino com garantia do direito a igualdade de oportunidades
de acesso e êxito escolar” veio atribuir à educação objectivos promissores, conforme o
postulado nas dez alíneas2 que dizem respeito às incumbências do Estado na realização
da política de ensino.
1 Sabemos que, infelizmente, ainda subsistem alguns casos de abandono escolar e de trabalho infantil.Embora possam considerar-se residuais não devem, por esse facto, deixar de constituir uma preocupaçãoa irradicar totalmente.2 “a) Assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito; b) Criar um sistema público edesenvolver o sistema geral de educação pré-escolar; c) Garantir a educação permanente e eliminar oanalfabetismo; d)Garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus maiselevados do ensino, da investigação científica e da criação artística; e) Estabelecer progressivamente agratuitidade de todos os graus de ensino; f) Inserir as escolas nas comunidades que servem e estabelecer a
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
66
Apesar de, pouco antes da Revolução, se ter assistido a uma tentativa no sentido
de reformar o sistema educativo, através da designada reforma de Veiga Simão3, no ano
lectivo 1974/1975 começa a caminhar-se no sentido de introduzir as medidas que
estabeleceram os estatutos da escola que se conhecem actualmente. De modo que, a Lei
de Bases do Sistema Educativo, Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, não veio introduzir
grandes rupturas na estrutura do sistema educativo, podendo até considerar-se que “no
plano dos princípios, consagrou as grandes vertentes humanistas subjacentes à melhor
tradição do pensamento pedagógico português, à reflexão nacional sobre a
democratização dos processos educativos e ao valores progressivos da Constituição da
República” (Teodoro, 2006: 52).
A Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, para além de atribuir a um único Ministério o
sistema de ensino, parte para o alargamento da escolaridade obrigatória para nove anos
e para um ensino secundário preparado para o ingresso na vida activa e o
prosseguimento dos estudos, determina os apoios e complementos educativos
necessários para o sucesso escolar, define princípios enquadradores da formação de
professores, da gestão democráticas das escolas, entre outros.
De facto, a educação sofreu alterações profundas desde o fim do regime
ditatorial, um quadro em que o sistema de ensino, até então, só possuía uma rede escolar
ajustada às necessidades, a do chamado Ensino Primário que chegava a todas as aldeias.
Foi por isso necessário alargar significativamente a rede de ensino para acolher todos os
alunos que passaram a frequentar a escola. Surgiu igualmente a necessidade de mais
professores, o que fez com que, das Escolas do Magistério distritais saíssem anualmente
centenas de professores que foram assegurando as necessidades crescentes do sistema
(Freitas, 2001).
Este período foi palco de fortes perturbações para os professores, quer pela
imposição da denominada reforma, quer como consequência das negociações entre
sindicatos de professores e o Ministério da Educação a propósito do Estatuto da
interligação do ensino e das actividades económicas, sociais e culturais; g) Promover e apoiar o acessodos cidadãos portadores de deficiência ao ensino e apoiar o ensino especial, quando necessário; h)Proteger e valorizar a língua gestual portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso àeducação e igualdade de oportunidades; i) assegurar aos filhos dos emigrantes o ensino da línguaportuguesa e o acesso à cultura portuguesa; j) Assegurar aos filhos dos emigrantes apoio adequado paraefectivação do direito ao ensino” (Artigo 74º, ponto 2).3 A reforma de Veiga Simão foi instituída pela Lei n.º 5 de 25 de Julho de 1973, no entanto foi revogadapelo processo revolucionário que se seguiu ao derrube da ditadura.
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
67
Carreira Docente, que viria a ser promulgado em 1990. Este estatuto veio, por um lado,
regulamentar vários aspectos da carreira docente, entre eles, os direitos e deveres, a
formação, o recrutamento e selecção, os quadros, a vinculação, a carreira e o acesso à
mesma, e, por outro, a avaliação do desempenho que, na prática, apesar estar vinculada
à entrega de um relatório de avaliação de desempenho, trata-se, na maior parte dos
casos, de uma mera formalidade. Actualmente, dezasseis anos depois, este estatuto que,
dentro dos limites impostos, confere o merecido reconhecimento e beneficio aos
professores está em vias de ser profundamente alterado, vivendo-se, novamente, um
período de grande agitação e descontentamento entre os professores. Pena é que, tudo
indique que a esta revisão do estatuto subjazam motivos de índole essencialmente
economicista.
Por conseguinte, mais recentemente, no Ensino Básico – que com a Lei de
Bases do Sistema Educativo passou a dividir-se em três ciclos contínuos, abrangendo as
crianças do 1º ao 9º anos de escolaridade –, resultado do projecto Gestão Flexível do
Currículo, que procurava encontrar respostas adequadas aos problemas dos alunos nos
contextos em que estes se inseriam, foi posta em prática a Reorganização Curricular do
Ensino Básico que estabelece os princípios orientadores da organização e gestão
curricular, bem como da avaliação das aprendizagens dos alunos.
No seio de todas estas mudanças, o 1º Ciclo do Ensino Básico foi o nível de
ensino que mais alterações sofreu ao longo dos últimos anos, quer ao nível da
organização, quer ao nível dos docentes e discentes que o frequentam e frequentaram.
A respeito da organização, a grande dispersão geográfica e dimensão reduzida
que caracterizava as escolas do 1º ciclo justificou uma organização simples que
consistia, ao nível da escola, na existência de dois órgãos: o conselho escolar,
constituído pela totalidade dos professores da escola e o director da escola4, eleito pelos
membros do conselho escolar5.
Em virtude da introdução dos princípios de “gestão democrática”6, que
asseguravam às escolas uma dimensão participativa através de eleições para os
diferentes cargos, e da colegialidade das decisões, foi prevista a participação do pessoal
4 Convém não esquecer que em muitas escolas existia apenas um professor, o que inviabilizava a escolhade um director de escola.5 Esta organização foi criada pelo Despacho n.º 40/75, de 18 de Outubro.6 O “modelo de gestão democrática” é consolidado no Decreto-Lei n.º 769-A/76, de 23 de Outubro, queaprova o regime de gestão dos estabelecimentos de ensino preparatório e secundário.
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
68
docente e não docente nas diferentes estruturas criadas, possibilitando uma intervenção
de carácter consultivo aos pais/encarregados de educação, bem como aos autarcas e
representantes de instituições sócio-culturais nos conselhos escolares. Contudo, em
1977, no ensino primário, este regime foi extinto, acabando com a colegialidade e
regressando à cadeia hierárquica instituída (Delgado e Martins, 2001).
Com a aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo, em 1986, são
propostas orientações que fizeram renascer estes princípios tanto no 1º ciclo, como nos
restantes níveis de ensino, orientações essas que vieram reforçar a dimensão
participativa e pedagógica, bem como a devolução de poderes contra o centralismo,
nomeadamente:
“ – democraticidade e participação envolvendo em graus variados a comunidade escolar,a família, as autarquias e outros agentes de desenvolvimento local;
- Descentralização e desconcentração de estruturas com soluções de carácter regional,local e institucional;
- Prevalência de critérios pedagógicos e científicos sobre critérios administrativos;(Delgado e Martins, 2001: 19-20).
Em 1991, após vários debates, é promulgado o Decreto-Lei n.º 172, de 10 de
Maio, que define o regime de direcção, administração e gestão dos estabelecimentos de
ensino e introduz o conceito de área escolar7 para os estabelecimentos de educação pré-
escolar e do 1º ciclo, possibilitando a existência de uma estrutura organizativa para os
estabelecimentos agrupados em áreas escolares assente em três níveis: direcção,
assegurada pelo conselho de escola ou conselho de área escolar; administração e gestão,
assegurada pelo director executivo e pelo conselho administrativo; e orientação
educativa, assegurada pelo conselho pedagógico e pelo conselho de núcleo. No caso da
dimensão dos estabelecimentos de educação pré-escolar e do 1º ciclo do ensino básico
justificar a existência de órgãos de direcção, administração e gestão próprios, estes
seriam designados por escolas.
Neste contexto, a administração e gestão das escolas passam a estar a cargo de
um director executivo, órgão unipessoal, designado por concurso através do conselho de
área escolar ou de escola, sendo coadjuvado por adjuntos. No exercício das suas
funções é responsável pela gestão cultural, pedagógica, administrativa, financeira e
patrimonial da escola, sendo ainda responsável “pela compatibilização das políticas
educativas definidas a nível nacional, com as orientações do conselho de escola, tendo
7 Área escolar – grupo de estabelecimentos de educação pré-escolar e do 1º ciclo do ensino básico.
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
69
em vista níveis de qualidade de ensino que venham ao encontro das aspirações da
comunidade escolar” (Delgado e Martins, 2001: 25).
Ainda ao nível da administração, o Conselho Administrativo, constituído pelo
director executivo, um dos adjuntos designado para o efeito e o chefe dos serviços de
administração escolar, é o órgão que delibera relativamente à gestão administrativa e
financeira da escola.
Por seu turno, o coordenador de núcleo, eleito pelos professores de cada área
escolar, é responsável pela coordenação das actividades, competindo-lhe cumprir e
fazer cumprir as orientações do director executivo. Já o Conselho Pedagógico é tido
como um órgão de coordenação e orientação educativa, prestando apoio quer ao
conselho de escola, quer ao director executivo “nos domínios pedagógico didáctico, de
coordenação da actividade e animação educativas, de orientação e acompanhamento de
alunos e de formação inicial e contínua do pessoal docente e não docente” (artigo 31º do
D.L. n.º 172/91).
Desta forma, este diploma, tendo por base os princípios de democraticidade,
participação e descentralização, vê a sua aplicação, ainda que em regime de experiência,
iniciada nos anos lectivos 1992/93 e 1993/94. Em 1996, o Governo apresenta o
Despacho n.º 128/ME, de 18 de Julho, que prorroga a sua aplicação experimental,
continuando assim a vigorar os modelos preconizados pelos Decretos n.º 769-A/76, de
23 de Outubro e n.º 172/91, de 10 de Maio. Entretanto, o Ministério da Educação
encarrega João Barroso de realizar um estudo de natureza prospectiva e relacional
sobre o reforço de autonomia das escolas, podendo, para o efeito sugerir um novo
modelo de gestão das escolas.
Entretanto, é emitido o despacho n.º 147-B/ME/96, de 1 de Agosto, que vem
tornar possível a associação de estabelecimentos de educação e ensino para a criação de
Territórios Educativos de Intervenção Prioritária, constituídos, na maior parte dos casos,
por escolas do 1º ciclo e uma escola dos 2º e 3º ciclos onde funciona a sede, estando
incumbidos de desenvolver projectos plurianuais que permitem o relacionamento entre
os vários ciclos do ensino básico e, também, da educação pré-escolar. A criação dos
territórios de educativos de intervenção prioritária teve por base os seguintes objectivos
centrais:
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
70
“a melhoria do ambiente educativo e da qualidade das aprendizagens dos alunos,prevenindo o absentismo e o abandono escolar através da diversificação de ofertasformativas (designadamente o recurso a currículos alternativos); uma visão integrada earticulada de escolaridade obrigatória que favorecendo a aproximação dos vários ciclos,bem como da educação pré-escolar; a criação de condições que favorecessem a ligaçãoescola-vida activa; a progressiva coordenação das políticas educativas e a articulação dasvivências das escolas de uma determinada área geográfica com as comunidades em quese inserem, promovendo a gestão integrada de recursos e desenvolvimento de actividadesde âmbito educativo, cultural, desportivo e ocupação de tempos livres, e visando eredimensionamento da rede escolar” (Delgado e Martins, 2001: 31).
No ano lectivo 1997/98, ano de preparação da aplicação do novo regime de
autonomia e gestão das escolas, em resultado das propostas apresentadas pelo estudo de
João Barroso, surge o Despacho Normativo n.º 27/97, de 2 de Junho, que apresenta os
dados relativos aos agrupamentos de escolas, constituídos, ainda que em regime de
experiência, ao abrigo deste Despacho.
Por último, o Decreto-Lei n.º 115-A/89, de 4 de Maio, alterado pela Lei n.º
24/99, de 22 de Abril, traz-nos de volta à realidade educativa que as nossas escolas
vivem nos dias de hoje. Embora se trate de um normativo largamente estudado e
analisado pelos especialistas, o regime de autonomia, administração e gestão dos
estabelecimentos da educação pré-escolar e dos ensino básico e secundário proposto
por este diploma continua a suscitar grande interesse e tem sido tema de discussão e
análise no seio da comunidade educativa.
Cabe-nos referir que é dada especial atenção ao 1º ciclo do ensino básico, pois,
por um lado, integra-o “numa organização coerente de autonomia, administração e
gestão dos estabelecimentos públicos de educação” (Lemos e Conceição, 2001: 184) e,
por outro lado, tem em consideração a especificidade mutável destas escolas, bem como
a complexidade da rede escolar deste ciclo, sendo que a aplicação do diploma na
educação pré-escolar e no 1º ciclo foi feita de forma gradual, durante dois anos lectivos.
Com efeito, foi longo e atribulado o caminho que o ensino primário, ou melhor,
o 1º ciclo do ensino básico teve que percorrer ao longo dos últimos trinta anos e, apesar
de se terem feito grandes avanços no sentido de melhorar a realidade deste nível de
ensino e, por conseguinte, proporcionar aos professores e alunos, os principais actores
envolvidos neste processo, melhores e mais eficazes condições de trabalho, a sociedade
está também em permanente mutação, o que é uma forte indicação de que são ainda
muitos os desafios que se lhes colocam, principalmente aos professores, cujas
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
71
inquietações, pelo menos as relacionadas com o desenvolvimento do projecto curricular
de turma, são alvo do nosso estudo.
Ao encararmos o ensino como uma profissão de mudanças, precisamos de
alargar o nosso entendimento em relação às características mais específicas das escolas,
para melhor compreender os professores que nelas ensinam. Parece-nos que uma
abordagem às diferentes culturas de escola e às características dos professores nos
permitirá esclarecer alguns aspectos que estão por detrás da definição da sua identidade,
quer como organização ou instituição, quer relativamente à sua identidade profissional e
à(s) forma(s) como esta tem vindo a ser (re)definida.
Por outro lado, partindo do princípio de que aprender a ser professor é uma
tarefa que se aprende ao longo da vida, não podemos ficar alheios à questão da
formação e ao impacto que esta pode ter no desenvolvimento profissional dos docentes.
Por este motivo, ao consideramos a formação contínua como uma via para que os
professores adquiram algumas das ferramentas necessárias à construção de qualquer
processo de mudança, também não podemos omitir as alterações a que a própria
formação tem vindo a ser submetida ao longo dos últimos anos e o papel preponderante
que, eventualmente, pode ter no processo de (re)definição da identidade profissional dos
professores.
2. CULTURAS DE ESCOLA
Embora se verifique uma tendência para a sociedade ver a escola como uma
instituição igual a muitas outras, para o universo cultural e pedagógico dos professores a
realidade escolar tem significados diferentes. Nesta linha de ideias, Nóvoa (1992b: 16)
afirma que “as escolas são instituições de um tipo muito particular, que não podem ser
pensadas como uma qualquer fábrica ou oficina”, posição que se baseia no facto da
educação não tolerar “a simplificação do humano (das suas experiências, relações e
valores), que a cultura da racionalidade empresarial sempre transporta.”
Para compreender a instituição escolar é necessário atendermos à sua história e
às estruturas económicas, sociais, ideológicas e políticas que legitimam a sua
construção. No fundo, encararmos a escola como organização, atendendo às diferentes
culturas que aí possam existir. Trata-se, portanto, de entender que a complexidade e a
especificidade de cada escola não pode ser equiparada a imagens mais ou menos
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
72
estereotipadas de uma qualquer empresa ou fábrica, onde, geralmente, imperam as leis
de mercado e a natureza do produto/serviço é de ordem material.
Neste sentido, Gomes (1993) refere alguns factores importantes sobre o
desenvolvimento da noção de cultura organizacional. Considera que esta noção se
desenvolveu no meio educacional com o uso, no contexto escolar, da noção de cultura
empresarial.
O autor (idem) assinala que, sobretudo nos anos 60/70, se assiste a um
desenvolvimento de uma representação fatalista da profissão docente e da organização
escolar. A realidade do homem dentro da organização deixa de ser a de objecto, para
passar a ser a de actor. A escola deixa de ser encarada como um mero repositório de
culturas societais e comunitárias e passa a ser valorizada enquanto produtora de
representações e de culturas.
A crise ideológica dos anos 60 e a crise económica dos anos 70 começaram a
pôr em causa o mito do “Estado-Previdência”, potenciando a emergência, mais ou
menos contextualizada, de movimentos sociais e culturais da sociedade civil. A
mundialização da economia e o impacto das novas tecnologias mostraram não só a
ineficácia das grandes máquinas estatais, como também obrigaram estas a actuar de
forma mais flexível e a valorizar as pequenas organizações.
Com esta expansão, associada ao facto de terem que desempenhar novos papéis,
os professores e as escolas sentem a necessidade de reequacionar o modo de ocupação
dos seus espaços profissionais e das suas práticas. Assim, nos anos 80 parte-se para a
descoberta das variáveis da escola como uma organização relacionada com a eficácia do
ensino. Pode dizer-se que uma descentração da sala de aula para a escola deu origem à
criação de uma nova identidade profissional, onde a própria cultura de escola é reflexo
da imagem e da cultura profissional dos professores (idem).
Segundo Gomes (1993), as organizações produzem uma cultura específica onde
transparecem as orientações que os membros que as integram partilham. No caso das
escolas, questiona-se o que é que os professores partilham, se são valores, normas,
atitudes, expectativas, se a escola tem uma cultura base comum ou se existem várias
culturas, qual a intensidade da partilha e se os elementos da cultura são conscientes ou
inconscientes na forma como se relacionam.
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
73
Nesta linha de pensamento, Schein (1985: 9) define cultura organizacionalcomo:
“um padrão de pressupostos básicos – imaginado, descoberto ou desenvolvido por umdeterminado grupo que vai aprendendo a lidar com os seus problemas de adaptaçãoexterna e integração interna – cujo o funcionamento foi considerado válido e, porconseguinte, pode ser ensinado a novos membros como uma maneira correcta deobservar, pensar e sentir em relação a esses problemas”.
Por seu turno, Sarmento (1994: 90) apresenta uma definição de cultura que
pressupõe a possível existência de culturas organizacionais, no seu entender:
“cultura é o domínio simbólico, integrado por crenças, assunções valores, ritos e artefactos,construído historicamente através de um processo conflitual, e em estado permanente de umadinâmica de reconstrução, através do qual os seres humanos estabelecem os protocolos para asua comunicação, ao nível grupal, organizacional ou societal”.
Verifica-se assim, que a cultura organizacional da escola é um conceito
polissémico. É vulgar a utilização de diferentes termos, cultura e ethos, sistema social
ou clima, atribuindo-lhes significados semelhantes. Tal facto deve-se sobretudo à
natureza dos elementos que caracterizam uma cultura. Contudo, os termos cultura e
clima são os mais recorrentes no discurso dos professores, pelo que alguns autores
apontam algumas diferenças entre estes dois conceitos.
Torres (1997: 15) salienta que o conceito de cultura organizacional é mais
amplo e abrangente do que o conceito de clima, sendo o clima apenas a manifestação de
superfície da cultura - ”cultura organizacional como o reflexo dos traços culturais da
sociedade, isto é, as práticas organizacionais tendem a ser determinadas e niveladas pela
cultura societal”.
Gomes (1993: 62) faz a distinção entre clima e cultura, utilizando a seguinte
metáfora: “o clima é o mapa cognitivo e a cultura é o globo representacional”. Assim, o
clima de escola remete para as características e atributos dos indivíduos, que assumem
determinadas configurações de acordo com variáveis situacionais.
Na abordagem da cultura como metáfora, a cultura não nasce, nem dentro, nem
fora da organização, até porque as fronteiras físicas não se revelam importantes. A
cultura constrói-se, fundamentalmente, a partir da interacção dos actores.
Para Romanelli (1995: 20-21) a forma como a cultura de escola se origina e
evolui define bem a dinâmica do processo educativo:
“ Cultura é muito mais do que a quilo que a escola transmite e até muito mais do queaquilo que as sociedades determinam como valores a serem preservados pela educação(...) A cultura, quer enquanto processo, quer enquanto produto, tem uma exigência de
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
74
continuidade. (...) a continuidade do processo e preservação dos bens estão interligados efornecem a motivação básica para a comunicação interpessoal, seja no sentido horizontalou vertical. É por isso que a cultura não sobrevive a não ser no meio social”.
Nesta linha de pensamento, podemos encontrar várias tipologias de análise das
diferentes culturas de escolas, nomeadamente a da Sethia e Glinow, referidos por
Gomes (1993), que construíram a sua tipologia a partir de duas dimensões: uma
orientação centrada nas pessoas e uma orientação centrada nos resultados. Se pensarmos
na progressão da carreira, a partir da avaliação de desempenho ou da obtenção de
formação especializada, podemos enquadrar no contexto organizacional escolar esta
tipologia, uma vez que a podemos relacionar com as culturas que esta apresenta: a
cultura apática, a cultura prudente, a cultura exigente, e a cultura interpretativa.
No primeiro tipo de cultura não há interesse pelas pessoas nem pelos resultados,
sendo esta figura de um modelo de organização governado por interesses e políticas e
não pela eficácia, predominando o cinismo e desmoralização. Já, na cultura exigente
apela-se aos bons resultados dos membros da organização, mas existe preocupação com
o seu bem-estar, estando orientada toda a organização para o sucesso; as recompensas
estão directamente ligadas a resultados individuais, predominando a competição, a
inovação e o risco. Por seu turno, cultura prudente tem grande interesse pelo bem-estar
dos membros, não lhes impondo resultados elevados. Este tipo de cultura é o reflexo do
fundador ou dos seus líderes, predominando a cooperação, a conformidade e a
obediência aos supervisores como valores recompensados. A cultura integrativa
caracteriza-se por apresentar interesse elevado pelas pessoas, baseando-se na ideia que
podem contribuir significativamente para os resultados; criam-se grandes expectativas
relativamente aos resultados. Os pontos fortes de cada um são recompensados e os
pontos fracos considerados irrelevantes, ainda que referenciados à performance.
Predomina o igualitarismo e a informalidade e enfatiza-se o sucesso do grupo e da
organização (idem).
Se esta tipologia privilegia a ideia da não contradição, já a tipologia de Quinn e
Mcgrath, também apresentada pelo mesmo autor, privilegia a perspectiva de disputa de
valores dentro da mesma organização. Considerando que as organizações nunca
atingem um estado de perfeita coerência entre as condições do envolvimento, a forma, a
cultura da organização e o estilo de liderança, Quinn e Mcgrath8 juntam um conjunto de
8 Cit. por Gomes (1993).
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
75
critérios que lhes permite apresentar quatro tipos de culturas: consensual, prospectiva,
racional e hierárquica.
A cultura consensual caracteriza-se, essencialmente, pela descentralização do
poder; as interacções baseiam-se na discussão, na participação e no consenso, existindo,
assim, um elevado grau de confiança e abertura. Os líderes são tidos como mentores e
os critérios de sucesso baseiam-se no espírito de equipa e no respeito. A cultura
prospectiva também se marca pela descentralização de poder, embora se direccione
mais para a inovação e o desenvolvimento do que a anterior; e os membros tomam
iniciativas e correm riscos à imagem dos líderes. O dinamismo e a capacidade para
enfrentar novos desafios são uma constante e o estilo de gestão baseia-se na iniciativa
individual e na criatividade. A cultura racional focaliza-se na competitividade, na
produtividade e na obtenção de resultados. Sendo o controlo dos resultados uma grande
preocupação, os lideres são exigentes e directivos. A cultura hierárquica é,
essencialmente, burocrática, estruturada e formal. O mais importante nesta cultura é que
não haja sobressaltos; os líderes são conservadores e cautelosos e o sucesso assenta,
sobretudo, na previsibilidade (idem).
Se compararmos estas duas tipologias encontramos várias semelhanças mas
também algumas situações contraditórias de onde podem surgir quatro estados que os
autores classificam como isolamento, acomodação, dominação e transcendência. Estes
estados são essencialmente vistos como estratégias que os membros da organização
adoptam para enfrentar situações contraditórias.
Analisando as realidades organizacionais e simbólicas das escolas primárias
portuguesas, Sarmento (1994: 114) apresenta duas tipologias predominantes de culturas
organizacionais: as que são geralmente “formuladas a partir de dicotomias ou da
formação de dois pólos de um continuum em função de um ponto de análise, de uma
dimensão ou de um elemento da cultura organizacional”; ou outras, mais complexas,
que tentam estabelecer “tipos ideais” de culturas organizacionais.
Em relação às tipologias do primeiro tipo, Sarmento (idem, ibidem) refere
aquela que pode apresentar maior interesse no estudo das culturas organizacionais das
escolas é de Handy, que identifica quatro tipos de culturas organizacionais: a cultura de
clube, a cultura de papel, a cultura de tarefa e a cultura de pessoa. É com base nestas
denominações que Sarmento (1999) constrói o quadro analítico das culturas
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
76
organizacionais da escola primária para a análise das narrativas que constituíram o
corpus de análise do estudo referido e que, de forma breve, descrevemos a seguir.
A cultura do clube poderá ser uma das culturas que mais marcou as escolas
primárias portuguesas. O professor aparece como o centro de onde emergem todas as
decisões, centralidade esta que é o traço mais característico deste tipo de cultura
organizacional da escola. A relação de poder é demasiado assimétrica, a favor do
professor, que corresponde a uma concepção de mestre, aqui visto como aquele que
molda os seus alunos e que se realiza enquanto modelo. A função de mestre não se
esgota na relação com os seus alunos. Este poder da escola-clube atinge também os pais
dos alunos, que são beneficiados no processo educativo. Os pais não são agentes
educativos anónimos, motivo pelo qual o professor procura acolhê-los. O benefício dos
pais reside sobretudo na aprendizagem da melhor forma de educar os seus filhos. Nesta
cultura, a comunidade é colaboradora do trabalho dos professores, enquanto o Estado
não desempenha nenhum papel relevante.
A cultura do papel, contrariamente à cultura anterior, sublinha a materialidade
do acto educativo e assenta no processo de socialização burocrática dos professores,
sendo essencialmente de índole racional-legal. Os alunos são considerados os
destinatários do processo de ensino, embora pouco tenham a dar à escola que, por sua
vez, pouco lhes tem, também, a dar também. O professor é visto como funcionário, uma
vez que para o desempenho do seu papel não lhe são dadas as condições indispensáveis.
Relativamente aos pais, tanto aparecem como intrusos do processo educativo quanto
como ausentes. Por outras palavras, aos pais não é destinado nenhum papel; quando se
propõem desempenhar alguma função, são considerados intrusos. O Estado é o
elemento fulcral neste tipo de cultura, porque se assume como patrão, de características
desumanizantes tanto pelo que faz, mas principalmente pelo que devia fazer e não faz.
A cultura da tarefa é o oposto da cultura do papel, sendo identificada como
uma cultura eufórica. Neste caso, a escola, a educação, os professores e os alunos são
muito valorizados. Uma das prioridades na concepção da organização é a diluição da
relação hierárquica. O papel do professor remete-se à função de um interventor, num
grupo de descoberta. O professor é entendido como um elemento mais de um grupo de
colegas, tendo como finalidade a auto-realização profissional mas também pessoal.
Neste tipo de cultura, os pais aparecem como aliados, como colaboradores no processo
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
77
educativo. É uma cultura onde se destaca o voluntarismo, a flexibilidade e a elasticidade
organizacional.
A cultura da pessoa significa a assunção pelos professores de um estatuto
profissional altamente especializado. Relativamente aos pais, quando estes são
contactados, pode até mesmo fazer-se divisão de trabalho. No entanto, esta divisão de
trabalho não significa a atribuição de papéis fixos, mas o desempenho especializado de
um papel. Neste tipo de cultura o Estado está ausente, mesmo quando é chamado a
apoiar a escola. Aqui a cultura de pessoa encontra-se próxima da cultura de clube
(idem).
Os tipos de culturas apresentados permitem-nos afirmar, com (Morgado, 2005:
75), que “a cultura de escola traduz uma determinada forma de pensar e de agir e resulta
de um conjunto de significados e comportamentos que a própria escola, enquanto
instituição social, gera e se esforça por conservar e reproduzir”.
Para Hargreaves (1996), as culturas de escola contribuem para dar sentido,
apoio e identidade aos professores e ao seu trabalho. Um facto que, por si só, leva
Gomes (1993: 55) a sublinhar que “a cultura aparece como um factor explicativo dos
disfuncionamentos e como uma reserva de eficácia a mobilizar”.
Para que escola, enquanto comunidade educativa, se transforme num efectivo
veículo de mudança é importante que esteja aberta a uma participação colaborativa, o
que constitui:
“- um princípio organizativo indispensável para gerar projectos que reflictam os direitos,expectativas, interesses e padrões de cultura que caracterizam a comunidade humana quejustifica e edifica a própria escola:
- uma actividade co-implicadora de todos os membros da comunidade educativa paragerar um processo cultural de colaboração que, por sua vez, é condição decomprometimento democrático e de educação para a cidadania” (Vilar, 2000: 34).
Contudo, para se conseguir alterar de forma substancial a educação são
necessárias, não só, uma efectiva intervenção dos professores, mas também “uma
postura diferente da administração central, que teima em não perder protagonismo nem
abdicar do seu papel centralizador e controlador, tentando, por várias formas, conservar
o monopólio das principais decisões educativas” (Morgado, 2005: 101).
Em relação às escolas do 1º ciclo do Ensino Básico que, enquanto organizações
educativas, têm especificidades próprias que condicionam o perfil e identidade dos seus
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
78
professores, constata-se que apesar do que as aparências poderiam fazer crer, a sua
realidade organizacional não é assim tão simples (Sarmento, 1994). Trata-se de uma
realidade organizacional e simbólica marcada pela heterogeneidade e complexidade,
que só é detectável a partir da “auscultação por dentro dos processos de atribuição de
significado à realidade escolar utilizados pelos professores e por outros actores da cena
escolar” (idem: 169).
Se queremos entender o que faz o professor e porque o faz, temos que
compreender a comunidade educativa, bem como a cultura de trabalho na qual este se
insere e participa. As culturas dos professores e as relações entre eles constituem um
contexto vital para o desenvolvimento do professor e para a sua forma de ensinar, delas
dependendo quer um determinado modelo de professor, quer a qualidade dos processos
de ensino-aprendizagem que viabilizam.
3. O PAPEL DO PROFESSOR
Configurando-se o ensino como uma profissão de mudanças, é legitimo afirmar
que estas não se podem desenvolver sem a intervenção do professor, pelo que para
tornar possível qualquer melhoria do fenómeno educativo tem de (re)pensar (n)o papel
e (n)a missão do professor (Morgado, 2001).
Na verdade, “a cultura docente atravessa um período de acentuados conflitos
resultantes de uma enorme tensão que advém de duas forças antagónicas”: se, por um
lado, a pressão das exigências de mudança da própria sociedade, ela também em
constante mudança e transformação; por outro lado, a existência de um sistema e uma
escola, que na realidade, permanecem praticamente inalterados e onde continua a
imperar a burocracia e a rigidez (idem: 54).
Para compreender as formas distintas de cultura docente é necessário entender
as diferentes implicações dos professores no seu trabalho e nas oportunidades de
desenvolvimento profissional de que usufruem, como também muitos dos limites a todo
este processo de desenvolvimento e a própria mudança educativa. Hargreaves (1996:
191), define quatro grandes formas de cultura dos professores, - individualismo,
balcanização, colaboração, colegialidade art i f ic ial - , cada uma delas com
consequências muito distintas no trabalho e na mudança educativa.
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
79
Na cultura do individualismo, o isolamento do professor é visto como uma
estratégia de adaptação, pois salvaguarda o tempo e energia necessárias para ir de
encontro às exigências da aprendizagem dos alunos, sendo por isso normalmente
entendido como um individualismo estratégico (Flinders, citado por Hargreaves, 1996).
Causas arquitectónicas e administrativas podem originar este tipo de situação. No
entanto, pode surgir o individualismo por livre opção de trabalho individual e por se
revelar uma opção segura para o professor.
Enquanto forma de cultura, a balcanização causa separações, principalmente em
contextos onde os professores trabalham de forma isolada ou em grupos disciplinares,
sendo muito mais leais para com o grupo do que para com a escola. A colaboração só
ocorre perante os interesses do grupo No entanto, para Hargreaves (1996), a
balcanização pode ter [e tem] consequências negativas para a aprendizagem tanto do
aluno como do professor. Também os directores de estabelecimentos de ensino, que
desejam promover na escola uma visão mais alargada de profissionalismo, se defrontam
com problemas por causa desta cultura balcanizada (Day, 2001).
A cultura da colaboração é considerada por vários autores como um ingrediente
essencial para a mudança educativa e para o desenvolvimento profissional docente e,
consequentemente, para a melhoria da escola. Para tal é necessário que a colaboração se
estenda às salas de aula, não sendo tomada como uma ameaça à independência dos
professores. Pelo contrário, é uma forma de partilhar as dificuldades e de resolver os
problemas, possibilitando a cada professor aprender com os demais.
Contudo, pode instalar-se uma cooperação disfarçada de colaboração,
permanecendo esta apenas ao nível das conversas, e não se verificando nas práticas de
ensino. Nestas culturas de “colaboração confortável” dá-se maior importância a
questões imediatas e a preocupação dos professores será a de manter uma camaradagem
pessoal que resista a desafios profissionais. Numa cultura colaborativa, as relações de
trabalho são espontâneas, voluntárias e orientadas para o desenvolvimento, onde os
professores se encontram disponíveis para responder a exigências externas. Este tipo de
colaboração só funciona se toda ou grande parte de corpo docente prescindir de uma
certa independência (Day, 2001).
Uma cultura colaborativa pode não implicar democracia, uma vez que esta pode
ser imposta pelo director do estabelecimento. Assim, Hargreaves (1996) refere que
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
80
nestas condições de colegialidade artificial as relações de trabalho colaborativo entre os
professores não são espontâneas, voluntárias, orientadas para o desenvolvimento, mas
previsíveis e fixas no tempo e no espaço. Esta cultura assume um carácter de
obrigatoriedade, podendo surgir em situações impostas, regulamentada pela
administração, não sendo uma iniciativa dos professores. Trata-se de uma imposição
administrativa e orientada para a implementação.
Apesar de algumas tentativas no sentido de uniformizar os critérios que
orientam os estudos sobre a identidade profissional dos professores, continua a manter-
se a questão de saber se poderá existir uma “entidade designada como cultura dos
professores que caracteriza globalmente a actividade docente ou se existe uma
multiplicidade de culturas” (Loureiro, 2001: 92), o que não quer dizer que se descarte a
existência de “factores unificadores, produtores de um sentimento de corpo que dilua de
forma consistente as clivagens e diferenciações no interior do grupo e faça realçar traços
comuns e semelhanças em termos de cultura profissional” (idem: 95).
Entendendo a cultura docente como consubstanciadora das condições em que se
desenvolve o seu trabalho, Morgado (2005) aborda algumas das características da
profissão docente que, no seu entender, reúnem maior consenso entre os investigadores
e que, têm contribuído para configurar o panorama educativo actual, tais como: o peso
da tradição, o isolamento profissional, a colegialidade aparente, a intensificação e o
aumento de responsabilidades profissionais, a ansiedade e a desmoralização e o
conformismo.
É certo que os professores vivem uma fase marcadamente inquietante, o que tem
levado, de alguma forma, a “uma crise de identidade no seio da profissão docente,
resultante da mudança rápida de papéis, expectativas e contextos em tornos dos quais a
profissionalidade de estrutura” (Roldão, 1999a: 111).
Na verdade, o professor assume papéis que vão muito para além do simples “dar
aulas” ou “dar notas”. Este facto é ainda mais relevante no 1º ciclo do Ensino Básico,
onde o professor interage com os alunos de uma forma muito particular. O professor
não é, se é que alguma vez foi, um mero transmissor de conhecimentos, nem pode ser
visto como tal. No entanto, embora ser professor hoje seja muito diferente do que era
ser professor há trinta ou vinte anos, altura em que usufruía de um prestigio social
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
81
considerável e não contestado, a verdade é que existem poucas diferenças no modo
como a profissão se exerce e como a escola funciona.
Nesta linha de ideias, para Sarmento (1994: 34) os professores do 1º ciclo do
Ensino Básico têm algumas especificidades que decorrem da própria história do ensino
primário e, que em geral, se distinguem dos restantes professores pelas seguintes razões:
“ensinarem crianças de menor idade do que nos níveis de ensino subsequentes;trabalharem em escolas com menor número de lugares docentes, e, por consequência,viverem em muitos casos uma situação de relativo (ou total) isolamento; estarem muitodispersos no território, dada a extensão geográfica da rede escolar; exercem o ensinodominantemente, segundo um modelo de monodocência em classe autónoma; e,finalmente, terem uma estrutura hierárquica usualmente mais pesada, ainda que maisdistante, sobretudo em países com uma estrutura administrativa da educaçãotradicionalmente centralizada”.
A especificidade quer das características apresentadas, às quais se pode ainda
acrescentar o facto de o ensino primário ser muito mais feminizado do que os restantes
níveis de ensino, quer a história da profissão e da estrutura da carreira, permitem-nos
afirmar que ao nível dos professores do 1º ciclo do Ensino Básico existe maior
homogeneidade do que ao com os professores dos restantes níveis de ensino. O autor
(idem), com base um estudo de Herriott e Firestone, refere que grau de homogeneidade
entre os professores do 1º ciclo do Ensino Básico permite concluir que, entre eles,
predomina uma imagem da escola como uma estrutura burocrática, ao contrário do que
sucede nos níveis posteriores, onde predomina a imagem de anarquia organizada.
Os desenlaces da história do ensino, também ela consequente das mudanças
sociais, têm, sem dúvida, influenciado o desenvolvimento da profissão docente,
fundamentalmente a “imagem que o professor tem de si próprio e do seu trabalho
profissional, provocando a emergência de uma crise de identidade que pode levar à
autodepreciação pessoal e profissional” (Esteve, 1995: 99).
Aliás, o próprio Estatuto da Carreira Docente, postulando que o desempenho
dos docentes “deve orientar-se para níveis de excelência” (Artigo 10º, ponto 2), confere
aos professores deveres profissionais que largamente extrapolam esta ideia tecnicista de
encarar a sua actuação, nomeadamente, o de contribuir para a formação e realização
integral dos alunos, promovendo o desenvolvimento das suas capacidades, estimulando
a autonomia e a criatividade. Ora, apenas na primeira de treze alíneas é também
consignada ao professor a responsabilidade de moldar os futuros cidadãos, que por sua
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
82
vez deverão ser também responsáveis e capazes de intervir de forma democrática na
comunidade.
O conjunto de deveres que o Estatuto atribui aos professores acarreta uma série
de responsabilidades que, muitas vezes, não é coincidente com os meios, recursos e
condições de trabalho que lhes são proporcionadas. Factores como este e outros que se
lhe podem associar, tais como as implicações decorrentes da massificação do ensino, a
excessiva exigência política sobre o trabalho dos professores, as alterações que
ocorreram na estrutura e dinâmica das famílias ou o acelerado desenvolvimento
tecnológico e dos conteúdos transmitidos pelos media (Jesus, 2002) afectam os
professores e causa um profundo mal-estar na profissão.
A sociedade está em permanente mudança, o que, inevitavelmente, tem
consequências na educação e na profissão docente. Porém, muitos de nós vivemos ainda
agarrados à ideia de um ensino alicerçado em pressupostos que se tornaram obtusos
com o alargamento da escolaridade obrigatória e o aumento substancial do número de
alunos a frequentar as escolas. São várias as diferenças em relação à vida profissional
dos professores da actualidade, nomeadamente, “o tipo de alunos que têm nas suas
aulas, o ambiente e interacções dentro da escola, o conhecimento disponível sobre a
educação, a aprendizagem e o ensino e a formação a que têm acesso” (Roldão, 1999b:
15), aspectos que constituem desafios que os professores têm de enfrentar para
conseguirem dignificar a profissão docente.
Esteve (1995: 99-108), a propósito das mudanças recentes na área da educação,
enumera doze indicadores básicos que resumem estas mudanças, cujo ritmo apressado,
interfere no papel do professor no decurso do processo de ensino: i) aumento das
exigências em relação ao professor - é cada vez maior o número de responsabilidades
que lhe pedem para assumir, sendo que, actualmente, a sua tarefa não se reduz ao
domínio cognitivo, pois além dominar as matérias que lecciona, “pede-se ao professor
que seja facilitador da aprendizagem, pedagogo eficaz, organizador de trabalho de
grupo e, que para além do ensino, cuide do equilíbrio psicológico e afectivo dos alunos,
da integração social e da educação sexual, etc.”; ii) inibição educativa de outros agentes
de socialização – são atribuídas à escola maiores responsabilidades educativas,
principalmente no que diz respeito a certos valores básicos que, tradicionalmente, eram
transmitidos pela família; iii) desenvolvimento de fontes de informação alternativas à
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
83
escola - como os meios de comunicação de massa, que fazem com que o professor
modifique o seu papel, reconhecendo o seu potencial e integrando-os no seu trabalho;
iv) ruptura do consenso social sobre a educação – nomeadamente sobre os objectivos
das escolas e valores que se devem incrementar, v) aumento das contradições no
exercício da docência – o professor vê-se, muitas vezes, perante a necessidade de
protagonizar papéis contraditórios, pede-se que o professor “desempenhe o papel de
amigo, de companheiro e de apoio ao desenvolvimento do aluno, o que é incompatível
com as funções selectivas e avaliadoras que também lhe pertencem”; vi) mudança de
expectativas em relação ao sistema educativo - alunos, professores e pais devem mudar
as suas expectativas em relação ao ensino, não se podem aplicar os objectivos de um
ensino de elite a um ensino de massas; vii) modificação do apoio da sociedade ao apoio
educativo – “se tudo corre bem, os pais pensam que os filhos são bons estudantes. Se as
coisas correm mal, pensam que os professores são maus profissionais”; viii) menor
valorização social do professor – “para muitos pais, o facto de alguém ser professor
tem a ver com a clara incapacidade de ter um emprego melhor, isto é, uma actividade
profissional onde se ganhe mais dinheiro”; ix) mudança dos conteúdos curriculares –
“no momento actual, o domínio de qualquer matéria tornasse muitíssimo difícil, ao
ponto de afectar a confiança do professor”, de maneira que, um bom funcionamento do
sistema de formação permanente dos professores “deve garantir uma compreensão
adequada dos objectivos e das reformas curriculares, evitando, com um número
suficiente de cursos de reciclagem, a desinformação e a insegurança dos professores
perante as mudanças que se projectam”; x) escassez de recursos materiais e deficientes
condições de trabalho – actualmente “o ensino de qualidade é mais fruto do
voluntarismo dos professores do que consequência natural de condições de trabalho
adequadas às dificuldades reais e às múltiplas tarefas educativas”; xi) mudanças nas
relações professor-aluno – mudanças profundas operaram-se a este nível nas últimas
décadas, de uma situação em que o professor tinha todos os direitos e o alunos deveres,
passa para uma situação em tudo é permitido ao aluno, sem que existam, na prática,
grandes mecanismos de arbitragem; xii) fragmentação do trabalho do professor – “para
além das aulas, devem desempenhar tarefas de administração, reservar tempo para
programar, avaliar, reciclar-se, orientar os alunos e atender os pais”, etc.
Perante a variedade de exigências que hoje se consignam ao professor torna-se
importante, com defende Morgado (2005), compreender que o professor deve, na sua
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
84
actuação, integrar dimensões de um profissional técnico, de um profissional reflexivo e
de um profissional crítico, doseadas sabiamente e de acordo com algumas variáveis
(personalidade, tipo de alunos, programas que operacionaliza, etc.). Assim poderá, de
uma forma mais eficaz, dar resposta às solicitações que o desempenho da sua profissão
exige.
Todavia, apesar das novas tarefas que se espera que o professor cumpra, ainda
não se verificaram mudanças tão significativas quanto seria desejável ao nível da sua
formação. Neste sentido, a formação desempenha um papel primordial tanto na
profissionalização como e na construção da identidade profissional docente. É, pois, em
torno de algumas questões relacionadas com a formação de professores, nomeadamente
da formação contínua, que iremos centrar a nossa atenção no ponto seguinte.
4. FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES E DESENVOLVIMENTO
PROFISSIONAL DOCENTE
Em Portugal, apesar do salto quantitativo da formação contínua dos professores
nas últimas décadas, constatamos que a mesma está longe corresponder às expectativas
que gerou, nomeadamente em relação aos projectos curriculares de turma, cuja
formação nesse âmbito poderia ter sido mais eficaz.
Assim, como ponto de partida, parece-nos pertinente clarificar o conceito
formação de Professores num sentido mais ou menos amplo, fazendo referência às
diferentes fases/etapas de formação. A partir desta clarificação iremos, por um lado,
reflectir sobre as diferentes perspectivas apresentadas e, por outro lado, encontrar um
ponto de partida para a clarificação dos conceitos de formação contínua e de
desenvolvimento profissional.
O conceito de formação é um conceito polissémico, podendo situar-se em
diversas vertentes e perspectivar-se “de diferentes modos, conforme as posturas
adoptadas em relação ao curricula de formação, ao papel do professor e às finalidades
do processo educativo” (Pacheco, 1995: 53).
De Ketele et al (1988: 242), referem-se ao conceito de formação como um
“processo de aprendizagem sistemático de um saber, de um saber-fazer, de um saber-ser
ou de um saber-tornar-se e de iniciação aos tipos de comportamento requeridos para o
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
85
exercício de uma função”. Convém lembrar que, muitas vezes, o conceito de formação
se refere ao resultado deste processo.
Já para Ribeiro (1993: 7), o conceito de formação de professores “identifica-se
cada vez mais, com o processo de desenvolvimento permanente do professor,
acentuando a unidade desse processo na diversidade das fases que nele se podem
distinguir”.
Por seu turno, para Marcelo (1999:21) o conceito formação reporta-se a um
“fenómeno complexo e diverso”, por três ordens de razões. Em primeiro lugar, a
formação, como conceito, não se identifica nem se dilui dentro de outros conceitos que
também se usam, tais como educação, ensino, treino, etc. Em segundo lugar, no
conceito de formação está presente uma dimensão pessoal de desenvolvimento humano
global que é preciso ter em conta. Em terceiro lugar, o conceito de formação tem a ver
não só com a capacidade de formação, mas também com a vontade de formação. Quer
isto dizer que o indivíduo é responsável pelo seu processo formativo, o que não implica
que a formação seja necessariamente autónoma.
Em qualquer dos casos, importa referir que a formação teve [e tem] um papel
fulcral no processo de profissionalização dos professores, nomeadamente dos
professores do 1º ciclo do Ensino Básico, processo que remonta à altura da
“substituição de um corpo de ensinantes sob a tutela da igreja, por um corpo de
ensinantes laicos, sob o controlo do Estado” (Brandão, 1999: 60). Desta forma, “ a
profissionalização desenvolve-se em etapas de afirmação que passam pelo exercício a
tempo inteiro, pela licença estatal9 de serviço, formação longa e existência de
associações dos que exercem a actividade” (idem, ibidem). No entanto, a criação de
instituições só se torna realidade em pleno século XIX, graças à conjugação de
interesses do Estado e dos professores.
Assim sendo, as instituições de formação passam a ocupar “um lugar central na
produção e reprodução do corpo de saberes e do sistema de normas da profissão
docente, desempenhando um papel crucial na elaboração dos conhecimentos
pedagógicos e de uma ideologia comum” (Nóvoa, 1992a, 18).
9 “A partir do final do século XVIII não é permitido ensinar sem uma licença ou autorização estatal, aqual é concedida na sequência de um exame que pode ser requerido pelos indivíduos que preencham umcerto número de condições (habilitações, idade, comportamento moral, etc.)” (Nóvoa, 1995: 17).
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
86
É, também, em torno de questões relacionadas com a formação que se tem
verificado grande parte da debate entre os investigadores, pois a formação de
professores, enquanto “chave da abóbada dos sistemas educativos ou, pelo menos, uma
das suas peças essenciais” não poderá deixar de afigurar como “um lugar de grande
turbulência das ideias e das práticas” (Esteves, 2002: 508).
Como já referimos, podem-se identificar diferentes fases na formação de
professores: a formação inicial, o período de indução e a formação contínua. Parece-
nos relevante referir Feiman (citada por Marcelo, 1999), que distingue quatro fases no
aprender a ensinar, o que como a autora indica, não é sinónimo de formação de
professores. A primeira é a fase de pré-treino, que se caracteriza pelas experiências
prévias que os futuros professores vivenciaram enquanto alunos. Situada nesta
focalização, uma investigação realizada por Flores (2003a: 196) que analisa o(s)
modo(s) com o um grupo de professores avalia o seu processo formativo, evidência que
esses professores:
“atribuem muita importância às suas experiências enquanto alunos e recordam osepisódios (positivos e negativos) que marcaram a sua trajectória escolar (...); o ambienteescolar (o relacionamento entre os alunos, professores e funcionários) e o sistema deavaliação dos alunos. Contudo, as experiências mais relevantes estão intimamenterelacionadas com os professores que os marcaram, de uma ou de outra forma, e que,nalguns casos, terão influenciado a opção por um curso de ensino”.
A segunda é a fase de formação inicial sendo esta entendida como “a etapa de
preparação formal numa instituição específica de formação de professores, na qual o
futuro professor adquire conhecimentos pedagógicos e de disciplinas académicas, assim
como realiza as práticas de ensino (Marcelo, 1999: 25). Para Flores (2003b:139), esta
etapa “constitui o primeiro passo de um longo e permanente processo formativo, ao
longo de toda a carreira, que prepara apenas para a entrada na profissão”.
Contudo, a transferência para as instituições de ensino superior ou universitário
a responsabilidade da formação inicial de professores “ tem aberto expectativas de
renovação pela aproximação aos saberes académicos e investigativos que pode
proporcionar, expectativas que, no entanto, podem ser defraudadas” (Esteves, 2002:
509).
A terceira, a fase de iniciação, correspondente aos primeiros anos de exercício
profissional. Esta fase pode ser também entendida como indução profissional, pois
compreende um período de formação destinado aos professores recém formados que,
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
87
“tendo completado todos os requisitos necessários à habilitação profissional para a
docência [e] se encontram no seu primeiro ano de serviço” assumem “responsabilidades
inerentes à docência e comuns aos professores com mais experiência” (Ribeiro, 1993:
8). Este é um período de reconhecida importância, pois é uma “fase de aprendizagens
importantes e intensas” e, que apesar de regulamentado, “carece de maior atenção por
parte dos decisores políticos” (Flores:2003b: 139).
A quarta fase é a designada fase de formação permanente, aqui se incluindo
todas as actividades planificadas pelas instituições ou até pelos próprios professores de
modo a permitir o desenvolvimento profissional e aperfeiçoamento do ensino, tratando-
se, a nosso ver, daquilo que entendemos por formação contínua. Neste sentido, todas
estas fases se inserem num princípio de formação, onde se concebe a formação como
um continuum. A este propósito Fullan (citado por Marcelo, 1999: 27) afirma que:
“o desenvolvimento profissional é um projecto ao longo da carreira desde a formaçãoinicial, à iniciação, ao desenvolvimento profissional contínuo através da própriacarreira... O desenvolvimento profissional é uma aprendizagem contínua, interactiva,acumulativa, que combina uma variedade de formatos de aprendizagem”.
O conceito de formação contínua, pode ser encarado de formas muito diversas,
conforme o ponto de vista assumido, aparecendo frequentemente como sinónimo de
educação de adultos, aperfeiçoamento, formação em serviço, reciclagem,
desenvolvimento profissional ou desenvolvimento dos professores. Ribeiro (1993: 10),
apelidando-a também de formação em serviço define-a:
“como o conjunto de actividades formativas de professores, que vêm na sequência da suahabilitação profissional inicial e do período de indução profissional (quanto existe), e quevisa o aperfeiçoamento dos seus conhecimentos, aptidões e atitudes profissionais emordem à melhoria da qualidade da educação a proporcionar aos educandos”.
É consensual a ideia de que esta formação deva ocorrer depois do professor
concluído a formação inicial, ter recebido um certificado e ter iniciado a sua prática
profissional, assumindo-se, por isso, como “um processo destinado a aperfeiçoar o
desenvolvimento profissional do professor, nas suas mais variadas vertentes e
dimensões” (Pacheco, 1995: 120).
Segundo Formosinho (1991a: 237), a formação contínua de professores engloba
a formação dos professores “dotados de formação inicial profissional”, visando “o
aperfeiçoamento dos saberes, das técnicas, das atitudes necessárias ao exercício da
profissão de professor”. Em idêntica perspectiva, Day (2003: 168) afirma que “a
formação contínua de professores é ainda a forma mais utilizada de desenvolvimento
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
88
profissional organizada no sentido de proporcionar uma aprendizagem intensiva durante
um curto espaço de tempo”.
Porém, o exercício da profissão de professor não pode ser somente assumido
como dar aulas (Formosinho, 1991a), pelo que a formação contínua deve ter como
finalidade o aperfeiçoamento pessoal e social de cada docente, perspectivando o seu
desenvolvimento profissional.
Portanto, a noção de formação contínua concebida como potenciadora de
desenvolvimento pode apontar para distintas perspectivas. Neste âmbito, Day (2001:
204) refere que:
“embora o conceito tradicional de formação contínua, como uma actividade ou conjuntode actividades isoladas de aprendizagem, realizada na escola ou ainda como principalmeio de desenvolvimento dos professores, esteja a desaparecer, continua a ser verdadeque, nalgumas escolas os professores recebem pouca ajuda no sentido do seudesenvolvimento profissional”.
A formação contínua não deve, por isso, ser reduzida a um conjunto de módulos
de necessidades individuais e necessidades educativas, sendo necessário desenvolver
projectos e dispositivos de formação conectados com a própria realidade. Este aspecto
assume grande relevância já que é difícil dar resposta à multiplicidade de tarefas com
que os professores são confrontados diariamente. Uma missão quase impossível, mas
que, nem por isso, diminui os desafios e as responsabilidades crescentes que a
sociedade continua a consignar aos professores.
É evidente que estas constatações não são neutras e, como tal, há que lutar para
que a formação contínua seja relevante para o desenvolvimento pessoal e profissional
dos docentes, para a melhoria das suas práticas educativas e para o aperfeiçoamento do
sistema educativo. Segundo Nóvoa (1992a: 67), a formação contínua de professores
"assume uma importância crucial. Por aqui pode passar um esforço de renovação, comconsequências para os programas de formação inicial, o estatuto da profissão, a mudançadas escolas e o prestígio social dos professores".
Uma ideia corroborada por Barroso (2003: 138-139), ao afirmar que:
“É neste contexto que na formação contínua de adultos se valoriza cada vez mais asmodalidades que favorecem a capacidade de os actores nas organizações, produzirem oseu próprio conhecimento, quer seja através dos métodos autobiográficos e outras formasde formação experiencial, quer através da aprendizagem auto-dirigida e outras formas deauto-formação”.
Como podemos constatar, é bem notória a importância atribuída ao
desenvolvimento profissional dos professores quando se fala de formação contínua.
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
89
Para Loureiro (1997), os modelos de desenvolvimento conceptualizados numa
lógica de ciclos de vida dão ênfase ao estudo de todas as mudanças no desenvolvimento
individual do professor e caracterizam-se pela tentativa de abordar o conjunto da
carreira, desde a entrada na profissão até à reforma.
Em idêntica posição, Marcelo (1999:137) adopta o conceito de desenvolvimento
profissional de professores por entender que se adapta à concepção do “professor como
profissional do ensino”. Enquanto o conceito desenvolvimento “tem uma conotação de
evolução e continuidade” que parece “superar a tradicional justaposição entre formação
inicial e aperfeiçoamento dos professores”, o conceito desenvolvimento profissional
docente “pressupõe uma abordagem na formação de professores que valorize o seu
carácter contextual, organizacional e orientado para a mudança” (idem, ibidem).
O reconhecimento da importância da formação contínua como complemento da
formação inicial parece ser consensual. No entanto, como já verificámos as formas de
perspectivar e viver a formação são diversas. O próprio enquadramento normativo, em
diferentes países, entende a formação contínua mais na lógica dos deveres do que na
lógica dos direitos.
Como referem Fernandes et al (2001), a formação contínua de professores em
Portugal começa a ter história nos anos 60, devido às mudanças ocorridas
internacionalmente, no domínio da educação. Nos anos 60/70, o Estado mantém uma
forte presença nesta área, pautando o ritmo das mudanças e das reformas. Prevalecendo
a ideia de reciclagem e aperfeiçoamento dos professores, como meios imediatos para se
cumprirem as medidas políticas educativas.
Nos anos 70/80, verifica-se uma explosão das práticas de formação contínua e
uma diversificação das entidades organizacionais. Tratando-se uma formação dirigida a
título individual, organizada à margem da carreira docente e do desenvolvimento
profissional dos professores e, assenta numa lógica de adaptação e/ou actualização dos
professores.
Na década de 80, a formação contínua começa por ser consagrada como um
direito (Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro – Lei de Bases do Sistema Educativo), altura
em que é pela primeira vez regulamentada.
A partir da década de 90, a formação contínua transforma-se “num direito, dever
e condição de progressão na carreira” (Estrela, 2003: 47). Com o regime jurídico da
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
90
formação gera-se “uma concepção desenvolvimentalista e personalista da formação”,
conferindo-se ao docente o direito de escolher as acções de formação que mais se
adeqúem ao seu plano de desenvolvimento profissional e pessoal, sem prejuízo de
cumprimento de programas ou prioridades definidos pela escola a que pertence ou pelo
Ministério da Educação (idem, ibidem).
Por outro lado, Estrela (2001: 136-137), a partir da leitura de alguns currículos
de formação inicial, em estudos de avaliação contínua e em alguns trabalhos de
investigação, considera que se a formação tem sido um instrumento importante de
profissionalização da função, nem sempre a tem servido da melhor maneira. Aponta
algumas das consequências daí decorrentes, tais como:
“a fragmentação dos saberes e competências e a falta de coordenação dos projectosformativos, o desfasamento entre o discurso desenvolvimentalista e construtivista daformação, (...) a mercantilização da formação contínua, ligada a mecanismos de oferta eprocura sem relação das necessidades reais dos professores e das escolas mesmo quandonelas realizada, o desvirtuamento da formação contínua em função da necessidade deacumulação de créditos para progressão na carreira, o relativo fracasso dos Centros deAssociações de Escolas na dinamização destas”.
Torna-se, portanto, importante que os professores façam ouvir a sua voz e
estabeleçam um diálogo construtivo com as instituições de formação, não podendo ter
uma atitude conformista ou oportunista, recebendo passivamente aquilo que lhes dão. É
o seu desenvolvimento profissional que está em jogo.
A formação de professores, tal como refere Estrela (2001: 136) apresenta-se um
“tema inesgotável mas também já muito debatido”, onde nos confrontamos com um
inúmeras de perspectivas. É nesta ordem de ideias que Silva (2001: 36) considera como
que a formação contínua “constitui um amplo e complexo campo que, para se afirmar,
necessita de ser estruturado em moldes completamente diferentes dos utilizados na
formação inicial, ainda que muitos dos processos, dispositivos e certas estruturas a criar
possam ser comuns”.
Da conjugação de todos os aspectos que fomos evidenciando ao longo do
enquadramento teórico resulta a profissão professor, uma tarefa complexa que requer
um grande empenhamento, muita persistência e uma actualização permanente. Da maior
ou menor qualidade docente, dependerá, sem dúvida, um ensino com mais ou menos
qualidade.
CAPÍTULO IV – O papel do professor na construção do currículo
91
No nosso caso, procuramos averiguar o que se tem vindo a passar nas escolas
em torno dos projectos curriculares de turma, uma das peças fundamentais para
conceber e operacionalizar os processos de ensino-aprendizagem
CAPÍTULO V
METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
93
1. CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDO
Um processo de investigação visa a aquisição de conhecimento cientifico, de
maneira a encontrar respostas para determinados problemas. No que diz respeito à
investigação educativa, Pacheco (1995: 9) define-a como “uma actividade de natureza
cognitiva que consiste num processo sistemático, flexível e objecto de indagação e que
contribui para explicar e compreender os fenómenos educativos”.
O trabalho de investigação sobre o projecto curricular de turma, no 1º ciclo do
Ensino Básico, que nos propusemos realizar teve como principal finalidade
“desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista, a formulação de
problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores”(Gil, 1999:
43). De acordo com esta linha de pensamento, optámos por um estudo de tipo
exploratório, de carácter descritivo, procurando recolher informação para descrever e
interpretar fenómenos e/ou situações em estudo.
Convém não esquecer que, na linha do que nos é proposto por Pacheco (1995:
21), “sendo a investigação educativa uma investigação do porquê, exige-se não uma
única metodologia mas antes uma pluralidade metodológica”. De facto, a discussão em
torno das distintas opções metodológicas faz-nos ponderar até que ponto a comparação
entre pesquisa qualitativa e quantitativa é verdadeiramente necessária ou se as sinergias
despendidas em tal debate não deveriam ser canalizadas para enaltecer a importância
dos dois tipos de metodologia, uma vez que ambas se complementam.
De facto, “a oposição quantitativo/qualitativo começa por uma distinção
ontológica entre qualidade e quantidade, ambas em relação dialéctica, pois é possível a
transformação de uma em outra” (Davila, 1995: 67-70).
Aliás, como sustenta Moreira (1994: 93), embora se reconheçam diferenças
entre os dois tipos de metodologias, “a melhor investigação social” tem-se servido
”usualmente de elementos de ambas”. Ainda a este respeito vários autores (Miles e
Huberman, 1984, cit. por Boutin et al, 1994: 34) defendem “a tese de um continuum
metodológico entre qualitativo e quantitativo”, foi este o nosso propósito. Sendo que, no
nosso caso, o recurso a ambas acabou por proporcionar uma abordagem mais
aprofundada do objecto do estudo, uma vez que “os processos de interacção social e de
comportamento pessoal implicam, tanto aspectos simbólicos, como elementos medíveis
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
94
(número de actores intervenientes, tamanho dos grupos, características ou tipo de
objectivos, etc.)” ( Ortí, 1995: 88).
Neste sentido, e a par da problemática apresentada, o presente estudo inseriu-se
nas perspectivas quantitativa e qualitativa, uma vez que, a nível conceptual, o objecto de
estudo consubstanciava, para além dos comportamentos, as intenções e as ideias dos
professores.
1.1. Metodologia quantitativa
Vários autores convergem ao assinalar que o recurso a estudos de índole
quantitativa no domínio da educação se intensificou a partir dos finais da década de 50,
nomeadamente no campo da investigação didáctica, tendo por base a intenção de
melhorar a qualidade do ensino (Pacheco, 1995).
Com o intuito de adaptar o modelo das Ciências Naturais à investigação nas
Ciências Sociais e Humanas, associado ao método experimental, o paradigma
positivista, também denominado por quantitativo, empírico-analítico, racionalista ou
empiricista, socorre-se maioritariamente de uma metodologia de teor quantitativo
(Coutinho, 2004). O que não deixa de gerar alguma contestação ao ser utilizada no
campo das Ciências Sociais e Humanas, onde os processos tendem a ser diferentes.
Este paradigma começa a ser também muito contestado por se verificar que não
era possível aplicar os pressupostos de uniformidade, regularidade e linearidade que
caracterizam os fenómenos naturais dos comportamentos humanos, neste caso o
investigado é visto como um objecto de observação, não como participante ou sujeito da
investigação e, estando cientes da utilidade dos estudos quantitativos, podemos observar
a sua incidência nos produtos em detrimento do processo.
Não deixando de reconhecer com Pacheco (1995) e Coutinho (2004) a
existência dos paradigmas investigativos que estiveram na base, durante um longo
período, da afirmação da linha quantitativa de investigação - paradigma presságio-
produto, paradigma processo-produto– Pacheco (1995) considera que o paradigma
processo-produto foi um dos modelos mais utilizados nesta linha de investigação, tendo
contribuído para a investigação cientifica sobre o ensino. O mesmo autor (idem: 30-31),
devido à frequência com que o modelo era utilizado, refere o modelo de Dunkin &
Biddle (1974) como um dos mais representativos da perspectiva quantitativa.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
95
“No modelo que apresentam, definem quatro tipo de variáveis:
a) de processo (onde destacam o comportamento do professor e o comportamento doaluno na turma, bem como as mudanças observadas no comportamento do aluno);
b) de produto – efeitos a curto prazo (aprendizagem da matéria, atitude para com amatéria, desenvolvimento de outras capacidades) e a longo prazo (desenvolvimento deoutras capacidades vocacionais e profissionais);
c) de presságio – redefinem-nas enumerando as experiências formativas do professor(classe social, idade, sexo), a formação do professor (programa seguido, característicasdo programa, experiências práticas de ensino) e as características do professor(capacidade para ensinar, inteligência, motivação, personalidade);
d) de contexto – introduzem estas novas variáveis distinguindo o contexto da escola eda comunidade educativa (clima, composição étnica da comunidade, ocupações,dimensões da escola) e da turma (dimensão, livros de texto, televisão educativa), alémda experiências formativas do aluno (classe social, idade, sexo) e da suas características(atitudes, conhecimentos e crenças).”
O carácter explicativo do presente estudo não nos leva a inserir especificamente
num dado modelo. No entanto, não deixámos de reconhecer que, em termos
quantitativos, se aproxima mais do modelo processo-produto e que, no âmbito do
paradigma positivista, “o objecto geral da investigação é concebido em termos de
comportamentos” em que o investigador recorre a “categorias de classificação
predeterminadas”(Boutin, et al, 1994: 36), no nosso caso isso não se verifica, uma vez
que se trata de um estudo baseado nas representações, crenças e atitudes dos
professores.
As tradições da metodologia quantitativa, bem como as definições do seu papel
e relação com a metodologia qualitativa são variadas. A metodologia quantitativa exige
uma maior especificação prévia dos dados que devem ser recolhidos e uma definição
mais precisa das variáveis, enquanto que a metodologia qualitativa requer “um
envolvimento mais completo e mais flexível do investigador com aqueles que
estuda”(Moreira, 1994: 94).
Contudo, há aspectos que são mais eficazmente elucidados através de métodos
quantitativos, pois permitem a utilização de amostras amplas e mais representativas de
uma determinada população. Por outro lado, Moreira (1994: 150) é da opinião que se
“nas etapas iniciais da pesquisa, o investigador tem muitas vezes dificuldade em
traduzir os objectivos num plano de investigações quantitativas, na fase de análise e
elaboração final” acaba por ficar “surpreendido com a simplicidade de exploração de
tipo de dados em causa”.
Assim, quanto à definição dos objectivos da investigação, no caso da
investigação quantitativa, estes podem ser definidos previamente à recolha de dados
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
96
“sob a forma, por exemplo, de hipóteses a testar” ou então a investigação pode ser
“concebida em termos mais abertos e exploratórios” esperando-se pela fase da análise
para verificar as relações entre as variáveis (Moreira, 1994: 151). Porém, um dos
entraves que é necessário ter em conta com este processo “consiste no facto das ideias e
objectivos do investigador estarem indubitavelmente sujeitos a mudança” o que pode
“conduzir a um desfasamento entre a perspectiva teórica e dados recolhidos” (idem:
152)
Contudo, a metodologia quantitativa não deixa de ser válida pois permite-nos
abranger um considerável número de respondentes através da utilização do inquérito por
questionário como técnica de recolha de dados.
1.2. Metodologia qualitativa
O paradigma qualitativo, também designado por interpretativo, hermenêutico
naturalista, construtivista, emerge nas últimas décadas do século no século XX. Esta
linha de investigação implica uma interpretação das acções de quem é também
interprete, envolve interpretações de interpretações – a dupla hermenêutica em acção
(Coutinho, 2004), portanto será legitimo afirmar que esta linha de investigação assenta
num pressuposto basicamente interpretativo, dedicando-se a estudar os fenómenos nos
contextos em que os sujeitos interagem.
No âmbito do paradigma interpretativo, “o objecto da análise é formulado em
termos de acção” portanto, “face ao objecto acção-significado (“meaning-in-action”), o
investigador postula uma variabilidade das relações entre as formas de comportamento e
os significados que os actores lhes atribuem através das suas interacções sociais.”
(Boutin et al,1994: 39).
Assim, a aproximação interpretativa/qualitativa das questões sociais e
educativas procura entrar no mundo pessoal dos sujeitos (Coutinho, 2004), atendendo às
diferentes histórias de vidas dos investigados, não menosprezando os contextos em que
os fenómenos ocorrem e procurando interpretar e compreender os pontos de vista dos
investigados, bem como os fenómenos em estudo, aspectos que conferem grande
importância a esta linha investigativa.
A metodologia qualitativa, como referem Pacheco (1995) e Coutinho (2004),
apresenta um maior número de paradigmas investigativos - paradigma mediacional
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
97
centrado no professor, paradigma mediacional centrado no aluno, paradigma
ecológico – ainda que entre o paradigma mediacional e o ecológico não se verifiquem
diferenças acentuadas. Enquanto que o mediacional centrado no professor “situa-se
mais no âmbito do ensino do que no da aprendizagem”, o mediacional centrado no
aluno, “reside na observação e interpretação do pensamento do discente” e o ecológico
está ligado a estudo etnográficos, “tendo como base a necessidade de compreender os
processos ou estruturas subjacentes dos intervenientes numa dada actuação”(Pacheco,
1995: 36-37).
Considerando a natureza do nosso estudo, podemos considerar que o paradigma
mediacional centrado no professor apresenta-se como o mais adequado a esta fase da
investigação, pois é caracterizado “como o processo de planificação e execução das
actuações com base num processo de tomada de decisões sendo o professor consciente
das suas actuações, realizando-as às vezes de forma automática”(Idem: 35).
Em termos metodológicos, a investigação de índole qualitativa baseia-se no
método indutivo, pois “o investigador busca a intenção, o propósito de uma acção,
estudando-a na sua própria posição significativa, isto é, o significado tem valor
enquanto inserido nesse contexto” (Pacheco, 1995: 41).
Por outro lado, esta perspectiva pressupõe que a metodologia seja “determinada
pela problemática em estudo” e que a generalização seja substituída pela
particularização, “a relação causal e linear pela relação causal e complexa, os
resultados inquestionáveis pelos resultados questionáveis e a observação sistemática
pela observação experimental ou participante” (idem, ibidem).
Bogdan e Biklen (1994: 47-50) consideram cinco características na investigação
qualitativa, apesar de nem todos os estudos que se consideram qualitativos possuírem
essas características com a mesma eloquência. Por conseguinte, apresentam as seguintes
características:
“1. Na investigação qualitativa a fonte directa de dados é o ambiente natural,constituindo o investigador o instrumento principal;
2. A investigação qualitativa é descritiva;
3. Os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo do que simplesmentepelos resultados ou produtos;
4. Os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma indutiva;
5. O significado é de importância vital na abordagem qualitativa.”
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
98
A flexibilidade assume-se como uma vantagem desta metodologia, ”uma vez
que as categorias de análise não são rígidas nem a análise está restrita a uma fase em
que os dados já tenham sido recolhidos”(Moreira, 1994: 97), o que não significa que o
rigor não seja indispensável, a recolha e comprovação, bem como a análise de dados
necessitam ser o mais sistemáticas possível.
2. TÉCNICAS E INSTRUMENTOS DE RECOHA DE DADOS
Com o intuito de realizar uma recolha de dados que permita concretizar os
objectivos deste estudo, da forma mais clara e objectiva possível, bem como proceder à
necessária triangulação de dados, optámos por recorrer a três técnicas de recolha de
dados: inquérito por questionário e inquérito por entrevista e análise documental.
A este respeito De Ketele e Roegiers (1999: 17) referem que:
“a recolha de informações pode, desde já, ser definida como o processo organizado postoem prática para obter informações junto de múltiplas fontes, com o fim de passar de umnível de conhecimento para outro nível de conhecimento ou de representação de umadada situação, no quadro de uma acção deliberada cujos objectivos foram claramentedefinidos e que dá garantias de validade suficientes”.
Adoptamos o termo técnica para designar fórmulas de investigação mais
concretas, pois como Pacheco (1995) refere os termos método e técnica são, por vezes,
usados com imprecisão, pelo que o termo método será utilizado num sentido mais geral.
O recurso a estas técnicas de recolha de dados prendeu-se com o facto de
pretendermos obter diferentes perspectivas sobre a construção do projecto curricular de
turma no 1º ciclo do Ensino Básico.
Assim procurámos, por um lado, obter dados sobre a opinião de uma amostra
estatisticamente significativa de professores, a partir da aplicação do inquérito por
questionário. E, por outro, tomar conhecimento das visões de oito professores através da
entrevista. Estes, por seu turno, desempenham diferentes cargos nos órgãos de gestão
dos agrupamentos a que pertencem os professores que constituem a amostra
anteriormente determinada.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
99
2.1. Inquérito por questionário
O inquérito por questionário constitui uma técnica de recolha de dados que
consiste em colocar uma série de questões a um conjunto de inquiridos, em geral
representativos de uma população, e tem por objectivo o conhecimento de opiniões
crenças, interesses ou expectativas.
Ferreira (2003: 167) afirma que:
“ a sua natureza quantitativa e a sua capacidade de objectivar informação conferem-lhe oestatuto máximo de excelência e autoridade cientifica no quadro de uma sociedade e deuma ciência dominadas pela lógica formal e burocrático-racional, mais apropriada àcaptação dos aspectos contabilizáveis dos fenómenos”.
Os fenómenos estudados a partir do questionário podem ser extremamente
variados, pois “corresponde ao mais estruturado e rígido dos tipos de entrevista, visto
que nele se recorre a um conjunto de perguntas, inseridas no questionário sob uma
forma e segundo uma ordem prévia, estritamente programadas” (Amorim, 1995: 98).
À semelhança de outras técnicas o inquérito por questionário apresenta
vantagens e desvantagens. No quadro das vantagens pode-se considerar não só a
possibilidade de recolher e trabalhar uma grande variedade de dados, procedendo a
várias análises de correlação, mas também a possibilidade de interrogar um grande
número de pessoas com uma elevada economia de tempo e com a garantia de
anonimato.
Por outro lado, algumas limitações advêm da utilização desta técnica,
nomeadamente a probabilidade de uma elevada percentagem da população não
responder ou fazer um preenchimento incompleto dos questionários ou, ainda, como
referem Quivy e Campenhoudt (1992:191), poder emergir “o carácter frágil da
credibilidade do dispositivo”. É nesse sentido que advertem para o seguinte:
“Para que o seja método digno de confiança devem ser preenchidas várias condições:rigor na escolha da amostra, formação clara e unívoca das perguntas, correspondênciaentre o universo de referência das perguntas e o universo de referência do entrevistado,atmosfera de confiança no momento de administração do questionário, honestidade econsciência profissional dos entrevistadores”.
A elaboração do questionário consistiu, num primeiro momento, em elaborar um
conjunto de questões especificas que permitissem concretizar os objectivos do estudo.
Para o efeito, elaborámos um guião (Anexo 1) com os objectivos gerais e específicos do
questionário, que depois utilizamos para nortear a redacção das questões.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
100
2.1.1. Estrutura do questionário
Partindo do pressuposto que “a construção de um questionário compreende à
partida três grandes etapas: preparação; formulação e redacção das perguntas, e
organização” (Moreira, 1994: 166), iniciámos este processo fazendo alguma revisão da
bibliografia existente sobre o assunto, uma consulta aos estudos já realizados e à
legislação referente ao projecto curricular.
O questionário foi estruturado em duas partes principais: uma relativa aos dados
pessoais e profissionais do inquiridos e a outra relativa aos dados de opinião sobre a
construção, implementação e avaliação do projecto curricular de turma, no 1º ciclo do
Ensino Básico (Anexo2).
Em relação à forma definimos quatro tipos de questões: questões fechadas de
resposta “sim/não”; uma questão fechada de resposta por escolha de um item; questões
fechadas com escala de Likert de cinco níveis; e questões abertas.
Deixou-se ainda um espaço de resposta aberta para os professores, caso o
entendessem, poderem tecer comentários, críticas e/ou sugestões.
O recurso a um maior número de itens de resposta fechada (27) prende-se com o
facto de facilitar o posterior tratamento dos resultados. De reste esta é reconhecida
como uma das maiores vantagens deste tipo de questões.
Todavia, os itens de resposta aberta (4), apesar de requererem a subsequente
análise de conteúdo, que implica maior gasto de tempo e mais esforço, apresentam
também algumas vantagens: permitirem às pessoas inquiridas exprimir-se nas suas
próprias palavras; possibilitam uma recolha de informação mais completa e protegem os
inquiridos de influências externas (Moreira, 2004).
Tendo como base os objectivos inicialmente formulados, organizámos as
variáveis dependentes em função de três dimensões:
1. Projecto Curricular;
2. Desenvolvimento do Projecto Curricular de Turma;
3. Constrangimentos e vantagens da utilização do Projecto Curricular de Turma.
Nos quadros (1,2,3,4,5) apresentamos os itens do questionário distribuídos pelas
três dimensões.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
101
No que concerne às questões abertas, estas foram alvo de uma análise de
conteúdo, cuja apresentação dos dados será efectuada de acordo com a dimensão com
que apresentam maior relação.
Dimensão 1 - Projecto Curricular
Esta dimensão integra um conjunto de itens através dos quais se pretende
averiguar se os professores conhecem e projecto educativo e curricular dos
agrupamentos a que pertencem, bem como questioná-los relativamente às suas
concepções sobre os projectos curriculares de escola e de turma.
Item 1 Conhece o Projecto Educativo do seu Agrupamento?
Item 2 Conhece o Projecto Curricular do seu Agrupamento?
Quadro 1 – Itens do questionário – Dimensão 1
Item 3 O projecto curricular de escola pretende adequar o currículo nacional à especificidade dosalunos da escola.
Item 4 O projecto curricular de turma pretende adequar o currículo aos alunos de uma turmaespecífica.
Item 5 O projecto curricular de escola elabora-se em função do currículo nacional e do projectoeducativo de escola.
Item 6 O projecto curricular de turma deve ter por referência o projecto curricular da escola.
Item 7 A construção do projecto curricular de turma contribui para o sucesso educativo dos alunos.
Quadro 2 – Itens do questionário – Dimensão 1
Dimensão 2 - Desenvolvimento do projecto curricular de turma
Esta dimensão integra uma série de itens, através dos quais pretendemos
verificar que tipos de procedimentos os professores adoptam no âmbito processo de
desenvolvimento do projecto curricular de turma.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
102
Item 8 É usual, o Conselho de Docentes a que pertenço convocar reuniões para elaborar o projectocurricular de turma.
Item 9 A construção do projecto curricular de turma é uma tarefa que cada professor/a do 1º Ciclodo Ensino Básico concretiza sozinho/a.
Item 14 O Conselho de Docentes a que pertenço procura estimular o trabalho colectivo dosprofessores para a elaboração de projectos curriculares.
Item 21 O Conselho de Docentes a que pertenço fornece-me o apoio necessário para elaborarprojecto curricular de turma.
Item 10 Com a elaboração do projecto curricular de turma tive necessidade de modificar a formacomo organizo as minhas aulas.
Item 15 A forma como decorrem as aulas não foi alterada devido à existência do projecto curricularde turma.
Item 17 Com o desenvolvimento do projecto curricular de turma senti necessidade de recorrer aconteúdos que não estão no programa.
Item 19 Na prática, o projecto curricular de turma que elaboro é implementado.
Item 20 Com desenvolvimento do projecto curricular de turma modifiquei a forma como avalio osmeus alunos.
Item 22 No final de cada ano lectivo o projecto curricular de turma é avaliado.
Quadro 3 – Itens do questionário – Dimensão 2
Item 11 Recorre/recorreu a algum guião para elaborar o projecto curricular de turma?
Item 13 Quem o facultou? O/A coordenador/a do grupo; Um colega; Outros
Quadro 4 – Itens do questionário – Dimensão 2
Na apresentação dos dados relativos a esta dimensão também será incluída a
análise do item 12, de resposta aberta, que está relacionado com o conteúdo do guião
utilizado para a construção do projecto curricular de turma.
Dimensão 3 – Constrangimentos e vantagens da utilização do projecto
curricular de turma
No que diz respeito a esta dimensão, foi nosso intuito aferir com que
constrangimentos se defrontam os professores nas várias etapas do desenvolvimento do
projecto curricular de turma, bem como apurar as principais causas que estão na base
dessas dificuldades. Por outro lado, procuramos também inquirir os professores sobre as
vantagens pedagógicas e profissionais, decorrentes do desenvolvimento projecto
curricular de turma.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
103
Item 23 O projecto curricular de turma elabora-se apenas para dar cumprimento ao que está previstona lei a esse respeito.
Item 18 A elaboração do projecto curricular de turma trouxe um acréscimo de trabalho para além dacomponente lectiva.
Item 16 Com a elaboração do projecto curricular de turma há uma melhor articulação dos conteúdosdas várias áreas.
Item 24 A elaboração do projecto curricular de turma contribui para recorrer a actividadesdiferentes das que costumava utilizar nas aulas.
Item 25 O desenvolvimento das áreas curriculares não disciplinares é mais significativo devido àexistência do projecto curricular de turma.
Item 28 O recente alargamento do horário de permanência dos professores nas escolas contribuipara poder elaborar projectos curriculares de turma mais eficazes.
Item 29 A necessidade de desenvolver actividades de enriquecimento curricular tornou-se maisvisível desde que começamos a elaborar o projecto curricular de turma.
Item 30 O alargamento do horário de permanência dos professores nas escolas é uma forma de osprofessores poderem trabalhar em grupo.
Quadro 5 – Itens do questionário – Dimensão 3
À semelhança do que fizemos na dimensão anterior, a análise dos itens 26
(Quais as principais dificuldades que sente na construção, implementação e avaliação
do projecto curricular de turma?) e 27 (Na sua opinião, quais são as principais causas
que estão na base de tais dificuldades?) será englobada nesta dimensão.
2.2. Inquérito por entrevista
Qualquer plano de investigação, seja de cariz quantitativo, qualitativo ou misto,
pressupõe uma recolha de dados por parte do investigador.
A entrevista é um processo de recolha de informações que utiliza,
preferencialmente a forma de comunicação verbal, num encontro entre duas ou mais
pessoas, durante o qual o investigador interroga os entrevistados, com o objectivo de
conhecer as suas opiniões sobre alguns factos que lhe interessam (Amorim, 1995).
O contacto entre entrevistador e entrevistado possibilita que o primeiro possa
formular previamente algumas questões, bem como adaptá-las ao longo do processo
bem como pedir informação adicional sempre que tal se revele importante para o
estudo.
É neste sentido que De Ketelle & Roegiers (1999: 22), afirmam que o inquérito
por entrevista consiste num acto de comunicação, “como método ao serviço de um
processo de recolha de informações”.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
104
Trata-se de um processo de partilha que Quivy e Campenhoudt (1992: 193)
descrevem da seguinte forma:
“Instaura-se assim, em princípio uma verdadeira troca, durante a qual o interlocutor doinvestigador exprime as sua percepções de um acontecimento ou de uma situação, assuas interpretações ou as suas experiências, ao passo que, através das perguntas abertas edas suas reacções, o investigador facilita essa expressão, evita que ela se afaste dosobjectivos da investigação e permite que o seu interlocutor aceda a um grau máximo deautenticidade e de profundidade.”
Apesar de ser uma das técnicas mais utilizadas na metodologia qualitativa, a
entrevista é uma técnica privilegiada quando se pretendem obter dados válidos sobre as
crenças, as opiniões e as ideias dos sujeitos inquiridos. Sobretudo se tivermos em conta
que o diálogo entrevistador-entrevistado pode permitir destacar alguns aspectos mais
específicos, difíceis de conseguir através de outras técnicas de recolha de dados.
Todavia, tal como outras técnicas utilizadas para este efeito, as entrevistas
apresentam vantagens e desvantagens. Segundo Bell (1997: 118) a adaptabilidade é
uma das principais vantagens das entrevistas, na medida em que permitem que um
“entrevistador habilidoso” consiga “explorar determinadas ideias, testar respostas,
investigar motivos e sentimentos”. Situação que o questionário poderá não permitir, ou
seja, a forma como determinadas respostas são dadas podem fornecer informações que
uma resposta escrita não revelaria.
Autores como Quivy e Campenhoudt (1992: 195) apresentam outras vantagens
do recurso a esta técnica, tais como “o grau de profundidade dos elementos de análise
recolhidos, a flexibilidade e a fraca directividade do dispositivo que permite recolher os
testemunhos e as interpretações dos interlocutores, respeitando os seus próprios quadros
de referência”.
No entanto, a entrevista apresenta também algumas desvantagens. O tempo e a
disponibilidade que consome aos que nela intervêm são, talvez, dois dos aspectos mais
constrangedores. Além disso, é uma técnica bastante subjectiva, correndo-se o risco de
poder ser parcial, muitas vezes de forma inconsciente. A análise das respostas pode
levantar alguns problemas, pelo que a formulação das questões deve ser feita de forma
tão clara, concisa e exigente como nos inquéritos por questionário.
A propósito de algumas desvantagens da utilização desta técnica, Quivy e
Campenhoudt (1992: 195) acrescentam ainda que “a própria flexibilidade do método
pode intimidar aqueles que não consigam trabalhar com serenidade sem directivas
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
105
técnicas precisas”, um aspecto que pode ser seriamente constrangedor para o
investigador conduzir a realização de uma entrevista. Por outro lado, os mesmos
investigadores alertam para o perigo de se poder incorrer numa situação oposta, isto é,
pensarem que a “relativa flexibilidade os autoriza a conversar de qualquer maneira com
os seus interlocutores” (idem, ibidem).
Em suma, a flexibilidade que caracteriza o inquérito por entrevista pode levar-
nos a acreditar tanto na existência de uma total espontaneidade do entrevistado, como
na completa neutralidade por parte do investigador, o que pode contribuir para
desvirtuar todo o processo de recolha de dados. Por isso, a análise das entrevistas deverá
considerar o contexto de onde dependem os seus intervenientes, aliás, um dos
pressupostos mais importantes do paradigma qualitativo.
Entre os vários tipos de entrevista, recorremos à entrevista semi-estruturada,
semidirectiva ou semidirigida, pois permite que o entrevistador tenha previstas algumas
questões que servem de referência ao tema da conversa, procurando que as respostas se
orientem em função das questões que considera essenciais, mas sem que os
entrevistados se sintam limitados para emitirem suas opiniões. Não sendo um tipo de
entrevista totalmente aberta, não é, também, dirigida por grande número de perguntas
directas, o que facilita a adaptabilidade e a flexibilidade que referimos atrás,
propiciando assim a abertura por parte dos entrevistados.
Em qualquer dos casos, o papel do investigador é fundamental, uma vez que
deve esforçar-se por “reencaminhar a entrevista para os objectivos” que definiu à priori
sempre que a pessoa entrevistada se afastar deles, colocando questões a que o
entrevistado não chega por si próprio, na altura mais apropriada e de forma tão
desejável quanto possível (Quivy e Campenhoudt, 1992: 194).
A preparação das entrevistas segue procedimentos idênticos aos da preparação
dos questionários, isto é, “os tópicos têm que ser seleccionados, as questões elaboradas,
os métodos de análise considerados e preparado e testado um plano” (Bell, 1997: 119).
Já na condução das entrevistas há aspecto distintos, o que nos obriga a considerar alguns
procedimentos e algumas regras, nomeadamente no que respeita à preparação do
investigador, à linguagem utilizada e ao registo das respostas obtidas.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
106
2.2.1. Estrutura da entrevista
A utilização deste tipo de entrevista requer que se estabeleça previamente um
guião (Anexo 3). Um facto prático que permite ao entrevistado uma margem de
movimentos dentro desta estrutura e simplifica a análise subsequente, um aspecto
interessante, especialmente para estudos condicionados por um prazo de tempo, o que
acontecia com a realização deste trabalho.
A construção do guião da entrevista, à semelhança do guião questionário,
baseou-se nos objectivos do estudo, para a definição de objectivos gerais e específicos,
que foram traduzidos em questões e que serviram de suporte para a definição de
dimensões para a análise do conteúdo das mesmas.
Assim, a entrevista foi estruturada em duas partes: uma primeira relativa às
características pessoais e profissionais dos respondentes; a segunda, referente às suas
perspectivas sobre o projecto curricular de turma.
Relativamente à segunda parte e de forma idêntica o que tínhamos feito para o
questionário, foram definidas três dimensões, a partir das quais se identificaram as
categorias para a análise do conteúdo das respostas.
No quadro 6 apresentamos as categorias que identificamos em cada dimensão,
bem como os itens correspondentes a cada categoria.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
107
Dimensões Categorias Questões
Conceito Gostaria que me indicasse o que representa para si umprojecto curricular
1. ProjectoCurricular Papel do
entrevistado
Considera que o cargo que ocupa lhe permite uma intervençãosubstantiva na concepção, implementação e avaliação do(s)projecto(s) curricular(es) de turma? De que forma?
ProcedimentosA que procedimentos recorre para orientar a elaboração do(s)projecto(s) curricular(es) de turma pelos docentes?
Definição deEstratégias
Define estratégias de trabalho específicas, ao nível doagrupamento, para a elaboração do(s) projecto(s)curricular(es) de turma? Quais?
InstrumentosQue instrumentos/documentos utiliza para apoiar os docentesna elaboração do(s) projecto(s) curricular(es) de turma?
Trabalhocolaborativo
Na concepção, implementação e avaliação do(s) projecto(s)curricular(es) de turma, ao nível do agrupamento, procuraestimular o trabalho colaborativo dos professores? A queprocedimentos recorre para esse efeito?
Organizaçãodas aulas
Considera que os professores alteraram a forma comoleccionam as aulas devido à existência do(s) projecto(s)curricular(es) de turma?
Implementação
Tem recebido algum feedback sobre a forma como osprofessores desenvolvem o(s) projecto(s) curricular(es) deturma? Esse feedback é conseguido mais a nível formal ouinformal?
Avaliação dosalunos
Acha que os professores, como resultado da concepção,implementação e avaliação do(s) projecto(s) curricular(es) deturma, recorrem a procedimentos de avaliação distintos dosque utilizavam? Consegue identificar alguns?
2. Desenvolvimentodo projectocurricular de turma
Avaliação doprojecto
Costumam avaliar o(s) projecto(s) curricular(es) de turma?Quando? De que formas?
Constrangimen-tos
Quais as principais dificuldades que tem detectado naconcretização do(s) projecto(s) curricular(es) de turma pelosprofessores?
3. Constrangimentosda utilização doprojecto curricularde turma Sugestões de
melhoria
Pode apresentar algumas sugestões que contribuam parafacilitar e/ou melhorar a concepção, implementação eavaliação do(s) projecto(s) curricular(es) de turma?
Quadro 6 – Matriz da Análise de conteúdo das Entrevistas
2.3. Análise Documental
Tal como De Ketele e Roegiers (1999: 38) afirmam, é pouco usual que “um
único método de recolha de informações permita, por si só, fornecer toda a
documentação necessária”. Assim, também recorremos ao estudo de alguns
documentos, tratando-se estes basicamente de documentos oficiais e publicados que,
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
108
por um lado, servem para preparar a recolha de informações e, por outro, para a
completar.
A análise documental terá um carácter selectivo, ou seja, em relação à
quantidade de documentos a estudar optámos por uma análise por selecção, pois como
já referimos apenas pretendemos consultar alguns documentos específicos que se
enquadram no âmbito deste estudo e se relacionam, de forma directa ou indirecta, com a
construção de projectos curriculares nas escolas.
2.4. Validação dos instrumentos de recolha de dados
A validação é um procedimento indispensável sempre que pretendemos verificar
um instrumento de recolha de dados. De Ketele e Roegiers (1999: 220) definem este
processo da seguinte forma:
“A validação da recolha de informações é o processo pelo qual o investigador ou oavaliador se assegura que aquilo que quer recolher como informações, as informaçõesque recolhe realmente e o modo como as recolhe servem adequadamente o objectivo dainvestigação”
Como se pode depreender desta afirmação, o papel da validação dos
instrumentos de recolha de dados é de extrema importância, uma vez que se torna
imprescindível para garantir que tais instrumentos permitam recolher a informação
necessária para concretizar os objectivos da investigação. Por outras palavras, a
validação de um instrumento é um “processo que nos permite determinar se esse
instrumento mede o que pretende medir”(Morgado,2000: 123).
É consensual a asserção de que validade e fidelidade ou fiabilidade são duas das
características que um instrumento deve ter para assegurar a qualidade do dados. Na
opinião de Coutinho (2004), tratam-se de conceitos distintos porém intimamente
relacionados, a validade representa a qualidade dos resultados da investigação, na
medida em que os possamos aceitar como factos indiscutíveis, ao passo que um
instrumento é fiável se aplicado duas vezes ao mesmo fenómeno/situação fornece os
mesmos resultados, independentemente das circunstâncias da aplicação, do instrumento
ou do investigador.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
109
No nosso caso, o processo de validação dos instrumentos de recolha de dados
efectuou-se em dois momentos, a priori1 e a posteriori.
Assim, começámos por elaborar guiões escritos quer para o questionário, quer
para a entrevista. Esses guiões continham os objectivos que pretendíamos alcançar com
a investigação e aos quais fizemos corresponder um número considerável de questões,
redigidas a partir da consulta bibliográfica efectuada.
Como formas de validação a priori, e para verificar a fidelidade de ambos os
instrumentos, ao considerarmos que o processo de elaboração dos guiões tinha chegado
a um patamar relativamente definitivo e consistente, levamos a cabo um processo de
consulta a alguns especialistas na área de desenvolvimento curricular, com o intuito a
obter o acordo entre os juizes relativamente à pertinência e adequação das questões aos
objectivos a avaliar.
Seguidamente, no caso do questionário, elaborámos uma primeira versão que foi
testado por um grupo de professores com características idênticas aos da amostra2. O
pré-teste do questionário teve como finalidade verificar se havia falhas na redacção das
questões, bem como aferir a validade do mesmo, verificando se as questões estavam
adequadas aos objectivos definidos e à temática do estudo.
Como forma de validação a posteriori, apesar de também serem variados os
métodos que existem para calcular o coeficiente de fidelidade, no caso dos questionário,
dado o número reduzido de itens em análise, optámos por calcular o coeficiente Alpha
de Cronbach por dimensão e por ser o mais aconselhado para a consistência interna de
instrumentos de tipo escala de Likert. Aliás, “em caso de recurso à estatística, a
fidelidade tem um sentido bem preciso”, na medida em que se trata de “saber se o
instrumento de medida utilizado permite realmente obter todas as informações numa
base comparável e de uma maneira constante” (Deshaies, 1997: 371). Os resultados
obtidos através do cálculo do coeficiente Alpha de Cronbach são os apresentados no
Quadro 7.
1 Para De Ketele e Roegieus (1999:229) “quando um dispositivo se baseia na utilização de um utensílio
determinado, é necessário validar esse utensílio antes de o utilizar. Esta validação é uma validação a
priori.”2 O pré-teste do questionário foi aplicado a 18 professores do 1º ciclo do Ensino Básico do Concelho deViana do Castelo.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
110
Dimensões Coeficiente Alpha de CronbachN.º de itens da
dimensão
Dimensão 1 0,707 5
Dimensão 2 0,599 10
Dimensão 3 0,578 8
Quadro 7 – Alphas obtidos de acordo com as dimensões do questionário
Partindo do pressuposto que 0,50 é um valor aceitável, a observação do quadro
anterior permite-nos constatar que todas as dimensões apresentam um valor de alpha de
Cronbach superior, o que evidencia alguma consistência interna do instrumento de
recolha de dados.
No caso das entrevistas, como forma de validação à posteriori, após ter sido
efectuada a transcrição, esta foi fornecida aos entrevistados juntamente com um Cd
Rom contendo a respectiva gravação áudio, que os mesmos leram e efectuaram as
alterações e/ou correcções que acharam pertinentes, procuramos por este processo aferir
a validade das entrevistas.
3. POPULAÇÃO E AMOSTRA
3.1. Inquérito por questionário
Para a recolha de dados quantitativos, através de questionário, procurámos
delimitar uma amostra representativa3 da população em estudo. Começámos por definir
um campo específico de estudo, que englobou os professores do 1º Ciclo do Ensino
Básico que, no ano lectivo 2005/2006, exerceram funções em Escolas públicas do 1º
Ciclo do Ensino Básico, no Concelho de Barcelos, num total de 396 professores.
No quadro 8 apresenta-se a distribuição dos 396 professores pelos 11
agrupamentos de escolas que constituem a população abrangida por este estudo. O
levantamento desta informação foi efectuado quer telefonicamente, quer pessoalmente,
junto da secretaria e/ou do concelho executivo de cada agrupamento de escolas, do
concelho de Barcelos.
3 Bryman & Cramer (1993: 122) afirmam que uma amostra só se considera representativa quando pode ser tratadacomo se fosse a própria população.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
111
Agrupamentos de Escolas N.º de Professores
Agrupamento Vertical de Escolas Abel Varzim 38
Agrupamento Vertical de Escolas Gonçalo Nunes 38
Agrupamento Vertical de Escolas Vale do Tamel 38
Agrupamento Vertical de Escolas de Manhente 33
Agrupamento Vertical de Escolas Vale D’Este 35
Agrupamento Vertical de Escolas Cavado Sul 66
Agrupamento Vertical de Escolas de Fragoso 25
Agrupamento Vertical de Escolas de Vila Cova 17
Agrupamento Horizontal de Escolas Monte Lousado 35
Agrupamento Horizontal de Escolas Gonçalo Pereira 60
Agrupamento Horizontal de Escolas Horizontes do Este4 11
Total 396
Quadro 8– N.º de professores do 1º ciclo por agrupamento - Concelho de Barcelos - Ano lectivo
2005/2006
Uma vez que pretendíamos constituir uma amostra representativa da população
em estudo, evitando assim a constituição de uma amostra demasiado grande ou
excessivamente pequena, utilizámos a fórmula proposta por Bernstein (1965: 188) para
o cálculo de amostras em populações finitas.
Fórmula
Cálculo da Amostra:
4 Trata-se de um agrupamento pluri-municipal, abrangendo escolas de 3 concelhos (Barcelos, Braga eVila Nova de Famalicão) mas para o presente estudo foram apenas considerados os professores queleccionaram nas escolas pertencentes ao concelho de Barcelos.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
112
A amostra representativa da população em estudo foi constituída por 195
professores.
3.2. Inquérito por entrevista
No que diz respeito à recolha de dados qualitativos, através das entrevistas, foi
definida uma amostragem de conveniência5, pois, como só dispúnhamos de tempo para
entrevistar um número restrito de pessoas, decidimos entrevistar professores que
desempenhavam diversos cargos no Conselho Executivo e um no Conselho Pedagógico.
Como refere Moreira (1994: 78), este tipo de amostras são “ ideais quando se preparam
guias de entrevista”, tratando-se do tipo de amostragem mais utilizado em estudos
exploratórios ou qualitativos.
Contudo, trata-se de um método pouco rigoroso e sem rigor estatístico, uma vez
que o entrevistador selecciona os inquiridos a que tem acesso, partindo do princípio de
que estes, de alguma forma, representam a população.
No quadro 9 apresenta-se a distribuição dos oito entrevistados em função do
cargo que ocupam quer no Conselho Executivo, quer no Conselho Pedagógico (caso dos
Coordenadores do Conselho de Docentes) do agrupamento a que pertencem.
Entrevistados Cargo que desempenham
E1 Assessor do Conselho Executivo
E2 Assessor do Conselho Executivo
E3 Presidente do Conselho Executivo
E4 Coordenador do Conselho de Docentes do 1º Ciclo
E5 Vice-presidente do Conselho Executivo
E6 Coordenador do Conselho de Docentes do 1º Ciclo
E7 Presidente do Conselho Executivo
E8 Vice-presidente do Conselho Executivo
Quadro 9 – N.º de professores entrevistados e os cargos que desempenham
5 Moreira (1994: 77)
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
113
3.3. Procedimentos
Para constituir a amostra de conveniência e para distribuir e recolher os
questionários encetámos alguns procedimentos, dos quais importa dar conta.
Em primeiro lugar, contactámos os Conselhos Executivos dos agrupamentos
para os informar da nossa intenção de realizar um estudo, no concelho de Barcelos
sobre projecto curricular de turma, solicitando a sua colaboração, para poder concretizar
este trabalho de investigação.
Uma vez que todos se mostraram muito receptivos, marcámos uma primeira
reunião onde, pessoalmente, lhes fornecemos questionários em número suficiente para
serem distribuídos aos professores. Pedimo-lhes que a distribuição fosse feita de forma
aleatória e que, depois de preenchidos, procedessem à recolha dos questionários, pela
forma que julgassem mais oportuna.
Esta reunião serviu, também, para expressarmos a nossa intenção de, no âmbito
deste estudo, realizar algumas entrevistas aos professores que ocupam diferentes cargos
do Órgão de Gestão e Administração de cada agrupamento.
Em requerimento dirigido ao Senhor Director Regional de Educação do Norte
(Anexo 5) solicitámos a necessária autorização para poder recolher dados junto dos
professores do 1º Ciclo do Ensino Básico, o que mereceu e despacho de “autorizo”
(Anexo 6).
Para a realização das entrevistas, procedeu-se a um primeiro contacto com os
professores a entrevistar, tendo-lhes fornecido uma carta de apresentação e um guião da
entrevista (Anexo 4). Após a sua anuência em participar no estudo, foi agendado o
encontro para a realização da entrevista. No dia da entrevista, forneceu-se um conjunto
de informações preliminares, embora algumas delas tivessem já sido fornecidas
anteriormente, tais como, os objectivos da investigação, a explicação do método através
do qual foram escolhidas as pessoas a entrevistar, bem como a garantia de anonimato e
a confidencialidade dos relatos produzidos.
Procurou-se, na medida do possível, realizar as entrevistas num ambiente
adequado e com ausência de interferências. Durante a conversa tentou seguir-se a
dinâmica adoptada por Pacheco (1995: 86), segundo a qual a principal preocupação do
investigador é “saber escutar, saber responder e saber dar pistas, procurando assim
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
114
12,31%
87,69%
MasculinoFeminino
Sexo
evitar-se a sensação de estar a examinar os entrevistados através de um interrogatório”.
Além disso, e de acordo com o mesmo autor (idem, ibidem), procurámos não induzir as
respostas sem prejuízo de explorarmos ”a consistência e coerência de ideias.”
Tendo em conta que a qualidade das entrevistas é tanto maior quanto mais
ampla for a exactidão das respostas produzidas, optámos pelo registo dos dados em
suporte magnético tendo, para o efeito, recorrido a um gravador digital.
3.4. Caracterização da Amostra
3.4.1. Inquérito por questionário
A caracterização dos 195 dos professores, que constituem a amostra da
população em estudo e que foram inquiridos através de um questionário, fez-se a partir
das seguintes variáveis: sexo, idade, tempo de serviço, habilitações académicas,
situação profissional e ano(s) de escolaridade de leccionam. Para facilidade de leitura,
os resultados obtidos foram organizados em gráficos, em função de cada uma das
variáveis expressas.
Sexo
Do total de respondentes, a maioria (87,7%) são do sexo feminino (Gráfico 1).
Um resultado que não nos surpreende pois, desde há muito tempo que se verifica que no
1º Ciclo do Ensino Básico existem predominantemente mulheres.
Gráfico 1- Dados relativos ao sexo
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
115
45,64%
35,9%
18,46%
Mais de 45
De 30 a 45
Menos de 30
Idade
52,82%
20,51%
26,67%
Mais de 21 anos11-20 anos1-10 anos
Tempo de Serviço
Idade
Quanto à idade, verificámos que 45,6% dos inquiridos se situam na faixa etária
mais alta, isto é, têm mais de 45 anos, e que 35,9% têm entre 30 e 45 anos. Apenas
18,2% dos professores da amostra têm menos de 30 anos (Gráfico 2).
Os dados referidos permitem-nos constatar que estamos perante um conjunto de
professores de “média” idade, o que deixa notar tratar-se de um colectivo profissional
com alguma experiência.
Gráfico 2- Dados relativos à idade
Tempo de Serviço
A maioria dos 195 respondentes tem mais de 21 anos de serviço (52,8%),
enquanto que 26,7% têm entre 11 e 20 anos e serviço e 20,5% entre 1 e 10 anos de
serviço (Gráfico 3).
Gráfico 3- Dados relativos ao tempo de serviço
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
116
0,51%
31,28%
66,15%
2,05%
Outra
BacharelatoLicenciaturaMestrado
Habilitações Académicas
Habilitações Académicas
Relativamente às habilitações académicas, a maioria dos inquiridos (66,15%)
são portadores de uma licenciatura, cerca de 31,3 % possuem um Bacharelato e apenas
2,1% um mestrado (Gráfico 4). Em qualquer dos casos, estamos perante um nível de
ensino onde, no geral, os professores só podem leccionar de tiverem habilitação
académica ou profissional para o efeito.
Gráfico 4- Dados relativos às habilitações académicas
Situação Profissional
Relativamente à situação profissional dos inquiridos, podemos observar pela
análise do Gráfico 5 que 49,74% pertencem ao quadro de zona pedagógica e 34,4% ao
quadro de nomeação definitiva ou ao quadro de nomeação provisória, embora exista um
número ainda significativo(15,9) de professores Contratados.
Pela comparação desta variável com a variável anterior - habilitações
académicas -, podemos presumir que os professores do quadro de nomeação definitiva e
do quadro de nomeação provisória são, na sua maioria, detentores de um bacharelato.
Não nos surpreende que assim seja, uma vez que os professores com mais tempo de
serviço frequentaram o antigo Curso do Magistério Primário.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
117
15,9%
49,74%
3,08%
31,28%
Contratado
PQZPPQNPPQND
Situação Profissional
Gráfico 5- Dados relativos à situação profissional
Anos de escolaridade que leccionam
Para organizar os dados relativos aos anos de escolaridade que os professores
leccionam construímos o Quadro 10. A análise do quadro permite-nos a verificar que
existe uma grande diversidade, relativamente à composição das turmas leccionadas
pelos professores inquiridos.
Do total de inquiridos, 49,2% leccionam turmas compostas por apenas um ano
de escolaridade, enquanto que 42,1% leccionam turmas com dois anos de escolaridade,
3% leccionam turmas com três anos de escolaridade e 2,1% leccionam turmas com
quatro anos de escolaridade (Quadro 10).
Trata-se de uma situação preocupaste, uma vez que, embora sendo todos
docentes do 1.º Ciclo do Ensino Básico, exercem a sua profissão em contextos de sala
de aula bastante distintos, facto que, por si só, pode ter reflexos nas tarefas que hoje
estão consignadas a todos os docentes, e particular a elaboração do projecto curricular
de turma.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
118
Anos de escolaridade que lecciona Frequência Percentagem
1º ano de escolaridade 32 16,4
4º ano de escolaridade 27 13,8
2º,3º anos 22 11,3
3º ano de escolaridade 20 10,3
3º,4º anos 17 8,7
2º ano de escolaridade 17 8,7
1º,2º anos 15 7,7
1º,4º anos 12 6,2
2º,4º anos 10 5,1
Sem turma 7 3,6
1º,3º anos 6 3,1
1º, 2º, 3º, 4º anos 4 2,1
1º, 2º, 3º anos 2 1,0
1º,3º,4º anos 2 1,0
2º,3º,4º 1 0,5
1º,2º,4º anos 1 0,5
Total 195 100,0
Quadro 10 – Dados relativo ao(s) ano(s) de escolaridade leccionados
Pela análise global dos dados obtidos através da caracterização da amostra,
podemos constatar que se trata de um conjunto de professores maioritariamente do sexo
feminino o que é bastante comum no 1º Ciclo do Ensino Básico, principalmente entre
professores possuidores de alguma experiência, quer em função da idade, quer em
função do tempo de serviço.
Trata-se pois, na maioria, de uma amostra de professores com mais de 45 anos
de idade, mais de 21 anos de tempo de serviço e com uma situação profissional estável,
pertencendo na sua maioria aos Quadros do Nomeação Definitiva e Provisória. Os
professores questionados também investiram na sua formação, tendo, em alguma altura
da sua carreira, feito uma especialização ou complemento de forma a obterem a
licenciatura, verificando-se uma percentagem menor, ainda que considerável, de
professores que não enveredaram por esse caminho, continuando a possuir o
Bacharelato.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
119
Por outro lado, estamos perante uma amostra representativa deste concelho onde
apenas uma pequena parte dos professores são jovens, isto é, com menos de 30 anos de
idade, sendo estes, muito provavelmente, alguns dos professores do Quadro de Zona
Pedagógica e os professores Contratados. Juntos estes representam a maioria dos
professores do concelho (64,64%), o que nos leva a concluir que há uma grande
mobilidade entre os docentes do concelho de Barcelos, ou seja, mais de metade dos
professores que constituem a amostra, até agora, podiam muito certamente, mudar de
escola todos os anos lectivos, o que obviamente acarreta prejuízos, quer para eles
próprios, quer para os alunos.
3.4.2. Inquérito por entrevista
A caracterização dos 8 professores que constituem a amostra dos inquiridos por
entrevista fez-se a partir das seguintes variáveis: sexo, idade, tempo de serviço,
habilitações académicas e situação profissional.
F 6Sexo
M 2
Menos de 30 1
De 30 a 45 3Idade
Mais de 45 4
1 – 10 anos 1
11 – 20 anos 2Tempo de serviço
Mais de 21 anos 5
Licenciatura 1
Mestrado 1HabilitaçõesAcadémicas
Outra (Magistério Primário + Especialização) 6
PQND 4Situaçãoprofissional PQZP 4
Quadro 11 – Caracterização da amostra da entrevista
Da análise do quadro anterior podemos constatar que dos oito professores
entrevistado apenas dois são do sexo masculino e quatro são do feminino, o que segue a
tendência da amostra dos questionários. De igual forma, a maioria dos entrevistados têm
mais de 30 anos de idade (7), sendo que apenas um professor tem menos de 30 anos.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
120
Quanto ao tempo de serviço, cinco professores possuem mais de 21 anos de
tempo de serviço, dois têm entre 11 e 20 anos de tempo de serviço e apenas um tem
menos de 10 anos de tempo de serviço.
A situação profissional dos entrevistados está distribuída equitativamente, sendo
que quatro pertencem ao Quadro de Nomeação Definitiva e quatro são docentes do
Quadro de Zona Pedagógica.
Apesar de se tratar de uma amostra com um número reduzido de professores,
podemos considerá-la considerar heterogénea, à semelhança do que se verificou com a
amostra de professores respondentes ao questionário.
4. Técnicas de Análise de Dados
Numa investigação os dados recolhidos necessitam de ser organizados e
analisados. Para o efeito, e de acordo com as técnicas de recolha de dados utilizadas –
inquéritos por questionário e inquéritos por entrevista -, recorremos a uma análise
estatística e a uma análise de conteúdo.
4.1. Análise estatística
Um dos maiores desafios, talvez o mais aliciante, com que nos defrontamos
neste projecto de investigação, foi o de tentar descobrir algumas representações ocultas
no amontoado de dados que recolhemos, procurando assim interpretar o que, na
realidade, os professores faziam e fazem no âmbito dos projectos curriculares de turma.
Além disso, tivemos ainda a preocupação de apresentar os resultados do estudo
de forma clara e concisa, de modo a facilitar a sua leitura. No caso dos dados recolhidos
através dos questionários, procedemos a uma análise estatística, tendo procedido ao
cálculo dos seguintes valores:
a ) distribuição de frequência – é um dos procedimentos mais utilizados neste
tipo de situações, uma vez que “as variáveis” se agrupam em categorias “ a distribuição
das frequências é um processo que permite através do valor da percentagem, verificar a
“maior ou menor ocorrência de cada categoria, o que nos permite ajuizar acerca da
preponderância com que cada um ocorre na amostra”(Morgado, 1998: 218-219).
b) medidas de tendência central- i) a média é uma medida de tendência central
que se utiliza para estudar e comparar valores, não é mais do que a média
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
121
aritmética que resulta da soma dos scores e dividindo pelo número deles
(Coutinho, 2004);
ii) a mediana “é o ponto que divide uma determinada distribuição de valores em
duas metades” (Morgado, 1998: 219);
iii) a moda “é definida como o valor que ocorre com maior frequência na
distribuição”(idem, ibidem);
c) medidas de dispersão- são medidas que reflectem “a disseminação dos
valores em relação à média”, cujos indicadores nos permitem “conhecer a variação que
a distribuição de valores evidencia”(idem: 220). O mais usual é o desvio-padrão, uma
medida que permite avaliar “o maior ou menor grau em que os valores de uma
determinada distribuição se afastam da média” (idem, ibidem) expressando, de forma
fiável, o grau de consenso entre os respondentes.
d) medidas de relação – são medidas que permitem avaliar a relação entre duas,
ou mais, variáveis, nomeadamente, consideram-se as seguintes medidas de relação:
i) a medida quantitativa da correlação, designada por coeficiente de correlação,
é uma medida de associação linear entre duas variáveis, os valores vão de –1 a
+1, correspondendo o zero a não haver correlação, ou seja, são variáveis
independentes;
ii) a matriz de correlação, uma tabela que “representa os coeficientes de
correlação entre variáveis distintas, identificando-se nesta matriz possíveis pares
de relação”, bem como a intensidade dessa relação, de acordo com os valores
obtidos, a relação considera-se, ou não, significativa, neste sentido, “grande
parte dos autores consideram aceitáveis coeficientes de valor > 0.30.”(idem,
ibidem);
iii) no caso das variáveis independentes (nominais ou ordinais) o cálculo do
coeficiente de correlação prevê a organização dos dados numa tabela, designada
de tabela de contingência, sendo o seu objectivo permitir verificar se a
distribuição de uma das varáveis se relaciona, ou é contingente, com a outra, isto
é, estas tabelas permitem-nos associar variáveis independentes (sexo, idade) com
variáveis dependentes (crenças, atitudes) (idem).
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
122
Para o tratamento estatístico dos dados, necessário para obter os valores acima
referidos e respectivas análises, recorremos a programa SPSS. Começámos por
organizar os dados, agrupando-os em categorias/dimensões definidas a priori,
apresentando-os em tabelas de frequência, em que, a cada categoria está associado o
respectivo número de ocorrências. Nessas tabelas incluímos também a percentagem que
expressa a proporção de cada categoria no total da amostra. Os dados das tabelas foram
posteriormente organizados graficamente, através de gráficos de barras.
Na maioria das questões, os professores inquiridos responderam através de uma
escala de valores (escala de Likert), tendo, para uma análise mais abrangente dos dados
e para facilitar a sua leitura, organizado os mesmos em três níveis6.
Nível Média de avaliação Significado da avaliação
1
2
3
1.0 a 2.5
2.6 a 3.5
3.6 a 5.0
Claramente inadequado
Indefinição avaliativa
Claramente adequado
No que se refere às medidas de tendência central, recorremos ao cálculo da
média, por ser a operação mais utilizada e por estar associada à medida de dispersão que
utilizámos, o desvio-padrão. O desvio-padrão fornece indicações muito precisas sobre
as medidas de dispersão das pontuações numa distribuição, demonstrando se estas se
afastam ou não da média, indicando, por isso, o grau de consenso, cujo valor
interpretámos com base nos seguintes critérios8:
Valor do desvio-padrão Nível de consenso
0,00 a 0,29
0,30 a 0,59
0,60 a 0,89
mais de 0,90
Consenso alto
Consenso moderado/alto
Consenso moderado/baixo
Consenso baixo
Por fim, as medidas de relação foram calculadas para averiguar o grau de
relação entre as variáveis de cada dimensão. Atendendo ao tipo e à natureza das
variáveis em estudo, decidimos recorrer ao cálculo do coeficiente de correlação de
Spearman.
6 Adaptado de Morgado (2000: 126)
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
123
4.2. Análise de conteúdo
O conteúdo das entrevistas, bem como do conteúdo das questões abertas do
questionário foram objecto de uma análise de conteúdo, já que esta técnica constitui um
recurso eficaz para a sistematização da informação recolhida.
A análise de conteúdo é uma técnica de investigação que “permite a descrição
objectiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto da comunicação” (Berelson,
1952, cit. por Vala, 1986: 103).
Porém, é preciso ter em atenção que “o material sujeito à análise de conteúdo é
concebido como o resultado de uma rede complexa de condições de produção, cabendo
ao analista construir um modelo capaz de permitir inferências sobre uma ou várias
condições de produção” Vala (1986: 104).
Assim, “a análise de conteúdo aparece como um conjunto de técnicas de análise
das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objectivos de descrição do
conteúdo das mensagens”(Bardin, 2004:33)
Nessa perspectiva,. a análise de conteúdo, como refere Vala (2003:108-109)
“pressupõe o seguinte tipo de operações mínimas:
- Delimitação dos objectivos e definição de um quadro de referência teórico orientadorda pesquisa;
- Constituição de um corpus;
- Definição de categorias;
- Definição de unidades de análise.(…)
- A quantificação
(…) pressupõe a elaboração de um conjunto de procedimentos que permitam assegurar asua fidedignidade e validade.”
Uma vez transcritas as entrevistas procedeu-se ao levantamento da informação
contida no seu corpus, optámos pela categorização7 para organizar o procedimentos de
análise, construção que foi feita a priori e a posteriori8. Ou seja, a definição de
objectivos que pretendíamos estudar com a entrevista permitiu-nos a formulação de um
sistema de categorias que posteriormente foi alvo de reformulação.
7 Bardin (2004:111) define categorização como “uma operação de classificação de elementosconstitutivos de um conjunto, por diferenciação e, seguidamente, por reagrupamento segundo o género(analogia, com critérios previamente definidos”8 Vala (2003:111) refere que a construção de um sistema de categorias pode ser feita a priori ou aposteriori, ou ainda através da combinação destes dois processos”.
CAPÍTULO V – Metodologia da Investigação
124
Definidas as categorias verificámos se estas eram boas ou más9, procurámos
assegurar-nos da sua exaustividade e exclusividade, no primeiro caso, garantir que todas
as unidades de registo possam ser colocadas numa categoria e, no segundo, que uma
unidade de registo só caiba numa categoria.
No entender de Vala (2003:114) uma análise de conteúdo requer a definição de
três tipos de unidades: unidade de registo, unidade de contexto e unidade de
enumeração. A unidade de contexto foi considerada a resposta do entrevistado a cada
questão e a unidade de registo segmento desse contexto (uma afirmação, uma
declaração, um juízo), uma frase ou um elemento da frase. Seguidamente, procedeu-se à
quantificação através das unidades de enumeração que nos permitiu contar a frequências
das categorias (Anexo 10).
No caso da análise do conteúdo das questões abertas dos questionários,
efectuou-se um primeiro levantamento da informação contida no corpus de cada
resposta (Anexos 7,8,9) para posteriormente ser organizada e apresentada
complementarmente às dimensões com que apresentam maior relação.
9 Para Bardin (2004:113-114) “Existem boas e más categorias. Um conjunto de categorias boas devepossuir as seguintes qualidades: a exclusão mútua; a homogeneidade; a pertinência; a objectividade e afidelidade; a produtividade.”
CAPÍTULO VI
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
126
1. Inquérito por questionário
No presente capítulo procedemos à apresentação e discussão dos resultados
obtidos, de acordo com um dos instrumentos utilizados para a recolha de dados na
investigação por nós realizada.
No que diz respeito ao questionário, como este contém um grande número de
itens, a apresentação dos dados obtidos através das questões de resposta fechada será
efectuada em função das dimensões e dos objectivos específicos predefinidos, embora
possamos recorrer a uma análise mais pormenorizada em alguns itens. No que concerne
às questões de resposta aberta, estas foram alvo de uma análise de conteúdo, cuja
análise será efectuada de acordo com a dimensão com que apresentam maior relação
temática.
Para facilitar a leitura dos resultados procedemos à elaboração de gráficos,
quadros e tabelas quer por dimensões, quer por item, quer ainda por aspectos
específicos que foram objecto do estudo.
As dimensões consideradas como estruturantes quer do questionário, quer da
entrevista são apresentadas no quadro 12 .
Dimensões
1. Projecto Curricular
2. Desenvolvimento do Projecto Curricular de Turma
3. Constrangimentos e vantagens da utilização do Projecto Curricular de Turma
Quadro 12 - Dimensões estruturantes do questionário
1.1. Projecto Curricular
Embora, nos tempos mais recentes, a expressão projecto curricular seja
frequentemente utilizada, quer ao nível nos discursos educativos, quer no âmbito da
produção normativa que enquadra o processo de desenvolvimento curricular, a verdade
é que se trata de um conceito polissémico, sendo, por isso, susceptível de interpretações
distintas.. Nem sempre as referências à expressão projecto curricular é clara para os
professores, tanto no que respeita às suas finalidades, quanto ao seu conteúdo.
Por conseguinte, tornava-se pertinente questionar os professores relativamente
às suas concepções sobre os projectos curriculares de escola e de turma. Para o efeito,
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
127
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
O projecto curricular de escola pretende adequar ocurrículo nacional à especificidade dos alunos da
O projecto curricular de turma pretende adequar ocurrículo aos alunos de uma turma específica
O projecto curricular de escola elabora-se em função docurrículo nacional e do projecto educativo de escola.
O projecto curricular de turma deve ter por referência oprojecto curricular da escola.
A construção do projecto curricular de turma contribuipara o sucesso educativo dos alunos.
Concordam Discordam Não têm opinião
disponibilizamos algumas questões construídas quer em torno do conceito de projecto
curricular, quer de um conjunto de aspectos que, directa ou indirectamente, estão
associados à sua concepção e implementação. Os resultados obtidos encontram-se
sistematizados no Gráfico 6.
Gráfico 6 - Projecto Curricular
De um modo geral verificamos que a grande maioria dos professores concorda
com as propostas conceptuais apresentadas.
Relativamente aos referentes que devem presidir à construção do projecto
curricular de turma, elaboramos algumas questões a que, inevitavelmente, se associa
algumas finalidades bem perceptíveis.
Quanto à construção do projecto curricular de turma contribuir para o sucesso
educativo dos alunos, podemos verificar que a maioria de professores inquiridos
(70,8%) considera tratar-se de um elemento fundamental, existindo ainda uma
percentagem significativa – 15,9% discordam desta posição e 13,3% não se pronunciam
– que pensa de forma diferente.
Cerca de 83,1% dos inquiridos concorda que o projecto curricular de escola
deve procurar adequar o currículo nacional à especificidade dos alunos da escola.
Porém, 14,9% não emitem opinião e apenas uma pequena percentagem (2%) discorda.
Em idêntica linha de pensamento, 81,5% dos inquiridos defende que o projecto
curricular de escola se deve elaborar em função do currículo nacional e do projecto
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
128
educativo, discordando desta opinião apenas 1,5% dos respondentes, ao passo que 17%
não têm opinião formada a este respeito.
Em face dos resultados anteriores, não nos surpreende que a maioria dos
professores (85,6%) afirme que o projecto curricular de turma deve adequar o currículo
nacional aos alunos de uma turma específica. Discordam desta opinião 4,5% dos
inquiridos e 8,7% não se pronunciam.
Sobre a necessidade do projecto curricular de turma ter por referência o projecto
curricular de escola, também os resultados, em função da posição que os inquiridos
tinham manifestado, não foram surpreendentes: a maioria (82,6%) concorda que assim
seja, 13,3% não emitem opinião e apenas 4,1% discorda.
Pela análise global dos resultados é possível verificar que, de uma maneira
geral, os professores concordam que o projecto curricular de turma pode contribuir para
o sucesso educativo dos alunos e tem como finalidade adequar o currículo nacional a
cada contexto escolar específico, em particular aos alunos de cada turma. Da mesma
forma, defendem que a elaboração deste projecto deve ter por referência o projecto
curricular de escola/agrupamento. A opinião da maioria dos inquiridos considera ainda
que o projecto curricular de escola/agrupamento, deve ser elaborado em função do
projecto educativo e do currículo nacional, com o intuito de adequar o currículo
nacional às especificidades dos alunos de cada estabelecimento de ensino, contribuindo
assim para que cada um deles possa realizar as aprendizagens aí previstas.
A partir da análise da médias obtidas podemos verificar que os professores
evidenciam uma opinião claramente adequada em relação ao conjunto dos itens desta
dimensão (x=3,98)1.
Conforme se pode observar no gráfico 7, a opinião dos professores é claramente
concordante tanto em relação à construção do projecto curricular de escola pretender
adequar o currículo nacional à especificidade dos alunos da escola (x = 3,99), como
relativamente ao facto do projecto curricular de turma pretender adequar o currículo aos
alunos de uma turma específica (x=4,09). É ainda claramente adequada a opinião dos
inquiridos relativamente ao projecto curricular de escola ser elaborado em função do
projecto educativo e do currículo nacional (x=4,02), ao projecto curricular de turma
1 Média aritmética das médias dos itens da dimensão em análise.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
129
3,5 3,6 3,7 3,8 3,9 4 4,1 4,2
O projecto curricular de escola pretende adequar ocurrículo nacional à especificidade dos alunos da
escola.
O projecto curricular de turma pretende adequar ocurrículo aos alunos de uma turma específica
O projecto curricular de escola elabora-se emfunção do currículo nacional e do projecto
educativo de escola.
O projecto curricular de turma deve ter porreferência o projecto curricular da escola.
A construção do projecto curricular de turmacontribui para o sucesso educativo dos alunos.
dever ter por referência o projecto curricular de escola (x=4,07) e à possibilidade de
contribuir para o sucesso educativo dos alunos (x=3,75).
Gráfico 7- Projecto Curricular (Médias das respostas)
No que diz respeito aos valores do desvio-padrão, a partir do valor médio da
dimensão (0,80), verifica-se um consenso moderado/baixo entre os respondentes,
registando-se uma relativa dispersão nas respostas, com valores que oscilam entre 0,66
e 1,09 (Quadro 13).
Itens Valores do desvio-padrão
3. O projecto curricular de escola pretende adequar o currículonacional à especificidade dos alunos da escola.
0,66
4. O projecto curricular de turma pretende adequar o currículoaos alunos de uma turma específica.
0,81
5. O projecto curricular de escola elabora-se em função docurrículo nacional e do projecto educativo de escola.
0,67
6. O projecto curricular de turma deve ter por referência oprojecto curricular da escola.
0,76
7. A construção do projecto curricular de turma contribui parao sucesso educativo dos alunos.
1,09
Quadro 13 – Valores do desvio-padrão relativos à dimensão 1
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
130
As relações entre as variáveis desta dimensão encontram-se expressas no quadro
14.
3. 4. 5. 6. 7.3. O projecto curricular de escola pretende adequar o currículonacional à especificidade dos alunos da escola.
1
4. O projecto curricular de turma pretende adequar o currículoaos alunos de uma turma específica.
0,611 1
5. O projecto curricular de escola elabora-se em função docurrículo nacional e do projecto educativo de escola.
0,471 0,431 1
6. O projecto curricular de turma deve ter por referência oprojecto curricular da escola.
0,317 0,294 0,489 1
7. A construção do projecto curricular de turma contribui parao sucesso educativo dos alunos. 0,368 0,352 0,240 0,302 1
Quadro 14 - Matriz de correlação relativa à dimensão 1
Pela análise do quadro, verifica-se que o coeficiente de correlação obtido é, na
maior parte dos casos, superior a 0,30, pelo que, em média, há uma correlação
significativa e positiva entre as variáveis em estudo, referentes ao projecto curricular.
Após a análise dos coeficientes de correlação podemos concluir que há uma
correlação significativa entre os itens referentes às finalidades do projecto curricular de
escola e do projecto curricular de turma (0,611), o que nos leva a deduzir que os
professores consideram importante que o currículo nacional seja adequado às diferentes
escolas e às suas turmas especificas das mesmas.
Significativas e positivas são também as correlações relativas à elaboração dos
projectos curriculares de escola e de turma, concluindo-se que os professores acham
importante a relação existente entre estes projectos, na medida em que o projecto
curricular de turma deve ter por referência o projecto curricular de escola e este, por sua
vez, ser elaborado em função do currículo nacional e do projecto educativo (0,489).
Por conseguinte, os itens relativos às finalidades do projecto curricular de escola
e de turma apresentam coeficientes de correlação positivos de 0,471 ( entre o item 5” O
projecto curricular de escola elabora-se em função do currículo nacional e do projecto
educativo de escola” e o item 3 “O projecto curricular de escola pretende adequar o
currículo nacional à especificidade dos alunos da escola”), de 0,431 ( entre o item 5 ” O
projecto curricular de escola elabora-se em função do currículo nacional e do projecto
educativo de escola” e o item 4 “O projecto curricular de turma pretende adequar o
currículo aos alunos de uma turma específica” ) e de 0,317 (entre o item 6 ” O projecto
curricular de turma deve ter por referência o projecto curricular da escola” e o item 3 “O
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
131
projecto curricular de escola pretende adequar o currículo nacional à especificidade dos
alunos da escola”).
Significativas são também as correlações relativas aos itens referentes à
construção do projecto curricular de turma como contributo para o sucesso educativo
dos alunos e com o mesmo pretender adequar os currículo nacional aos mesmos (0,352)
bem como as que se referem ao projecto curricular de escola adequar o currículo
nacional ao alunos da escola e contribuir também para o sucesso educativo (0,368).
Em suma, podemos concluir que há uma relação muito forte entre o projecto
curricular de escola e o projecto curricular de turma, quer ao nível da sua elaboração,
quer nas suas finalidades, sendo uma das mais importantes, a promoção do sucesso
educativo dos alunos.
Ainda no que diz respeito às concepções dos professores inquiridos sobre o
projecto curricular, foi-lhes pedido que indicassem se conheciam, ou não, o projecto
educativo e o projecto curricular dos seus agrupamentos. Os dados encontram-se
descritos na tabela 1.
Frequência Percentagem
Sim 179 91,8
Não 16 8,2
Total 195 100,0 Tabela 1 - Tabela de frequência relativa ao item 1 do questionário
Foi-nos possível constatar que a grande maioria (91,8%) conhece o projecto
educativo do agrupamento a que pertence, existindo apenas 8,2% dos professores
inquiridos que admitem não conhecer tal documento.
Relativamente ao projecto curricular de agrupamento verifica-se uma situação
semelhante, já que 90,8% dos inquiridos conhecem o projecto curricular do
agrupamento e 9,2% diz não o conhecer (Tabela 2).
Tabela 2 - Tabela de frequência relativa ao item 2 do questionário
Frequência Percentagem
Sim 177 90,8
Não 18 9,2
Total 195 100,0
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
132
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
É usual, o Conselho de Docentes a que pertençoconvocar reuniões apenas para elaborar o projecto
curricular de turma.
A construção do projecto curricular de turma é umatarefa que cada professor/a do 1º Ciclo do Ensino
Básico concretiza sozinho/a.
O Conselho de Docentes a que pertenço procuraestimular o trabalho colectivo dos professores para a
elaboração de projectos curriculares
O Conselho de Docentes a que pertenço fornece oapoio necessário para elaborar o projecto curricular
de turma
Concordam Discordam Não têm opinião
Em qualquer dos casos, consideramos que existe uma percentagem significativa
de professores que não conhecem o projecto educativo e o projecto curricular do
agrupamento a que pertencem, já que se trata de documentos fundamentais para a
gestão curricular ao nível local.
Com base na análise das tabelas de contingência relativas ao cruzamento dos
itens desta dimensão com as variáveis idade e tempo de serviço verificámos não
existirem divergências significativas.
1.2. Desenvolvimento do projecto curricular de turma
Parece não suscitar controvérsia a ideia de que o desenvolvimento de um
projecto deverá compreender três etapas distintas, embora profundamente interligadas
entre si, o que não permite perspectivá-las de forma isolada: a elaboração, a
implementação e a avaliação.
Nesse sentido, pareceu-nos pertinente questionar os professores relativamente
aos procedimentos que adoptam na concepção e implementação do projecto curricular
de turma, bem como saber se o mesmo é avaliado, tanto ao longo da implementação,
como no final do ano lectivo. Os resultados obtidos encontram-se inseridos no Gráfico
8.
Gráfico 8 - Desenvolvimento do projecto curricular de turma
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
133
A análise dos dados obtidos permitiu-nos verificar que poucos dos professores
inquiridos (24,6%) afirmam que o Conselho de docentes a que pertencem convoca
reuniões apenas com o intuito de elaborar o projecto curricular de turma. Dos restantes,
a maioria (49,2%) refere que o conselho de docentes a que pertence não convoca
reuniões para esse efeito, existindo ainda 26,2% de respondentes que não se pronuncia
a esse respeito.
No entanto, parece-nos que o facto do conselho de docentes não reunir, em
muitas escolas/agrupamentos de escolas, expressamente para elaborar o projecto
curricular de turma, não é impeditivo de apelar/estimular ao trabalho em equipa na
realização dessa tarefa , um procedimento corroborado por 57,0% dos professores
inquiridos. Discordam desta posição 21,5% dos respondentes, existindo idêntica
percentagem que não emite qualquer opinião sobre este assunto.
Ainda no domínio da intervenção do conselho de docentes na elaboração do
projecto curricular de turma, 51,8% dos professores inquiridos reconhecem que o
conselho de docentes a que pertencem lhes fornece o apoio necessário, manifestando
opinião contrária 26,7% dos respondentes. Os restantes ( 21,5 %) não se pronunciam.
Todavia, os resultados obtidos na questão relativa à possibilidade dos
professores do 1º ciclo do Ensino Básico elaborarem isoladamente os projectos
curriculares de turma – 46,2% afirma que é uma tarefa que desenvolvem sozinhos,
46,2& discordem e 7,6% não se pronunciaram – denotam alguma ambiguidade e falta
de clareza nas posições assumidas pelos docentes.
Em face dos resultados obtidos, podemos referir que, se, por um lado, o
conselho de docentes desempenha um papel importante na construção do projecto
curricular de turma, na medida em que fornece algum apoio na sua elaboração e procura
estimular o trabalho colectivo dos docentes, por outro lado, tal facto verifica-se apenas
no campo da informalidade, uma vez que a maioria dos inquiridos afirma não serem
convocadas reuniões para esse efeito. Além disso, somos ainda compelidos a concluir
que tal apoio não tem sentido os efeitos desejados, uma vez que a construção do
projecto curricular de turma é totalmente uma tarefa que, os professores do 1º ciclo do
Ensino Básico, desempenham em muitos casos sozinhos
Para além de ouvir os professores relativamente à forma como constróem o
projecto curricular de turma e os apoios que, eventualmente, recebem para concretizar
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
134
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Com a elaboração do projecto curricular de turma tivenecessidade de modificar a forma como organizo as
minhas aulas.
A forma como decorrem as aulas não foi alterada devido àexistência do projecto curricular de turma.
Para desenvolver do projecto curricular de turma sentinecessidade de recorrer a conteúdos que não estão
previstos no programa
Na prática, o projecto curricular de turma que elaboro éimplementado.
Com o desenvolvimento do projecto curricular de turmamodifiquei a forma como avalio os meus alunos
No final de cada ano lectivo o projecto curricular de turmaé avaliado
Concordam Discordam Não têm opinião
tal tarefa, pareceu-nos pertinente averiguar que efeitos tem traduzido a construção de
projectos curriculares de turma tanto no que se refere à programação/planificação das
actividades lectivas, como à forma como decorrem tais actividades. Os resultados
encontram-se expressos no Gráfico 9.
Gráfico 9 - Desenvolvimento do projecto curricular de turma
No que diz respeito à forma como passaram a organizar as aulas desde que os
professores se viram na contingência de ter de elaborar os seus projectos curriculares de
turma, as opiniões dividem-se, já que 42,6% afirmam que sentiram necessidade de
alterar a forma como organizam as suas aula, enquanto 41,3% discordam e 16,4% não
se manifestaram relativamente a essa consequência.
Não nos surpreende que, quando questionados sobre forma como as aulas
decorrem, a posição assumida pelos professores seja sensivelmente idêntica. Os dados
expressos no Gráfico 9 permitam-nos constatar que 44,6 % dos respondentes afirma que
a forma como decorrem as aulas foi, 32,3% discorda 23,1% não emite opinião a este
respeito.
No tocante aos conteúdos abordados nas aulas, as opiniões também não são
unânimes. Uma maioria pouco significativa de professores (44,6%) concorda que para
desenvolver o projecto curricular de turma sentir a necessidade de recorrer a conteúdos
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
135
que não estavam previstos no programa, uma percentagem similar (41,0%) discorda
e16,4% não manifesta a sua opinião.
Além das alterações que o projecto curricular de turma pode desencadear em
termos de planificação e concretização das actividades lectivas, pareceu-nos ainda
importante averiguar se, de facto, tal projecto é implementado, se é avaliado e que efeito
pode ter produzido ao nível da avaliação das aprendizagens dos alunos.
No primeiro caso, a posição assumida pelos professores é muito clara. Uma
maioria muito significativa (83,6%) afirma que o projecto curricular de turma que
elaboram é implementado, tendo apenas discordado desta opinião 4,6% dos inquiridos.
Não deixa de ser surpreendente que uma percentagem ainda significativa (11,8%) não
tenha opinião a este respeito.
No segundo caso, relativo ao facto do projecto curricular de turma ser avaliado
no final do ano lectivo, a posição exibida pelos professores é idêntica, uma vez que a
maioria esmagadora dos inquiridos (84,1%) afirma que tal procedimento se concretiza.
Dos restantes, apenas 3,1% discordam desta opinião, existindo ainda cerca de 12,8%
que não se pronunciam.
Po último, no que se refere à avaliação da aprendizagem dos alunos, as posições
assumidas já não são tão taxativas. Na verdade, ao nível dos procedimentos de avaliação
a que recorrem nas aulas, as opiniões dividem-se: 36,4% concordam que coma
implementação do projecto curricular de turma modificaram a(s) forma(s) como
avalia(m) os seus alunos, 45,6% afirmam que a implementação de tal projecto não
produziu alterações a esse nível e 18,0% não referem se houve modificações, ou não.
Em jeito de conclusão das opiniões emitidas acerca deste conjunto de questões,
podemos afirmar que a grande maioria dos professores inquiridos afirma que
implementa e avalia o projecto curricular de turma que constrói. Todavia, as opiniões
dividem-se sobre as mudanças que a implementação desses projectos produziu ao nível
da avaliação dos alunos. Situação idêntica se verifica relativamente à forma como
decorrem as aulas embora haja uma já percentagem significativa de professores que
sentem necessidade de as suas práticas. O mesmo de pode dizer em relação aos
conteúdos leccionados, nomeadamente no que diz respeito a recurso a conteúdos que
não estão previstos no programa, e que consideram necessário para o desenvolvimento e
a aprendizagem dos alunos.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
136
0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5
É usual, o Conselho de Docentes a que pertençoconvocar reuniões apenas para elaborar o projecto
A construção do projecto curricular de turma é umatarefa que cada professor/a do 1º Ciclo do Ensino
Com a elaboração do projecto curricular de turmative necessidade de modificar a forma como
O Conselho de Docentes a que pertenço procuraestimular o trabalho colectivo dos professores para
A forma como decorrem as aulas não foi alteradadevido à existência do projecto curricular de turma.
Para desenvolver do projecto curricular de turmasenti necessidade de recorrer a conteúdos que não
Na prática, o projecto curricular de turma queelaboro é implementado.
Com o desenvolvimento do projecto curricular deturma modifiquei a forma como avalio os meus
O Conselho de Docentes a que pertenço fornece oapoio necessário para elaborar o projecto curricular
No final de cada ano lectivo o projecto curricular deturma é avaliado
,
Embora os resultados obtidos estejam aquém do que seria desejável, a verdade é
que estão a ser dados alguns passos importantes na mudança das práticas curriculares no
contexto das escolas.
A análise dos resultados obtidos em função das médias (Gráfico 10), permite-
nos verificar que, no conjunto dos itens deste dimensão, a opinião dos professores
apresenta uma clara indefinição avaliativa (x=3,28)2.
Gráfico 10 - Desenvolvimento do projecto curricular de turma (média das respostas)
Por conseguinte, verifica-se que, se a opinião dos professores é claramente
adequada relativamente ao projecto curricular de turma que elaboram ser implementado
(x=3,97) e ser avaliado no final do ano lectivo (x=4,08). O mesmo não se pode dizer
relativamente à quase totalidade dos restantes itens desta dimensão, onde a indefinição
avaliativa é uma constante: (x=2,57) e manifestam indiferença perante os restantes itens
da dimensão: a construção do projecto curricular de turma ser uma tarefa que
desempenham sozinhos (x=2,94); terem sentido necessidade de modificar a forma como
2 Média aritmética das médias dos itens da dimensão em análise.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
137
organizam as aulas com a elaboração do projecto (x=3,02); o conselho de docentes a
que pertencem procurar estimular o trabalho colectivo dos professores para a elaboração
do projecto (x=3,40); a forma como decorrem as aulas ter sido alterada devido à
existência do projecto curricular de turma (x=3,16); o conselho de docentes fornecer o
apoio necessário para a elaboração do projecto (x=3,30) e com o desenvolvimento do
projecto a forma como avaliam os alunos ter sofrido alterações (x=2,81).
Digno de reparo é, ainda, o facto dos professores discordarem que o conselho de
docentes a que pertencem convoque reuniões apenas para elaborar o projecto curricular
de turma (x=2,57).
No respeitante aos valores do desvio-padrão, denota-se um consenso baixo entre
as respostas, com valores que oscilam entre 0,74 e 1,19, sendo o valor médio da
dimensão 1,05 (Quadro 16).
Itens Valores dodesvio-padrão
8. É usual, o Conselho de Docentes a que pertenço convocar reuniões paraelaborar o projecto curricular de turma.
1,18
9. A construção do projecto curricular de turma é uma tarefa que cadaprofessor/a do 1º Ciclo do Ensino Básico concretiza sozinho/a.
1,18
10. Com a elaboração do projecto curricular de turma tive necessidade demodificar a forma como organizo as minhas aulas.
1,19
14. O Conselho de Docentes a que pertenço procura estimular o trabalhocolectivo dos professores para a elaboração de projectos curriculares.
1,05
15. A forma como decorrem as aulas não foi alterada devido à existência doprojecto curricular de turma.
1,06
16. Com o desenvolvimento do projecto curricular de turma senti necessidadede recorrer a conteúdos que não estão no programa.
1,13
19. Na prática, o projecto curricular de turma que elaboro é implementado. 0,7420. Com desenvolvimento do projecto curricular de turma modifiquei a formacomo avalio os meus alunos.
1,14
21. O Conselho de Docentes a que pertenço fornece-me o apoio necessáriopara elaborar projecto curricular de turma.
1,06
22. No final de cada ano lectivo o projecto curricular de turma é avaliado. 0,76
Quadro 15 – Valores do desvio-padraão relativos à dimensão 2
As correlações entre as variáveis que integram esta dimensão são apresentadas
no Quadro 16.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
138
8 9 10 14 15 16 19 20 21 22
8. É usual, o Conselho deDocentes a que pertençoconvocar reuniões paraelaborar o projecto curricularde turma.
1
9. A construção do projectocurricular de turma é umatarefa que cada professor/ado 1º Ciclo do Ensino Básicoconcretiza sozinho/a.
-,093 1
10. Com a elaboração doprojecto curricular de turmative necessidade demodificar a forma comoorganizo as minhas aulas.
0,228 0,69 1
14. O Conselho de Docentesa que pertenço procuraestimular o trabalhocolectivo dos professorespara a elaboração deprojectos curriculares.
0,388 0,100 0,224 1
15. A forma como decorremas aulas não foi alteradadevido à existência doprojecto curricular de turma.
0,118 -,050 -,218 0,123 1
16. Com o desenvolvimentodo projecto curricular deturma senti necessidade derecorrer a conteúdos que nãoestão no programa.
0,144 0,065 0,311 0,110 -,177 1
19. Na prática, o projectocurricular de turma queelaboro é implementado.
-,050 -,132 0,013 0,148 0,016 4. 1
20. Com desenvolvimentodo projecto curricular deturma modifiquei a formacomo avalio os meus alunos.
0,320 -,025 0,391 0,266 -,098 0,267 0,083 1
21. O Conselho de Docentesa que pertenço fornece-me oapoio necessário paraelaborar projecto curricularde turma.
0,389 0,010 0,194 0,523 0,123 0,182 0,118 0,283 1
22. No final de cada anolectivo o projecto curricularde turma é avaliado.
0,114 0,008 0,162 0,216 0,041 0,079 0,321 0,193 0,375 1
Quadro 16 - Matriz de correlação relativa à dimensão 2
Pela análise dos resultados obtidos verifica-se que existem algumas correlações
positivas, nomeadamente significativas. Como é o caso das correlações obtidas entre o
item 21” O Conselho de Docentes a que pertenço fornece-me o apoio necessário para
elaborar projecto curricular de turma.” quer com o item 11 “Com a elaboração do
projecto curricular de turma tive necessidade de modificar a forma como organizo as
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
139
minhas aulas”, cujo coeficiente obtido é muito significativo (0,523), quer com o item 8
“É usual, o Conselho de Docentes a que pertenço convocar reuniões para elaborar o
projecto curricular de turma” (0,389),o que demonstra que os professores atribuem uma
importância significativa ao papel que o conselho de docentes pode desempenhar na
elaboração do projecto curricular de turma quer através do fornecimento do necessário
apoio, quer estimulando o trabalho colectivo dos professores, que ainda pela
convocatória de reuniões para esse efeito.
Igualmente significativas, embora com menor intensidade, são as correlações
entre o item 20 “Com desenvolvimento do projecto curricular de turma modifiquei a
forma como avalio os meus alunos” quer com o item 10 “Com a elaboração do projecto
curricular de turma tive necessidade de modificar a forma como organizo as minhas
aulas”, quer com o item 8 “É usual, o Conselho de Docentes a que pertenço convocar
reuniões para elaborar o projecto curricular de turma”, sendo os coeficientes de
correlação 0,391 e 0,320 respectivamente, pelo que podemos concluir que os
professores consideram que o desenvolvimento do projecto curricular de turma pode
contribuir para modificarem a forma como avaliam os alunos e a forma como
organizam as aulas, bem como o papel que as reuniões de conselho de docentes possam
desempenhar nessas modificações, nomeadamente ao nível da avaliação dos alunos.
Ainda significativas são as seguintes correlações: entre o item 14 “O Conselho
de Docentes a que pertenço procura estimular o trabalho colectivo dos professores para
a elaboração de projectos curriculares” e o item 8 “É usual, o Conselho de Docentes a
que pertenço convocar reuniões para elaborar o projecto curricular de turma” (0,388), o
que demonstra a relação que existe entre a possibilidade do conselho de docentes
procurar o trabalho colectivo dos docentes na elaboração de projectos curriculares, e as
reuniões que convoca com esse propósito; entre o item 22 “No final de cada ano lectivo
o projecto curricular de turma é avaliado” e os itens 21” O Conselho de Docentes a que
pertenço fornece-me o apoio necessário para elaborar projecto curricular de turma”
(0,375) e 19 “Na prática, o projecto curricular de turma que elaboro é implementado”
(0,321), o que realça a importância atribuída à avaliação do projecto curricular de turma
no final de cada ano lectivo e o apoio fornecido pelo conselho de docentes, bem como
com a importância atribuída ao projecto curricular de turma ser, na prática,
implementado, pois só assim se poderá proceder a uma avaliação, também esta na
prática.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
140
Por fim, é também significativa a correlação entre os itens 16 e 10 (0,311), o que
evidencia a relação que existe no âmbito do projecto curricular de turma entre a
necessidade do professor recorrer a conteúdos que não estavam previstos no programa e
a mudança modificando da forma como organizam a suas aulas.
Em sentido negativo, embora com valores pouco significativos, emergem as
correlações verificadas entre o item 15 “a forma como decorrem as aulas não foi
alterada devido à existência do projecto curricular de turma”, com o item 10 “ com a
elaboração do projecto curricular de turma tive a necessidade de modificar a forma
como organizo as minhas aulas” (-0,218) e com o item 16 “para desenvolver o projecto
curricular de turma senti a necessidade de recorrer a conteúdos que não estavam
previstos no programa”(-0,177).
No âmbito da construção do projecto curricular de turma, os professores foram
questionados relativamente a alguns dos procedimentos que costumam adoptar nesta
fase do projecto, tendo-lhes sido colocadas três questões, duas fechadas (itens 11 e 13) e
uma aberta (item 12). Os resultados obtidos encontram-se inseridos nas Tabelas 3 e 4 e
no Quadro 17.
A questão correspondente ao item 11 procurava averiguar se os professores
recorriam a um guião para elaborarem o projecto curricular de turma, ao que 70,3% dos
inquiridos respondeu afirmativamente e apenas 29,7% respondeu “Não”.
Frequência Percentagem
Sim 137 70,3
Não 58 29,7
Total 195 100,0
Tabela 3 - Tabela de frequência relativa aos dados do item 11
Relativamente a quem facultou esse guião (item 13), a maioria dos respondentes
(43,5%) indicou que obteve o guião por intermédio do/a coordenador(a), 35,1% afirmou
que havia sido um colega a facultar-lhe o guião e 21,4% referiu que o tinha conseguido
por outros meios.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
141
Frequência Percentagem
O/A Coordenadora do grupo 57 43,5
Um colega 46 35,1
Outros 28 21,4
Total 131 100,0
Tabela 4 - Tabela de frequência relativa aos dados do item 13
Em qualquer dos casos é de digno de respeito o facto de os professores terem
tido a possibilidade de recorrer a um guião que os ajudasse a elaborar o projecto
curricular de turma, o que, por si só, demonstra o interesse que esta temática tem
suscitado junto dos docentes.
No que diz respeito ao conteúdo do guião utilizado3, verifica-se que dos 195
inquiridos apenas 70 responderam a esta questão, apesar de 137 ter afirmado utilizar um
guião para a elaboração do seu projecto curricular de turma, o que equivale a uma
percentagem de 51% de respondentes.
Item 12 “Quais os principais conteúdos desses guião?”
Unidades de registo Unidades deenumeração
A estruturação / organização 7
Caracterização/identificação da turma (da escola e do meio) 55
Identificação de problemas/ necessidades da turma / alunos com problemas 32
Definição de prioridades de intervenção / delineação de medidas educativas 10
Planificação das áreas curriculares disciplinares e não disciplinares / das actividadeslectivas e não lectivas / das competências a adquirir/ metodologias / estratégias /
esquematização dos conteúdos/ Sugestões de trabalho e/ou actividades54
Avaliação dos alunos e do projecto / critérios, instrumentos de avaliação. 32
Intenções/ objectivos do projecto 10Quadro 17 - Dados resultantes da análise de conteúdo do item 12
Conforme se pode constatar, o conteúdo do guião utilizado pelos professores
abarca um número razoável de elementos, sendo evidente a especial importância que é
consignada quer à caracterização/identificação da turma, da escola e do meio, quer à
planificação de tudo o que envolve o trabalho com a turma como parte do guião, aqui
considerando a planificação das áreas curriculares e não curriculares e das actividades
3 Anexo 7 (Matriz inicial da análise de conteúdo desta questão aberta)
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
142
não lectivas, a definição das competências a desenvolver, das metodologias e estratégias
de trabalho a adoptar e a “esquematização dos conteúdos”.
Com menor frequência, são apresentados como aspectos estruturantes do guião
utilizado a identificação dos problemas e/ou necessidades da turma e a avaliação dos
alunos e do projecto. Com frequência ainda menor são referidas a definição de
prioridades de intervenção e as intenções/objectivos do projecto, existindo ainda sete
professores que afirmam que os conteúdos do guião que utilizam diziam respeito à
estruturação / organização do projecto curricular de turma mas de uma maneira geral,
não especificando os itens específicos que o compõem.
As tabelas de contingência relativas ao cruzamento dos itens desta dimensão
com as variáveis idade e tempo de serviço não evidenciaram divergências significativas,
sendo apenas dignas de referência, apesar de pouco significativos, os valores que
emergem do item 14, referentes ao estímulo que o conselho de docentes procura
proporcionar para a elaboração do projecto curricular de turma quer com a idade
(0,172), quer com o tempo de serviço (0,202) dos professores inquiridos, verificando-se
que quanto mais velhos e mais tempo de serviço têm maior é a concordância com a
afirmação.
Numa aproximação muito global aos resultados obtidos nesta dimensão
podemos inferir que na elaboração do projecto curricular de turma os professores
consignam uma especial importância à planificação de tudo o que envolve o trabalho
com a turma, não descurando a necessidade de uma prévia caracterização da turma.
Uma posição que não nos surpreende uma vez que, para o projecto curricular de turma
poder conduzir à prossecução dos objectivos delineados na sua fase de construção é
imperativa a existência de um conhecimento prévio da turma a que tal projecto se
destina. Caso contrário, perde-se o sentido que deve presidir a tal empreendimento.
Além disso, embora não existam orientações precisas a esse respeito, verifica-se
uma certa uniformidade nos itens que os professores consideram ter de contemplar na
construção do projecto curricular de turma. Daí que os itens que são identificados como
existentes nos guiões utilizados serem bastante semelhantes, deixando mesmo
subentender as três etapas inerentes: concepção, desenvolvimento e avaliação do
projecto curricular de turma.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
143
A primeira etapa, referente à concepção do projecto curricular de turma, inclui a
caracterização da turma onde, sendo para o efeito realizado um levantamento de dados
relativos aos alunos, que integram a turma e que permita ao professor obter um
conhecimento o mais aprofundado possível dos seus alunos, identificando alguns
problemas e necessidades para definir ou objectivos do projecto e as prioridades de
intervenção. É ainda consensual a opinião de que os conselhos de docentes a que os
professores pertencem desempenham um papel importante nesta tarefa, pois apesar de
poderem não convocar reuniões para esse efeito, ao fornecer o apoio necessário e ao
estimular o trabalho colectivo dos docentes propiciam um contributo para a elaboração
do projecto curricular de turma.
A segunda etapa, a implementação, contempla o concretização da planificação
elaborada, sendo incluídas todas as actividades a desenvolver com os alunos no âmbito
do projecto, de maneira a concretizar os objectivos propostos, articulando com o
programa específico de cada ano de escolaridade e com a sequênciação dos conteúdos
de cada área curricular. Apesar da sua exigência esta é, de facto uma tarefa que os
professores desempenham, pois, na prática, os projectos curriculares de turma são
implementados, embora de formas e em níveis de concretização muito diferentes. Para
uma significativa melhoria dos resultados obtidos parece-nos óbvio que os professores
se deveriam empenhar um pouco mais nas mudanças que lhes têm sido propostas,
nomeadamente na forma como organizam as aulas e no recurso a conteúdos que, não
estando previstos no programa, sejam úteis para os alunos..
A avaliação é considerada um terceiro passo inerente ao desenvolvimento do
projecto curricular de turma, verificando-se que estes são avaliados pelos professores,
pelo menos no final de cada ano, embora fosse necessário averiguar de que forma é que
essa avaliação se processa – isto é, se serve apenas para cumprir o que está determinado
na legislação vigente ou se resulta de uma necessidade de melhoria sentida pelos
docentes.
Muito há ainda a fazer, sobretudo no que diz respeito à avaliação das
aprendizagens dos alunos, onde os resultados indicam que os efeitos da implementação
do projecto curricular de turma são muito ténues.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
144
1.3. Constrangimentos e vantagens da utilização do projecto curricular de turma
À semelhança do que acontece com outros projectos, a implementação do
projecto curricular de turma transporta reconhecidas vantagens, podendo, no entanto,
provocar alguns constrangimentos nas pessoas que têm a seu cargo concebê-lo,
operacionalizá-lo e avaliá-lo. Sobretudo por se tratar de uma tarefa que só
recentemente4 foi incumbida aos professores e ser, em Portugal, um conceito
relativamente novo, quer ao nível da dinâmica política, quer do discurso educativo.
Daí, a opinião dos professores nesta matéria ser de extrema importância, uma
vez que são eles que no terreno têm de operacionalizar aquilo que lhes é sugerido pela
administração central.
Importa, portanto, verificar se os professores elaboram o projecto curricular de
turma em resultado de uma prescrição normativa ou se o conceptualizam como um
instrumento necessário para a realização do currículo, questioná-los sobre os possíveis
constrangimentos com que se defrontam nas várias etapas do seu desenvolvimento e as
causas que possam estar por detrás de tais dificuldades, bem como averiguar sobre as
vantagens que consideram decorrentes do desenvolvimento do projecto curricular de
turma. Os resultados obtidos apresentam-se nos Gráficos 11 e 12.
Gráfico 11 - Constrangimentos decorrentes da elaboração do projecto curricular de turma
4 A tentativa de generalizar a elaboração do projecto curricular de turma foi introduzida com o Decreto-Lei 6/2001,portanto há 5 anos.
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
O projecto curricular de turma elabora-se apenaspara dar cumprimento ao que está previsto na lei a
esse respeito
A elaboração do projecto curricular de turmatrouxe um acréscimo de trabalho para além da
componente lectiva.
ConcordamDiscordamNão têm opinião
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
145
A grande maioria dos professores inquiridos (80,0%) acredita que a elaboração
do projecto curricular de turma veio trazer um acréscimo de trabalho para além da
componente lectiva, tendo apenas 9,2% discordado desta opinião e 10,77% ficado
indiferentes a ela.
Em contrapartida, 42,0% dos inquiridos discordam que o projecto curricular de
turma seja elaborado apenas para dar cumprimento ao que está previsto na lei. Embora
24,1% não se manifestem a esse respeito, não deixa de ser preocupante que uma
percentagem ainda significativa de docentes (32,9%) considera a existência de projectos
curriculares de turma nas escolas apenas como forma de cumprir o que está legislado.
As duas questões analisadas permitem ainda constatar que a maioria dos
professores inquiridos consideram o acréscimo de trabalho para além da componente
lectiva um constrangimento decorrente da elaboração da elaboração do projecto
curricular de turma, existindo ainda um número significativo de professores que vê a
utilização do projecto curricular de turma como uma imposição legal. Poderá ser que, na
base destes constrangimentos, resida alguma da resistência que os professores têm
evidenciado à mudança das suas práticas curriculares.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
146
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Com a elaboração do projecto curricular de turma há umamelhor articulação dos conteúdos das várias áreas
A elaboração do projecto curricular de turma contribuipara realizar actividades diferentes das que costumava
utilizar nas aulas.
O desenvolvimento das áreas curriculares nãodisciplinares é mais significativo devido à existência do
projecto curricular de turma
O recente alargamento do horário de permanência dosprofessores nas escolas contribui para poder elaborar
projectos curriculares de turma mais eficazes.
A necessidade de desenvolver actividades deenriquecimento curricular tornou-se mais visível desde
que começamos a elaborar o projecto curricular de turma.
O alargamento do horário de permanência dosprofessores nas escolas é uma forma de os professores
poderem trabalhar em grupo.
ConcordamDiscordamNão têm opinião
Gráfico 12 – Possíveis vantagens resultantes da concepção e implementação do projecto curricular de turma
Quanto às possíveis vantagens que possam resultar da elaboração do projecto
curricular de turma a maioria dos professores (63,0%) concorda que possa existir uma
melhor articulação dos conteúdos das várias áreas curriculares, 21,0% discorda e 16%
permanece indiferente a tal questão.
Relativamente à possibilidade do projecto contribuir para a realização de
actividades diferentes das que costumavam ser utilizadas nas aulas, 44,6% dos
professores afirmam que isso venha a acontecer, 33,9% têm a opinião contrária e 21,5%
não emitem qualquer opinião.
Posição idêntica é assumida acerca do desenvolvimento das áreas curriculares
não disciplinares – área de projecto, formação cívica e estudo acompanhado -, 41,5%
dos professores inquiridos afiança que estas áreas se tornaram mais significativas
devido à existência do projecto curricular de turma, 37,4% discordam e 21,1 não se
pronunciaram acerca dessa mudança.
Em relação à necessidade de desenvolver actividades de enriquecimento
curricular, a maior parte dos inquiridos (57,4%) discorda que estas se tenham tornado
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
147
mais visíveis desde que começaram a elaborar o projecto curricular de turma, cerca de
21,5% concordam e 21,1 não manifestaram a sua opinião.
No que diz respeito ao alargamento do horário de permanência nas escolas, a
grande maioria dos professores inquiridos (83,1%) assegura que tal alargamento não
contribuiu para elaborar de projectos curriculares de turma mais eficazes, assumindo
uma posição contrária apenas 10,3% dos respondentes. Os restantes 6,7% não se
pronunciaram
O mesmo se verifica no que respeita ao aumento do trabalho em grupo como
consequência do alargamento do horário de permanência dos professores nas escolas -
77,4% dos inquiridos afirma que não contribuiu para melhorar o trabalho em grupo,
discordam que esta seja uma forma de poderem trabalhar em grupo, 12,3% asseguram
que sim e 10,3 permaneceram indiferentes.
A análise dos dados obtidos permite-nos afirmar que, de um modo geral, os
professores não consideram que o alargamento do seu horário de permanência na escola
seja uma via para melhorar o trabalho em equipa, nem para conceber projectos
curriculares de turma mais eficazes. Garantem ainda que a necessidade de desenvolver
actividades de enriquecimento curricular não se tornou mais evidente a partir do
momento em que passaram a realizar-se os projectos curriculares de turma.
Contudo, a maioria dos professores reconhece que o projecto curricular de
turma foi um estímulo para que o desenvolvimento das áreas curriculares não
disciplinares se tornasse mais significativo, para realizarem de actividades lectivas
diferentes das que eram habitualmente realizadas, bem como para se conseguir uma
melhor articulação dos conteúdos das várias áreas curriculares.
A partir da análise dos resultados obtidos em função das médias, verificámos
que, nos conjunto dos itens deste dimensão e à semelhança do que havia acontecido na
dimensão anterior, a opinião dos professores apresenta uma razoável indefinição
avaliativa (x=2,83)5(Gráfico 13).
5 Média aritmética das médias dos itens da dimensão em análise
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
148
0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5
Com a elaboração do projecto curricular de turma háuma melhor articulação dos conteúdos das várias
áreas
A elaboração do projecto curricular de turma trouxeum acréscimo de trabalho para além da componente
lectiva.
O projecto curricular de turma elabora-se apenas paradar cumprimento ao que está previsto na lei a esse
respeito
A elaboração do projecto curricular de turmacontribui para realizar actividades diferentes das que
costumava utilizar nas aulas.
O desenvolvimento das áreas curriculares nãodisciplinares é mais significativo devido à existência
do projecto curricular de turma
O recente alargamento do horário de permanênciados professores nas escolas contribui para poder
elaborar projectos curriculares de turma mais
A necessidade de desenvolver actividades deenriquecimento curricular tornou-se mais visível
desde que começamos a elaborar o projecto curricular
O alargamento do horário de permanência dosprofessores nas escolas é uma forma de osprofessores poderem trabalhar em grupo.
Gráfico 13 - Constrangimentos e vantagens do projecto curricular de turma (Média das respostas)
Analisando o gráfico anterior verificamos que, embora próxima da
concordância, a opinião dos professores demonstra uma indefinição avaliativa nos
seguintes casos: existência de uma melhor articulação dos conteúdos das diferentes
áreas curriculares com a elaboração do projecto curricular de turma (x=3,55)6; a
elaboração do projecto curricular de turma conduzir à realização actividades diferentes
das que costumavam utilizar na aulas (x=3,05); o desenvolvimento das áreas
curriculares não disciplinares ser mais significativo (x=2,98); e com o facto deste
projecto ser elaborado apenas para dar cumprimento ao que está previsto na lei a esse
respeito (x=2,93).
Os professores manifestam uma opinião claramente inadequada, ao discordarem
do facto do recente alargamento do horário de permanência dos professores nas escolas
contribuir para elaborar projectos curricular mais eficazes (x=1,73) e ser uma forma de
os professores poderem trabalhar em grupo (x=1,89). Claramente discordante é também
a opinião manifestada perante a necessidade de desenvolver actividades de
6 Convém não esquecer que talvez os professores do 1º ciclo do Ensino Básico tenham alguma dificuldade em avaliaras melhorias na articulação dos conteúdos, uma vez que se trata de um nível de ensino que funciona, quaseexclusivamente, em regime de monodocência,
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
149
enriquecimento curricular ter aumentado devido à existência dos projecto curricular de
turma (x=2,43).
No entanto, a posição demonstrada em relação ao acréscimo de trabalho trazido
pelo projecto curricular de turma é claramente adequada (x=4,08), verificando-se uma
forte concordância neste item.
Os valores do desvio-padrão variam entre 0, 97 e 1,25, sendo o valor médio da
dimensão de 1,09, o que revela uma grau de consenso baixo entre os respondentes. Uma
situação que não nos surpreende e que a indiferença avaliativa patenteada já deixava
antever.
ItensValores do
desvio-padrão16 - Com a elaboração do projecto curricular de turma há uma melhor articulaçãodos conteúdos das várias áreas.
1,02
18 - A elaboração do projecto curricular de turma trouxe um acréscimo de trabalhopara além da componente lectiva.
0,97
23 - O projecto curricular de turma elabora-se apenas para dar cumprimento ao queestá previsto na lei a esse respeito 1,25
24 - A elaboração do projecto curricular de turma contribui para recorrer aactividades diferentes das que costumava utilizar nas aulas
1,14
25- O desenvolvimento das áreas curriculares não disciplinares é maissignificativo devido à existência do projecto curricular de turma.
1,13
28 - O recente alargamento do horário de permanência dos professores nas escolascontribui para poder elaborar projectos curriculares de turma mais eficazes.
1,05
29 – A necessidade de desenvolver actividades de enriquecimento curriculartornou-se mais visível desde que começamos a elaborar o projecto curricular deturma.
1,11
30 - O alargamento do horário de permanência dos professores nas escolas é umaforma de os professores poderem trabalhar em grupo.
1,10
Quadro 18 – Valores do desvio-padraão relativos à dimensão 3
Da análise dos coeficientes de correlação depreende-se que existem várias
correlações positivas e significativas entre itens referentes a esta dimensão,
conforme pela análise do Quadro 19.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
150
16 18 23 24 25 28 29 30
16 - Com a elaboração do projectocurricular de turma há uma melhorarticulação dos conteúdos das várias áreas.
1
18 - A elaboração do projecto curricular deturma trouxe um acréscimo de trabalhopara além da componente lectiva.
-,126 1
23 - O projecto curricular de turmaelabora-se apenas para dar cumprimentoao que está previsto na lei a esse respeito
-,345 0,147 1
24 - A elaboração do projecto curricularde turma contribui para recorrer aactividades diferentes das que costumavautilizar nas aulas
0,446 -,095 -,315 1
25- O desenvolvimento das áreascurriculares não disciplinares é maissignificativo devido à existência doprojecto curricular de turma.
0,362 0,049 -,198 0,605 1
28 - O recente alargamento do horário depermanência dos professores nas escolascontribui para poder elaborar projectoscurriculares de turma mais eficazes.
0,114 -,177 0,034 0,234 0,213 1
29 – A necessidade de desenvolveractividades de enriquecimento curriculartornou-se mais visível desde quecomeçamos a elaborar o projectocurricular de turma.
0,300 -,087 -,150 0,491 0,487 0.469 1
30 - O alargamento do horário depermanência dos professores nas escolas éuma forma de os professores poderemtrabalhar em grupo.
0,061 -,074 -,078 0,091 -,087 0,702 0,442 1
Quadro 19 – Matriz de correlação relativa à dimensão 3
Verifica-se que existe uma correlação significativa e positiva entre item relativo
ao alargamento do horário de permanência dos professores nas escolas ser uma forma
de os professores poderem trabalharem em grupo (item 30), quer com item 28, relativo
ao seu contributo para a elaboração de projectos curriculares mais eficazes (0,702), quer
o item 29 “A necessidade de desenvolver actividades de enriquecimento curricular
tornou-se mais visível desde que se iniciou a elaboração o projecto curricular de turma”
(0,442).
Igualmente significativas são as correlações entre o item relativo ao
desenvolvimento das áreas curriculares não disciplinares ser mais significativo devido à
existência do projecto curricular de turma (item 25) e o item 24, que diz respeito à
elaboração deste projecto contribuir para a realização de actividades diferentes das que
habitualmente eram utilizadas nas aulas (0,605) bem como com o item 16, referente ao
facto do projecto curricular de turma contribuir para uma melhor articulação dos
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
151
conteúdos das várias áreas curriculares (0,362), o que demonstra que os professores
consideram possível que, com a elaboração do projecto curricular de turma, se venham
a verificar alterações no seu trabalho com os alunos, no interior da sala de aulas.
Também significativa é a correlação entre o item 24, referente à elaboração do
projecto curricular de turma contribuir para realizar actividades diferentes e o item 16,
em que se afirma que tal projecto pode permitir uma melhor articulação de conteúdos
(0,446).
Com coeficientes de correlação positivos e significativos são ainda as
correlações entre o item 29 “A necessidade de desenvolver actividades de
enriquecimento curricular tornou-se mais visível desde que começamos a elaborar o
projecto curricular de turma”, quer com o item 25 “O desenvolvimento das áreas
curriculares não disciplinares é mais significativo devido à existência do projecto
curricular de turma” (0,491), quer com o item 24 “A elaboração do projecto curricular
de turma contribui para recorrer a actividades diferentes das que costumava utilizar nas
aulas” (0,487), quer ainda com o item 28 “ O recente alargamento do horário de
permanência dos professores nas escolas contribui para poder elaborar projectos
curriculares de turma mais eficazes” (0,469) e com o item 16 “Com a elaboração do
projecto curricular de turma há uma melhor articulação dos conteúdos das várias áreas”
(0,300).
No sentido negativo verificam-se duas correlações significativas entre o item 23,
referente à elaboração do projecto curricular de turma se processar apenas para dar
cumprimento ao que está previsto na lei, quer com o item 16, relativo à elaboração deste
projecto permitir uma melhor articulação dos conteúdos das várias áreas (-0,345), quer
com item 24, relativo ao facto de contribuir para o professor realizar actividades
diferentes das que costumava utilizar (-0,315).
As tabelas de contingência relativas ao cruzamento dos itens desta dimensão
com as variáveis idade e tempo de serviço não evidenciaram divergências significativas,
excepto a correlação verificada no sentido negativo, mas pouco significativa, entre o
item 24, referente à utilização de actividades diferentes das que habitualmente utilizadas
com o tempo de serviço (-0,174), sendo que quanto maior é o número de anos de tempo
de serviço menor é a concordância com esta afirmação. Será que o facto dos professores
terem mais tempo de serviço os desmotiva em relação às mudanças que urge operar no
sistema de ensino, em particular ao nível da sala de aulas?
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
152
Para melhor averiguar possíveis constrangimentos gerados pelo
desenvolvimento do projecto curricular de turma, os professores foram também
inquiridos através de duas questões abertas7, relativamente às dificuldades sentidas na
construção, implementação e avaliação do projecto. Relativamente à primeira questão,
dos 195 professores inquiridos, 80 pronunciaram-se sobre este assunto, o que
corresponde a uma percentagem de 41% de respondentes a esta questão aberta.
As dificuldades referidas pelos professores inquiridos são variadas e abrangem
um grande número de aspectos, conforme podemos verificar no Quadro 20, onde foram
registados os resultados da análise de conteúdo efectuada a esta questão.
Item 26 “ Quais as principais dificuldades que sente na construção, implementação e avaliação doprojecto curricular de turma?”
Unidades de contexto/registoUnid. de
enumeraçãoFalta de directrizes específicas por parte do Ministério da Educação 5Falta de consenso sobre a estrutura que o projecto curricular de turma deve ter e sobre oque deve ser um projecto curricular de turma
2
Articular as diversas áreas em torno de um tema 1
Adaptação do currículo à realidade da turma 1
Saber o que o Agrupamento pretende que seja elaborado 1Elevado número de alunos por turmaHeterogeneidade das turmas com vários níveis de aprendizagemTurmas com dois, três e mesmo quatro anos de escolaridade (ex.: 1º e 4º)
13
Comportamentos dos alunos 2
Falta de recursos (financeiros, materiais, humanos, pedagógicos) 14
Ter um conhecimento pouco aprofundado da turma no início do ano lectivo. 7
Dificuldades em estabelecer parcerias e protocolos 1
Realidades imprevisíveis e problemáticas 1
Existência de um “molde” imposto 1Prazo de entrega do projecto curricular de turma (a seguir ao Natal)Falta de tempo no início do ano
5
Suportes como o projecto curricular de agrupamento e projecto educativo não seencontrarem disponíveis
3
Falta de formação e orientação 7Adaptar o projecto curricular de turma à realidade da turma e/ou aluno/ atingir osobjectivos propostos
7
Organizar as áreas curriculares não disciplinares, principalmente Área de projecto 2Pouco empenho da comunidade educativa (p/ ex. dos encarregados de educação nafacultação de dados importantes)
10
Tratar-se de um documento meramente burocrático 6
Falta de apoio aos docentes mais novos 1
Falta de professores de apoio educativo 3
Cumprimento dos programas nacionais 2Quadro 20 - Dados resultantes da análise de conteúdo do item 26
7 Anexos 8 e 9 (Matrizes iniciais da análise do conteúdo destas questões)
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
153
A partir da análise do quadro anterior é possível verificar que opiniões expressas
patenteiam várias dificuldades relativas ao desenvolvimento do projecto curricular de
turma, sendo a falta de recursos - financeiros, materiais, pedagógicos ou humanos -, o
elevado número de alunos por turma, a heterogeneidade das turmas com vários níveis
de aprendizagem e/ou com dois ou mais anos de escolaridade os motivos mais
indicados.
Embora com menor intensidade, os professores inquiridos apontam ainda o
conhecimento pouco aprofundado das turmas no início do ano lectivo, o fraco empenho
demonstrado pela comunidade educativa (nomeadamente os encarregados de educação
quando lhes é solicitada a facultação de dados importantes para a construção do projecto
curricular de turma), o sentimento mais ou menos generalizado de falta de formação e
orientação neste âmbito, as dificuldades em conseguir adaptar o projecto à realidade da
turma e/ou do aluno e o facto de se tratar de um documento meramente burocrático,
como aspectos que dificultam a construção, implementação e avaliação do projecto
curricular de turma e de são um obstáculo que os professores se apropriem do seu
verdadeiro sentido.
Embora com menor número de referências é indicada a falta de directrizes
específicas por parte do Ministério da Educação para a elaboração do projecto curricular
de turma, bem como a falta de tempo, principalmente no início de cada ano.
Outras dificuldades são ainda apontadas pelos professores inquiridos, tais como,
dificuldade no acesso ao projecto curricular de agrupamento e ao projecto educativo, a
falta de consenso sobre a estrutura que o projecto curricular de turma deve ter e sobre o
que este deve ser, o comportamento dos alunos, a dificuldade em organizar as áreas
curriculares não disciplinares e de articular as diversas áreas em torno de um tema,
adaptar o currículo à realidade da turma, saber o que o Agrupamento pretende que seja
elaborado, estabelecer parcerias e protocolos, as realidades imprevisíveis e
problemáticas, existir um molde imposto, a falta de apoio aos docentes com menos
tempo de serviço, a falta de professores de apoio educativo e o cumprimento dos
programas nacionais.
Enfim, um conjunto de motivos que urge debelar se quisermos que o projecto
curricular de turma se assuma como um verdadeiro instrumento de mudança dos
processos de ensino-aprendizagem.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
154
Em relação à segunda questão aberta, na qual procuraram inventariar as causas
que podem estar na base das dificuldades geradas pelo desenvolvimento do projecto
curricular de turma, dos 195 professores inquiridos, apenas 49 (25,1%) manifestaram a
sua opinião.
À semelhança do que se verificou com o item referido anteriormente, a
variedade de registos é significativa. Os resultados constam do Quadro 21.
Item 27 “ Na sua opinião quais são as principais causas que estão na base de tais dificuldades”
Unidades de RegistoUnid. de
enumeração
Falta de orientação do Ministério da Educação 2
Falta de formação e/ou formação de qualidade 13
Elevado número de alunos por turma/ heterogeneidade das turma com vários níveis de
aprendizagem / turmas com dois, três e mesmo quatro anos de escolaridade12
Poucos documentos/ bibliografia 1
Não existir um “guião universal”/ modelo global 3
Problemas sociais, afectivos e familiares (p/ ex. a falta de colaboração da família) 9
O próprio sistema educativo português 1
A organização da rede escolar 1
Excesso de burocracia 10
Falta de recursos (financeiros, materiais, humanos, pedagógicos) 11
Ficar com os alunos no prolongamento do horário 1
Mobilidade docente 2
Falta de tempo 6
Falta de professores de apoio educativo 2
Falta de autonomia das escolas / agrupamentos 1
Os programas nacionais 2
Monodocência 1Quadro 21- Dados resultantes da análise de conteúdo do item 27
A análise do quadro permite-nos verificar que as causas que, segundo os
professores inquiridos, podem estar na base das dificuldades apontadas são variadas,
embora com menor número de registos. Para a maior parte dos professores que
responderam a esta questão, a falta de formação e/ou informação de qualidade, a
constituição das turmas (número elevado de alunos, vários níveis de aprendizagem, dois
ou mais anos de escolaridade), a falta de recursos (de vários tipos), o excesso de
burocracia e os problemas sociais, afectivos e familiares dos alunos apresentam-se
como principais causas das dificuldades sentidas no desenvolvimento do projecto
curricular de turma.
Além disso, a falta de tempo, a questão da mobilidade docente, a falta de
professores de apoio educativo e o cumprimento dos programas nacionais são também
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
155
motivos que dificultam a concepção e o desenvolvimentos dos projectos curriculares de
turma, bem como a obtenção de resultados mais consonantes com tal empreendimento.
Existem ainda mais alguns motivos invocados pelos professores, embora em
menor escala, motivo pelo qual nos dispensamos de comentar
Da análise global dos dados desta dimensão depreendemos que parece ser
consensual entre os professores inquiridos a ideia de que a elaboração do projecto
curricular de turma veio trazer um acréscimo de trabalho para além da componente
lectiva, uma vez que é o professor titular de turma, no caso do 1º Ciclo do Ensino
Básico, que tem a responsabilidade de o construir, implementar e avaliar. Só que, esta
incumbência não é percepcionada da mesma forma por todos os professores.
Quando questionados acerca da obrigatoriedade de construir, implementar e
avaliar o projecto curricular de turma, as opiniões dividem-se, o que nos leva a deduzir
que muitos dos professores vêm o desenvolvimento do projecto curricular de turma
como algo útil, não o cingindo apenas ao cumprimento do que está previsto na lei. Não
vêm, por isso, tal tarefa como um constrangimento ao seu desempenho docente.
Também não são consensuais as opiniões expressas pelos professores
relativamente às principais dificuldades sentidas nas diferentes etapas de
desenvolvimento do projecto curricular de turma, o que nos permite supor que estas são
tão variadas quanto os diferentes contextos em que os professores estão inseridos, ou
seja, as características particulares da sua escola e da sua turma específicas. O mesmo se
verifica em relação às causas que podem estar na base de tais dificuldades.
É de salientar que, para as dificuldades enunciadas, os inquiridos apontam, regra
geral, uma ou mais causas, chegando até a serem coincidentes, como é o caso da
heterogeneidade das turmas, da falta de recursos, da falta de formação, do carácter
burocrático que atribuem à elaboração do projecto, da pouca colaboração das famílias,
da falta de tempo e da falta de professores de apoio educativo, que são vistas quer como
dificuldades quer como causas geradoras das mesmas.
Não obstante, os professores inquiridos atribuem vantagens ao desenvolvimento
do projecto curricular de turma, já que a maioria considera que este permite uma melhor
articulação dos conteúdos das várias áreas, possibilitando-lhes uma maior liberdade ao
nível da planificação. Porém, não é tão visível a necessidade de desenvolverem
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
156
actividades de enriquecimento curricular, desde que começaram a elaborar o projecto
curricular de turma.
Quanto às actividades que desenvolvem com os alunos na sala de aula, verifica-
se que estas não sofreram grandes alterações, sendo que aproximadamente metade dos
professores inquiridos admite desenvolver actividades diferentes das que costumava
realizar devido à existência do projecto curricular de turma. O mesmo se verifica em
relação às áreas curriculares não disciplinares, na medida em que o seu
desenvolvimento pode ser mais significativo com a existência deste projecto, pois são
parte integrante do mesmo.
Em contrapartida, quando se fala do alargamento do horário de permanência dos
professores na escola, os professores recusam veementemente, que este seja um facto
facilitador para a elaboração de projectos curriculares de turma mais eficazes, ou que
seja uma forma de promover o trabalho em equipa.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
157
2. Inquérito por Entrevista
Após termos questionado os professores relativamente às suas concepções
acerca do projecto curricular, em particular à forma como constróem, implementam e
avaliam o projecto curricular de turma, bem como sobre as vantagens e/ou
constrangimentos que consideram como consequentes da sua utilização, pareceu-nos
pertinente conhecer os pontos de vista de alguns professores que desempenham
diferentes cargos nas escolas/agrupamentos de escolas em estudo. No fundo,
pretendíamos verificar se estes professores têm uma visão diferente da generalidade dos
professores, se as suas opines se limitam a confirmar os dados recolhidos ou se
acrescentam algo de novo às posições assumidas pelos docentes.
Para prosseguir esse propósito considerámos que a entrevista se apresentava
como o instrumento de recolha de dados mais adequado, uma vez que permite explorar
alguns aspectos de forma mais incisiva e aprofundada, o que não acontece com a
utilização de um questionário. Nesse sentido, entrevistámos dois presidentes do
conselho executivo, dois vice-presidente do conselho executivo, dois assessores do
conselho executivo e dois coordenadores do conselho de docentes, procurando obter os
seus pontos de vistas e aferir, de uma formal global, até que ponto, vão de encontro, ou
não, das posições assumidas pelos professores que se encontravam, nesse ano lectivo, a
leccionar nas escolas do 1º ciclo dos seus agrupamentos.
De forma idêntica ao que havíamos feito com os questionários e para facilitar a
apresentação e leitura dos resultados, a apresentação dos dados das entrevistas é feita
em função das dimensões e das categorias que definimos quer a priori, quer durante a
realização da análise do seu conteúdo. Os resultados da análise de conteúdo para cada
dimensão apresentam-se nos anexos 10, 11 e 12 (matrizes de análise), onde constam as
unidades de registo de cada entrevista, seleccionadas consoante a categoria em que se
inseriam.
As dimensões consideradas como estruturantes de cada entrevista são
apresentadas no Quadro 22.
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
158
Dimensões
1. Projecto Curricular
2. Desenvolvimento do Projecto Curricular de Turma
3. Constrangimentos da utilização do Projecto Curricular de Turma
Quadro 22 - Dimensões estruturantes da entrevista
2.1. Projecto Curricular
Conceito
Com o intuito de averiguar a forma como os entrevistados valorizam a
elaboração de projectos, questionámo-los relativamente às suas concepções sobre o
projecto curricular. Nesse sentido foi-lhes pedido que indicassem o que representaria
para eles um projecto curricular, tendo percebido que o assumem como um documento
base do professor servindo de fio condutor da sua prática educativa:
“…é um documento que suporta a tua prática educativa, também, e em vez de teorientares pelo programa, pelos livros, tu tens o teu próprio, tens aquele documento queanda sempre contigo e que te ajuda a trabalhar na sala de aula, onde tu rabiscas, apontas,escreves, mudas….com o projecto curricular de turma eu sei que é aquilo que eu tenhoque trabalhar dentro daquela turma, aquele tema, aquela problemática, aquelascompetências, só para a turma...” (E1).
“…Um projecto, para mim, é sempre alguma coisa que me vem ajudar naquilo que voutrabalhar. O projecto curricular de turma, o projecto educativo, o projecto curricular deescola, são trabalhos que nos ajudam, que nós colocamos na nossa cabeça econstantemente estamos a ir à gaveta para os consultar e para termos a ajuda deles dentroda nossa sala de aula até mesmo, fora da sala de aula, um projecto curricular é sempreuma ajuda para o docente. É um facilitador do trabalho…”(E6)
“…Para mim o projecto curricular será com que a bíblia daquilo que eu teria, se fosse eu a fazer,eu faria com que fosse um instrumento, tal como eu disse, a minha bíblia para trabalho, tudo oque eu iria fazer com os alunos teria de estar implícito no projecto curricular de turma…”(E7)
Das opiniões emitidas, por um dos entrevistados, podemos ainda afirmar que o
projecto curricular de turma se elabora para a atingir determinadas metas/objectivos,
devendo, para o efeito, ser alterado e/ou adaptado à medida que vai sendo
implementado:
“…Um projecto curricular é um documento que é elaborado para atingir determinadasmetas. Esse documento tem determinados objectivos, é um documento que não é fechadoé aberto, a qualquer momento podem surgir adaptações, pode e deve, de acordo com aavaliação que deverá ser feita ao longo de todo o ano e tem a vantagem de melhorar osucesso na aprendizagem…” (E2)
Verificámos também que os professores entrevistados assumem que o
primeiro passo a realizar na elaboração do projecto curricular de turma é o
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
159
diagnóstico da situação, podendo assim identificar um conjunto de características
inerentes àquele grupo de alunos, características essas imprescindíveis para uma
correcta adequação do projecto:
“…Um projecto curricular é um projecto que faz um diagnóstico pormenorizado sobreuma turma, nas suas várias vertentes….”(E5).
“… a caracterização dos alunos é essencial…”(E8).
“…Para mim, um projecto curricular é um projecto que tu vais desenvolvendo na sala deaula, de acordo com um problema ou qualquer coisa que vejas que a turma até necessita.Não precisa de ser um problema, pode ser até algo que a turma tenha, uma característicaou qualquer coisa e que tu depois interligues com os conteúdos do programa…”(E1).
Um outro aspecto que ressalta das opiniões emitidas pelos entrevistados, é o
facto de considerarem que este instrumento facilita o sucesso educativo, uma vez que
deve ser elaborado para e com os alunos, potenciando os saberes que cada um possui e
aproveitando os seus interesses, gostos, capacidades e diferentes ritmos de
aprendizagem
“…O projecto curricular será um documento, ou instrumento de trabalho para que oprocesso de ensino-aprendizagem possa decorrer tendo em vista o sucesso educativo eque vai permitir a elaboração de registos sistemáticos de avaliação e à introdução dasnecessárias alterações tendo em atenção a especificidade de cada caso…”(E3)
“…Um projecto é algo em que se vai analisar cada um daqueles que vai entrar nesseprojecto, ver o que cada um tem para dar, e cada um puder dar o que tem de melhor, epodermos aproveitar isso para fazermos um coisa conjunta, pôr aqueles que não gostamtanto de desenhar a desenhar, pôr aqueles que não gostam tanto de cantar a cantar edesenvolvemos coisas que uns têm mais jeito e outros têm menos jeito, como umdesenvolvimento geral. Um projecto positivo é aquele que tem impacto, que faz com queas pessoas fiquem a gostar de determinada coisa … qualquer coisa que motive…” (E4)
Existe ainda um docente para quem o projecto curricular facilita e o empenho e
mobilização dos docentes para procederem a uma avaliação contínua ao longo do ano.
“…E depois a avaliação, a avaliação tem que ser contínua…”(E8)
A análise das respostas torna perceptível a importância que os professores
consignam ao projecto curricular de turma, sendo concetpualizado como um auxiliar
valioso para o trabalho do professor na sala de aulas. Trata-se de um documento que
deve obedecer a uma estrutura, mais ou menos, uniforme e, podendo por isso, ser
elaborado com base num guião que oriente nas diferentes etapas a seguir, sem prejuízo
de ser operacionalizado de formas diversas, proporcionando assim aos alunos condições
que lhes permitam alcançar o sucesso educativo. Daí o ser usualmente identificado
como uma maneira de resolver problemas ou uma forma de dar resposta às necessidades
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
160
dos estudantes, não esquecendo porém a concretização do currículo proposto a nível
nacional, com o qual o projecto curricular de turma deve estar interligado.
Papel do entrevistado
Para averiguar a importância que os professores entrevistados atribuem ao cargo
que ocupam na escola/agrupamento de escolas onde desempenham funções,
questionámo-los relativamente à sua intervenção na concepção, implementação e
avaliação dos projectos curriculares de turma. Como os entrevistados ocupam cargos
diferentes, as respostas diferem em função do papel que desempenham, parecendo-nos
mais lógico que a apresentação dos dados fosse feita em função disso.
Não deixando de reconhecer que a concepção e realização dos projectos
curriculares de turma se restringe mais ao foro interno de cada conselho de docentes, os
presidentes do conselho executivo não abdicam do seu poder interventivo ao nível da
escola/agrupamento, sempre que isso se justifique, nem da responsabilidade de definir
linhas mestras que orientem e facilitem a construção de tais projectos:.
“…no âmbito das competências do presidente do executivo podem intervirsubstantivamente nos projectos, eu diria indirectamente nos projectos curriculares deturma, uma vez que a elaboração deles são da competência dos professores titulares deturma, mas indirectamente através de um processo de avaliação. A responsabilidade dosucesso educativo de um agrupamento de escolas, no caso concreto, é da inteiraresponsabilidade do presidente do executivo. Portanto, nesse sentido, tem toda alegitimidade para intervir, digamos em função dos diagnósticos feitos de procederem aalterações aos projectos curriculares…”(E3)
“…Quanto ao cargo de presidente do Conselho executivo, as competências não estãomuito vocacionadas para isso, mas de qualquer forma há sempre uma intervenção, nãosomos nós que ditamos as regras, mas de alguma forma, sim…”(E7)
“…Ao elaborar o projecto educativo e o projecto curricular de escola/agrupamento, faz-sede alguma forma, se calhar, na totalidade, preparo as linhas para o projecto curricular deturma….”(E7).
Por seu turno, os vice-presidentes do conselho executivo defendem que as
normas orientadoras para a construção do projecto curricular de turma devem constar de
um guião, exibindo posições distintas no que se refere à construção e aprovação de tal
documento:
“…Não. O guião para a feitura dos projectos curriculares de turma é elaborado eaprovado em conselho pedagógico…”(E5)
“…Apostei na concepção do guião, digamos, e actualmente participo em termos deavaliação orientação…”(E8)
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
161
Quanto aos assessores do conselho executivo, esses afirmam não ter uma
intervenção a este nível, limitando-se apenas seguir as orientações do conselho
executivo. Num dos casos, o conselho executivo delega aos seus assessores as funções
de “examinar” os projectos curriculares de turma e de verificar se os mesmos estão, ou
não, a ser concretizados:.
“ …o que Conselho Executivo me pede para transmitir aos professores…”(E1).
“…uma das minhas funções é ver os projectos curriculares de turma e fazer um relatóriodaquilo que eu observo, daquilo que eu analiso nos projectos, portanto, e depois transmitoao conselho executivo…” (E1).
“…Neste momento não. Eu como Assessor do Conselho Executivo trabalho mais ao níveldo Conselho Executivo…”(E2).
No que diz respeito aos coordenadores do conselho de docentes, a situação é
ligeiramente diferente. São eles que fazem a ligação entre o conselho pedagógico e os
docentes, quer transmitindo-lhes informações importantes para todo o processo de
desenvolvimento do projecto curricular de turma, quer exercendo um papel importante
na sua actualização ao nível de legislação, ou do próprio projecto curricular de turma:
“…não, eu faço a ligação do pedagógico ao conselho de docentes dos 1º Ciclo, portanto,há um projecto educativo do próprio agrupamento, há um regimento interno eu faço queisso seja tudo cumprido, faço cumprir as coisas. Portanto, no fundo, faço cumprir a lei,mais nesse âmbito. Sempre que é preciso transmitir, ou das colegas para o pedagógico oudo pedagógico para as colegas, é o que eu faço…”(E4).
“…Eu constantemente estou lembrar os colegas, ao longo do ano lectivo, para registar asactividades desenvolvidas. E portanto, isso faz também com que eu não me esqueça defazer as minhas alterações no meu projecto curricular…”(E6).
“…Estou constantemente a mandar-lhes informações que recebo de legislação, portantodaquilo eu estou sempre a actualizar-me e procuro actualizá-los a eles. A informação querecebo nos conselhos pedagógicos, a seguir aos pedagógicos, geralmente, há uma reuniãode docentes na semana seguinte, e eles recebem essa informação. Quando há documentospor escrito, apresento-os na reunião e fotocopio-os para os colegas…”(E6).
Em síntese, no que diz respeito à(s) forma(s) como os entrevistados intervêm na
concepção, implementação e avaliação do projecto curricular de turma, verifica-se que,
de um modo geral, existe uma responsabilização assumida como necessária para a
realização de tais projectos, notando-se a influência que estes professores consideram
ter no seu processo de desenvolvimento, embora com graus variáveis de importância
consoante o cargo que ocupam.
No entanto, o facto de partilharem tais ideias não significa que, em termos
práticos, o papel que assumem nesse processo seja significativo. Além de não existir
uma intervenção deliberada por parte de qualquer um dos órgãos representados na
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
162
amostra, torna-se evidente que as opiniões insistem na responsabilidade [quase
exclusiva] dos professores titulares de turma na concepção, implementação e avaliação
do seu projecto curricular. Os professores inquiridos remetem a sua influência mais para
um nível informal ou indirecto, sendo os presidentes do conselho executivo e os
coordenadores dos conselhos de docentes que melhor deixam transparecer esta posição,
a intervenção dos vice-presidentes e dos assessores do conselho executivo é ainda
menos visível ao nível do seus discursos.
2.2. Desenvolvimento do projecto curricular de turma
Procedimentos
Tendo em vista uma clarificação quanto ao tipo de apoio que é dado aos
professores nas diferentes etapas de desenvolvimento do projecto curricular de turma,
pela escola/agrupamento de escolas a que pertencem, começamos por procurar
identificar procedimentos que os entrevistados utilizam para orientar a elaboração desse
projecto. À semelhança do que acontece na categoria anterior as respostas diferem
consoante os cargos que os professores inquiridos desempenham, pelo que a
apresentação dos dados será feita de acordo essas funções.
Numa lógica que privilegia uma intervenção indirecta em relação ao trabalho
que os professores titulares de turma desenvolvem no âmbito da construção projecto
curricular de turma, os presidentes do conselho executivo assumem uma posição mais
extrínseca em relação a este processo. Contudo, não deixam de sentir a obrigação de
alertar os docentes para esta matéria e, sempre que necessário, intervir em situações
mais concretas:
“…podemos falar de dois tipos de intervenção; uma intervenção de âmbito geral, mais dealerta; e uma intervenção que lhe posso chamar cirúrgica, muito localizada. Essa,portanto, a mais localizada é em função do feedback que nós temos relativamente asituações muito concretas. Eu tenho, por exemplo, uma abordagem de um encarregado deeducação ou de uma associação de pais relativamente a uma situação concreta de turma eque tem a ver com o processo educativo, etc. etc. Eu terei que desenvolver osmecanismos necessários para averiguar a situação, de modo a que o próprio professorpossa reflectir, discutir o assunto em reunião de conselho docente e depois voltamos outravez à fase inicial…”(E3).
“…Não, directamente. Não tenho nenhum contacto directo com os docentes.Indirectamente sim, os professores entregam os projectos curriculares de turma no iníciode cada ano e, embora sem uma intenção de avaliar, damo-lhes uma vista deolhos…”(E7).
No tocante aos vice-presidentes do conselho executivo, os procedimentos
adoptados para apoiar os professores na construção do projecto curriculares de turma
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
163
passam, essencialmente, pela marcação das reuniões, onde são fornecidas as
informações mais relevantes nesse sentido:
“…Os professores fazem reuniões de trabalho e é divulgada a legislação vigente…”(E5).
“…A orientação é feita no início do ano, portanto, há uma reunião no início do ano,damos as orientações sobre o funcionamento deste agrupamento, damos um guião emsuporte de papel e em suporte digital, e as pessoas, a partir daí, elaboram o projectocurricular de turma de acordo, também, com o projecto curricular deagrupamento…”(E8).
Por seu turno, os assessores do conselho executivo inquiridos indicam que, a
partir de orientações que recebem do conselho executivo, uma vez que não lhes
compete tomar decisões a este respeito, podem recorrer a distintos procedimentos de
apoio aos professores:
“…Como assessora não tenho tanta, a não ser que o conselho executivo diga, entre aspas,para comunicar aos professores ou alguma comunicação a respeito dos projectos, daelaboração dos projectos curriculares de turma…mais em concreto, em relação aoprojecto curricular de turma é isso que eu faço, vejo os relatórios que chegam, também sehá algum relatório que por exemplo não esteja bem feito ou que não obedeça àquilo quese pediu, contacto o professor para ele reformular, é mais nesse processo…”(E1).
“…Costumo preparar as reuniões de acordo com as sugestões que podem surgir, deacordo com a legislação que possa entretanto sair, que seja actual e tenha interesse serdebatida na reunião. Recolho alguma informação sobre como está a decorrer aimplementação dos projectos curriculares de turma e tentamos criar uma articulação entreos diferentes anos. Consulto alguns manuais para ver se surgem novas ideias e tambémme baseio no projecto educativo do agrupamento e no projecto curricular deescola…”(E2).
Já um dos coordenadores do conselho de docentes entrevistados afirmou que,
em trabalho de grupo com os restantes coordenadores, define os critérios que devem
presidir à elaboração do projecto curricular de turma, critérios esses que,
posteriormente, servem de base para se estruturar um guião que poderá auxiliar na
elaboração do projecto pelos professores:
“…Nós definimos em reunião de ano, eu e os coordenadores de ano, estivemos a elaboraruns parâmetros e com esses parâmetros os professores tiveram a oportunidade de fazercom mais facilidade o projecto curricular de turma. Levámos esse guião a pedagógico, emconselho pedagógico foi aprovado e depois enviamos isso para as escolas e a partir daí oscolegas…”(E6)
Em suma, podemos verificar que, relativamente aos procedimentos adoptados
para nortear os professores na elaboração dos projectos curriculares de turma, é pouco
clara a natureza da intervenção que cada professor tem. Aliás, foi-nos difícil destrinçar
pontos comuns nas diferentes posições apresentadas, o que pode indicar que cada
escola/ agrupamento de escolas envereda pelos caminhos que lhe parecem mais
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
164
adequados, perante as situações que lhes são apresentadas no seu dia-a-dia, disso
resultando o apoio que devem prestar aos docentes com quem trabalham.
Não obstante emergem algumas preocupações que, estamos convictos, estarão
na base de procedimentos com vista à solução dos constrangimentos que possam surgir
neste processo. Das opiniões emitidas cumpre-nos destacar as seguintes: a preocupação
em estabelecer uma ligação entre o órgão de gestão e o conselho de docentes; a
preparação e marcação de reuniões; a resolução de situações concretas; a divulgação de
informação e/ou legislação pertinente para o tema; analisar e/ou avaliar os projectos
curriculares de turma no final do ano lectivo.
Definição de estratégias
Seguidamente, procuramos averiguar que estratégias de trabalho específicas são
definidas ao nível do agrupamento, para a elaboração dos projectos curriculares de
turma. Mais uma vez, verificámos que o conteúdo das respostas se interliga com o cargo
que o entrevistado ocupa no seu agrupamento de escolas, de maneira que utilizaremos o
método de apresentação de dados adoptados nas duas categorias anteriores.
Os presidentes do conselho executivo afirmam não definir estratégias
específicas, embora possam contribuir com o fornecimento de directrizes para a
elaboração dos projectos curriculares de turma, atribuindo ao conselho de docentes e ao
próprio professor titular de turma uma acção mais efectiva a esse nível.
“…Não definimos estratégicas muito definidas relativamente aos projectos curricularesde turma, a única coisa que o conselho executivo faz é, digamos, proceder à elaboração dedirectrizes sobre os projectos curriculares de turma, agora, é obvio que se alerte, digamos,para a o desenho do projecto curricular de turma, agora o tipo de desenho específicocompete a cada professor e ao próprio conselho de docentes…”(E3).
“…Não, não definimos nenhumas estratégias. Portanto, os professores é que, baseadosnos documentos essenciais, é que estruturam o seu projecto curricular de turma e, talvez,os coordenadores do conselho de docentes tenham aí um papel mais próximo nessesentido…”(E7).
Quanto aos vice-presidentes do conselho executivo, estes apenas referem como
estratégia de trabalho específica a marcação e preparação das reuniões:
“…Sim, marcando a ordem de trabalhos com este tema…”(E5)
“…os professores também reúnem periodicamente…”(E8)
Em relação aos assessores do conselho executivo, deparamo-nos com duas
posições distintas: enquanto um dos entrevistados afirma não definir quaisquer
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
165
estratégias, por iniciativa própria, o segundo já as define, nomeadamente na avaliação
dos alunos com dificuldades de aprendizagem:
“…eu por iniciativa minha não posso definir estratégias, não o faço, posso sugerir, issotambém eu posso. O conselho executivo pergunta-me o que eu penso e o que eu acho e eusugiro, a minha sugestão pode eu não ser aceite…”(E1)
“…Definimos estratégias em relação aos alunos com dificuldades de aprendizagem,reunimos e conversamos sobre esses alunos e tentamos encontrar a melhor forma de ostentar ajudar a superar as dificuldades que encontram e tentar que o sucesso educativoseja melhorado para todos...”(E2).
Por fim, é aos coordenadores do conselho de docentes que cabe uma actuação
mais preponderante na definição de estratégias de trabalho para a elaboração dos
projectos curriculares de turma, orientando as reuniões onde se expõem as estratégias e
os parâmetros de trabalho definidos ao nível da escola / agrupamento de escolas:
“…Nós fazemos reuniões, duas vezes por período, portanto temos quatro reuniões porperíodo, uma só de docentes com turma, de titulares de turma, onde se definemprogramações, avaliação, a situação até dos miúdos, e algum caso mais em que as colegasestão em dúvida, expõe em conselho de docentes, nós damos a nossa opinião…”(E4)
“definimos os parâmetros, que chegaram a todas as escolas do agrupamento, estipulamosuma data de entrega do projecto curricular, os colegas entregaram no agrupamento e aqualquer altura os colegas podem consultá-los e fazer as devidas alterações.”(E6)
Instrumentos
Quando questionados em relação aos instrumentos e/ou documentos que
utilizam para apoiar os docentes na elaboração dos projectos curriculares de turma,
podemos verificar que os professores entrevistados referem a utilização de uma
variedade de instrumentos e documentos para apoiar o docente na concretização de tal
tarefa:
- O regulamento interno, o projecto educativo, o projecto curricular do
agrupamento e legislação.
“…Os instrumentos que utilizo são as reuniões, a leitura de informação, o projectoeducativo do agrupamento, o projecto curricular do agrupamento…”(E2).
“…A legislação existente; os projectos educativo e curricular de escola”(E5).
“…Legislação, orientações que recebo no pedagógico”(E6).
“…não temos um guião para a construção dos projectos curriculares… a nível dedocumentos, bibliografia temos alguma coisa e indicámo-la aos professores. Mas eupenso que os professores se servem mais de exemplos que encontram nesses projectoscurriculares já pré-fabricados, que se baseiam um bocadinho neles…”(E7)
“…Tem que ter o regulamento interno em primeiro lugar, para saber como diversos osórgãos e estruturas funcionam, depois o projecto educativo, depois é o projecto curricular,e depois é que têm o projecto curricular de turma…”(E8).
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
166
- Um guião ou linhas orientadoras.
“…Fiz uma pesquisa na Internet, através de bibliografia, lembro-me perfeitamente deuma livro da Carlinda Leite, socorri-me desse livro para recolher alguma informação parafazer os tópicos que iriam, portanto, definir as orientações para fazer o projecto. E é esseque tem estado em vigor até agora. Se bem que nem todos os docentes o seguem, à risca,essas linhas orientadoras, aliás, foi esse o nome que lhe demos, linhas orientadoras parafazer o projecto curricular de turma…”(E1)
“…Eu tenho um guião e se alguém o pedir posso-o fornecer…Não há um guião feito peloagrupamento…”(E2).
“…Fizemos isso (um guião) quando foi do lançamento dos projectos curriculares deturma, no primeiro ano, … quando foi criada a obrigatoriedade. Aí sim, demosorientações, fizemos aí umas acções, digamos, de sensibilização e isso desenvolveu-senaquele momento, como pontapé de saída, a partir daí não, os professores é que terão queter essa competência e essa responsabilidade, uma vez que se enquadra dentro das suasfunções…”(E3)
“…Há um guião, aliás há várias, há três guiões … e cada um vai adoptar aquele que achaque fica melhor ou aquele que condiz mais consigo, …, projecto curricular de turma, osguiões, o que deve conter cada guião e depois cada colega vai ser livre na adopção, namaneira articular tudo isto, cada uma tem quer ser autónoma…”(E4)
“…É o guião …No início do ano cada professor faz levantamento da caracterização daturma, faz a caracterização de cada aluno com um questionário, é um questionário masque é feito com a família…”(E8)
Não podemos deixar de assinalar que o projecto educativo e o projecto curricular
de turma, bem como a legislação existente, são colocados à disposição dos docentes. O
mesmo não se verifica em relação à existência de um guião, pois apesar de referirem, na
sua maioria, que os professores recorrem ou recorreram a um guião, outros também
afirmam que o agrupamento a que pertencem não tem qualquer guião para esse efeito,
revertendo para a inteira responsabilidade do professor titular de turma a sua
elaboração.
Trabalho colaborativo
Quando questionados sobre a possibilidade de na concepção, implementação e
avaliação dos projectos curriculares de turma, ao nível do agrupamento, estimular o
trabalho colaborativo dos professores, as posições assumidas são distintas:
- O projecto curricular de turma é elaborado pelo professor titular de turma de
uma forma isolada:
“…O projecto curricular de turma é elaborado aqui, no nosso agrupamento peloprofessor titular de turma, não é em conselho de turma que se faz, como é o caso do 2ºciclo. Aqui o professor titular de turma é que faz, concebe, desenvolve e avalia…
Na elaboração propriamente dita do projecto acho que não, a elaboração é um trabalhomais isolado do próprio professor da turma, ele é que conhece a turma, sabe os seusproblemas e sabe os objectivos que quer atingir com o projecto…”(E1)
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
167
- O projecto curricular de turma é elaborado pelo professor titular de turma, em
articulação com o conselho de docentes:
“…Agora no desenvolvimento da avaliação, acho que, nos conselhos de docentes de anode escolaridade, porque os conselhos de docentes de ano de escolaridade são para issomesmo, é um espaço, digamos, onde os professores têm oportunidade de tirarem as suasdúvidas, colocarem os seus problemas, da turma, deles próprios…”(E1)
“…Se forem consultados os projectos curriculares de turma há muitas coisas em comum,a caracterização da turma é mais individual, o resto é tudo em comum..”.(E2).
“…É óbvio, que se estimula, digamos, o trabalho cooperativo e participativo dosprofessores, relativamente ao primeiro ciclo é uma questão um pouco complexa, porquehá aqui um projecto histórico, histórico-cultural. Os professores do 1º ciclo sempreviveram muito isoladamente, sempre foram donos deles mesmos, nunca prestaram contasa ninguém e não tinham nenhuma estrutura que, de certo modo, a quem prestassem contase os responsabilizassem pelo desempenho das suas tarefas. Eu costumo dizer que oprofessor no 1º ciclo, antes desse tema, era o profissional com maior autonomia. E isto,portanto, para uma percentagem significativa foi extremamente negativo, porque oprofessor não se habituou a partilhar, é sempre os meus alunos, a minha sala, a minhaescola e, portanto, a partilha não existia…”(E3).
“…A nível de conselho de docentes só quando há alguma coisa a apontar, porque, regrageral, cada um trabalha o seu projecto. Agora, a nível a grupo, núcleo de escola, sim, atéporque temos um plano comum, um tema comum…”(E4).
“….Sim, as experiências são partilhadas, em reuniões…” (E4).
“…Sim. Nas reuniões destinadas a esse tema, são debatidos os problemas comuns àsvárias turmas e procuram-se estratégias para a solução dos mesmos...”(E5).
“…Eu penso que as pessoas já se fecharam mais, na minha maneira de ver, neste períodoestá muito melhor, precisamente porque surgiam as dificuldades agora as pessoas estãomais abertas a trabalhar em grupo…”(E6).
“…É possível que ainda não esteja no ponto que nós mais desejávamos, mas já está muitomelhor, as pessoas já trabalham mais em grupo e já aceitam mais as opiniões dos colegas,o trabalho em grupo origina sempre um debate, tiram-se dúvidas esclarecem-se questões,aprende-se sempre mais ao ouvir os outros e agora já está a acontecer isso...”(E6).
“…Nós procuramos sempre, que a nível dos conselhos de docentes, os professorestenham, digamos que, colaboração entre eles para chegarem a determinado conceito doprojecto curricular de turma e até a definição da própria estrutura do mesmo, nós ditarmosalguma coisa, não…”(E7).
“…no início do ano, nível de secção, reúnem e fazem esse trabalho a nível de secção. Nãoé um trabalho isolado é um trabalho de colaboração dos titulares de turma e osprofessores dessa secção…”(E8).
A análise das respostas permite-nos inferir a existência de duas perspectivas
distintas: uma, a menos frequente, de ser apenas da responsabilidade do professor titular
de turma a concepção, o desenvolvimento e a avaliação do projecto curricular de turma;
outra, que remete para o conselho de docentes tal tarefa, defendendo que deve ter uma
participação activa em todo o processo.
Embora mais significativo na fase da avaliação dos alunos, o trabalho de grupo
desenvolve-se em grande parte nas reuniões onde os professores partilham ideias e
experiências e tiram dúvidas. Os professores entrevistados são da opinião de que se
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
168
estão a fazer progressos significativos, na medida em que os professores, aproveitando
os estímulos que lhes são dados, tiveram de se habituar a um outro modo de trabalhar,
que não se cinge à sua escola, à sua sala de aula, aos seus alunos, isto é, um modo que
de trabalho que privilegia o trabalho colaborativo.
Implementação
Tendo em vista verificar se os entrevistados conhecem a(s) forma(s) como os
professores desenvolvem os projectos curriculares de turma, questionámo-los a respeito
do feedback que recebem, ou não, acerca da forma como os projectos são
implementados, bem como se esse feedback é obtido a nível formal ou informal:
“…O formal é a partir de um documento escrito que os professores têm queentregar…”(E1)
“…A nível formal, fazemos um relatório anual…”(E4)
“….Sim. Através das actas dos conselhos de turma, logo a nível formal…”((E5)
“…O feedback que temos é que os professores entregam o projecto curricular de turmaaqui…Toda a gente entrega o projecto curricular de turma e no final de cada período,toda a gente entrega o relatório, digamos que é uma reflexão que engloba o projectocurricular de turma o projecto educativo…”(E7)
“…A nível formal, No final do ano há uma avaliação global, final, cada projectocurricular de turma é avaliado nos itens essenciais que constam e que foramtrabalhados…”(E8)
“…Aos dois níveis, quer formal, quer informalmente. Através de relatório, no fim doano, através de questões, às vezes, que se levantam com os encarregados de educação eacabamos por chegar lá, às vezes é o próprio professor que levanta situações e aíperguntamos o que é que está no projecto curricular de turma, o que é que foi feito, seexiste algum registo sobre isso no projecto curricular…”(E3)
“…Tenho, informalmente. Nas reuniões, normalmente há colegas que até gostam defalar sobre o que fizeram, e depois outros colegas pedem projectos curriculares de turmaemprestados a outros colegas para tirarem ideias e falam sobre alunos que têm maisdificuldades, o que é que vão fazer na sala de aula para ajudar os alunos a superar essasdificuldades…”(E2)
“…Informal, estando em diálogo, cada um partilha experiências…”(E4)
“…Mais a nível informal, dos colegas mais novos em conversas informais, realmentenós trocamos impressões, nas reuniões, já a nível forma, nas reuniões…”(E6)
De uma forma global, podemos afirmar que nos agrupamentos de escolas que
constituem a amostra, os responsáveis procuram tomar conhecimento sobre a forma
como os projectos curriculares de turma são desenvolvidos pelos professores, exigindo
para o efeito, a elaboração de, pelo menos, um relatório ou uma reflexão sobre esse
processo, sendo este, portanto, um feedback conseguido mais a nível formal. No
entanto, a necessidade sentida por muitos professores de expor as suas dúvidas e
partilhar as suas dificuldades e/ou experiências, levam-nos a conversar, de modo mais
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
169
informal, com os responsáveis da escola. Daí, os entrevistados terem uma percepção
mais ou menos alargada da forma como os projectos curriculares de turma estão a ser
postos em prática.
Organização das aulas
Com a intenção de constatar se a dinâmica do projecto curricular de turma
proporciona o recurso a novas formas de leccionar pelos professores, perguntámos aos
entrevistados se consideram que os professores alteraram a forma como leccionam as
aulas devido à existência do projecto. As opiniões dividem-se
“…Eu acho que sim, se bem que há docentes que ainda consideram que o projectocurricular de turma é um documento, para fazer, obedecer, é um pró-forma, para ter nagaveta, como muita gente fala, eu oiço falar, agora, mesmo assim … quando se faz oprojecto curricular de turma está-se já a pensar numa forma diferente de leccionar,porquê? Porque o projecto curricular de turma vai permitir a tal flexibilização do ensino,que pode ter estipulado, por exemplo, trabalhar um competência que só estava previstanos projectos curriculares de turma para o 3º período, mas se a oportunidade surgir nasala de aula de a trabalhar naquele dia, no 1º período, tu podes trabalhá-la…”(E1).
“…Penso que sim, só que é uma coisa que leva tempo… eles sabem que têm que fazerum relatório (…), quando entregam a avaliação dos alunos aos encarregados de educaçãotêm que falar no que foi feito, como têm que fazer a avaliação dos alunos não vão fazeressas coisas à sorte… há professores que seguem o projecto curricular de turma mais àrisca e fazem as adaptações e há outros que o fazem e guardam na gaveta, há detudo…”(E2)
“…Sim. Ajuda o professor a diversificar as suas estratégias, tendo como meta o sucessoescolar...”(E5).
“…Sim, sem dúvida… Para mim, veio-me facilitar a preparar as minhas planificações,porque trabalho com o documento todos os dias, todos os dias vou consultar odocumento, ver o que realmente está programado para aquele mês e é sempre uma ajudaque temos ali, dá a sensação que é um parceiro que está ali, que nos ajuda e que nosorienta todos os dias e ao longo do ano e vem, realmente, facilitar a preparação das aulas,sem dúvida… As pessoas já não encaram o projecto curricular de turma como mais umtrabalho, mais um peso, mas também como uma ajuda porque se está a preparar asaulas.(E6)
“…Acredito que haja professores que mudaram mas, efectivamente, e quando refiro osque mudaram, se calhar penso que serão os mais novos que terão isso como umadefinição da estratégia de trabalho…”(E7).
“…penso que não houve grandes alterações e eu acho que funciona mais como uminstrumento ao qual estão obrigados, porque, em termos práticos, eu penso que nãointroduziu qualquer tipo de melhoria ao processo de ensino-aprendizagem… é só darcumprimento a um instrumento…”(E3).
“…Sinceramente não. As pessoas fazem o projecto… Eu penso que toda a vida tivemosque fazer uma organização, nem que fosse mental, mas tem que se fazer… Mas isto nãotem a ver com falta de profissionalismo, conheço colegas óptimas professoras, comaproveitamentos óptimos, mas dizem mesmo, nós temos que ter isto mas quase nuncavão ao projecto…”(E4)
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
170
De uma maneira geral os professores inquiridos consideram que se verificaram
algumas alterações na forma como os professores leccionam e organizam as suas aulas,
uma mudança decorrente da existência do projecto curricular de turma e da forma como
estes são desenvolvidos na sala de aulas. No entanto, deixam sempre claro de que isso
pode não se verificar em todos os casos.
Avaliação dos alunos
Em relação à avaliação dos alunos, procurámos averiguar se os professores,
como resultado da concepção, implementação e avaliação de projectos curriculares de
turma, recorrem a procedimentos distintos dos que vinham utilizando na avaliação dos
alunos. Os pontos de vista dos entrevistados, ao nível da avaliação, apontam para
algumas alterações na forma como os professores avaliam os seus alunos, privilegiando
uma avaliação mais formativa e mais global. No entanto, consideram que essas
alterações são concretizadas, sendo talvez mais evidente a preocupação em conseguir
uma certa uniformização dos critérios utilizados na avaliação dos alunos:
“…Junto com a concretização, a construção de um projecto curricular de turma, vemtambém uma outra forma de avaliar, acho as duas coisas estão associadas. Então, hojeem dia privilegia-se a avaliação formativa, enquanto que para trás era uma avaliaçãomais sumativa até porque, como te disse à bocado, hoje em dia um aluno só é retido emúltimo caso… É uma avaliação mais global, não compartimentada por anos deescolaridade, se bem que isso causa muitos constrangimentos aos professores…”(E1).
“…Ao nível da avaliação dos alunos cada professor dava a sua menção, uns diziam queera mau, outros, não satisfaz, “…havia muitos critérios para avaliar e agora já estáuniformizado…”(E2).
“…Há uma tendência para se avaliar um aluno mais pela positiva do que pela negativa,aquilo que ele é capaz de fazer, ele já consegue fazer isto, e não, ele não é capaz disto,não sabe…Há mais preocupação pelo processo de ensino-aprendizagem, já não fazemdeterminadas barbaridades que faziam antigamente…”(E4).
“…Sim. Os professores utilizam mais as grelhas de observação focalizada…”(E5).
“…os colegas, realmente alguns, viram aquilo como uma forma de avaliar o aluno, masuma coisa nova, que não conheciam e passaram realmente a trabalhar essas coisas na saladeles, a pegar em grelhas de avaliação e novidades que nós trouxemos para trabalhardentro da sala…”(E6)
“…Não há assim uma grande mudança é mais uma questão de formalização…”(E8)
“Honestamente não me parece… É natural que haja professores que inovam, mas issoinovariam da mesma forma se não houvesse projecto curricular de turma, porque háprofessores que estão todos os dias à procura de novas formas de abordar e de conceberas coisas, mas, sinceramente, a ideia que tenho é que não mudou muita coisa…”(E7)
Penso que não há grandes alterações, aquilo que poderá haver é alguma uniformização decritérios, em termos de modalidade, por exemplo, o professor é capaz ainda, de um modogeral, de não dar grande importância a um instrumento, que acho importante, que é aauto-avaliação…”(E3).
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
171
Avaliação do projecto
Por fim, quando procurámos verificar se os projectos curriculares de turma são
avaliados, em que altura do ano e de que formas, verificamos que é predominante uma
certa uniformidade ao nível dos procedimentos utilizados na avaliação dos projectos
curriculares de turma pelos professores: esta avaliação é efectuada através dum relatório
que entregam, em geral, no final do ano lectivo. Já quanto ao facto dos projectos serem
avaliados ou analisados pelo órgão de gestão da escola, esse procedimento só se
evidencia no discurso de um dos entrevistados. Contudo, pode-se deduzir que existe,
regra geral, uma avaliação, ainda que informal, a partir da leitura dos relatórios que os
professores entregam:
“…Trimestralmente, entrega-se um relatório no início do cada período. Foi decidido emConselho Pedagógico que seria assim, agora isso não impede que o professor duranteesses três meses, não espere pelo fim para o ir avaliando e reformulando, só que quandonos chega aqui a nós, ao Conselho Executivo, já vem aí tudo…”(E1)
“No final do ano os professores costumam fazer um relatório e nas reuniões de ano nofinal de cada período costumamos fazer a avaliação de como o projecto curricular deturma está a correr, se há propostas de adaptações, alterações, é um documento quenunca está fechado…”(E2)
“Avaliar o projecto curricular de turma, não avaliamos, não pegamos nos projectoscurriculares. Obrigo a que todos os professores tenham um projecto curricular, mas hácasos só porque são obrigados…”(E3)
“…No fim do ano, no fim do período, se for um projecto de período, faz-se no fim doperíodo, através dum relatório…”(E4)
“…Sim. Pelo menos avaliam-se nas reuniões de final de período e sempre que háreuniões intermédias…”(E5)
“…fazemos o relatório trimestral, foram definidos os parâmetros, o relatório depois vaipara o executivo e analisámos no executivo…”(E6)
“…Nós não avaliamos, mas os próprios avaliam, é uma auto-avaliação que nos entregame aí sim, nós procuramos ler dentro do possível e ver como é que as coisas estão acorrer…”(E7)
“…No final do ano os projectos curriculares vêm todos para cá e há uma equipadesignada pelo conselho executivo e que vai avaliar de acordo com os parâmetros que oconselho executivo projecta. Um dos parâmetros do projecto curricular de turma é aavaliação do projecto, a avaliação final é anual. Há uma avaliação curricular parcelar quefica dentro secção e que nós tomamos conhecimento por aquilo que os professores nosdizem, na avaliação trimestral. Depois no final do ano há uma constatação daquilo quefoi dito e uma avaliação final…”(E8)
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
172
2.3. Constrangimentos da utilização do projecto curricular de turma
Constrangimentos
Para obter uma compreensão mais alargada relativamente a possíveis
dificuldades que podem inquietar os professores do 1º ciclo do Ensino Básico na
concretização do projecto curricular de turma, pedimos aos entrevistados que, a partir
daquilo que têm observado ao longo dos últimos anos, indicassem quais as principais
dificuldades que detectaram na concretização do(s) projecto(s) curricular(es) de turma
pelos professores.
A este respeito, são várias as dificuldades que ressaltam do discurso dos
professores entrevistados, começando pela falta de formação e informação, que são
apontados como dois dos principais obstáculos à concretização do projecto curricular de
turma:
“…Às vezes havia falta de informação, muitos colegas não sabiam como é que haviam defazer o projecto curricular de turma…”(E2).
“…Devia haver mais acções de formação, com mais qualidade e também a nível demanuais há pouca coisa, há legislação e o que saiu foi há muito tempo, pelo menos que euconheça, não há publicações recentes…”(E2).
“…Falta de formação e informação, porque foi de repente que passou a serobrigatório…”(E4).
“…Não tivemos formação, não tive eu, e penso que não teve ninguém, e uma das coisasque eu acho, é precisamente que há necessidade de criar acções de formação nessesentido, para ajudar os colegas a elaborar o projecto curricular de turma, sem dúvida,porque ainda hoje, apesar de já o usarem há 4 ou 5 anos, ainda hoje sentem semprealgumas dúvidas e algumas dificuldades na elaboração…”(E6).
“…Eu acho que é sem dúvida a falta de formação dos professores nesta área. Não hámuito acesso a formação a este nível…”(E7).
No que se refere à formação, os professores entrevistados apontam falhas
quer do próprio sistema de formação contínua, quer das instituições responsáveis
pela formação de professores, que não proporcionam formação neste domínio:
“…Eu acho que os tratamentos, às vezes, têm que ser de choque, mas com oacompanhamento, e com o envolvimento devido. Porque isto tem a ver com outra coisa,tem a ver com sistema da formação contínua. Um sistema da formação contínua que nãodá resposta àquilo que se pretende que seja todo este processo. A formação contínua, nosmoldes em que funciona, penso que não tem qualquer consistência, porque, de facto, oprofessor escolhe a formação que lhe apetece em função do número de créditos, atençãoque estou a generalizar, embora existam indicações, por parte das entidades de formação,às escolas que sugiram aos professores que escolham as temáticas em função dosprojectos educativos…”(E3).
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
173
“…A formação passou a ser obrigatória, que eu acho muito bem, eu sempre concordeique os professores devem fazer formação, mas às vezes, vão para formação que nem lhesinteressa para terem crédito…”(E4).
“…Penso também que as instituições responsáveis pela formação de professoresdeveriam apostar mais nessas áreas, porque os professores não saíram dos cursos com aformação para isso e mesmo os mais recentes, também não. Os mais antigos, que tinhamuma formação noutro sentido, tiveram que mudar e isso é muito complicado, os maisnovos penso que também não trazem muita formação nessa área…”(E7).
Por outro lado, mesmo ao nível dos diversos órgãos da escola, nos quais os
entrevistados desempenham determinados cargos, é denunciado o formalismo que
tem envolvido todo este processo, deixando perceber que, para muitos
professores, o projecto curricular de turma resulta do cumprimento de mais uma
burocracia:
“…O que eu ouço dizer é o fazer o documento, papéis e mais papéis.A burocracia, isso aí, é o que eu ouço mais contestação, acabam por fazer, mas depoisdizem, ai tantos papéis que temos que fazer, preencher, fazer isto, fazer aquilo, pedem-nos tudo, sobra pouco tempo depois para a aula, para cumprir o programa, entre aspas, sópapéis. Eu penso que muitas das vezes os professores podem desenvolver um projectocurricular de turma mesmo sem o terem em documento…”(E1).
“…Continua a ser visto como um documento só para dar resposta ao formalismoexistente…”(E3).
“…. É mais os papéis, penso que a burocracia foi um constrangimento…”(E4).
Para os professores entrevistados, e interligada com a questão anterior, situa-se a
resistência desenvolvida por muitos docentes quando se lhes pede para se envolverem
no trabalho de projecto:
“…A principal dificuldade tem a ver com a resistência. A grande dificuldade foi aresistência, digamos assim, é mais um papel, são mais um conjunto de papéis que nãoservem para nada. E agora o difícil é ir provando, ao longo dos tempos, destes anos, quede facto o projecto curricular de turma é importante…”(E3).
“…Há muitos docentes que dizem, para que é que eu vou fazer isto, há quem diga e nãotenha medo, vergonha ou qualquer tipo de problema em afirmar que é para meter nagaveta, que antigamente não havia nada destas coisas e nós trabalhávamos na mesma. Sóque as pessoas esquecem-se que as coisas agora são diferentes, o projecto curricular deturma é para concretizar o projecto educativo…”(E1).
A questão da mobilidade dos docentes constitui-se, também, na opinião dos
entrevistados, como uma dificuldade na operacionalização de todo este processo:
“…Há professores que vêm também com experiências diferentes de outrosagrupamentos…”(E1).
“…Nós constantemente estamos a saltar de escola em escola, que é mesmo assim, e nãoconhecemos o meio para onde vamos e, portanto, para conhecermos os alunos e o meioem que estamos a trabalhar precisamos de um certo tempo, não chega um mês, nãochegam dois, talvez no final do primeiro período já consigamos dar alguma informaçãosobre os meninos e sobre o meio em que estamos…”(E6).
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
174
“…Temos o problema da mobilidade dos docentes…”(E7).
Existem ainda um conjunto de aspectos que os professores consideram dificultar
a concepção e implementação do projecto curricular de turma, dos quais se salientam:
a) a heterogeneidade das turmas e o facto de existirem alunos com diferentes
níveis de desempenho na mesma turma, são factos que, por si só, dificultam o trabalho
do professor:
“…Vêem-se numa sala de aula com alunos com vários níveis de desempenho, tens alunosque estão matriculados num ano de escolaridade mas o seu nível de desempenhocorresponde a um outro ano, portanto é uma coisa um bocado fictícia. E isso torna-sedifícil depois para o professor trabalhar na sala de aula…”(E1).
b) dificuldades inerentes à própria organização e planificação do trabalho de
projecto:
“…No fundo custou um bocadinho a organizar, por exemplo o trabalho de projecto, planificar otrabalho de projecto. Depois, essa noção de que o projecto tem que ter um tempo que tem de seravaliado. Fazíamos, mas nada era avaliado…”(E4).
c) o fraco envolvimento dos encarregados de educação no processo de ensino-
aprendizagem dos seus educandos:
“…A maior dificuldade que sentem na sua concretização é os encarregados de educaçãonão obrigarem os alunos a cumprir as tarefas neles estipuladas…
…Devia haver um grande empenho do encarregado de educação para fornecer todos osdados que sejam imprescindíveis…”(E5).
d) a pressão exercida sobre os professores, pela escola, pelos pais e pela
sociedade em geral, o que provoca alguma ansiedade e dificulta o seu trabalho:
“…Hoje em dia sobrecarregam-se demais os professores, tudo se pede à escola, paraeducar para a saúde, para educar para a alimentação…, não quer dizer que essa não sejauma das funções da escola mas, deveria haver outras instituições que o fizessem, não sóna escola, porque os professores ficam com o tempo muito reduzido para leccionar o quetem que leccionar, o que está no programa. E depois temos também muita pressão dospais, da comunidade e de todos. Eu acho que se deveria aliviar um bocadinho essapressão…”(E1).
Da análise das opiniões dos professores entrevistados, podemos depreender que
as principais dificuldades que podem afectar a construção, implementação e avaliação
dos projectos curriculares de turma são originadas por factores distintos, tanto externos,
sobre os quais o professor não pode exercer grande influência, como é o caso da
formação, da burocracia, da mobilidade, da constituição das turmas, do envolvimento
dos encarregados de educação e da pressão a que estão sujeitos, - como internos -, isto
é, que dependem do próprio professor, como é o caso da resistência à mudança e da
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
175
organização do trabalho de projecto. Julgamos que só conseguindo conciliar esforços no
sentido de diluir tais dificuldades se poderá assumir o projecto curricular de turma como
um instrumento de mudança e melhoria educativa.
Cumprimento do estipulado na lei
No quadro da reorganização curricular do ensino básico o professor titular de
turma, no caso do 1º ciclo, está incumbido de, em articulação com o conselho de
docentes, construir o projecto curricular de turma. Desse modo, procurámos constatar se
a concepção, implementação e avaliação do projecto curricular de turma tem sido
desenvolvida mais para cumprimento do estipulado na lei para esse efeito ou como uma
necessidade sentida pelos professores perante as mudanças com que se confrontam.
Os discursos dos inquiridos relativamente a esta temática apontam, pelo menos,
em duas direcções. Enquanto alguns afirmam que o projecto curricular de turma é
elaborado apenas para dar cumprimento a uma disposição legal:
“…A minha opinião é a primeira hipótese, para dar cumprimento à lei. Se bem que se tudissesses agora aos professores que já não precisam de fazer o projecto, acho queninguém ficaria triste. Não sei se haveria alguém que iria continuar a fazê-lo, até podeser, até se calhar de outra forma, porque eu acredito que os professores na sala de aula, nofundo, têm a sua metodologia, fazem os sumários, pronto… não sei se necessitam de umprojecto para o fazer. Agora acho que é mais para cumprir um requisito do que umaobrigatoriedade, porque essa obrigatoriedade eles não a faziam mas faziam alguma coisacomo antigamente mas à sua maneira, não havia aquela obrigação de entregar de fazerrelatórios isso é uniforme, quase em todo o lado, muitos faziam se calhar, até já faziamesse projecto mas podiam nem dar esse nome…”(E1).
“…Acho que há muita gente que faz porque é obrigatório, mas também vê vantagens emfazer, agora se deixasse de ser obrigatório se calhar ….”(E2).
“…É por obrigação… penso que algumas partes se continuavam a fazer, outrasnão…”(E4);
Outros reiteram que a elaboração do projecto curricular de turma é uma necessidade
sentida pelos professores e que, caso esta imposição legal deixasse de existir não
afectaria a sua realização:
“…Penso que é uma necessidade que o professor tem,,,”(E2).
“…Alguns continuariam. O professor que de facto vive…, o professor inovadorcertamente manteria. Agora, o professor trabalhador, esse possivelmente, não. Oprofessor inovador certamente manteria o mesmo sistema. Isso tem a ver com váriascoisas, com a dedicação, com o gosto, com o brio, com a investigação … e o professorainda não entendeu que tem que ser uma classe diferenciada, ou seja, o professor tem queestar em permanente, o professor tem ser, digamos, ao seu nível permanentemente uminvestigador, um cientista, entre aspas, o professor não se pode acomodar aos saberes queadquiriu na sua formação inicial, o professor tem que estar em permanentemudança…”(E3).
CAPÍTULO VI – Apresentação e discussão dos resultados
176
“…Nos primeiros dois ou três anos penso, realmente, que os colegas faziam o projectocurricular de turma mais para cumprir aquilo que nos era pedido, agora não. Agora pensoque os colegas fazem o projecto curricular de turma como eu já disse, como uma ajudapara a preparação das aulas e já começam a ver esse trabalho doutra maneira.Se deixasse de existir a obrigatoriedade, não digo que se fizesse o trabalho com tantocuidado. Mas que talvez os colegas continuassem a orientar-se com trabalho semelhanteao projecto curricular de turma ou planificar as aulas da mesma maneira, a fazerplanificações no início do ano lectivo já para todo o ano lectivo, trabalhavam com umacoisa, pelo menos, semelhante…”(E6).
“…a impressão que tenho é que os professores preferiam não ter que os fazer. Claro queos professores iriam fazer outras coisas, todos os professores têm necessidade deestruturar o seu trabalho, mas gostariam de não o fazer com um carácter tão obrigatório,tão formal, tão rígido. Eu penso que qualquer pessoa que não tenha planificação do seutrabalho não consegue trabalhar, sobretudo os professores…”(E7).
“…Há pessoas que realmente elaboram o projecto curricular de turma, avaliam-nostrimestralmente, introduzem alterações ao que não está bem, de acordo com até comactividades que surjam pontualmente. Há outros professores que só fazem porque têmque fazer…”(E8).
De facto é visível alguma falta de consenso no discurso dos professores em
relação a esta matéria, se por um lado consideram que a concepção deste projecto
é somente levada a cabo porque existe uma obrigatoriedade, por outro têm a
percepção de que, caso isso não se verificasse, muito provavelmente, os docentes
continuaram a utilizar esta metodologia de trabalho, ainda que de uma forma
menos formal e rígida.
CONCLUSÃO
Conclusão
178
Este trabalho constituiu para nós um enorme desafio pessoal e profissional, só
possível de realizar graças ao contributo de vários colegas, mas, sobretudo, da
disponibilidade dos professores que aceitaram colaborar neste estudo.
Impõe-se neste momento evidenciar algumas ideias a que o mesmo conduziu e
que, mais do que a um conjunto de conclusões, pretendem ser singelos elementos de
reflexão e, quem sabe, pistas para possíveis trabalhos de investigação.
Em jeito de síntese final, e tendo em conta os resultados obtidos, quer através da
aplicação dos inquéritos por questionário (n=195), quer através da realização dos
inquéritos por entrevista (n=8), enaltecemos alguns aspectos que julgamos
fundamentais.
No sentido de verificar que implicações têm na acção do professor do 1º ciclo
do Ensino Básico (a obrigatoriedade) da concepção, implementação e avaliação de
projectos curriculares, mais especificamente do projecto curricular de turma, pareceu-
nos importante começar por clarificar alguns pontos, nomeadamente o(s) sentido(s) que
os professores atribuem à concepção, implementação e avaliação de projectos
curriculares e, em concreto, do projecto curricular de turma e aos procedimentos que
utilizam quer na construção, quer na forma(s) como o implementam e avaliam.
Os professores consideram a construção do projecto curricular de turma se
insere num processo contínuo, devendo ter por referência projecto curricular de escola e
o projecto educativo, situando-se, no último patamar de decisão para adequar o
currículo nacional a um grupo específico de alunos, contribuindo dessa forma para
promover o seu sucesso educativo. Assim, os professores assumem como adquirido o
facto de o projecto curricular de escola ter como finalidade adequar o currículo nacional
à escola e ao meio e o projecto curricular de turma fazer essa adequação a um conjunto
de alunos específicos.
À construção do projecto curricular de turma é atribuída uma significativa
importância, pois é tido como um instrumento de trabalho que pode prestar um valioso
contributo para o trabalho do professor na sala de aulas, com os seus alunos, tornando
possível, desta forma, definir estratégias e encontrar soluções que conduzam os alunos à
obtenção do sucesso nas suas aprendizagens, permitindo, numa perspectiva mais
prática, articular os conteúdos das diferentes áreas curriculares e a utilização de
actividades diferentes das que costumavam realizar. Também a existência das áreas
Conclusão
179
curriculares não disciplinares – área de projecto, formação cívica e estudo
acompanhado,- fazem mais sentido com a existência do projecto curricular de turma,
uma vez que os aspectos relacionais e o desenvolvimento de procedimentos e atitudes
passa a ter outro peso.
Relativamente aos procedimentos que utilizam na construção do projecto
curricular de turma, os professores atribuem alguma importância ao papel que o
conselho de docentes desempenha no apoio que lhes é prestado, considerando também
importante que tal tarefa seja fruto de um trabalho colectivo. Aliás, o próprio normativo
que postula a concepção, aprovação e avaliação do projecto curricular de turma, no 1º
ciclo, diz que este deverá ser resultado de uma articulação entre professor titular de
turma e o conselho de docentes.
De facto, o papel que o conselho de docentes pode desempenhar quer ao nível
da construção, quer da implementação dos projectos curriculares de turma é
extremamente importante. Independentemente do tipo de apoio que os diferentes órgãos
da escola prestam, directa ou indirectamente, aos docentes neste âmbito, os professores
consideram que é ao conselho de docentes que é atribuída a maior responsabilidade.
Apesar, de muitos professores afirmarem que, ao nível do 1º ciclo do Ensino
Básico, esta é uma tarefa que desempenham sozinhos, sabem que podem ter no
conselho de docentes ou, até mesmo, na figura do coordenador deste órgão um apoio
constante, embora muitas vezes seja de carácter informal.
A implementação e avaliação do projecto curricular de turma e todas as
alterações que daí emergem, quer na forma como decorrem e são organizadas as aulas,
quer nos procedimentos de avaliação dos alunos, quer na planificação das actividades,
não são vistas com indiferença pelos professores. No entanto, nem sempre as posições
assumidas pelos professores a este respeito são consensuais, denotando-se um certo
dualismo, diríamos mesmo ambiguidade, nas posições assumidas.
Por um lado, consideram que, de facto, com esta metodologia de trabalho se
viram impelidos a adoptar novas e/ou diferentes formas de organizar as aulas ou que, na
prática, se verificaram mudanças na forma como estas decorrem e que alteraram os
procedimentos relativamente à avaliação dos alunos, recorrendo às diferentes
modalidades de avaliação preconizadas pela Reorganização Curricular do Ensino
Básico.
Conclusão
180
Por outro lado, encaram a elaboração do projecto curricular de turma como
resultado de uma prescrição normativa, apenas uma formalidade que têm de cumprir.
Contudo, os professores não deixam de demonstrar que são profissionais responsáveis,
pois, mesmo no caso da inexistência de tal exigência, sempre necessitaram de um
instrumento que suportasse o seu trabalho na sala de aulas. Para muitos, o projecto
curricular de turma veio, apenas, transformar em algo mais formal e rígido aquilo que já
era feito, ainda que livre de quaisquer imposições e controlos.
Quanto ao nosso propósito de apurar constrangimentos decorrentes da
concepção, implementação e avaliação do projecto curricular de turma, pelos
professores do 1º ciclo do Ensino Básico, verificámos que são bastantes os
constrangimentos apontados, bem como as causas que estão na sua base.
Resumidamente, podemos salientar que os principais constrangimentos
apontados pelos professores assentam na constituição das turmas, predominantemente,
constituídas por mais do que um ano de escolaridade (entre outros aspectos), na
escassez de recursos de diferentes tipos (materiais, financeiros, pedagógicos), na
crescente pressão da sociedade e dos pais sobre o trabalho do professor, bem como na
falta de empenho e pouco envolvimento dos pais na vida da escola.
Contudo, se as principais causas evidenciadas pelos professores passam, na sua
maioria, por aspectos relacionados com a constituição das turmas e a falta de recursos.
É na falta de formação que reside um dos maiores dilemas dos professores.
Considerando que esse é um aspecto fundamental para o desenvolvimento de qualquer
mudança no ensino, como é o caso do projecto curricular de turma, os professores
afirmam que se sentiram desamparados ao encontra algumas lacunas a este nível,
principalmente na formação contínua que lhes foi posta à disposição pelas instituições
responsáveis.
São muitas ainda as questões que ficam por resolver e podem ser clarificadas no
âmbito do desenvolvimento do projecto curricular de turma, no 1º ciclo do Ensino
Básico. Aspectos que, no nosso entender, poderão ser explorados em futuras
investigações. Por exemplo, seria importante, conhecer, mais detalhadamente práticas
concretas de construção, implementação e avaliação de projectos curriculares de turma;
compreender, dando a voz aos professores do primeiro ciclo, que implicações teve nas
práticas esta forma de trabalhar na sala se aulas.
Conclusão
181
Em suma, mais do que encontrar soluções ou delinear “receitas”, esperamos ter
contribuído para o debate em torno das questões que estiveram na base da realização
deste trabalho. Resta-nos terminar assinalando que ser professor nos tempos que
decorrem e que se avizinham não é, nem será, tarefa fácil. Requer um alto nível de
comprometimento e uma preparação acrescida para assimilar as necessidades e as
repercussões que estão associadas tanto às mudanças da sociedade, como às alterações
do próprio sistema educativo. Não esquecendo que a nossa situação, a dos professores,
perante a mudança social pode ser “comparável à de um grupo de actores, vestidos com
traje de determinada época, a quem sem aviso prévio se muda o cenário, em metade do
palco, desenrolando um novo pano de fundo, no cenário anterior. Uma nova encenação
pós-moderna, colorida e fluorescente, oculta a anterior clássica e severa” (Esteve, 1995:
97). Daí a dificuldade mas, ao mesmo tempo, o aliciante desafio de ser professor.
BIBLIOGRAFIA
.
Bibliografia
183
ABRECHT, R. (1994). A avaliação formativa. Porto: Edições ASA.
ALLAL, L.; CARDINET, J. e PERRENOUD, P. (1986). A avaliação formativa num
ensino diferenciado. Coimbra: Almedina.
ALONSO, L.; PERALTA, H.; ALAIZ, V. (2001). Parecer sobre o Projecto de Gestão
Flexível do Currículo. www.deb.min-edu.pt (Consultado em Março de 2004).
ALVES, M. (2003). Organização, gestão e projectos educativos das escolas. Porto:
Edições Asa.
ALVES, P. (2002a). A avaliação e o desenvolvimento profissional. In MOREIRA, A. e
MACEDO, E. (Org). Currículo, Práticas Pedagógicas e Identidades. Porto: Porto
Editora.
ALVES, P. (2002b). Autonomia curricular: a face oculta da (re)centralização. In
MOREIRA, A., et al (Orgs.). Actas do V Colóquio sobre Questões Curriculares:
Currículo e Produção de Identidades. Braga: Universidade do Minho.
AMOR, E. (1996) Didáctica do Português. Fundamentos e Metodologias. Porto: Texto
Editora.
AMORIM, A. (1995). Introdução às Ciências Sociais. Aveiro: Estante Editora.
APPLE, M. (1998). Educar à maneira da “direita”. As escolas e a aliança conservadora.
In Actas do III Colóquio sobre Questões Curriculares. Braga: Universidade do
Minho
ARNAL. J.; LATORRE, A.; RINCÓN, D.(1996). Bases metodológicas de la
investigación educativa. Barcelona: Hurtado Ediciones
BARBIER, J-M. (1992). Elaboração de projectos de acção e planificação. Porto: Porto
Editora.
BARDIN, L. (2004). Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70.
Bibliografia
184
BARROSO, J. (2003). A Formação dos professores e a mudança organizacional das
escolas. In FERREIRA, N. (org.) Formação Continuada e Gestão da Educação. São
Paulo: Cortez.
BARROSO. J. (1992). Fazer da escola um projecto. In. CANÁRIO, R. (Org.) Inovação
e projecto educativo de escola. Lisboa: Educa.
BELL, J.(1997). Como realizar um projecto de investigação. Lisboa: Gradiva
BERNSTEIN, A.(1995). A handbook of statistic solutions for the behavioural sciences.
New York: Holt, Rinehart and Winston, Inc.
BOGDAN, R.; BIKLEN, S. (1994). Investigação Qualitativa em Educação. Introdução
à Teoria e aos Métodos. Porto: Porto Editora.
BOUTIN, G. et al (1994). Investigação Qualitativa: Fundamentos e Práticas. Lisboa:
Instituto Piaget.
BOUTINET, J-P. (1990). Antropologia do projecto. Lisboa: Instituto Piaget.
BRANDÃO, M. (1999) Modos de ser professor. Lisboa: Educa.
CARVALHO, A. (1998). A educação como projecto antropológico. Porto: Porto
Editora.
CORTESÃO, L. (1993). A avaliação formativa. Que desafios? Porto: Edições ASA
CORTESÃO, L., LEITE, C. e PACHECO, J. (2002). Trabalhar por projectos em
educação. Uma inovação interessante?. Porto: porto Editora.
COUTINHO, C. (2004). Métodos de Investigação em Educação. Texto Policopiado.
Braga: Universidade do Minho
DANTAS, M.; LOPES, M. e MIRANDA, T. (2001). Projecto da gestão Flexível do
currículo: Reflexões e práticas. In SOBRAL, M. (coord.). Gestão Flexível do
currículo – escolas partilham experiências. Lisboa: Ministério da Educação. DEB.
Bibliografia
185
DAVILA, A. (1995). Las perspectivas metodológicas cualitativa y cuantitativa en las
ciencias sociales: debate teorico e implicaciones praxeológicas. In DELGADO, J.;
GUTIÉRREZ, J. (Orgs.), Métodos y Técnicas Cualitativas de Investigacíon en
Ciencias Sociales. Madrid: Sintesis Psicología.
DAY, Ch. (2001). Desenvolvimento Profissional de Professores. Os desafios da
aprendizagem permanente. Porto: Porto Editora.
DAY, Ch. (2003) O desenvolvimento profissional dos professores em tempos de
mudança e os desafios para as universidades. In Revista de Estudos Curriculares.
Braga: Associação Portuguesa de Estudos Curriculares.
DE KETELE, J.-M. et al (1988). Guia de Formador. Lisboa: Instituto Piaget.
DE KETELLE, J.M.; ROEGIERS, X. (1999). Metodologia da Recolha de Dados.
Lisboa: Instituto Piaget.
DELGADO, D. & MARTINS, É. (2001).Autonomia, Administração e Gestão das
Escolas Portuguesas – 1974-1999. Continuidades e Rupturas. Lisboa: Ministério da
Educação.
DESHAIES, B. (1997). Metodologia da Investigação em Ciências Humanas. Lisboa :
Instituto Piaget.
ESTEVE, J. (1995). Mudanças sociais e função docente. In NÓVOA, A. (org.).
Profissão professor. Porto: Porto Editora.
ESTEVES, M. (2002). A investigação enquanto estratégia de formação de professores.
Um estudo. Lisboa: Instituto de Inovação Educacional.
ESTRELA, M. (2001) Questões de Profissionalidade e Profissionalismo Docente. In
TEIXEIRA, M.(org.) Ser Professor no Limiar do Século XXI. Porto: ISET..
ESTRELA, M. (2003) A formação contínua entre a teoria e a prática. In MORAES, M.,
PACHECO, J., EVANGELISTA, M. (orgs.): Formação de Professores. Perspectivas
educacionais e curriculares. Porto: Porto Editora.
Bibliografia
186
FERNANDES, P. et al. (2001). Uma formação em círculo: um sentido no presente...
um sentido no futuro. Ministério da Educação. Instituto de Inovação Educacional.
Colecção Práticas pedagógicas; 11.
FERNÁNDEZ, D. (1994) La planificación de la enseñanza: Técnica, sentido cómun o
saber profesional?. In ANGULO, J. e BLANCO, N. (Org.) Teoría y desarrollo del
curriculum. Málaga: Ediciones Aljibe.
FERREIRA, V. (2003). O Inquérito por Questionário na Construção de Dados
Sociológicos. In A. Silva e J. Pinto (Orgs.), Metodologia das Ciências Sociais. Porto:
Edições Afrontamento.
FLORES, A. (2003a). Aprender a ser professor: dilemas e (des)continuidades. In
Revista de Estudos Curriculares. Braga: Associação Portuguesa de Estudos
Curriculares.
FLORES, A. (2003b). Dilemas e Desafios na Formação de Professores. In MORAES,
M., PACHECO, J., EVANGELISTA, M. (orgs.): Formação de Professores.
Perspectivas educacionais e curriculares. Porto: Porto Editora.
FONTOURA, M. (1999). Projectos educativos de escola: um desafio à organização
curricular na escola. Tese de Doutoramento. Lisboa: Faculdade de Psicologia e
Ciências da Educação da Universidade de Lisboa.
FORMOSINHO, J. (1991). Currículo e cultura escolar. In MACHADO, F. e
GONÇALVES, M. Currículo – Problemas e Perspectivas. Rio tinto: Edições Asa.
FORMOSINHO, J. (1991a). Modelos organizacionais na Formação Contínua de
Professores. In Actas do I Congresso Nacional de Formação Contínua de Professores:
Realidades e Perspectivas. Aveiro: Universidade de Aveiro
FREITAS, C. (1998). Inovação curricular: o desafio que espera uma resposta. In Actas
do III Colóquio sobre Questões Curriculares. Braga: Universidade do Minho
Bibliografia
187
FREITAS, C. (2001). O currículo do Ensino Básico e as novas perspectivas para a
acção organizacional e pedagógica. In FREITAS, C. et al. A Reorganização
Curricular do Ensino Básico – fundamentos, fragilidades e perspectivas. Porto:
Edições Asa.
GAY, G. (1991). Desenvolvimento Curricular. In MACHADO, F. e GONÇALVES, M.
(Org.) Currículo – Problemas e Perspectivas. Rios tinto: Edições Asa.
GIL, A. (1999). Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Editora Atlas.
GIMENO, J. (1995). El Curriculum: Una reflexíon sobre la prática. Madrid: Morata.
GOMES, A. (2004). A Escola. Porto: Porto Editora
GOMES, J. (1997). O projecto educativo de escola e a sua influência na gestão dos
estabelecimentos do Ensino Básico e Secundário. Braga: Edições APPACDM
Distrital de Braga.
GOMES, R. (1993). Culturas de Escola e Identidades dos Professores. Lisboa: Educa.
GOODLAD, J. (1991). Definições situacionais de currículo. In MACHADO, F. e
GONÇALVES, M. (Org.) Currículo – Problemas e Perspectivas. Rios tinto: Edições
Asa.
HARGREAVES, A. (1996). Professorado, Cultura y Postmodernidade (Cambian los
tiempos, Cambia el professorado). Madrid: Ediciones Morata, S. L.
JACKSON, P. (1998). La vida en las aulas. Madrid: Morata.
JESUS, S. (2002). Perspectivas para o bem- estar docente. Porto. Edições Asa.
KLIEBARD, H. (1985). The struggle for the American curriculum: 1893-1958. New
York: Routledge.
LEITE, C. (2003). Para uma escola curricularmente inteligente. Porto: Edições Asa.
LEITE, C. e FERNANDES, P. (2002). Avaliação das Aprendizagens dos Alunos –
Novos contextos, novas práticas. Porto: Edições Asa.
Bibliografia
188
LEITE, C.; GOMES, L. e FERNANDES, P.(2001). Projectos curriculares de escola e
de turma. Conceber gerir e avaliar. Porto: Edições Asa.
LEMOS, J. e CONCEIÇÃO, J. (2001). Currículo e Autonomia. Porto: Porto Editora.
LLAVADOR, F. e ALONSO, A. (2000). Desenhar a coerência escolar. Bases para o
projecto curricular de escola e de turma. Porto: Edições Asa.
LOUREIRO, E. (2005). Projecto educativo. Documento estrutural para um novo
paradigma de escola. Dissertação de Mestrado. Porto: Universidade Portucalense
Infante D. Henrique.
LOUREIRO, M. (1997). O Desenvolvimento da Carreira dos Professores. In
ESTRELA, M. (Org.) Viver e Construir a Profissão Docente. Porto: Porto Editora.
LOUREIRO, M. (2001). A docência como profissão. Culturas dos professores e a
(in)diferenciação profissional. Porto: Edições Asa.
MACHADO, F. e GONÇALVES, M. (1991). Currículo e Desenvolvimento Curricular.
Rio Tinto: Edições Asa.
MARCELO, C. (1999). Formação de Professores - Para uma mudança educativa.
Porto: Porto Editora.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (2001). Currículo Nacional: Competências Essenciais
e Transversais. Lisboa: Editorial do Ministério da Educação.
MOREIRA, C. (1994). Planeamento e Estratégias da Investigação Social. Lisboa:
Universidade Técnica de Lisboa.
MOREIRA, J. (2004). Questionários: Teoria e Prática. Lisboa: Almedina.
MORGADO, J. (1998). A (des)construção da autonomia curricular. Dissertação de
Mestrado. Braga: Universidade do Minho
MORGADO, J. (2000). A (des)construção da autonomia curricular. Porto: Edições
Asa.
Bibliografia
189
MORGADO, J. (2001). A reorganização curricular do Ensino Básico – fundamentos,
fragilidades e perspectivas. In FREITAS, C. et al. A Reorganização Curricular do
Ensino Básico – fundamentos, fragilidades e perspectivas. Porto: Edições Asa
MORGADO, J. (2003). Projecto Curricular e Autonomia da Escola: Possibilidades e
Constrangimentos. Revista Galego-Portuguesa de Psicoloxia e Educación, N.º8,
Vol.10
MORGADO, J. (2005). Currículo e profissionalidade docente. Porto: porto Editora
MORGADO, J. e PARASKEVA, J. (1998). Autonomia curricular: uma nova
ferramenta ideológica. In PACHECO, J.; PARASKEVA, J. e SILVA, A. (Orgs.).
Reflexão e Inovação Curricular. Actas do III Colóquio sobre Questões Curriculares.
Braga: Universidade do Minho.
MORGADO. J. e PARASKEVA, J. (2000). Currículo: factos e significações. Porto:
Edições Asa.
NÓVOA, A. (1992a). A Reforma Educativa Portuguesa: questões passadas e presentes
sobre a formação de professores, in NÓVOA, A. & POPKEWITZ, T. S. (orgs.):
Reformas Educativas e Formação de Professores, Lisboa: Educa.
NÓVOA, A. (1995). O passado e o presente dos professores. In NÓVOA, A. (org.).
Profissão professor. Porto: Porto Editora.
NÓVOA, A. (coord.) (1992b). As organizações Escolares em Análise. Lisboa:
Publicações D. Quixote.
ORTÍ, A. (1995). La confrontación de modelos y niveles epistemológico en la génesis e
história de la investigación social. In Delgado, J.; Gutiérrez, J. (Orgs.), Métodos y
Técnicas Cualitativas de Investigacíon en Ciencias Sociales. Madrid: Sintesis
Psicología.
PACHECO, J. (1995). Da componente nacional às componentes curriculares regionais
e locais. PEPT. Lisboa: Ministério da Educação.
PACHECO, J. (1995). Formação de Professores: Teoria e Práxis. Braga: Universidade
do Minho – IEP.
Bibliografia
190
PACHECO, J. (1995). O Pensamento e a Acção de Professor. Porto: Porto Editora.
PACHECO, J. (2001). Currículo: teoria e praxis. Porto: Porto Editora.
PACHECO, J. e MORGADO, J. (2002). Construção e avaliação do projecto curricular
de escola. Porto: Porto editora.
PARASKEVA, J. (1998). A dinâmica dos conflitos ideológicos e culturais na
fundamentação do currículo. Braga: Universidade do Minho
PERES, A. (1999). Educação Intercultural: utopia ou realidade?. Porto: Profedições.
PÉREZ, M. e LÓPEZ, E. (1999). Curriculum y programación – diseños curriculares de
aula. Madrid: Editorial EOS.
PERRENOUD, P. (1993). Não mexam na minha avaliação! Para uma abordagem
sistemática da mudança pedagógica. In ESTRELA, A. e NÓVOA, A. (Orgs.),
Avaliações em educação: Novas Perspectivas. Porto: Porto Editora.
PONTE, J. et al. (1998). Projectos educativos. Lisboa: Ministério da Educação. DES.
QUIVY, R.; CAMPENHOUDT, L. (1992). Manual de Investigação em Ciências
Sociais. Lisboa: Gradiva.
RASCO, F. (1994). A qué llamamos curriculum? In ANGULO, J. e BLANCO, N.
(Orgs.) Teoría y desarrollo del curriculum. Málaga: Ediciones Aljibe.
RIBEIRO, A. (1990). Desenvolvimento curricular. Lisboa: Texto Editora.
RIBEIRO, A. (1993). Formar Professores. Elementos para uma Teoria e Prática de
Formação. Lisboa: Texto Editora.
ROCHA, A. (1996). Projecto Educativo de escola. Administração participada e
inovadora. Rio tinto: Edições Asa.
ROLDÃO, M. (1999a). Os Professores e a Gestão do Currículo. Perspectivas e
Práticas em Análise. Porto. Porto Editora
ROLDÃO, M. (1999b). Gestão Curricular. Fundamentos e Práticas. Lisboa: Ministério
da Educação, Departamento da Educação Básica.
Bibliografia
191
ROMANELLI, O., O. (1995). História da Educação no Brasil: 1930-1973. Petrópolis:
Editora Vozes..
SALINAS, D. (1994) La planificación de la enseñanza: ?Técnica, sentido común o
saber professional. In ANGULO, J. e BLANCO, N. (Orgs.) Teoría y desarrollo del
curriculum. Málaga: Ediciones Aljibe.
SANTOMÉ, J. (1995). O curriculum oculto. Porto: Porto Editora.
SARMENTO, M. J. (1994). A Vez e as Vozes dos Professores: Contributo para o
Estudo da Cultura Organizacional da Escola Primária. Porto: Porto Editora.
SCHEIN, E. (1985). Organizational Culture and Leadership. San Francisco: Jossey-
Bass.
SILVA, A. (2001). Os Directores dos Centros de Formação das Associações de
Escolas. A pessoa e a organização. Ministério da Educação. Instituto de Inovação
Educacional. Colecção Práticas pedagógicas. 18.
SOUSA, M. (1995). Projectos na vida de um professor. Porto: Porto Editora.
STENHOUSE, L. (1991). Um modelo de processo. In MACHADO, F. e
GONÇALVES, M. (Orgs.) Currículo – Problemas e Perspectivas. Rios tinto:
Edições Asa.
TADEU DA SILVA, T. (2000). Teorias do Currículo: uma introdução crítica. Porto:
Porto Editora.
TEODORO, A. (2006). Professores, para quê? Mudanças e desafios na profissão
docente. Porto: Profedições.
TEODORO, A. (2006). Professores, para quê? Mudanças e desafios na profissão
docente.Porto: Profedições.
TORRES, L. (1997). Cultura Organizacional Escolar: Representações dos Professores
numa Escola Portuguesa. Oeiras: Celta Editora.
Bibliografia
192
TYLER, R. (1991). Um modelo conceptual para o desenvolvimento do currículo. In
MACHADO, F. e GONÇALVES, M. (Org.) Currículo – Problemas e Perspectivas.
Rio tinto: Edições Asa.
VALA, J. (2003). Análise de Conteúdo. In. SILVA, A. e PINTO, J. (Orgs.),
Metodologia das Ciências Sociais. Porto: Edições Afrontamento.
VASCONCELOS, F. (1999) Projecto educativo. Teoria e prática nas escolas. Lisboa:
Texto Editora.
VASCONCELOS, M. e BRITO, R. (2006). Conceitos de educação em Paulo Freire.
São Paulo: Editora Vozes.
VILAR, A. (2000). O professor planificador. Rio Tinto: Edições Asa.
ZABALZA, M. (1994). Planificação e desenvolvimento curricular na escola. Rio
Tinto: Edições Asa.
ZABALZA. M. (2003). Do currículo ao projecto de escola. In. CANÁRIO, R. (Org.)
Inovação e projecto educativo de escola. Lisboa: Educa.
Legislação
Lei n.º 5/73, de 25 de Julho (Lei Veiga Simão).
Despacho n.º 40/75, de 8 de Novembro (Regime de gestão das escolas primárias).
Constituição da República Portuguesa, de 25 de Abril de 1976 (Consultada em www.
portugal.gov.pt/Portal/PT/Portugal/Sistema_Politico/Constituicao, em Setembro de
2006).
Decreto-Lei n.º 769/76, de 23 de Outubro (Regime de gestão dos estabelecimentos de
ensino preparatório e secundário).
Lei n.º 46, , de 14 de Outubro de 1986 - Lei de Bases do Sistema Educativo.
Decreto-Lei 43/89, de 3 de Fevereiro (Estabelece o “Ordenamento Jurídico da
Autonomia das Escolas do 2º e 3º Ciclos do Ensino Básico e Secundário)
Bibliografia
193
Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de Abril (Estatuto da Carreira Docente).
Decreto-Lei n.º 172/91, de 10 de Maio (Regime de direcção, administração e gestão dos
estabelecimentos de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário).
Despacho 125/ME/96, de 8 de Julho (Prorroga a aplicação experimental do regime
jurídico instituído pelo Decreto-Lei n.º 172/91, de 10 de Maio).
Despacho n.º 147-B/ME/96, de 1 de Agosto (Enquadramento legal de constituição dos
territórios educativos de intervenção prioritária, a partir do ano lectivo 1996/97).
Despacho Normativo 27/97, de 2 de Junho (Medidas que permitem a aplicação de um
novo regime de autonomia, administração e gestão das escolas).
Decreto-Lei n.º 115-A/98, de 4 de Maio (Regime de autonomia administração e gestão
das escolas e agrupamentos de escolas).
Decreto-Lei n.º 6/2001, Diário da Republica II Série A, 18 de Janeiro de 2001.
Despacho Normativo n.º 30/2001, Diário da Republica I Série B, 19 de Julho de 2001.