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DIREITO MARTIMO E PORTURIO
ESTUDOS EM HOMENAGEM A RUY DE MELLO MILLER E
ANTONIO BARJA FILHO
SANTOS
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COORDENADORES
THIAGO TESTINI DE MELLO MILLER
LUS FELIPE CARRARI DE AMORIM
DIREITO MARTIMO E PORTURIO
ESTUDOS EM HOMENAGEM A RUY DE MELLO MILLER E
ANTONIO BARJA FILHO
DIREITO MARTIMO E PORTURIO, DIREITO TRABALHISTA PORTURIO E
DIREITO ADUANEIRO
SANTOS
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SUMRIO
PREFCIO Ronaldo de Souza Forte.................................................................................................... 4
EMBARGO E ARRESTO Ruy de Mello Miller......................................................................................... 8
SEGURANA E SADE NO TRABALHO PORTURIORESPONSABILIDADES Antonio Barja Filho..... 13
SOBRE AS DENOMINADAS SERVIDES PORTURIAS Marco Antonio Negro Martorelli................ 21
ASPECTOS PENAIS DA INTERPOSIO FRAUDULENTA DE PESSOAS Elias Antonio Jacob e Luiz
Guilherme de Almeida Ribeiro Jacob.............................................................................................. 27
MULTIFUNCIONALIDADE DO TRABALHO PORTURIO Eraldo Aurlio Rodrigues Franzese.......... 32
TRIBUNAL MARTIMO: A REPERCUSSO DAS DECISES DO TRIBUNAL MARTIMO NO CENRIO
JUDICIAL Paulo Henrique Cremoneze............................................................................................. 44
A REGULAO DA CONCORRNCIA PORTURIA Thiago Testini de Mello Miller e Lus Felipe
Carrari de Amorim.............................................................................................................................. 51
DIREITO MARTIMO, LEX MERCATORIAE LEX MARITIMA: BREVES NOTAS Osvaldo Agripino de
Castro Junior....................................................................................................................................... 63
A RESPONSABILIDADE DO NVOCC Fernando Moromizato Jr........................................................... 74
A PRESCRIO E O TRABALHO PORTURIO AVULSO Danielle Nascimento Bredariol Campos e
Juarez Camargo de Almeida Prado Filho....................................................................................... 83
TRIBUTAO EM GUAS MARTIMAS E A BUSCA DO CONTRIBUINTE POR UM PORTO Slvia Roxo
Barja..................................................................................................................................................... 93
ANLISE CRTICA DAS REGRAS DE ROTERD: CONVENO LOBO EM PELE DE CORDEIRO E A
ELOGIVEL DECLARAO DE MONTEVIDU, MARCO DO DIREITO MARTIMO NA AMRICA LATINA .....
Paulo Henrique Cremoneze e Rubens Walter Machado Filho.................................................109
A CONVENO 108 DA OIT E A EXIGNCIA DE VISTOS PARA A TRIPULAO DE NAVIOS
ESTRANGEIROS AFRETADOS POR EMPRESAS NACIONAIS Eugnio de Aquino dos Santos.......... 118
APLICABILIDADE DO REGIME ESPECIAL DE TRNSITO ADUANEIRO S PARTES E PEAS
SOBRESSALENTES DE EMBARCAES Marcel Nicolau Stivaletti..................................................... 129
O PRAZO PRESCRICIONAL NAS DEMANDAS RELATIVAS SOBRE-ESTADIA (DEMURRAGE) DE
CONTINER E A LEI N 9.611/1998 Rafael Silva Ferreira............................................................... 138
VINCULAO EMPREGATCIA E APOSENTADORIA NO TRABALHO PORTURIO BRASILEIROSINTONIA
ENTRE A LEI N. 8.630/93 E AS DIRETRIZES DA OIT Lucas Rnio da Silva....................................... 152
POSFCIO Rodrigo Ferreira de Souza de Figueiredo Lyra......................................................... 162
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Todos eles com os quais tivemos o privilgio de compartilhar e debater alguns temas que
eram relevantes no longo perodo em que atuaram.
O Dr. Ruy Miller que tambm privou da convivncia com os referidos advogados,
pela sua irreverncia e destaque na defesa intransigente de teses do Direito Martimo, visto
que, nas suas origens ele havia trabalhado no ramo, antes da sua formao acadmica, se
juntou ao Dr. Antonio Barja Filho, brilhante especialista na rea trabalhista, e constituram o
Escritrio de Advocacia Ruy de Mello Miller, que se tornou referncia regional e nacional nas
referidas reas.
Por outro lado, iniciamos nossas atividades junto ao setor privado, trabalhando na
Deicmar, Mesquita e Santos Brasil, como assessor de Diretoria, Diretor Jurdico e Diretor
Institucional, poca em que convivemos profissionalmente com o colega Ruy e com o Dr.Antonio Barja Filho, seu companheiro de escritrio, e, mais recentemente, com os seus 3
filhos, Thiago, Matheus e Lucas que, com a morte do pai em 2003, assumiram o escritrio.
Desde 1996, com a edio da lei 9307/96, havamos conversado com o Ruy sobre as
possibilidades de montagem de uma Cmara de Arbitragem e Mediao, mas, ele ponderava
que a sustentabilidade da iniciativa ainda era bem remota, e de que o assunto ainda deveria
merecer amadurecimento, mas, que o assunto tambm o fascinava.
J em 2007, aps o consultar alguns amigos e colegas, e, inclusive, ao Dr. WadyJasmin, Presidente da Santos Brasil S/A, organizao qual era e ainda sou vinculado,
resolvemos criar a Santos-Arbitral Cmara de Conciliao, Mediao e Arbitragem, aps,
desde agosto de 2006, ter debatido e estudado com vrios colegas, entre os quais o Dr. Luis
Caetano Antunes, o Dr. Thiago Miller, o Dr. Felipe Chiarello, o Dr. Thiago Lima e o Dr.
Daniel Quaresma, para elaborar o Regulamento da Cmara que se torna a espinha dorsal, da
entidade, substituindo, nos procedimentos extrajudiciais, os cdigos de Processos, e definindo
as caractersticas bsicas do seu funcionamento.No ano de 2010, fomos incumbidos de coordenar a Comisso de Assuntos Porturios e
Martimos da 73 Seo da OAB, de Guaruj, onde estamos inscritos, e, por vrios interesses,
firmamos um Termo de Acordo de Mtua Colaborao, com a referida Seo 73 da OAB
Guaruj e com a ACEG Associao Comercial e Empresarial de Guaruj, na qual nos
comprometemos, em nome da Santos Arbitral, a envidar todos os nossos esforos no sentido
de divulgar e demonstrar as vantagens para as partes em litgio, no uso dos institutos
extrajudiciais de Mediao e de Arbitragem, lanando, com os apoios, os patrocnios e os
incentivos de vrios outros parceiros, a Cartilha de Mediao e Arbitragem, em solenidade
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de maro de 2011, com os nomes de OCOMEX Observatrio do Comrcio Exterior e
MODEXModelizador do Comrcio Exterior
Esperamos que este livro, que se constitui em marco na histria do Direito Martimo
do qual o nosso colega Ruy de Mello Miller se destacou e seus filhos dominam, juntamente
com os ilustres colaboradores que selecionaram e escolheram, tenha o pleno sucesso, cuja
leitura recomendamos.
Ronaldo de Souza Forte*Presidente do ICEX - Instituto de Estudos das Operaes de Comrcio Exterior
Diretor Titular do CIESP Regional de SantosDiretor do DEPAR-FIESP de Santos
Presidente do Conselho Consultivo do SESI e SENAI da Regio de Santos
*Assistente do Inspetor da Alfndega de Santos, de 1968 a 1969, tambm exerceu vrias outras funes e cargos
de destaque, na prpria Alfndega de Santos, alm de Guarda Mor da Alfndega de VitriaEsprito Santo, e deSupervisor Aduaneiro na Delegacia da Receita Federal da CampinasSo Paulo e, tambm, na Alfndega Areade ViracoposCampinasSP. Completa em maro de 2011, com a 4 Turma de Direito, de 1960, da FaculdadeSo LeopoldoCatlica de SantosCasa Amarela, hoje da UNISANTOS, 50 anos de formado.
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EMBARGO E ARRESTO
Ruy de Mello Miller*
No acontecer dirio do Direito Martimo, corre, nas nossas cortes de Justia, uma
polmica de natureza interpretativa sobre qual seria a medida correta a ser utilizada quando
requerida a deteno de um navio em razo de dbito do seu Armador.
Uns h, que entendem que a apreenso de uma embarcao somente pode ser pedida
atravs da medida do Arresto, hiptese prevista no Art. 814 do Cdigo de Processo Civil:
Para a concesso do arresto essencial: I prova literal da dvida lquida e certa.
Ns ousamos, no entanto, discordar desse entendimento, pois em determinadassituaes, a medida apropriada seria o Embargo, prevista no Art. 479 do Cdigo Comercial1.
primeira vista, poder-se-ia objetar tratar-se, essa pendncia, controvrsia, de mera
discusso acadmica, sem qualquer efeito prtico. Mas no , como se passa a demonstrar.
*Advogado, especialista em Direito Martimo e Porturio, fundador da Advocacia Ruy de Mello Miller.1
Enquanto durar a responsabilidade da embarcao por obrigaes privilegiadas, pode esta ser embargada edetida, a requerimento de credores que apresentarem ttulos legais (arts. 470, 471 e 474)Art. 470 No caso de venda voluntria, a embarcaopassa para o comprador com todos os seus encargos;salvo os direitos dos credores privilegiados que nele tiverem hipoteca tcita. Tais so:1os salrios devidos por servios prestados ao navio, compreendidos os de salvador e pilotagem;2todos os direitos de porto e impostos de navegao;3os vencimentos de depositrios e despesas necessrias feitas na guarda do navio, compreendido o aluguel dosarmazns de depsito dos aprestos e aparelhos do mesmo navio;4 todas as despesas do custeio do navio e seus pertences, que houverem sido feitas para sua guarda econservao depois da ltima viagem e durante a sua estadia no porto da venda;5 - as soldadas do capito, oficiais e gente da tripulao, vencidas na ltima viagem;6 o principal e prmio das letras de risco tomadas pelo capito sobre o casco e aparelho ou sobre os fretes(art.651) durante a ltima viagem, sendo o contato celebrado e assinado antes do navio partir do porto onde tais
obrigaes forem contradas;7 o principal e prmio de letras de risco, tomadas sobre o casco e aparelhos, ou fretes, antes de comear altima viagem, no porto da carga (art. 515).8as quantias emprestadas ao capito, ou dvidas contradas para o conserto e custeio do navio, durante a ltimaviagem, com os respectivos prmios de seguro, quando em virtude de tais emprstimos o capito houve evitadofirmar letras de risco (art. 515)9 faltas na entrega da carga, prmios de seguro sobre o navio ou fretes, e avarias ordinrias, e tudo o querespeitar ltima viagem somente.Art. 471 So igualmente privilegiadas, ainda que contradas fossem anteriormente ltima viagem:1as dvidas provenientes do contrato da construo do navio e juros respectivos, por tempo de 3 (trs) anos, acontar do dia em que a construo ficar acabada;2as deespesas do conserto do navio e seus aparelhos, e juros respectivos, por tempo dos 2 (dois) ltimos anos,a contar do dia em que o conserto terminou.
Art. 474 Em seguimento dos crditos mencionados nos arts. 470 e 471, so tambm privilegiados o preo dacompra do navio no pago, e os juros respectivos, por tempo de 3 (trs) anos, a contar da data do instrumento docontrato; contanto, porm, que tais crditos constem de documentos inscritos lanados no Registro do Comrcioem tempo til, e a sua importncia se ache anotada no registro da embarcao.
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Na acepo verncula as palavras EMBARGO e ARRESTO tm o mesmo significado,
ou seja, reteno, apreenso, mas quando so alojadas na composio de um INSTITUTO DE
DIREITO, passam a ter o significado e aplicao que lhes for destinado.
O ARRESTO, para ser requerido, exige, de quem dele se utilize, a prova literal
de dvida lquida e certa. O EMBARGO, diferentemente, apenas pede que o crdito
reclamado se revista da condio de privilegiado, como definido nos Arts. 470 e 471
do nosso Cdigo Comercial.
Dentre os casos que as leis apontam, esto o embargo (arresto) pelos fretes,avarias e despesas sobre as mercadorias da carga, enquanto estas se acharem em
poder dos donos ou consignatrios (PONTES DE MIRANDA, Comentrios ao
CPC, XII/119/125). A estes no exige o Cdigo em nem um passo forma especialpara prova de seus crditos. (RT 131/154-164).
Na prtica, essa diferena tem importncia significativa, pois, na maioria das vezes, o
credor do navio no dispe de prova literal de dvida lquida e certa, primeiro em razo das
circunstncias peculiares em que o negcio celebrado e, secundariamente, porque o devedor
- dono da embarcao/armador/afretador - est preocupado em no munir o seu fornecedor de
tal documento. Dessa situaofornecimento de bens ou servios a navio, exemplo invocado
emergem disputas entre o fornecedor de bens ou servios e os seus tomadores pessoal de
bordo que se alongam no tempo, sob a alegao de que os bens fornecidos no estavam
bons, ou os servios prestados no o foram a contento, a ponto de o navio deixar o porto e o
dbito ficar em aberto.
Nessas condies, como a garantia do credor o navio, uma vez que o Armador
devedor sediado no exterior normalmente no tem bens no pas, deix-lo sair ter
frustrada a cobrana do crdito, muitas vezes para sempre, pois o navio pode nunca mais
voltar por aqui, ou o seu Armador com outra embarcao.Em vista dessa situao, o Direito Martimo, com fulcro na sua natureza
particularssima e consequentemente autnoma, que o faz independente dos demais ramos do
Direito, arma com a medida do Embargo o eventual credor de uma embarcao, pois, como
demonstrado, se trata de remdio formalmente menos complicado que o Arresto e os seus
pressupostos, portanto, so mais simples.
A obteno, por parte do credor, de documento que constitua prova literal de dvida
lquida e certa, como se disse, frente s circunstncias peculiares em que se travam essesnegcios, sempre muito difcil. Assim, o crdito privilegiado, definido no Cdigo
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Comercial, constitui-se em garantia, para o credor, de amplo alcance, pois a ele se acopla, por
fico legal, hipoteca tcita nos termos do Art. 470 do Cdigo Comercial sobre a
embarcao em dbito e, com ela, o direito de sequela, ou seja, a garantia de poder perseguir o
navio devedor onde quer que ele se encontre, pedindo o seu Embargo e no o Arresto, que no
contemplado com essas armas.
o direito martimo um direito particular, no verdadeiro sentido da palavra(Brunetti). s suas regras e leis, particulares, ho de corresponder necessariamentesolues judiciais diferentes das obtidas com a aplicao das leis civis e processuaiscomuns.Onde mais se pode notar a originalidade do direito martimo no captulo referenteaos crditos e privilgios.Como propsito de garantir direitos de certos credores do navio e facilitar o crdito
indispensvel ao progresso da navegao, foram as leis martimas generosas paracom os privilgios, cercando-os de favores e benefcios. Entre as medidas inerentesaos crditos privilegiados martimos figura o arresto, a saise conservatoire dosfranceses. ele permitido pelas legislaes de todos os povos.O direito mercantil brasileiro admite em termos expressos o arresto deembarcaes, nos artigos 479 a 483 do Cdigo Comercial.Bem interpretado o preceito do art. 479 do Cdigo Comercial brasileiro, no exigeele provas especiais dos privilgios enumerados no art. 470, para que possam oscredores embargar o navio.Fala o art. 479 em credores com ttulos legais, fazendo remisso aos Arts. 470,471 e 474, que enumeram taxativamente os privilgios sobre o navio. Credores comttulos legais significam, diante da remisso, credores com qualidadelegal de
privilegiados, isto , credores includos em alguma das alneas em que se
decompem os citados arts. 470, 471 e 474. A estes no exige o Cdigo em nem umpasso forma especial para prova de seus crditos. Nem o podia fazer, sob pena decontradizer-se e inutilizar o privilgio concedido expressamente a muitos credores.(RT 131/154-164)
No mesmo sentido, ainda, da concluso acima colocada, vlido que se traga colao
o entendimento de Srgio Seigi Shimura Arresto Cautelar, p. 152:
De notar-se que o privilgio liga-se ao navio, mediante direito de sequela;
sobremais, percebe-se que os crditos privilegiados, em sua maioria, no solquidos e certos.
A Conveno Internacional de Bruxelas de 1926, para unificao de certas regras
relativas aos privilgios e hipotecas martimos, promulgada no Brasil pelo Decreto n 351, de
1.10.l935, contm as seguintes regras:
Art. 8 - Os crditos privilegiados acompanham o navio qualquer que seja o seudetentor.
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Por fora desse preceito, os privilgios martimos, no direito brasileiro, adquirem ocarter de verdadeiros direitos reais, semelhana do que acontece na legislaofrancesa e italiana. (RT 131/154-164)
Art. 11 - Salvo o previsto na presente Conveno, os privilgios estabelecidos pelas
disposies que precedem no ficam sujeitos a qualquer formalidade ou condioespecial de prova.
Em face dessa norma internacional, os privilgios martimos esto isentos, quer osconstitudos no Brasil, quer os no estrangeiro, de qualquer formalidade ou condioespecial de prova. Veio a Conveno internacional consagrar em termos expressosaquilo que implcito era no Cdigo Comercial brasileiro. Este no estabelecera paraos privilgios martimos nenhuma exigncia especial probatria. Desde que o
privilgio possa ser demonstrado deve receber a proteo legal. Provada a suaexistncia, aplicam-se-lhe os favores e benefcios da lei. No se detm esta a exigirrequisitos especficos, formas predeterminadas, cerimoniosas e difceis para a provado privilgio. (RT 131/154-164)
Trata-se, pois, o EMBARGOe no o ARRESTO, do Direito comum, com requisitos
diversos da medida judicial correta para a deteno de navio por dvida de seu Armador,
soluo processual fornecida pelo Direito Comercial, com contornos especficos, ainda que
sob a forma de medida cautelar preparatria de ao principal de cobrana, garantidora do
cumprimento da deciso a ser nesta proferida.
As causas que do ensejo ao ARRESTO no guardam a menor relao com aquelas
que so prprias do EMBARGO.
O EMBARGO de um navio por dbitos feitos e no pagos pelo armador somente
poder ocorrer se os crditos correspondentes se encaixarem na lista dos crditos
privilegiados enumerados nos Arts. 470, 471 e 474 do Cdigo Comercial.
J o ARRESTO, instrumento previsto nos Artigos 813 e seguintes do Cdigo de
Processo Civil, no um instrumento colocado disposio de um navio, muito mais
amplo, pois refere-se a crditos que se encaixarem no seu conceito, ou seja, lquido e certo.
Para invalidar ou contestar esta colocao, no se alegue que um crdito
expressamente definido pela lei, Cdigo Comercial, como PRIVILEGIADO, carrega a
natureza de liquidez e certeza, propriedades, como j foi dito, do ARRESTO.
Outro aspecto importante, que convalida este entendimento, que o EMBARGO tem
um campo restrito de alcance, cabvel apenas quando o seu objeto est definido na norma--, o
que j no se pode dizer do ARRESTO, pois este instrumento, de natureza processual, no
limita a sua aplicao, bastando que o crdito reclamado seja lquido e certo. O ARRESTO
no se preocupa com a natureza da dvida, do dbito, que o embasa, mas, to somente, se ele
LQUIDO E CERTO, e o EMBARGO somente cabvel quando a natureza do crdito se
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alinha com a figura prevista no Cdigo Comercial, independentemente dos requisitos de
liquidez e certeza.
Assim, verifica-se que o EMBARGO limitado natureza do dbito e o ARRESTO
no se vincula natureza do dbito, mas, sim, sua qualidadeliquidez e certeza.
No menos verdade e necessrio que se diga que alguns tratadistas nem cogitam a
respeito do entendimento aqui exposto, pois afirmam, categoricamente, que inexiste qualquer
diferena entre ambos.
Embora, parte da doutrina no veja qualquer diferena entre os dois INSTITUTOS,
vislumbrando-os no mesmo saco, ousamos dela discordar, pois, na prtica, h uma resistncia
da 1 Instncia do Poder Judicirio em conceder a apreenso ou reteno do navio, quando o
crdito apresentado NO LIQUIDO E CERTO, ainda que as peas iniciais venhamaliceradas em um crdito PRIVILEGIADO.
Ora, o no acolhimento imediato do pedido de reteno de um navio, quer se trata de
um ARRESTO ou EMBARGO, acarreta ao credor, muitas vezes, danos irreparveis, posto
que em se tratando de uma embarcao tramp, que aquela que vem uma vez e jamais
volta, ficar ele sem receber seu crdito.
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SEGURANA E SADE NO TRABALHO PORTURIO RESPONSABILIDADES
Antonio Barja Filho*
A legislao nacional dever responsabilizar as pessoas adequadas empregadores,proprietrios, capites de navio ou quaisquer outras pessoas, de acordo com o casopela
aplicao das medidas previstas (Conveno 152 da OIT relativa segurana e higiene nostrabalhos porturios, promulgada pelo Decreto 99.534/90).
1 DEFINIO DA RESPONSABILIDADE
A Portaria 53/97 da Secretaria de Segurana e Sade do Ministrio do Trabalho, que
aprova o texto da Norma Regulamentadora NR 29, relativa segurana e sade no trabalho
porturio, define as obrigaes especficas de cada um dos envolvidos nas operaes
porturias, a esse respeito: operadores porturios, empregadores, instalaes porturias de uso
privativo, terminais retroporturios, tomadores de servio, exportadores, rgo Gestor de
Mo-de-Obra, armadora e seus representantes no pas, trabalhadores, administrao do porto,
tudo sob a fiscalizao do Ministrio do Trabalho e da Capitania dos Portos e sem prejuzo
das eventuais responsabilidades de fornecedores, veculos e terceiros, seja pelas ali tambm
definidas, seja pelas decorrentes de atos ilcitos em geral.
No h solidariedade nessas obrigaes. Nos termos do disposto no Cdigo Civil, s
haver solidariedade na obrigao de reparao do dano causado se mais de um for autor da
ofensa ou violao do direito, ou seja, s os que forem autores da ofensa ou violao
respondero solidariamente pela reparao.1 A responsabilidade , portanto, resultado da
ao, de violao da norma ou obrigao diante da qual se encontrava o agente.
Marton define responsabilidade como a situao de quem, tendo violado uma normaqualquer, se v exposto s consequncias desagradveis decorrentes dessa violao. Slvio
Rodrigues enfatiza a afirmao segundo a qual o princpio informador de toda a teoria da
responsabilidade aquele que impe a quem causa dano o dever de reparar. Segundo
Cretella Jr., situao originada por ao ou omisso de sujeito de direito pblico ou
privado que, contrariando norma objetiva, obriga o infrator a responder reunindo sempre,
em essncia, a entidade personativa, que se projetou ou se omitiu no mundo das normas
* Advogado, especialista em Direito do Trabalho Porturio, fundador da Advocacia Ruy de Mello Miller. Esteartigo foi originalmente publicado na LTr 69/1369.1Art. 1.518 do antigo, 942 do novo.
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jurdicas, quebrando-as e provocando o dano. Envolve a responsabilidade jurdica, desse
modo, a pessoa que infringe a norma, o nexo causal entre infrator e infrao. Esse
comportamento gera, para o autor, a responsabilidade civil, que traz, como conseqncia, a
imputao do resultado sua conscincia, traduzindo-se, na prtica, pela reparao do dano
ocasionado, conseguida, normalmente, pela sujeio do patrimnio do agente.Deve, pois,
o agente recompor o patrimnio.
A doutrina objetiva assenta-se na equao binria cujos polos so o dano e a
autoria do evento danoso; o autor do fato causador do dano o responsvel. Ru ser
aquele que for apontado como causador do dano; se fica provado que o ato produtor do
dano emanou de um membro do grupo, que fica assim determinado, no h como condenar a
todos ou reconhecer solidariedade entre eles2. Correlata idia de dano eventual aidentificao de seu causador. Como a ao exige se estabelea com segurana a equao
processual e determinao dos sujeitos ativo e passivo da lide, necessrio estabelecer quem
deve ser responsabilizado. Cumpre indicar com preciso o responsvel3.
Assim, para a responsabilizao, fundamental o estabelecimento da causa eficiente
do acidente, aquela sem a qual ele no teria ocorrido; que ela corresponda ao descumprimento
de uma daquelas obrigaes ou a uma daquelas responsabilidades inicialmente referidas, com
a conseqente definio do seu titular; bem como a culpa desse causador do dano. Nemsempre se tem condies de apontar qual a causa direta do fato, sua causa eficiente. A teoria
da equivalncia das condies vem em socorro da vtima, tentando resolver, na prtica, o
problema da relao causal e tem o mrito da simplicidade. Contudo, foi afastada por
inadequada.A determinao do nexo causal uma quaestio facti, considerando Leonardo
A. Colombo no ser proveitoso enunciar uma regra absoluta, cabendo ao julgador examinar
cada caso. Somente a valorao de todos e cada um dos aspectos que oferea aquele que se
encontra sub judice permitir enfoc-lo com maior ou menor exatido (Culpa aquiliana(Cuasidelitos), n. 58, p. 162).4 necessrio que se estabelea uma relao de causalidade
entre a injuridicidade da ao e o mal causado, ou, na feliz expresso de Demogue,
preciso esteja certo que, sem este fato, o dano no teria acontecido. Assim, no basta que
uma pessoa tenha contravindo a certas regras; preciso que sem esta contraveno, o dano
no ocorreria.O nexo causal se torna indispensvel, sendo fundamental que o dano tenha
sido causado pela culpa do sujeito.No tocante determinao do nexo causal, situa-se
2STOCO, Rui.Responsabilidade Civil.3. ed., ps. 50, 51, 53, 69, 97 e 101.3PEREIRA, Caio Mrio da Silva. Responsabilidade Civil.p. 48.4STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretao Jurisprudencial.97, p. 63.
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na identificao do fato que constitui a verdadeira causa do dano, a causa direta do fato,
sua causa eficiente.5.
2 DA ADMINISTRAO DO PORTO
Em linhas gerais, nos termos daquela NR e da Lei 8.630/93, compete
Administrao do Porto, denominada autoridade porturia, fiscalizar as operaes porturias,
zelando para que os servios se realizem com regularidade, eficincia, segurana; autorizar a
entrada, sada, atracao, desatracao, o fundeio, o trfego e a movimentao de carga dos
navios, suspender operaes porturias, lavrar autos de infrao e instaurar processos
administrativos, aplicando penalidades, como suspenso da atividade ou cancelamento docredenciamento do operador porturio, no caso de realizao de operao porturia com
infringncia ao disposto naquela Lei6; criar e coordenar o Plano de Controle de Emergncia e
participar do de Ajuda Mtua; organizar e sinalizar os fluxos de mercadorias, veculos,
unidades de cargas e de pessoas, na rea do porto (equipamentos, ciclistas e pedestres, bem
como a movimentao de cargas no cais, plataformas, ptios, estacionamentos, armazns e
demais espaos operacionais; estabelecendo aes coordenadas a serem adotadas na
ocorrncia de condies ambientais adversas); manter instalaes sanitrias, vestirios,refeitrios, locais de repouso e aguardo de servios7.
3 DO ARMADOR
A empresa armadora do navio em operao e seus representantes no pas so os
responsveis pelas condies de segurana e pelo bom estado de conservao efuncionamento dos equipamentos de guindar e acessrios de bordo, devendo promover
vistoria peridica e o reparo ou troca das partes defeituosas; acrescendo que o servio de
movimentao de carga a bordo deve ser executado de acordo com a instruo do
comandante, preposto da armadora8. O comandante do navio, embora no execute as
operaes porturias, detm o comando e o controle das operaes que se realizem a bordo
da embarcao, pelo que a movimentao de mercadorias ser executada de acordo com
5STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil.2001, p. 106.6Lei, Art. 33, par. 1o, VII.7NR 29.6.3.4.c e d; 29.3.6.1; Lei, Art. 33, par. 5o, II, b; NR 29.3.6.10.9 e 29.4.1.8NR 29.3.5.8 e Lei, Art. 15.
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suas instrues, devendo a carga ser arrumada nos pores e no convs, de forma e modo que
entenda mais conveniente segurana da embarcao a que comanda, evitando acidentes
quando de sua estadia no porto ou em viagem. Ao comandante dado o poder de despedir o
operador porturio que no atenda ao seu comando, substituindo-o por outro. Essas
operaes sempre se deram dessa forma, no traduzindo nenhuma novidade a quem conhece
as atividades da orla porturia.De outro lado, quando o dano seja ocasionado por ato de
bordo da embarcao, desde que sem a culpa do trabalhador avulso contratado pelo
operador porturio que opera o equipamento de bordo, ao operador se permitir obter o
ressarcimento daquele que, efetivamente, der causa ao evento danoso, eis que em nvel de
responsabilidade civilperante a legislao brasileira, o dever ressarcitrio depende da
ocorrncia da trilogia: ato ilcito, dano e sua extenso e o liame do nexo causal.9
4 DO EXPORTADOR
O exportador ou seu preposto deve fornecer administrao do porto e ao OGMO a
declarao de mercadorias perigosas embaladas para exportao10.
5 DO OGMO
A competncia do rgo de Gesto de Mo-de-Obra no sentido de zelar pelas
normas de sade, higiene e segurana no trabalho porturio avulso consiste em
proporcionar aos trabalhadores formao sobre segurana, sade e higiene ocupacional no
trabalho porturio; responsabilizar-se pela compra, manuteno, distribuio, higienizao,treinamento e zelo pelo uso correto dos equipamentos de proteo individual EPI e
equipamentos de proteo coletivaEPC; elaborar e implementar o programa de preveno
de riscos ambientaisPPRAno ambiente de trabalho porturio e elaborar e implementar
o programa de controle mdico em sade ocupacionalPCMSO11.
9SILVA, Francisco Carlos de Morais. Direito Porturio.p. 54-55.10NR 29.6.3.2.1 e 29.6.3.1.1.a.11Lei, Art. 19, V e NR 29.1.4.2.
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6 DO TRABALHADOR
Compete aos trabalhadores cumprir aquela NRmormente quanto ao trnsito sobre os
vos entre as cargas estivadas s quando cobertos com pranchas de madeira12; ao no trnsito
ou permanncia no setor necessrio rotina operacional do equipamento e ao posicionamento
frente de tubos, bobinas ou similares (cujo empilhamento deve ser peado imediatamente
aps a estivagem e adequadamente calado), por ocasio da movimentao, s quando
absolutamente indispensvel13bem como as demais disposies legais de segurana e sade
do trabalhador; informar ao responsvel pela operao de que esteja participando, as avarias
ou deficincias observadas que possam constituir risco para eles ou para a operao e utilizar
corretamente os dispositivos de seguranaEPI e EPC, que lhes sejam fornecidos, bem comoas instalaes que lhes forem destinadas14. Embora a lei civil codificada no faa qualquer
meno culpa da vtima como causa excludente da responsabilidade civil, a doutrina e o
trabalho pretoriano construiu a hiptese, pois como se dizia no Direito Romano: Qui quis ex
culpa sua damnum sentit, non intelligitur damnum sentire. Como ensina Aguiar Dias, a
conduta da vtima como fato gerador do dano elimina a causalidade; culpa exclusiva da
vtima quebra um dos elos que conduzem responsabilidade do agente (o nexo
causal).Quando se verifica a culpa exclusiva da vtima, tollitur quaestio: inocorreindenizao. O que importa, no caso, como observam Alex Weill e Franois Terr,
apurar se a atitude da vtima teve o efeito de suprimir a responsabilidade do fato pessoal do
agente, afastando a sua culpabilidade (Droit Civil, Les Obligacions, n. 635, p. 647; Malaurie
e Ayns, ob. cit., n. 59, p. 57, apud Caio Mrio, op.cit., p. 296).15
7 DA FISCALIZAO
Em ltima anlise, pelo Decreto 1.886/96, compete ao Ministrio do Trabalho a
fiscalizao das condies gerais do trabalho porturio, adotando as medidas regulamentares
previstas na hiptese de descumprimento da legislao, para tanto nele institudo o Grupo
Especial para fiscalizao mvel do trabalho porturio, tendo como atribuies fiscalizar o
trabalho porturio nos portos organizados e nas instalaes porturias privativas localizadas
12NR 29.3.4.7.13NR 29.3.7.2.14NR 29.1.4.3.15STOCO, Rui. Responsabilidade Civil.1999, p. 89.
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dentro ou fora da rea do porto organizado e fiscalizar as normas de segurana e sade no
trabalho na forma da legislao vigente16.
8 DO OPERADOR PORTURIO, INSTALAES DE USO PRIVATIVO,
TERMINAIS RETROPORTURIOS E TOMADORES DE SERVIO
Acima de tudo, entretanto, nos termos da Lei 8.630/93, o operador porturio titular
e responsvel pela direo e coordenao das operaes porturias que efetuar. Assim,
responde por toda a operao porturia que dirige e coordena, inclusive pela segurana dessa
operao e pelos equipamentos e trabalhadores que nela emprega, bem como dos
trabalhadores porturios avulsos por ele requisitados e pagos, como tomador dos servios detodos e por cujos atos responde como preponente, ainda que no ligado por relao
empregatcia e de tais equipamentos no seja o proprietrio. Quando da execuo de uma
operao porturia (digamos, a descarga e o carregamento de um determinado navio), o
operador porturio contrata a mo-de-obra avulsa para a movimentao da carga a bordo
da embarcao (estivagem, inclusive com a operao dos guindastes de bordo e das
empilhadeiras no convs e/ou nos pores pelos prprios estivadores, conferncia, conserto,
vigilncia, etc.);a lei responsabiliza o operador porturio pelos danos causados infra-estrutura do porto, s suas instalaes e ao equipamento de sua propriedade, ou sob contrato
com a Administrao, devendo ressarcir-lhe os danos causados.17
O trabalhador porturio avulso e tambm o no avulso que esteja sob as ordens do
Operador Porturio (antiga entidade estivadora) so prepostos deste. Nesse ponto, aquela
Lei veio acentuar tal responsabilidade. E isto se aplica tambm s instalaes porturias de
uso privativo, terminais retroporturios e demais tomadores de servios de trabalhadores
porturios, ainda que no sejam operadores porturios. Pela segurana dos trabalhadoresporturios de cujos servios so tomadores e dos quais so preponentes e pelos atos deles, no
exerccio desse trabalho, so os responsveis.Em tema de responsabilidade civil, a
conceituao de preposto desvincula-se de rigorosa vinculao empregatcia(TJSP, RT
532/84).Mesmo sendo autnomos os estivadores, evidente que, ao realizar desembarque
de mercadorias, eles agem na condio de prepostos eventuais dos responsveis pelos navios
e que estes respondem pelos danos causados pelos primeiros no exerccio dessas
16Decr.1886/96, Art. 7o; Port. GM/MTb 1115/96,I e IV; MP 1575/97,Arts. 13 e 8; Lei 9719/98 e Port. MTb746/00.17SILVA, Francisco Carlos de Morais. Direito Porturio.p.56.
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funes;os armadores, ou seus agentes, so entidades estivadoras, que respondem pelos
atos praticados pelos estivadores. (1o. TAC. SP, Apel. 331.086, 24.10.84).
Mais clara, ainda, aquela Lei, no sentido de que so eles e no o OGMO quem
responde pelos prejuzos causados pelos trabalhadores porturios avulsos a eles prprios,
tomadores de servio, ou a terceiros, entre os quais os prprios demais trabalhadores
porturios avulsos. O Ogmo no tem ingerncia na direo e na coordenao dos trabalhos
porturios, matria afeta de modo preferencial aos operadores porturios (Lei N. 8.630/93,
Art. 16), sem prejuzo da responsabilidade do armador ou do afretador pelo ato de seus
prepostos (v.g. comandante), ex vi do artigo 15 da Lei N. 8.630/93. (r. sentena da
4aVC.Santos, proc. 1291/02, 30.6.03).
Por tudo isso que a grande maioria das obrigaes minuciosamente estabelecidasnaquela NR 29 se refere a todos esses tomadores de servios de trabalhadores porturios e
seria muito extenso enumer-las aqui. Assim, mormente por ser impossvel a fiscalizao
simultnea de todas as operaes porturias realizadas diariamente num grande porto pelas
autoridades porturias, cabe ao titular e responsvel pela direo e coordenao das
operaes porturias que efetuar cumprir e fazer cumprir a NR no que tange preveno
de riscos de acidentes do trabalho nos servios porturios e fornecer instalaes,
equipamentos, maquinrios e acessrios em bom estado e condies de segurana,responsabilizando-se pelo correto uso18. Os operadores porturios so as pessoas jurdicas
pr-qualificadas pela administrao do porto para movimentar e armazenar mercadorias,
contratando, para tanto, mo de obra porturia prpria (vnculo de emprego) ou avulsa
(relao de trabalho)19. Trabalhador avulso o que presta servios, na orla martima,
trabalhando, sem vnculo empregatcio, para vrias empresas (tomadoras de servio), que
requisitam esse entidade fornecedora de mo-de-obra; forma peculiar de prestao de
servios subordinados entre o prestador de servio e a empresa para a qual o servio prestado.20.
9 CONCLUSO
Estas consideraes so aqui feitas quer quanto responsabilidade civil de todos os
envolvidos no trabalho porturio, por danos materiais ou pessoais, quer perante a fiscalizao
18Arts. 16, 15 e 19 par. 1o; NR 29.1.4.1.19SUSSEKIND, Arnaldo. Instituies de Direito do Trabalho.vol. 2, p. 1.058.20SUSSEKIND, Arnaldo. Instituies de Direito do Trabalho.vol. 1, p. 315.
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da Administrao do Porto, do Ministrio do Trabalho e at da Capitania dos Portos, qual
compete instaurar inqurito sobre fatos da navegao, assim considerados os que
prejudiquem ou ponham em risco as vidas e fazendas de bordo, enviando-o ao Tribunal
Martimo, que indicar os responsveis, aplicando-lhes as penas estabelecidas na Lei
2.180/54.
No h solidariedade nessas obrigaes. Nos termos do disposto no Cdigo Civil, s
haver solidariedade na obrigao de reparao do dano causado se mais de um for autor da
ofensa ou violao do direito, ou seja, s os que forem autores da ofensa ou violao
respondero solidariamente pela reparao.
Cabe, finalmente, observar, neste pequeno apanhado sobre as responsabilidades dos
diversos envolvidos no trabalho porturio, mais especificamente quanto segurana e sadedos trabalhadores, que, entre os sujeitos s sanes at do Tribunal Martimo, esto eles
prprios, trabalhadores, acrescendo que a sua culpa eximir de responsabilidade os demais,
donde lhes caber principalmente o uso dos equipamentos de proteo, a freqncia aos cursos
de treinamento e aperfeioamento para as diversas tarefas e o seu exerccio responsvel.
10 REFERNCIAS
PEREIRA, Caio Mrio da Silva. Responsabilidade Civil.
SILVA, Francisco Carlos de Morais. Direito Porturio.
STOCO, Rui.Responsabilidade Civil.3. ed.
______ . Responsabilidade Civil e sua Interpretao Jurisprudencial.
______ . Tratado de Responsabilidade Civil.
SUSSEKIND, Arnaldo. Instituies de Direito do Trabalho.vv 1 e 2.
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SOBRE AS DENOMINADAS SERVIDES PORTURIAS
Marco Antonio Negro Martorelli*
"as palavras so nomes das coisas, e no das idias quetemos das coisas" (Stuart Mill)
A questo aqui analisada versa sobre as chamadas servides porturias,ou seja, as
autorizaes administrativas concedentes do direito de acesso a bem pblico (terrenos e
instalaes porturias) afetado ao servio porturio, qualificados como bens pblicos de uso
especial, tal como prevem clusulas insertas em contratos de arrendamento porturio. Essasservides porturiaspermitem o carregamento de navios graneleiros atravs de sistemas de
dutos ou de esteiras transportadoras que ligam terminais internos ou externos rea primria
do porto, mas que no tm acesso direto gua, ou seja ao cais em que operam esses navios.
Ab initio, cabe consignar que a terminologia utilizada pelo chamado direito
porturio no prima pelo rigor, utilizando muitas vezes de expresses de forma equvoca,
mas que, consagradas pelo uso para designar institutos e atividades peculiares a essa atividade
empresarial, incorporaram-se a essa disciplina, com sentido prprio e especfico. o caso da servido porturia,que nada tem a ver com os institutos de direito civil
e de direito administrativo que encontram definio atravs da expresso servido.
Por primeiro, consigne-se que a expresso servido, propriamente dita, expressa um
direito de uso real sobre a coisa alheia o que, prima facie, demonstra a impropriedade do seu
uso na atividade porturia sob exame.
de se notar que a servido porturia uma autorizao objeto dos contratos
administrativos em que uma das partes a Autoridade Porturia. Assemelha-se fisicamente servido de aquaeductusdo velho direito romano que estabelecia o direito de conduzir gua
pelo prdio alheio e, por tal motivo foi utilizado o termo servido, denominao condutora
de errneas interpretaes, conforme ficou claro no debate travado na Audincia Pblica
042010 ANTAQ.
* Ex-professor titular da Faculdade Catlica de Direito de Santos, nas disciplinas de Direito InternacionalPrivado e Direito Comercial, e ex-professor auxiliar de Direito Comercial na Faculdade de Direito daUniversidade de So Paulo. E-mail: [email protected].
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Mas as servides porturiasnada tm a ver com o instituto das servides, como a
seguir buscamos demonstrar e, para tanto, estabelecemos a seguir as seguintes premissas
fticas e jurdicas:
1. As reas dos portos brasileiros so bens dominicais da Unio Federal,
juridicamente afetados a um servio pblico, conforme fixa a Constituio Federal em seu
art. 21, XI I ,f;
2. As servides propriamente ditas, como direito real sobre coisa alheia, somente
podem ser constitudas quando os terrenos reservados esto sob o domnio particular.
3. Na servido administrativa, a Administrao Pblica impe o uso real sobrebens
de parti cularespara assegurar a conservao ou realizao de obras e servios pblicos.4. A onerao de terrenos pblicos afetados a um fim determinado para os
particulares ou para entes pblicos que lhes dariam outra utilidade, somente pode ser feita
mediante aforamento ou concesso pelo poder pblico detentor do domnio e isso aps sua
desafetao.1
Anote-se que, na grande maioria dos casos, as servides porturias, quando
originrias de contratos de arrendamento de reas porturias, tm, como prdio dominante eprdio serviente, imveis do mesmo titular, a Unio Federal. Falar em servido de passagem,
nesse caso especfico, um contrassenso, uma vez que ambos os imveis, tanto o dominante
quanto o serviente, pertencem ao mesmo titular, a Unio Federal, e estar-se-ia, assim,
constituindo servido sobre coisa prpria, o que ofende a lgica dos fatos.
Em outra hiptese, o prdio dominante da titularidade de terceiro e o prdio serviente
pertence Unio Federal. Nesse caso, o bem serviente afetado pela servido de passagem
um bem pblico pertencente Unio Federal e afetado a um servio pblico federal, pelo queinvivel a constituio de servido de passagem sobre ele ex vi, no s por serem esses bens
imprescritveis, mas tambm porque esto imunes a qualquer outra competncia que no a da
administrao federal, consoante reiterado entendimento jurisprudencial dos Tribunais
Superiores2; pelo que o arrendatrio jamais poderia sustentar ter direito real sobre o bem pblico
de uso especial ex vi da constituio de servido.
1Nesse sentido, vide Decreto-lei n 271 de 28 de fevereiro de 1971.2Vide Recurso Extraordinrio n 172816-7 RJ, Relator Min. Paulo Brossard e Recurso Especial n 440.002,Relator Min. Teori Albino Zavascky.
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A servido de passagem, direito real sobre imvel alheio, um instituto de direito
privado regrado pelo artigo 1.378 do C. Civil 3, norma que no se aplica sobre os bens das
pessoas de direito pblico, porque estes so imprescritveis.
De outro lado, a chamada servido administrativa criada pela Lei n 1.507, de
26.06.1867 no direito positivo brasileiro, tambm no se aplica a hiptesesub examen.
Para Jos dos Santos Carvalho Filho, servido administrativa o direito real
pblico que autoriza a Poder Pblico a usar a propriedade imvel para permitir a execuo
de obras e servios de interesse coletivo.
Jpara Celso AntnioBandeira de Melloservido administrativa o direito real
que assujeita um bem a suportar uma utilidade pblica, por fora da qual ficam afetados
parcialmente os poderes doproprietrio quanto ao seu uso ou gozo.Silvio de Salvo Venosa esclarece bem a distino entre servido de passagem e
servido administrativa:
O direito pblico utilizou-se do princpio bsico das servides clssicas de direitoprivado para estabelecer nus real de uso, imposto pela Administrao, a fim derealizar e assegurar obras e servios pblicos. Da a denominao servidoadministrativa. Nesse conceito, no existe a definio de dois prdios, dominante ouserviente, mas a restrio ao exerccio amplo da propriedade privada em prol deatividade para fins pblicos. No se confundem, portanto, nem com as servidescivis, nem com as limitaes decorrentes da vizinhana. A servidoadministrativa impe nus a determinados imveis, para suportar, por exemplo,
passagem de cabos areos de energia eltrica, tubulaes subterrneas de gua ouesgoto, proibio de edificao acima de determinada altura em locais prximos aaeroportos etc. Dependendo da natureza da restrio imposta, haver ou noindenizao.
Hoje, a regulamentao desse ato encontra fundamento no Decreto-lei n. 3.365/41, art. 40,
que estabelece que, no caso da servido administrativa, alguns atributos do direito de propriedade
so partilhados com terceiros. Essa servido consubstancia um nus real de uso, institudo
pela Administrao sobre imvel privado, para atendimento ao interesse pblico, mediante
indenizao dos prejuzos efetivamente suportados. Apenas uma parcela do bem tem seu uso
compartilhado ou limitado, para atender ao interesse pblico.
Os entes polticos, empresas governamentais, concessionrios e permissionrios
podem instituir servido. Seu fundamento declarado de necessidade pblica, utilidade
pblica ou interesse social. Depois de editado o ato declaratrio da servido, esta poder
3Artigo 1.378 - A servido proporciona utilidade para o prdio dominante, e grava o prdio serviente, quepertence a diverso dono, e constitui-se mediante declarao expressa dos proprietrios, ou por testamento, esubseqente registro no Cartrio de Registro de Imveis.
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concretizar-se por acordo ou mediante sentena do Judicirio em ao movida pelo Poder
Pblico ou seu delegado. Mas s pessoas de direito privado no atribudo esse direito.
Nessa modalidade de interveno do Estadona propriedade privada,no ocorre a
transferncia do domnio ou da posse do imvel, apenas se limita o direito de usar e gozar o
bem. So alguns exemplos de servides: passagem de aqueduto, fios de rede eltrica, de
telefonia, placas pblicas em imveis de particulares.
Fundamenta-se a servido administrativa na supremacia do interesse pblico e na
funo social da propriedade.
A servido administrativa , portanto, expresso do poder do Estado sobre a
propriedade privada e, como instituto de direito, somente se assemelha com a servido de
passagem do direito privado na denominao. Alis, em matria de denominao, atente-seque as expresses "servido de passagem" e "servido administrativa" so sintagmas 4, forma
de expresso vernacular muito usada em linguagem jurdica.
Hely Lopes Meirellesconclui que os terrenos reservados constituem faixa que, como
o nome indica, :
reservada como simples servido administrativa, para eventuais fiscalizaes do rio,sem ser retirada da propriedade particular e sem impedir a sua normal utilizao em
culturas ou pastagens, ou a extrao de areia, argilas e cascalhos. Como toda aservido administrativa, esta tambm incide sobre a propriedade particular,visto que seria rematado absurdo que o poder pblico a institusse sobre seusprprios bens.
Como se v, o instituto examinado, a servido porturia, no comporta qualificao
como servido administrativa.
No encontra, portanto, a norma contratualsub examen, por absoluta desconformidade
com os institutos jurdicos acima elencados, sua qualificao seja como servido de passagem
e muito menos como servido administrativa, cabendo indagar qual a natureza do direito
concedido na hiptese sob exame, para viabilizar a movimentao de granis.
A resposta deve ser buscada nas normas do direito porturio, especfico na
regulamentao da questo. A Lei 8.630, de 1993, autoriza a cesso, via arrendamento, de
reas situadas dentro do porto organizado, integrando o conceito de rea no somente a
superfcie, mas suas acesses, dentre as quais condutos subterrneos ou areos.
4"Conjunto de palavras em que todas perdem sua significao individual para tomar a do conjunto".
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rescindveis ad nutum, a empresas com estabelecimentos limtrofes ao porto os quais, por via
area ou subterrnea, tem seu acesso ao cais do porto.
A Agncia Nacional dos Transportes Aquavirios ANTAQ editou proposta para
reviso da Resoluo 55/02, em que prope disciplinar o Contrato de Servido Pblica de
Passagem com as seguintes normas:
Art. 60 O interessado na Servido Pblica de Passagem deve requerer a utilizao darea para esta finalidade Autoridade Porturia, que se manifestar no prazo de 30(trinta) dias.
Art. 61 A proposta de celebrao do Contrato de Servido Pblica de Passagemdever ser submetida pela Autoridade Porturia anlise a aprovao da ANTAQ.
Art. 62 O Contrato de Servido Pblica de Passagem far-se- por acordo entre aspartes interessadas ou em decorrncia de sentena judicial.
Art. 63 O prazo do Contrato de Servido Pblica de Passagem poder serestabelecido por at 25 (vinte e cinco) anos, podendo ser prorrogado por at igual
perodo, respeitados os prazos dos contratos cujas reas so afetadas pela passagem.
Essa proposta utiliza a expresso servido pblica de passagemde forma equvoca
e no observa que a utilizao de rea porturia, seja ela superficial, area ou subterrnea, no
pode prescindir do procedimento licitatrio, pena de nulidade.
A propositura da Agncia reclama, como se v, de uma anlise mais aprofundada, ante
os limites da legislao ordinria. De outro lado, a outorga de "servido de passagem
porturia" deve, de um lado, respeitar as normas que regulam a explorao dos portos e das
licitaes e contrataes pblicas, no se buscando no direito privado o seu regramento sob
pena de estar-se tomando a nuvem por Juno.
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operao, portanto, contabilizado pela contratada como ingresso de recurso de terceiros para
o cumprimento do mandato.
A importadora mandatria atua como prestadora de servios, promovendo em seu
nome o despacho aduaneiro de importao, podendo realizar, se previstos em contrato, outros
servios relacionados transao (cotao de preos, intermediao comercial).
Certamente, as operaes de comrcio exterior usufruem das diversas vantagens
inerentes terceirizao. Mas tambm padecem das suas vulnerabilidades, a mais
significativa tem sido a ocultao de sujeitos.
a denominada interposio fraudulenta de pessoas, caracterizada pelo
acobertamento ardiloso ou artificioso dos reais responsveis pela operao.
Trata-se, portanto, da clssica simulao, um dos vcios do negcio jurdico, posto queilude o controle do Comrcio Exterior, reduz ilicitamente a onerao tributria devida e
fragiliza o sistema, desdobrando-se em diversas fraudes patrimoniais possveis
(subfaturamento, concorrncia desleal, sonegao de tributos, evaso de divisas).
Demais disso, esconde a incapacidade patrimonial e financeira da interposta,
aumentando consideravelmente o risco de irreversibilidade do prejuzo tributrio, razo pela
qual se presume fraudulenta a operao de comrcio exterior sem a comprovao da origem,
disponibilidade e transferncia dos recursos empregados.A tal ponto preocupante a terceirizao insidiosa que logo se cuidou de editar normas
especficas destinadas a evitar a caracterizao das operaes (por conta prpria)
realizadas pelas comerciais importadoras e tradingscomo operaes com ocultao do real
adquirente da mercadoria.
O artigo 23, inciso V, do Decreto-Lei 1455/76, por exemplo, foi alterado pelo artigo
59 da Lei 10.637 de 30.12.2002 de modo a definir como danosas ao errio as infraes
relativas s mercadorias estrangeiras ou nacionais, na importao ou na exportao, nahiptese de ocultao do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsvel
pela operao, mediante fraude ou simulao, inclusive a interposio fraudulenta de
terceiros.
Estabelece, ainda, as penalidades de perdimento e de multa equivalente ao valor
aduaneiro da mercadoria, na importao, ou ao preo constante da respectiva nota fiscal ou
documento equivalente, na exportao, quando a mercadoria no for localizada, ou tiver sido
consumida ou revendida.
Em paralelo, a Secretaria da Receita Federal muniu-se de instrumentos normativos
eficientes que disciplinam os procedimentos fiscais destinados a apurar a prtica fraudulenta,
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destacando-se a Instruo Normativa 228 de 21 de outubro de 2002, editada na vigncia da
Medida Provisria n. 66 de 29 de agosto de 2002, depois convertida na referida Lei
10.637/2002.
Mais tarde, a Lei n 11.281/06 criou a figura do encomendante predeterminado nas
operaes por conta prpria.
O cuidado se justifica porquanto, alm das infraes fiscais, a prtica pode configurar
diversos ilcitos penais, com severas consequncias resultantes da responsabilidade criminal
dos simuladores.
Ressalte-se desde j que, seja qual for a incriminao pretendida, imprescindvel
identificar a autoria ou a participao de pessoa fsica, ateno nem sempre observada pelos
operadores do Direito Penal, mxime no mbito dos crimes societrios, figura compreensivada quase totalidade das hipteses penais sob estudo.
que em matria criminal no se concebe a responsabilidade objetiva (versari in re
illicita); necessrio constatar, em cada caso concreto, um vnculo doloso ou negligente entre
a conduta do agente e a empreitada criminosa a ele imputada, ensejando a incidncia de um
juzo normativo de reprovabilidade (culpabilidade penal).
No se aceita incriminar algum simplesmente pelo fato de figurar no contrato social,
por ser diretor ou scio de determinada empresa. Nos crimes contra o Sistema FinanceiroNacional ou contra a Ordem Econmica, cuja apurao, via de regra, tem como supedneos os
procedimentos administrativos instaurados pelas autoridades fiscais, a situao ainda mais
sria.
No caso da interposio fraudulenta avultam as representaes fiscais para fins penais
que se prestam a legitimar, certo, a instaurao de procedimentos investigatrios (inquritos
policiais, por exemplo). Porm, ao fim e ao cabo, acusao (oferecimento da denncia) ou
ao juiz (sentena) no importa se, no mbito da Receita Federal, pode-se ou no presumirresponsabilidade dos diretores das instituies que fiscaliza. O Direito Penal no admite
responsabilidade por ser diretor ou figurar no contrato social, mas por fazer ou deixar de fazer
algo1.
1A mera invocao da condio de diretor ou de administrador de instituio financeira, sem a correspondentee objetiva descrio de determinado comportamento tpico que o vincule, concretamente, prtica criminosa,no constitui fator suficiente apto a legitimar a formulao de acusao estatal ou a autorizar a prolao dedecreto judicial condenatrio. A circunstncia objetiva de algum meramente exercer cargo de direo ou deadministrao em instituio financeira no se revela suficiente, s por si, para autorizar qualquer presuno de
culpa (inexistente em nosso sistema jurdico-penal) e, menos ainda, para justificar, como efeito derivado dessaparticular qualificao formal, a correspondente persecuo criminal. No existe, no ordenamento positivobrasileiro, ainda que se trate de prticas configuradoras de macrodelinquncia ou caracterizadoras dedelinquncia econmica, a possibilidade constitucional de incidncia da responsabilidade penal objetiva.
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E de fato, o que prenota a possvel ocorrncia da interposio fraudulenta de pessoas
a constatao de indcios de incompatibilidade entre os volumes transacionados no
comrcio exterior e a capacidade econmica e financeira evidenciada pelas empresas
(artigo 1 da Instruo Normativa SRF 228 de 21 de outubro de 2002).
Em outras palavras, h presuno juris tantum (admite prova em contrrio) que as
operaes de importao realizadas por empresa inapta so fraudulentas, justificando a
instaurao deprocedimento especial destinado a verificar a origem dos recursos aplicados.
Esta presuno, contudo, no se presta a acusar ou condenar perante o juzo criminal.
Completada a verificao fiscal, s ento abrir-se- instncia penal a possibilidade de iniciar
investigao destinada a apurar a autoria e a materialidade de crimes, notadamente para a
individualizao das responsabilidades, pois, em tese, esto presentes as elementares dosseguintes tipos penais:
1. Crimes contra a ordem tributria, consistentes na reduo ou supresso de
tributos pela prestao de informaes falsas nos registros contratuais ou pela
insero de elementos inexatos nos documentos de importao exigidos pelas leis
fiscais (art. 1, I e II, da Lei n. 8.137/1990);
2.
Descaminho, pela utilizao em proveito prprio ou alheio de mercadoria deprocedncia estrangeira fraudulentamente importada por empresa de fachada ou
inapta (art. 334, 1, c, do Cdigo Penal);
3. Crimes contra o sistema financeiro, na hiptese de contratao de cmbio pela
trading como se fosse a importadora direta, ou cujas operaes no esto
registradas no respectivo sistema, implicando remessa ilegal de divisas para o
exterior (arts. 21, nico, e 22, nico, da Lei 7492/86).
4.
Crimes contra a F Pblica e contra a Paz Pblica (falsidade documental, arts.297 a 304, e quadrilha, artigo 288, do Cdigo Penal).
No raro, a acusao alude a regras definidoras da pluralidade de delitos, seja a ttulo
de concurso material ou de concurso formal (artigos 69 e 70 do Cdigo Penal) pleiteando
imposio de penas privativas da liberdade superiores a oito anos e implica srio risco de
Prevalece, sempre, em sede criminal, como princpio dominante do sistema normativo, o dogma daresponsabilidade com culpa (nullum crimen sine culpa), absolutamente incompatvel com a velha concepo
medieval do versari in re illicita, banida do domnio do direito penal da culpa. Precedentes. (...) Os princpiosdemocrticos que informam o sistema jurdico nacional repelem qualquer ato estatal que transgrida o dogma deque no haver culpa penal por presuno nem responsabilidade criminal por mera suspeita (STF - 2 T. - HC84.580 - rel. Celso de Mello - j. 25.08.2009 - DJe 18.09.2009 - ementa no-oficial).
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imposio de penas privativas da liberdade superiores a oito anos, cujo cumprimento inicia-se
em regime fechado, de mximo rigor penitencirio.
preciso estar atento proibio do ne bis in idem, nem sempre observada por
acusadores ou juzes, gerando indevida acumulao sancionatria pela violao dos critrios
da progresso criminosa e do conflito aparente de normas incriminadoras.
Com frequncia, duas ou mais normas parecem incidir sobre o mesmo fato. O
ordenamento jurdico, notadamente na esfera penal, apresenta-se como um sistema coerente e
unitrio, impedindo a incidncia mltipla e simultnea de incriminaes.
Nesses casos, h unidade de fato (ocorrncia de um s crime) e pluralidade de normas
incriminadoras vigentes. No h concurso de crimes2.
O mais das vezes, na interposio fraudulenta de pessoas com emprego de falso, istoocorre: a falsidade material ou ideolgica reduz-se ao antefato impunvel (crime-meio),
consumido pelos crimes contra a ordem tributria ou contra o sistema financeiro (crimes-fim).
Ademais, pode ocorrer a relao de especialidade entre o crime de descaminho e o de
sonegao fiscal.
E, em ltima anlise, dependendo do caso concreto, possvel antever a prtica de um
s crime patrimonial, sob a forma de continuao.
So aspectos tcnicos do Direito Penal que tornam possvel ao menos impedir aexacerbao da pena.
Leve-se em conta, ainda, a pretensa incidncia de normas referentes a organizaes
criminosas, elevando consideravelmente o coeficiente de reprovabilidade desses delitos e
autorizando medidas processuais e cautelares de alto teor constritivo.
Por fim, no se despreze a influncia exercida pelos meios de comunicao de massa
criando uma presso popular que, nos ltimos tempos, elege alguns delitos como alvos de
represso especial.Este apelo miditico aumenta a tentao de se adotarem medidas desnecessrias e
indignas visando apenas ao constrangimento pblico das pessoas precipitadamente apontadas
como autores desses crimes, com total violao das garantias constitucionais do devido
processo legal e da presuno de no-culpabilidade.
2A respeito dos critrios de soluo do Conflito Aparente de Normas Penais e sua distino com o Concurso deCrimes, confira-se nosso Direito Penal: Parte Geral,Editora IOB-Thomson, SP:2007, 3 Edio, p. 239 e segs.
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MULTIFUNCIONALIDADE DO TRABALHO PORTURIO
Eraldo Aurlio Rodrigues Franzese*
SUMRIO:1. Introduo. 2. Princpio de proteo do trabalho porturio. 3. Origem histricada multifuncionalidade no cenrio porturio brasileiro. 4. Alcance da multifuncionalidadedentro das atividades porturias. 5. Diferenas de paradigmas entre o capital e o trabalho
porturio e manuteno do sistema de registro e cadastro como premissa damultifuncionalidade. 6. Obrigatoriedade de insero da multifuncionalidade nos acordos,contratos e convenes coletivas. 7. Paradigma da eficincia da multifuncionalidade. 8.Concluso.
1 INTRODUO
Nascida sob a gide de um ambicioso programa de privatizaes, a Lei 8.630/93 o
marco legal da mudana do regime de explorao da atividade porturia brasileira. Por fora
da norma a operao porturia deixou de ter a forte presena estatal e passou a ser uma
atividade com fim lucrativo a cargo de empresas privadas, constitudas de forma especfica
para o exerccio dessa atividade delegada, mudando radicalmente os paradigmas at ento
vigentes especialmente pelo sensvel aporte de automao nas operaes de carga e descarga.
Como ocorreu em todos os pases europeus, a reduo do contingente de trabalhadores
desde o incio foi tratada como o ponto mais nevrlgico da reforma porturia. A mecanizao
da operao, com o uso crescente de modernos equipamentos, exige um menor emprego de
mo-de-obra, gerando desamparo econmico de trabalhadores extremamente especializados,
at ento habilitados s formas de explorao do Porto dentro do modelo anterior eleito e
regulado pelo prprio Estado, que explorava diretamente a atividade econmica porturia.Nos ltimos anos, um dos marcos negativos do desenvolvimento porturio no Brasil
caracterizou-se pelo crescimento sem emprego. A elevao do investimento em tecnologias
de transporte modal e controle eletrnico no processamento de cargas aumentaram a produo
* Advogado especializado em direito coletivo do trabalho. Consultor daF.N.P. - Federao Nacional dosPorturios e da FENCCOVIB - Federao Nacional dos Conferentes e Consertadores de Carga e Descarga,Vigias Porturios, Trabalhadores de Bloco, Arrumadores e Amarradores. Advogado do Sindicato dosTrabalhadores Administrativos em Capatazia, nos Terminais Privativos e Retroporturios e na Administrao emGeral dos Servios Porturios do Estado de So Paulo, Sindicato dos Conferentes de Carga Descarga e Capatazia
do Porto de Santos, Sindicato dos Operadores em Aparelhos Guindastescos, Empilhadeiras, Mquinas eEquipamentos Transportadores de Carga dos Portos e Terminais Martimos e Fluviais do Estado de So Paulo,Sindicato dos Operrios e Trabalhadores Porturios em Geral nas Administraes dos Portos e TerminaisPrivativos e Retroportos do Estado de So Paulo e Sindicato dos Trabalhadores Rodovirios de Santos.
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dos portos, sem implicar em aumento proporcional da distribuio de renda pelo aumento dos
postos de trabalho.
Esse quadro era previsto como um impacto da lei 8.630/93. A automao trouxe
repercusses considerveis sobre o nvel de emprego nos portos e sobre as condies de
trabalho e vida dos porturios. Um dos institutos introduzidos na lei destinados a atenuar o
impacto social da modernizao porturia foi a multifuncionalidade.
2 PRINCPIO DE PROTEO DO TRABALHO PORTURIO
Segundo do dicionrio Aurlio multifuncionalidade a qualidade ou estado de
multifuncional; que tem muitas funes. Em interpretao gramatical, portanto, podemosentender a multifuncionalidade do trabalho porturiocomo a possibilidade de habilitao do
trabalhador porturiopara o exerccio de muitas funes porturias dentre as delineadas no
artigo 26 da Lei 8.630/93.
Aps constatar e registrar a diviso do trabalho no Porto Organizado em vrias
atividades, a Lei estabeleceu em seu artigo 57 que:
no prazo de cinco anos contados a partir da publicao desta Lei, a prestao deservios por trabalhadores porturios deve buscar, progressivamente, amultifuncionalidade do trabalho, visando adequ-lo aos modernos processos demanipulao de cargas e aumentar a sua produtividade.1
A multifuncionalidade, portanto, foi inserida no ordenamento que regula o trabalho
porturio como um objetivo a ser alcanado no curso da privatizao, sendo tratada pela
doutrina estatal como um princpio do trabalho porturio, conforme registra o prestigiado
Manual do trabalho porturio e ementrio, produzido no ano de 2001, pelo ento Ministrio
do Trabalho e Emprego:
Princpio da multifuncionalidade: Est previsto no art. 57 da Lei n 8.630/93.Propugna que atividades ou tarefas que requeiram a mesma qualificao poderoser realizadas pelos trabalhadores habilitados, independentemente da categoriaprofissional a que pertenam. A multifuncionalidade dever ser implementada deforma negocial pelas convenes coletivas de trabalho. 2
1Lei 8.630 de 1993.
2Manual do trabalho porturio e ementrio.Braslia : MTE, SIT, 2001. 152 p. Contm glossrio dos principaistermos porturios em ingls. 1. Trabalho martimo, inspeo, Brasil. 2. Segurana do trabalho, Brasil. 3. Sadeocupacional, Brasil. I. Brasil. Ministrio do Trabalho e Emprego (MTE). II. Brasil. Secretaria de Inspeo doTrabalho (SIT). CDD341.65185.
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3 ORIGEM HISTRICA DA MULTIFUNCIONALIDADE NO CENRIO
PORTURIO BRASILEIRO
A multifuncionalidade no foi uma novidade introduzida pela Lei 8.630/93.
O Decreto-Lei n 5 de 4 de abril de 1966 (DOU DE 5/04/66) que estabeleceu normas
para a recuperao econmica das atividades da Marinha-mercante e dos Portos Nacionais,
muito antes da Lei 8.630/93, foi a primeira norma que tratou a multifuncionalidade no mbito
porturio ao almejar a unificao das atribuies das atividades de estiva e capatazia,
mediante a criao de uma nova categoria denominada operadores de carga e descarga:
Art. 21.Os trabalhadores de estiva e de capatazia constituiro categoria profissionalnica denominada operador de carga e descarga e reger-se-o pelas regras gerais daConsolidao das Leis do Trabalho e deste decreto-lei. 1 A Comisso de MarinhaMercante fixar as tabelas de remunerao, por produo, da nova categoria. 2 Odisposto neste artigo vigorar a partir da data de sua regulamentao.
Apesar da norma ter sido editada no auge do poder das Delegacias de Trabalho
Martimo (DTMs), essa primeira iniciativa de introduzir a multifuncionalidade no ambiente
porturio no prosperou e nunca foi efetivamente implementada por ausncia deregulamentao.
Como o trabalho porturio sempre teve diretrizes estatudas em uma cultura muito
particularizada, com origens e tradio historicamente arraigadas no seio das populaes
fixadas no entorno das regies porturias, que sempre distinguiram o estivador, mais
vinculado ao trabalho avulso, dos demais trabalhadores decapatazia, era razovel imaginar
que um decreto no mudaria a cultura de uma sociedade e sua forma particularizada de
enxergar o trabalho.Com o advento da lei 8.630/93, novamente o legislador tentou implantar a
multifuncionalidade. Nessa segunda tentativa, a edio da norma refletiu a postura liberal que
norteou a reforma poltica do programa de privatizaes, o que perceptvel mediante
inovaes importantes que merecem ser consideradas.
Em um primeiro plano, o legislador aumentou de forma significativa as atividades que
poderiam ser consideradas multifuncionais. O caput do artigo fala em multifuncionalidade
do trabalho de forma genrica, mas o segundo pargrafo estabelece que para os efeitos do
disposto neste artigo a multifuncionalidade deve abranger as atividades de capatazia, estiva,
conferncia de carga, conserto de carga, vigilncia de embarcaes e bloco.
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A segunda inovao, no menos importante, foi a determinao de que a
multifuncionalidade deve necessariamente constar das negociaes coletivas estatudas no
setor porturio, nos termos do pargrafo primeiro do artigo 57 que aduz: Os contratos, as
convenes e os acordos coletivos de trabalho devero estabelecer os processos de
implantao progressiva da multifuncionalidade do trabalho porturio de que trata o caput
deste artigo.
Se por um lado, para os operadores porturios a multifuncionalidade no parece ser
algo importante, sobretudo diante da enorme quantidade de mo de obra disponvel fora do
sistema, para os trabalhadores porturios, a aplicao da multifuncionalidade tem questes
prticas bastante controvertidas, que analisaremos considerando que o objetivo do instituto
atenuar as malvolas consequncias scio-econmicas da automao nos mtodos deexplorao da atividade econmica porturia, com base na Conveno n 137 da OIT e no
Decreto n 1.886/96, que regulamentou a Lei n 8.630/93.
4 ALCANCE DA MULTIFUNCIONALIDADE DENTRO DAS ATIVIDADES
PORTURIAS
A primeira questo que surge na implantao da multifuncionalidade a dvida se eladeve ocorrer dentro de cada uma das atividades do trabalho porturio ou entre as prprias
atividades de trabalho porturio.
A capatazia, por exemplo, desenvolve-se pelo recebimento, conferncia, transporte
interno, abertura de volumes para a conferncia aduaneira, manipulao, arrumao e entrega,
bem como o carregamento e descarga de embarcaes, quando efetuados por aparelhamento
porturio3.
Para cada um desses elos da operao de capatazia necessria uma determinadahabilitao. O trabalhador que realiza a manipulao da carga tem qualificao diversa do
trabalhador que, para fazer a movimentao da carga, opera o aparelhamento porturio tipo
Portainere ambos se encontram na atividade de capatazia.
Bem por isso, parte significativa dos representantes de entidades sindicais porturias
sustenta que a multifuncionalidade ocorre somente dentro da prpria atividade, de modo que o
trabalhador inscrito no rgo Gestor de Mo de Obra para atividade de capatazia que faz a
3Lei 8.630/93 art. 57, 1, I.
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manipulao da carga, somente pode credenciar-se para outras funes dentro da prpria
capatazia, como a operao de aparelhamento porturio, por exemplo.
Outros, com os quais nos identificamos, sustentam que a multifuncionalidade ocorre
em relao a todas as atividades referidas no 2 do artigo 57 da Lei 8.630/93, podendo o
trabalhador tanto ser qualificado para funes dentro da sua prpria atividade quanto para
funes em atividade porturia diversa de sua inscrio originria no OGMO.
O trabalhador de capatazia na funo de manipulao de carga, por exemplo, pode
habilitar-se tanto para operao de equipamentos dentro da prpria capatazia, quanto para o
exerccio da funo de conferncia de carga, na condio de trabalhador multifuncional.
Nessa amplitude, a multifuncionalidade parece ser mais efetiva e de maior interesse scio
econmico.
5 DIFERENAS DE PARADIGMAS ENTRE O CAPITAL E O TRABALHO
PORTURIO E MANUTENO DO SISTEMA DE REGISTRO E CADASTRO
COMO PREMISSA DA MULTIFUNCIONALIDADE
A modernizao introduzida nos portos pela Lei 8.630/93 inseriu o Brasil em patamar
mais elevado no processo global de comrcio internacional. A interveno do Estado foi fatorde dinamizao da economia nacional e trouxe em seu contedo mudanas de vrios
paradigmas, inclusive o relacionado ao valor do trabalho porturio.
No modelo anterior, os trabalhadores porturios que ingressavam no sistema tinham
uma cultura prpria e valores ditados pelo trabalho porturio, com significados historicamente
construdos. A noo de si prprio e seu objetivo profissional era agregado definitivamente ao
trabalho desenvolvido no porto, que sempre propiciou a essa massa de trabalhadores um
sentido de valor e estabilidade muito bem delineados.No modelo novo, com o porto agora explorado por empresas privadas, a ordem
imposta pelas operadoras porturias foi a valorizao da racionalizao no processo
produtivo, visando o lucro em primeiro plano, o que conduziu a processos seletivos de
indivduos que so classificados, remunerados e substitudos, passando pelo trabalho
porturio de forma dissociada da cultura antes vigente, valendo apontar como exemplo a
incansvel e ainda constante prtica de contratao de empregados fora do sistema.
Essa bipolaridade, saindo de um extremo para outro, no era a inteno do legislador.
Ao modificar o padro de distribuio do trabalho que vigia durante mais de um sculo a lei
8.630/93 procurou valorizar a mo de obra do trabalhador porturio que at ento servia ao
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modelo criado e explorado pelo prprio Estado, sem se opor ou desprezar a cultura porturia
ento vigente.
Um dos mecanismos nesse sentido foi a multifuncionalidade. Nela apostou o
legislador para transformar o trabalhador porturio de antes em um novo trabalhador, com
novas habilidades cognitivas e status de multifuncional. Aplicada em outros pases a premissa
de fato foi louvvel e se efetivamente praticada em nosso pas seria de relevante alcance
social. Mas sua aplicao prtica dependia e ainda depende da observao de outras regras de
proteo previstas na legislao, especialmente a necessidade de evitar contrataes fora do
sistema.
Ao investir na contratao de trabalhadores fora do sistema, os representantes das
operadoras perceberam que era mais simples qualificar a mo de obra mais barata do querequalificar o trabalhador porturio cadastrado e registrado, mesmo que no aspecto social essa
conduta no minimizasse os impactos sociais da reforma porturia e ofendesse s normas
internacionais das quais Brasil signatrio.
Esse comportamento empresarial mostrou-se dissociado da preocupao poltica
estatal com o impacto social da mudana de paradigma, porque na forma da lei 8.630/93
clara a pretenso estatal de identificar e assegurar aos trabalhadores que se ativavam no porto,
o reconhecimento de suas qualificaes e a exclusividade do trabalho, limitando desta forma oquantitativo de trabalhadores.
Em um segundo momento, por meio do instituto da multifuncionalidade, esperava o
Estado assegurar investimentos privados nesse quantitativo de trabalhadores, requalificando
os porturios aos novos mtodos de manipulao de carga e ainda para outras atividades
porturias, buscando com isso a movimentao do trabalhador de uma atividade para outra,
dentro daquele quantitativo de trabalhadores, atendendo necessidade da demanda com
aproveitamento dos trabalhadores inseridos no sistema.Nesse panorama, por certo que a multifuncionalidade ocorre pela qualificao do
trabalhador no s em relao atividade porturia a que pertence e tem sua inscrio junto
ao OGMO, mas tambm para atividade diversa da que se encontra inscrito originalmente.
E a importncia desta qualificao de multifuncionalidade to grande, em face do
efeito social de oportunidade de trabalho, que o legislador estipulou o prazo de cinco anos
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para sua implantao a partir da edio da Lei, determinando que ela ocorresse de forma
progressiva, atravs de contratos, convenes e os acordos coletivos de trabalho4.
Como as contrataes irregulares substituram parte significativa dos trabalhadores
porturios, no incorreto afirmar que a base do sistema de requalificao que atendia a
multifuncionalidade foi quebrada, a medida que a manuteno dos postos de trabalho prevista
em lei e previamente necessria a requalificao do trabalhador, foi relativamente desprezada,
considerando sobretudo que os operadores porturios buscaram reorganizar os espaos da
produo investindo maciamente em formas novas tecnologicamente mais desenvolvidas,
sem pensar em promover reforma equivalente na mo de obra porturia por meio da
multifuncionalidade.
6 OBRIGATORIEDADE DE INSERO DA MULTIFUNCIONALIDADE NOS
ACORDOS, CONTRATOS E CONVENES COLETIVAS
A determinao de que os acordos e convenes devero estabelecer os processos de
implantao progressiva da multifuncionalidade do trabalho porturio consignada na lei, em
nosso entender, no se traduz em detrimento de outras formas que possam atender o objetivo
previsto pelo legislador. Em nenhum momento a lei afirma que a multifuncionalidade s podeser implantada pela via negocial.
Excelente doutrina produzida por Cristiano Paixo Arajo de Ronaldo Curado Fleury,
sustenta a importncia poltica e econmica da negociao coletiva no curso da implantao
da multifuncionalidade:
A disposio decorre do fato de que as atividades descrita na lei de Modernizaono so, como j frisado, descries de categorias profissionais. Isso permite que o
trabalhador porturio, desde que devidamente habilitado pelo OGMO, possaprestar servios e concorrer a escala em mais de uma atividade porturia (porexemplo, um consertador habilitado para a funo de conferencia de carga podeconcorrer a escala e compor equipe de conferentes). Diante do impacto que amultifuncionalidade provoca em toda a cadeia de prestao de servios porturios,
sua implantao ter de ocorrer mediante conveno coletiva de trabalho. E algunscenrios, especialmente no complexo de Vitria (ES), vem sendo gradualmenteaplicada, com xito, a multifuncionalidade.
4Lei 8.630/93 art. 57 No prazo de cinco anoscontados a partir da publicao desta Lei, a prestao de servios
por trabalhadores porturios deve buscar, progressivamente, a multifuncionalidade do trabalho, visando adequ-lo aos modernos processos de manipulao de cargas e aumentar a sua produtividade. 1. Os contratos, asconvenes e os acordos coletivos de trabalho devero estabelecer os processos de implantao progressiva damultifuncionalidade do trabalho porturio de que trata o caput deste artigo.
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Outros textos doutrinrios, valendo citar Francisco Carlos de Morais Silva5, afirmam
que na ausncia da via negocial, o OGMO deve implantar a multifuncionalidade:
O contrato, conveno ou acordo coletivo e, na sua falta, o OGMO, dever definir osistema de progressividade dessa multifuncionalidade de funes, de forma que, nodecorrer dos cinco anos, subsequentes lei, os trabalhadores se encontrem aptos
para a realizao das tarefas que lhes sejam destinadas. Essa progressividadeespelha que, antes dos cincos anos, os diversos servios antes elencados, j podem
ser executados por categorias diferentes, bastando, para tanto, que os instrumentosnormativos ou o OGMO assim o especifique, bem assim, que se encontrem noreferido rgo.
O legislador, diante da importncia de aplicao da multifuncionalidade, estabeleceu
fosse ela tratada como assunto necessrio nas negociaes coletivas, seja porque isso leva ocapital ao enfrentamento da questo relacionada a diviso do trabalho, seja porque estabelece
caminho de incluso do trabalhador porturio na nova produo pela requalificao ou nova
qualificao, de forma a promover a transio com o menor trauma possvel.
Mas a validade jurdica da multifuncionalidade no deve ser restrita origem
negocial. No possvel entender que a lei imps essa restrio. Primeiro porque a
multifuncionalidade passa necessariamente pela qualificao tcnica do trabalhador, que deve
receber formao para que possa exercer outra funo dentro da prpria atividade ou em
atividade diversa daquela para a qual est inscrito e habilitado junto ao OGMO.
Segundo porque esta obrigao cabe, por fora do art. 19, II da Lei 8.630/93, ao rgo
de gesto de mo-de-obra do trabalho porturio avulso, verbis:
II - promover a formao profissional e o treinamento multifuncional dotrabalhador porturio, bem assim programas de realocao e de incentivo aocancelamento do registro e de antecipao de aposentadoria.
Sendo obrigao do OGMO a formao profissional e o treinamento multifuncional do
trabalhador porturio e cabendo a ele a obrigao de administrar o fornecimento da mo-de-
obra do trabalhador porturio vinculado e avulso, o contrato, acordo ou conveno coletiva
para aplicao da multifuncionalidade teria como objetivo apenas preservar alguns aspectos
relacionados remunerao, ao direito de escolha quanto a escala que vai concorrer e s
garantias mnimas e complementares que devem ser asseguradas a esse trabalhador
multifuncional.
5Pgina 103 da obra referenciada na bibliografia.
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Como se percebe, a multifuncionalidade tem ntima relao com o gerenciamento da
mo de obra, sendo de grande valia onde existe maior demanda de trabalho e menor oferta de
mo de obra, fazendo a gangorra da oferta e procura prpria do gerenciamento, funo fim,
e diria nica do OGMO, j que as demais elencadas na lei so acessrias a esta.
Com isso no se renega a fora e o valor que tm os acordos e convenes coletivas,
inclusive para atenuar os efeitos malficos da estruturao de nos modelos de explorao da
atividade econmico, minimizando os impactos da diminuio da oferta de trabalho.
Os instrumentos normativos podem at regular essas relaes6mas, o treinamento do
trabalhador, iniciativa mais importante para ser multifuncional, no necessita de qualquer
norma coletiva para ser aplicada, em face da determinao expressa que existe que cabe ao
rgo Gestor de Mo de Obra a formao profissional e o treinamento multifuncional e ogerenciamento do fornecimento da mo de obra7.
E a aplicao prtica da multifuncionalidade apresenta-se como regra bastante simples
para o sistema porturio, onde o atendimento da requisio do trabalhador avulso obedeceria a
seqncia de escala primeiro aos portadores de inscrio no registroem seguida os portadores
de inscrio no cadastro e por ltimo quando no atendida a requisio, os trabalhadores
qualificados como multifuncionais, constantes igualmente de uma lista com observncia do
sistema rodizirio. Ao multifuncional seria assegurada a remunerao e a aplicao de todasas demais normas de natureza coletiva da atividade principal que veio a exercer como
multifuncional.
Todavia, sendo o rgo Gestor de Mo de Obra gerido pelas prprias empresas
porturias, que nomeiam seus dirigentes, a oferta e disponibilizao de cursos de qualificao
e requalificao com vistas a multifuncionalidadecontrape-se a disposio das operadoras de
no abrir mo das formas mais liberais de controle social da mo de obra, calcadas em
processos seletivos irregulares, destinados aos trabalhadores desvinculados do registroporturio, que podem ser contratados e substitudos com mais facilidade a base de salrios
inferiores.
No h por parte dos rgos Gestores de Mo de Obra uma poltica de implementao
da multifuncionalidade fundamentada em elementos estatsticos que identifique em que
atividade est ocorrendo falta de mo de obra porturia e em que atividade est havendo
6 Lei 8.630/93 artigo 18 Pargrafo nico. No caso de vir a ser celebrado contrato, acordo, ou conveno coletivade trabalho entre trabalhadores e tomadores de servios, este preceder o rgo gestor a que se refere o caput
deste artigo e dispensar a sua interveno nas relaes entre capital e trabalho no porto.7 Lei 8630/93 art. 19 II - promover a formao profissional e o treinamento multifuncional do trabalhadorporturio, bem assim programas de realocao e de incentivo ao cancelamento do registro e de antecipao deaposentadoria;
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sobra. Por esse motivo, com raras excees temos testemunhado desinteresse das operadoras
porturias na implantao da multifuncionalidade, apesar do instrumento ter elevado alcance
social e promover efetiva melhora nas relaes laborais.
7 PARADIGMA DA EFICINCIA DA MULTIFUNCIONALIDADE
O rgo Gestor de Mo de Obra de Santos, avalista das posies empresariais, desde a
sua criao, no apresentou qualquer poltica estruturada em dados concretos e prprios de
um gerenciamento competente que aponte para a implantao da multifuncionalidade.
Apesar de no haver impedimento legal, os rgos Gestores de Mo de Obra praticam
a multifuncionalidade somente quando existe acordo coletivo, situao isolada que no seinsere numa poltica ampla idealizada pelo legislador, que a partir da Lei 8.630/93 imaginou
um curto espao de tempo para a integral implantao desse sistema.
As iniciativas para a multifuncionalidade tm partido dos Sindicatos laborais com
demonstrao de eficincia do sistema.
No Porto de Santos, os tra