CONTRIBUIÇÃO DE PAULO FREIRE PARA A EDUCAÇÃO NA ENFERMAGEM
ATRAVÉS DO MÉTODO DA PROBLEMATIZAÇÃO
Lorena de Godoi Montes
Uninove
Amanda A. Camargo De Oliveira
Uninove
Resumo: Paulo Freire foi um filósofo e educador, que questionava o modelo de ensino-aprendizagem apresentando pelas escolas tradicionais. Em suas obras se apoia em seis pressupostos, que ele designa como ideia-chave, como liberdade, humanização, conscientização, diálogo, cultura, reflexão crítica e problematização. A partir dessas ideias-chaves, Paulo Freire desenvolveu um modelo pedagógico – Método da Problematização; o qual contrapõe ao ensino tradicional e propõe um ensino diferenciado, pois problematiza a realidade e busca de soluções, possibilitando o desenvolvimento do raciocínio crítico contribuindo para uma melhor formação de profissionais ligados à área da Enfermagem. Por isso, esse artigo tem o objetivo de definir o Método da Problematização, seus princípios e suas finalidades; e como esse modelo pedagógico pode contribuir para a melhor formação dos profissionais da área da Enfermagem. Trata-se de uma pesquisa teórica, realizada através da busca de banco de dados, em livros periódicos, artigos, dissertações de mestrado, teses de doutorado e publicações da Internet.
Palavras-chave: Educação; Método da Problematização; Enfermagem.
Introdução
Paulo Freire é um pernambucano, nascido na capital em 19 de setembro de 1921. Com
os pais, Joaquim Temístocles Freire e Edeltrudes Neves Freire, aprendeu a importância do
diálogo entre as pessoas. Licenciou-se em Direito, porém não exerceu a profissão por opção
pessoal, dedicando-se ao ideal de educação e alfabetização. Na década de 1950, Freire
pensava a educação para adultos, não como mera reposição de conteúdos, mas sugeria uma
pedagogia singular, com a associação de teoria, o vivido, o trabalho, a pedagogia e a política
(Gadotti, 1996).
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Durante a ditadura militar, Freire foi perseguido pelo regime e exilou-se no Chile,
entre os anos de 1964 a 1969, participando ativamente das reformas educacionais naquele
país. Lecionou em Harvard, nos Estados Unidos, seguindo para Genebra, Suíça, completando
16 anos de exílio. Na década de 1970, segundo Feitosa (1999), foi assessor em vários países
da África, países que sofriam com a recente libertação de suas colônias, colaborando com a
implantação de sistemas de educação, em contato direto com a cultura africana.
Neste período, em 1968, que o educador escreveu uma das suas maiores obras, o livro
“Pedagogia do Oprimido”, onde defendeu uma nova relação entre professor, estudante e a
sociedade para a época. Através de uma análise marxista, Freire afirma que o educador deve
ter uma postura revolucionária, conscientizando os estudantes sobre a ideologia opressora
para que estes possam se libertar e modificar a realidade na qual estão inseridos (Rovai,
2013).
Em 1980 retornou ao Brasil, como ele mesmo falava, "com desejo de reaprendê-lo".
Deu sentido a um novo pensamento em contato com o povo brasileiro por intermédio da
classe trabalhadora, com uma concepção de educação popular, consolidou um dos paradigmas
mais ricos da pedagogia contemporânea rompendo radicalmente com a educação elitista e
comprometendo-se verdadeiramente com homens e mulheres. Num contexto de massificação,
de exclusão, de desarticulação da escola com a sociedade, Paulo Freire contribui para a
formação de uma sociedade democrática ao construir um projeto educacional radicalmente
democrático e libertador (Feitosa, 1999).
Através de suas obras, insere em seus questionamentos uma educação multicultural,
ética, libertadora e transformadora. Segundo Miranda e Barroso (2004), o pensamento de
Freire ainda é contemporâneo e inspira a teoria e a prática da educação. Em suas reflexões,
evidencia cuidados com a educação, propondo a humanização das relações e a libertação dos
homens. Ele também falava da educação para uma sociedade que pensa, ouve, sente, se veste
de forma diferente. Mostrava a educação solidária, dialogada, sem arrogância e supremacia do
educador, defendendo a articulação do saber, conhecimento, vivência, comunidade, escola,
meio ambiente, traduzindo-se um trabalho coletivo. Propõe a possibilidade de uma pedagogia
fundamentada na práxis, inserida numa política de esperança, de luta revolucionária, de amor
e de fé no ser humano.
Paulo Freire parte do pressuposto de que o ser humano é histórico, logo está submerso
em condições espaço-temporais, isto é, o homem, estando nessa situação, quanto mais refletir
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de maneira crítica sobre a sua existência, mais poderá influenciar-se e será mais livre. Essa
filosofia se apoia em seis pressupostos que ele designa como ideia-força (Freire, 2000, p. 52-
61).
Das ideias-forças, fundamentadas por Freire, segundo Spínola e Pereira (1976, p. 29)
emergiram alguns conceitos formulados pelo autor, que foram utilizados na educação e
também na área da saúde, dentre elas a Enfermagem, tais como: liberdade, humanização,
conscientização, diálogo, cultura, reflexão crítica e problematização.
A partir dessas ideias-chaves, Paulo Freire desenvolveu um modelo pedagógico -
Método da Problematização.
O modelo pedagógico do Método da Problematização contrapõe ao ensino tradicional
e propõe um ensino diferenciado, pois problematiza a realidade e busca de soluções,
possibilitando o desenvolvimento do raciocínio crítico, contribuindo para uma melhor
formação de profissionais ligados à área da Enfermagem (Franco, 2010).
Apoiado nesse pensamento considera-se ser necessário um modelo de educação em
saúde que propicie a oportunidade de fazer com que os indivíduos busquem, dentro de sua
realidade, alternativas favoráveis às mudanças necessárias. Uma prática que inclua os
indivíduos, aprecie suas capacidades, estimule a procura das causas e analise as suas
implicações com o intuito de ajuda-los a enfrentar os problemas. Um modelo simples, prático,
que valorize a realidade dos indivíduos, suas vivências e experiências, seus saberes e
conhecimentos objetivando o desenvolvimento cognitivo, crítico e autónomo, a fim de
proporcionar uma educação para a saúde assentada e fundamentada em uma política de
confiança e respeito mútuo (Schaurich, 2007).
Nesse contexto, a enfermagem precisa adequar suas práticas de acordo com as rápidas
transformações sociais, trilhar caminhos em busca de processos de educativos
contextualizados, isto é, baseados em uma prática integrada à dinâmica do dia-a-dia das
pessoas, na tentativa de alargar horizontes, promover o intercâmbio de saberes e facultar
mecanismos eficazes de crescimento não só para os indivíduos, como também para os
enfermeiros (Franco, 2010).
Por isso, esse artigo tem como objetivo apresentar qual é o modelo pedagógico do
Método da Problematização descrita por Paulo Freire. Definir o Método da Problematização,
seus princípios e suas possibilidades enquanto caminho para atingir os ideais Freireanos de
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educação. E como esse modelo pedagógico pode contribuir para a melhor formação dos
profissionais da área da Enfermagem.
Trata-se de uma pesquisa teórica, com abordagem quantitativa, utilizando método
dedutivo, de natureza bibliográfica; realizada através da busca de banco de dados GOOGLE,
SCIELO, LILACS, BIREME, MEDILNE, em livros periódicos, artigos, dissertações de
mestrado, teses de doutorado e publicações da Internet.
Método da problematização
A educação é um processo omnilateral, ou seja, a formação da pessoa humana se dá no
todo, em todas as dimensões e no conjunto das relações. Isso faz com que a prática
pedagógica necessite ser vista, através de uma perspectiva que possibilite pensar o homem em
sua totalidade e em sua singularidade. Significa conceber o homem e suas práticas, e dentre
elas a educativa, sem dicotomizá-lo (Kramer, 1993).
Como a educação é um processo dinâmico, contínuo e global, gradativo e cumulativo,
existem condições que facilitam sua realização de forma consistente, que são: maturidade para
aprender, motivação, condições psicossociais e pedagógicas (Campos, 1986).
Atualmente, observar-se os educadores discordando da forma como vem sendo
desenvolvido o processo educativo em nosso país, pois as estratégias utilizadas, através do
ensino tradicional, têm se mostrado ineficientes, comprometendo o resultado final que é a
aprendizagem eficaz (Santos et al., 2006).
O ensino tradicional é centrado no educador e os educandos são “coadjuvantes” do
processo de ensino-aprendizagem. É denominado de educação bancária, uma vez que nesse
tipo de pedagogia, o ensino é o ato de depositar, transferir e transmitir valores e
conhecimentos. O educador é o sujeito do processo e o educando é encarado como mero
objeto depositário, que deve repetir, memorizar mecanicamente, receber, guardar e arquivar as
informações. A educação é vista como doação dos sábios aos que nada sabem. O educador é o
opressor e o educando o oprimido (Santos et al., 2006).
O método tradicional, segundo Freire (1997) compromete a aprendizagem, pois não
permite ao aluno a experiência do debate, a análise dos problemas e o desenvolvimento do
pensamento crítico, impedindo totalmente a participação do educando no processo de ensino.
O aluno é visto como uma página em branco.
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Assim sendo, fica evidenciada a falha pela falta de uma postura reflexiva diante de
possíveis problemas que venham surgir. Apesar disso, de acordo com Santos et al (2006)
ainda é um dos métodos mais difundidos e utilizados.
O método da problematização contrapõe o ensino tradicional e propõe um ensino
diferenciado, pois problematiza a realidade e busca de soluções, possibilitando o
desenvolvimento do raciocínio crítico. Este método encontra muitos dos pressupostos de sua
prática nas correntes filosóficas fenomenológicas e existencialistas. Logo apresenta uma
natureza transformadora, na medida em que problematiza o conhecimento adquirido,
confrontando-o com a realidade, de modo a verificar como esses conhecimentos podem
contribuir para explicar, interpretar ou modificar o mundo que nos cerca, encontrando novas
aplicações em todos os sectores da vida social (Guedes, 2007, p.300).
A problematização tem nos estudos de Freire (1997), a sua origem, enfatizando que os
problemas a serem estudados precisam valer-se de um cenário real. Os problemas obtidos pela
observação da realidade manifestam-se para alunos e professores com todas as suas
contradições, daí o caráter fortemente político do trabalho pedagógico na problematização,
marcado por uma postura crítica de educação.
Supõe que a ação transformadora é inseparável do ato cognoscente e, como ele,
inseparável das situações concretas, mesmo que ocorra sobre os conteúdos já elaborados.
Nesse caso, eles serão referidos ao contexto, pois a problematização parte de situações vividas
e implica um retorno crítico a essas. Por intermédio da problematização, o educador chama os
educandos a refletir sobre a realidade de forma crítica, produzindo conhecimento e cultura em
um mundo e com o mundo (Miranda & Barroso, 2004, p. 634).
Tem sido usado o esquema intitulado Método do Arco, descrito por Berbel, para
ajudar a explicar o Método da Problematização como um processo que privilegia a troca de
conhecimentos, de saberes e de experiências entre os educandos e o educador, considerando
que ambos apresentam uma história individual – coletiva – e um contexto social
compartilhado (Franco, 2010).
O Método da Problematização apresenta cinco etapas. Começa com a observação da
realidade que se caracteriza por uma observação cuidadosa dos problemas colocados pelo
indivíduo, procurando identificar fatores relacionados que possam estar subjacentes. Nesta
fase é feita uma reflexão crítica junto com o sujeito acerca dos problemas levantados para
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posterior problematização. Schaurich (2007) acrescenta e diz “neste momento que se torna
oportuno aos educandos e ao educador lançar um olhar atento e crítico ao vivido”.
A segunda etapa denomina-se ponto-chave, momento de síntese e de definição dos
problemas fundamentais que serão aprofundados junto do indivíduo. É importante questionar
quais as possíveis causas; os determinantes contextuais; os componentes e seus
desdobramentos. Para Santos et al (2006) esse momento é importante para selecionar pontos
essenciais que deverão ser estudados.
Posteriormente, a teorização ocorre após os problemas serem identificados, nesta fase
analisa-os de vários ângulos, à fim de fundamentar as futuras propostas para a resolução dos
problemas. Schaurich (2007) refere que esta fase possibilita um ampliar de horizontes
teóricos, um aprofundar de conhecimentos acerca do problema.
A formulação de hipóteses de solução é a quarta fase, segundo Santos et al (2006), o
momento de encontrar alternativas e elaborar propostas para a resolução dos problemas.
Incentiva-se a participação, visto que na maioria das vezes, é o indivíduo que será responsável
pela implementação das ações futuras. Esta fase tem como premissa a criatividade inerente ao
indivíduo como ser inacabado. Este olhar/agir criativo e reflexivo, propicia aos educandos e
educador uma percepção do problema, de sua génese, de seu entorno e repercussões
individuais e coletivas.
A última etapa do Método da Problematização é a aplicação na realidade prática, esta
etapa se resume na ação que deve ser executada ou encaminhada na prática. Berbel (1998)
refere que as hipóteses são construídas como resultado do estudo e da compreensão
pormenorizada dos problemas.
Portanto, para Berbel (1998), a problematização “constitui uma verdadeira
metodologia, entendida como um conjunto de métodos, técnicas, procedimentos ou atividade
intencionalmente selecionada e organizada em cada etapa, de acordo com natureza do
problema em estudo e as condições gerais dos participantes”. Na educação problematizadora,
busca-se interpretar a realidade voltando-se à criação de espaços contra hegemônicos e
contestatórios que possibilitem crítica, algumas vezes radical, à realidade estudada.
Constatando e conhecendo os problemas, tornamo-nos capazes de intervir na realidade.
Educação na enfermagem através do método da problematização
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Durante muito tempo a saúde foi abordada e fundamentada em um modelo biológico,
centrado na queixa/doença, onde ações curativas predominavam e acabavam por se
transformar em indicadores de medida. O indivíduo era dividido em partes e só era observado
a parte afetada ou a sintomatologia que se associava a uma determinada doença. A educação
para saúde seguia a mesma linha, pois se prendia na transmissão de informações ou
recomendações baseadas no poder técnico, não respeitando a individualidade, a dimensão
social, nem tão pouco os determinantes culturais. O indivíduo não era totalmente envolvido
no processo educativo, sendo obrigado a assumir o papel de objeto, apesar de se tratar de sua
própria vida (Franco, 2010).
No ensino da Enfermagem, considerar como única função educativa a socialização,
apenas dos saberes técnicos relacionados com a política profissional admitida para os
profissionais de saúde deste nível é, provavelmente, correr o risco de sonegar elementos
básicos de compreensão profunda daquelas práticas. Além disso, está desprezando a
totalidade e a complexidade da educação e do próprio exercício profissional, que tem como
critério, menos a hierarquização dentro de um campo profissional e, mais o entendimento da
realidade (princípios, processos e procedimentos) para o desenvolvimento das competências
humanas (Santos et al, 2006).
O ensino baseado na problematização da realidade acredita na educação que conduza o
homem à busca incessante da realidade, ouvindo, perguntando, analisando, investigando,
problematizando, criticando o ensino, na tentativa constante de mudança de atitude.
A relação de dialogicidade é permanentemente defendida, como essência do processo
em que o educador e o educando são sujeitos interlocutores do processo educativo em busca
da “significação e dos significados”. Não é transferência de saber. O educador educa e é
educado no diálogo com o educando (Freire, 1995).
Segundo Santos et al (2006) os oprimidos são estimulados a desvelarem a opressão
através da problematização, comprometendo-se com a transformação da realidade pela ação e
reflexão, fazendo surgir a pedagogia dos homens em processo de libertação permanente e
autêntica. O desrespeito à leitura de mundo do educando revela o gosto elitista, portanto
antidemocrático, do educador que, desta forma, não escutando o educador, com ele não fala.
Nele deposita seus comunicados.
A Teoria da Problematização parte da base, que em um mundo de mudanças rápidas, o
importante não são os conhecimentos ou ideias, nem os comportamentos corretos e fáceis que
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se espera, mas sim o aumento da capacidade do aluno-participante e agente da transformação
social para detectar os problemas reais e buscar para eles soluções originais e criativas. Por
esta razão a capacidade que se deseja desenvolver é a de fazer perguntas, relevantes em
qualquer situação para entendê-las e ser capaz de resolvê-las adequadamente (Franco, 2010).
Em um primeiro momento, o aluno é levado a selecionar um determinado aspecto da
realidade. Quando isto não é possível, os meios audiovisuais, modelos, permitem trazer a
realidade até aos alunos, mas naturalmente, com perdas de informação inerentes a uma
representação do real (Cyrino &Pereira, 2004). Ao observar a realidade, os alunos expressam
suas percepções pessoais, efetuando assim uma primeira leitura sincrética ou ingênua da
realidade.
Em segundo momento ou fase, os alunos separam no que foi observado, o que é
verdadeiramente importante do que é puramente superficial ou contingente. Melhor dizendo,
identificam os pontos chaves do problema ou assunto em questão, as variáveis mais
determinantes da situação. Esta etapa da problematização constitui uma das razões mais
importantes da superioridade desta pedagogia sobre as de transmissão e condicionamento
(Santos et al, 2006).
Em um terceiro momento, os alunos passam à teorização do problema ao se
perguntarem o porquê das coisas observadas. Ainda que o papel do professor seja sempre
importante como estímulo para que os alunos participem ativamente, nesta fase de teorização
sua contribuição é fundamental, pois tarefa de teorizar é sempre difícil e ainda mais quando
não se possui o hábito de fazê-lo em geral, a caso de adultos em treinamento. Trata-se então
do caso de apelar para conhecimentos científicos contidos no dia-a-dia e outras maneiras
simplificadas e de fácil compreensão (Berbel, 1998).
Se a teorização é bem sucedida o aluno chega a “estudar” o problema tão somente em
suas manifestações empíricas ou situacionais, assim como também, os princípios teóricos que
o explicam. Essa etapa de teorização que compreende operações analíticas da inteligência é
altamente enriquecedora e permite o crescimento mental dos alunos (Santos et al, 2006).
Eles passam pelo próprio espaço do domínio das “operações concretas” e isto lhes
confere um poder de generalização e extrapolação considerável. Eis, então, outra razão da
superioridade da pedagogia da problematização sobre a pedagogia tradicional (Freire, 1995).
Confrontada a realidade com sua teorização, o aluno se vê naturalmente movido a uma
quarta fase: a formulação de hipóteses de solução para o problema em estudo. É aqui onde
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deve ser cultivada a originalidade inventiva para que os alunos deixem sua imaginação livre e
se acostumem a pensar de maneira inovadora. Esta etapa deve conduzir o aprendiz a levar a
termo provas de viabilidade e facilidade, confrontando suas hipóteses de solução com os
condicionamentos e limitações da própria realidade. A situação de grupo ajuda a esta
confrontação do ideal e do real. Além disso, o aluno usa a realidade para aprender com ela, ao
mesmo tempo em que se prepara para transformá-la (Santos et al, 2006).
Na última fase o aluno pratica e fixa as soluções que o grupo encontrou como sendo as
mais viáveis e aplicáveis. Aprende a generalizar o aprendido para utilização em situações
diferentes. Através do exercício, aperfeiçoa sua destreza e adquire domínio e competência no
manejo das técnicas associadas â soluções do problema (Santos et al, 2006).
A utilização do método da problematização faz com que o docente em enfermagem
considere a educação para saúde algo indissociável das atividades desenvolvidas no dia-a-dia
profissional; que promova uma educação em saúde voltada para capacitação dos indivíduos,
humanização dos cuidados e valorização da cidadania; que esteja atento e observe se suas
ações estão adequadas a realidade social, económica e cultural dos indivíduos; que tenham
consciência do notório esgotamento das dinâmicas essencialmente curativas que, na maioria
das vezes, tornam-se pouco resolutivas; que realizem um trabalho verdadeiramente de
parceria; e finalmente, que na formação desses técnicos de saúde seja incutido o compromisso
com posturas acolhedoras e de construção da autonomia das pessoas e comunidades (Cyrino
& Pereira, 2004).
Além disto, traz aos alunos mudanças de postura nos níveis individual e social.
Segundo Berbel (1998), quanto ao nível individual destaca-se, que o aluno torna-se
ativo, observador, formulando perguntas, expressando percepções e opiniões, além de ser
motivado por problemas reais. Ocorre, ainda, desenvolvimento das habilidades intelectuais de
observação, análise, compreensão e extrapolação; intercâmbio e cooperação com os demais
membros do grupo; superação de conflitos como ingrediente natural da aprendizagem grupal
e status do professor não diferente do status do aluno.
No que se refere ao nível social, observa-se a formação de indivíduos conhecedores de sua
própria realidade; cooperação na busca de soluções a problemas comuns; elevação do nível
médio de desenvolvimento intelectual dos indivíduos, graças à maior estimulação e desafio
criação ou adaptação de tecnologia viável e culturalmente compatível e, resistência à
dominação por classes e países (Berbel, 1998).
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Considerações Finais
Cyrino e Pereira (2004), discutindo o processo educacional no mundo contemporâneo,
resgata a necessidade de romper com a postura de transmissão de informações, na qual os
alunos assumem o papel de indivíduos passivos, preocupados apenas em recuperar tais
informações quando solicitados. Apropriando-se de conceitos desenvolvidos por Paulo Freire,
ressalta a necessidade de conceber a educação como prática de liberdade, em oposição a uma
educação como prática de dominação.
Ao propor a educação de adultos como prática de liberdade, Paulo Freire (1995)
defende que a educação não pode ser uma prática de depósito de conteúdos apoiada numa
concepção de homens como seres vazios, mas de problematização dos homens em suas
relações com o mundo. Por isso, a educação através do Método da Problematização,
fundamenta-se na relação dialógica entre educador e educando, que possibilita a ambos
aprenderem juntos, por meio de um processo emancipatório.
O Método da Problematização trabalha com a construção de conhecimentos a partir da
vivência de experiências significativas. Apoiada nos processos de aprendizagem por
descoberta, em oposição aos de recepção (em que os conteúdos são oferecidos ao aluno em
sua forma final), os conteúdos de ensino não são oferecidos aos alunos em sua forma acabada,
mas na forma de problemas, cujas relações devem ser descobertas e construídas pelo aluno,
que precisa reorganizar o material, adaptando-o à sua estrutura cognitiva prévia, para
descobrir relações, eis ou conceitos que precisará assimilar (Santos et al, 2006).
Fazendo uma análise comparativa entre a Pedagogia Tradicional a da
Problematização, parece evidente uma nítida superioridade da segunda opção. Sem dúvida,
isto não quer dizer que haja que se rechaçar totalmente a outra opção restante, sobretudo de
algumas de suas aplicações metodológicas. O que não se pode é perder de vista, o objetivo
fundamental da ação educativa, que é desenvolver a personalidade integral do aluno, sua
capacidade de pensar e raciocinar, assim como seus valores e hábitos de responsabilidade e
cooperação (Cyrino & Pereira, 2004).
Isso é o que se almeja para o ensino da Enfermagem, pois na prática é comum
encontrar no cotidiano dos serviços, profissionais executando tarefas e rotinas dicotomizadas
da realidade, sem avaliação ou planejamento do trabalho, desenvolvendo, sempre, as tarefas
ditadas pelos chefes, ou seja, conforme dito anteriormente, a formação em Enfermagem, ainda
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está centrada na reiteração de gestos, sequências e rotinas rigidamente normatizadas. Daí a
predominância de profissionais submissos, alienados, incapazes de se sobressaírem dentro de
sua própria realidade.
Essa é a razão da necessidade premente de mudança da postura do educador, com a
adoção de alternativas pedagógicas, como a problematização da realidade permite a formação
de alunos e, por conseguinte, profissionais participativos, conscientes e transformadores de
sua realidade. Entendendo-se, assim, que o ato educativo é uma produção humana, e a
realidade deste mundo não está dada, predestinada, pronta ou acabada.
Ao contrário, é um processo em permanente continuação, o que requer de todas as
pessoas e, no caso, do enfermeiro-docente a capacidade, disponibilidade e disposição para
construir e reconstruir permanentemente essa realidade.
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