Download - Edição 89 - abr/mai/jun
Revista DR! • 1
DR!Nº 89 | 2016
Publicação do SIMESP Sindicato dos Médicos de São Paulo abril/maio/junho
A ameaça do capital estrangeiro na saúde
Revista
A ampliação da atuação de investidores internacionais na saúde suplementar deve provocar impacto direto no Sistema Único de Saúde e nas relações de trabalho em geral
Páginas VerdesÁquilas Mendes
ArtigoLucio Flávio Gonzaga Silva
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87 anos de históriae cada vez mais presentepara facilitar a defesa do médico e de seu trabalho
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Iniciativas de pequenos agricultores e da
comunidade em geral defendem alimentos
sem agrotóxico
Os palcos conquistaram o psiquiatra
Saulo Ciasca, que recentemente se tornou
ator profissional
Mergulhe no mundo das bibliotecas, que
se tornaram espaços interativos de lazer
e cultura
5 Editorial
29 Redes Sociais
32 Crônica
39 Literatura
Alimento orgânico
Médico artista
Espaço cultural
Sumário
18 26 34
Nº 89 | 2016abril/maio/junho
Sustentabilidade Horas Vagas Cultura
Especial
22
Saúde do médico
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O momento pelo qual passa o país é delicado, com ameaças a diver-sos direitos sociais conquistados pelo povo brasileiro nas últimas gerações, especialmente o direito à saúde pública por meio de nosso Sistema Único de Saúde (SUS).
Uma dessas ameaças é a am-pliação da atuação do capital es-trangeiro no setor, em todos os segmentos. Uma lei assinada no apagar das luzes do ano de 2014 permite aos investidores estran-geiros explorarem a saúde brasi-leira, tornando-a um bem mera-mente comerciável.
A diretoria do Simesp preocu-pa-se com os próximos capítulos dessa história. A partir dos oli-gopólios que temos observado se formarem, a organização de nos-sos serviços de saúde passará por grandes transformações que têm a ver tanto com a dinâmica assis-tencial quanto com as relações de trabalho. Com maior oferta de médicos e um menor número de empresas dominando o mercado haverá desafios para viabilizarmos um padrão razoável de vencimen-tos e manutenção na qualidade de insumos.
Editorial
O lobby em favor das empresas de planos de saúde tem se forta-lecido junto ao Congresso Nacio-nal e já vinha dando a linha nas políticas de saúde suplementar. Agora, pasme: um representante à frente do Ministério da Saúde, que no primeiro dia na função de-fendeu “rever o tamanho do SUS”, declarou não ser possível garantir os direitos que a Constituição de-termina e apontou, como saída, a ampliação de oferta de saúde para a população.
Com os incentivos fiscais e a possibilidade de que empresas comandadas pelo capital inter-nacional controlem tanto planos de saúde quanto hospitais, inclu-sive filantrópicos, possivelmen-te assistiremos recursos de nos-so trabalho e do erário público transferidos para os seus sócios nos diversos cantos do planeta. Esse assunto está na reportagem de Capa desta Revista DR!, com ampla abordagem e opiniões de diversos especialistas.
Outro assunto em destaque nesta edição chama a atenção para a saúde do médico. Sim, muitas vezes somos displicentes com nós mesmos. Na rotina ex-tenuante, inerente ao nosso tra-
Direitos ameaçadosDiretoria do Simesp
balho, protelamos um olhar mais atento para nosso bem-estar. Até adoecermos. A matéria Especial destaca que os locais de trabalho não oferecem serviço de apoio ao médico, tampouco sabem lidar com o problema. Muitas vezes, o empregador simplesmente afas-ta o profissional dando férias ou chegando ao extremo de demiti- lo. É urgente que esse tema deixe de ser tabu e passe a fazer parte das nossas discussões.
Por fim, aproveitamos para in-formar que o Simesp está inician-do a campanha salarial 2016 do setor privado, que inclui as organi-zações sociais e filantrópicas. Para uma boa negociação, é importante a participação de todos nas assem-bleias do Sindicato. O médico pode acompanhar as informações pelo site e pelo Jornal do Simesp, ou ain-da, ligando para nosso canal de Re-lacionamento. Boa leitura!
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Páginas Verdes Áquilas Mendes
O dinheiro que hoje faz tanta falta ao Sistema Único de Saúde (SUS) exis-te, mas está represado, por exemplo, no setor bancário brasileiro que, a cada trimestre, bate recordes de lucro (a despeito de qualquer crise ou quadro recessivo). Para Áquilas Mendes, professor doutor livre-docente de Economia da Saúde da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, é daí que poderiam vir os recursos necessários para garan-tir a sustentabilidade financeira de um sistema que hoje é subfinancia-do. Ele propõe, entre outros, a criação de uma contribuição sobre grandes transações financeiras e também sobre as grandes fortunas do Brasil, garantindo que uma parte do dinheiro arrecadado tivesse como desti-nação exclusiva o campo da saúde. O professor é contra a lei que permi-te a entrada do capital estrangeiro na saúde brasileira por avaliar que um dos seus objetivos é o de abocanhar, por meio de renúncias, isenções fiscais e outros, os já escassos recursos públicos disponíveis. “Não resta dúvida que o aumento desses incentivos fiscais ao capital privado vem respondendo à necessidade de valorização desse capital no contexto do capitalismo financeirizado e sua crise”. O professor concedeu entrevista à revista DR! por e-mail, no final do mês de abril
Leonardo Gomes Nogueira
“Devido à dominância do capital financeiro, é na sua esfera que novas fontes devem ser pensadas”
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O senhor é contra a lei que per-mite a entrada do capital es-trangeiro na saúde brasileira?É importante esclarecer que, ao lado de várias entidades vincu-ladas à saúde pública, mante-mos nosso compromisso com a preservação do direito universal à saúde e com a responsabilida-de do Estado na garantia desse direito. A Lei 13.097/2015, apro-vada no ano passado, dentre ou-tros aspectos, promove a abertu-ra da saúde para que empresas e capitais estrangeiros possam instalar, operar ou explorar clí-nicas, hospitais gerais, inclusive filantrópicos, por meio da per-missão de aquisição das santas casas – instituições que basica-mente são financiadas pelo Es-tado brasileiro. Atualmente, a presença do capital externo já existe em outras áreas da saú-de, a exemplo dos planos e se-guros de saúde. Essa nova Lei altera a Lei Orgânica da Saúde (8.080/90), que originalmente proíbe os investimentos estran-geiros no setor, e fere também a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 199, em relação à pro-posta do SUS.
A lei deve aprofundar os pro-blemas na saúde pública?Entendemos que essa lei agra-va e aprofunda ainda mais as dificuldades de nosso sistema público de saúde, ampliando
uma concorrência privada que já tem sido totalmente desigual para o SUS, inibindo qualquer possibilidade de ampliação e consolidação desse sistema. Concordamos com as várias en-tidades vinculadas à saúde pú-blica, como a Frente Nacional contra a Privatização da Saúde (FNPS), que vem realizando es-forços contrários a essa nova lei e defendendo que o Supre-
mo Tribunal Federal (STF) de-cida pela aprovação da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin). Entendemos que essa luta não deve ser apenas jurí-dica, mas sobretudo política, no sentido de incorporarmos em nossa agenda o repúdio a essa medida e ao posicionamento do governo federal que vem man-tendo o seu argumento a favor. Na realidade, o governo federal tem insistido que a primeira “brecha” para a entrada de ca-pital estrangeiro no mercado de saúde brasileiro ocorreu em 1998, com a lei que regulamenta planos de saúde e, sendo assim, a 13.097 não constitui novida-de nesse campo. A partir da lei
de 1998, operadoras de saúde de capital internacional, sob a li-derança do capital financeiro, foram autorizadas a comprar planos no Brasil. Sabe-se que, desde então, a empresa Uni-ted Health adquiriu a Amil e o grupo americano Bain Capital - fundo de private equity e ven-ture capital – comprou a Inter-médica. Sem dúvida, a Lei 13.097 veio para agravar ainda mais a possibilidade de ampliarmos a conquista desse direito pela so-ciedade brasileira e assegurar a insaciabilidade do capital, sob a dominância do capital financei-ro, na forma de apropriação do fundo público. Nesse sentido, cabem as indagações: como um hospital filantrópico pode ser vendido e, particularmente, a uma empresa estrangeira? Se a sua característica de filantropia não for alterada, continuando a receber recursos do SUS, signi-fica que o Estado irá transferir recursos financeiros para o ca-pital estrangeiro?
A Lei de Responsabilidade Fis-cal dificulta a ampliação dos gastos com saúde e até mesmo estimula o uso das organizações sociais na gestão desse sistema, correto? Há 16 anos, desde que a Lei Com-plementar 101/2000, denomina-da Lei de Responsabilidade Fis-cal (LRF), foi aprovada, as áreas
“O Estado irá transferir recursos
financeiros para o capital
estrangeiro?”
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Páginas Verdes Áquilas Mendes
sociais, em especial a saúde, vêm sendo prejudicadas no tocante à execução das suas ações e servi-ços. Conforme o princípio maior da lei em que os entes públicos devem gastar bem menos do que arrecadam, vários limites são determinados ao poder Executi-vo, especificamente as despesas de pessoal que não podem ultra-passar 54% da receita corrente líquida do município. Caso isto venha a ocorrer, as penalidades são significativas, conforme in-dica a Lei 10.028/2000 que tipifica crime em finanças públicas. Tal exigência legal vem afetando o comprometimento das esferas de governo, em especial da ins-tância municipal com a execu-ção das ações e serviços públi-cos de saúde em geral, e com a Estratégia Saúde da Família em particular. Na realidade, o res-peito a esse limite da LRF, por parte dos municípios, tem leva-do a que direcionem seus gas-tos para a despesa com serviços de terceiros - pessoa jurídica -, isto é, referente à contratação de organizações sociais da saúde (OSSs) ou organizações civis de interesse público (Oscips). Tra-ta-se de uma grave distorção na aplicação dos recursos do SUS,
sendo usados prioritariamente para financiar essas entidades privadas, a fim de executarem as ações e serviços de saúde que deveriam ser de responsabilida-de dos municípios. Sem dúvida, essas entidades privadas aca-bam por administrar parcela importante dos serviços da rede pública com a lógica mercantil. Entendemos ser urgente e fun-damental que todos os defenso-res do SUS público, integral e de qualidade reúnam forças para solicitar a aprovação da proposta que exclui o limite das despesas de pessoal da LRF para a saúde.
A ideia do capital estrangeiro, ao ingressar no Brasil, é captu-rar uma parte do dinheiro pú-blico oferecido ao setor privado por meio de renúncias e isen-ções fiscais?
É importante começar essa dis-cussão das renúncias e isenções fiscais concedidas pelo governo federal à saúde privada, na for-ma de redução de Imposto de Renda a pagar da Pessoa Física ou Jurídica e de tributos para as entidades sem fins lucrativos e para a indústria farmacêutica, por meio de seus medicamentos, relacionando-a com a questão do subfinanciamento do SUS. Como já é conhecido por mui-tos, um dos maiores problemas desse sistema é o seu subfinan-ciamento histórico que acaba refletindo no comportamento do gasto público em saúde bra-sileiro, que ainda é baixo (3,9% do PIB em 2014) em relação ao dos demais países que têm um sistema público universal. Para que o Brasil atinja o nível desses países, precisaria dobrar a par-ticipação do SUS em relação ao PIB (Produto Interno Bruto), a fim de equipará-lo à média dos países de capitalismo avançado (Reino Unido, Canadá, França e Espanha), isto é, 8%. Nota-se que o total desses benefícios tributá-rios à saúde privada vem cres-cendo de forma considerada. Registre-se: R$ 3,67 bilhões em 2003, passando para R$ 8,70 bi-
“Sem dúvida, essas entidades
privadas acabam por administrar
parcela importante dos serviços da rede pública com a lógica
mercantil”
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lhões em 2006 ; R$ 15,85 bilhões em 2009, e, por fim, R$ 19,98 bi-lhões em 2014 (dados extraídos da Secretaria da Receita Fede-ral). Não resta dúvida que o au-mento desses incentivos fiscais ao capital privado vem respon-dendo à necessidade de valori-zação desse capital no contexto do capitalismo financeirizado e sua crise.
O senhor tem algumas ideias interessantes para garantir a sustentabilidade financeira do SUS... Devido à dominância do capital financeiro na fase contempo-rânea do capitalismo, é na sua esfera que novas fontes devem ser pensadas. Destacamos: 1) adoção de mecanismos de tri-butação para a esfera financei-ra, como por meio da criação de uma Contribuição sobre as
Grandes Transações Financei-ras (CGTF) progressiva ou, por exemplo, acima de uma renda de R$ 2 milhões mensais – sen-do essa contribuição vinculada à Seguridade Social e com des-tinação de 50% para a Saúde; 2) estabelecimento da Contri-buição sobre Grandes Fortunas com vinculação para a seguri-dade social, com destinação de 50% para a saúde; 3) aprofun-damento dos mecanismos de tributação para a remessas de lucros e dividendos realizadas pelas empresas multinacionais, atualmente isentas na legisla-ção, destinadas ao Orçamento da Seguridade Social (saúde, previdência e assistência so-cial); 4) ampliação constante da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para instituições financeiras; 5) revisão da tributação sobre
heranças (ITMCD) e com parte de sua destinação à seguridade social (saúde).
Há ainda outras propostas al-ternativas?Sim. Em outro plano de discus-são sobre propostas de fontes alternativas, destacamos: 1) o fim das isenções de Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) com despesas médicas e do Im-posto de Renda das Pessoas Ju-rídicas (IRPJ), das empresas que prestam assistência médica a seus funcionários; 2) o estabe-lecimento de uma política de renúncia fiscal para entidades sem fins lucrativos e para a in-dústria farmacêutica; 3) a ex-tinção dos subsídios públicos aos planos prwivados de saúde; 4) o repúdio à Lei 13.097/2015 que permite a entrada de capital es-trangeiro na saúde pública. !
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Capa Capital Estrangeiro
A Lei 13.097, aprovada, sem debate, às vésperas de um recesso parlamentar,
permite que o dinheiro estrangeiro atue em quase todos os setores da saúde brasileira
Leonardo Gomes Nogueira
O Capital no Século 21
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No final da 54ª legislatura, às vés-peras do início do recesso parla-mentar de fim de ano, escondida em meio a dezenas de artigos tra-tando dos mais variados assuntos, o Congresso Nacional aprovou, em 10 de dezembro de 2014, regra que amplia, em muito, o campo de atuação do capital estrangeiro na saúde do Brasil.
A presidente Dilma Rousseff, ignorando o pedido de diversas entidades e organizações que tra-balham em defesa da saúde pú-blica, aprovaria a mesma regra em 19 de janeiro de 2015.
Antes restrito aos planos e se-guros, agora o capital de fora pode, de forma direta ou indireta, atuar na assistência à saúde. O que in-clui hospitais (inclusive filantró-picos), clínicas e laboratórios. É o que diz, em resumo, o Artigo 142 da Lei 13.097 (que altera trechos da 8.080, de 19 de setembro de 1990), que definiria o âmago do futuro Sistema Único de Saúde (SUS).
A lei sancionada pela presi-dente agora afastada tem 169 ar-tigos. Além do tamanho, também chama atenção pelo fato de que os seus artigos têm pouco ou nenhu-ma relação entre si.
Ela trata de coisas tão díspares como a “Desoneração Tributária de Partes Utilizadas em Aerogera-dores” e o “Descarte das Matrizes Físicas no Processo Administrati-vo Eletrônico”.
O que alguns que acompanha-ram o assunto, como a professo-ra Ligia Bahia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), classificaram como “X Tudo” (o sanduíche que reúne ingredien-tes em grande quantidade e tão diferentes entre si quanto os ar-tigos inseridos na lei do capital estrangeiro).
“Não foi uma surpresa”, co-mentou Ligia. “Era um pleito das entidades do meio empresarial. Não teve oposição. Não há oposi-ção a essa lei”, avaliou a professo-ra da UFRJ, citando o deputado fe-deral Ivan Valente como uma das poucas vozes no parlamento que se opôs ao tema.
“É triste porque é uma mudan-ça constitucional. Como que uma mudança constitucional ocorre sem um grande debate na socie-dade?”, indagou.
O subprocurador-geral da Re-pública, Oswaldo José Barbosa Silva, classificou o processo como “vergonhoso”. “Essa lei foi uma colcha de retalhos”, criticou, em 25 de junho de 2015, durante de-bate promovido pela Associação
Brasileira de Defesa do Consumi-dor (Proteste).
“Essa lei é manifestamente in-constitucional”, disse Silva. “Nos-sa preocupação como membros do ministério público não é discu-tir a mão invisível do mercado de um lado ou as virtudes do Estado no controle da sociedade do outro. Nós somos operadores jurídicos. E nosso dever é defender a Consti-tuição”, ressaltou.
Oswaldo José Barbosa Silva, da Associação Nacional do Minis-tério Público de Defesa da Saúde (Ampasa), lembrou que o arti-go 199 da Constituição brasileira veda a participação (direta ou in-direta) de empresas ou capitais estrangeiros na assistência à saú-de e acrescentou: “salvo nos casos previstos em lei.”
Ele acredita que os consti-tuintes redigiram o texto dessa maneira, prevendo algum tipo de exceção ao veto para casos ex-cepcionais que obrigassem o país a aceitar a entrada do capital de fora. “Então, você tem uma regra e uma exceção. Só que essa lei transformou exceção em regra”, avaliou.
“Na prática designa-se, por exceção, a possibilidade do capi-tal estrangeiro entrar em toda e qualquer ação e serviço de saú-de. Agora, a legislação brasileira sobre saúde traz duas políticas opostas na mesma norma”, escre-
Especialistas criticam o fato de a
lei ter sido aprovada sem o necessário
debate
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Expressão criada pelo filóso-fo e economista Adam Smith para se referir aos indivíduos que concentram grande poder econômico e, portanto, político em suas mãos. Mesmo sendo a figura que praticamente inau-gura o liberalismo econômico,
“Senhores da humanidade”
veu o professor Mário Scheffer em artigo (leia mais na página 16).
Uma Ação Direta de Incons-titucionalidade questionando a legalidade dessa lei aguarda julga-mento, desde fevereiro de 2015, no Supremo Tribunal Federal (STF). A liminar, quando (e se) houver um julgamento da questão, será apre-ciada pela ministra Rosa Weber.
O supermercado da saúdeNo mesmo debate promovido pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor, o na época presiden-te do Conselho Regional de Medi-cina do Estado de São Paulo (Cre-mesp), Bráulio Luna Filho, avaliou que o ingresso do capital estran-geiro pouco ou nada contribuirá para o avanço da saúde ofertada ao brasileiro ou mesmo para a me-lhoria das condições salariais e de trabalho entre os médicos.
“Em dez anos, nós vamos ter não mais 300 mil médicos no país, vamos ter quase 500 mil. E os médi-cos não vão ter alternativas”, disse Luna Filho, lembrando a tendência de que grandes grupos econômicos estrangeiros adquiram empresas
brasileiras e criem um setor forte-mente oligopolizado, permitindo, dessa forma, que o poder de ne-gociação ou mesmo de imposição desses grupos cresça à medida que o dos trabalhadores diminui. Isto somado ao fato de que, em poucos anos, haverá uma maior oferta de médicos no mercado, tornando quase certo que a famosa lei da oferta e da procura favoreça os “se-nhores da humanidade”.
Relações trabalhistasA entrada de investidores estran-geiros deve também provocar grande impacto no mercado de trabalho, nas relações entre mé-dicos e empresas de saúde. “O ca-pital estrangeiro é mais agressivo no que diz respeito à obtenção do lucro, essa é a prioridade máxima”, afirmou Eder Gatti, presidente do Simesp.
Para Gatti, a busca desenfrea-da pelo lucro vai precarizar ainda mais as relações de trabalho de todos os profissionais, inclusive do médico. “A tendência é ampliar a terceirização, ao mesmo tempo que não darão abertura para o mé-
Capa Capital Estrangeiro
defensor do livre mercado e dos benefícios da “mão invisí-vel” desse (outro termo criado por ele), Adam Smith reconhe-cia, já no século 18, que essa eli-te se guiava pelo seguinte lema: “Tudo para nós e nada para os outros”.
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dico empreendedor. Serão criados grandes conglomerados, empresas menores serão absorvidas pelas maiores. E nesses conglomerados cria-se uma dinâmica de linha de produção: o médico será mais uma engrenagem nesse sistema”, enfa-tizou o presidente do Simesp.
Atualmente já existem hospi-tais que trabalham numa dinâ-mica de telemarketing. No pron-to-socorro, por exemplo, o médico sofre uma pressão por quantidade, tendo que atender rapidamente os pacientes. “As previsões não são nada boas. Se hoje há exploração e insegurança, o cenário só tende a piorar no setor privado”, avaliou.
Sem sucessoO Brasil não é um caso isolado, lembrou Luna Filho. Há uma ten-dência global de que empresas da área de saúde procurem investir em países emergentes. Lugares onde, até então, quase sempre esse tipo de atividade era restrita, ao capital local (fosse ele privado ou público). “Melhorou a saúde da Índia?”, perguntou. “Não melho-rou”, o próprio respondeu.
A médica sanitarista Maria Angélica Borges também desta-cou, em programa disponível na internet, a mesma onda que se verifica, sobretudo, nos chama-dos países emergentes (como é o caso, entre outros, do Brasil e da China). No ano 2000, lembra a mé-dica, a Índia abriu o país ao capi-tal externo. “E ela não é nenhum exemplo de sistema de saúde para a população”, avaliou.
“O setor privado de saúde em mercados emergentes oferece retornos atrativos para os inves-tidores. Em contrapartida, inves-timentos estrangeiros em estru-turas privadas de saúde de países de renda média e baixa melho-raram pontualmente a qualida-de de serviços hospitalares alta-mente especializados acessíveis a clientela restrita, mas também foram responsáveis pela disputa predatória por recursos huma-nos, agravando a falta de médicos e de outros profissionais de saúde nos estabelecimentos públicos e nas áreas remotas. No Brasil, os padrões atuais já sugerem que o uso excessivo do setor privado promove concorrência desleal com o setor público, drenando serviços, recursos humanos e fi-nanceiros do SUS”, escreveu Má-rio Scheffer, professor do Depar-tamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP, no artigo “O capital estrangeiro e a privatização do sistema de saú-de brasileiro”.
“Com volatilidade e vocação especulativa, investimentos es-trangeiros escolherão leitos, exa-mes e procedimentos que geram altos retornos financeiros, prin-cipalmente serviços baseados em valores e preferências parti-culares, e que praticam a seleção adversa, afastando-se do atendi-mento a populações que vivem em áreas distantes de recursos as-sistenciais, do atendimento a ido-sos, crônicos graves, portadores de transtornos mentais e outros pacientes que demandam aten-ção contínua”, diz o mesmo arti-go, publicado em abril de 2015, na revista mensal Cadernos de Saúde Pública (produzida pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, ligada à Fundação Oswal-do Cruz).
Na esteira da nova lei, em 28 de novembro de 2015, a Folha de S. Paulo noticiou que a americana United Health comprou o Hospi-tal Samaritano de São Paulo por cerca de US$ 1,3 bilhão. Em 2012, a mesma companhia já havia ad-
>Segundo Ligia Bahia, a aprovação da lei atende pleito do meio empresarial
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Capa Capital Estrangeiro
quirido a operada Amil por US$ 4,9 bilhões, ainda de acordo com a reportagem.
“Pelo alvo ser um hospital fi-lantrópico, a transação levanta questionamentos. Os hospitais filantrópicos se beneficiam com isenção tributária sobre patrimô-nios, rendas ou serviços – benefí-cio que contribuiu para formar a estrutura que agora vai para uma empresa com fins lucrativos”, diz a matéria assinada por Claudia Collucci e Tatiana Freitas.
Para o professor Áquilas Men-des, da Faculdade de Saúde Públi-ca da Universidade de São Paulo (USP), é muito provável que ao invés de injetar dinheiro no país, empresas estrangeiras retirem mais capital do que o eventual-mente investido.
Além disso, lembra Mendes, fusões ou aquisições não signifi-cam, obviamente, um aumento do número de leitos ou da capa-cidade de atendimento já que a estrutura, geralmente, mantém-
se idêntica, mudando apenas os seus donos (leia entrevista a partir da página 6).
A reportagem da Folha de S. Paulo levanta outra questão im-portante: os hospitais filantrópi-cos, como é o caso do Samaritano, são obrigados por lei a destinar 60% da sua capacidade operacio-nal para atendimentos pelo Sis-tema Único de Saúde ou 20% dos atendimentos em serviços gratui-tos. Isso será ou mesmo tem sido respeitado?
É o fim do SUS como conhecemos?Dez dias antes de Dilma Rousseff aprovar, em definitivo, a lei 13.097, organizações da área da saúde di-vulgaram manifesto, em 9 de ja-neiro de 2015, pedindo que a presi-dente a vetasse. O texto é assinado pela já citada Ampasa e ainda por entidades como o Centro Brasilei-ro de Estudos da Saúde (Cebes), a Associação Brasileira da Saúde Coletiva (Abrasco) e a Associação Paulista de Saúde Pública.
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“O domínio pelo capital estran-geiro na saúde brasileira inviabili-za o projeto de um Sistema Único de Saúde e, consequentemente, o di-reito à saúde, tornando a saúde um bem comerciável, ao qual somen-te quem tem dinheiro tem acesso. Com a possibilidade do capital es-trangeiro ou empresas estrangei-ras possuírem hospitais e clínicas – inclusive filantrópicas, podendo atuar de forma complementar no SUS –, ocorrerá uma apropriação do fundo público brasileiro, repre-sentando mais um passo rumo à privatização e desmonte do SUS”, diz trecho do manifesto.
Para a médica sanitarista Ma-ria Angélica Borges, pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Públi-ca Sergio Arouca, a nova lei sacra-menta ou, ao menos, contribuirá bastante para o desmonte de toda a estrutura legal construída ao longo das últimas décadas na ten-tativa de efetivação do SUS.
“Todo o arcabouço do SUS é desenhado para dar condição de
igualdade para entidades munici-pais, estaduais, controle social etc. Nesse arcabouço, o SUS acaba até do ponto de vista da construção institucional que nós fizemos para ele”, avaliou no programa “Sala de Convidados”, do Canal Saúde, da Fundação Oswaldo Cruz.
Afinal, o Sistema Único de Saú-de se estrutura com a participação dos três entes federativos (União, estados e municípios) e, além disso, há uma série de instâncias, como os conselhos de saúde, para que a população e representantes do po-der público possam acompanhar a gestão e garantir a execução dessa política. Modelo que, na avaliação da médica, estaria ameaçado pela nova lei. “O arcabouço que a gente demorou 30 anos para construir e ter algum equilíbrio está jogado por terra”, lamentou.
Para a pesquisadora, a exemplo de outros especialistas no tema, o resultado dessa abertura não será “a expansão da capacidade insta-lada”. “É um movimento de fusões
e aquisições. É uma intensificação disso”, avisou Maria Angélica.
“Urge”, como escreveu o profes-sor Mário Scheffer, “uma agenda nacional de pesquisas que ofereça terreno para acompanhar o im-pacto do capital estrangeiro no processo de privatização nos vá-rios componentes do sistema de saúde: no financiamento, na pres-tação de serviços, na gestão e nos investimentos em saúde”.
“A gente está em outra conjun-tura. Era uma conjuntura de cres-cimento econômico”, lembrou Li-gia Bahia sobre a época do grande lobby e da posterior aprovação da nova lei, o que, em sua opinião, fez com que o capital estrangeiro ainda não se interessasse em in-gressar, de fato, no Brasil.
Em 23 de junho passado, o tema foi abordado no Simesp Debate, evento promovido pelo Sindicato para tratar de temas de interesse aos médicos. Na ocasião, Scheffer conclamou entidades ligadas ao setor e aos trabalhadores a se mo-bilizarem, a fim de que, daqui a alguns anos, “não cheguemos no ponto do que ocorreu com as OSs (organizações sociais), que foram surgindo, se disseminando” e ti-veram sua existência legitimada no país.
“Se há uma notícia boa nisso tudo, talvez seja a de que essa cri-se está reascendendo uma mobi-lização conjunta, de novo, em de-fesa da saúde enquanto direito”, pontuou, complementando: “Essa situação precisa ser acompanha-da de perto”. !
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Mário SchefferProfessor do Departamento de Medicina Preventiva
da Faculdade de Medicina da USP
Logo após a sanção pela presiden-te Dilma Rousseff, em 2015, a lei que escancarou a saúde ao capital estrangeiro foi ovacionada pelo setor privado e por vários gestores do SUS.
Agora liberado para se associar a hospitais privados e até filantró-picos, o capital estrangeiro já estava aí, nas empresas farmacêuticas, no varejo de farmácias e nos laborató-rios de diagnose, em muitas situa-ções de forma ilegal mas consenti-da por órgãos governamentais.
No caso dos planos de saúde, chamou atenção a rapidez com que a ANS e Advocacia-Geral da União (AGU) validaram a com-pra da Amil pela United Health em 2013, mas desde 1998 esse tipo de transação era previsto em lei. Por interpretação marota, hospi-tais que compõem rede própria de operadoras também já eram bene-ficiados por aportes estrangeiros.
Motivados por rendimentos elevados e por generosidades fis-cais e legislativas, poderão vir com mais intensidade os investi-mentos de empresas multinacio-nais, grandes bancos ou fundos especulativos, interessados na compra ou participação acioná-
ria em hospitais e outros serviços.Talvez assustado com as crises
econômica e política, o “novo” ca-pital estrangeiro ainda não desem-barcou em peso. A origem da lei, no entanto, antecipou reais interesses e expectativas. O tema foi inserido sorrateiramente, no apagar das lu-zes de 2014, em Medida Provisória (MP 656) que tratava de assuntos sem conexão com a saúde. O au-tor da emenda, um deputado do PMDB que quase virou ministro da Saúde, teve sua campanha fi-nanciada por plano de saúde.
No rastro de delações premia-das e da operação que apura nego-ciações em torno de MPs que vira-ram leis e beneficiaram empresas do setor automotivo, talvez pos-sam ser esclarecidas também as MPs que nos últimos anos atende-ram ao lobby do consórcio forma-do por planos de saúde e hospitais privados.
Segundo seus patrocinadores a lei permitirá expandir a capacida-de instalada de serviços hospita-lares, para que os planos de saúde possam aumentar sua clientela.
O capital que vem de fora tem preferência por leitos, exames e procedimentos que dão altos
retornos financeiros, e serviços por produção para atendimento de demandas individualizadas, como as clínicas populares de consultas nas periferias.
Tal movimento integra pauta antiga dos planos de saúde, que também pedem liberação de rea-justes de mensalidades, anistia de multas, mais subsídios públicos e obrigatoriedade de plano pri-vado para empregados, este últi-mo o teor da PEC 451, de Eduardo Cunha, mais um que recebeu di-nheiro do setor nas eleições.
Com rede própria insuficiente de média complexidade e especia-lidades, o setor público seria po-tencial comprador desses serviços e, portanto, avalista da expansão da rede privada via capital estran-geiro, como, aliás, ocorreu na edu-cação, que expandiu a oferta de cursos superiores, mas sem con-trapartida de qualidade.
Em cenário de desfinancia-mento público, o capital estrangei-ro chega como mais uma ameaça à universalidade do SUS, pois fará aumentar as despesas privadas, a segmentação de clientelas e as de-sigualdades de acesso no sistema de saúde brasileiro.
A quem interessa o capital estrangeiro na saúde?
Saúde em Questão
Revista DR! • 17
18 • Revista DR!
A utilização de agrotóxicos em lavouras prejudica o meio ambiente, conta-
mina o solo e também pode con-taminar a água se atingir lençóis freáticos, lagos, represas e rios. A terra que recebe grande quan-tidade desses produtos quími-cos é esgotada de tal forma que é preciso ser renovada. Para isso, o agricultor tem que utilizar outras áreas para o cultivo enquanto tra-ta o solo, geralmente com fertili-zantes químicos.
Esse processo de renovação é bem comum, já que em todo o Brasil existem mais de cinco mi-lhões de estabelecimentos agro-pecuários que fazem o cultivo conhecido como sistema tradi-cional (com uso de agrotóxicos), conforme dados do último censo do setor, realizado em 2006 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A prática contribui para o Bra-sil ser o país que mais consome agrotóxico no mundo, conforme o Relatório de Indicadores de Desen-volvimento Sustentável do IBGE, divulgado em 2015. São utilizados cerca de sete quilos de agrotóxicos por hectare, mais que o dobro do que era usado há 12 anos no plantio.
Além de ser prejudicial ao meio ambiente, tem alto custo para o produtor, como conta o agricul-tor João Carlos Fonte Basso, que utilizava o sistema. “A terra ficava ruim, tínhamos que gastar muito para renová-la e ficávamos um pe-ríodo sem plantar naquela área”, afirma. Ele destaca ainda que o custo maior era com a saúde. “Tí-nhamos vários problemas respira-tórios. Os médicos nos orientaram a parar de utilizar agrotóxicos”.
A médica Thaís Mauad, profes-sora de patologia geral na Faculda-de de Medicina da Universidade
Sustentabilidade
Plantação de produtos orgânicos no meio
acadêmico: a médica Thaís Mauad é coordenadora
da horta comunitária da FMUSP. Ao lado, a feira do
Parque da Água Branca
Revista DR! • 19
Por uma vida com menos agrotóxicosCultivo de alimentos orgânicos resultou em mais qualidade de vida para as famílias de pequenos agricultores, melhorou a renda e reduziu os danos à natureza
Nádia Machado
de São Paulo (FMUSP) alerta que o contato direto, por tempo pro-longado com agrotóxicos, também pode causar aumento da incidên-cia de cânceres, doenças neuroló-gicas e infertilidade.
Thaís coordena a Horta Co-munitária da FMUSP, criada com o intuito de introduzir os concei-tos de alimentação saudável, com ampla diversidade alimentar. A médica ressalta que o consumo de produtos com agrotóxicos incen-tiva a manutenção desse tipo de produção. “Estamos fomentando que grande parcela da população brasileira, que lida diariamente na lavoura com agrotóxicos, te-nha a saúde prejudicada”, alerta.
Segundo Maria Edna Tenório Nunes, pós-doutoranda em enge-nharia agrônoma, ligada ao Nú-cleo de Ecotoxicologia e Ecologia Aplicada, do Centro de Recursos Hídricos e Estudos Ambientais da
Escola de Engenharia da USP em São Carlos, o agricultor pode ter contato direto com o agrotóxico de diversas formas, entre elas, o manejo inadequado, a utilização incorreta dos equipamentos de proteção, e por meio de água con-taminada com o veneno.
“O agrotóxico aplicado nas fo-lhas das plantas pode atingir o solo, por meio da penetração da água da chuva, chegando aos len-çóis freáticos que, muitas vezes, são fontes de poços, ou até mesmo ser levado pela enxurrada para lagos e represas, nos quais o pro-dutor utiliza para o consumo pró-prio”, esclarece.
A produção orgânica é livre de produtos químicos porque a for-ma do cultivo é diferente. Nela a biodiversidade é responsável pela manutenção do solo, um organis-mo protege o outro, ao contrário da monocultura que é um prato
cheio para a proliferação de pra-gas. “Esse tipo de cultivo auxilia na renovação da terra, sem es-gotá-la, e acaba deixando o solo mais úmido”, explica Maria Edna.
Incentivo à agricultura familiarO agricultor João Carlos Fonte Bas-so, que citamos anteriormente, mantém uma pequena produção familiar na cidade de Jundiaí. A terra é herança do avô, que chegou da Itália em 1913. Até os anos 1980, o plantio era feito da forma tradi-cional. Após recomendação médi-ca, a família optou pela produção de alimentos orgânicos. “Hoje eu trabalho tranquilo, a saúde dos meus filhos também melhorou”, ressalta.
A renda da família aumentou a partir de 2002, quando começa-ram a comercializar seus produ-tos sem atravessadores, na Feira do Produtor Orgânico do Parque
20 • Revista DR!
da Água Branca. “Antes vendía-mos na Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo), mas quase não tínha-mos lucro”, relata.
A feira é gerida pela Asso-ciação de Agricultura Orgânica (AAO). Para comercializar no lo-cal é necessário ter certificação de que o produto, processo ou servi-ço obedece às normas e práticas da produção orgânica, conforme estabelecido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abasteci-mento (Mapa).
O evento acontece há 25 anos e, atualmente, auxilia cerca de 150 famílias a comercializarem produtos como frutas, verduras, legumes, laticínios, temperos e comida pronta de 45 pequenos produtores. Ademais, é possível comer quitutes orgânicos, como salgados, bolos, tortas e até pizzas e pastéis integrais.
Um dos objetivos da associação é acabar com o mito de que pro-dutos orgânicos são mais caros. “Quando o consumidor compra direto do produtor ele paga mais barato, porque não há interme-diário”, explica Márcio Stanziani, secretário-executivo da AAO e completa: “E ele consegue pagar mais barato, ainda, quando está na época da safra do produto”.
Sustentabilidade
> Em São Paulo, apenas 3.371 estabelecimentos produzem alimentos orgânicos
SERVIÇOA feira do Produtor Orgânico do Parque da Água Branca é realizada todas as terças-feiras, sábados e domingos, das 7h às 12h (Rua Francisco Matarazzo, 455, Barra Funda, zona oeste da capital paulista).
Produção de orgânicos Outro objetivo da AAO é que o produto orgânico seja mais aces-sível à população. O secretário-executivo da associação acredi-ta que a regulamentação da Lei 16.140, de março de 2015, da Prefei-tura de São Paulo, irá contribuir para isso, já que a proposta é ofe-recer 100% de alimentos orgâni-cos para toda a rede municipal de ensino no prazo de 11 anos a con-tar desde a implantação da lei.
“Para atender toda a deman-da da cidade será necessário que haja incentivo por parte do gover-no para ampliar a produção. Atu-almente, a agricultura familiar ainda está em segundo plano”, la-menta Stanziani. Segundo o Cen-so Agropecuário do IBGE, no Bra-sil existem pouco mais de 90 mil unidades de plantio de alimentos orgânicos. O mesmo levantamen-to mostra que, no estado de São
Paulo, dos mais de 200 mil estabe-lecimentos agropecuários, apenas 3.371 são voltados para a agricultu-ra orgânica. Destes, apenas 451 são certificados.
Na contramão ao incentivo da produção de alimentos orgâ-nicos, a Câmara dos Deputados instalou, em 12 de abril deste ano, uma comissão especial para ana-lisar o Projeto de Lei 3.200, de 2015, que trata sobre a regulamentação de agrotóxicos, o que não agra-dou aos órgãos de defesa ambien-tal. “A proposta é um retrocesso. Os ruralistas querem fazer com agrotóxico aquilo que consegui-ram fazer com transgênicos em 2005: liberar geral. Não bastasse o Brasil ser o país que usa a maior quantidade de agrotóxicos no planeta”, argumenta Rafael Cruz, da Campanha de Agricultura do Greenpeace, em nota divulgada pela instituição.
Revista DR! • 21
Qual é o seu problema?App oferece lista de hospitais com as melhores indicações para o paciente buscar atendimento
Adriana Cardoso
Tecnologia
Imagine se você tiver uma dor de
cabeça e poder, com um clique, en-
contrar o melhor tratamento para o
problema no melhor hospital, seja
público ou privado, e o mais próximo
de casa possível. Isso será factível
por meio do aplicativo que vem sen-
do desenvolvido pelo psiquiatra Feli-
pe Salles Neves Machado, 33 anos. O
dispositivo seria lançado no início de
julho para todas as plataformas exis-
tentes.
A ideia do App nasceu no ano
passado, a partir do seu Trabalho de
Conclusão de Curso (TCC) para o Mas-
ter em Liderança e Gestão Pública
(MLG) do Centro de Liderança Pública
(CLP), em parceria com a instituição
americana Harvard Kennedy School,
uma das melhores do mundo. A ins-
piração dele e de seu colega de cur-
so, o engenheiro Rodolfo Fiori, veio
dos sites e aplicativos de hospeda-
gem, como o Booking.com e Trivago,
pelos quais o usuário pode encontrar
a melhor e mais bem avaliada oferta
de hotéis por outros clientes.
“Durante a minha rotina de tra-
balho, percebi a insatisfação das
pessoas com o atendimento que re-
cebem, muitas vezes atribuída à falta
de humanidade do médico, quando
na verdade o problema está mais na
infraestrutura e falta de profissionais.
A partir dessa percepção, nossa ideia
foi a de organizar melhor o fluxo des-
sas informações para quem não tra-
balha na área de saúde e analisar os
motivos da insatisfação dos usuários
com o sistema de saúde”, conta.
Após a conclusão do MBA, o mé-
dico fundou uma startup para que
pudesse ir atrás de recursos para ca-
pitalizar seu projeto.
Ele participou de um edital (Vai
Tec) lançado pela Secretaria do De-
senvolvimento, Trabalho e Empre-
endedorismo da Prefeitura de São
Paulo, dentro do projeto Tech Sampa
promovido pela AdeSampa, lançado
em 2014 justamente para promover
projetos como os dele. Foi seleciona-
do para receber R$ 25 mil.
Com o dinheiro, ele contratou
uma agência para desenvolver a pla-
taforma. “Realizamos, com o apoio
de um gabinete da câmara munici-
pal, reuniões com as áreas técnicas
da Secretaria Municipal de Saúde e
com a Secretaria de Estado da Saúde
para implementar este projeto nos
estabelecimentos das redes públi-
ca e privada que atendam também
pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
A plataforma será o mais simples
possível para permitir que qualquer
cidadão faça uso dela”, diz.
Basta clicar a patologia e a região
onde está, e o usuário receberá uma
lista com as melhores indicações de
onde poderá buscar atendimento.
O App também permitirá que
os usuários deixem suas opiniões
sobre os serviços prestados, com a
finalidade de formar filtros nos mes-
mos moldes dos sites/aplicativos de
hospedagem, para auxiliar nas esco-
lhas dos outros.
“Queremos, a partir dessas opi-
niões, promover a humanização da
área da saúde, elencando os ser-
viços mais e menos humanizados.
Além disso, há equipamentos (públi-
cos e privados) subutilizados que as
pessoas nem sabem que são bons.
Queremos fazer a divulgação de for-
ma positiva”, conjectura.
Mais informações do projeto po-
dem ser encontradas no site www.
saluz.me
22 • Revista DR!
Especial Saúde do Médico
Precisamos falar sobre a sua saúde
As doenças que acometem médicos ainda permanecem um tabu, gerando uma
série de consequências graves não só aos profissionais, mas à assistência à população
Adriana Cardoso
Há um dito que circula entre profissionais da área médica, de que os médicos são bons para cuidar dos outros, mas displicen-tes quando se tornam pacientes. A princípio, podemos até achar graça, mas o assunto é bastante grave, pois as agruras que afligem quem zela pela saúde do outro ainda permanecem um tabu.
Pressionados durante a resi-dência médica; jornadas e plan-tões extenuantes no decorrer do exercício da profissão; carreira nada atraente na rede pública; planos de saúde que pagam va-lores irrisórios por consultas e procedimentos; e lidar com a li-nha tênue entre a vida e a morte de quem está sob o seus cuidados. É como abaixar a válvula de uma
panela de pressão impedindo que o vapor saia. Uma hora ela explode e é quando o médico adoece, seja física ou mentalmente. Incapaz de pedir ajuda, muitos acabam recor-rendo ao álcool e às drogas. Para piorar, muitas vezes os colegas de trabalho percebem o problema, mas fazem vistas grossas.
“Os hospitais não têm serviço de apoio (a profissionais com de-pendência química) e não sabem lidar com isso. Quando desco-brem, ou os demitem, ou fazem com que tirem férias, porém não solucionam o problema”, ressalta o psiquiatra Daniel Sócrates, es-pecialista em dependência quí-mica e doutor em psiquiatria pela Universidade Federal de São Pau-lo (Unifesp-SP).
Sócrates é um dos médicos da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (Uniad), serviço que ofe-rece auxílio psiquiátrico a depen-dentes de substâncias psicoativas com apoio do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Pau-lo (Cremesp).
A principal queixa dos mé-dicos que buscam auxílio, conta o psiquiatra, é da sobrecarga de trabalho. “É uma constante desde a residência até os 50 anos de pro-fissão”, diz.
Entre as especialidades mais vulneráveis à dependência aten-didos por Sócrates estão os clíni-cos-gerais, anestesiologistas e ci-rurgiões. A maioria é de homens e em faixa etária economicamente ativa (28 aos 50 anos).
Revista DR! • 23
Importante salientar que é ne-cessário ter predisposição genéti-ca para tornar-se um dependente químico. Mas o que, segundo o psiquiatra da Unifesp, diferen-cia a categoria é o fácil acesso à medicação (e à automedicação), especialmente a opioides, uma das substâncias-base das anes-tesias com potencial altamente viciante.
“Essa questão do opioide é mui-to grave! Muita gente não fala, os colegas não falam, a família não fala porque na maioria dos casos o profissional é o provedor do lar. Dificulta muito o fato de nin-guém falar a respeito”, critica Só-crates, que já se sentiu fracassado quando perdeu um paciente víti-ma de overdose após uma recaída.
O silêncio é tão devastador que não são incomuns casos de pro-fissionais que morrem de over-dose nos banheiros de hospitais e unidades básicas de saúde, o que faz Sócrates lançar um alerta: “A questão (da dependência química de médicos) precisa deixar de ser um tabu”.
Tão tabu que a reportagem da Revista DR! tentou falar com al-guns profissionais que enfrenta-ram o problema e nenhum deles quis contar sua experiência nem mesmo sob anonimato.
Outros malesDepressão, Burnout (esgotamen-to), transtorno bipolar, síndrome do pânico também são recorren-tes. Atualmente, 85 médicos estão
suspensos parcial ou totalmente pelo Cremesp devido a problemas relacionados à dependência quí-mica ou outros desses males. Es-ses casos chegam ao conselho por meio de denúncias, muitas vezes feitas pelos próprios pacientes ou diretores das localidades onde trabalham. Parece pouco, mas o número corresponde apenas àqueles que chegaram ao órgão.
O presidente do Cremesp, o psi-quiatra Mauro Aranha, expõe que a questão das drogas é o que mais preocupa, pois afeta diretamente o trabalho e pode levar o profissio-nal à morte. “O primeiro contato começa já na faculdade. Há muita oferta de drogas e bebidas. Além disso, muitos estudantes usam es-timulantes cognitivos, como deri-
Cél
io L
uigi
24 • Revista DR!
Especial Saúde do Médico
vados de anfetaminas, para conse-guirem estudar”, relata.
Ele mesmo já atendeu e ainda atende médicos com distúrbios diversos em seu consultório par-ticular. “A maioria dessas doenças têm fatores desencadeantes e há, obviamente, uma predisposição do paciente”, explica.
Aranha salienta que o perfil workaholic, aquele sujeito viciado em trabalho, está também entre os mais suscetíveis a sofrer um colapso.
Os médicos normalmente tra-balham muito para conseguir manter um padrão de vida que, muitas vezes, nem mesmo conse-guem desfrutar. Para o psiquiatra Luiz Antonio Nogueira Martins, também da Unifesp, a culpa de o médico virar um workaholic é precarização da medicina ocasio-nada pelos planos de saúde.
“A medicina piorou muito no geral. Mas, com o que pagam os convênios, os médicos são obri-gados a atender 20, 30 pacientes
(Da esquerda para a direita) O presidente do Cremesp,
Mauro Aranha, e os psiquiatras da Unifesp Luiz Antonio Nogueira Martins
e Daniel Sócrates veem com preocupação a saúde
dos médicos
por dia para ganhar uma quantia que valha a pena e isso é humana-mente impossível”, presume.
Por isso, ele acredita que o ca-minho para não surtar é buscar compensações. Ele próprio en-controu as suas envolvendo-se em pesquisas, participando de as-sociações.
O fim da linha pode ser a op-ção por tirar a própria vida. Um estudo conduzido por Cremesp/Unifesp há alguns anos aponta que a taxa de morte por suicídio nessa população foi de 4,2 por 100 mil no período de 2000 a 2009 no estado de São Paulo. A taxa é com-parável à da população em geral (4,6 por 100 mil).
Foram avaliados dados de 2.927 declarações de óbitos de médicos falecidos no estado naquele pe-ríodo, com idades entre 23 e 104 anos. O que mais surpreendeu é que a morte entre mulheres foi maior que a de homens.
O balanço da saúde física dos profissionais também preocu-
Revista DR! • 25
pa. Mauro Aranha conta que no mesmo levantamento feito pelo Cremesp as mulheres médicas morrem menos de câncer de colo de útero que as não médicas. Por outro lado, o índice de óbitos é igual para câncer intestinal. Ele atribui isso à falta de exames periódicos, como de sangue nas fezes, e uma alimentação desba-lanceada por conta de rotina de trabalho.
“É importante que os médicos reconheçam suas limitações e di-ficuldades, não se automediquem e busquem ajuda”, aconselha Ara-nha.
ResidênciaA saúde do médico passou a in-teressar Luiz Antonio Nogueira Martins quando fazia residência na Unifesp. Ele fez uma pesquisa para o doutorado sobre o tema em 1994, que acabou virando um li-vro (“Residência Médica, Estresse e Crescimento”, Editora: Casa do Psicólogo).
“A residência é o ponto de con-vergência da profissão. O médico se sente refém quando sai dela, pois é jogado no mundo, terá que decidir sozinho. Quando come-ça a trabalhar, ele está cheio de ideias, mas esbarra nas dificul-dades do dia a dia, na falta de in-fraestrutura e é quando começa a sua frustração”, salienta.
Ao longo da residência o pro-fissional passa a lidar com pro-blemas do mundo real, que não existiam na graduação, como a responsabilidade profissional, os plantões, o assédio e as pressões. A concorrência entre os próprios residentes é bastante pungente nessa fase, segundo Martins.
“O primeiro ano da residência é o mais estressante. Basicamen-te ele é muito inexperiente e tem que lidar com o não saber”, avalia.
Na outra ponta desse ciclo, o fim da carreira também é difícil. “Ele não fez outra coisa na vida. Formou-se médico e vai morrer médico. Se deixa de fazer isso é
como tirar um membro do corpo – ele perde a razão de existir. Parar, assim como começar, também é um processo difícil que pode levá--lo a adoecer”, observa Martins.
Mauro Aranha, do Cremesp, reforça ainda que, quando algo não vai bem na saúde, o médico normalmente é culpabilizado. “As iniciativas governamentais vão mais no sentido de culpá-lo pelos problemas em vez de ajudá-lo em suas agruras.”
Diante da importância que o médico tem na vida da popula-ção, é imprescindível que cuide de si. Aranha confessa que já teve depressão duas vezes (“não por causa do trabalho, mas por proble-mas pessoais”) e se tratou. Martins também já teve suas “crises” quan-do principiante e Daniel Sócrates cuida da mente para poder ajudar os outros.
Ter problemas, adoecer física ou mentalmente é da condição humana. É preciso falar disso sem culpa ou vergonha.
Div
ulga
ção
26 • Revista DR!
O psiquiatra Saulo Ciasca, apaixonado pelo teatro, interpreta o interno de um hospício do século 19 em sua
primeira experiência como ator profissional
Leonardo Gomes Nogueira
De médico ao louco
Metalinguagem é quan-do usamos uma de-terminada linguagem
para falar da própria. Também é, outra definição possível, a “lingua-gem utilizada para descrever outra linguagem ou qualquer sistema de significação”, segundo o dicioná-rio Aurélio. Não é incomum, por exemplo, a realização de peças ou filmes nos quais se fala da própria montagem.
Um bom exemplo é “Oito e Meio” (ou apenas 8 ½), de Federi-co Fellini, no qual o personagem interpretado por Marcello Mas-troianni tem algum tipo de blo-
queio criativo e, por isso, sofre para levar adiante o seu novo fil-me. O “branco” do cineasta fictício toma a tela de Fellini de assalto, inclusive e, sobretudo, na ofus-cante fotografia do filme.
Assim como a “loucura” to-mará conta do psiquiatra Saulo Ciasca nos minutos que antece-dem um dos últimos ensaios da peça “Marat – Sade”, que ficou em cartaz entre os meses de maio e junho na cidade de São Paulo. A montagem, do Teatro da Pequena Morte, é inspirada num drama musical do autor alemão e tem di-reção de Reginaldo Nascimento.
A peça em si é metalinguística e mostra a encenação, feita pelos internos de um hospício em 1808, do assassinato do médico e revo-lucionário francês Jean Paul Ma-rat. “Dirigida pelo ferino Marquês de Sade, a peça apresenta embates fictícios entre o ex-marquês e o revolucionário acerca da política, dos conflitos sociais e da própria condição humana”, diz o texto de apresentação da peça.
O psiquiatra Saulo Ciasca in-terpreta um desses internos. “Um louco bem louco”, brinca. “Eu faço um louco... O que eu acho muito legal porque eu sou psiquiatra”,
Horas Vagas Teatro
Revista DR! • 27
diz. “Quando eu faço o louco eu uso um monte de experiências que tive com pacientes meus”, afirma.
“Naquela época, não eram só pessoas com questões, proble-mas mentais, tinham pessoas que também eram presos políticos”, ressalta, ao explicar o perfil dos indivíduos internados, naquele momento, nessas instituições.
Ele lembra que o próprio Sade ficou internado no hospício no qual se passa a peça. “É uma peça dentro de uma peça”, resume, de forma simples, a metalinguagem contida na montagem. “Um dos loucos, um dos internos desse hospício, que é o Marquês de Sade, dirige a peça”, diz. “Mas tem uma intenção por trás, que é fazer os loucos se revoltarem”, conclui.
É importante contextualizar: 1808, ano no qual se passa a peça, era um tempo de grande agitação política por causa da ainda recen-te, na época, é claro, eclosão da Re-volução Francesa, em 1789. O líder revolucionário Jean Paul Marat, ao qual ambas se referem (lem-
bremos que há uma peça dentro da outra), havia sido assassina-do em 1793 (muitos anos antes, portanto, da montagem realiza-da pelos internos do hospício de Charenton sob direção do famoso escritor libertino).
O médico, formado pela Facul-dade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) em 2006, diz que sempre gostou de teatro e que retomou contato com ele por meio de uma pós-graduação em psico-drama.
“É uma modalidade, uma téc-nica psicoterápica na qual a gente usa muitos elementos do teatro para atender pacientes”, explica. “Eu já gostava de teatro antes, re-solvi fazer psicodrama”, acrescen-ta o psiquiatra.
Por causa do seu interesse pela área, Ciasca fez um curso profis-sionalizante no tradicional Teatro Escola Macunaíma. Ao se formar, em dezembro de 2015, ele foi con-vidado para participar da peça que tem alguma ou bastante familiari-dade com a sua outra área de atu-
>Psiquiatra usa experiência com os seus pacientes para interpretar personagem na peça “Marat Sade”
ação. Na data da entrevista, aliás, o médico estava a poucos dias de formalizar o registro, em sua car-teira de trabalho, que atesta que agora ele é um ator profissional.
A partir de 2011, Ciasca come-ça a trabalhar no Ambulatório Transdisciplinar de Identidade de Gênero e Orientação Sexual (Am-tigos), do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Facul-dade de Medicina da USP. “A gen-te atende crianças e adolescentes transgêneros”, resume.
Boa parte ou, até o momento, a totalidade da trajetória profissio-nal do médico está ligada ao ins-tituto de psiquiatria já citado. Ele foi residente em psiquiatria entre os anos de 2007 e 2009 e preceptor no mesmo instituto de 2010 a 2011. De 2011 até hoje, ele se integrou ao Amtigos.
“A gente tem alguns quadros que exigem internação. Mas são breves”, diz. “A psiquiatria mo-derna não preconiza mais uma internação de longuíssimo prazo”, ressalta.
28 • Revista DR!
+ SIMPLES+ BENEFÍCIOS+ INFORMAÇÃOBAIXE NOSSO APLICATIVONO SEU CELULAR OU TABLETE FIQUE A POUCOS CLIQUESDAS NOVIDADES DO SIMESP+DAS NOVIDADES DO SIMESP+E DAS NOSSAS PUBLICAÇÕES:
• TV SIMESP
• REVISTA DR!
• JORNAL DO SIMESP
• REDES SOCIAIS
[email protected] ou 11 3292.9147
Revista DR! • 29
Redes Sociais
Logo abaixo do nome do blog “Medicina Baseada em Evi-
dências”, uma linha fina traz a seguinte explicação: “in-
terpretação de evidências científicas com foco especial na
área cardiovascular e discussão de conceitos referentes à
metodologia científica”.
Em um post de 12 de dezembro de 2014, o cardiologista
Luís Cláudio Correia, 46 anos, professor-adjunto da Escola
Bahiana de Medicina e Saúde Pública, em Salvador, sinte-
tiza a ideia de onde queria chegar quando decidiu colocar
tudo o que pensava sobre como deve ser um protocolo mé-
dico: “Não há evidência para tudo”. O título, na verdade,
vai na contramão do que ele próprio pensa. Trata-se de uma
assertiva – da qual Correia lança mão para provocar um de-
bate sobre a postura profissional – comumente usada por
médicos na promoção da “liberdade de definir condutas
médicas com base em suas próprias crenças”.
Quando criou o blog em 2010, Correia pretendia pro-
mover, dentro de um espaço acessível a todos, discussões
metodológicas de importantes trabalhos publicados na li-
teratura médica. Usando tais artigos como exemplos, ele
procura transmitir conhecimento de técnicas de análise crí-
tica da confiabilidade e relevância de evidências, trazendo
reflexões quanto à necessidade de hipóteses lógicas serem
comprovadas experimentalmente antes da incorporação na
decisão médica.
“A ideia do blog partiu da percepção de uma lacuna en-
tre o pensamento médico tradicional e a forma científica de
pensar. Por vezes, o pensamento médico é pouco científico
e baseado em crenças que, por sua vez, são baseadas em
sofismas”, diz o também coordenador científico do Hospi-
tal São Rafael, na capital baiana.
O médico aponta para a necessidade de se colocar a
arrogância sob o jaleco. “No paradigma científico devemos
experimentar em cima de hipóteses para ver se são verda-
deiras ou não, mas há uma arrogância epistêmica de profis-
sionais que fazem afirmações sem experimentações”, frisa.
No blog, o cardiologista também discute outros temas
inerentes à prática médica, além de trazer vídeos com en-
trevistas, como a que fez com o médico alemão Franz Porz-
solt, criador do conceito de “economia clínica”.
Ciência mais importante que a crença
Adriana Cardoso
Cardiologista defende em blog a importância de se pautar condutas médicas em informações cientificamente comprovadas
>"Há uma arrogância epistêmica de profissionais que fazem afirmações sem experimentações", diz Luís Cláudio Correia
Mais informações: www.medicinabaseadaemevidencias.blogspot.com
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30 • Revista DR!
Simesp por Dentro
Memória Associado
A criação do estatuto do Sindicato
O primeiro estatuto do Sindica-to dos Médicos de São Paulo (Si-mesp) foi aprovado logo após sua fundação, em 1929. O documento com cinco capítulos estabelecia os objetivos da entidade, ainda de forma muito abrangente. No primeiro artigo do Capítulo 1, por exemplo, definia como atribuição do Sindicato uma “(...) associação destinada a promover o estudo, a defesa e o desenvolvimento dos interesses gerais da profissão mé-dica e dos interesses profissionais e econômicos de seus membros”.
O aprofundamento das dis-cussões, em defesa da categoria, sobre as questões trabalhistas fo-ram sendo moldadas nos anos se-guintes, pois o Sindicato ficou sob
o controle e fiscalização do Estado durante um longo período. O Si-mesp cuidava “apenas das ques-tões de ordem moral” da categoria, como explicou Flamínio Fávero, primeiro presidente da entidade, durante um discurso em 1931.
Os objetivos estabelecidos no primeiro estatuto se confundem com os do conselho de ética pro-fissional, órgão que foi criado apenas três décadas depois, tra-tando de temas como ética mé-dica, fiscalização e princípios da atividade profissional, além do controle, fiscalização e denúncia do exercício ilegal da medicina. As atividades dos membros do Sindicato resultaram na elabora-ção de um Código de Ética Médica.
Sindicalizado desde o ato de posse da atual gestão do Si-mesp (2014-2017), em junho de 2014, Felipe Corneau sempre foi engajado na defesa da categoria. Formado pela Fa-culdade de Medicina da USP, em 2011, participou do Centro Acadêmico Oswaldo Cruz e da Direção Executiva Nacio-nal dos Estudantes de Medici-na (Denem).
Ele conta que acompanhou as discussões sobre o reajuste salarial dos médicos que pres-tam serviço à Prefeitura de São Paulo, por meio de organiza-ções sociais, na qual o Simesp conquistou melhores reajus-tes, além das denúncias contra as irregularidades na terceiri-zação do serviço público.
Felipe espera que o Simesp continue defendendo os mé-dicos e que consiga se envol-ver cada vez mais na luta por um Sistema Único de Saúde (SUS) de qualidade. “O Sindi-cato é importante para termos nossos direitos respaldados, mas também para nos ajudar a construir um sistema que nos permita cuidar melhor da saúde das pessoas”, enfatiza.
Felipe Gonçalves CorneauEspecialista em Medicina de Família e Comunidade
>Primeiro estatuto definia objetivos da entidade de forma abrangente
Revista DR! • 31
O jornal O Estado de S. Paulo, na sua edição de 20 de julho de 2015, publicou reportagem cuja man-chete "Governo federal cria novos cursos de medicina em cidades sem estrutura" chamava a aten-ção para um fato inquietante: a proliferação de faculdades de medicina em nosso país sem a preocupação com a qualidade da formação do médico brasileiro.
A reportagem trata de dois editais publicados pelo Ministé-rio da Educação (MEC), que sele-cionam e pré-selecionam muni-cípios para albergarem escolas de medicina, todas particulares. O primeiro selecionou 36 cidades, principalmente do Sul e Sudes-te, e o segundo pré-selecionou 22 para o mesmo fim, no Norte, Nor-deste e Centro-Oeste.
Surpreendentemente, a maio-ria das cidades não atende aos próprios critérios definidos pelo MEC para este fim: 20 dentre as 36 selecionadas não atendem ao critério de cinco leitos do SUS por aluno. Apenas seis possuem ou estão inseridas em regiões de saúde que contam com um hospi-tal de ensino.
Artigo
Os últimos anos testemunha-ram um exagero na abertura de novos cursos de medicina no Brasil. Entre 1808, ano da inaugu-ração da 1ª escola (Faculdade de Medicina da Bahia), e 1994 surgi-ram 82 faculdades de medicina. De 1995 até o princípio deste ano de 2016, foram 184. Só nos últimos três anos, 88.
O cenário posto é o de grande expansão de vagas e de cursos em nosso país. Há uma expectativa de que teremos entre 350 e 450 escolas de medicina na próxima década, a persistir a tendência atual. Haverá infraestrutura ade-quada, corpo docente qualificado, hospitais de ensino e cenários de prática para toda essa estudanta-da no Brasil?
São pontos de inquietação do Conselho Federal de Medicina (CFM). Há preocupação com a qualidade da formação do médi-co a refletir diretamente na qua-lidade da assistência do paciente brasileiro.
O CFM tem um histórico de luta pela avaliação do ensino mé-dico no Brasil. Sempre pugnou por uma avaliação progressiva e for-
mativa do estudante de medicina, devolutiva para a escola e que haja consequências, o que lamentavel-mente não tem ocorrido no Brasil. Escolas mal avaliadas continuam abertas, formando profissionais de qualificação questionável.
Há duas frentes de ação: criou o CFM, em parceria com a Associa-ção Brasileira de Educação Médica (Abem), o Sistema de Acreditação das Escolas Médicas (Saeme) e ex-ternou integral apoio à Avaliação Nacional Seriada dos Estudantes de Medicina (Anasem).
O Saeme está em progresso, sob a coordenação do professor Milton Arruda, avaliando 31 esco-las médicas que voluntariamente se apresentaram para a acredita-ção. Sua avaliação autônoma, ex-terna e independente do governo e o prestígio das instituições pro-motoras conferem ao programa alta credibilidade.
A Anasem, avaliação seriada dos estudantes de medicina no 2º, 4º e 6º anos, por suas característi-cas formativa, devolutiva e con-sequente, prospecta ótimas novi-dades para a formação do médico brasileiro.
Pela qualidade da formação do médico brasileiro
Lucio Flávio Gonzaga Silva Professor da Universidade Federal do Ceará e conselheiro
do Conselho Federal de Medicina (CFM)
32 • Revista DR!
Eu e a Medicina Crônica
Dona Brasilina represen-tava o país até no nome. Era idosa, subnutrida,
desletrada, mal cuidada e com pobre saúde bucal, infelizmente, vítima das precárias condições sociais que desafortunadamen-te teve. Contudo, sentia-se quase que uma rainha pela atenção que nós dávamos a ela, na enfermaria de mulheres, durante nosso inter-nato de clÍnica médica há quase quatro décadas.
Éramos instruídos a chamar o paciente pelo nome. Sempre solíci-ta, não se furtava quando reitera-damente era indagada pelos grupos de internos que se revezavam – ávi-dos em aprender! – em repetir in-formações e em disponibilizar seu arqueado corpo para o estudo dos sinais que lhe eram abundantes.
Numa época em que os recur-sos diagnósticos se baseavam tão somente na anamnese, exame
Morte Compensada
Helio Begliomini
físico, estudo radiológico, eletro-cardiograma e exames laborato-riais era de se supor as dificulda-des que se tinha no aprendizado e no exercício da profissão. Um dos aforismos que muito sucesso fa-zia – repetido à exaustão desde o ensino da semiologia – era de que “A Clínica é Soberana”.
Dona Brasilina parecia não se importar com a permanência de semanas e semanas ou até de me-ses internada numa enfermaria coletiva de cerca de 20 pacientes. Ao contrário, parecia que até gos-tava, pois fazia daquele singelo es-paço sua morada, além de ter sua autoestima elevada pela atenção e carinho que recebia.
Apesar do bom humor de dona Brasilina, em sua última inter-
Membro da Academia de Medicina de São Paulo; urologista do Hospital do Servidor Público Estadual e do Imuvi; e associado do Simesp
Revista DR! • 33
Cél
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nação ela apresentou um quadro incipiente de consumpção: ina-petência, lento emagrecimento, tosse e sudorese. Nas discussões diárias com o preceptor, após a evolução da paciente, sempre co-gitávamos quadro de tuberculo-se. Por mais que pesquisássemos radiológica e laboratorialmente não conseguíamos ratificar essa hipótese diagnóstica. Orientações para a correção dos distúrbios hi-droeletrolíticos, da albumina, da mecânica pulmonar com inala-ções e tapotagens, dentre outros, parâmetros eram rotineiras.
Os dias foram se sucedendo e o quadro clínico de dona Brasili-na ficava cada vez pior. Lembro-me que, muito aflitos, chegamos até a discutir asperamente com o
preceptor sobre a possibilidade de se instituir um teste terapêutico, tendo em vista a forte suspeita de tuberculose, apesar da ausência de comprovação laboratorial. De-balde. A intransigência era gran-de de nosso orientador, visto que na clínica aprendíamos que era indispensável saber o diagnósti-co para se empreender a melhor conduta terapêutica. Ademais, estávamos lá para aprender e de-veríamos cumprir determinações superiores: persistir na pesquisa laboratorial, dar suporte clínico e compensar parâmetros séricos em desacordo com a normalidade.
Mais alguns dias, e dona Bra-silina entra em estado de obnubi-lação e se torna hiporreativa. Sur-preendentemente a pesquisa do
bacilo de Koch se faz presente no escarro, e, curiosamente, outros parâmetros pesquisados encon-tram-se equilibrados.
A terapêutica para a tubercu-lose fora prontamente ministra-da, contudo, mostrara-se ineficaz, pois, em poucos dias sucessivos, ela, já muito debilitada, veio a óbito, perplexamente com diag-nóstico e compensada!
O conceito de medicina ba-seada em evidências viria a ser cunhado décadas depois. Hoje em dia, numa época em que predomi-na o tecnicismo e o uso desmesu-rado de aparelhos em detrimento da propedêutica, seria anacrônico dizer que “A Clínica ainda é Sobe-rana”? Ou melhor: que o “Raciocí-nio Clínico é Soberano”!?
34 • Revista DR!
Elas deixaram de ser um espaço exclusivo para leitura, diversificaram seus serviços com inclusão
de tecnologia, saraus literários, contação de histórias e continuam vivas, atraindo público de
todas as idades e classe sociais
Adriana Cardoso
Bibliotecas modernizadas
Desde o boom da internet, princi-palmente ao longo dos anos 2000, as bibliotecas foram forçadas a agregar a tecnologia para conti-nuar atraindo público e existindo. Sim, a maioria delas ainda não perdeu sua característica prin-cipal, que é a de ser um grande acervo de livros. Mas tiveram que diversificar para continuarem atraentes ao leitor. Com a dissemi-nação do acesso à rede mundial, deixaram de ser apenas locais de pesquisa (até porque muita gente hoje faz isso do computador de casa) para se transformarem em espaços lúdicos, com atividades para formar novos leitores, pro-mover debates e entreter toda a família.
“A biblioteca é a casa da pala-vra e o pensamento precisa de li-berdade”, sintetiza Pierre Andre
Ruprecht, diretor-executivo da Associação Paulista de Bibliotecas e Leitura (SP Leituras), uma orga-nização social sem fins lucrativos responsável pela gestão de alguns dos símbolos mais importantes da cultura do estado, como a Sala São Paulo, a Pinacoteca e as duas úni-cas bibliotecas atreladas à esfera estadual na cidade – a Biblioteca de São Paulo (BSP), no Carandiru, região central, e seu braço caçula, a Biblioteca do Parque Villa-Lobos, na zona oeste.
O modelo de biblioteca como conhecemos, na opinião de Ru-precht, não corresponde mais à realidade atual. “Há uma enorme diferença entre um local abarro-tado de prateleiras de livros e uma biblioteca. O que diferencia uma coisa da outra são as ações e ser-viços. Por essa razão, nosso projeto
está calcado na ideia de uma bi-blioteca viva”, elucubra.
A própria construção da Bi-blioteca de São Paulo possui mui-tos significados. Muita gente deve lembrar-se que, por quase 50 anos, aquela área abrigou a Casa de De-tenção de São Paulo, popularmen-te conhecida como Carandiru, que foi parcialmente demolida em dezembro de 2002 para dar lu-gar ao Parque da Juventude, onde fica a BSP. A prisão, famosa após o massacre de 111 presos pela polícia num episódio bastante controver-so em 1992, hoje é um espaço de la-zer e cultura.
O local recebe cerca de mil pessoas diariamente (27 a 28 mil por mês), sendo boa parte delas formada por moradores de rua do entorno que vão ler jornais e usar a internet gratuitamente.
Cultura
Revista DR! • 35
Nos moldes do que acontece des-de sempre, os associados podem emprestar livros e levá-los para casa. Há também Kindles (leito-res eletrônicos) disponibilizados apenas no local para que as pes-soas os conheçam (“mas elas não se interessam muito”, diz Rupre-cht, numa demonstração de que nem nas bibliotecas esse modelo se popularizou). Há também sa-raus, debates e uma programa-ção mensal variada.
Inaugurada em dezembro de 2014, a Biblioteca do Parque Villa-Lobos, mais voltada à fa-mília, recebe gente não só que vai ao parque exercitar-se, mas a população da região metropo-litana, como Osasco e Franco da Rocha. São 2.500 por dia no fim de semana e, segundo Ruprecht, a frequência só cresce.
Em linha com a tecnologia, há uma sala com jogos de videoga-mes, luaus literários e musicais, contação de histórias e um espaço lúdico (Bebelê) que busca incenti-var a leitura de crianças dos zero aos quatro anos.
Mário de AndradeA biblioteca que leva o nome de um dos maiores poetas e escrito-res brasileiros, é a segunda maior biblioteca pública do país (só per-dendo para a Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro) e, segundo Tar-cila Lucena, supervisora do depar-tamento de Ação Cultural da uni-dade, a vigésima do mundo. Foi inaugurada em 1926, na Rua Sete de Abril, como Biblioteca Munici-pal de São Paulo, e só em 1942 mu-dou-se para o prédio atual, na Rua da Consolação, no Centro.
E por que Mário é o seu patro-no? Porque foi ele quem criou na década de 1930 o departamento que veio a ser, mais tarde, a Secre-taria Municipal de Cultura. Deste departamento, nasceu a ideia de uma biblioteca que agregasse toda a história cultural da cidade e do país. Mário, que também foi um grande ativista cultural, musicis-ta e folclorista, defendia a arte e a cultura como um bem comum. A BMA só ganhou seu nome na dé-cada de 1960.
Projetado pelo arquiteto fran-cês Jacques Pilon, o prédio da BMA é considerado um marco da arquitetura moderna do país e, por essa razão, é tombado pelo patrimônio histórico e cultural da cidade. Além disso, guarda um acervo valioso de obras raras, her-dadas de bibliotecas particulares
>No lugar onde antes era uma casa de detenção, Biblioteca de São Paulo virou um importante espaço de cultura e lazer
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36 • Revista DR!
Cultura
de gente do calibre de Paulo Pra-do, poeta e escritor organizador da Semana de Arte Moderna de 1922 (da qual Mário também foi uma das vozes mais importantes); e de Batista Pereira, advogado e genro de Rui Barbosa. Na seção, há 52 mil livros, quase 9 mil periódicos e outros documentos que só podem ser consultados no local.
A importância da Mário de An-drade para a cidade (e para o país) é tamanha que, em 2005, obteve status de departamento pela Se-cretaria Municipal de Cultura, ga-nhando, assim, autonomia admi-nistrativa. De 2007 a 2010, passou por uma grande reforma, tendo sido reinaugurada em 2011.
Com a reforma, o contato do público com o acervo (são mais de 53 mil livros, além de periódicos,
mapas) ficou mais fácil. A tecno-logia também ganhou lugar. “Não podemos encarar a cultura digital como ameaça”, frisa Tarcila.
A rede Wi-Fi foi melhorada com a reforma (“pega em qualquer lugar da biblioteca”, afirma Tarci-la) e iniciou-se um grande projeto de catalogação digital do acervo. “Temos outros projetos de longo prazo, como fazer uma platafor-ma com lançamentos de e-books (livros eletrônicos) em parceria com as editoras”, antecipa a super-visora, que tem experiência de dez anos no mercado editorial.
Outro projeto de sonho é levar a biblioteca para uma nuvem digital, o que permitiria às pessoas acessa-rem o acervo de qualquer lugar.
A programação cultural tam-bém é diversificada, com música,
> As bibliotecas municipais Hans Christian Andersen e Monteiro Lobato são focadas no público infanto-juvenil
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Revista DR! • 37
> Localizada no coração de São Paulo, a Mário de Andrade é a segunda maior biblioteca pública do país
debates, teatro, artes em geral. São as várias linguagens se encon-trando num mesmo lugar.
Vocação particularDas 52 unidades diretamente li-gadas à coordenadoria do sistema municipal de bibliotecas, 28 pos-suem telecentros para acesso à internet. “Antigamente, as biblio-tecas eram mais voltadas a aten-der o aluno. Com a proliferação da internet, perderam muito dessa função”, diz Waltemir Nalles, co-ordenador de bibliotecas da Secre-taria Municipal de Cultura.
Por isso, investiu-se na diversi-ficação de programações culturais, pois, no entender de Nalles, os li-vros não são a única ferramenta para formar leitores. “O mundo forma leitores. A literatura tem di-
versas linguagens”, filosofa.Abrir as portas das bibliotecas
à comunidade, como quem abre as portas de casa, tem sido a estra-tégia utilizada para atrair público. Ainda, usufruir do potencial de cada uma.
Dois bons exemplos são as vol-tadas ao público infantil Hans Christian Andersen, que home-nageia o escritor dinamarquês de livros infantis (quem nunca ouviu falar de “O Soldadinho de Chumbo” e “O Patinho Feio”?), no Tatuapé, zona leste da cidade; e a tradicionalíssima Monteiro Lo-bato (dispensa apresentações), no Centro, concebida por Mário de Andrade, e que completou 80 anos este ano. Ambas já tinham apelo aos pequenos e às mamães e a coor-denação aproveitou-se disso.
Outro belo exemplo de ocupa-ção pela comunidade aconteceu na Menotti Del Picchia, no bairro do Limão, na zona norte. “A biblio-teca fica num lugar escondido, numa rua sem saída. As pessoas invadiam, depredavam o prédio, pois não havia uma interlocução com a comunidade. Houve, então, uma aproximação com a popula-ção local, como cantores de hip- hop, e hoje, o espaço é totalmente diferente”, elogia Nalles.
O coordenador defende que esses espaços públicos devem ir atrás das pessoas em vez de espe-rá-las. “As bibliotecas são um lu-gar de interlocução e devem fazer sentido para a comunidade, como escolas, moradores do entorno. Essa é a receita para serem um cir-cuito de sucesso”, acredita.
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A Faculdade de Medicina da Uni-versidade de São Paulo (FMUSP) tem passado por uma mudança na grade curricular, para que o aluno possa despender mais tempo em atividades de pesqui-sa fora da sala de aula. Boa parte desse tempo, segundo a coorde-nação da biblioteca da unidade, é despendido lá.
“A missão de uma biblioteca universitária é diferente da de uma biblioteca pública. Nosso público-alvo é a comunidade aca-dêmica e, mais especificamente, da área de medicina”, diz Rosa Maria Fischi, bibliotecária super-visora do Serviço de Promoção e Divulgação da biblioteca.
Documentos foram digitali-zados e podem ser acessados a distância. É nesse ponto, segun-do Rosa, que se torna muito im-portante o papel da biblioteca, de servir como uma espécie de
filtro ao que é ou não mais rele-vante.
Apesar da possibilidade de aces-so ao acervo a distância, a frequên-cia de alunos é grande. “A bibliote-ca dispõe de espaço interativo, com ambiente e equipamentos prepa-rados para tornar mais acolhedor e descontraído o estudo. É um am-biente que estimula a leitura, a pes-quisa e o aprendizado colaborativo dos estudantes”, diz.
Oficialmente conhecida como Divisão de Biblioteca e Documen-tação da FMUSP, a unidade foi fundada em 1912, junto com a fa-culdade. Teve apoio financeiro da Fundação Rockfeller, dos Estados Unidos, e tem seu acervo (51.582 livros, 11 mil teses entre outros) organizado de acordo com a clas-sificação da National Library of Medicine (EUA), uma das mais re-putadas, se não a mais, na área de medicina.
ServiçoPara saber maisBiblioteca Mário de Andrade www.bma.sp.gov.brBiblioteca de São Paulowww.bsp.org.brBiblioteca Parque Villa-Lobos www.bvl.org.brBiblioteca da Faculdade de Medicina da USPwww.fm.usp.br/bibliotecaPara informações sobre as bibliotecas do município de São Paulo www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/bibliotecas
Estão disponíveis também e-books que podem ser acessa-dos do celular dos alunos, atlas anatômicos em três dimensões, além de uma série de iniciativas em andamento para facilitar o estudo.
Cultura
> Estabelecimento disponibiliza documentos digitalizados que podem ser acessados de qualquer lugar
Frequência à biblioteca da FMUSP aumenta com redução de tempo em sala de aula
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Revista DR! • 39
Pedagogia do oprimido na saúdeLeonardo Gomes Nogueira
O livro De que Adoecem e Morrem os Trabalhadores na
Era dos Monopólios - A Violência do Trabalho no Brasil, or-
ganizado pelo médico Herval Pina Ribeiro, é o capítulo final
de um trabalho de mais de 30 anos.
Lançado no final do ano passado, o livro foi precedido
por uma obra anterior, de 1984, intitulada De que Adoecem
e Morrem os Trabalhadores. Ambas, ressalta o médico for-
mado pela Universidade Federal da Bahia, abordam as rela-
ções entre trabalho e saúde.
O lançamento em 19 de novembro de 2015, deu-se em
meio a um ciclo de debates realizado na Faculdade de Saú-
de Pública da Universidade de São Paulo (USP).
A ideia, conta o médico, doutor em saúde pública pela
USP, é que essa discussão possa “sair da academia e pas-
sar para a prática, para a classe trabalhadora”. “A preocu-
pação é justamente ter uma bibliografia, um conhecimento
que você possa, realmente, devolver aos trabalhadores”,
ressalta.
Não por acaso, Herval Pina Ribeiro tem realizado deba-
tes em sindicatos e outras organizações sociais para discu-
tir os assuntos abordados na obra. “A intenção é de forma-
ção de interlocutores”, resume.
“Esse livro, digamos assim, é de pedagogia na saúde.
Pedagogia dos oprimidos na saúde”, sugere. O médico se
refere ao famoso método criado pelo educador Paulo Freire
(1921-1997).
No livro Pedagogia do Oprimido, escrito no final dos anos
1960, Freire relaciona todo o aprendizado ao contexto social
e defende que tanto o educador quanto o educando produ-
zam conhecimento, ainda que distintos, e que deve prevale-
cer o diálogo e a troca de informações entre as partes.
“Os médicos deveriam se inserir nisso enquanto traba-
lhadores. E não o fazem”, avalia o médico que coordenou,
entre os anos de 1980 e 1984, o recém-criado Departamen-
to Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Am-
bientes de Trabalho (Diesat).
Uma parte da tiragem inicial do livro, de dois mil exem-
plares, já foi comprada por sindicatos. Outra pode ser
adquirida de forma avulsa. Para quem tiver interesse na
publicação ou mesmo em promover um debate, o médico
disponibiliza o seu e-mail: [email protected]
Ele também sugere acessar a página do Centro Nacio-
nal de Apoio em Pesquisas sobre as Relações de Trabalho
(Cenpras).
Literatura
> Médico defende que discussão "saia da academia e passe para a prática, para a classe trabalhadora"
40 • Revista DR!
Simesp+
Simesp+: benefícios para o associadoConfira nossas parcerias
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gem durante a alta e baixa temporadas.
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semana, em baixa temporada, e 10% de
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Revista DR! • 41
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42 • Revista DR!
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"Esta imagem foi feita numa campina amazônica na região de Humaitá, fronteira entre os estados do Amazonas e Rondônia.Meu hobby é fotografar aves e, para tal, viajo pelo país sempre que possível, buscando fotografar aves ainda desconhecidas por mim. É claro que, além das aves, cenas apaixonantes da natureza, como este belo exemplar de borboleta, sempre se manifestam e são devidamente registradas através das nossas (minha e da minha mulher) lentes”.
Seu olhar pode ser publicado nas próximas edições da Revista DR!. Envie sua foto para [email protected]
Numa campina amazônica
Revista DR! • 43
44 • Revista DR!
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