Orientador: Professora Doutora Maria Manuela Serra de Carvalho Pereira Alves Ferreira
Maria Daniela Cerqueira Simões
março, 2013
Projeto/Relatório elaborado com vista à obtenção
do grau de Mestre em Terapia Ocupacional,
na Especialidade de Integração Sensorial
Contributo para a adaptação cultural e linguística da
Sensory Processing Measure (SPM) – forma Sala de Aula
Contributo para a adaptação cultural e linguística da
Sensory Processing Measure (SPM) – forma Sala de Aula
Projeto/Relatório elaborado com vista à obtenção
do grau de Mestre em Terapia Ocupacional,
na Especialidade de Integração Sensorial
Orientador: Professora Doutora Maria Manuela Serra de Carvalho Pereira Alves Ferreira
Maria Daniela Cerqueira Simões
março, 2013
Júri:
Presidente: Professora Doutora Élia Maria Carvalho Pinheiro da Silva Pinto
Professor Coordenador da Escola Superior de Saúde do Alcoitão
Vogais: Professora Doutora Isabel Maria Damas Brás Dias Ferreira
Professor Adjunto da Escola Superior de Saúde do Alcoitão
Professora Doutora Cláudia Regina Pereira Quaresma
Professor Adjunto da Escola Superior de Saúde de Beja do Instituto Politécnico de
Beja
RESUMO
Dada a inexistência de instrumentos de avaliação em Portugal que suportem a
abordagem dos terapeutas ocupacionais com especialização em Integração Sensorial, o
presente estudo pretendeu contribuir para a adaptação cultural e linguística da SPM –
forma Sala de Aula. Este instrumento avalia itens do processamento sensorial, da praxis
e da participação social, permitindo obter uma imagem completa do funcionamento
sensorial da criança na escola. Analisa tanto o impacto dos problemas sensoriais no
desempenho, como a influência das qualidades sensoriais do ambiente no desempenho.
Sendo um instrumento de origem americana, realizou-se uma versão de consenso a
partir de duas traduções independentes para a língua portuguesa já existentes. Seguiu-se
a retroversão, e depois o painel de peritos, constituído por oito terapeutas ocupacionais
que avaliaram a equivalência cultural e linguística. Seguidamente realizou-se o pré-teste
mediante a aplicação do instrumento a 58 educadores de infância e professores, que
preencheram o questionário avaliando crianças dos 5 aos 12 anos, com desenvolvimento
normal. Os resultados quantitativos e qualitativos obtidos comprovaram que o estudo
atingiu o objetivo proposto. Os peritos apresentaram sugestões e, consequentemente,
introduziram-se alterações na tradução que mantiveram o significado dos itens. No pré-
teste, a linguagem utilizada foi considerada clara, não existiram dificuldades
significativas no preenchimento dos itens e não se procedeu a alterações, obtendo-se,
assim, a versão final traduzida. Este instrumento traduzido para a cultura portuguesa é
uma mais-valia para os terapeutas ocupacionais desenvolverem a sua prática clínica
com maior rigor e realizarem investigação que contribua para o reconhecimento da
profissão e da Integração Sensorial.
Palavras-chave
Avaliação em Terapia Ocupacional, Instrumentos de avaliação em Integração Sensorial,
Processamento Sensorial, Contexto escolar, Adaptação cultural e linguística de
instrumentos
ABSTRACT
Given the lack of assessment instruments in Portugal supporting the approach of
occupational therapists with a specialization in Sensory Integration, this study intends to
contribute to the cultural and linguistic adaptation of the SPM – Main Classroom form.
This instrument assesses items of sensory processing, praxis and social participation,
allowing for a complete perspective of the child's sensory functioning at school. It
analyzes both the impact of sensory problems in performance, as the influence of
sensory qualities of the environment in performance. Being an instrument of american
origin, there was a consensus version made from two existing independent portuguese
translations. The process was followed by retroversion, and then the panel of expert,
composed by eight occupational therapists, who evaluated the cultural and linguistic
equivalence. Then we carried out the pre-test by applying the instrument to 58 educators
and teachers who filled out a questionnaire assessing children from 5 to 12 years, with
normal development. The quantitative and qualitative results obtained proved that the
study achieved the objective. The experts presented suggestions and, consequently,
changes were introduced in the translation that maintained the meaning of the items. In
the pre-test, the language used was considered clear, there were no significant
difficulties in filling the items, and no changes were needed, obtaining thereby the final
translation. This instrument translated into portuguese culture is a valuable asset for
occupational therapists to develop their clinical practice with greater rigor and carry out
research contributing to the recognition of the profession and Sensory Integration.
Keywords
Occupational Therapy Evaluation, Assessment instruments in Sensory Integration,
Sensory Processing, School Context, Cultural and linguistic adaptation of instruments
5
INTRODUÇÃO
Na prática clínica, o terapeuta ocupacional inicia o seu processo através da
avaliação do cliente. É uma etapa extremamente importante, pois os seus resultados
determinam a definição dos objetivos, das abordagens e das estratégias de intervenção,
tendo por base as melhores práticas e a evidência científica (American Occupational
Therapy Association, 2008).
A avaliação especializada em Integração Sensorial, à semelhança do que sucede
em todas as outras áreas da Terapia Ocupacional, implica uma abordagem multifacetada
que não se limita a analisar a participação ocupacional da criança, mas que envolve
também uma compreensão da sua família e dos seus contextos (Bundy, 2002; Parham &
Mailloux, 2005).
Começa pela elaboração do perfil ocupacional da criança, que engloba
informações como: as razões para a avaliação, o que é que a criança quer e precisa
fazer, as expectativas da família, a participação atual nas áreas de ocupação mais
significativas para a criança e para a família, os contextos ou os ambientes que suportam
ou inibem a participação em ocupações desejadas, a história ocupacional e as
experiências passadas (American Occupational Therapy Association, 2008; Stewart,
2005).
Depois de identificados os principais problemas, necessidades e prioridades,
segue-se a análise do desempenho ocupacional. Nesta etapa, o terapeuta ocupacional
avalia e interpreta a interação dinâmica e complexa entre as competências de
desempenho, os padrões de desempenho, os contextos e ambientes, os requisitos da
atividade e os fatores inerentes à criança, que estão a afetar a sua participação
(American Occupational Therapy Association, 2008; Stewart, 2005).
Segundo a literatura existente, uma grande variedade de métodos e de
instrumentos de avaliação são necessários para o terapeuta ocupacional poder avaliar se
uma criança tem uma Disfunção de Integração Sensorial e, em caso afirmativo, para
saber qual a natureza do problema e que tipo de intervenção deve ser recomendado
(Ayres, 2005; Bundy, 2002; Parham & Mailloux, 2005).
Deste modo, a compreensão holística da participação ocupacional e do
funcionamento sensorial da criança, através dos diferentes contextos, coloca ao
terapeuta ocupacional o desafio de selecionar os métodos de avaliação mais apropriados
6
(entrevistas, questionários, inventários, observações informais, observações clínicas
estruturadas e não-estruturadas, testes estandardizados), através de diversas fontes de
informação (por exemplo, a criança, os pais, os professores, outros familiares) (Fawcett,
2007; Parham & Mailloux, 2005; Stewart, 2005).
Gradualmente, os terapeutas ocupacionais têm vindo a ser encorajados a utilizar
cada vez mais instrumentos de avaliação validados e padronizados na sua prática
clínica. Vários autores referem que, sem eles, não é possível avaliar com precisão,
objetivar a tomada de decisão que orienta a intervenção terapêutica, provar a eficácia de
intervenções ou tratamentos, estabelecer comunicação entre profissionais, ou mesmo
reclamar credibilidade científica para a profissão (de Clive-Lowe, 1996; Fawcett, 2007).
Em Portugal, os terapeutas ocupacionais especializados que desenvolvem o seu
trabalho na área da Integração Sensorial utilizam como métodos de avaliação a
entrevista (a pais, familiares, professores e à criança), as observações informais e as
observações clínicas estruturadas e não-estruturadas, não dispondo contudo de
instrumentos padronizados de origem portuguesa ou validados de outra cultura. Assume
assim extrema relevância a realização de estudos de tradução e validação de
instrumentos de avaliação em Integração Sensorial para a realidade portuguesa, através
da aplicação cuidadosa de metodologias de investigação.
Um dos instrumentos de avaliação em Integração Sensorial, desenvolvido nos
Estados Unidos da América com base nos pressupostos da Teoria de Integração
Sensorial de Jean Ayres e que tem também como referência a Classificação
Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) e o Enquadramento da
Prática da Terapia Ocupacional, é a Sensory Processing Measure (SPM).
Este instrumento é um sistema integrado de escalas de avaliação que avalia itens
do processamento sensorial, da praxis e da participação social, permitindo obter uma
imagem única e completa do funcionamento sensorial da criança em casa, na sala de
aula e nos ambientes escolares. Destina-se a dar suporte na identificação e no tratamento
de crianças com dificuldades de processamento sensorial, podendo ser usado como um
instrumento de despiste ou como um componente da avaliação diagnóstica (Parham,
Ecker, Miller-Kuhaneck, Henry & Glennon, 2007).
O conceito de processamento sensorial refere-se ao processo neurológico que
envolve o registo, a modulação e a integração das informações sensoriais táteis,
propriocetivas, vestibulares, visuais e auditivas (Ayres, 1972; Ayres, 2005; Schaaf &
7
Miller, 2005). Segundo a Teoria de Integração Sensorial, o processamento sensorial
eficiente é essencial para o envolvimento da criança em ocupações significativas,
estando diretamente relacionado com a capacidade para aprender e para modular o
comportamento, bem como, para interagir de forma adaptativa com o ambiente. Assim
sendo, a capacidade da criança processar e integrar a informação sensorial é
determinante no seu desenvolvimento e na sua participação ao nível das atividades da
vida diária, do brincar, do lazer, da participação social e da educação (Ayres, 2005;
Bundy, Shia, Qi & Miller, 2007; Cosbey, Johnston & Dunn, 2010; Schaaf & Miller,
2005; Schaaf & Nightlinger, 2007).
Dificuldades ao nível do processamento sensorial podem estar associadas a
dificuldades na praxis, assim como, na participação social da criança na comunidade,
em família, ou com os amigos (Parham et at, 2007).
A praxis pode ser definida como a capacidade de ideação, de planeamento e de
execução de movimentos novos ou pouco habituais. É uma função cognitiva de nível
superior que depende da integração de múltiplos sistemas sensoriais, particularmente do
processamento tátil e propriocetivo. Dificuldades ao nível da praxis originam
dificuldades no brincar, na prática de atividades desportivas, na organização do tempo e
do espaço e na capacidade de resolução de problemas, entre outras (Hepburn & Rogers,
2005; Parham & Mailloux, 2005; Parham et at, 2007).
A participação social relaciona-se com a capacidade de envolvimento da criança
em atividades sociais, tendo em conta aspetos como a interação social, o
estabelecimento de relações interpessoais, a comunicação verbal e a comunicação não-
verbal. Em algumas crianças, estas dificuldades podem estar associadas a questões de
processamento sensorial (por exemplo, dificuldades de modulação ou de procura
sensorial) (Cosbey, Johnston & Dunn, 2010; Parham et at, 2007).
Pelo exposto, na avaliação e na interpretação das dificuldades de praxis e de
participação social é fundamental ter em consideração as funções sensoriais. Por outro
lado, devem considerar-se também os fatores médicos, desenvolvimentais, cognitivos e
ambientais que poderão estar igualmente a influenciar o funcionamento da criança
(Parham et at, 2007).
A SPM surgiu da união de dois instrumentos de avaliação em Integração
Sensorial, a School Assessment of Sensory Integration e a Evaluation of Sensory
Processing (Miller-Kuhaneck, Henry, Glennon & Mu, 2007; Parham & Ecker, 2002;
8
Parham et at, 2007). Estes dois testes foram reunidos pela Western Psychological
Services (Parham et at, 2007).
A SPM é constituída por três formas - a forma Casa, a forma Sala de Aula e a
forma Ambientes Escolares (que inclui a Aula de Artes, a Aula de Música, a Aula de
Educação Física, o Intervalo/Recreio, o Refeitório e o Autocarro escolar). Estas formas
facultam informações essenciais acerca do funcionamento sensorial da criança, em três
contextos que fazem parte do seu dia a dia e que apresentam fatores ambientais distintos
(Parham et at, 2007). Estes dados assumem especial relevância num momento em que
tanta importância se atribui à compreensão da participação e do envolvimento da
criança em ocupações, nos vários contextos de vida, através da análise das interações
entre as funções e estruturas do corpo, a atividade e participação e os fatores ambientais,
que são determinantes da saúde (World Health Organization, 2001).
A SPM foi desenvolvida para avaliar crianças dos 5 aos 12 anos de idade, que
estejam a frequentar entre o jardim de infância e o 6º ano de escolaridade. Cada uma das
formas consiste num conjunto de escalas, cujos itens são avaliados em termos da
frequência do comportamento, através de uma escala de Likert, com quatro pontos. As
opções de resposta são: nunca, ocasionalmente, frequentemente e sempre (Parham et at,
2007).
A SPM tem como objetivos identificar os conceitos sensoriais, tanto os sistemas
sensoriais como as dificuldades de processamento sensorial e determinar se as
dificuldades de integração sensorial influenciam o comportamento e o desempenho da
criança na escola, em casa e na comunidade escolar. Pretende também analisar se
existem diferenças entre os diferentes ambientes e se as qualidades sensoriais do
ambiente influenciam o funcionamento da criança (Miller-Kuhaneck et al, 2007;
Parham et at, 2007).
A interpretação dos resultados da SPM possibilita ao terapeuta ocupacional o
planeamento da intervenção terapêutica, adaptada às necessidades e pontos fortes da
criança, da sua família e da escola, considerando as características únicas dos diferentes
ambientes. Facilita ainda o trabalho em equipa e a partilha de informação e de
estratégias entre a escola, a família e os técnicos que intervêm com a criança (Parham et
at, 2007).
A SPM (forma Casa e forma Sala de Aula) é constituída por oito subescalas, das
quais seis são relativas aos sistemas sensoriais - Visão, Audição, Tato, Paladar e Olfato,
9
Proprioceção (Consciência do Corpo) e Vestibular (Equilíbrio e Movimento) - e duas
referem-se a funções de integração de nível superior – a Praxis (Planeamento e Ideias) e
a Participação Social (Parham et at, 2007).
A visão, a audição, o paladar, o olfato e o tato são os cinco sistemas sensoriais
que comummente todas as pessoas conhecem. Porém, segundo os princípios da Teoria
de Integração Sensorial, os sistemas sensoriais mais primitivos e essenciais para o
desenvolvimento normal desde o período pré-natal são o tato, a proprioceção e o
sistema vestibular. O tato apresenta simultaneamente funções protetivas e
discriminativas. As informações provenientes dos seus recetores localizados na pele são
fundamentais para o planeamento motor, as competências de motricidade fina, a praxis
oral, o esquema corporal, a perceção visual, a segurança emocional, a organização do
comportamento e o desenvolvimento de competências sociais. A proprioceção, através
dos seus recetores situados nos músculos, articulações, ligamentos e tendões informa
acerca da posição e do movimento dos diferentes segmentos do corpo no espaço, sendo
responsável pela graduação da força e fluidez do movimento. Em interação com outros
sistemas sensoriais contribui para a consciência corporal, o tónus muscular, o
planeamento motor, a estabilidade postural e a segurança emocional. O sistema
vestibular, situado no ouvido interno, fornece informações constantes e permanentes ao
Sistema Nervoso Central, acerca de como a cabeça e o corpo estão em relação à
gravidade. Tem influência no controlo postural, no tónus muscular, no equilíbrio, na
estabilização dos campos visuais, na coordenação motora bilateral, nos movimentos
antecipatórios, no desenvolvimento da linguagem, no processamento visuo-espacial, na
segurança física e emocional e na regulação do estado de alerta (Ayres, 2005;
Kranowitz, 1998; Lane, 2002; Parham & Mailloux, 2005).
As subescalas da SPM, à exceção do Paladar e Olfato, fornecem valores
normativos padronizados. Após a cotação, o resultado de cada uma, assim como o valor
do Total dos Sistemas Sensoriais, é interpretado como sendo típico, com alguns
problemas ou com disfunção definitiva. Para cada sistema sensorial, os itens de resposta
facultam ainda informações clínicas descritivas acerca das vulnerabilidades de
processamento, incluindo a hiperresponsividade, a hiporresponsividade, os
comportamentos de procura sensorial e os problemas percetivos (Parham et at, 2007).
A hiperresponsividade e a hiporresponsividade representam problemas de
modulação sensorial. A hiperresponsividade caracteriza-se por uma hiperresposta a um
10
estímulo sensorial, considerado normal. A criança pode expressar reações emocionais
excessivas ou medo, comportamentos agressivos, ou evitar determinadas experiências
sensoriais. Em contrapartida, a hiporresponsividade pode estar associada a dificuldades
no registo do input sensorial ou a apatia ou a indiferença a uma experiência sensorial.
Os comportamentos de procura sensorial implicam uma procura intensa de experiências
sensoriais e podem ser consequência da hipo ou da hiperresponsividade a um
determinado sistema sensorial. Por último, os problemas percetivos estão relacionados
com a dificuldade da criança diferenciar um estímulo sensorial de outros ou discriminar
as qualidades (a localização, a intensidade, o tempo, os aspetos espaciais, etc.) de
estímulos sensoriais específicos (Ayres, 2005; Parham & Mailloux, 2005; Parham et at,
2007).
Com a aplicação da SPM - forma Sala de Aula e forma Casa é possível obter o
resultado da Diferença Ambiental, isto é, pode estabelecer-se uma comparação direta
entre os problemas sensoriais da criança em casa e na escola, e perceber em que
contexto a criança poderá apresentar mais dificuldades. Se o avaliador quiser recolher
informações de apenas um dos contextos, estas duas formas podem ser aplicadas
isoladamente (Parham et at, 2007).
A SPM - forma Sala de Aula tem 62 itens e é preenchida pelo professor titular de
turma da criança. Para tal, este deverá ter observado a criança na sala de aula
diariamente no último mês, pois só assim terá conhecimentos suficientes acerca da
criança. Esta forma requer entre 15 a 20 minutos para ser preenchida e cerca de 10
minutos para ser cotada pelo examinador. Para proceder à cotação, existe uma folha de
autocotação para onde são transferidas as respostas, através de uma folha de carbono,
que facilita o cálculo dos resultados (Parham et at, 2007).
A avaliação do contexto escolar da criança, em colaboração com a equipa
educativa, é atualmente considerada uma boa prática. Por um lado, o terapeuta
ocupacional pode analisar os fatores contextuais da participação e do funcionamento
sensorial da criança e ter uma maior compreensão acerca do seu desempenho, ajudando
a equipa a perceber os seus problemas. Por outro, os educadores e professores podem
percecionar o papel e o contributo do terapeuta ocupacional na avaliação e no
desenvolvimento de competências de desempenho e de estratégias de intervenção junto
do aluno (Barnes & Turner, 2001; Brown & Dunn, 2010; Case-Smith, 1997; Miller-
Kuhaneck et al, 2007).
11
Em particular, a avaliação do processamento sensorial e das dificuldades de
praxis na escola, permitem que o terapeuta ocupacional possa identificar as causas
subjacentes a determinados comportamentos que influenciam o desempenho escolar e
delinear um plano de intervenção que promova o sucesso educativo da criança, baseado
nas evidências da Teoria de Integração Sensorial (Case-Smith, 1997; Miller-Kuhaneck
et al, 2007).
O estudo normativo e padronizado da SPM foi realizado com uma amostra
demograficamente representativa de 1.051 crianças com desenvolvimento normal, desde
o jardim de infância até ao 6º ano, às quais foi aplicada a forma Casa e a forma Sala de
Aula. Os autores analisaram a fidelidade do instrumento, através da consistência interna
e da estabilidade teste-reteste, tendo verificado ainda os erros-padrão de medição e os
intervalos de confiança. A validade do instrumento também foi comprovada através da
análise da validade de conteúdo, da validade de construção e da validade de critério. Os
resultados obtidos forneceram evidências que suportam a fidelidade e a validade da
SPM (Parham et at, 2007). Este estudo encontra-se devidamente descrito no Dossier
Complementar (Anexo I).
Como já foi referido anteriormente, a existência de instrumentos de avaliação
em Integração Sensorial adaptados à cultura portuguesa são indispensáveis para os
terapeutas ocupacionais poderem desenvolver a sua prática clínica com maior rigor e
fidedignidade, assim como, para realizarem investigação, que contribua para a evidência
científica da Terapia Ocupacional e da Teoria de Integração Sensorial em Portugal.
A utilização de instrumentos estandardizados entre países, que não sejam o da
sua origem, coloca um desafio à comunidade científica: como definir e usar medidas
padronizadas entre países, ultrapassando os problemas metodológicos, de forma a
manter simultaneamente a sensibilidade do instrumento de medição e as características
únicas de cada cultura (Figueiredo & Lemkau, 1980; Hunt, McEwen & McKenna,
1985; Hunt, 1986; Kuyken, Orley, Hudelson & Sartorius, 1994).
A validação cultural de instrumentos previamente desenvolvidos e validados, tal
como acontece no presente estudo, constitui uma boa alternativa à construção de novos
instrumentos de avaliação, pois para além de permitir a comparação intercultural entre
estudos efetuados, é um processo menos complexo e dispendioso, em termos de
recursos de índoles diversas (Ferreira & Rosete, 1994; Ferreira & Marques, 1998; Hunt,
1986). Contudo, o European Research Group on Health Outcomes defende que para um
12
instrumento ter equivalência cultural e ser utilizado em diferentes países, implica que o
processo de tradução e adaptação intercultural englobem a avaliação das equivalências
conceptuais e linguísticas, assim como a avaliação das propriedades psicométricas
(Hutchinson, Bentzen & Konig-Zahn,1997).
A equivalência conceptual diz respeito à relevância e ao significado, noutra
cultura, de um conceito ou dimensão tidos por relevantes na cultura original. A
avaliação da equivalência conceptual deve aferir que o instrumento mede em ambas as
culturas os mesmos conceitos teóricos. A equivalência linguística (ou semântica) está
diretamente relacionada com o processo de tradução e compreende a verificação de que
a construção das perguntas (ou dos itens) mantém significado idêntico ao que tinha na
língua original (Ferreira & Marques, 1998).
A tradução deve ser realizada por dois ou mais tradutores independentes,
bilingues e multiprofissionais ou tradutores oficiais cuja língua-mãe é a da versão a
adaptar. Segue-se a elaboração da versão de consenso a partir das duas traduções. A
versão assim obtida deve ser retrovertida para a língua original por tradutores cuja
língua-mãe seja a da versão original. As duas versões na língua original devem então ser
comparadas. No caso da necessidade de se introduzirem modificações, devem ser
produzidas novas retroversões até se alcançar a equivalência (Ferreira & Marques,
1998).
Em seguida, as versões produzidas são revistas e analisadas por um painel de
peritos que avalia de forma crítica, a aceitabilidade e a compreensibilidade do
instrumento traduzido, garantindo a equivalência conceptual e linguística. De notar,
contudo, que a eliminação de itens pertencentes a conceitos importantes deve ser
acompanhada da edição de novos itens equivalentes para que se atinja a equivalência de
conteúdo e a consistência interna, sem comprometer a liberdade intercultural. O painel
de peritos é responsável pela versão pré-final, encontrando um consenso para as
discrepâncias (Benton, Bombardier, Guillemin & Ferraz, 2000; Ferreira & Marques,
1998).
A versão pré-final é posteriormente sujeita a um pré-teste, que tem como
objetivo produzir uma versão final do instrumento que seja clara e aceitável para todas
as pessoas que o irão utilizar. Nesta etapa, o instrumento traduzido e adaptado é
aplicado, idealmente, a um grupo de 30 a 40 sujeitos para os quais se destina a escala.
Os participantes devem pronunciar-se acerca do significado atribuído aos itens e à
13
escolha da resposta, identificar eventuais dificuldades de interpretação dos itens, e
sugerir possíveis soluções para uma melhor formulação dos mesmos. A informação
recolhida deverá ser compilada e analisada e, se necessário, poderão introduzir-se
modificações no instrumento, de forma a obter a versão final da tradução e adaptação
cultural (Benton et al, 2000).
Após estas etapas estarem concluídas, segue-se o estudo das propriedades
psicométricas do instrumento, que avalia a fidelidade e a validade do instrumento
traduzido e adaptado (Ferreira & Marques, 1998).
Considerando a importância da realização de estudos para a validação de
instrumentos de avaliação em Terapia Ocupacional e em Integração Sensorial em
Portugal e, a inexistência de instrumentos de medida válidos e fidedignos que avaliem o
processamento sensorial de crianças em contexto escolar, o presente estudo tem como
objetivo a adaptação cultural e linguística da Sensory Processing Measure – Main
Classroom Form (SPM – forma Sala de Aula) para a realidade portuguesa.
METODOLOGIA
Para proceder à adaptação cultural e linguística da SPM – forma Sala de Aula,
realizou-se um estudo metodológico, o qual difere de outros métodos de investigação,
pois não inclui todas as etapas do processo da investigação (Fortin, 2009).
Participantes
Neste estudo foram constituídas duas amostras distintas: a amostra referente ao
painel de peritos (amostra I) e a amostra do pré-teste (amostra II).
A amostra I, que integrou o painel de peritos, foi retirada da população de
terapeutas ocupacionais a exercerem em Portugal, com formação especializada na
Teoria de Integração Sensorial (Pós-Graduação em Integração Sensorial, Curso de
Certificação em Integração Sensorial da University of Southern California/Western
Phychologial Services, Mestrado ou Doutoramento) e experiência profissional com
crianças nesta mesma área de intervenção.
14
O método de amostragem utilizado foi não probabilístico, por conveniência. O
facto dos elementos da amostra serem escolhidos por conveniência quer dizer que estes
indivíduos estavam facilmente disponíveis num determinado momento e local, e que
cumpriam os critérios de inclusão (Fortin, 2009). Assim sendo, foram selecionados por
conveniência, devido ao fácil acesso e proximidade aos mesmos, 16 terapeutas
ocupacionais, considerados peritos pelos critérios anteriormente descritos.
Os peritos foram contactados, através de email, com a finalidade de solicitar a sua
participação neste estudo. Dos 16 enviados, apenas oito foram reenviados. Deste modo,
obteve-se uma amostra de oito participantes, que analisaram a equivalência semântica e
cultural do instrumento traduzido relativamente ao instrumento original.
Esta amostra é constituída por terapeutas ocupacionais, com idades compreendidas
entre os 27 e os 49 anos (média=33,5; desvio padrão=7,7), 7 do género feminino e 1 do
género masculino, com número de anos de atividade profissional entre os 5 e os 23 anos
(média=10,4; desvio padrão=6,9) e experiência profissional em Integração Sensorial
entre os 2 e os 18 anos (média=7,4; desvio padrão=6,1). Estes profissionais apresentam
formação especializada na Teoria de Integração Sensorial, nomeadamente um perito
tem doutoramento, três peritos têm a Pós-graduação em Integração Sensorial e o Curso
de Certificação em Integração Sensorial, três peritos têm o Curso de Certificação em
Integração Sensorial, e um perito tem a Pós-graduação em Integração Sensorial. De uma
forma geral, os peritos frequentaram também formações e workshops relevantes na área
da Integração Sensorial.
A população-alvo do pré-teste foi constituída por educadores de infância e
professores do 1º e 2º ciclo, a trabalharem com crianças dos 5 aos 12 anos, com
desenvolvimento normal (crianças a frequentar o Ensino Regular, a tempo inteiro; sem
apoio de Educação Especial ou de terapias; podendo apresentar ligeiras dificuldades
académicas ou de comportamento, de modo a ser uma amostra demograficamente
representativa).
Os participantes no pré-teste foram selecionados através do método de
amostragem não probabilístico, por redes, também denominado de amostragem “em
bola de neve”, o qual pretende recrutar indivíduos por intermédio dos próprios
participantes, apoiando-se nas redes sociais. Para tal, os participantes foram
contactados, pessoalmente ou através de email, pelo investigador, assim como, foi
pedido a estes mesmos participantes e a outros terapeutas e colegas para enviarem o
15
questionário a indivíduos seus conhecidos que cumprissem os critérios de inclusão na
amostra. Dos mais de 100 questionários enviados, a partir dos 40 iniciais, foram
devolvidos 58.
A amostra II, que avaliou a clareza da linguagem e as dificuldades no
preenchimento dos itens, é assim constituída por 13 educadores de infância, 31
professores do 1º ciclo e 14 professores do 2º ciclo do Ensino Regular, com idades
compreendidas entre os 26 e os 62 anos. Maioritariamente, os participantes são do
género feminino (74,1%), com idades compreendidas entre os 26 e os 35 anos (51,8%),
com Licenciatura (91,4%), com experiência profissional igual ou inferior a 10 anos
(43,2%), com experiência profissional com alunos com Necessidades Educativas
Especiais (91,4%), sem Especialização em Educação Especial (81%), e da região Norte
do país (70,7%). No quadro 1 são apresentadas as características da amostra.
Quadro 1: Caracterização sócio-demográfica dos educadores de infância e dos
professores que participaram no pré-teste da SPM – forma Sala de Aula.
N
(N=58)
% Média
(Anos)
Desvio
padrão
Mínimo-Máximo
(Anos)
Género
Feminino 43 74,1
Masculino
15 25,9
Idade 38,7 8,8 26 – 62 26 – 35 30 51,8
36 – 45 14 24,1
46 – 55 12 20,7
56 – 65
2 3,4
Habilitações literárias Bacharelato 3 5,2
Licenciatura 53 91,4
Mestrado
2 3,4
Anos de experiência profissional 14,3 9,1 2 – 35 1-10 25 43,2
11-20 18 31,0
21-30 10 17,2
31-40
5 8,6
Experiência profissional com alunos
com Necessidades Educativas
Especiais
Sim 53 91,4
Não
5 8,6
Especialização em Educação Especial
Sim 11 19,0
Não 47 81,0
16
Os participantes do pré-teste avaliaram 58 crianças com desenvolvimento
normal, dos 5 aos 12 anos de idade, que frequentam o Ensino Regular a tempo inteiro e
que não beneficiam de apoio de terapias ou de Educação Especial. Destas crianças, 13
estão inscritas em jardim de infância, 31 no 1º ciclo e 14 no 2º ciclo de escolaridade. As
características sócio-demográficas das crianças avaliadas no pré-teste encontram-se
descritas no quadro 2.
Quadro 2: Caracterização sócio-demográfica das crianças avaliadas no pré-teste da SPM
– forma Sala de Aula
N
(N=58)
%
Género Feminino 29 50,0
Masculino 29 50,0
Idade
5-6 17 29,3
7-8 15 25,9
9-10 15 25,9
11-12 11 18,9
Escolaridade
Jardim de Infância 13 22,4
1º Ano 6 10,3
2º Ano 9 15,5 3º Ano 8 13,8
4º Ano 8 13,8
5º Ano 7 12,1
6º Ano 7 12,1
Raça/etnia
Branca 55 94,8
Negra 2 3,5
Cigana 1 1,7
Instrumentos de recolha de dados
Inicialmente foi elaborado um documento para o painel de peritos, onde se
apresentou o âmbito do estudo, descreveu brevemente o instrumento e solicitou a sua
participação, explicando para tal os objetivos do painel de peritos e as instruções para o
preenchimento do questionário.
No questionário construído para este efeito, foram apresentadas as instruções e
todos os itens traduzidos da SPM – forma Sala de Aula, seguidos da sua versão original.
Solicitou-se aos peritos para avaliarem a equivalência semântica e cultural do
instrumento traduzido, no sentido de garantir a correspondência de significados, a
concordância gramatical e a adequação das expressões à cultura portuguesa, tendo para
17
isso de expressar o seu grau de acordo, item a item (o instrumento está disponível no
Dossier Complementar, Apêndice I).
Com este instrumento pretendeu-se ter o parecer dos terapeutas ocupacionais
com especialização em Integração Sensorial relativamente à versão traduzida da SPM –
forma Sala de Aula e registar as críticas e sugestões dos mesmos. Foi ainda elaborado
um pequeno questionário para recolher alguns dados sócio-demográficos dos
participantes no painel de peritos.
Na fase de pré-teste foi criado um instrumento destinado a educadores de
infância e professores do 1º e 2º ciclo, composto por três partes distintas (ver Dossier
Complementar, Apêndice II).
Na primeira parte foi descrito o âmbito do estudo, o instrumento de avaliação e
as suas finalidades, o objetivo da realização do pré-teste, e solicitou-se o seu
preenchimento.
Na segunda parte, elaborou-se um breve questionário para recolher alguns dados
sócio-demográficos que caracterizavam os participantes.
Por fim, na terceira parte foi apresentado o questionário no qual constavam todos
os itens da SPM - forma Sala de Aula traduzidos, assim como, três questões de opinião
que surgiam no final de cada subescala, que pretendiam avaliar a clareza, a
compreensão, a relevância cultural e o ajuste das palavras utilizadas na versão traduzida
da SPM - forma Sala de Aula. No final do questionário foi ainda solicitado aos
participantes para apresentarem sugestões que achassem pertinentes. Estas questões
tinham como objetivo obter o parecer dos participantes relativamente aos itens
problemáticos ou que suscitassem dúvidas e recolher propostas e sugestões para uma
melhor formulação dos mesmos.
Procedimentos
O processo de adaptação e validação do instrumento de avaliação SPM – forma
Sala de Aula para a população portuguesa decorreu em várias fases, de acordo com as
normas estipuladas por Ferreira e Marques (1998).
Num primeiro momento, foi solicitada a autorização dos autores para a
realização do presente estudo, através de contacto por email com a Western
Psychological Services.
18
Seguidamente, realizou-se a versão de consenso da SPM – forma Sala de Aula, a
partir de duas traduções independentes para a língua portuguesa já existentes,
elaboradas por terapeutas ocupacionais com especialização em Integração Sensorial,
uma versão realizada pela terapeuta Isabel Ferreira e outra pelos terapeutas Paulo
Fernandes, Patrícia Begedas e Susana Pereira. Para tal, compararam-se e analisaram-se
as duas traduções, e quando existiram divergências entre as traduções, recorreu-se a
consultas em dicionários.
A versão de consenso foi, posteriormente, sujeita a uma retroversão, realizada
por uma pessoa de nacionalidade canadiana, em que a língua materna é o inglês, com
fluência na língua portuguesa. A retroversão foi comparada com a versão original
tendo-se introduzido pequenas alterações.
Após a elaboração do instrumento para o painel de peritos, este foi enviado por
email à amostra de peritos com conhecimentos em Integração Sensorial selecionada,
com o objetivo destes avaliarem a equivalência semântica e cultural do instrumento
traduzido relativamente ao instrumento original.
Não foi solicitada a avaliação da equivalência conceptual do instrumento aos
peritos, dado que os conceitos teóricos base deste questionário, estão devidamente
fundamentados na Teoria de Integração Sensorial de Jean Ayres, na qual os autores têm
vasta experiência profissional e investigação científica desenvolvida (Parham et at,
2007). Assim sendo, não faria sentido que os terapeutas ocupacionais portugueses, com
menos experiência profissional nesta área de intervenção, se fossem pronunciar sobre o
trabalho desenvolvido pelos autores e analisar se a versão traduzida mede ou não aquilo
que se propõe medir. Contudo, considera-se que o instrumento mede em ambas as
culturas os mesmos conceitos teóricos.
A informação obtida nos questionários foi devidamente analisada, tendo sido
construídas várias tabelas para estudo e comparação dos resultados e das sugestões. Para
que as decisões fossem tomadas da forma mais objetiva possível, foi pedido o parecer a
uma das autoras do instrumento Diana Henry (nos itens mais problemáticos), recorreu-
se ao dicionário e tentou-se uniformizar alguns termos com a tradução da SPM – forma
Casa a decorrer em simultâneo, realizada por outra aluna do Mestrado de Terapia
Ocupacional com especialização em Integração Sensorial, da Escola Superior de Saúde
do Alcoitão. A tomada de decisão sobre os resultados do painel de peritos foi realizada
19
em conjunto com a orientadora do estudo e, após várias alterações realizadas, construiu-
se a versão pré-final da SPM – forma Sala de Aula.
Seguiu-se a fase de pré-teste, mediante a aplicação do instrumento a educadores
de infância e professores, de crianças dos 5 aos 12 anos, contactados por email ou
pessoalmente. Os participantes desta amostra preencheram o questionário e
responderam ainda a questões de opinião, onde deram o seu parecer relativamente à
clareza da linguagem e a dificuldades no preenchimento dos itens, assim como tiveram
oportunidade para propor sugestões.
Após a realização do pré-teste, seguiu-se a análise dos questionários, novamente
com o recurso à construção de tabelas, o que facilitou a análise quantitativa e
qualitativa. Os resultados dos itens da SPM – forma Sala de Aula foram cotados
manualmente.
Com base na análise de toda a informação recolhida durante este estudo foi
elaborada a versão final da tradução e adaptação linguística da SPM – forma Sala de
Aula para a língua portuguesa.
Técnicas de Análise dos dados
As características da amostra foram descritas através de estatística descritiva
simples, que tem como objetivo destacar o conjunto dos dados brutos tirados de uma
amostra, de maneira que sejam compreendidos (Fortin, 2009). Para as variáveis com
escalas nominal e ordinal procedeu-se à análise de frequências, enquanto que para as
escalas intervalares analisou-se a média, o desvio padrão, o mínimo e o máximo. A
análise dos dados efetuou-se com o programa estatístico SPSS 19.
Os resultados do painel de peritos e do pré-teste foram analisados através de
estatística descritiva simples (análise quantitativa) e de análise de conteúdo (análise
qualitativa).
Para o tratamento dos dados do painel de peritos, inicialmente construiu-se uma
grelha que reuniu as respostas referentes ao grau de acordo de cada perito, para cada um
dos itens. Pretendia-se calcular as frequências e as percentagens de acordo e perceber
quais os itens que tinham total acordo dos peritos e quais os que seriam posteriormente
analisados em detalhe.
20
Seguiu-se a elaboração de uma outra tabela onde foram colocados todos os itens
que não tiveram 100% de acordo e as respetivas sugestões dos peritos, agrupadas item a
item. Para a interpretação dos dados e para a justificação das tomadas de decisão,
procedeu-se ao tratamento qualitativo das sugestões mencionadas pelos peritos,
utilizando-se a técnica de análise de conteúdo de Bardin (2011). Todas as sugestões
foram minuciosamente analisadas juntamente com a orientadora do estudo, sendo que as
sugestões aceites tiveram como pressuposto os critérios: parecer da autora; frequência da
sugestão; pertinência da sugestão; uniformização da tradução com a versão traduzida da
SPM – forma Casa. Construiu-se então uma terceira tabela na qual constavam os itens,
as respetivas sugestões e a decisão final. Por fim, contabilizou-se a frequência e a
percentagem dos itens alterados e dos itens não alterados, assim como se quantificou a
frequência das várias categorias que motivaram as alterações.
Os dados do pré-teste tiveram similarmente um tratamento quantitativo e, para
tal, calcularam-se as frequências e as percentagens de participantes que consideraram a
linguagem clara (“Sim” e “Não”) e que tiveram dificuldades no preenchimento dos itens
(“Sim” e “Não”).
Relativamente aos participantes que apontaram e especificaram dificuldades no
preenchimento do instrumento e fizeram sugestões, procedeu-se então à análise de
conteúdo.
Construiu-se uma grelha com os itens considerados problemáticos e registaram-
se os motivos especificados pelos participantes no preenchimento dos mesmos, assim
como a frequência de cada justificação apresentada. Em seguida, e tendo em
consideração as sugestões apresentadas, procedeu-se à tomada de decisão para a
elaboração da versão final da SPM – forma Sala de Aula traduzida para a realidade
portuguesa.
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Este estudo metodológico teve dois momentos de recolha de dados distintos,
nomeadamente a realização do painel de peritos, que permitiu analisar a equivalência
cultural e linguística da versão traduzida da SPM - forma Sala de Aula, e a realização do
pré-teste, que possibilitou a avaliação da clareza da linguagem, e de possíveis
dificuldades no preenchimento dos itens.
21
Os resultados do painel de peritos foram, numa primeira instância, analisados
quantitativamente. Esta análise facilitou a clarificação dos dados obtidos e contribuiu
para a tomada de decisão, aquando da análise de conteúdo.
Assim, verificou-se que o número e a percentagem total de itens em que cada
perito concordou sem reservas com a tradução apresentada foi variável, existindo no
entanto, cinco peritos que concordaram totalmente com a tradução em mais de 80% dos
itens (ver quadro 3). Importa também registar que nenhum dos peritos discordou
totalmente e propôs alterações substanciais aos itens traduzidos (consultar os resultados
detalhados no Apêndice III do Dossier Complementar).
Apesar do instrumento ser constituído por 62 itens, contabilizou-se o nome das
oito subescalas e as Instruções, obtendo-se assim um total de 71 itens avaliados pelos
peritos.
Quadro 3: Análise de frequências relativamente ao grau de acordo dos itens traduzidos,
por perito
Grau de acordo dos itens traduzidos
% total acordo
de cada perito 1
(N itens)
2
(N itens)
3
(N itens)
4
(N itens)
Perito 2 65 6
91,5
Perito 6 65 5 1 91,5
Perito 7 61 10 85,9
Perito 5 58 10 3 81,7
Perito 4 57 13 1 80,3
Perito 8 54 17 76,1
Perito 3 53 18 74,6
Perito 1 39 32 54,9
1. Concorda sem reservas. 2. Concorda na generalidade, mas propõe alterações. 3. Discorda na
generalidade e propõe alterações. 4. Discorda totalmente e propõe alterações substanciais.
Numa análise mais detalhada, verificou-se que no total dos 71 itens avaliados,
em 24 itens (33,8%) existiu consenso total dos oito peritos relativamente à tradução
apresentada.
Nos restantes 47 itens (66,2%), alguns peritos concordaram sem reservas com a
tradução, mas outros apresentaram sugestões. Em 30 itens, os peritos estiveram de
acordo com a tradução numa percentagem igual ou superior a 75%, o que significa que,
pelo menos seis dos oito peritos concordaram sem reservas com a tradução. Apenas 11
itens tiveram uma percentagem de acordo dos peritos igual ou inferior a 50%. No
quadro 4 é apresentada uma síntese da análise quantitativa dos 71 itens traduzidos, em
relação ao número de peritos que concordou sem reservas com a tradução apresentada.
22
Quadro 4: Análise de frequências dos itens relativamente ao número de peritos que
concorda sem reservas com a tradução apresentada
De acordo com estes resultados, os 24 itens que reuniram o consenso dos peritos
(100% de acordo) mantiveram-se inalterados, enquanto os restantes 47, para os quais foi
apresentada uma ou mais sugestões, foram analisados qualitativamente.
Para facilitar a interpretação dos dados, as sugestões dos peritos foram
agrupadas item a item e procedeu-se à análise de conteúdo (Bardin, 2011). A tomada de
decisão foi orientada pelos seguintes critérios:
Parecer da autora: foi solicitado à autora Diana Henry a explicação dos itens 17,
42 e 50, e a clarificação do significado da palavra “distress”. A resposta da autora foi
considerada essencial na tomada de decisão em todos os itens em que surgiu a palavra
“distress”, assim como, nos restantes itens para os quais foi clarificado o significado.
Pertinência da sugestão: as sugestões apresentadas pelos peritos foram
consideradas pertinentes e relevantes quando, mesmo não sendo frequentes,
contribuíram para uma melhor construção frásica, para a clarificação da linguagem e da
compreensão e interpretação do item, e para o ajuste das palavras à realidade portuguesa.
Frequência da sugestão: as sugestões aceites foram consideradas frequentes,
quando mencionadas por dois ou mais peritos. É um procedimento quantitativo que se
baseia na hipótese de que uma característica é tanto mais frequentemente citada quanto
mais importante é para o locutor (Quivy & Campenhoudt, 2005).
Uniformizar a tradução com a versão traduzida da SPM – forma Casa: foi
estabelecido contacto com a aluna do Mestrado de Terapia Ocupacional, da Escola
Superior de Saúde do Alcoitão, que está a realizar a adaptação cultural e linguística da
N
peritos
em
acordo
%
peritos
em
acordo
Itens
N itens
(N=71)
% itens
8 100 2, 9, 26, 30, 34, 36, 37, 39, 40, 43, 44, 45, 48, 53, 54, 56, 57, 60, Participação Social, Visão, Audição, Paladar e
Olfato, Equilíbrio e Movimento, Planeamento e Ideias
24 33,8
7 87,5 7, 10, 13, 20, 24, 32, 33, 35, 42, 47, 59, Tato, Consciência Corporal
13 18,3
6 75 3, 5, 6, 8, 12, 15, 16, 21, 22, 29, 38, 41, 46, 51, 52, 58, 61 17 23,9
5 62,5 4, 23, 27, 31, 50, 62 6 8,5
≤4 ≤ 50 1, 11, 14, 17, 18, 19, 25, 28, 49, 55, Instruções 11 15,5
23
SPM – forma Casa, no sentido de se encontrar um consenso para as Instruções e os
nomes das subescalas, que são comuns na forma Sala de Aula e forma Casa.
Tendo em consideração estes quatro critérios na análise qualitativa, 33 itens
foram alterados (70,2%) mas 13 mantiveram a mesma tradução (29,8%), pois apesar de
terem sugestões, estas não foram consideradas pertinentes e o grau de acordo dos peritos
nos referidos itens foi igual ou superior a 75%. Entre os itens alterados, os critérios que
motivaram as alterações variaram em frequência, embora o mais frequente tenha sido a
pertinência da sugestão apresentada. Em alguns itens as alterações foram devidas a mais
do que um critério, pois foram aceites sugestões que se enquadravam em critérios
distintos (ver quadro 5).
Quadro 5: Itens alterados em relação aos critérios definidos para a análise do painel de
peritos.
Seguidamente serão apresentados e discutidos alguns dos itens considerados mais
relevantes na interpretação do parecer dos peritos.
A palavra “distress”, que surge nas Instruções e em mais oito itens do
instrumento (12, 17, 18, 19, 25, 27, 28 e 33), foi alvo de discussão. Na versão de
consenso foi traduzida como “incómodo”, e após o painel de peritos esta tradução teve o
acordo de seis peritos. Dois peritos não concordaram, um por considerar que “distress”
era mais do que incómodo e outro por sugerir que a tradução fosse “angústia/aflição”.
Por ser um termo frequente e bastante significativo no questionário e, ao mesmo tempo,
de difícil tradução, foram solicitados à autora Diana Henry sinónimos desta palavra, que
indicou “troubled” e “upset”. Após a consulta em dicionários e a discussão com vários
terapeutas ocupacionais, optou-se por traduzir a expressão “shows distress” como sendo
Critério(s) Itens alterados N itens alterados
Pertinência da sugestão 4, 8, 10, 13, 15, 16, 22,
31, 35, 46, 51, 62
12
Frequência da sugestão 1, 6, 14, 23, 38, 55 6
Parecer da autora e pertinência da sugestão 17, 19, 27, 28, 41, 50 6
Parecer da autora 12, 25, 33, 42 4
Pertinência da sugestão e frequência da sugestão 11, 49 2
Uniformizar a tradução com a SPM- forma Casa Consciência Corporal 1
Pertinência da sugestão, frequência da sugestão, e
parecer da autora
18 1
Pertinência da sugestão, parecer da autora e
uniformizar a tradução com a SPM – forma Casa
Instruções 1
24
“mostra-se aflito/perturbado” e manter estra tradução nos nove itens em surge esta
expressão. Estes referidos itens pretendem avaliar comportamentos de
hiperresponsividade, nos quais o indivíduo reage defensivamente ou com evitamento a
um input sensorial normal. Muitas vezes, esta resposta é acompanhada de reações
emocionais negativas excessivas e da ativação do sistema nervoso simpático (Ayres,
2005; Parham et at, 2007).
Outro item que foi alterado devido ao parecer da autora foi o item 42 (“Jumps or
stomps on stairs”). Neste item traduzido como “Salta ou bate com os pés nas escadas”
apenas um perito não concordou com a tradução e sugeriu outro sentido para esta
expressão (“Sobe e desce as escadas sempre aos saltos”). A autora explicou que
“stomps” se referia a “heavy walking” e, neste sentido, optou-se pela tradução “Salta ou
anda com pés pesados”. Consequentemente, a tradução do item 41 (“Stomps or slaps
feet on the ground when walking”) também foi alterada para “Anda com “pés pesados”
ou bate com os pés no chão quando anda”, tal como sugeriu igualmente um perito.
O item 50 (“When seated on floor, cannot sit up without support”) traduzido
como “Quando está sentado no chão, não consegue levantar-se sem apoio” teve o
consenso de cinco peritos. Apenas um perito sugeriu que a tradução fosse “Quando está
sentado no chão, não consegue manter-se sem apoio” mas, após o parecer da autora,
considerou-se que esta era a tradução que mantinha o significado original do item e
procedeu-se à alteração.
No item 18 (“Shows distress at loud sounds (slamming door, electric pencil
sharpener, PA announcement, fire drill)”) vários peritos sugeriram alterações distintas
para a tradução dos exemplos. Considerando estas sugestões e o facto de nas escolas
portuguesas não existir o afia elétrico e o sistema interno de som de anúncios, decidiu-se
fazer o ajuste das palavras à realidade portuguesa e colocar como exemplos “bater da
porta, aparelhos elétricos, campainha da escola, alarme de incêndio”. Similarmente, no
item 23 (“Speaks too loud or makes excessive noise during transitions”) dois peritos
sugeriram que se clarificasse o termo “transitions” para a cultura portuguesa, dando
exemplos. Esta sugestão foi aceite, pelo que a tradução do item ficou “Fala muito alto
ou faz excessivo barulho durante as transições (quando muda de atividade ou de
espaço)”.
A tradução do nome das oito subescalas teve o acordo de sete peritos mas um
propôs sugestões para o “Tato” e a “Consciência Corporal”. Estabeleceu-se o consenso
25
com a tradução da SPM – forma Casa e manteve-se o nome de todas as subescalas, à
exceção da “Consciência Corporal” que se alterou para “Consciência do Corpo”.
As alterações realizadas nos restantes itens que não foram aqui descritas
cumpriram como principais objetivos: manter o significado original dos itens (por
exemplo, substituiu-se “Brinca, por vontade própria” por “Brinca, de bom grado”);
clarificar a linguagem e melhorar a compreensão e interpretação dos itens (por exemplo,
substituiu-se “Cai bruscamente, apoia-se na secretária” por “Escorrega, deita-se na
secretária”); ajustar e adequar os conceitos à língua portuguesa e aos termos mais
familiares para os professores (por exemplo, substituiu-se “Trabalha como parte da
equipa” por “Trabalha em equipa”); e melhorar a construção frásica (por exemplo,
substituiu-se “Escorregam-lhe ou deixa cair coisas” por “Deixa escorregar ou cair
coisas”).
Em síntese, após a análise quantitativa e qualitativa do painel de peritos
elaborou-se a versão pré-final do instrumento, na qual 33 itens foram alterados (46,5%) e
38 mantiveram a tradução (53,5%). A Visão foi a subescala com maior percentagem de
itens alterados, e o Planeamento e Ideias com menor (ver quadro 6). A informação
detalhada da análise do painel de peritos e da tomada de decisão está disponível no
Dossier Complementar, Apêndice IV.
Quadro 6: Análise de frequências dos itens alterados e dos itens não alterados após a
tomada de decisão do painel de peritos
N total itens
Itens alterados Itens não alterados
N % N %
Instruções 1 1 100 0 0
Participação Social 11 5 45,5 6 54,5
Visão 8 7 87,5 1 12,5
Audição 8 4 50,0 4 50,0
Tato 9 4 44,4 5 55,6
Paladar e Olfato 5 2 40,0 3 60,0
Consciência do Corpo 8 4 50,0 4 50,0
Equilíbrio e Movimento 10 4 40,0 6 60,0
Planeamento e Ideias 11 2 18,2 9 81,8
Total 71 33 46,5 38 53,5
O segundo momento de recolha de dados deste estudo foi o pré-teste, que
possibilitou a avaliação da clareza da linguagem, e de possíveis dificuldades no
26
preenchimento dos itens do instrumento, assim como, permitiu recolher sugestões
pertinentes.
A análise dos resultados revelou que 100% dos educadores de infância e
professores que participaram no pré-teste consideraram a linguagem clara. Este valor é
bastante significativo, e é indicativo de que o vocabulário utilizado neste instrumento é
acessível para os profissionais que o irão preencher.
Relativamente às dificuldades no preenchimento dos itens, apenas 10 dos 58
participantes referiram ter dificuldades em algumas subescalas do questionário. Nenhum
participante relatou dificuldades no preenchimento dos itens da Visão, da Consciência
do Corpo e do Equilíbrio e Movimento.
Os motivos especificados para justificar as dificuldades de preenchimento foram:
dificuldade na compreensão do item (5, 20); item não observável (6, 7, 8, 10, 21, 29, 30,
33, 34, 35, 36); e dificuldade em responder a questões na negativa (20, 21, 26, 29, 32,
34, 35, 56, 57). É importante realçar que cada um destes itens foi considerado
problemático por um número muito reduzido de participantes (ver quadro 7).
Quadro 7: Subescalas da SPM – forma Sala de Aula e respetivos itens e motivos especificados, em
que os participantes do pré-teste referiram dificuldades no preenchimento
Subescalas Itens Motivo(s) especificado(s) N sujeitos
Participação Social 5 Dificuldade na compreensão do item 1
6 Item não observável 1
7 Item não observável 1
8 Item não observável 1
10 Item não observável
1
Audição 20 Dificuldade na compreensão do item Dificuldade em responder a questões na negativa
1 4
21 Dificuldade em responder a questões na negativa
Item não observável
4
1
Tato 26 Dificuldade em responder a questões na negativa 4
29 Dificuldade em responder a questões na negativa
Item não observável
3
1 30 Item não observável 1
32 Dificuldade em responder a questões na negativa
4
Paladar e Olfato 33 Item não observável 3
34 Dificuldade em responder a questões na negativa
Item não observável
4
1
35 Dificuldade em responder a questões na negativa
Item não observável
4
2 36 Item não observável
1
Planeamento e ideias 56 Dificuldade em responder a questões na negativa 1
57 Dificuldade em responder a questões na negativa 1
27
A dificuldade em responder a questões na negativa foi a justificação mais
frequente, tendo sido mencionada por seis dos 10 participantes que sentiram dificuldades
no preenchimento de algumas subescalas do instrumento. Efetivamente, na versão pré-
final existem 10 itens na forma negativa, nas subescalas Audição (20 e 21), Tato (26, 29
e 32), Paladar e Olfato (34 e 35) e Planeamento e ideias (53, 56 e 57), que exigem
alguma atenção e ponderação para que a resposta dada não seja contrária à pretendida.
Para além dos participantes que expressaram dificuldades no preenchimento dos
itens na forma negativa, verificou-se também que três participantes do pré-teste
interpretaram mal alguns destes itens e, induzidos em erro, escolheram a opção de
resposta inversa. Quando questionados pelo investigador reconheceram o erro, mas
referiram que as expressões na negativa são mais complexas e difíceis de responder.
No manual da SPM os autores relatam que alguns inquiridos podem expressar
confusão no preenchimento dos itens que estão na forma negativa. Sugerem que os
terapeutas expliquem que os itens na negativa se referem à ausência ou ao não
desempenho de um comportamento típico ou normal. Por exemplo, no item 20 (“Não
responde a vozes ou a sons novos”) a opção de resposta Nunca significa que a criança
responde sempre a vozes ou a sons novos, enquanto que a opção de resposta Sempre
indica que a criança nunca responde a vozes ou a sons novos (Parham et at, 2007).
Um reduzido número de participantes do pré-teste, apenas seis, sugeriu que os
itens na negativa fossem substituídos por frases afirmativas, para melhorar a
compreensão dos mesmos e minimizar os erros de resposta. Embora estas justificações
sejam válidas, a percentagem de participantes que fez esta sugestão foi mínima
(aproximadamente 10%). Por outro lado, tendo em consideração as recomendações dos
autores do instrumento relativamente aos itens na negativa, concluiu-se que não seria
necessário nem pertinente modificar estes itens na versão final do instrumento.
Cinco professores de 1º e 2º ciclo referiram ter dificuldades no preenchimento de
alguns itens do questionário nas subescalas Participação Social (6, 7, 8 e 10), Audição
(21), Tato (29 e 30) e Paladar e Olfato (33, 34, 35 e 36), por estes itens não serem
facilmente observáveis no contexto sala de aula. Em nove destes itens, apenas foi
contabilizada uma resposta. Nos restantes dois, nos itens 33 (“Mostra-se
aflito/perturbado com sabores ou cheiros de diferentes comidas”) e 35 (“Não consegue
distinguir odores; não prefere bons cheiros a maus cheiros”) verificaram-se três e duas
respostas dos participantes, respetivamente, de professores de 2º ciclo.
28
Os resultados da fidelidade e da validade da SPM mostram que todos os itens
presentes no questionário são relevantes e passíveis de ser observados pelo professor
(Parham et at, 2007). Apesar deste nem sempre estar presente e acompanhar os alunos
nos intervalos e no refeitório, tal como mencionaram alguns participantes do pré-teste, é
suposto o professor deter um conhecimento alargado dos comportamentos do aluno.
Não obstante este facto, compreende-se que o professor de 2º ciclo tenha menos
conhecimento do aluno relativamente a um professor de 1º ciclo ou a um educador de
infância, por ter menor tempo de contacto e num contexto mais restrito. Por outro lado,
os itens da subescala Paladar e Olfato apenas contribuem para o Total dos Sistemas
Sensoriais, não fornecendo um valor normativo padronizado (Parham et at, 2007).
Apesar de 100% dos participantes do pré-teste terem considerado a linguagem
clara, uma educadora de infância mostrou dificuldade em compreender o significado
dos itens 5 (“Entra nas brincadeiras com os colegas sem interromper o decorrer da
atividade”) e 20 (“Não responde a vozes ou sons novos”). Porém, uma vez que os
restantes participantes não demonstraram dificuldade na compreensão destes itens, e
que a linguagem dos mesmos é acessível e de fácil compreensão, optou-se por não
realizar qualquer alteração na linguagem.
Por fim, dois professores apresentaram mais três sugestões distintas. No sentido
de melhorar a formulação dos itens, foi sugerido que se questionasse uma situação por
item (em alguns itens são questionadas duas situações simultaneamente, e pode
acontecer de a opção de resposta não ser igual para ambas, tornando-se imprecisa), e
que se adaptasse um questionário para jardim de infância, um para o 1º ciclo e outro
para o 2º ciclo. Foi também proposto o aumento do espaçamento nos dados de
identificação do professor e do aluno.
Após a análise das dificuldades no preenchimento dos itens e das sugestões
apresentadas, considerou-se que não existiam fundamentos suficientes para introduzir
modificações no instrumento, obtendo-se assim a versão final da SPM - forma Sala de
Aula, traduzida para a língua portuguesa (ver Dossier Complementar, Apêndice V).
CONCLUSÕES
Este projeto de investigação teve como objetivo contribuir para a adaptação
cultural e linguística da Sensory Processing Measure – Main Classroom Form para a
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realidade portuguesa. Este instrumento pretende avaliar o impacto dos problemas
sensoriais da criança no contexto escolar, assim como, a influência das qualidades
sensoriais do ambiente no desempenho da criança.
Sendo a SPM um instrumento de origem americana, a metodologia utilizada para
a adaptação cultural e linguística cumpriu as normas e os princípios profissionais e
éticos definidos internacionalmente. Através da análise das diferentes etapas que
possibilitaram a elaboração da versão final da SPM – forma Sala de Aula traduzida para
a língua portuguesa, pode afirmar-se que o objetivo do estudo foi alcançado.
A análise quantitativa e qualitativa do parecer dos peritos, culminou com a
introdução de inúmeras alterações no instrumento traduzido, que contribuíram para
garantir a correspondência de significados dos itens, para melhorar a compreensão e a
interpretação dos itens e para adequar as expressões à cultura portuguesa. Os dados
obtidos no pré-teste revelaram que os educadores de infância e professores
consideraram a linguagem do instrumento clara e acessível. Não existiram dificuldades
significativas no preenchimento dos itens, nem fundamentos para proceder a alterações,
tendo-se obtido assim a versão final da tradução.
O estudo teve como principal limitação a dimensão reduzida da amostra I,
devido à fraca adesão dos terapeutas ocupacionais com especialização em Integração
Sensorial, no período de tempo estabelecido para a realização do painel de peritos. Por
este motivo, não é tão representativa da população a que pertence e dificultou, por
vezes, a tomada de decisão. No entanto, não pôs em causa a equivalência linguística e
cultural do instrumento traduzido.
A realização deste estudo pretendeu contribuir para a qualidade e excelência da
prática clínica dos terapeutas ocupacionais portugueses, que não têm disponíveis até ao
momento instrumentos de avaliação em Integração Sensorial suficientemente validados.
Por outro lado, pretendeu valorizar a profissão e a abordagem de Integração Sensorial
em Portugal e incentivar a realização de futuros projetos de investigação nesta área de
intervenção.
Neste sentido, considera-se essencial a aplicação do instrumento a uma amostra
de grandes dimensões, representativa da realidade portuguesa, que permita a análise das
medidas psicométricas da SPM. É também fundamental a realização da adaptação
cultural e linguística da SPM – forma Ambientes Escolares, para que a avaliação da
criança no contexto escolar possa ser ainda mais abrangente.
30
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