Performances Interacionais e Mediações Sociotécnicas Salvador - 10 e 11 de outubro de 2013
CONSTRUINDO UMA CARTOGRAFIA DO ACONTECIMENTO JORNALÍSTICO1
BUILDING A JOURNALISTIC OCCURRENCE CARTOGRAPHY
Alciane Nolibos Baccin2
Resumo: O artigo faz reflexões sobre a construção dos acontecimentos jornalísticos, a partir
do avanço das mídias sociais digitais, amparadas na perspectiva metodológica da Cartografia.
Essas reflexões são parte da minha dissertação de mestrado “A Construção do Acontecimento
Jornalístico – Geisy Arruda-Uniban: do vídeo no YouTube à biografia”, do PPG em Ciências
da Comunicação, na Unisinos/RS. Fizeram parte do corpus de análise 960 matérias publicadas
nos portais de notícias G1, R7 e Terra, do dia 22 de outubro de 2009 até o dia 17 de novembro
de 2010. Trago aqui dois dos mapas construídos que contribuem para a análise das
reconfigurações pelas quais passa o fazer jornalístico. O Jornalismo está agora diante da
continuidade e a construção dos acontecimentos jornalísticos em constante transformação.
Palavras-chave: Acontecimento jornalístico, mídias sociais digitais, cartografia.
Abstract: The article propounds reflections on the journalistic happenings construction,
considering the advance of the digital social media, supported by the methodological
perspective of the Cartography. These reflections are part of my masters’ degree dissertation
“The Construction of the Journalistic Occurrence – Arruda, Geisy - Uniban: from YouTube
video until bibliography”, at the Post Graduation Program in Communication Sciences,
Unisinos/RS. Making part of this essay body is the analysis of 960 articles published on news
portals as G1, R7, Terra, from October 22nd
2009 until November 17th
2010. I present here
two from the maps which have contributed for the analysis of the reconfigurations in which
the journalistic process passes. Journalism is now facing of the continuity and the build of
journalistic happenings in constant transformation.
Keywords: Journalistic occurrence, digital social media, cartography.
1 CARTOGRAFANDO O OBJETO DE ESTUDO
Este artigo traz algumas considerações às quais cheguei ao longo da caminhada do
mestrado, concluído em 2012, no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação,
da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), as quais fazem parte da minha
dissertação. Proponho reflexões sobre a construção dos acontecimentos jornalísticos, a partir
1 Artigo submetido ao NT – Sociabilidade, novas tecnologias e práticas colaborativas de produção de conteúdo do
SIMSOCIAL 2013. 2 Doutoranda em Comunicação e Informação, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), mestre
em Ciências da Comunicação pela Unisinos, especialista em Comunicação Midiática pela UFSM. Jornalista da Emater/RS-Ascar. Email: [email protected]
do avanço das mídias sociais digitais, amparada na perspectiva metodológica da Cartografia.
Esta perspectiva possibilitou-me contemplar as multiplicidades e perceber conexões e nós que
a rede proporciona, além de ser um dos caminhos possíveis para romper com a tradição
limitadora do espírito inventivo e criador do pesquisador.
A ciência contemporânea está aberta às metodologias mais participativas, que
contemplem a experimentação e a subjetividade do pesquisador. Por isso, escrevo este artigo
na primeira pessoa, para deixar nítidas as marcas da subjetividade desta pesquisadora, assim
como os mapas que construí revelam as escolhas que fiz durante o percurso da pesquisa. São
mapas que capturam os pontos de tensões, as várias transformações percorridas no caminho e
as implicações das escolhas e decisões tomadas pelo investigador ao longo dessa estrada,
como destaca Rosário (2008, p. 217) “a construção do mapa, então, não tem receita, é o
espelho do olhar que o cartógrafo foi capaz de produzir”. Para a autora, o cartógrafo é um
experimentador, que se entrega ao caminho percorrido apreciando tudo o que sua percepção
lhe permite, construindo assim o seu mapa, único, singular, conectado as suas experiências,
porém nunca completo e acabado. É esse compartilhamento da experiência do investigador
que enriquece a pesquisa e, é por meio desse reconhecimento da subjetividade, que a ciência
contemporânea caminha.
A Cartografia abarcar toda a complexidade do objeto e os movimentos do processo
comunicacional, que, com o surgimento das tecnologias digitais e a comunicação em rede,
ficou ainda mais complexo. A internet está presente no cotidiano social, como mediadora de
grande parte das interações ocorridas atualmente. Segundo Manuel Castells (2003, p.8), “a
internet é um meio de comunicação que permite, pela primeira vez, a comunicação de muitos
com muitos, num momento escolhido, em escala global.” Comparada com as mídias
tradicionais (rádio, TV, impressos), a internet possibilita aos usuários uma interatividade até
então inexistente. Não existe uma linearidade na navegação, nem no acesso a informações via
internet. De acordo com Lúcia Santaella, “ao final de cada página ou tela, é preciso escolher
para onde seguir. É o usuário que determina qual informação deve ser vista, em que sequência
ela deve ser vista e por quanto tempo.” (SANTAELLA, 2004, p.52).
Mudam as formas de ver a produção de conteúdo, pois, a produção das mídias
tradicionais e do webjornalismo passa agora também pelas mídias sociais digitais, como os
blogs, twitter, e sites de compartilhamento de vídeo como o YouTube, sendo estes relevantes
na construção de sentido. Essa nova forma de produção traz também uma nova maneira de ver
e entender o acontecimento em sociedade. Os usuários têm a possibilidade, além de selecionar
as informações dos acontecimentos que desejam receber, também de produzir a sua versão
desses acontecimentos. A agenda de notícias, antes determinada essencialmente pelos
jornalistas e organizações de mídia, com a internet passa a ser determinada por um número
cada vez maior de pessoas. A notícia deixa de ser um produto acabado para se tornar “um
produto em constante construção, isso pode ser feito por meio dos comentários e também com
as notícias produzidas pelos usuários” (MALINI e FROSSARD, 2009, pág 8).
Outro fenômeno que é ampliado pela internet, segundo Ramonet (1999, online), é a
multiplicação de informação. Segundo o autor, estamos vivendo um mimetismo midiático,
porque “os diferentes meios de comunicação se auto-estimulam, superexcitam uns aos outros,
multiplicam cada vez mais as ofertas e se deixam arrastar para a superinformação numa
espécie de espiral vertiginosa, inebriante, até a náusea”. Ramonet (1999, online) ainda
sublinha que a internet reforçou esta imbricação, pois em muitos casos “os jornalistas se
repetem, se imitam, se copiam, se correspondem e se misturam a ponto de não constituir mais
do que um único sistema informacional, no seio do qual é cada vez mais árduo distinguir as
especificidades de um meio tomado isoladamente”.
Com a utilização das mídias sociais digitais pelo jornalismo, a maneira como os
acontecimentos emergem na sociedade é reconfigurada. Proponho uma reflexão sobre como
as mídias sociais digitais estão configurando a construção do acontecimento jornalístico,
independente do meio no qual este acontecimento circula. Para isso, foco a minha
investigação no acontecimento Geisy Arruda - estudante de Turismo da Universidade
Bandeirantes (Uniban), de São Bernardo do Campo, no interior paulista, vítima de bullying
por ir à aula com um vestido curto.
O acontecimento bruto a partir do qual investigo a construção do acontecimento
jornalístico é o bullying que a estudante sofreu no dia 22 de outubro de 2009, no prédio da
Uniban. A mobilização de parte da universidade, através de gritos, xingamentos e ameaças de
linchamento foram gravadas por vários estudantes, em equipamentos portáteis, como câmeras
fotográficas e celulares. Essas gravações foram postadas no YouTube e tiveram grande
repercussão, segundo o portal G13, apenas um dos vídeos contabilizava quase 20 mil acessos,
em apenas uma semana. Tomando conhecimento da repercussão dos vídeos, a Uniban vai à
caça desses vídeos e reivindica aos estudantes a retirada. É só então, que a mídia tradicional
conhece o acontecimento, a partir dessa repercussão e dos desdobramentos.
Para analisar o objeto de estudo em questão, utilizo a Cartografia como método, pois
pretendo detectar algumas das multiplicidades das quais o processo de construção de um
acontecimento se ramifica e desdobra-se, por meio da construção de novas paisagens e fluxos,
como se dão essas conexões, territorizalizações e desterritorializações desse processo e
apontar marcas de sua subjetivação. Mas, deixo claro que os movimentos feitos ao longo da
pesquisa são escolhas desta pesquisadora, baseadas nas percepções, naquilo que os sentidos
permitiram captar e na bagagem que trago.
Embora o rizoma não tenha um começo e um fim, o objeto precisou ser delimitado.
Para mapear o percurso, tive como base as variantes da atenção do pesquisador-cartógrafo -
quatro variedades do funcionamento da atenção, apontadas por Kastrup (2007): o rastreio, o
toque, o pouso e o reconhecimento atento, para chegar ao caminho percorrido até ao mapa dos
fluxos e platôs do Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda - Uniban. Como o processo
cartográfico não é linear e contempla as correções de rota (idas e vindas), redefini o contorno
do objeto ao longo da caminhada, focando a análise nos portais de notícias G1, R7 e Terra;
delimitando o corpus em tudo o que foi veiculado nesses portais desde a postagem do vídeo
no YouTube, no dia 22 de outubro de 2009, até o lançamento da biografia da estudante,
“Vestida para Causar”, no dia 17 de novembro de 2010. Os portais de notícias constituem-se
como peças-chave para analisar o processo comunicacional atual e a construção do
acontecimento jornalístico. Muitos são os fluxos que se estabelecem no ambiente
comunicacional multidirecional e compõem uma variedade de paisagens, por isso foram
analisadas 960 matérias publicadas, sendo 221 no portal G1, 536 no R7 e 203 no Terra.
2 CARACTERÍSTICAS DO ACONTECIMENTO JORNALÍSTICO
Parto das características de acontecimento com as quais Quéré (2005) trabalha para
verificar se a agressão à estudante Geisy Arruda, no dia 22 de outubro de 2009, na Uniban,
3 http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1358779-5605,00-
ALUNA+COM+ROUPA+CURTA+PROVOCA+TUMULTO+EM+UNIVERSIDADE+E+VIDEO+CAI+NA+WEB.html. Acessado em 08 de fevereiro de 2012.
pode ser classificada como um acontecimento. Características essas como descontinuidade,
emergência do novo, afetação, poder hermenêutico e campo problemático. Segundo ele, “os
acontecimentos importantes são, em grande parte, inesperados” (2005, p. 61), pois são
descontínuos, excedendo as possibilidades pré-calculadas de ocorrências, e provocam um
rompimento no curso normal das coisas, instaurando uma descontinuidade na vida dos
sujeitos afetados pelo acontecimento. E essa descontinuidade provoca uma surpresa, uma
estranheza sobre o ocorrido, fazendo emergir algo de novo. O Acontecimento Geisy Arruda –
Uniban rompeu com a ordem normal do funcionamento de uma universidade, causando
estranheza que, num ambiente universitário, a liberdade de expressão seja cerceada. A atitude
dos estudantes foi inesperada, provocando uma ruptura na normalidade do ambiente
acadêmico, uma descontinuidade.
Quando o acontecimento emerge como uma descontinuidade instaura o novo, mas
mesmo sendo descontínuo, ele torna compreensíveis acontecimentos passados, incluindo-o
dentro de um contexto. Essa ligação com o passado e o contexto do acontecimento é que o
traz de volta para uma situação de continuidade. Na primeira matéria apresentada pelo
Programa Fantástico, da TV Globo, o Acontecimento em estudo é narrado depois que são
mostradas imagens de outro episódio de agressividade que ocorreu na mesma Universidade
meses antes, com outra aluna4. O “Acontecimento Geisy Arruda – Uniban” revela esse
passado que até então não conhecíamos, situando-se num contexto de continuidade, isso quer
dizer que tudo o que acontece, acontece de acordo com condições necessárias que já existiam
antes dele emergir completamente.
De acordo com Quéré (2005), o acontecimento é aquele que afeta alguém e o nosso
sentido das ocorrências possíveis. O Acontecimento, objeto de estudo, provocou reações a
várias pessoas que assistiram aos vídeos postados pelos estudantes no YouTube. Os vídeos
tiveram grande número de acessos na semana em que ficaram no ar. Os portais G1 e Terra
revelam que na semana em que estiveram no ar, apenas um dos vídeos contabilizava quase 20
mil acessos5. As pessoas que tiveram acesso aos vídeos se dividiram em “a favor ou contra” a
4 http://fantastico.globo.com/Jornalismo/FANT/0,,MUL1363048-15605,00-NAO+RECEBI+PROTECAO
+NEM+SEGURANCA+DIZ+ALUNA+XINGADA.html. Acessado em 23 de julho de 2010. 5 Matéria do G1: http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1359750-5605,00-UNIBAN+
INSTAURA+SINDICANCIA+PARA+APURAR+CASO+DE+ALUNA+COM+ROUPA+CURTA.html. Acessado em 18 de agosto de 2011. Matéria do Terra: http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/ 0,,OI4069618-EI8139,00-Aluna+e+xingada+por+causa+da+roupa+e+deixa+universidade+ escoltada.html. Acessado em 18 de agosto de 2011.
aluna. O Acontecimento também provocou reações em alunos da própria universidade, que
passaram a ter que conviver com as consequências do Acontecimento, como a sindicância
interna, a investigação da Uniban para identificar quem participou e os que colocaram os
vídeos na internet, além de piadas sobre a Universidade em programas humorísticos. A
afetação sofreu a estudante Geisy Arruda, que teve sua vida transformada por conta da
experiência provocada pelo Acontecimento.
Quéré (2005, p. 60) também afirma que o “acontecimento é um fenômeno de ordem
hermenêutica”, ele pede compreensão, não explicação ou narração de alguém, faz com que as
coisas e situações do mundo sejam compreendidas. Para ele, o acontecimento está carregado
de um grande poder de revelação. O Acontecimento em estudo reúne essas características, na
medida em que nos faz compreender a sociedade atual, revelando campos problemáticos
presentes nela, como o machismo, o preconceito de classes e a intolerância com as diferenças.
O “Acontecimento Geisy Arruda – Uniban” tem esse poder de ordem hermenêutica, revela
campos problemáticos, faz emergir o novo, afeta uma multiplicidade de pessoas e apresenta
uma descontinuidade do curso normal das coisas, então posso concluir que ele é realmente um
Acontecimento.
Todas essas características são nós que interligam o acontecimento com o seu contexto
e os seus vários pontos de desdobramentos. As conexões entre os nós/características, as quais
determinam o tumulto na universidade como Acontecimento, podem ser identificadas nas
matérias publicadas nos portais pesquisados. As características, apontadas por Queré, estão
mais explícitas nas matérias veiculadas nas primeiras semanas após o Acontecimento, como
nos revela o exemplo6 abaixo (FIG.1).
6 http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1361871-5605,00-PARA+UNIVERSITARIAS+DE+SP+MI NISSAIA+NAO+COMBINA+COM+SALA+DE+AULA.html
Figura 1 - Exemplo 1 da conexão das características do Acontecimento Jornalístico Geisy
Arruda - Uniban
O exemplo evidencia as conexões entre as características definidas por Queré (2005)
como pertencentes aos acontecimentos. Na FIG. 1 é possível perceber as características
interagindo e se movimentando, fortalecendo o Acontecimento Jornalístico.
Revela campos
problemáticos:
preconceitos –
comportamento
não deve fugir ao
padrão estabelecido
socialmente
Acontecimento
provocou uma
descontinuidade/
ruptura no
cotidiano da
Universidade
Poder
hermenêutico: faz
compreender a
sociedade em que
vivemos
Revela campos
problemáticos:
preconceito e
moralismo
Revela campo
problemático: admite
o papel de submissão
da mulher na
sociedade machista
3 OS FLUXOS E OS PONTOS DE PARADAS/PLATÔS
Analiso agora o fluxo do Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda – Uniban e os
múltiplos pontos de entradas e as possíveis paradas nesta caminhada. A viagem que farei
agora, por entre essa multiplicidade de fluxos que se estabelece num ambiente
comunicacional, necessita da segurança que a Cartografia me proporciona. Ao cartografar este
mapa, apreendo os movimentos do Acontecimento, as multiplicidades do processo, as várias
entradas e saídas que pude com a minha experiência perceber, além dos possíveis pontos de
parada que o caminho me proporciona. Mapeando todo o fluxo, identifiquei alguns platôs que
tensionaram e impulsionaram a construção do Acontecimento Jornalístico. São eles: o
Acontecimento, o vídeo, a questão da justiça, a estética, as estratégias de visibilidade
midiática, o empreendedorismo e a busca pela legitimação.
Para demarcar esse espaço de fluxo que delimitei, represento-o através de uma linha
do tempo (FIG. 2), destacando 33 desdobramentos que apresentaram para esta cartógrafa mais
intensidade. Na construção dessa paisagem identifico os pontos de paradas e os platôs do
Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda – Uniban. Mas quero deixar claro que essa linha do
tempo não representa evolução, mas fluxo, com suas multiplicidades, desdobramentos e
conexões.
Os 33 desdobramentos do Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda – Uniban
selecionados puderam ser agrupados em sete platôs conectados entre si. Cada um desses
platôs é ao mesmo tempo dependente e independente dos demais. Dependente porque faz
parte do fluxo, apresenta conexão com os demais e é parte do contexto do Acontecimento e,
ao mesmo tempo, é independente porque reúne uma série de desdobramentos e informações
que o sustentam. Farei agora uma parada em cada nó/platô analisando a intensidade, as
multiplicidades e as conexões.
ACONTECIMENTO – o Acontecimento Geisy Arruda – Uniban não é o começo do
rizoma, em um rizoma não podemos determinar o seu início. Esse nó representa o ponto que
escolhi para dar início à análise deste recorte do fluxo. O Acontecimento emergiu dentro de
um contexto do qual ele é parte, outros acontecimentos o antecederam e deram vazão para que
ele viesse à tona com grande intensidade. O Acontecimento em questão faz parte de um fluxo
já existente. Em matéria do Fantástico e do portal G17, do dia 1º de novembro de 2009, outro
vídeo é mostrado onde aparece uma estudante de educação física da mesma Universidade
sendo agredida por não querer participar de um protesto em frente à Uniban, meses antes do
Acontecimento Geisy Arruda- Uniban emergir, instalando esse Acontecimento dentro de um
fluxo já existente.
Desse nó que parto, para analisar o fluxo, estão conectados outros nós, desencadeando
uma série de desdobramentos que surgem ao longo do percurso, e que simultaneamente
provocam devires. Em inúmeros pontos do fluxo, as matérias fazem referência ao
Acontecimento, como na matéria do portal R78, publicada praticamente um ano após, dia 15
de outubro de 2010 (FIG. 3).
7 http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1362978-5605,00-NAO+RECEBI+PROTECAO+NEM+
SEGURANCA+DIZ+ESTUDANTE+XINGADA+POR+USAR+VESTIDO+CU.html 8 http://entretenimento.r7.com/famosos-e-tv/noticias/barracos-e-escandalos-levaram-geisy-a-fama-20101015 .html
Figura 1 - Exemplo Platô Acontecimento
VÍDEOS – Embora este nó se forme praticamente ao mesmo tempo que o platô
Acontecimento, ele dá um impulso ao fluxo do Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda –
Uniban, por meio dele vários ‘entres’ proporcionam pontos de fuga no rizoma. É por meio dos
vídeos postados no YouTube que o blog Boteco Sujo constrói o Acontecimento Jornalístico e
que ele se expande via Twitter, portais e mídias tradicionais, alimentando novos
desdobramentos. O blog Boteco Sujo foi o espaço que deu vazão ao fluxo do Acontecimento
Jornalístico após a postagem dos vídeos, a partir de onde iniciaram os comentários via Twitter
e, dos portais que pesquisei, o primeiro que fez referência aos vídeos e ao Acontecimento foi
o R7, na coluna Querido Leitor, de Rosana Hermann9. No texto ela se refere a comentários
que leu “perdidos”, não detalha onde leu esses comentários, mas posta o link de uma matéria
do portal Uol10
, divulgada horas antes, onde buscou as informações. A construção da narração
do Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda – Uniban vai se tecendo, pelas próprias mídias,
por meio do que as outras mídias estão construindo. A narrativa vai se construindo
transmidiática, por meio das mídias sociais digitais (YouTube, blogs, Twitter) e do
webjornalismo.
Figura 2 - Exemplo Platô Vídeo
9 http://noticias.r7.com/blogs/querido-leitor/2009/10/28/unibanquase-estupro-minissaia/. Acessado em 12 de abril 2011. 10 http://virgula.uol.com.br/ver/noticia/inacreditavel/2009/10/28/226552-aluna-da-uniban-ameacada-de-estupro-no-campus-
por-usar-minissaia. Acessado em 24 de fevereiro de 2012.
O platô Vídeos está conectado a vários outros platôs, mas a sua intensidade fica
evidente no início do fluxo. Neste período, do dia 28 de outubro de 2009 até 02 de novembro
de 2009, os portais veicularam 40 matérias, focando a postagem dos vídeos. Foram 19
matérias no G1, 22 no R7 e 09 no portal Terra.
JUSTIÇA – Este é um platô que se movimenta e se manifesta em vários pontos ao
longo do fluxo analisado. O ponto alto desse platô é a expulsão da estudante, de onde partem
vários desdobramentos. No período de tempo, que compreende desde o início dos protestos e
manifestações de apoio à estudante e pedidos de justiça, passando pela expulsão, pela pressão
das autoridades para que a Universidade reavaliasse a expulsão até a reconsideração da
Uniban, foram sete dias. Nesse intervalo de tempo, foram veiculadas 197 matérias nos três
portais, sendo 85 no G1, 63 no R7 e 49 no Terra. Na matéria veiculada no dia 11 de novembro
de 200911
(FIG. 5), do portal Terra, fica evidente que a expulsão gerou outros fatos que deram
continuidade ao fluxo.
11 http://noticias.terra.com.br/mundo/noticias/0,,OI4095907-EI294,00-Universitarios+tiram+a+roupa+em+
Brasilia+em+apoio+a+estudante+da+Uniban.html. Acessado em 10 de fevereiro de 2012.
Figura 3 - Exemplo Platô Justiça
As questões relacionadas à justiça estão presentes não só nos nós que se formam, mas
também nos entres/linhas, servindo de conexão a outros platôs e gerando uma multiplicidade
de desdobramentos e pontos de fuga. Um exemplo dessa linha, identifico na matéria a seguir
(FIG. 6), publicada no portal G1, no dia 12 de novembro de 200912
, na qual a questão da
injustiça que a estudante sofreu, tanto sendo hostilizada pelos demais alunos, quanto expulsa
da universidade, provocou reações em várias pessoas, que num primeiro momento não teriam
nenhuma conexão com o Acontecimento, mas que sentiram-se envolvidas de alguma maneira.
Figura 4 - Exemplo 1 de conexão entre os Platôs Justiça e Estratégia de Visibilidade Midiática
continua...
12 http://g1.globo.com/Noticias/Musica/0,,MUL1375793-7085,00-TUMULTO+NA+UNIBAN+GANHA+AXE +DE+PROTESTO+NO+YOUTUBE.html
... continuação da figura 6
Na matéria a seguir (FIG. 7), assim como na anterior, também do portal G1, do dia 14
de novembro de 200913
, aparece uma conexão do platô Justiça com o platô Estratégia de
Visibilidade Midiática. O presidente da escola de samba Unidos da Porto da Pedra convida a
estudante para desfilar pela escola no carnaval do Rio de Janeiro, num ato contra a
discriminação que a estudante sofreu.
13 http://g1.globo.com/Noticias/Rio/0,,MUL1379487-5606,00-RJ+ESTUDANTE+HOSTILIZADA+NA+
UNIBAN+SERA+CONVIDADA+A+DESFILAR+EM+ESCOLA+DE+S.html
Figura 5 - Exemplo 2 de conexão entre os Platôs Justiça e Estratégia de Visibilidade Midiática
ESTÉTICA – Há multiplicidades de linhas que conectam o platô Estética a outros,
mas, principalmente, ao platô Estratégias de Visibilidade Midiática, tornando a configuração
entre eles tênue. Assim como no rizoma, cada um desses platôs apresenta uma estrutura
indefinida, pois “trata-se do modelo que não para de erigir e se entranhar, e do processo que
não para de se alongar, de romper-se e retornar” (DELEUZE; GUATARRI, 2000, online). A
ruptura no fluxo das intensidades dos platôs é o que determina a continuidade desse fluxo e as
múltiplas linhas que os conectam. Nesta matéria do portal G1 (FIG. 8), veiculada no programa
Fantástico do dia 17 de janeiro de 201014
, fica evidente a linha que mantém a continuidade do
fluxo e a conexão entre os platôs Estética e Estratégias de Visibilidade Midiática. A questão
da estética é utilizada como uma estratégia midiática, realimentando o fluxo do
Acontecimento Jornalístico.
Figura 8 - Exemplo 2 de conexão entre os Platôs Estética e Estratégia de Visibilidade
Midiática
continua...
14 http://g1.globo.com/Carnaval2010/0,,MUL1451429-17812,00-RECAUCHUTADA+GEISY+ARRUDA+ SE+PREPARA+PARA+O+CARNAVAL.html. Acessado em 11 de fevereiro de 2012
... continuação da figura 8
ESTRATÉGIAS DE VISIBILIDADE MIDIÁTICA – Ao analisar o mapa do fluxo do
Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda – Uniban e perceber a intensidade dos platôs e as
tramas que se estabelecem entre eles é possível afirmar que, de tempos em tempos, quando há
uma retração do fluxo o platô Estratégias de Visibilidade Midiática retorna e recoloca o fluxo
em movimento. Esta situação é identificada em vários momentos, como logo após a
reconsideração da expulsão da estudante pela Uniban e o encerramento dos protestos a
estudante começa a participar de programa de TV humorístico como o Casseta e Planeta, na
TV Globo; aproveita o carnaval e as cirurgias plásticas para manter-se na mídia; por dois
meses participa todos os sábados do quadro Vai Dar Namoro, do Programa O Melhor do
Brasil, da Record, selecionando um namorado e na sequência é escolhida para integrar o
grupo de participantes do reality show A Fazenda, também da Record. A participação da
estudante no reality show não durou muito, sendo eliminada na segunda semana, mesmo
assim o ingresso ao programa provocou a veiculação de 33 matérias no portal Terra e de 253
no R7. O G1 não noticiou.
Mesmo depois que a estudante foi eliminada do reality show a Record mantém Geisy
na mídia, realimentando o fluxo e prolongando o platô. Um exemplo dessa iniciativa da
Record é a matéria do portal R7, do dia 06 de novembro de 201015
(FIG. 9), na qual a
estudante assume papel de repórter e vai até o estádio do Pacaembu entrevistar a torcida do
Corinthians.
15 http://esportes.r7.com/futebol/noticias/geisy-arruda-vai-ao-pacaembu-e-brinca-com-a-torcida-do-corinthians-
20111104.html
Figura 96 - Exemplo 1 Platô Estratégia de Visibilidade Midiática
Em outros trechos do percurso, a antecipação de estratégias de visibilidade na mídia
atinge um alto grau de intensidade, configurando-se como platô. No dia 16 de junho de 2010,
o portal Terra antecipa que Geisy está preparando uma biografia16
. Em instantes, o assunto
passa a ser o segundo tema mais comentado no mundo no Twitter. Como o tópico Geisy
16 http://diversao.terra.com.br/gente/noticias/0,,OI4499505-EI13419,00-Autor+de+biografia+de+Geisy+promete
+historias+surpreendentes.html
Arruda atingiu os Trending Topics17
do Twitter, usuários de outros países quiseram saber do
que se tratava, foi quando os brasileiros resolveram inventar que se tratava de uma espécie de
baleia ameaçada de extinção. Os portais R7 e Terra divulgam a brincadeira. A seguir
reproduzo a matéria veiculada no portal R7, do dia 16 de junho de 201018
.
Figura 107 - Exemplo 2 Platô Estratégia de Visibilidade Midiática
EMPREENDEDORISMO – Este platô também apresenta uma forte conexão com o
platô Estratégias de Visibilidade Midiática, ao mesmo tempo em que corresponde a uma
iniciativa empreendedora da estudante também tem um caráter midiático, de manutenção de
Geisy na mídia. Esse platô reacende o fluxo, pois brilha principalmente em dois momentos do
17 Os Trending Topics ou TTs são uma lista em tempo real das frases mais publicadas no Twitter pelo mundo todo. É
possível fazer um filtro por país, alguns estados e cidades. 18 http://entretenimento.r7.com/famosos-e-tv/noticias/geisy-arruda-e-o-segundo-assunto-mais-comentado-no-mundo-pelo-
twitter-20100616.html. Acessado em 10 de fevereiro de 2012.
percurso, quando a participação da estudante no programa Vai Dar Namoro está encerrando e
entre o término do reality show e o lançamento da revista Sexy (com fotos de Geisy nua). O
lançamento da grife de vestidos Rosa Divino, inspirada no vestido que provocou o tumulto na
Uniban, é tema de matéria nos três portais entre os dias 28 e 30 de abril de 2010 e, depois
novamente no lançamento da segunda coleção, no dia 22 de outubro de 2010. Na matéria do
portal Terra, do dia 30 de abril de 201019
, sobre o lançamento da grife é evidente também a
conexão com as estratégias de manutenção da estudante na mídia.
Figura 118 - Exemplo de conexão entre os Platôs Empreendedorismo e Estratégia de
Visibilidade Midiática
continua...
19 http://moda.terra.com.br/noticias/0,,OI4407865-EI1119,00-Vestido+de+Geisy+Arruda+inspira+colecao
+e+vai+para+as+lojas.html. Acessado em 10 de fevereiro de 2012.
... continuação da figura11
BUSCA DE LEGITIMAÇÃO – Esse platô surge como legitimador de todos os
demais, isso não significa que tenha uma importância maior para o fluxo, porque no rizoma
não há hierarquia, mas surge para reforçar e realimentar outros platôs, mantendo a conexão
com e entre todos os nós. O lançamento da biografia Geisy Arruda - Vestida para Causar não
estourou em vendas. O autor da biografia, jornalista Fabiano Rampazzo, compara a história
vivida por Geisy com a de Geni, personagem presente na letra da música de Chico Buarque de
Holanda, “Geni e o Zepelim”. Para ele, Geisy “como Geni, encontra uma sociedade que não
tolera alguém diferente, alguém que fuja ao script dos costumes vigentes e tradicionais”
(RAMPAZZO, 2010, p.15). Na matéria veiculada, no portal Terra, no dia 16 de novembro de
2010 (FIG. 12), o destaque é para a moça humilde que saiu do anonimato, foi hostilizada e
conquistou a fama.
Figura 12 - Exemplo Platô Busca pela Legitimação
A publicação tem como foco a noite de 22 de outubro de 2009, quando Geisy apareceu
na faculdade com um microvestido e foi hostilizada pelos universitários, tendo que voltar para
casa sob escolta policial. Mas aborda também a infância, a família, os relacionamentos
amorosos e até a intimidade sexual. A biografia mantém conexão com todos os demais platôs.
O livro detalha os principais pontos de parada da construção do Acontecimento Jornalístico
Geisy Arruda – Uniban e como a mídia contribuiu para a continuidade do fluxo desde o
começo, evidenciando as linhas que fazem os entrelaçamentos dos nós. Geisy cita várias
vezes a participação da mídia na condução do processo, como é revelado no trecho a seguir:
Na sexta à noite tocou a campainha em casa, ela foi abrir, e era o Fantástico. (...)
Uma coisa é você falar para um jornal, outra coisa é você aparecer no Fantástico, né? (...) E logo depois, quase junto com o Fantástico, que é da Globo, chegou o
repórter da Band, logo em seguida chegou a Record, aquilo virou um sei lá o quê!
(...) Só que a Delma, da Record, queria me levar para a emissora, para eu entrar ao
vivo. Disse que queria me ajudar e que iria me apresentar um advogado. (...) Fui ao
programa do Geraldo Luís, o primeiro programa de TV em que apareci. Conheci o
doutor Nehemias, conversei com ele, contei a minha história. (...) Até que o Geraldo
pediu para ver o vestido (...) - Vamos fazer assim, vamos criar um suspense. A gente
ocupa metade do programa falando do vestido, cadê o vestido, cadê o vestido, cadê
o vestido? Aí, no final, você põe o vestido e a gente segura a audiência.
(RAMPAZZO, 2010, p. 86-87)
A busca pela legitimação e aceitação da sociedade fez com que o Acontecimento
Jornalístico Geisy Arruda – Uniban proporcionasse à estudante mais que os habituais 15
minutos de fama, de quem ganha espaço na mídia por participar de algum escândalo. A
estudante, que ficou conhecida por ter usado um vestido curto rosa na Uniban e ter sido
hostilizada pelos demais alunos, acabou aproveitando a situação para provocar a continuidade
do Acontecimento, produzindo novos fatos que lhe renderam ainda mais visibilidade, assim
como a mídia também construiu essa continuidade. Levando em conta o período de tempo
analisado e o estudo que fiz do fluxo do Acontecimento, mapeando os desdobramentos e
possíveis pontos de paradas e identificando os platôs que se revelam na medida em que o
fluxo segue, desenho o rizoma do Acontecimento Jornalístico em estudo (FIG. 13).
Figura 13 - Mapa-Rizoma do Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda – Uniban
Fonte: Elaboração da autora20
20 Desenho feito pela autora inspirado na imagem do site: http://augustodefranco.locaweb.com.br/
cartas_comments.php?id=333_0_2_0_C
É possível perceber que não existe um começo e muito menos uma linha guia que nos
diga por onde seguir. Cada platô está conectado a outros, seja diretamente ou por meio de
múltiplos pontos, e a ele estão ligados muitas matérias que foram se desdobrando e
representam pontos de fuga no rizoma. Esse desenho não é um decalque do Acontecimento
Jornalístico Geisy Arruda – Uniban, é um mapa que representa o Acontecimento, pois seria
impossível num pequeno espaço de papel representar as 960 matérias reunidas na pesquisa.
As bolas vermelhas representam os platôs; as laranjas, a grande intensidade de dois platôs ou
mais nas matérias, e as bolas amarelas, as matérias/pontos de fuga. Procurei deixar visível que
as questões relacionadas à Justiça e às Estratégias de Visibilidade Midiática contemplaram
mais de 2/3 das matérias pesquisadas, totalizando 678 matérias veiculadas.
A análise do fluxo permitiu que eu tivesse a visão geral do Acontecimento
Jornalístico, identificando onde e como as mídias sociais digitais atuaram e qual a
reconfiguração que essa participação deu ao Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda –
Uniban. Trechos do percurso também revelam que as mídias provocaram muitos dos
desdobramentos, tanto as mídias sociais digitais e o webjornalismo com a repercussão que
deram ao Acontecimento e as mobilizações que suscitaram, quanto a mídia tradicional que a
elevou à condição de celebridade, a partir do momento que a mantém em vários programas
televisivos, provocando uma mudança no estatuto do Acontecimento, pois na medida em que
o fluxo continua a natureza comportamental e jurídica – forte no começo do fluxo – se
transforma na natureza da vida das celebridades.
4 CONSIDERAÇÕES
Deixo claro que os mapas não estão acabados, não são definitivos e nem têm a
pretensão de se mostrarem como únicos caminhos e muito menos de apontar uma conclusão
desta caminhada. Reconhecer as marcas da subjetividade na investigação e exercitar um saber
mais aberto às descobertas foi essencial para a construção do conhecimento. A construção dos
mapas passou por um processo de subjetivação, onde priorizei os pontos de paradas de acordo
com os meus objetivos de pesquisadora-cartógrafa e que para mim revelaram questões
importantes da construção do Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda - Uniban. O objeto de
estudo teve todas as características que o elevam à condição de um acontecimento: afetou a
vida dos sujeitos envolvidos, revelou campos problemáticos, provocou descontinuidade e
ruptura da normalidade, fez referência ao passado e ainda pediu para ser compreendido e nos
fez compreender a sociedade em que vivemos. Como o acontecimento não tem em si mesmo
uma significação já determinada, ele requer a construção de interpretações, esse processo é a
construção do acontecimento jornalístico.
O mapa dos fluxos e das paradas mostrou a participação tanto do público, quanto do
sujeito envolvido - Geisy – e da mídia na configuração do Acontecimento Jornalístico e na
manutenção do fluxo. Os mapas tornaram visível uma mudança na forma com que o público e
as próprias mídias estão produzindo e consumindo informações. O modelo objetivista do
Jornalismo está cedendo espaço para uma cultura mais participativa. E essa é uma demanda
que está partindo do público, que quer cada vez mais participar da construção jornalística.
Mas essa demanda requer mudanças sociais, principalmente na forma como a mídia se
relaciona com o público e vice-versa, e na maneira como as mídias interagem entre si, bem
como Jenkins (2009, p. 52) nos diz, estamos “numa era de longa transição e de transformação
no modo como os meios de comunicação operam” – a era da cultura da convergência.
O Jornalismo está aos poucos seguindo o rastro das mudanças que ocorrem na
sociedade, experimentando e adaptando-se à cultura da convergência, que requer uma
transformação de conteúdo, espaço e tempo. De conteúdo, porque cada vez mais a construção
dos acontecimentos jornalísticos terá a participação do público e das outras mídias; de espaço,
porque em qualquer ambiente, seja ele online ou não, teremos como produzir e consumir
acontecimentos jornalísticos, e de tempo, porque no ambiente da web, não existe mais o
deadline, o texto é atualizado minuto a minuto, ele passa a contar com a colaboração de
muitos atores, que mesmo através dos comentários podem atualizá-lo. O Jornalismo está
diante da continuidade e a construção dos acontecimentos jornalísticos em constante
transformação.
O Acontecimento Jornalístico Geisy Arruda – Uniban nos mostra o quanto a
participação do público foi importante tanto para a divulgação do Acontecimento (via vídeos),
quanto nas mídias sociais digitais para chamar a atenção das demais mídias (webjornalismo e
mídias tradicionais) ao Acontecimento, assim como em muitos outros momentos do fluxo. O
processo linear de produção da notícia (emissor – mensagem – receptor) não se sustenta mais.
O Jornalismo tem muito a aprender com as mídias sociais digitais, onde o consumo da
informação não é visto como o fim da cadeia, mas como um entre, um espaço dinâmico de
possibilidades de inovação e reconstrução.
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