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Universidade Federal de Campina Grande
Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 1
ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765
DIALOGISMO E POLIFONIA EM ENUNCIADOS PUBLICITÁRIOS
Lívia Maria Alvarenga de LIMA (UFPB) [email protected]
Valdenice Pereira de LIMA (UFPB)
RESUMO
Entre os vários estudos realizados em Análise de Discurso, uma das temáticas de grande pertinência é a que se propõe à análise do discurso de outrem, ou seja, a presença implícita e/ou explícita da palavra de outrem nos enunciados, entendidos como instâncias dinâmicas e dialógicas mediante as quais interagimos socialmente. Este trabalho objetiva analisar o discurso alheio presente no gênero discursivo propaganda, demonstrando como esse fenômeno enunciativo-discursivo se apresenta no fio do discurso, materializado em enunciados concretos verbovisuais. Utilizamos, como aporte teórico principal, as formulações de Bakhtin/ Volochinov (1999/2002), Brait (2005), Faraco (2003), Fiorin (2006) e Sobral (2009) acerca dos conceitos de dialogismo, polifonia, discurso de outrem e outros conceitos fundamentais para a análise, os quais foram indispensáveis para compreensão e para a identificação dos vários discursos que se entrelaçam no gênero analisado. A pesquisa é de base bibliográfica e documental, e o corpus, composto de cinco propagandas, foi coletado em sites da Internet, no período entre fevereiro e agosto de 2012, e é permeado de discursos políticos e jurídicos. A escolha do gênero se deu pelo fato de a propaganda ser um gênero muito popular que se apresenta nas mais variadas formas e suportes, visto que esse gênero pode aparecer na mídia impressa – jornais, revistas, panfletos etc. – ou eletrônica – cinema, televisão, internet etc. Além disso, a propaganda também é rica na utilização da linguagem não-verbal que proporciona diferentes efeitos de sentidos através das cores, imagens, entre outros. Assim, tem grande poder de captar a atenção do leitor. As análises apontam que a presença do discurso de outrem, nesse gênero, contribui para a formação de variados e múltiplos sentidos, tornando-o cada vez mais criativo e, consequentemente, mais complexo, bem como estabelece diferentes atitudes sociais frente aos discursos reportados. Palavras-chave: Dialogismo. Polifonia. Discurso de outrem.
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INTRODUÇÃO
Neste trabalho, objetivamos analisar o discurso alheio presente no gênero
discursivo propaganda, tendo como enfoque a Teoria da Enunciação que concebe a
linguagem como um fenômeno sócio-histórico-ideológico. A pesquisa é de base
bibliográfica e documental. Para a sua realização, foram coletadas quinze (10)
amostras, das quais cinco (03) foram escolhidas para análise. Essas propagandas foram
retiradas de sites da internet, mas circularam também em outros meios de
comunicação, tais como TV, jornais, revistas etc. A escolha das cinco (05) propagandas
ocorreu, entre outros motivos, pelo contexto de circulação delas, pela
popularidade/reconhecimento dos produtos e, principalmente, por abordarem
discursos distintos. O período para a coleta dos dados aconteceu entre os meses de
fevereiro e agosto de dois mil e doze (2012).
A base teórica adotada é a que se pauta nos trabalhos advindos da Teoria da
Enunciação de Bakhtin/ Volochinov (1999/2002), bem como de outros estudiosos que
se ocuparam com a temática do dialogismo e polifonia, tais como Brait (2005), Faraco
(2003), Fiorin (2006) e Sobral (2009). Fundamentamo-nos, ainda, em trabalhos sobre
gêneros do discurso abordados sob a ótica Bakthin (2003) e Marchuschi (2002) e
algumas considerações a respeito da linguagem da propaganda com Sandmann (2001).
Em um primeiro momento, discorremos acerca dos principais conceitos da
Teoria da Enunciação, tais como linguagem, enunciado e enunciação, dialogismo,
polifonia, discurso de outrem e gêneros do discurso.
Logo em seguida, analisaremos o discurso de outrem no gênero discursivo
propaganda. A escolha do gênero se deu pelo fato de a propaganda ser um gênero
muito popular que se apresenta nas mais variadas formas e suportes, visto que esse
gênero pode aparecer na mídia impressa – jornais, revistas, panfletos etc – ou
eletrônica – cinema, televisão, internet etc. Além disso, a propaganda também é rica
na utilização da linguagem não-verbal que, por sua vez, proporciona diferentes efeitos
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de sentidos através das cores, imagens, dentre outros, e sendo assim, tem grande
poder de captar a atenção do leitor.
1. CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM, ENUNCIAÇÃO E ENUNCIADO
Bakhtin/Volochinov (2002) conceituam a enunciação como um produto da
interação social, quer seja na fala ou em contextos mais amplos de uma determinada
comunidade linguística e ainda acrescentam: “A estrutura da enunciação e da
atividade mental a exprimir são de natureza social.” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2002,
p.22). Portanto, os fatores exteriores são o centro de organização de toda enunciação
e não o psiquismo individualista, conforme defende o subjetivismo individualista.
Para Bakhtin/Volochinov (2002, p.124), “a língua vive e evolui historicamente
na comunicação verbal concreta, não no sistema linguístico abstrato das formas da
língua, nem no psiquismo individual dos falantes.” Portanto, não há como descartar o
contexto extraverbal da enunciação, pois a linguagem, no pensamento bakhtiniano, é
concebida de um ponto de vista histórico, cultural e social, que inclui a comunicação
efetiva e os sujeitos e discursos nela envolvidos.
Sendo a linguagem inteiramente contextual, ela se realiza dentro da
enunciação de natureza social.
A enunciação, compreendida como uma réplica do diálogo social, é a
unidade de base da língua, trata-se de discurso interior (diálogo
consigo mesmo) ou exterior. Ela é de natureza social ideológica. Ela
não existe fora de um contexto social, já que cada locutor tem um
“horizonte social”. (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2002, p.16). (Destaque
dos autores)
Dessa forma, observamos que a língua registra aspectos sociais, assim como
também é determinada pela ideologia, o que reforça seu caráter dialógico, uma vez
que pontos de vista estão sempre em interação. O locutor, em seu horizonte social,
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constrói seu discurso, sua enunciação, que por sua vez é o produto da interação com
outros indivíduos. Sendo de natureza social e histórica, a enunciação relaciona-se a
enunciações passadas e futuras, produzindo e fazendo circular discursos.
Sobral (2009, p.95) afirma que “a enunciação é grosso modo o ato de proferir
um enunciado, de dizer alguma coisa que é sempre endereçada a alguém, com um
dado objetivo”. Nesses termos, a enunciação, quando produzida por alguém, tem o
propósito de ser compreendida. O seu sentido não está no indivíduo, nem na palavra
ou frase, nem no interlocutor, mas no resultado que emerge da interação e é através
dessa que ocorre a enunciação, a inter-relação das vozes e o sentido.
No que diz respeito ao enunciado, unidade real da comunicação, Sobral (2009)
mostra que, para Bakhtin e o Círculo, o enunciado não é apenas a frase ou sequência
de frases nem tampouco se reduz a materialidade do texto. O enunciado emerge da
interação de sujeitos concretos, em situações concretas e é através dele que nós
aprendemos a utilizar a língua e não por meio de dicionários e gramáticas. A frase e a
oração pertencem ao sistema linguístico, enquanto que o enunciado concerne à
unidade do sistema de uso da língua, ou da comunicação discursiva.
Diferentemente das unidades da língua, que são sons, palavras e orações, os
enunciados levam consigo emoções, valores, ideologias etc. Bakhtin (2003) enfatiza
que, diferentemente da frase e da oração, o enunciado requer alternância de sujeitos
no discurso. O enunciado é uma réplica de um diálogo, pois os sujeitos, quando o
produzem, estão participando de um diálogo com outros sujeitos e discursos. E por ser
uma réplica, os enunciados permitem que haja uma resposta ativa por parte do
interlocutor.
1.1 Dialogismo e polifonia
A natureza dialógica da linguagem é um conceito que desempenhou papel
fundamental nas obras de Bakhtin. Barros (In Brait, 2005) mostra que dialogismo e
polifonia são termos, muitas vezes, utilizados como sinônimos nos escritos de Bakhtin.
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A mesma autora diferencia um termo do outro: dialogismo é princípio constitutivo da
linguagem e de todo discurso, a polifonia, por sua vez, caracteriza-se pelas diversas
vozes que constituem um determinado discurso.
O conceito de polifonia é bastante relevante para a elaboração dessa pesquisa,
uma vez que o nosso objetivo primordial é resgatar as diversas vozes presentes no
gênero discursivo propaganda com o fito de mostrar como, mediante esse
procedimento, ocorre a produção de sentidos. São vozes resgatadas do discurso
religioso, político e jurídico, conforme poderá ser visto no próximo capítulo que
contém a análise do corpus dessa pesquisa.
Para Bakhtin, a língua tem a propriedade de ser dialógica, mas essas relações
dialógicas não se reduzem ao diálogo face a face, estendendo-se a qualquer situação
de interação em contextos mais amplos. O diálogo face a face interessa ao Círculo no
sentido de entrecruzamento das múltiplas verdades sociais, a confrontação das mais
diferentes refrações sociais expressas em enunciados.
Faraco (2003) chama a atenção para o fato de que o diálogo face a face é de
caráter intrinsecamente social e por isso não pode ser reduzido ao mero encontro de
dois falantes empíricos isolados, que trocam enunciados ao acaso. Pelo contrário, deve
ser analisado na corrente da interação social que se constitui de seres socialmente
organizados, situados e agindo no quadro de relações socioculturais no interior do qual
manifestam-se relações dialógicas. Bakhtin caracteriza as relações dialógicas como
relações de sentido que se estabelecem entre enunciados ou mesmo no interior
desses, mesmo que seja uma única palavra, mas que seja tomada como signo e se
ouça nela a voz de outro alguém.
As relações dialógicas só acontecem quando entram na esfera do discurso,
transformam-se em enunciados, entendidos não como unidades da língua, mas como
unidades da interação social, que possuem um sujeito socialmente organizado.
Fiorin (2006, p. 19) apresenta o dialogismo como “as relações de sentido que se
estabelecem entre dois enunciados” e estes, por sua vez, não existem fora das
relações dialógicas.
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1.2 O discurso de outrem
Em se tratando do discurso de outrem, foco primordial desse trabalho,
começaremos pela abordagem apresentada por Bakhtin/Volochinov (2002): “O
discurso citado é o discurso no discurso, a enunciação na enunciação, mas é ao mesmo
tempo, um discurso sobre o discurso, uma enunciação sobre a enunciação” (p.144). O
discurso citado é visto pelo falante como a enunciação de outra pessoa. De fato, como
bem mencionam Bakhtin e seu Círculo, um enunciado é sempre marcado por outros
enunciados.
Bakhtin/Volochinov (2002) apresentam duas orientações principais de
transmissão do discurso citado. A primeira orientação é chamada de discurso linear,
que diz respeito à assimilação integral do alheio, mantendo-se, inclusive, a sua
estrutura sintática, de modo que no discurso citado a autenticidade e integridade do
discurso são apreendidas de forma literal. A segunda orientação é chamada de
discurso pictórico. Aqui, estão presentes estilos mais sutis e versáteis que permitem ao
autor demonstrar suas réplicas. O discurso citante tenta desfazer a estrutura fechada e
compacta do discurso citado. Temos ainda uma terceira orientação, em que o discurso
citado é o que domina a organização do enunciado, porém, essa terceira orientação é
mais comum em discursos literários e, por esse motivo, não será explorada aqui.
Brait (2005) acentua que a transmissão do discurso de outrem configura-se, em
Marxismo e filosofia da linguagem, um estudo do discurso não enquanto fala
individual, mas enquanto instância significativa de vozes que circulam socialmente e se
realizam na e pelas interações entres os sujeitos.
Assim como mostra Bakhtin e seu Círculo, existem diferenças essenciais entre a
recepção ativa da enunciação de outrem e sua transmissão no interior de um contexto.
Toda transmissão tem um fim específico e sempre leva em conta uma terceira pessoa,
a qual reforça a influência das forças sociais sobre o modo de apreensão do discurso.
A esse respeito, Bakhtin/Volochinov (2002) afirmam:
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A língua não é o reflexo das hesitações subjetivo-psicológicos, mas
das relações sociais estáveis dos falantes. Conforme a língua,
conforme a época ou os grupos sociais, conforme o contexto
apresente tal ou qual objetivo específico, vê-se dominar ora uma
forma, ora outra, ora uma variante, ora outra
(BAKTHIN/VOLOCHINOV, 2002, p.147).
Nesse sentido, uma mesma enunciação, um mesmo discurso pode ganhar
significados diferentes dependendo do contexto e da época em que o falante se
encontra. O falante se constrói através da interação social e não de maneira isolada, já
que para Bakhtin, a língua transcende as formas cristalizadas e antigas, configurando-
se como um sistema evolutivo. Na transmissão do discurso de outrem, devem-se
analisar as diferentes atitudes sociais frentes aos diversos discursos e ver como elas se
expressam nos modos de reportar esses discursos, lembrando que, como afirma
Faraco (2003), há hierarquias que precisam ser consideradas; é importante ver a
posição que o discurso a ser reportado ocupa nessa hierarquia, pois ela interfere no
modo de transmissão do discurso.
Bakhtin/Volochinov (2002) dizem que “Aquele que apreende a enunciação de
outrem não é um ser privado da palavra, mas ao contrário, um ser cheio de palavras
interiores.” (p.147). Ou seja, toda a atividade mental do falante é mediada pelo
discurso interior e é através disso que ocorre a junção com o discurso que é
apreendido do exterior. É no discurso interior que se efetua a apreensão do discurso
de outrem.
Faraco (2003) diz que o discurso reportado é o fenômeno linguístico mais
discutido nos textos de Bakhtin e Volochinov. Para Faraco (2003 p.124),
[...] reportar não é fundamentalmente reproduzir, repetir; é
principalmente estabelecer uma relação ativa entre o discurso
que reporta e o discurso reportado; uma interação dinâmica
entre essas duas dimensões.
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Nesses termos, o discurso reportado não se limita a meras citações, mas, pelo
contrário, relaciona-se à apreensão do discurso de outrem conforme já foi mencionado
anteriormente. Entre o discurso citante e o discurso citado ou reportante e reportado,
deve haver uma relação dialógica, uma vez que eles só se formam e vivem através
dessa inter-relação e não de maneira isolada.
1.3 O gênero propaganda
Antes de falarmos do gênero propaganda, é importante mostrarmos os
conceitos que Bakhtin (2003) e Marcuschi (2002) apresentam sobre gêneros
discursivos/textuais.
Na Antiguidade, estudavam-se apenas os gêneros centrados no âmbito da
literatura, mas, com o passar dos tempos, os gêneros do discurso foram ganhando
mais ênfase, desde as breves réplicas do diálogo até gêneros mais complexos como os
documentos oficiais.
Bakhtin (2003) denominou os gêneros do discurso como “tipos relativamente
estáveis de enunciados” (p.262). Essa denominação se dá pelo fato de os gêneros do
discurso apresentarem três elementos em sua estrutura definida: conteúdo temático,
estilo e estrutura composicional, os quais são determinados pelo campo da
comunicação.
É importante ressaltar que há uma grande heterogeneidade dos gêneros, pois à
medida que a sociedade necessita, novos gêneros surgem, por isso eles são infinitos. A
esse respeito, Bakhtin (2003) afirma:
A riqueza e a diversidade dos gêneros do discurso são infinitas
porque são inesgotáveis as possibilidades da multiforme atividade
humana e porque em cada campo dessa atividade é integral o
repertório de gêneros do discurso, que cresce e se diferencia à
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medida que se desenvolve e se complexifica um determinado campo
(p.262).
Cabe ainda salientar que cada gênero possui um propósito comunicativo
diferente. Isso implica dizer que, para sermos bons leitores e escritores, devemos
desenvolver habilidades para usarmos recursos verbais e não verbais requeridos pelo
gênero discursivo em questão.
Marchuschi (2002) é outra grande referência na área de estudos sobre gêneros.
Ele usa a expressão gêneros textuais, denominando-os como:
[...] uma noção propositalmente vaga para referir os textos
materializados que encontramos em nossa vida diária e que
apresentam características sócio-comunicativas definidas por
conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição
característica. (p.22-23).
Os gêneros são, portanto, textos dinâmicos ligados à vida cultural e social. São
textos que circulam na nossa sociedade e possuem funções e propósitos
comunicativos distintos. A propaganda, por exemplo, tem como propósito vender um
produto, uma ideia, uma ideologia. É um gênero que se configura como um dos mais
lidos popularmente, isso porque ele se faz muito presente nos meios de comunicação,
além de possuir uma linguagem acessível para os leitores/ouvintes do dia-a-dia e,
possivelmente, futuros consumidores.
Segundo Sandmann (2001), o principal desafio desse gênero é prender a
atenção do leitor ou ouvinte, por isso as propagandas geralmente são criativas,
utilizam cores fortes, doses de humor, além de muitas outras coisas, como estratégias
para fazer com que o leitor/ouvinte fique “vidrado” no que está sendo propagado.
Feito isso, outros desafios aparecem, como convencê-lo ou levá-lo a comprar o
produto. A propaganda é um gênero que possui e combina linguagem verbal e não
verbal e isso poderá ser visto nas propagandas elencadas no corpus dessa pesquisa.
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2. RESULTADOS E DISCUSSÕES
O corpus desta pesquisa constitui-se de propagandas coletadas na internet,
mas que também circularam em outros meios de comunicação. São propagandas que
veiculam discursos religiosos, políticos e jurídicos.
Vale salientar que o intuito deste trabalho não está em estabelecer um juízo de
valor em relação aos anúncios publicitários analisados abaixo, mas em resgatar outros
discursos que se entrelaçam e que dialogam com os dizeres do discurso da
propaganda, o que faz com que a enunciação se torne uma teia discursiva. O que
buscamos saber é como o enunciado se constrói e forma novos sentidos, e como o
gênero em questão se forma com a presença dos múltiplos e variados discursos. O
corpus é constituído por cinco (05) propagandas, que abordam as temáticas do
discurso jurídico, político e religioso, conforme veremos abaixo.
Figura 1: Propaganda do creme dental Close up.
Fonte: http://agenciakaleidoscopio.blogspot.com.br/2010/04/intertextualidade.html.
Acesso em: 18/04/2012.
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A figura acima é uma propaganda do creme dental da marca close up. Esse
creme dental surgiu nos Estados Unidos na década de 60 e chegou ao Brasil por volta
do ano de 1971.
A UNILEVER, uma das maiores empresas de bens de consumo do mundo, é a
empresa que fabrica essa marca de creme dental. Ela se volta para o segmento de
higiene pessoal, limpeza, alimentos e sorvetes. Além da close up, a UNILEVER também
fabrica as marcas consagradas como: Omo, Comfort, Seda, Lux, Kibon, Hellmann’s,
Arisco, Knorr, Becel, Maizena, AdeS, Dove, Axe, e Rexona, entre outras.
A close up é conhecida como a marca que fala com o mundo jovem e para isso,
usa campanhas ousadas, criativas e produtos diferenciados. A linha close up é bastante
ampla e possui produtos adequados para o hálito, branqueamento, tratamento de
cáries etc. Para cada momento, existe um close up perfeito. No caso da propaganda
acima, temos o close up White Now, o qual, segundo informações, deixa os dentes
mais brancos com uma única escovação. Esse modelo proporcionaria um efeito
branqueador imediato, além de oferecer toda a proteção de um creme com flúor para
uso diário.
A missão dessa marca de creme dental é promover aos consumidores uma
relação saudável, com hálito refrescante que dá segurança para as pessoas chegarem
mais perto umas das outras. Essas propagandas geralmente circulam em TV’s aberta e
a cabo, rádio, internet, outdoor e em demais suportes adequados para esse tipo de
gênero.
Não diferente de outras propagandas, a marca close up usa o recurso da
persuasão para induzir o leitor a comprar o produto. Na figura acima, podemos ver
que há uma intertextualidade com umas das Leis de Talião, a qual diz: “olho por olho,
dente por dente”. Essa Lei foi criada pelo Código de Hamurabi e era uma das mais
utilizadas pelos povos da antiguidade. Segundo Arruda e Piletti (2002), O Código de
Hamurabi foi formulado por Hamurabi, um dos reis da Babilônia, e consistia, de modo
geral, em estabelecer valores morais.
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De acordo com Castro (2007), a Lei de Talião ou Princípio da Pena, como
também conhecida, é exemplificada na Bíblia Sagrada pela frase “olho por olho, dente
por dente” que consiste na pena equivalente ao dano causado. Ou seja, o causador do
crime era punido da forma como o executou. Isso resulta na compreensão de que a
propaganda não só faz analogia à Lei de Talião, mas também reporta o seguinte
discurso Bíblico: “Contudo, se houver dano grave, então pagará vida por vida, olho por
olho, dente por dente, pé por pé, queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe
por golte” (A Bíblia Sagrada, 1991, Êxodo 21. 23-25).
No enunciado da propaganda temos: “olho por olho, close up por close up”, o
qual tem como intuito revelar a credibilidade do creme dental na garantia do
branqueamento dos dentes. Assim, como a expressão “olho por olho, dente por
dente”, que se reporta às Leis de Talião, bem como ao enunciado bíblico, está
associada à garantia da justiça, a expressão “olho por olho, close up por close up” está
associada à garantia de bons resultados, ou seja, à obtenção dentes brancos e
brilhantes.
Além de reportar ao discurso bíblico, o anúncio em destaque também utiliza o
discurso jurídico para enfatizar a credibilidade do produto que está sendo anunciado.
Essa voz jurídica é percebida por meio da balança da justiça e comprovada pelo
enunciado que se encontra ao lado da mesma, o qual diz: “faça justiça ao seu sorriso
com close up White Now seus dentes mais brancos e brilhantes”. Dessa forma,
observamos que a concepção de justiça gera o sentimento de confiança e o sujeito
produtor dessa propaganda se utilizou dessa noção para fazer com que as pessoas
confiem na ação do creme dental e deem credibilidade ao produto, o que,
consequentemente, despertará o interesse para adquiri-lo.
Assim, constatamos que há uma sobreposição da voz jurídica e religiosa, que
nos direcionam para os efeitos de sentido de compromisso justo e bom do produto.
Vale salientar que essas vozes são percebidas por meio do princípio da polifonia, que
consiste no entrecruzamento das várias vozes no discurso.
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Ainda referente a essa propaganda, reportamo-nos à concepção bakhtiniana a
qual enfatiza que na construção do enunciado há um diálogo existente entre o
indivíduo e a sociedade, portanto, temos uma enunciação de caráter sócio-ideológico.
A propaganda em destaque nos permite inferir que as vozes jurídica e religiosa dão um
aspecto novo à propaganda deste produto. Vejamos agora, outro tipo de discurso na
imagem que segue.
Figura 2: Propaganda do Bombril
Fonte: http://comunicaunivates.blogspot.com.br/2010_09_01_archive.html. Acesso
em: 20/04/2012
A propaganda acima ilustra uma propaganda da marca Bombril, marca fundada
no ano de 1948, na cidade de São Paulo. É uma empresa de higiene e limpeza
doméstica.
É comum vermos nas propagandas da Bombril, em TV’s, internet etc., que essa
marca possui “Mil e uma utilidades”, isso porque, de acordo com as propangadas, ela
possui uma lã de aço que pode ser utilizada para várias finalidades. Sua missão é ser a
melhor linha de higiene e limpeza doméstica brasileira que dá qualidade de vida e
facilidade ao seus consumidores.
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A propaganda acima foi produzida no ano de 2010 pela WMcCnn, uma
moderna agência tradicional da publicidade que constrói marcas multinacionais e se
preocupa em gerar campanhas que entrem para a cultura popular do país, bem como
promover propagandas criativas, embasadas e espontâneas. Na imagem acima, temos
o ator Carlos Moreno (garoto propaganda da marca) caraterizado dos candidados
Dilma Rousseff (PT), Plínio de Arruda Sampaio (PSOL), José Serra (PSDB) e Marina Silva
(PV), que disputaram as eleições à Presidência da República no primeiro turno de
2010.
Começaremos a analisar a propaganda em destaque por seu aspecto não
verbal. Observemos que as cores das roupas que alguns “candidatos” estão usando,
remetem à cor do partido a que eles pertecem. Na imagem, Dilma aparece com uma
roupa vermelha, cor do PT, e bastante sorridente; já o tucano José Serra olha para
Dilma com expressão de desdém, isso porque as pesquisas eleitorais apontavam a
candidata pestista como sua principal concorrente. Plínio de Arruda, por sua vez, está
atrás de todos os candidatos e isso reflete os resultados das pesquisas eleitorais, em
que ele sempre obtinha o menor índice de porcentagem. Marina Silva expressa um
semblante bastante calmo e usa uma roupa esverdeada, remetendo-se ao Partido
Verde. Podemos inferir, então, que o não verbal, nessa propaganda, retrata a postura
que cada um desses sujeitos exerceram nas eleições de 2010, além de causar um
efeito de humor na propaganda.
Percebemos, ainda, a sobreposição do discurso político instaurado nos
enunciados: “Pesquisas apontam: “1001% dos brasileiros preferem Bom Bril” e
“Sujeira, não. Bom Bril é a solução. Para um Brasil limpinho, vote Bom Bril”, contidos
na figura acima. No primeiro enunciado, nota-se que a marca Bom Bril utiliza um
percentual elevado, acima do normal (1001%), para enfatizar que a sociedade prefere
o Bom Bril em detrimento dos candidatos que disputaram as eleições à Presidência da
República. O Bom Bril aparece como um quinto candidato e o único capaz de limpar,
purificar a sujeira do Brasil. Essa ideia é comprovada no outro enunciado, o qual diz:
“Sujeira, não. Bom Bril é a solução. Para um Brasil limpinho, vote Bom Bril”. Notemos
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que há duas palavras nesse enuciado que são de natureza dicotômicas: “sujeira” e
“limpinho”. Podemos inferir que a “sujeira” refere-se à situação do Brasil que será
solucionada, apenas, com o uso do Bom Bril. Desse modo, concluímos que a
propaganda induz o leitor a “votar”, “comprar” a lã de aço Bom Bril.
É notório que a propaganda não agride nem se mostra favorável ou contrária
aos candidatos, mas afirma que o Bom Bril – quinto candidato – é a melhor opção de
voto. O discurso político foi trazido para esta propaganda não com o intuito de fazer
uma propaganda política propriamente dita, mas de tornar o discurso reportado um
recurso discursivo com fins persuasivos. É exatamente essa recepção do discurso de
outrem que constitui a peça fundamental para o processo dialógico da propaganda.
Dessa forma, remetemos às palavras de Bakhtin/Volochinov(2002), quando afirmam
que o discurso citante e o discurso citado se formam em uma relação dialógica.
Observemos a propagada seguinte que reporta também um discurso político.
Figura 3: Propaganda do Bom Bril
Fonte:
http://colunas.revistaepocanegocios.globo.com/coffeebreak/2010/10/18/bombril-tambem-no-segundo-turno/. Acesso em: 20/04/2012
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A WMcCnn, também criou uma propaganda da Bom Bril nas eleições de
segundo turno de 2010. Na propaganda antecedente a essa, vimos que a imagem
trazia os quatro cadidados às eleições para presidente no primeiro turno. Nesta
imagem, Carlos Moreno aparece caracterizado apenas como Dilma Rousseff (PT) e José
Serra (PSDB), candidatos que passaram do primeiro para o segundo turno e
continuaram na disputa para a presidência do Brasil.
Além da leitura visual, podemos identificar o discurso político presente no
enunciado: “Nem situação. Nem oposição. Para um Brasil limpinho Bom Bril é a
solução”. Assim como na propaganda no primeiro turno, essa propaganda também
retrata, de forma implícita, a sujeira do Brasil. Cumpre falar, mesmo não sendo este o
objetivo do nosso trabalho, da função da linguagem estética ou poética, aquela que
tem o propósito de direcionar o crivo do destinatário para o código da propaganda. No
referido enunciado, há o uso do recurso da rima em: “Nem situação. Nem oposição.
Para um Brasil limpinho Bom Bril é a solução”. Ora, esta rima não foi imposta de modo
aleatório, mas com a finalidade de fazer com que o enunciado ficasse gravado na
mente do leitor. Mas é importante destacar que a função predominante nessa
propaganda é conativa, também conhecida como apelativa, aquela que direciona o
sujeito para a compra do produto. No caso dessa imagem, a função estética é vista
como um recurso, uma estratégia para o objetivo maior do enunciado, que é a
persuasão.
Embaixo da imagem dos sujeitos candidatos, há um enunciado que diz: “Bom
Bril preferido por 1001% dos brasileiros”. Partimos da premissa de que, para o
entendemento desse enunciado o leitor precisa entender que esta lã de aço é
conhecida por ter mil e uma (1001) ultilidades e por ser reconhecida de tal maneira;
dentre essas 1001 utilidades, podemos deduzir que há pelo menos uma delas que
serve para limpar a corrupção do Brasil.
Como visto no primeiro capítulo, a concepção filosófica de linguagem
bakhtiniana afirma que a enunciação é, por natureza, diálogica e é exatamente isso
que podemos identificar nas propagandas aqui analisadas, em que a enunciação é
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construída considerando-se os aspectos social, histórico e cultural. Sendo assim, faz-se
circular discursos. São discursos que se entrelaçam, dialogam e formam novos sentidos
no campo da publicidade. Isso caracteriza o processo dialógico na propaganda.
Vejamos agora as duas últimas propagandas; ambas abordam a mesma temática.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O discurso reportado é um tema bastante amplo. Muitas são as propagandas
que contêm discursos alheios, mas as que aqui analisamos foram suficientes para
percebermos como o enunciado se constrói e forma novos sentidos a partir da
retomada do discurso de outrem.
O discurso da propaganda é persuasivo por natureza, uma vez que o propósito
comunicativo desse gênero reside justamente no ato de convencer o consumidor a
adquirir o produto. Com a transposição do discurso reportado, a propaganda enfatiza
cada vez mais esse traço persuasivo.
Quando Bakhtin/Volochinov (1999, p.114) afirmam: “A situação e os
participantes mais imediatos determinam a forma e o estilo ocasionais da
enunciação”, entendemos que é o leitor quem dá forma à enunciação, levando sempre
em consideração o contexto social em questão.
O importante é que o sujeito leitor, além de perceber as diversas vozes no
discurso, tenha compreensão de que a inclusão dos vários discursos se dá não apenas
como forma de reconhecimento desses textos, mas como uma interação dinâmica
entre o discurso citante e o discurso citado, nos termos de Bakhtin/Volochinov (2002).
Identificamos, portanto, que esse universo discursivo desperta opiniões
valorativas e posturas crítica nos leitores, tanto é que, como visto no corpus analisado,
uma das propaganda foi censurada. Porém, o que nós procuramos averiguar foi o
aspecto dialógico dos enunciados e constatamos que a enunciação não ocorre de
maneira monológica e sim de forma dialógica, constituindo, assim, um território
comum do locutor e interlocutor. Além disso, observamos também que o gênero
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discursivo propaganda, com a presença do discurso reportado, torna-se mais criativo e
dinâmico, uma vez que causam impacto nas pessoas.
REFERÊNCIAS
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