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ENADE COMENTADO 2008 Pedagogia
ChancelerDom Dadeus Grings
ReitorJoaquim Clotet
Vice-ReitorEvilázio Teixeira
Conselho EditorialAna Maria Lisboa de MelloBettina Steren dos SantosEduardo Campos PellandaElaine Turk FariaÉrico João HammesGilberto Keller de AndradeHelenita Rosa FrancoIr. Armando BortoliniJane Rita Caetano da SilveiraJorge Luis Nicolas Audy – PresidenteJurandir MalerbaLauro Kopper FilhoLuciano KlöcknerMarília Costa MorosiniNuncia Maria S. de ConstantinoRenato Tetelbom SteinRuth Maria Chittó Gauer
EDIPUCRSJerônimo Carlos Santos Braga – DiretorJorge Campos da Costa – Editor-Chefe
Elaine Turk Faria
Maria Conceição Pillon Christofoli (Organizadores)
ENADE COMENTADO 2008
Pedagogia
Porto Alegre 2011
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Ficha Catalográfica elaborada pelo Setor de Tratamento da Informação da BC-PUCRS.
EDIPUCRS – Editora Universitária da PUCRSAv. Ipiranga, 6681 – Prédio 33Caixa Postal 1429 – CEP 90619-900 Porto Alegre – RS – BrasilFone/fax: (51) 3320 3711e-mail: [email protected] - www.pucrs.br/edipucrs
© EDIPUCRS, 2011
CAPA Rodrigo Valls
REVISÃO TEXTUAL Patrícia Aragão
EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Gabriela Viale Pereira
Edição revisada segundo o novo Acordo Ortográfico.Questões retiradas da prova do ENADE 2008 da Pedagogia.
Q5 ENADE comentado 2008: pedagogia [recurso eletrônico] / Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Organizadores). – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : EDIPUCRS, 2011.79 p.ISBN 978-85-397-0121-6
Sistema requerido: Adobe Acrobat ReaderModo de Acesso: <http://www.pucrs.br/edipucrs>
1. Ensino Superior – Brasil – Avaliação. 2. Exame Nacional de Cursos (Educação). 3. Pedagogia – Ensino Superior. I. Faria, Elaine Turk. II. Christofoli, Maria Conceição P.
CDD 378.81
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, especialmente por sistemas gráficos, microfílmicos, fotográficos, reprográficos, fonográficos, videográficos. Vedada a memorização e/ou a recuperação total ou parcial, bem como a inclusão de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibições aplicam-se também às características gráficas da obra e à sua editoração. A violação dos direitos autorais é punível como crime (art. 184 e parágrafos, do Código Penal), com pena de prisão e multa, conjuntamente com busca e apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos direitos Autorais).
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ..................................................................................................... 7 Marcos Villela Pereira
QUESTÃO 11 ........................................................................................................... 10 Maria Helena Camara Bastos
QUESTÃO 12 ........................................................................................................... 13 Nadja Hermann
QUESTÃO 13 ........................................................................................................... 15 Maria Waleska Cruz
QUESTÃO 14 ........................................................................................................... 18 Marcos Villela Pereira
QUESTÃO 15 ........................................................................................................... 21 Patricia Pinto Wolffenbuttel
QUESTÃO 16 ........................................................................................................... 23 Ana Lúcia Souza de Freitas
QUESTÃO 17 ........................................................................................................... 27 Jussara Margareth de Paula Loch
QUESTÃO 18 ........................................................................................................... 29 Zuleica Almeida Rangel
QUESTÃO 19 ........................................................................................................... 31 Zuleica Almeida Rangel
QUESTÃO 20 ........................................................................................................... 33 Elaine Turk Faria
QUESTÃO 21 ........................................................................................................... 36 Marcos Villela Pereira
QUESTÃO 22 ........................................................................................................... 40 Helena Sporleder Côrtes
QUESTÃO 23 ........................................................................................................... 43 Beatriz Kulisz
QUESTÃO 24 ........................................................................................................... 50 Maria Conceição Pillon Christofoli
QUESTÃO 25 ........................................................................................................... 52 Maria Conceição Pillon Christofoli
QUESTÃO 26 ........................................................................................................... 55 Rosana Maria Gessinger e Rosane da Conceição Vargas
QUESTÃO 27 ........................................................................................................... 57 Rosane da Conceição Vargas e Rosana Maria Gessinger
QUESTÃO 28 ........................................................................................................... 59 Maria Conceição Pillon Christofoli e Maria Inês Côrte Vitoria
QUESTÃO 29 - ANULADA ...................................................................................... 62
QUESTÃO 30 ........................................................................................................... 63 Isabel Cristina de Moura Carvalho
QUESTÃO 31 ........................................................................................................... 65 Jussara Margareth de Paula Loch
QUESTÃO 32 ........................................................................................................... 67 Zuleica Almeida Rangel
QUESTÃO 33 ........................................................................................................... 69 Jussara Margareth de Paula Loch
QUESTÃO 34 ........................................................................................................... 71 Afonso Strehl
QUESTÃO 35 ........................................................................................................... 73 Afonso Strehl
QUESTÃO 36 ........................................................................................................... 76 Zuleica Almeida Rangel e Leunice Martins de Oliveira
QUESTÃO 37 ........................................................................................................... 78 Jussara Margareth de Paula Loch
LISTA DE CONTRIBUINTES ................................................................................... 79
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 7
APRESENTAÇÃO
O ENADE, Exame Nacional de Desempenho de Estudantes, é um importante
instrumento de avaliação para pensarmos a Educação Superior contemporânea.
Muito mais do que uma simples prova, essas questões pretendem fornecer
um diagnóstico do estado de conhecimento da formação geral e específico nas
diferentes carreiras de graduação.
Articulado a outros instrumentos, ele integra o complexo do SINAES (Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Superior) e funciona como um indicador de
qualidade dos diferentes cursos.
Suas questões não se atêm apenas aos conteúdos programáticos, mas,
seguindo o espírito do modelo das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para os
Cursos de Graduação, se propõe a avaliar diferentes competências e habilidades
que os estudantes, de modo geral, devem ter desenvolvido ao longo dos anos de
passagem pela universidade.
A iniciativa da PUCRS em produzir a Coleção Eletrônica ENADE Comentado
denota a preocupação institucional com essa instância formativa e revela mais uma
medida de cuidado e atenção com seus alunos: a prova não é assunto de interesse
individual, que cada um toma conta e resolve por si. Ao contrário: essa iniciativa
confirma o compromisso de todo o coletivo implicado no Mundo PUCRS com os
percursos formativos dos estudantes.
Os docentes da Faculdade de Educação, apoiados pela Pró-Reitoria de
Graduação e sob a coordenação das professoras Elaine Turk Faria e Maria
Conceição Pillon Christofoli, dedicaram-se a comentar cada uma das questões com
a tarefa de analisar desde sua formulação até os mínimos detalhes das alternativas
de resposta.
Nosso propósito é fornecer subsídios para que os alunos aperfeiçoem sua
competência analítica das questões e exercitem, uma vez mais, a articulação de
importantes temas pertinentes à sua formação com diferentes modos de
problematização.
Se considerarmos que formar também é formar-se, podemos dizer que o
exercício permanente da avaliação representa um importante expediente do
8 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
percurso na direção da autonomia do próprio pensamento. A apropriação crítica de
um processo avaliativo é, talvez, a principal conquista da formação ao longo da vida,
tornando a experiência autoformativa uma atitude responsável e compromissada
com as próximas gerações.
Marcos Villela Pereira
Diretor da Faculdade de Educação
PUCRS
COMPONENTE ESPECÍFICO
10 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
QUESTÃO 11
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova foi publicado em 1932 e assinado por
26 educadores brasileiros, entre eles Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo e
Lourenço Filho.
Nos trechos a seguir, aparecem algumas de suas principais idéias. Mas, do direito
de cada indivíduo à sua educação integral, decorre logicamente para o Estado que o
reconhece e o proclama, o dever de considerar a educação, na variedade de seus
graus e manifestações, como uma função social e eminentemente pública, que ele é
chamado a realizar, com a cooperação de todas as instituições sociais.
A consciência desses princípios fundamentais da laicidade, gratuidade e
obrigatoriedade, consagrados na legislação universal, já penetrou profundamente os
espíritos, como condições essenciais à organização de um regime escolar, lançado,
em harmonia com os direitos do indivíduo, sobre as bases da unificação do ensino,
com todas as suas conseqüências.
Com base nesses trechos, conclui-se que, em seu contexto histórico, o Manifesto era
(A) libertário, pois pregava o fim do Estado. (B) autoritário, já que defendia a obrigatoriedade escolar. (C) elitista, porque pregava a dualidade do sistema de ensino. (D) inovador, pois compreendia a educação como um direito social. (E) conservador, na medida em que entendia a educação pública como privilégio. Tipo de questão: escolha simples com indicação da resposta correta. Conteúdo avaliado: a educação, no período de 1930-1945, articulada com a política
de “reconstrução nacional” pós-Revolução de 1930, no governo de Getúlio Vargas.
Autor: Maria Helena Camara Bastos
Alternativa correta: D
Comentários:
O direito do cidadão à educação integral laica, com gratuidade obrigatória, é a
premissa básica da instrução pública, segundo os princípios de um projeto
democrático de sociedade. Democracia e liberalismo assumiram características
complementares. O liberalismo tem um caráter econômico e político, calcado na ideia
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 11
de liberdade individual e de escolha pública. O ideário liberal em educação
caracteriza-se por quatro aspectos: a igualdade de oportunidades e democratização
da sociedade via escola; a nação de escola ativa; a distribuição hierárquica dos jovens
no mercado de trabalho por meio de uma hierarquia de competências; e a proposta da
escola como posto de assistência social (GHIRALDELLI Jr., 2006, p. 55-56).
No Brasil, a partir da proclamação da República (1889) e, especialmente, da
década de 1920, a educação passa a ser considerada cada vez mais uma tarefa
do Estado, como função social que visa preparar crianças e adolescentes para
viver em sociedade.
A política de “reconstrução nacional” voltada para a reordenação da
sociedade e do Estado, apostava na modernização cultural e institucional do país e
contava com a escola como agência de difusão e propaganda de normas de
convivência social, visando à formação do “novo” homem, isto é, preparar o homem
completo como pessoa, cidadão e trabalhador para servir à Nação. Essa proposta
volta-se para todas as camadas da sociedade, mas especialmente às camadas
populares, pois o processo de urbanização e industrialização crescente demanda a
ampliação do acesso à escolaridade elementar. As reformas econômicas não
poderiam estar dissociadas das reformas educacionais.
Alternativa A: o anarquismo teve sua origem no século XIX e propugnava a
possibilidade de construção de uma sociedade sem a ingerência do Estado, uma
sociedade justa e igualitária. Os ideários do socialismo libertário deram muita
importância à educação integral do homem. A pedagogia libertária defende um
ensino antiautoritário (entendido como a passagem de uma etapa do
desenvolvimento infantil caracterizada pela heteronomia a outra, com a autonomia
como eixo central) e o ensino integral, com o objetivo de fazer cada sujeito um
“homem livre”. Essa resposta é INCORRETA, porque não comunga com a
intervenção do Estado, como o texto expõe, pois os libertários são contra qualquer
poder institucionalizado, uma vez que a gestão da sociedade deve ser direta, isto é,
deve haver autogestão.
Alternativa B: resposta INCORRETA, pois a defesa da obrigatoriedade
escolar decorre da necessidade de atender a um direito de todo cidadão, e é dever
12 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
do Estado garanti-lo. A obrigatoriedade só tem razão de ser acoplada com a
gratuidade, pois como um direito deve ser garantido para todos.
Alternativa C: o texto não dá pistas para essa dedução, mesmo que o
Manifesto e as inúmeras análises realizadas sobre a educação no período assinalem
o dualismo do sistema educacional brasileiro: uma escola para a elite e outra para o
povo. Essa parte do texto do manifesto afirma a educação como um direito social
para todos e não estabelece nenhuma diferenciação de escolas.
Alternativa E: o texto não permite essa conclusão, pois em nenhum
momento fala em privilégio.
Referências bibliográficas: GHIRALDELLI Jr., Paulo. História da Educação Brasileira. São Paulo: Cortez, 2006.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 13
QUESTÃO 12
Qual a contribuição da disciplina Filosofia da Educação para a formação do
educador?
(A) Atender à necessidade de organização do pensamento com vistas a um melhor desempenho didático-pedagógico.
(B) Dominar o conhecimento historicamente produzido pela humanidade visando a uma cultura erudita.
(C) Reunir informações sobre a existência humana para orientar a forma de organizar sua vida privada.
(D) Contribuir para as soluções práticas exigidas pelo cotidiano, auxiliando na elaboração do planejamento escolar.
(E) Ajudar o professor a identificar e interrogar os valores que estão subjacentes à ação e às concepções do humano.
Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: Filosofia da Educação.
Autor: Nadja Hermann
Alternativa correta: E
Comentários:
Pode-se considerar a questão 12 do ENADE de baixo grau de dificuldade,
pois é possível eliminar alternativas por não pertenceram ao campo do
conhecimento em questão. As alternativas erradas (A, B e D) apontam aspectos
gerais de conteúdo didático, o que não permitiria responder à pergunta do
enunciado. A alternativa C contém elementos parciais e imprecisos a respeito de
possíveis entendimentos de uma assim chamada filosofia de vida, ou de certa
capacidade em adotar posicionamento diante da vida. Todavia, é insuficiente para
responder de modo correto a contribuição da Filosofia da Educação, tal como é
solicitado no enunciado da questão. A alternativa E é a única que aponta para uma
perspectiva mais plausível do papel da filosofia da educação na formação de
professores. Identificar e interrogar valores constitui uma das abordagens mais
persistentes da disciplina. Essa alternativa condensa parte da herança do
pensamento ocidental que entende como relevante o constante questionamento e
ponderação sobre nosso agir e sobre as orientações valorativas de tal agir.
14 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
Nesse sentido, quando Platão pergunta se é possível ensinar a virtude
(Menon), isso significa, em última instância, problematizar a possibilidade da
educação1
, ou seja, como fazer uma transformação psíquica, que produza nos
homens a própria formação de si e um novo ethos. A filosofia da educação pensa os
problemas da educação, as relações éticas entre os homens, o sentido da formação
humana. Em outras palavras, a aventura intelectual do mundo ocidental pensa a
formação associada à ética.
1 Ver SCOLNICOV, Samuel. Platão e o problema educacional. São Paulo: Edições Loyola, 2006
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 15
QUESTÃO 13
A dicotomia entre professores e especialistas marcou, ao longo da história, as
discussões sobre a identidade do pedagogo. A partir dos anos 1990 uma
determinada perspectiva sobre essa identidade foi fortalecida. Ela está nas
Diretrizes Curriculares do Curso de Graduação em Pedagogia/Licenciatura,
promulgadas em 2006.
Qual destas afirmações expressa essa concepção?
(A) A docência é a base identitária do pedagogo, além da gestão escolar, de sistemas e de programas não escolares.
(B) A identidade do pedagogo se afirma por sua condição de especialista. (C) O planejamento e a avaliação dos sistemas educacionais cabem aos
administradores e a gestão escolar, aos pedagogos. (D) A investigação educacional é tarefa das universidades e sua aplicação é papel
dos pedagogos. (E) O pedagogo deve optar entre dedicar-se à docência das séries iniciais ou à
gestão educacional. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: identidade do Pedagogo e Diretrizes Curriculares do curso de
Pedagogia.
Autor: Maria Waleska Cruz
Alternativa correta: A
Comentários:
O artigo 4º da RESOLUÇÃO CNE/CP Nº. 1, DE 15 DE MAIO DE 2006, que
institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em
Pedagogia, licenciatura, coloca claramente que este curso destina-se à formação
de professores na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental,
nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na
área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos
conhecimentos pedagógicos, o que legitima que a docência é a base identitária do
pedagogo. Este mesmo artigo, em seu parágrafo único, inciso II, diz que as
atividades docentes também compreendem participação na organização e gestão
de sistemas e instituições de ensino, englobando planejamento, execução,
16 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos e experiências educativas
não escolares2
A resposta evidente a esta questão remete à alternativa A, em que há a
referência à docência como base identitária do pedagogo, além de envolver sua
participação na gestão escolar, de sistemas e de programas/experiências não
escolares, como já justificamos anteriormente.
[1].
As demais alternativas são descartadas porque contrariam os dispositivos
legais das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em
Pedagogia, licenciatura. A assertiva B coloca que “a identidade do pedagogo se
afirma por sua condição de especialista”: ao contrário, a formação do pedagogo tem
natureza generalista. O artigo 3º, das referidas Diretrizes, apregoa que um repertório
de informações e habilidades composto por pluralidade de conhecimentos teóricos e
práticos caracteriza a formação do pedagogo. Essa colocação descaracteriza a
condição de especialista.
A alternativa C refere que o planejamento e a avaliação dos sistemas
educacionais cabem aos administradores, e a gestão escolar, aos pedagogos. Essa
afirmativa contrapõe-se ao que sustentam as Diretrizes, no que se refere à estrutura
do curso de Pedagogia quando assegura, nesta estrutura, a articulação da
observação, da análise, do planejamento e da avaliação de processos educativos e
de experiências educacionais, em ambientes escolares e não escolares (Artigo 6º,
inciso I, alínea c).
A letra D sustenta que a investigação educacional é tarefa das universidades
e sua aplicação é papel dos pedagogos. O pedagogo não é “massa de manobra”,
ele é sujeito pensante, por isso, não é mero aplicador de valores, normas, diretrizes
e decisões político-curriculares, ele é um intelectual que reelabora e produz novos
saberes. A investigação educacional é tarefa do professor porque pesquisa, como
coloca Demo (1993), é ao mesmo tempo princípio científico e educativo, e o que
qualifica a educação é mediar-se pela produção científica, e vice-versa. Além disso,
as Diretrizes para o Curso de Pedagogia, ao falarem sobre a estrutura do curso,
destacam um núcleo de aprofundamento e diversificação de estudos voltados às
áreas de atuação profissionais priorizadas pelo projeto pedagógico das instituições e
2[1] Grifo nosso.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 17
que, atendendo a diferentes demandas sociais, oportunizará, entre outras
possibilidades, investigações sobre processos educativos e gestoriais, em diferentes
situações institucionais: escolares, comunitárias, assistenciais, empresariais e
outras, legitimando que o papel do pedagogo é também o de investigador (Artigo 6º,
Inciso II, alínea a).
A última hipótese, letra E, coloca que o pedagogo deve optar entre dedicar-se
à docência das séries iniciais ou à gestão educacional. A conjunção alternativa “ou”
colocada entre docência e gestão educacional comprometeu a afirmativa, pois de
acordo com a legislação vigente a formação do pedagogo permite-lhe transitar tanto
pela docência como pela gestão.
18 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
QUESTÃO 14
A relação entre educação escolar e desigualdade social vem sendo estudada pela
Sociologia há mais de um século. Diferentes autores e diversas correntes de
pensamento explicam os complexos mecanismos dessa relação. Mesmo
considerando as grandes diferenças existentes entre países e épocas, a
escolarização progressiva da população
(A) vem acompanhada de um aumento das exigências educacionais do mercado de trabalho.
(B) garante empregabilidade compatível com o nível de instrução. (C) proporciona acesso ao mercado de trabalho devido à diminuição da
competitividade. (D) está relacionada às crises econômicas e favorece o desemprego. (E) gera equanimidade entre segmentos sociais e diminuição de conflitos culturais. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: educação escolar e desigualdade social.
Autor: Marcos Villela Pereira
Alternativa correta: A Comentários:
Talvez aquilo que melhor defina a Sociologia da Educação como campo de
conhecimento seja a relação entre a ação dos dispositivos e aparatos educacionais
e as transformações da sociedade. A escola, sem dúvida, é a principal forma de
institucionalização desse processo, atuando diretamente na formação individual e
coletiva e articulando estratégias de ensino, instrução, formação, socialização e
capacitação, entre tantos outros.
Desde seu surgimento como disciplina, em meados do século XIX, no âmbito
da sociedade europeia, um dos principais focos da Sociologia da Educação é a
análise da implicação da educação escolar na produção, reprodução ou superação
das desigualdades sociais e culturais da população.
O enunciado da questão destaca esse aspecto, chamando a atenção para o
fato de que diferentes correntes de pensamento, através da expressão de
inumeráveis intelectuais, se preocupam com a investigação dos diferentes níveis,
formas e naturezas dessa implicação. Cada um, orientado pela particularidade dos
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 19
seus componentes teóricos e compreensivos acerca da realidade, formula suas
explicações. Entretanto, a raiz da questão dá destaque para a ideia de que há
unanimidade entre eles, a despeito de suas diferenças. A partícula “mesmo”, no
início do período, suplanta o fator condicionante no sentido de significar “ainda que”,
ou seja, no sentido de que para além das diferenças geográficas e históricas que
contingenciam os postulados teóricos, algo há em comum entre eles.
O foco proposto, como elemento de referência para esse ponto em comum, é
apresentado na segunda oração da frase, “a escolarização progressiva da
população”, a partir do que é solicitado ao respondente que complete o pensamento.
A alternativa A é a única que se atém a um dado de realidade factível e,
portanto, é a alternativa correta. Seu tom é prosaico e despretensioso, redundando
em uma constatação óbvia e aparentemente sem importância. Há uma relação de
continuidade, embora não determinista: “a escolarização progressiva da população
vem acompanhada de um aumento das exigências educacionais do mercado de
trabalho” e não postula o que vem antes ou depois, o que determina o que. A
expressão “vem acompanhada” indica uma condição de indissociabilidade entre as
premissas, ou seja, afirma que uma coisa (a escolarização progressiva) vem
acompanhada da outra (o aumento das exigências educacionais). Por vezes, o
aumento da complexidade no mundo do trabalho faz aumentarem as exigências
educacionais para seu acesso e, em consequência, isso demanda um aumento da
escolarização da população; por vezes, é a escolarização progressiva da população
que vai empurrar o nível de exigência do mercado de trabalho.
A segunda alternativa tenta forçar uma conclusão improvável, uma vez que a
garantia da empregabilidade não deriva do aumento da escolaridade da população.
De certa forma, considerando o argumento já destacado na alternativa anterior, até
poderíamos dizer que esse aumento de escolarização vai fazer aumentar as
exigências do mercado e exigir progressiva compatibilidade com o nível de
instrução. Mas não é verdade que garanta empregabilidade em alguma instância.
A alternativa (C) faz uma afirmação incorreta quando aponta a “diminuição da
competitividade” como correlata à “escolarização progressiva da população”. Bem ao
contrário: o aumento da escolarização aumenta a competitividade ao possibilitar acesso
ao mercado de trabalho a cada vez mais pessoas com nível elevado de escolarização.
20 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
A quarta alternativa, por sua vez, sugere dois aspectos que, embora
relacionados entre si (as crises econômicas e o desemprego), não têm
correspondência com a premissa inicial (a escolarização progressiva da população).
Ao contrário, de modo geral é factível considerar que o aumento da escolaridade é
um fator que favorece a autonomia laboral da população, independente das
condições de oferta de empregos (aqui entendidos como postos formais de
trabalho). Mas as condições de empregabilidade mantêm relações de dependência
com inúmeros outros fatores que não apenas as condições objetivas da qualificação
profissional do trabalhador. De modo geral as crises econômicas e o desemprego
andam juntos, mas não há nenhuma relação evidente entre elas e a escolarização
progressiva da população.
Por fim, a última alternativa peca pela associação de duas assertivas que não
mantêm correlação entre si (a equanimidade entre os segmentos sociais e a
diminuição dos conflitos culturais) e pela pretensão de associá-las à escolaridade.
Muito embora se pretenda que a escolarização progressiva contribua para a
diminuição da desigualdade social através da equiparação das condições de acesso
da população às mesmas benesses sociais, sabemos que isso não representa a
equalização social idealizada. A escolarização progressiva da sociedade
proporciona, talvez, uma relativa equilibração em termos do repertório das pessoas
no nível do conhecimento disciplinar processado no âmbito da escola. Podemos até
mesmo considerar que a escola viabiliza acesso às noções e habilidades
necessárias para o exercício de competências laborais que permitem, em
consequência, a geração das condições materiais necessárias para o aumento da
qualidade de vida. Mas não podemos dizer que isso significa “equanimidade entre
segmentos sociais”. Igualmente, não podemos afirmar que os conflitos culturais têm
relação direta com a escolarização: as diferenças culturais existem antes e para
além da homogeneização pretendida pela escolarização. Ainda que o aumento da
escolaridade pretenda um aumento dos níveis de compreensão acerca da
diversidade cultural e, dessa maneira, resulte em uma ampliação do espectro de
tolerância, não existe uma condição automática e necessária de correspondência
entre uma coisa e outra.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 21
QUESTÃO 15
A professora afirmou que a baleia é um mamífero. Inconformado, Pedro
argumentou: “Mamífero é vaca, gato, cachorro, cujos filhotes mamam. A baleia vive
dentro d’água, tem nadadeiras, é um peixe”. A maioria dos colegas concordou com
Pedro, mas todos começaram a mudar de idéia ao assistir a um filme em que
apareciam baleias pequenas sendo amamentadas. Pedro começou a perceber que
morar fora d’água não é algo que defina os mamíferos, e que ter rabo de peixe,
nadadeiras e morar na água não são características apenas dos peixes.
A aprendizagem de Pedro foi gerada, segundo a teoria piagetiana, pelo processo de
(A) anulação do conhecimento anterior e substituição deste por conteúdos novos e diferentes.
(B) associação de novos conteúdos àqueles que já faziam parte da sua estrutura cognitiva.
(C) comparação entre informações contrastantes e o reforço do conhecimento anterior.
(D) desequilíbrio, por conflito cognitivo, e acomodação do novo conhecimento ao anterior.
(E) reforço positivo por parte da professora, dos colegas e da família. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: aprendizagem segundo Piaget.
Autor: Patricia Pinto Wolffenbuttel
Alternativa correta: D
Comentários:
O enunciado da questão já propõe que a mesma seja analisada a partir da
teoria de Jean Piaget, assim, é possível observar que as opções A, B, C e E
apresentam termos que as afastam das conclusões a que o teórico em questão
chegou através de suas pesquisas. A opção correta é a D, pois refere conceitos
essenciais da teoria de Piaget a fim de explicar o aprender das crianças diante da
ideia que tinham sobre a baleia e os mamíferos, pois há um desequilíbrio ao serem
confrontados com uma nova informação que provoca um conflito cognitivo em
relação a uma aprendizagem anterior. No entanto, ao serem levadas a ter um
contato com o novo conhecimento, no caso, através do filme, as crianças puderam
22 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
acrescentar informações e melhorar o que já sabiam. Dessa forma, a generalização
anterior sobre os mamíferos teve que passar por uma ressignificação, enriquecida
por novos conhecimentos, assim houve uma mudança qualitativa. Nesse sentido,
não houve uma simples anulação do conhecimento anterior e substituição deste por
novos, como afirma a opção A; tampouco foi um processo meramente associativo,
como infere a opção B, pois as crianças tiveram a oportunidade de refletir sobre seu
conflito e tirar conclusões através do que estavam observando. Da mesma forma,
não é possível afirmar que houve qualquer tipo de reforço, pois o caminho percorrido
para chegar à nova conclusão foi proporcionado pela vivência do conflito cognitivo,
pela oportunidade de expressão desse conflito, pelo ensejo da argumentação, pela
possibilidade de contato com a nova informação mostrada às crianças através do
filme, ou seja, dinâmica que se opõe ao simples ato de reforçar verdades já
construídas por outros; conforme opções C e E.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 23
QUESTÃO 16
O pensamento pedagógico de Paulo Freire parte de alguns princípios que marcam,
de forma clara e objetiva, o seu modo de entender o ato educativo.
Considerando as características do pensamento desse autor, analise as afirmações
que se seguem.
I Ensinar é um ato que envolve a reflexão sobre a própria prática.
II Modificar a cultura originária é parte do processo educativo.
III Superar a consciência ingênua é tarefa da ação educativa.
IV Educar é um ato que acontece em todos os espaços da vida.
V Educar é transmitir o conhecimento erudito e universalmente reconhecido.
Estão de acordo com o pensamento de Paulo Freire APENAS as afirmações
(A) I e II (B) II e V (C) I, III e IV (D) I, IV e V (E) I, II, III e IV Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: o pensamento pedagógico de Paulo Freire. Autor: Ana Lúcia Souza de Freitas
Alternativa correta: C
Comentários:
O pensamento pedagógico de Paulo Freire é um conteúdo recorrente nas
questões apresentadas em processos avaliativos. Costumam ser elaboradas
questões de dois tipos: as que abordam conceitos fundantes do pensamento do
autor, como, por exemplo, o de “educação bancária”, e as que questionam, de um
modo mais geral, os princípios que sustentam sua proposição acerca de uma
“educação libertadora” (FREIRE, 1987), como é o caso da questão apresentada no
ENADE 2008.
A questão envolve o conceito de educação e de ensino no pensamento de
Paulo Freire e exige do respondente um nível mais elaborado de compreensão, visto
que a análise das afirmações apresentadas requer o conhecimento de outros
24 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
conceitos do mesmo autor. A Pedagogia do Oprimido e a Pedagogia da Autonomia
são as obras em que podemos encontrar mais diretamente a fundamentação desta
questão e cuja leitura se recomenda para um aprofundamento de estudos. Também
é uma boa alternativa para estudo a leitura de alguns verbetes do Dicionário Paulo
Freire (STRECK; REDIN; ZITKOSKI, 2010), indicados na continuidade do
comentário para cada uma das afirmações.
Afirmação I – CORRETA
A afirmação traz implícita a compreensão do ato de ensinar na perspectiva da
educação libertadora. Uma citação clássica a este respeito refere-se à compreensão
de que “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a
sua produção ou a sua construção” (FREIRE, 1996, p.25). Ou seja, significa
reconhecer que ambos – educador e educandos – são sujeitos do processo de
conhecer, do qual o ensinar e o aprender fazem parte. A reflexão sobre a prática
decorre desta postura crítica do ensinar e do aprender e se apresenta, mais
especificamente, nas obras escritas por Paulo Freire na década de noventa, em que
tematiza a formação de professores (FREITAS, 2001). É o caso, por exemplo, da
Pedagogia da Autonomia que, em seu capítulo primeiro, ao tratar da compreensão
de que “não há docência sem discência”, um dos aspectos trabalhados é: “ensinar
exige reflexão crítica sobre a prática”.
Afirmação II - INCORRETA
A afirmação apresenta uma compreensão inversa do que Paulo Freire
propõe. O conceito de invasão cultural está implícito na formulação desta afirmativa
e diz respeito exatamente à crítica feita pelo autor ao modo como a educação pode
funcionar como processo de dominação de uma cultura sobre outras. O
silenciamento dos sujeitos e a negação de seus saberes, inerentes ao processo de
invasão cultural, contrariam a proposição de Paulo Freire no que se refere ao
respeito à identidade cultural. Sobre o conceito de invasão cultural, é relevante a
leitura do quarto capítulo da Pedagogia do Oprimido, que tematiza A teoria da ação
antidialógica. No primeiro capítulo da Pedagogia da Autonomia, encontram-se os
seguintes desdobramentos temáticos: “ensinar exige respeito aos saberes dos
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 25
educandos” e “ensinar exige o reconhecimento e a assunção da identidade cultural”.
No Dicionário Paulo Freire, os verbetes identidade cultural e invasão cultural são
bastante elucidativos. As leituras sugeridas poderão aprofundar a compreensão do
conteúdo desta afirmação.
Afirmação III – CORRETA
A conscientização como finalidade e método da educação libertadora é uma
importante contribuição do legado de Paulo Freire à formação de professores
(FREITAS, 2001). A criticização da consciência, tendo em vista a superação da
ingenuidade nas relações consciência-mundo para que se efetive uma ação
transformadora é um permanente desafio à prática educativa. O termo
conscientização é ponto de muitas distorções e controvérsias em relação ao
pensamento do autor. Embora tenha deixado de empregá-lo por algum tempo em
seus escritos, na obra Pedagogia da Autonomia Paulo Freire ratifica sua
compreensão de que “Contra toda a força do discurso fatalista neoliberal,
pragmático e reacionário, insisto hoje, sem desvios idealistas, na necessidade da
conscientização”. Insisto na sua atualização (p.60). Os verbetes consciência e
conscientização se encontram no Dicionário Paulo Freire e contribuem para o
aprofundamento desta compreensão.
Afirmação IV – CORRETA
A afirmação é bastante ampla, mas ratifica o pensamento do autor no que se
refere à sua compreensão de que a educação tem na escola um lugar fundamental,
mas não exclusivo. Um conceito relevante para esta compreensão é o saber de
experiência feito. Ao referendar o valor epistemológico dos saberes de experiência
feitos, Paulo Freire contribui para que possamos perceber a experiência cotidiana
como lugar de fecundas aprendizagens. A valorização do senso comum, naquilo que
ele tem de bom-senso é, na perspectiva do autor, um dos caminhos para a
desdogmatização da ciência e para o fortalecimento da educação em diferentes
contextos. Esta compreensão está presente nas obras Pedagogia do Oprimido e
Pedagogia da Esperança, mas também pode ser estudada a partir dos verbetes
presentes no Dicionário Paulo Freire, entre outros, saber e saber de experiência feito.
26 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
Afirmação V – INCORRETA
A afirmação utiliza o termo educação para referir-se ao ensino; contraria o
pensamento de Paulo Freire em dois sentidos. “Educar é transmitir o conhecimento”
corresponde à crítica feita pelo autor à educação tradicional, nomeada por ele de
“educação bancária”. Sua compreensão sobre ensino, já comentada na primeira
afirmação, apresenta-se como uma alternativa a esta compreensão. No que se
refere aos conteúdos, igualmente a afirmação contraria o pensamento do autor, pois
ao atribuir supremacia ao “conhecimento erudito e universalmente reconhecido”
desconsidera os saberes de experiência feitos. O diálogo de saberes é a essência
da educação libertadora e, segundo Paulo Freire, a dialogicidade inicia na busca do
conteúdo programático. Esta discussão é o tema do capítulo terceiro da Pedagogia
do Oprimido, cuja referência é fundamental para a compreensão-ação da pesquisa
como uma dimensão do ensino. No processo de investigação temática, proposto por
Paulo Freire e recriado nas experiências que tomam a pesquisa como ponto de
partida para a organização do ensino, o conteúdo, ao ser contextualizado, adquire
função problematizadora e conscientizadora.
Referências bibliográficas: FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido, 22ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. ______. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. FREITAS, Ana Lúcia. Pedagogia da Conscientização – Um legado de Paulo Freire à formação de professores. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2001. STRECK, Danilo; REDIN, Euclides; ZITKOSKI, Jaime (orgs.). Dicionário Paulo Freire. Segunda edição revista e ampliada – Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 27
QUESTÃO 17
Considere as descrições que se seguem.
Escola X: O currículo é desenvolvido em projetos de trabalho, com integração entre
disciplinas, e os laboratórios de informática estão a serviço da pesquisa
empreendida pelos alunos.
Escola Y: Há uma delimitação clara entre as disciplinas, com horários e espaços
bem definidos para as atividades, e os recursos tecnológicos dão suporte à
transmissão de conhecimentos.
Escola Z: Laboratórios de informática, telas digitalizadas e estúdios de produção
audiovisual estão disponíveis aos professores, que são conduzidos a desenvolver
um currículo em que os novos conhecimentos científicos sejam imediatamente
incorporados.
Qual das análises faz uma relação coerente entre concepções de currículo e uso da
tecnologia, segundo as correntes teóricas a que se referem?
(A) As escolas X e Y adotam uma concepção de currículo calcada no multiculturalismo, pois o tratamento dado ao uso de recursos tecnológicos está associado à diversidade.
(B) Na escola X o currículo possui uma abordagem interdisciplinar, o que favorece o caráter investigativo do uso de recursos tecnológicos no contexto da metodologia de projetos.
(C) Na escola Y a delimitação entre as disciplinas demonstra que o currículo é reflexo da pluralidade cultural contemporânea, ao passo que o modo como a tecnologia é adotada remete a um modelo tecnicista.
(D) Na escola Z os diversos recursos tecnológicos usados indicam uma visão de currículo calcada na teoria póscrítica, pois os professores acompanham as inovações tecnológicas.
(E) As escolas Y e Z trabalham segundo uma perspectiva curricular crítica, em que os recursos tecnológicos são utilizados para a formação continuada de alunos e professores.
Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: concepções de Currículo e metodologia de projetos.
Autor: Jussara Margareth de Paula Loch
Alternativa correta: B
28 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
Comentários: A análise que faz uma relação coerente entre concepções de currículo e uso da
tecnologia é apontada na alternativa B. Foram eliminadas as alternativas A, C, D, E,
pois na descrição da escola Y não há referência a um currículo calcado na diversidade
e no multiculturalismo. O fato de segmentar o currículo em disciplinas e o uso dos
recursos tecnológicos para a transmissão dos conhecimentos, numa visão do currículo
como instrução, seguramente não atende à concepção de diversidade e de visão
multiculturalista, já que estas estão mais relacionadas à visão crítica e pós-crítica do
currículo, além de que “parece haver uma evidente continuidade entre a perspectiva
multiculturalista e a tradição crítica do currículo” (SILVA, 1999, p. 90). Segundo o
mesmo autor (1999) a tradição crítica inicial no currículo chama a atenção para as
determinações de classe na definição das opções do tipo de conhecimento a ser
contemplado no currículo enquanto o multiculturalismo aponta as questões de gênero,
raça e sexualidade. Um currículo organizado a partir das concepções críticas e pós-
críticas de currículo deveria refletir as formas pelas quais a diferença é produzida, isto é,
por relações sociais assimétricas implicadas em relações de poder e saber.
Nesse sentido, a alternativa correta B envolve três questões fundamentais: 1)
a abordagem interdisciplinar do conhecimento - têm sido publicadas experiências
realizadas em SP, explicitadas no livro Ousadia do Diálogo: interdisciplinaridade na
escola pública; no RS, sobre A Escola Cidadã e, em BH, sobre A Escola Plural, para
citar apenas algumas; 2) o ensino como pesquisa - que caracteriza a metodologia de
projetos; 3) a valorização do uso de recursos tecnológicos - a serviço da
investigação e da pesquisa como meio moderno, atualizado e com amplas
possibilidades de abordagens que propiciam a construção de conhecimentos
significativos e que atendam aos interesses e necessidades dos alunos.
Dessa forma, o trabalho educativo/pedagógico, ao tratar o conhecimento, não
pode se restringir a transmitir o conhecimento ou a disponibilizá-lo.
Referências bibliográficas: SILVA, Tomaz Tadeu da. Documento de Identidade: uma introdução às teorias de currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 29
QUESTÃO 18
A elaboração do projeto político-pedagógico é um processo de consolidação da
democracia e da autonomia da escola, com vistas à construção de sua identidade. É
uma ação intencional, com um compromisso definido coletivamente, que reflete a
realidade, busca a superação do presente e aponta as possibilidades para o futuro.
O projeto político-pedagógico é um documento que não se reduz à dimensão
didático-pedagógica.
Nesse texto, o projeto político-pedagógico se constitui como
(A) instrumento legitimador das ações normativas da equipe gestora. (B) desenvolvimento de ações espontâneas da comunidade escolar. (C) definição de princípios e diretrizes que projetam o vir a ser da escola. (D) incorporação de múltiplas teorias pedagógicas, produzidas na
contemporaneidade. (E) implementação de estrutura organizacional visando à administração interna da
escola. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: Projeto Político-Pedagógico. Autor: Zuleica Almeida Rangel
Alternativa correta: C
Comentários:
A - A alternativa é incorreta, uma vez que o texto explicita a constituição do
Projeto Político-Pedagógico como um compromisso a ser assumido coletivamente e
não apenas pela equipe gestora da escola.
B - A alternativa B é incorreta na medida em que o Projeto Político-
Pedagógico, de acordo com o texto, é uma ação intencional, com um compromisso
definido coletivamente, o que inviabiliza o desenvolvimento de ações espontâneas
da comunidade.
C – A resposta correta é a alternativa C porque, ao construirmos o Projeto
Político-Pedagógico (PPP) de nossa escola, expressamos nossa visão de homem,
de escola e de sociedade, o que servirá de alicerce para definir o caminho a ser
traçado e as metas que irão corporificar as próprias ações do PPP.
30 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
D – A alternativa D é incorreta porque mais que a “incorporação de múltiplas
teorias pedagógicas, produzidas na contemporaneidade”, o texto sinaliza que o PPP
é um documento que não se reduz à dimensão didático-pedagógica. É preciso
considerar que a elaboração do PPP pressupõe uma reflexão detalhada sobre as
possibilidades de mudança e sobre a aproximação entre o que se faz e o que se
deseja fazer, o que significa que “não serão as novas propostas, mesmo que bem
elaboradas e que são produzidas pelas instâncias que pensam a escola que
promoverão estas mudanças” (VEIGA, 2000, p.55). Nesta perspectiva, é a reflexão
sobre a vida cotidiana da escola que fará emergir, na elaboração do PPP, o
paradigma metodológico orientador do fazer educativo.
E - A alternativa E é incorreta porque o PPP não se constitui como
implementação de estrutura organizacional visando à administração interna da
escola e sim como um documento norteador de todos os planos de ação dos seus
diferentes setores, com vistas “à construção da identidade da escola, oferecendo
subsídios para a consolidação da democracia e da autonomia da escola em
consonância com seu contexto sociocultural, numa abertura ao processo
participativo da comunidade”.
Referência bibliográfica: VEIGA, Ilma Passos de Alencastro (org.). Projeto Político-Pedagógico da escola: uma construção possível. Campinas, SP: Papirus, 2000.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 31
QUESTÃO 19
Uma professora propõe uma atividade em que as crianças devem escrever um
bilhete para uma personagem. Ao longo da tarefa, a professora percorre todas as
mesas, lê em voz alta ou silenciosamente alguns bilhetes, comenta as adequações e
inadequações na escrita, leva as crianças a refletirem a partir dos erros ortográficos
e pede que os bilhetes sejam reescritos em casa.
De acordo com a descrição dessa situação, a prática avaliativa realizada pela
professora é OPOSTA a qual das concepções e seus propósitos, apresentados no
quadro abaixo?
Concepção Propósito
(A) Diagnóstica conhecer os conhecimentos já aprendidos pelas crianças.
(B) Classificatória medir erros e acertos das aprendizagens das crianças em relação à escrita.
(C) Formativa acompanhar o processo individual de aprendizagem das crianças.
(D) Mediadora intervir nas aprendizagens realizadas pelas crianças.
(E) Investigativa conhecer os indícios das aprendizagens realizadas pelas crianças. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: concepção de avaliação.
Autor: Zuleica Almeida Rangel
Alternativa correta: B
Comentários:
A resposta correta é a alternativa B, pois uma concepção classificatória de
avaliação tem sua função centrada na valorização do produto, não sendo vista como
elemento integrador entre o ensino e a aprendizagem. Foca-se na descrição do
fenômeno do ponto de vista quantitativo, ficando restrita ao propósito de medir os
resultados alcançados pelo aluno e sua função, portanto, se opõe a todas as ações
da professora, descritas no enunciado da questão.
As estratégias utilizadas pela professora por ocasião da realização da tarefa
expressam uma intenção oposta a esses propósitos, quando acontecem várias
intervenções em decorrência da análise sobre as atividades realizadas, o que
evidencia uma concepção interacionista de avaliação, em que a professora assume
um posicionamento de mediadora, buscando um significado para toda a relação que
32 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
estabelece com seu aluno, procedendo a um diálogo permanente na direção das
possibilidades de construção de novos conhecimentos. Tal concepção pressupõe
uma prática avaliativa que, em sua perspectiva mediadora, se destina assim a acompanhar, entender, favorecer a contínua progressão do aluno em termos destas etapas: mobilização, experiência educativa e expressão do conhecimento, alargando o ciclo que se configura no sentido de favorecer a abertura do aluno a novas possibilidades (HOFFMANN, 2001, p.18)
e não em apenas medir erros e acertos das aprendizagens das crianças, como diz a
alternativa B.
Referência bibliográfica: HOFFMANN, Jussara. Avaliar para promover: as setas do caminho. Porto Alegre: Mediação, 2001.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 33
QUESTÃO 20
Leia a tabela que apresenta dados do Índice de Desenvolvimento
Saeb e Censo Escolar
Disponível em: http://www.inep.gov.br. Acesso em set. 2008.
Qual das afirmações faz uma análise coerente entre os dados da tabela e os fatores
do Ideb?
(A) Os dados sobre aprovação escolar e as médias totais de desempenho no Saeb e na Prova Brasil resultaram em índices que ultrapassaram as metas para o ensino fundamental em 2007.
(B) Os índices observados no ano de 2007, mais elevados quanto maior a escolaridade, são ferramentas para o acompanhamento das metas de qualidade do Plano de Desenvolvimento da Educação.
(C) O Ideb, que reúne, em um indicador, o fluxo escolar e as médias de desempenho nas avaliações, foi, no total de 2007, inferior à meta para o mesmo ano.
(D) A superação das metas no ensino fundamental e no ensino médio foi um avanço, levando-se em consideração que a escala do Ideb vai de zero a seis.
(E) A expectativa de avanço nas escolas estaduais é inferior àquela esperada para as escolas municipais, uma vez que o índice é comparável nacionalmente.
Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica.
Autor: Elaine Turk Faria
Alternativa correta: A
34 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
Comentários: De acordo com os dados apresentados na tabela, verifica-se que os índices
do Ensino Fundamental no IDEB em 2007 foram superiores às metas previstas para
o mesmo ano:
Ensino Fundamental – Anos Iniciais: 4,2, quando a meta proposta era 3,9.
Ensino Fundamental – Anos Finais: 3,8, quando a meta proposta era 3,5.
Observa-se que também no Ensino Médio a meta foi superada: a previsão era
chegar a 3,4 em 2007, mas se chegou a 3,5.
Apesar do avanço alcançado, cabe, no entanto, considerar que os índices do
IDEB são extremamente baixos, considerando que o IDEB obedece a uma escala de
zero a dez. Assim, os índices obtidos (4,2; 3,8 e 3,5) não atingem sequer a metade
da escala, que seria 5,0. A indicação evidente é que nossos alunos ainda têm um
longo caminho a percorrer para que atinjam um nível satisfatório de desempenho.
Para conhecer mais dados acerca do IDEB, sugere-se uma consulta no site
do INEP (www.inep.gov.br) ou no site do MEC (www.mec.gov.br) no qual estão
apresentadas informações sobre o IDEB e os resultados das avaliações realizadas
(http://portalideb.inep.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=47&Ite
mid=57).
Encontramos também informações sobre o IDEB no site do MEC que
explicam que “o índice é medido a cada dois anos e o objetivo é que o país, a partir
do alcance das metas municipais e estaduais, tenha nota 6 em 2022 – ano do
bicentenário da independência – correspondente à qualidade do ensino em países
desenvolvidos. É o mesmo que dizer que teremos uma educação compatível com
países de primeiro mundo antes do previsto”
(http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=336&id=180&option=com_content&view=
article)
As demais alternativas estão incorretas.
A alternativa B é falsa quando afirma que os índices observados no ano de
2007, mais elevados quanto maior a escolaridade, (...). A tabela apresenta
justamente o contrário: o índice mais alto está nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental (4,2), seguido pelos Anos Finais do Ensino Fundamental (3,8), ficando
o Ensino Médio com o último lugar (apenas 3,5).
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 35
A alternativa C também está incorreta, pois afirma que o IDEB foi, no total de
2007, inferior à meta para o mesmo ano. Já vimos que, de fato, todos os índices de
2007 foram superiores às metas estabelecidas.
Já o início da frase está correto, pois conforme o site do MEC, o IDEB
“sintetiza dois conceitos igualmente importantes para a qualidade da educação:
aprovação e média de desempenho dos estudantes em língua portuguesa e
matemática. O indicador é calculado a partir dos dados sobre aprovação escolar,
obtidos no Censo Escolar, e médias de desempenho nas avaliações do INEP, o
SAEB e a Prova Brasil”.
Na alternativa D o erro está na escala apresentada no final da questão,
quando diz que a escala do IDEB vai de zero a seis. Na realidade vai de zero a dez, conforme expresso no site do MEC: “o indicador, que mede a qualidade da
educação, foi pensado para facilitar o entendimento de todos e estabelecido numa
escala que vai de zero a dez
Na alternativa E é errôneo dizer que a expectativa de avanço nas escolas
estaduais é inferior àquela esperada nas escolas municipais, pois “o IDEB foi criado
para medir a qualidade de cada escola e de cada rede de ensino”. Cada sistema
municipal, estadual e federal de ensino tem metas de qualidade a atingir. Isso
significa que “cada sistema deve evoluir segundo pontos de partida distintos e com
esforço maior daqueles que partem em pior situação, com um objetivo implícito de
redução da desigualdade educacional. É importante esclarecer que o procedimento
do cálculo dos esforços e metas intermediárias dos Estados, municípios e escolas,
leva em consideração o IDEB inicial observado, fazendo com que cada rede obtenha
uma trajetória diferente para o IDEB ao longo dos anos” (INEP).
”.
36 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
QUESTÃO 21
A racionalidade científica, forma dominante de pensar e de agir na Modernidade,
transformou o homem e sua ação em objetos de investigação. Passaram a ser
tratados da mesma forma que as “coisas” e os fenômenos da natureza, como
“objetos” fixos, imutáveis.
O historicismo veio a se opor a essa perspectiva positivista, chamando a atenção
para a dimensão histórica da existência, do mundo e da sociedade. As vertentes da
pesquisa em educação que acompanharam essa discussão incorporaram idéias do
historicismo e trouxeram para a prática da investigação o pressuposto de que
(A) a pesquisa educacional supõe a existência de métodos previamente definidos. (B) a objetividade e a universalidade do conhecimento são garantidas pelos
métodos de pesquisa. (C) a metodologia da pesquisa determina a produção dos conhecimentos histórico-
educacionais. (D) o conhecimento da realidade só é possível por meio do controle do fenômeno
educacional. (E) o conhecimento educacional depende da compreensão dos processos sócio-
históricos. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta. Conteúdo avaliado: racionalidade científica e investigação científica.
Autor: Marcos Villela Pereira
Alternativa correta: E
Comentários:
A questão pauta um confronto bastante conhecido no âmbito da teoria da
ciência e da história da filosofia. O corpo do enunciado inicia por caracterizar uma
vertente dessa polarização, o Positivismo. Logo após, apresenta o contraponto
historicista e, no último período da raiz, formula uma sentença inconclusa que
deverá ser completada com o trecho expresso em alguma das alternativas
elencadas abaixo. Vejamos alguns supostos que compõem o corolário da questão.
Após a derrocada do cosmocentrismo (característico da antiguidade clássica)
e do teocentrismo (característico da Idade Média), podemos acompanhar a
ascensão do antropocentrismo, no âmbito da civilização ocidental. O homem coloca-
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 37
se no centro do mundo e dos processos de conhecimento, articulando sua razão
com a empiria para produzir as verdades necessárias para sua vida, individual e
coletiva. O advento das Ciências acompanha esse agenciamento entre a razão e o
mundo empírico, provocando a reabilitação de um interminável questionamento
acerca da verdade, oscilando entre uma visão racionalista (de que a verdade reside
no sujeito) e uma visão empirista (de que a verdade reside no objeto).
Quando se produz um deslocamento epistemológico e o sujeito que conhece
também ocupa o lugar de objeto a ser conhecido, trava-se um grande embate entre
os pensadores acerca de como deve ser objetivada essa forma de conhecimento.
No decorrer da modernidade clássica, presenciamos a consolidação do
Positivismo que, num impulso de apreensão de verdades universais acerca do
homem e da sociedade, busca submetê-los às mesmas condições de controle que
as coisas e os fenômenos da natureza. E as ciências humanas – mais notadamente
a sociologia – emergem aí como uma espécie de física social, tentando replicar o
modelo da física no estudo do homem e suas relações. Para poder suportar a
aplicação do método científico tradicional, entretanto, esse objeto precisou ser
considerado como de natureza fixa e imutável, a exemplo dos objetos de
conhecimento das ciências naturais.
Essa visão, entretanto, começa a ser contestada e confrontada pelos
pensadores que pautam o entendimento na dimensão histórica da realidade, ou
seja, por aqueles que reconhecem que cada lugar ou cada época, tomados como
referência para uma leitura da realidade, produz uma perspectiva diferente. Dessa
maneira, fragiliza-se a hipótese de que possa haver “uma” verdade, universal e
absoluta, acerca da realidade humana e social. Cada vez mais eles reforçam a
noção de que há tantas verdades quantas são as posições que o sujeito
cognoscente ocupa em sua trajetória investigativa. Dessa maneira, também a
universalidade do método (próprio daquele modelo anterior) perde sua condição
determinante. A forma como a realidade será abordada também obedece a alguma
relativização histórica.
A formulação dessa Questão 21, então, toma como mote principal essa
segunda perspectiva, articulando-a com a pesquisa educacional. A questão,
propriamente dita, solicita que se identifique qual, dentre as cinco alternativas, é
38 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
aquela que expressa a contribuição do historicismo para as vertentes da pesquisa
aplicada à educação que se alinham a esse modelo.
A primeira alternativa, em que se afirma que “a pesquisa educacional supõe a
existência de métodos previamente definidos”, remete a um importante postulado
positivista, de que o método deve ser estabelecido a priori para que seja assegurada
a objetividade da investigação. O argumento, nesse caso, se aproxima da ideia de
neutralidade, na medida em que se supõe que o método independe do objeto ou dos
propósitos da pesquisa. A segunda alternativa praticamente repete a primeira ao
propor que “a objetividade e a universalidade do conhecimento são garantidas pelos
métodos de pesquisa”, reiterando o mesmo princípio já mencionado. A terceira
alternativa – “a metodologia da pesquisa determina a produção dos conhecimentos
histórico-educacionais” – apresenta uma pequena variação. Um pouco maliciosa,
uma vez que introduz na formulação a expressão “conhecimentos histórico-
educacionais” e suscita alguma suspeita de que seu teor se alinha com a proposição
do enunciado. Entretanto, se analisarmos o período, observamos que a ênfase dada
ao sujeito (a metodologia) e ao verbo (determina) levam novamente ao mesmo lugar
já identificado nas duas alternativas anteriores, ou seja, de que a atitude de pesquisa
é um expediente neutro, independente do objeto a ser conhecido, e que o método
deve ser estabelecido a priori.
A quarta alternativa, que diz que “o conhecimento da realidade só é possível
por meio do controle do fenômeno educacional”, nos oferece duas pistas para
interpretação. A primeira é a partícula “só”: essa partícula restringe a possibilidade de
entendermos o processo cognitivo a uma única via, caracterizando uma concepção
universal e absoluta do ato de conhecer. A segunda é a noção de “controle”, que
supõe e reitera aquela noção já apresentada na raiz da questão, relativa ao
Positivismo, que considera que o homem e sua ação devem ser considerados como
coisas ou como fenômenos da natureza, sendo passíveis de controle.
A última alternativa, que diz que “o conhecimento educacional depende da
compreensão dos processos sócio-históricos”, é a correta. Não apenas por
exclusão. Há também duas pistas em sua formulação que nos ajudam a chegar a
essa conclusão. A primeira é a ideia de dependência: o conhecimento depende da
compreensão, ou seja, não se verifica o pressuposto de uma verdade única e
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 39
absoluta, mas a existência de diferentes possibilidades de leitura do mundo e,
portanto, de produção de verdades. A segunda é a noção de compreensão, ou seja,
a ideia de que o conhecimento resulta não de uma descoberta ou revelação mas de
uma compreensão. O sujeito cognoscente compreende porque articula a
contingência de seus saberes prévios, da situação histórica em que se encontra e da
perspectiva produzida a partir da posição que ocupa, produzindo assim uma verdade
que é histórica e social.
40 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
QUESTÃO 22
Há uma discussão do “ser” professor que envolve a diferenciação entre a pedagogia
do professor e a pedagogia do mestre. A função do professor é ensinar a todos a
mesma coisa e a do mestre, anunciar, a cada um, uma verdade particular, uma
resposta singular e uma realização. Nesse sentido, o mestre é o condutor do
discípulo até si mesmo, um agente de seu processo de individuação. O discípulo
confia no mestre para que o instrua e o conduza enquanto ele não for capaz de se
conduzir sozinho, entendendo que a condição de discípulo é provisória. Assim, a
experiência do mestre, adquirida através da prática e da sagacidade, é, na verdade,
a capacidade de discernimento dos espíritos que, ao pressentir as possibilidades de
cada um, propõe-lhes fins ao seu alcance, assim como os meios de alcançá-los,
através da utilização das suas capacidades.
As idéias do texto afirmam:
I a confiança do discípulo na figura do mestre;
II a busca de padrões nos processos de individuação;
III o entendimento das limitações e possibilidades de mestres e discípulos;
IV a percepção do mestre como condutor às verdades.
De acordo com o texto, é(são) correta(s) APENAS a(s) idéia(s)
(A) II (B) IV (C) I e II (D) I e III (E) I, II e III Tipo de questão: escolha múltipla com mais de uma alternativa correta.
Conteúdo avaliado: Pedagogia do Professor e Pedagogia do Mestre. Autor: Helena Sporleder Côrtes
Alternativa correta: D
Comentários:
Ainda que, sob o ponto de vista teórico-metodológico, realmente consideremos
discutível a distinção entre ‘professor’ e ‘mestre’, há que reconhecer que o senso
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 41
comum – e, mesmo, a produção literária, em geral – de certo modo, já consagrou, no
imaginário coletivo, essa diferenciação proposta pela questão em pauta.
Assim, o ‘mestre’ é ‘quem, de repente, aprende’ (no sentido de que os
processos de ensinar e aprender, embora distintos, não são exclusivos, em relação
à função específica dos atores envolvidos: o professor, que, por ofício, ensina,
também aprende com o aluno (tanto quanto este, que chega à escola para
‘aprender’, também ensina àquele os saberes que construiu ao longo de sua
experiência anterior), num movimento permanente de troca de papéis e
competências diferenciadas. ‘Mestre’, então, sob esse enfoque não acadêmico, seria
o professor mais ‘qualificado’, mais ‘sensível’, capaz de reconhecer a importância
dos demais saberes – definido a partir do senso comum, da experiência cotidiana,
da percepção mágica, entre outros – e usá-los como ponto de partida para a
organização de estratégias didáticas que permitam sua articulação ao conhecimento
científico com o qual lhe cabe trabalhar.
Além disso, tal ‘sensibilidade’ também conferiria ao professor um
conhecimento mais aprofundado de seus alunos, de modo a avaliar com mais
critério suas efetivas condições e possibilidades de aprendizagem – conhecer a
realidade dos diferentes ‘pontos de partida’ permite projetar mais consistentemente
os possíveis ‘pontos de chegada’...
Estabelecidas essas considerações introdutórias como referências para a
análise da questão 22, observem-se as razões que direcionam a resposta correta à
alternativa (D):
- a alternativa A, que contém apenas uma afirmação – a busca de padrões
nos processos de individuação – não pode ser aceita, na medida em que o processo
de construção da individualidade não obedece apenas a ‘padrões’ predefinidos,
sendo caracteristicamente subjetivo e dependente da interação singular de cada
indivíduo com o meio circundante;
- a alternativa B, também apenas com uma afirmação – a percepção do
mestre como condutor às verdades – igualmente não há de ser correta, pois esta
não deve ser a proposta do ensino: ao mestre/professor não cabe ‘conduzir às
42 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
verdades’, senão que estabelecer as condições favoráveis para que as verdades
(sempre provisórias) de cada um possam ser consistente, individual e coletivamente
construídas na interação com o mundo e com o outro;
- a alternativa C, embora proponha a confiança do discípulo na figura do
mestre – fator necessário à relação professor-aluno – também envolve a afirmação
II, já analisada como incorreta, o que a desqualifica como resposta certa;
- a alternativa E, por reunir a afirmação I (correta), às afirmações II e III, que já
se mostraram inconsistentes (portanto, incorretas), igualmente não pode ser
escolhida;
- a alternativa D, por consequência, que reúne as afirmações I e III, passa a
ser a necessária opção: não só é fundamental, na relação entre ensino e
aprendizagem, a confiança do discípulo (aluno) na figura do mestre (professor),
como o entendimento das limitações e possibilidades de mestres e discípulos é
parte central das condições propícias para que esta confiança possa ser
estabelecida. Assim, ao enfatizar que “a experiência do mestre, adquirida através da
prática e da sagacidade, é, na verdade, a capacidade de discernimento dos espíritos
que, ao pressentir as possibilidades de cada um, propõe-lhes fins ao seu alcance,
assim como os meios de alcançá-los, através da utilização das suas capacidades”, o
texto alude a essa concepção empírica que confere ao ‘mestre’ uma ‘fluida
competência’ que o distingue do ‘professor’ – nesta perspectiva, o verdadeiro mestre
é o professor experiente, capaz de conhecer-se e sensibilizar-se ante as
características individuais de seus alunos, conhecendo e avaliando suas efetivas
capacidades, para fornecer-lhes, com seu ensino, o alcance das aprendizagens que
lhes são possíveis.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 43
QUESTÃO 23
As Diretrizes Curriculares da Educação Infantil e os Referenciais Curriculares
propõem a educação infantil como espaço de cuidar e educar. Essa concepção
também se estende às creches, sobre as quais afirma-se:
I as creches são lugar de proteção e de cuidados com a saúde, bem como de educação para as crianças;
II o ambiente escolar da creche se constitui como espaço assistencialista às crianças;
III o processo educativo na creche promove o desenvolvimento afetivo, cognitivo e social;
IV como espaço de guarda e tutela, a creche tem especial cuidado com a saúde e a higiene das crianças.
São afirmações adequadas à concepção de creche, expressas nos documentos
citados, APENAS
(A) I e II (B) I e III (C) II e III (D) II e IV (E) III e IV Tipo de questão: escolha múltipla com mais de uma alternativa correta.
Conteúdo avaliado: Diretrizes Curriculares e Referenciais Curriculares da
Educação Infantil.
Autor: Beatriz Kulisz
Alternativa correta: B
Comentários:
Não podemos deixar de reconhecer os grandes avanços no campo da
legislação, fruto de intensa mobilização popular, desde a promulgação da
Constituição de 1988, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) de 1988, e da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) em 1996. Na Constituição, a
educação das crianças de 0 a 6 anos, anteriormente concebida, muitas vezes, como
amparo e assistência, passou a figurar como direito do cidadão e dever do Estado,
numa perspectiva educacional, em resposta aos movimentos sociais na defesa dos
44 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
direitos das crianças. Na LDB, a Educação Infantil constitui a primeira etapa da
Educação Básica, tendo como objetivo o desenvolvimento integral da criança até os
6 anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, em
complementação à ação da família e da comunidade. A subordinação do
atendimento em creches e pré-escolas à área da Educação Infantil representa, no
texto constitucional, conforme Campos (1995), um grande passo na direção da
superação do caráter assistencialista predominante nos anos anteriores à
Constituição. No caso especifico das creches, tradicionalmente vinculadas às áreas
de assistência social, essa mudança foi bastante significativa para a integração entre
creches e pré-escolas, entre o cuidar e o educar.
É na Educação Infantil que se estabelecem as bases da personalidade
humana, da inteligência, da vida emocional e da socialização, as primeiras
experiências da vida são as que marcam mais profundamente a pessoa. Assim
definida como a primeira etapa da Educação Básica, a Educação Infantil passou a
ser parte intrínseca do processo educacional e, consequentemente, do sistema de
ensino, tendo sua atenção à primeira etapa daquela que deve ser a base da
Educação Infantil. Para atender às inúmeras necessidades da criança, a creche e a
pré-escola têm que integrar, no educar, a dimensão do cuidar, sem hierarquizar
funções. A Educação Infantil, embora tenha mais de um século de história como
cuidado e educação extradomiciliar (KRAMER, 1994), somente nos últimos anos foi
reconhecida como direito da criança, das famílias, como dever do Estado e como a
primeira etapa da Educação Básica.
A creche, segundo Faria (2007), como primeira etapa da Educação Básica,
conforme a LDB, constitui um espaço de educação, quando pais e profissionais
entendem que o processo de desenvolvimento de uma criança até os 3 anos
envolve cuidados com saúde, nutrição e higiene, além das aprendizagens que ela
realiza nas interações com os adultos, com as outras crianças e os objetos
presentes do meio físico e social. A creche tem uma ação complementar, e não
substituta à da família, compreendendo assim o significado e o valor do trabalho
com crianças, criando condições para um relacionamento de confiança e respeito
em que a criança vai encontrar espaço para crescer, aprender e se desenvolver.
Essa instituição deve dar sentido à vida da criança, segurar e realizar a fusão do
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 45
imaginário de seus pais com a criança real que se constrói como sujeito, único, com
um lugar na história. É preciso então garantir a creche como uma instituição de
educação, em que o cuidar e o educar façam parte do atendimento a todas as
crianças e suas respectivas famílias.
Desse modo, a Educação Infantil tem vivenciado nestes últimos anos alguns
avanços não somente no que tange aos aspectos legais como também ao
desenvolvimento de programas que procuram estabelecer em creches e escolas
infantis a integração entre cuidar e educar. Nesses programas, busca-se superar a
ideia de que cuidado e educação são momentos separados no cotidiano da criança.
Como afirma Kuhlmann (1998), os objetivos educacionais estiveram presentes no
trabalho das instituições de atendimento às crianças de zero a seis anos, desde as
primeiras vivências. A Educação Infantil deve proporcionar experiências e interações
com o mundo social e físico, focalizadas no desenvolvimento global das crianças em
todos os grupos de idade, tendo consciência cada vez mais acentuada de que
educação e cuidado são conceitos inseparáveis que, necessariamente, deverão ser
levados em consideração nos serviços de qualidade destinados às crianças. A ideia (...) do funcionamento didático da escola infantil não é a de antecipar as aprendizagens mais tipicamente escolares, mas a de “enriquecer os âmbitos da experiência das crianças que a frequentam”. Trata-se de aproveitar o amplo repertório de recursos (linguísticos, comportamentais, vivenciais, etc.) com que os sujeitos chegam à escola e utilizá-los para complementar o arco de experiências desejáveis para essa idade (ZABALZA, 1998, p.17).
As propostas educacionais das escolas infantis, embora priorizando a
educação, também atendem as funções vinculadas à guarda e assistência das
crianças. É necessário compreender que cada ação na Educação Infantil é,
intrinsecamente, cuidado e educação. Na medida em que a higiene, a alimentação,
o sono fazem parte de toda uma vivência cultural própria de grupo social, toda
interação com as crianças e as famílias sobre esses aspectos estará desenvolvendo
aprendizagens e construção de novos conhecimentos entre todos os envolvidos.
Sabe-se que nas instituições que apresentam um bom atendimento, é possível
constatar nas atividades e vivências pedagógicas com as crianças a aquisição de
novos conhecimentos por meio do brincar, além dos cuidados necessários para o
desenvolvimento físico e emocional dos mesmos, através da ação de professores
46 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
qualificados que exercem um papel socioeducativo fundamental no processo
educativo. Dessa forma, afirma Gandini (2002), o trabalho pedagógico busca
atender às necessidades determinadas pela especificidade da faixa etária,
superando a visão adultocêntrica em que a criança é concebida como vir a ser,
portanto, necessita ser “preparada para”.
As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil, como uma proposta
pedagógica, defendem alguns princípios norteadores para a formação da criança
(como ética, autonomia, solidariedade, respeito, entre outros), além de utilizar as
práticas cotidianas para influenciar no seu desenvolvimento integral. Desse modo,
educar e cuidar, um princípio indissociável e norteador do trabalho pedagógico nas
instituições voltadas para as crianças de 0 a 6 anos, conforme estabelecem as
Diretrizes Curriculares da Educação Infantil, quando defendem que as Propostas Pedagógicas para as instituições de Educação Infantil devem promover em suas práticas de educação e cuidados, a integração entre os aspectos físicos, emocionais, afetivos, cognitivo/ linguísticos e sociais da criança, entendendo que ela é um ser total, completo e indivisível. Desta forma ser, sentir, brincar, expressar-se, relacionar-se, mover-se, organizar-se, cuidar-se, agir e responsabilizar-se são partes do todo de cada indivíduo, menino ou menina, que desde bebês vão, gradual e articuladamente, aperfeiçoando estes processos nos contatos consigo próprios, com as pessoas, coisas e o ambiente em geral (BRASIL, 1999).
Em 1998 foi elaborado o Referencial Curricular Nacional para a Educação
Infantil (RCNEI), no contexto da definição dos Parâmetros Curriculares Nacionais no
atendimento ao que está estabelecido no art. 26 da LDB em relação à necessidade
de uma base nacional comum para os currículos. Visa, também, contribuir para que
possa realizar, nas instituições, a socialização dessa etapa educacional, em
ambientes que propiciem o acesso e a ampliação, pelas crianças, dos
conhecimentos da realidade social e cultural. Esse documento de referência que
apresenta orientações pedagógicas para superar a dicotomia entre creche e pré-
escola, cuidado e educação, assistência e desenvolvimento/aprendizagem, faz
distinção do que é cuidar e do que é educar. Salienta a indissociabilidade desses
dois termos na Educação Infantil como também aponta metas de qualidade que
contribuam para que as crianças tenham um desenvolvimento integral de suas
identidades, capazes de crescerem como cidadãos de direitos à infância. Na
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 47
perspectiva da integração de cuidados e educação, o Referencial Curricular definiu o
educar da seguinte maneira: Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança, e o acesso, pelas crianças, aos conhecimentos mais amplos da realidade social e cultural. Neste processo, a educação poderá auxiliar o desenvolvimento das capacidades de apropriação e conhecimento das potencialidades corporais, afetivas, emocionais, estéticas e éticas, na perspectiva de contribuir para a formação de crianças felizes e saudáveis (BRASIL, 1998, p. 23).
Nesse mesmo documento citado anteriormente, que possui um caráter
instrumental e didático, é defendida a ideia de que os professores devem ter a
consciência, em sua prática educativa, de que a construção de conhecimentos se dá
de maneira integrada e global, sem esquecer-se da necessidade da integração do
cuidar e do educar no atendimento das crianças de 0 a 6 anos. Nessa perspectiva, o
Referencial tem como base o desenvolvimento das capacidades cognitivas do
pensamento humano através de uma estreita relação com o processo das
aprendizagens específicas que as experiências educacionais podem proporcionar.
Assim define o cuidar como: ‘[...] valorizar e ajudar a desenvolver capacidades. O cuidado é um ato em relação ao outro e a si próprio que possui uma dimensão expressiva e implica procedimentos específicos.’ (...) Para se atingir os objetivos dos cuidados com a preservação da vida e com o desenvolvimento das capacidades humanas, é necessário que as atitudes e procedimentos estejam baseados em conhecimentos específicos sobre o desenvolvimento biológico, emocional, e intelectual das crianças, levando em consideração as diferentes realidades socioculturais (BRASIL, 1998, p.24-25).
A integração entre o cuidar e educação precisa então permear todo o projeto
pedagógico de uma creche, pré-escola ou escola, em um planejamento em que o
cuidado e a aprendizagem sejam mais efetivos e prazerosos, com sintonia entre
quem cuida e quem é cuidado, entre quem ensina e quem aprende, em que o
professor educador é capaz de respeitar o momento da criança, proporcionando
condições que a acolham e assegurem o atendimento integral, considerando seus
aspectos físico, afetivo, cognitivo/linguístico, sociocultural, bem como as dimensões
48 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
lúdicas, artística e imaginária (FORMOSINHO, 2007). O acesso das crianças à
educação e ao cuidado de qualidade tem, antes de tudo, a missão de acolher, de ser
o lugar do encontro e de estar aberto para o novo, o original, o criativo.
Referências bibliográficas: BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. Resolução CEB nº. 1, de 7 de abril de 1999. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 13 de abril de 1999. CAMPOS, Maria Malta; ROSEMBERG, Fúlvia; FERREIRA, Isabel M. Creches e pré-escolas no Brasil. São Paulo: Cortez, 1995. GANDINI, L.; EDWARDS, C. Bambini. A abordagem Italiana à Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 2002. FARIA, Ana Lucia Goulart de. O coletivo infantil em creches e pré-escolas – fazeres e saberes. São Paulo: Cortez, 2007. FORMOSINHO, Júlia Oliveira (org.) Pedagogia(s) da Infância: Dialogando com o Passado: Construindo o Futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007. KRAMER, Sonia. A política do pré-escolar no Brasil: A arte do disfarce. São Paulo: Cortez, 1994. KUHLMANN JÚNIOR, Moysés. Infância e Educação Infantil: uma abordagem histórica. Porto Alegre: Mediação, 1998. ZABALZA, Miguel A. Qualidade em Educação Infantil. Tradução. Beatriz Affonso Neves. Porto Alegre: Artmed, 1998 Outras sugestões de bibliografias: ÀRIES, Philipe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LCT, 1978. BRASIL. Educação e cuidado na primeira infância: grandes desafios. Brasília: UNESCO Brasil, 2002. EDWARDS, Carolyn; GANDINI, Lella; FORMAN, George. As cem linguagens da criança: a abordagem de Reggio Emilia na educação da primeira Infância. Porto Alegre: Artmed, 1999. FARIA Ana Lucia Goulart de. Educação pré-escolar e cultura. Campinas: Cortez, 1999. KINNEY, Linda. Tornando visível a aprendizagem das crianças: Educação Infantil em Reggio Emilia. Porto Alegre: Artmed, 2009.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 49
KRAMER, Sonia e NUNES, Maria Isabel. Infância: Fios e desafios da pesquisa. Rio de Janeiro: Papirus, 1996. TIRIBA, Lea. Educar e cuidar: buscando a teoria para compreender discursos e práticas. Rio de Janeiro: Ática, 2005. SANCHES, Emilia Cipriano. Creche: realidade e ambiguidades. Petrópolis: Vozes, 2004. ZABALZA, Miguel. Diários de aula: um instrumento de pesquisa e desenvolvimento profissional. Porto Alegre: Artmed, 2004.
50 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
QUESTÃO 24
Jornal do Brasil. Rio de Janeiro.
A tirinha de Ziraldo apresenta-nos uma situação corriqueira. De um modo geral, tem-
se a concepção de que as crianças aprenderão os conhecimentos em um único dia
e de uma única forma. Essa concepção perde o sentido quando se pensa, por
exemplo, nos ciclos básicos de alfabetização, pois os mesmos pressupõem que a
alfabetização é
(A) marcada por estágios. (B) linearmente construída. (C) construída em processo. (D) elaborada sem interrupções. (E) aprendida por etapas sucessivas. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: ciclos básicos da alfabetização.
Autor: Maria Conceição Pillon Christofoli
Alternativa correta: C Comentários:
A tirinha de Ziraldo ilustra a questão 24, abordando a temática da
aprendizagem escolar, mais especificamente uma aprendizagem focada no
aprender a ler e a escrever: a alfabetização. Nesse sentido, a alfabetização é uma
aprendizagem que está sob responsabilidade da escola, sendo que até a aprovação
do Plano Nacional de Educação de 2001, Lei nº 10.172, a alfabetização deveria
ocorrer no primeiro ano do Ensino Fundamental. A instituição dos ciclos básicos de
alfabetização vem assegurar um direito das crianças de terem um tempo maior para
a aprendizagem da escritura. As crianças que têm contato com a língua escrita, por
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 51
exemplo, as que escutam histórias lidas por adultos, as que assistem a diferentes
atos de leitura e escrita, as que começam desde muito cedo a construir hipóteses
sobre a língua escrita, provavelmente se alfabetizem ao final de um ano de estudos.
Considera-se, entretanto, que as crianças que não têm oportunidades de interação
com a língua escrita contem somente com a escola como forma de enriquecer seus
conhecimentos sobre a língua escrita. Daí a necessidade de uma escola que
promova situações que oportunizem aprendizagens e que favoreçam a
compreensão de que a escrita é um processo de representação. Cabe ressaltar que,
embora fique sob a responsabilidade da escola esse tipo de aprendizado, se sabe
que antes mesmo de nela ingressar todas as crianças começam a pensar e a
construir ideias sobre o funcionamento da escrita. Como afirma Ferreiro (2000, p.65), As crianças de todas as épocas e de todos os países ignoram a restrição de que para aprender precisam ingressar na escola. Nunca esperaram ter 6 anos e ter uma professora à sua frente para começarem a aprender. No esforço de compreender o mundo que as rodeia, levantam problemas muito difíceis e abstratos e tratam, por si próprias, de descobrir respostas para eles. Estão construindo objetos complexos de conhecimento e o sistema de escrita é um deles.
Como é processo, a alfabetização precisa de tempo e de experiências ricas
de interação com a leitura e a escrita, portanto a resposta correta é a letra C.
A alternativa A, “marcada por estágios”, não é totalmente incorreta, mas não
se refere a que estágios. Da mesma forma a alternativa E “aprendida por etapas
sucessivas” também não refere quais etapas são essas e a que se referem. A
alternativa B “linearmente construída” é incorreta, pois a alfabetização, por ser um
processo, não é linear e não tem um método a ser seguido, como era a concepção
que norteava as práticas pedagógicas de alfabetização da escola tradicional. A
alternativa D “elaborada sem interrupções” é semelhante à alternativa B, a escola
tradicional considerava que a alfabetização deveria seguir um método, com
sequências preestabelecidas e não considerava que conhecimentos sobre a língua
escrita as crianças possuíam.
Referências bibliográficas: FERREIRO, Emilia. O passado e o presente dos verbos ler e escrever. São Paulo: Cortez, 2000.
52 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
QUESTÃO 25
Numa sala de aula de terceiro ano do ensino fundamental, com crianças oriundas de
várias regiões do Brasil, um aluno pronunciou a palavra olho como [oio]. Outra
criança da turma chamou-lhe a atenção, corrigindo-lhe a fala. A professora
aproveitou a oportunidade e pediu a todos para que, a partir dali, falassem sempre
como se escreve, ou seja: os que falassem [sau] deveriam sempre falar [sal]; os que
falassem [viage] deveriam sempre falar [viagem]; os que falassem [bodi] deveriam
sempre falar [bode]; os que falassem [cantano] deveriam sempre falar [cantando].
Rapidamente as crianças perceberam que ficou muito difícil falar e que seria
impossível falar sempre exatamente como se escreve. A professora aproveitou para
explicar que ninguém fala exatamente como se escreve.
Essa professora sabe que
(A) as relações arbitrárias e não perfeitas entre sons e letras são raras. (B) as variações dialetais de origem social e regional devem ser superadas. (C) as variações da língua falada têm significados afetivos e culturais. (D) a língua portuguesa escrita não é fonética. (E) a correspondência entre os sons da fala e a escrita fonética é invariável. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: variações da língua falada. Autor: Maria Conceição Pillon Christofoli
Alternativa correta: C
Comentários:
A questão 25 aborda as variações linguísticas da fala. Sabemos que a língua
evolui com o tempo e vai adquirindo características diferentes de acordo com sua
comunidade social e cultural, do seu grupo de pertencimento. A linguagem oral,
assim como a linguagem escrita, é aprendida na interação com os falantes da
língua. Para Cagliari (2003) “os modos diferentes de falar acontecem porque as
línguas se transformam ao longo do tempo, assumindo peculiaridades e
características de grupos sociais diferentes, e os indivíduos aprendem a língua ou
dialeto da comunidade em que vivem”. Ainda segundo o autor, as variações
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 53
linguísticas são todas corretas e perfeitas, do ponto de vista estrutural linguístico.
Entretanto, o que pode lhes outorgar maior ou menor prestígio são os valores sociais
que cada sociedade atribui a seus membros. Uma variação linguística também se
origina da carga de afeto porque é a marca de pertencimento a uma comunidade:
um mineiro, um sergipano, um gaúcho (no próprio estado do RS: quem nasce em
Uruguaiana, quem nasce em Feliz e quem nasce em Porto Alegre têm o seu modo
de falar peculiar), enfim seja de que natureza for a variação linguística, importa
ressaltar que não há nenhuma “melhor forma de falar”, o que há são variações e
diferenças que não significam desigualdade.
A escola, de um modo geral, emprega os mesmos mecanismos da
sociedade para a valorização - ou não - de determinadas variações linguísticas,
quando deveria proceder como a professora da questão analisada, ou seja, propor
situações para que os alunos reflitam sobre as variações linguísticas, para que
percebam que não há uma forma melhor que outra, mas que uma língua abarca
uma riqueza de variedades de acordo com as diferentes peculiaridades de seus
grupos de falantes.
A alternativa correta é a C, pois a professora sabe que as diferenças
linguísticas são as marcas de diferentes grupos sociais e que não há uma melhor do
que a outra, não há apenas uma correta e mais perfeita, já que todas são corretas.
A alternativa A é incorreta, pois não é raro termos relações arbitrárias e
imperfeitas entre letras e sons, por exemplo, a letra “e” das palavras leite, contente,
quente, tem o som de [i]. Da mesma forma, a letra “o” nas palavras aluno, barco,
quadro, muitas vezes assume o som de [u], bem como a letra “l” nas palavras
cálculo, jornal, sol, assume o som de [u],portanto não são raras, mas sim frequentes
as relações imperfeitas entre som e letra.
A alternativa B que trata das “variações dialetais de origem regional e social
[que] devem ser superadas” está incorreta, pois a riqueza de uma língua está na sua
diversidade, portanto anulá-la significa dizer que só há uma única e correta forma de
falar, sendo que a língua é dinâmica, viva, e sofre alterações no tempo e no espaço
em que é falada.
A alternativa D, “a Língua Portuguesa não é fonética”, é igualmente incorreta,
pois a língua é constituída de fonemas - unidades mínimas de sons da fala. Dessa
54 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
forma, dizer que a Língua Portuguesa não é fonética seria o mesmo que dizermos
que nossa língua não tem som.
A última alternativa da questão, “A correspondência entre os sons da fala e a
transcrição fonética é invariável”, também está incorreta, pois a transcrição fonética
é dependente de inúmeras variáveis.
Referências bibliográficas: CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e lingüística. São Paulo: Scipione,2003.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 55
QUESTÃO 26
A professora Inês, interessada em integrar matemática e artes plásticas, propôs aos
seus alunos uma pesquisa da obra do artista plástico Piet Mondrian (1872-1944),
que consistiu na observação dos quadros reproduzidos abaixo.
Composição com Vermelho, Azul e Amarelo - 1930 Composição com Amarelo, Azul e Vermelho - 1939
Disponível em: http://www.artcyclopedia.com/artists/mondrian_piet.html
A qual objetivo da educação matemática para o ensino fundamental, presente nos
PCN, atende a proposta da professora, de observação dos quadros de Mondrian?
(A) Identificar formas geométricas e reproduzi-las segundo categorias artísticas miméticas, a fim de apurar o gosto estético.
(B) Estabelecer conexões entre temas matemáticos de diferentes campos e entre esses temas e conhecimentos de outras áreas curriculares.
(C) Descrever resultados com precisão e argumentar sobre suas conjecturas, estabelecendo relações entre matemática e linguagem oral.
(D) Resolver situações-problema para validar estratégias e resultados, identificando os ângulos obtuso, agudo e reto entre as formas geométricas.
(E) Apurar a percepção da forma e estimular a sua criação, por meio da cooperação, tendo em vista a solução de problemas numéricos propostos.
Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: conhecimento dos Parâmetros Curriculares Nacionais de
Matemática referentes às quatro primeiras séries da Educação Fundamental.
Autor: Rosana Maria Gessinger e Rosane da Conceição Vargas
Alternativa correta: B
Comentários:
No enunciado da questão 26 é apresentada a intenção da professora de
integrar matemática e artes plásticas, duas áreas curriculares distintas. Para isso,
56 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
ela propõe aos alunos uma pesquisa sobre a obra do artista plástico Mondrian.
Assim, busca estabelecer conexões entre a geometria, que é um campo da
matemática, com a arte. A proposta da professora contempla o objetivo expresso na
página 37 dos PCN, de “estabelecer conexões entre temas matemáticos de
diferentes campos e entre esses temas e conhecimentos de outras áreas
curriculares”, que corresponde à alternativa B.
As alternativas A e E estão incorretas, pois não expressam os objetivos da
educação matemática presentes nos PCN, conforme solicitado no enunciado da questão.
A alternativa C está incorreta, pois apresenta parte de um objetivo da
educação matemática para o Ensino Fundamental presente nos PCN, “comunicar-se
matematicamente, ou seja, descrever, representar e apresentar resultados com
precisão e argumentar sobre suas conjecturas, fazendo uso da linguagem oral e
estabelecendo relações entre ela e diferentes representações matemáticas”. No
entanto, a atividade proposta pela professora não dá conta de tal objetivo.
A alternativa D está incorreta, pois coincide em parte com um dos objetivos
expressos nos PCN, qual seja, resolver situações-problema, sabendo validar estratégias e resultados, desenvolvendo formas de raciocínio e processos, como dedução, indução, intuição, analogia, estimativa, e utilizando conceitos e procedimentos matemáticos, bem como instrumentos tecnológicos disponíveis (BRASIL, 1998).
No entanto, os PCN não fazem referência explícita a conteúdos específicos como a
identificação de ângulos referida na alternativa D. Tampouco a atividade proposta
pela professora contempla o objetivo referido.
Referência bibliográfica: BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: matemática. Brasília: MEC/SEF, 1998.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 57
QUESTÃO 27
Observe a ilustração abaixo.
A fala do menino permite os comentários a seguir.
I Quando o menino diz “e vão quatro”, utiliza-se de um mecanismo que não reflete o valor posicional do algarismo, realizando a operação de forma mecânica.
II Expressões como “e vão quatro” ou “desce um” estão relacionadas à “troca” que ocorre na base 10, no sistema de numeração decimal, no entendimento de sua estrutura lógico-matemática.
III O ensino de regras destituídas de significados pode estar na origem das dificuldades apresentadas por crianças, ao tentarem utilizar os algoritmos na resolução de problemas.
IV A compreensão do valor posicional de um algarismo é favorecida quando a criança opera com materiais concretos em que pode agrupar elementos de dez em dez ou de cem em cem, por exemplo.
São corretos os comentários
(A) I e II, apenas. (B) I e III, apenas. (C) II e III, apenas. (D) II, III e IV, apenas. (E) I, II, III e IV. Tipo de questão: escolha múltipla com mais de uma alternativa correta. Conteúdos avaliados: resolução de problemas matemáticos, sistema de
numeração decimal e valor posicional do número.
Autor: Rosane da Conceição Vargas e Rosana Maria Gessinger
Alternativa Correta: E
58 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
Comentários: As afirmativas I e II estão interligadas, portanto serão analisadas em conjunto.
É necessário destacar que o sistema de numeração decimal, como seu nome
expressa, é de base dez, ou seja, possui uma estrutura organizada de dez em dez.
Além disso, é um sistema posicional, pois o valor dos algarismos depende da
posição em que se encontram.
As crianças, ao realizarem uma operação de multiplicação de unidade pela
dezena (caso do menino da questão), devem compreender que o resultado da
multiplicação sempre terá como resposta um numeral representando as dezenas.
Quando a criança diz: “e vão quatro”, está demonstrando que pode não ter
compreendido o valor posicional deste número, que neste caso é quarenta,
mostrando desta forma, uma aprendizagem calcada na resolução direta do
algoritmo, sem compreensão do valor relativo e absoluto do número e sem fazer as
relações numéricas com o significado das operações.
A afirmativa III está correta, pois o ensino da matemática deve se valer da
resolução de problemas, ou seja, de situações significativas que criam desafios a
serem vencidos, possibilitando o uso de conhecimentos prévios e de diferentes
estratégias, sem dispor de procedimentos automáticos para chegar à solução,
diferenciando-se assim dos meros exercícios repetitivos (POZO, 1998).
A afirmativa IV está correta, pois reitera a ideia de que o conhecimento do
valor posicional do número pode ser facilitado pelo uso de materiais concretos que
permitam realizar agrupamentos de dez em dez, que irá facilitar ao aluno a
realização das “trocas” a cada dez unidades. O esquema simbólico que usamos
para representar os números deve ser coordenado com o esquema de
agrupamento.
Referência bibliográfica: POZO, Juan Ignácio (Org.). A solução de Problemas. Aprender a resolver, resolver para aprender. Porto Alegre: Artmed, 1998.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 59
QUESTÃO 28
O menino que carregava água na peneira Manoel de Barros
Tenho um livro sobre águas e meninos. Gostei mais de um menino que carregava água na peneira. A mãe disse que carregar água na peneira
Era o mesmo que roubar um vento e sair correndo com ele pra mostrar aos irmãos.
A mãe disse que era o mesmo que catar espinhos na água O mesmo que criar peixe no bolso.
O menino era ligado em Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos.
A mãe reparou que o menino Gostava mais do vazio Do que do cheio. Falava que os vazios são maiores E até infinitos. Com o tempo aquele menino Que era cismado e esquisito Porque gostava de carregar água na peneira
BARROS, M. de. Exercício de ser criança / bordados de Antônia
Zulma Diniz, Ângela Marilu e Sávia Dumont sobre desenhos de Demóstenes Vargas. Rio de Janeiro: Salamandra, 1999.(fragmento)
O texto e os bordados inventam uma realidade mágica e uma estética do corpo em
movimento. Esses elementos expressivos mostram algumas características de
linguagem:
I possibilidades plásticas da linguagem escrita; II aproximação do mundo mágico com o mundo real pela metáfora da água na
peneira; III literatura e arte visual como expressões dos conhecimentos que caracterizam o
mundo infanto-juvenil; IV hegemonia dos aspectos gramaticais na criação dos textos literários.
60 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
São características de linguagem evidenciadas no texto APENAS
(A) I e II (B) II e III (C) III e IV (D) I, II e III (E) II, III e IV Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: características da linguagem e teoria da literatura.
Autor: Maria Conceição Pillon Christofoli e Maria Inês Côrte Vitoria
Alternativa correta: D
Comentários:
A questão 28 aborda, a partir do poema “O menino que carregava água na
peneira”, alguns aspectos que merecem ser destacados. Nesse sentido, embora
historicamente a constituição do gênero literário – diretamente vinculado à teoria da literatura – tenha se originado do impulso de contar histórias, da necessidade de
comunicar aos outros alguma experiência, preservando íntima relação entre
literatura e oralidade, a linguagem literária contemporânea se expande para além da
oralidade, utiliza a palavra escrita e é rica em possibilidades plásticas oferecidas pela linguagem escrita. Cabe lembrar que as narrativas de caráter mágico e/ou fantasioso – difundidas e transmitidas pela oralidade – constituem-se como gênero literário durante o século XVII, com características próprias, pois decorre da
ascensão da família burguesa, do novo "status" concedido à infância na sociedade e
da reorganização da escola. Sua emergência deveu-se, antes de tudo, à sua
associação com a Pedagogia, já que as histórias eram elaboradas para se
converterem em instrumento didático. “O menino que carregava água na peneira” é
um texto literário que, longe de priorizar os aspectos puramente gramaticais, se
revela na dimensão estética, foge à prática corrente e (re)significa a linguagem de
maneira peculiar, tanto na forma quanto no conteúdo.
Dessa forma, pode-se dizer que a arte da linguagem explora todas as
potencialidades do signo linguístico, conferindo-lhe um valor singular, ao combinar,
de forma criativa, diferentes recursos. Considerando-se, portanto, a linguagem
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 61
literária como manifestação estética da totalidade da experiência humana, não nos
surpreende a constatação irrefutável de que não se conhece na história da
humanidade nenhuma sociedade que não possua manifestação artística. Daí se
dizer que a literatura é expressão do homem, do humano e meio privilegiado de
comunicação, que se inicia com as primeiras experiências da criança com a
linguagem: sons e ritmos aprendidos de maneira lúdica através das cantigas de
ninar, das cantigas folclóricas, das cantigas de roda e dos jogos de palavras e
fonemas. Nessa perspectiva, a leitura de poesias, contos, parlendas, peças de
teatro, histórias em quadrinhos, crônicas, lendas, mitos, é a forma privilegiada de ler
para nutrir e estimular o imaginário. Portanto a alternativa correta é a letra D, estão
corretas as afirmações I, II e III.
62 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
QUESTÃO 29
Em uma Escola de Ensino Fundamental, a professora de crianças 1de 6 anos
iniciará atividades para trabalhar o conceito de representação, importante para a
alfabetização geográfica e desenvolvimento do pensamento histórico. Considerando
as situações que contribuem para a construção do conceito em foco, analise as
atividades apresentadas a seguir.
I Os alunos devem trazer de casa suas fotos em idades diferentes, ordená-las cronologicamente e explicar as diferenças e semelhanças entre as imagens.
II A professora apresenta quatro fotos de uma casa em tamanhos diferentes e pede para que os alunos as recortem e as ordenem da maior para a menor.
III Os alunos observam pinturas famosas que retratam pessoas para reproduzi-las e destacar as que mais se aproximam das originais.
IV A professora solicita que as crianças preencham com cores específicas as figuras geométricas previamente desenhadas por ela.
As atividades que a professora deve trabalhar estão descritas APENAS em
(A) I e II (B) I e III (C) II e III (D) II e IV (E) III e IV
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 63
QUESTÃO 30
Estudantes de 9 anos de uma Escola de Ensino Fundamental estudam a distribuição
de água para a população.
O professor inicia a atividade com perguntas como:
• Toda água que sai da torneira é boa para beber?
• A água suja pode se tornar limpa?
• Existem casas sem água boa para beber?
As respostas são discutidas. O professor realiza em sala atividades práticas como:
• construção de uma maquete do sistema de distribuição de água da cidade;
• experiência de decantação e filtração da água;
• excursão à estação de tratamento de água da cidade.
O trabalho é ampliado para o estudo da preservação ambiental e da situação da
água potável da população, que não tem acesso à rede de abastecimento de água.
Refletem sobre como o poder público cuida da qualidade da água e das questões
ambientais e, ainda, sobre a responsabilidade social da população e dos
governantes.
A partir dessa descrição, considere as afirmações a seguir.
I As perguntas iniciais respondidas pelos alunos permitem ao professor fazer o levantamento do conhecimento prévio dos alunos.
II A contextualização dos temas ocorre durante as atividades, na inserção de aspectos do cotidiano dos alunos e da população.
III O conhecimento científico desautoriza o conhecimento que os alunos trazem de suas experiências de vida, em relação ao meio ambiente.
IV As crianças devem concluir que as questões relativas ao desmatamento próximo aos mananciais de água e a distribuição de água tratada a toda a população são de responsabilidade social exclusiva dos governos.
De acordo com a descrição, são corretas APENAS as afirmações
(A) I e II (B) I e III (C) I e IV (D) II e III (E) II e IV
64 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
Tipo de questão: escolha múltipla com mais de uma alternativa correta.
Conteúdo avaliado: Educação Ambiental.
Autor: Isabel Cristina de Moura Carvalho
Alternativa correta: A
Comentários:
A alternativa A é correta porque as afirmações I e II são claramente
compatíveis com um trabalho de educação ambiental. A afirmação I mostra a
estratégia pedagógica de problematização do tema discutido (água) a partir da
realidade dos alunos e a realização de experimentos em sala de aula de modo a
tornar mais concreta a compreensão dos processos da gestão da água e dos
indicadores de qualidade da água, bem como inclui a visitação à estação de
tratamento da água como um bom recurso de compreensão da realidade e
sensibilização para a cidadania ambiental. A afirmação II completa esta estratégia
destacando que a contextualização do tema ambiental trabalhado privilegiou a
experiência cotidiana dos alunos, o contato crítico com a realidade e a tomada de
consciência sobre a dimensão ambiental do cotidiano dos alunos e da população.
A alternativa III é incorreta porque afirma o que se procura evitar num trabalho
de educação ambiental, ou seja, o uso do conhecimento científico como
desqualificador ou desautorizador do conhecimento que os alunos trazem de sua
experiência de vida. O objetivo neste caso é a produção de um novo conhecimento
que parta da experiência e avance com a formação científica, reconhecendo no
diálogo de saberes entre a ciência e a experiência dos grupos sociais uma
oportunidade de formação e não a desqualificação do saber da experiência.
A alternativa IV é incorreta porque remete o diagnóstico dos problemas
ambientais identificados a uma solução de exclusiva responsabilidade do poder
público. A cidadania ambiental implica a corresponsabilidade de todos os setores
sociais. Governo e população são responsáveis e deveriam ser parceiros na busca
de soluções ambientalmente corretas. A responsabilização exclusiva dos governos
é, assim como seu oposto, a culpabilizaçao dos indivíduos, um reducionismo que em
nada contribui para a sustentabilidade social e ambiental.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 65
QUESTÃO 31
Os alunos da EJA chegam à sala de aula com saberes construídos a partir de suas
vivências em todos os contextos por onde circulam – familiar, profissional, de lazer
ou religioso. Os professores devem trabalhar tais saberes por meio de atividades em
que sejam
(A) avaliados para uma compreeensão dos erros epistemológicos. (B) integrados aos conteúdos das diferentes áreas do conhecimento. (C) reconstruídos em torno de parâmetros de correção prévios. (D) relativizados por serem construídos fora do processo de escolarização. (E) esvaziados por sua associação ao fracasso escolar dos alunos. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: EJA e currículo. Autor: Jussara Margareth de Paula Loch
Alternativa correta: B
Comentários:
A alternativa que responde corretamente à questão 31 é a B. Os alunos da
EJA, ao longo da vida, aprendem e, portanto, detêm saberes que não podem ser
ignorados, relativizados por serem construídos fora do processo de escolarização ou
esvaziados por sua associação ao fracasso escolar dos alunos, já que é provável
que um dos motivos deste fracasso, de não aprendizagem, de frustrações, seja
justamente o fato de que seus saberes e suas culturas não foram considerados na
organização curricular. Bernstein, ao tentar compreender quais as razões que
poderiam estar na origem deste fracasso, bem como o papel das diferentes
pedagogias no processo de reprodução cultural, desenvolve os conceitos de código
elaborado – suposto pela escola e código restrito – das classes operárias/populares,
afirmando que a criança da classe popular já entra em desvantagem na escola pelo
tipo de código nela utilizado.
Se considerarmos que conhecimento engloba a totalidade da experiência
humana, partir sempre da experiência concreta dos indivíduos situados no seu grupo ou
sociedade é um procedimento metodológico que decorre desta compreensão (Freire).
66 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
Na EJA, portanto, há que se considerar os interesses do jovem, adulto e idoso
trabalhador com seus conhecimentos socialmente constituídos e integrá-los aos
conteúdos das diferentes áreas do conhecimento, já que, ao partir dos
conhecimentos dos educandos e das suas relações com o mundo, e ao integrá-los
aos conteúdos das diferentes áreas, estes conhecimentos vão sendo desvelados,
ampliados e aprofundados. Para isto é necessária uma atitude permanente de
pesquisa na relação entre educador e educando na perspectiva de conhecer o que o
aluno já construiu de conhecimentos, assim como o que está em construção e o que
ele ainda não conhece. Esse entendimento permitirá, então, organizar o
conhecimento a ser trabalhado através de atividades, estratégias pedagógicas ou
situações de experiências para se aplicar o conhecimento em sua busca de
construções de novas ações. Portanto, na concepção dialética da educação, o
conhecimento nasce da prática social e, na escola, ao ser problematizado,
sistematizado, volta a ela ressignificado.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 67
QUESTÃO 32
A Escola Nova Fronteira apresentava altos índices de reprovação e de violência. Na
avaliação dos professores, as práticas pedagógicas eram individualizadas e não
havia articulação interna ou com a comunidade. A professora Clara foi eleita diretora
e entendeu que os aspectos administrativos deveriam dar sustentação aos
pedagógicos. Liderou um movimento de organização da escola em direção a uma
instituição autônoma e democrática.
Para isso, Clara considerou alguns dos princípios a seguir.
I A implementação do projeto político-pedagógico constrói a identidade da instituição por meio de permanente reflexão e discussão.
II A participação dos pais e da comunidade nas assembléias escolares é uma forma de aproximar a escola da sociedade.
III A centralização das ações desburocratiza os processos de gestão e de organização.
IV A gestão colegiada organiza o trabalho pedagógico, viabilizando a ampla participação.
São princípios da gestão democrática, que devem ser considerados por essa
professora APENAS
(A) I e II (B) II e III (C) II e IV (D) I, II e IV (E) I, II, III e IV Tipo de questão: escolha múltipla com mais de uma alternativa correta.
Conteúdo avaliado: gestão escolar.
Autor: Zuleica Almeida Rangel
Alternativa correta: D
Comentários:
A alternativa D é a correta, tendo em vista que a equipe desempenha um
papel de referência e que o desenvolvimento de práticas democráticas no interior da
escola depende muito diretamente da postura assumida pela gestão. Ao considerar
os princípios citados nas afirmativas I, II e IV, a diretora busca reforçar a
68 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
intencionalidade da mudança, explicitada no Projeto Político-Pedagógico,
favorecendo o estabelecimento de uma linha comum de ação a partir de uma visão
compartilhada de homem, de mundo e de educação; implementar a construção da
identidade da escola, objetivando “fazer a escola funcionar pautada num projeto
coletivo” (VASCONCELLOS, 2002, p.61); superar as práticas individualizadas,
resgatando o diálogo entre sociedade e escola; e descentralizar o poder, que numa
gestão colegiada flui entre todos os sujeitos envolvidos, na dimensão da autoridade
de cada um.
A alternativa III é incorreta porque sinaliza um princípio que não tem
coerência com a concepção de uma gestão democrática.
Referência bibliográfica: VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Coordenação do trabalho pedagógico: do Projeto Político-Pedagógico ao cotidiano da sala de aula. São Paulo; Libertad, 2002.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 69
QUESTÃO 33
A partir dos anos 1990 foram realizadas várias reformas curriculares no âmbito das
instituições educativas, dentre elas, as propostas de reorganização dos anos de
escolaridade em ciclos, que trouxeram mudanças significativas para a estruturação
curricular e a avaliação, com a implantação da progressão continuada. Tais
experiências fizeram constatar que a implementação de novas propostas nas
escolas necessita que as(os)
(A) particularidades da implementação em cada escola sejam programadas pelos níveis centrais.
(B) equipes diretoras aceitem a proposta e a desenvolvam com o apoio do coordenador pedagógico.
(C) ações pedagógicas e administrativas sejam modificadas de forma coletiva e participativa.
(D) projetos oficiais prescrevam com clareza as ações a serem executadas. (E) programas de formação continuada aconteçam depois do processo de
implementação. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta. Conteúdo avaliado: planejamento participativo. Autor: Jussara Margareth de Paula Loch
Alternativa correta: C
Comentários:
A alternativa que responde corretamente à questão 33 é a C. As alternativas
A, B, D e E são incorretas, pois o planejamento não deverá ser verticalizado de cima
para baixo, pelos níveis centrais, uma vez que os atores deste processo não
poderão ser apenas executores de projetos oficiais mesmo que prescrevam com
clareza as ações a serem executadas e que sejam constituídos programas de
formação continuada depois do processo de implementação. Essas ações não são
favorecedoras de processos de mudança.
Dessa forma, a alternativa correta prevê que a implementação de novas
propostas nas escolas necessita que as ações pedagógicas e administrativas sejam
modificadas de forma coletiva e participativa. Equivale a dizer que os atores são
protagonistas do planejamento, execução e avaliação dessa implementação.
70 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
Reconfigurar currículos é tarefa de diálogo entre todos os segmentos da
comunidade escolar.
A modificação e o compromisso com a ação transformadora das práticas
pedagógicas passam pelo planejamento coletivo e participativo, pois neste processo
se garante a mobilização para a ação-discussão, debate de diferenças, às vezes
contraditórias, concepções presentes no cotidiano das escolas; garante-se a
organização dos grupos, tornando-os protagonistas das ações a serem
implementadas, definindo responsáveis e cronogramas das ações; e ao mesmo
tempo garante-se o caráter educativo e político de todos os grupos implicados nessas
transformações. Nessa perspectiva, se tornam coconstrutores dessas novas
propostas independentemente do nível em que venham a atuar e, portanto, diminuem
os processos de resistência às mudanças encaminhadas sem o seu compromisso. É
desafio coletivo, de gestão democrática, que exige pensar mais do que numa
intervenção específica, mas numa organização de Projeto Político-Pedagógico em
que a diversidade da sociedade esteja contemplada e, portanto, presente.
O planejamento participativo se dá numa relação dialógica com o outro e com
o mundo, portanto, a partir da realidade conhecida, desvelada propõem-se ações
renovadas, solidárias e globais. O processo de ensino-aprendizagem é
responsabilidade de todos e se constrói na contínua interação entre os sujeitos.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 71
QUESTÃO 34
Uma organização social com foco no trabalho com crianças e adolescentes em
situação de risco está tendo problemas de evasão dos participantes do projeto de
iniciação musical e profissionalização. Os gestores ficaram preocupados, pois o
projeto conta com músicos experientes, recursos e equipamentos adequados.
Considerando os princípios da gestão, qual o primeiro procedimento para tentar
resolver o problema?
(A) Disponibilizar recursos financeiros. (B) Investir na formação docente. (C) Fazer diagnóstico sobre a situação. (D) Promover ações que envolvam a comunidade. (E) Reorganizar a gestão de pessoas. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: gestão do ensino não formal.
Autor: Afonso Strehl
Alternativa correta: C
Comentários:
O tema desta questão focaliza o campo da gestão do ensino não formal,
abordando o problema da evasão num projeto de iniciação musical e profissional
para crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social.
A gestão do ensino, tanto em espaços educativos formais (escolas) quanto em
espaços não formais (outras organizações sociais), requer conhecimentos específicos
e habilidades gerenciais por partes. A administração de uma organização social com
escopo educativo possui similaridade com uma empresa no que se refere à gestão de
problemas. Perante uma situação desafiadora como a descrita na questão 34 (a
evasão), cabe adotar os seguintes passos para a busca de solução:
a) análise da situação atual a partir de um levantamento de dados sobre o
problema, com vistas a identificar suas causas e condições, possibilitando o
estabelecimento de um diagnóstico fundamentado;
72 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
b) definição de objetivos a serem atingidos, mediante a proposição da
situação ideal à que se pretende chegar, com metas claramente explicitadas;
c) apresentação de estratégias para enfrentar as causas do problema,
definindo os passos a serem percorridos para alcançar os objetivos propostos (a
solução do problema);
c) implementação das estratégias por meio da execução de ações que
conduzam ao cumprimento das metas propostas para a superação do problema;
d) acompanhamento e avaliação das atividades realizadas, mediante
monitoramento, controle e feedback.
A análise dos diferentes passos elencados para a solução de problemas
evidencia que o primeiro procedimento é a realização de um diagnóstico
que permita
uma análise precisa da situação existente. Portanto, a alternativa correta é a C.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 73
QUESTÃO 35
A Escola Municipal Maíra vem modificando as características de sua gestão.
Ampliou as ligações com a comunidade em seu entorno e fortaleceu o conselho
escolar, que tem acompanhado a freqüência e o desempenho dos alunos. Quando
surgem problemas, os membros do conselho, formado por professores, alunos, pais,
funcionários e representantes da comunidade, conversam entre si, com os
professores e a família do aluno. Além disso, o conselho participa das decisões
pedagógicas e administrativas, inclusive no que tange ao uso dos recursos
financeiros da escola, seja para obras de manutenção, para passeios educativos ou
para a compra de materiais didáticos.
De acordo com a regulamentação municipal, haverá novas eleições para o conselho
escolar no próximo ano.
A escola apresentada nesse texto está atuando
I de forma equivocada, pois envolve os alunos nas decisões pedagógicas e administrativas;
II em consonância com as concepções democráticas de gestão, pois redefine os membros do conselho por meio de eleições periódicas;
III em desacordo com a LDBEN 9.394/1996, pois permite que pessoas de fora da escola interfiram em sua gestão;
IV de acordo com a LDBEN 9.394/1996, pois tem um conselho escolar atuante, com participação comunitária.
Está(ão) correta(s) APENAS a(s) afirmação(ões)
(A) II (B) III (C) IV (D) I e III (E) II e IV Tipo de questão: escolha múltipla com mais de uma alternativa correta.
Conteúdo avaliado: gestão escolar.
Autor: Afonso Strehl
Alternativa correta: E
74 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
Comentários: A LDB atual, preocupada com a gestão democrática, estabelece dois
princípios a serem adotados pelos sistemas públicos de ensino na administração de
suas escolas: a) “participação dos profissionais da educação na elaboração do
projeto pedagógico da escola; b) participação das comunidades escolar e local em
conselhos escolares
O princípio apontado na alínea “b” indica a opção por uma política de
integração de esforços da família, da comunidade e da escola em prol de melhor
formação a ser proporcionada aos alunos.
” (Lei nº 9.394/96, art. 14).
A experiência de diversos países onde a família atua em sintonia com a
escola, participando ativamente do enfrentamento dos desafios a que a escola está
submetida, comprova que existe uma relação direta entre o nível de participação da
comunidade na vida escolar e o desempenho apresentado pelos estudantes.
No Rio Grande do Sul, a Lei nº 10.576/95, alterada pela Lei nº 11.695/2001,
que dispõe sobre a Gestão Democrática do Ensino Público, prevê, dentre outras, as
seguintes atribuições do Conselho Escolar:
a) “aprovar o Plano Integrado da Escola;
b) aprovar o plano de aplicação financeira da escola;
c) apreciar a prestação de contas do Diretor;
d) coordenar, em conjunto com a direção da escola, o processo de discussão,
elaboração ou alteração do Regimento Escolar;
e) encaminhar, quando for o caso, à autoridade competente, proposta de
instauração de sindicância para os fins de destituição de Diretor da escola [...];
f) analisar os resultados da avaliação interna e externa da escola (exemplos:
ENEM, SAEB, Prova Brasil, IDEB), propondo alternativas para a melhoria do seu
desempenho;
g) analisar e apreciar as questões de interesse da escola a ele
encaminhadas” (Lei nº 10.576/95, art. 42).
No enunciado da questão 35, estão descritas importantes características de
uma gestão de cunho democrático:
a) estreita ligação da escola com a comunidade em seu entorno;
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 75
b) existência de um conselho escolar, integrado por professores, alunos, pais,
funcionários, gestores e representantes da comunidade;
c) diálogo entre os representantes dos diversos segmentos representativos da
comunidade escolar;
d) acompanhamento do desempenho e da assiduidade dos alunos pelo
conselho escolar;
e) participação efetiva do conselho escolar nas decisões estratégicas da
escola, envolvendo aplicação de verbas na manutenção do estabelecimento de
ensino, na realização de passeios e na compra de materiais didáticos necessários
ao desenvolvimento das atividades da escola;
f) realização periódica de eleições para a composição do conselho escolar.
De acordo com as características de gestão adotadas na Escola Municipal
Maíra e apresentadas no enunciado da questão, podemos afirmar com segurança
que estão corretas as afirmações contidas no item II (previsão de eleições periódicas
para o conselho escolar) e no item IV
Portanto, a alternativa correta é a E.
(conselho escolar atuante, com participação
de diversos segmentos da comunidade), uma vez que tais características mantêm
perfeita sintonia com a legislação exposta.
76 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
QUESTÃO 36
Considere os depoimentos para responder à questão.
Qual das afirmações abaixo analisa corretamente um ou mais dos depoimentos desses coordenadores pedagógicos?
(A) Lucas e Henrique possuem uma concepção de coordenação proveniente da pedagogia renovada, já que enfatizam um posicionamento crítico, voltado às questões sociais.
(B) Lucas e Ely demonstram ser técnicos normatizadores, pois seus procedimentos estão voltados à manutenção da ordem e às questões administrativas.
(C) A visão de Ely sobre coordenação pedagógica está calcada em um modelo de gestão técnico-científico, pois se preocupa com o desenvolvimento profissional dos docentes.
(D) A atividade proposta por Maria reflete um modelo de gestão participativa, na medida em que corresponde a uma prática passível de ser controlada em detalhes.
(E) O depoimento de Henrique revela uma visão de coordenação que privilegia a técnica, voltada para o controle do comportamento, para o desempenho e para os resultados.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 77
Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: coordenação pedagógica.
Autor: Zuleica Almeida Rangel e Leunice Martins de Oliveira Alternativa correta: E
Comentários:
A alternativa A é incorreta, pois somente Lucas possui uma concepção
proveniente da Pedagogia Renovada, que considera a educação como parte da própria
experiência humana. A escola renovada propõe um ensino que valorize a
autoeducação (o aluno como sujeito do conhecimento), ou seja, a vivência da
experiência direta do meio pela atividade. Já Henrique demonstra a preocupação com
procedimentos e técnicas necessárias ao arranjo do controle das condições ambientais,
utilizando-se da aplicação sistemática de princípios científicos comportamentais e
tecnológicos, sem demonstrar preocupação com os problemas educacionais.
A alternativa B é incorreta porque somente Ely demonstra ser técnico
normatizador, modelo em que os indivíduos adaptam-se aos valores e às normas
vigentes. Para Lucas, cabe à escola suprir as experiências que permitam ao aluno
educar-se, num processo ativo de construção e reconstrução do objeto.
A alternativa C é incorreta, pois no modelo de gestão em que Ely se baseia, a
preocupação se atém ao alcance de resultados e não com o processo, não sendo,
portanto, necessário investir no desenvolvimento profissional dos professores.
A alternativa D também é incorreta, uma vez que a ação de Maria reflete um
modelo de gestão compartilhada, a qual supõe uma prática interativa e dialógica,
com o acompanhamento e a avaliação de todos os partícipes do processo.
A alternativa E é a correta, considerando-se que Henrique revela uma visão de
coordenação que privilegia a técnica, em que a escola funciona como modeladora do
comportamento humano, e compete à educação organizar o processo de aquisição de
habilidades, atitudes e conhecimentos específicos, úteis e necessários para que os
indivíduos se integrem na máquina do sistema social global. A escola atua, assim, no
aperfeiçoamento da ordem social vigente (o sistema capitalista).
78 Elaine Turk Faria, Maria Conceição Pillon Christofoli (Orgs.)
QUESTÃO 37
O ano de 2008 foi repleto de atividades e comemorações na Escola Machado de
Assis, devido ao centenário de morte do grande escritor brasileiro. O resultado
desse processo necessitava ser sistematizado e socializado. Para isso, considerou-
se a possibilidade de desenvolver as seguintes atividades:
I organizar reuniões com docentes das escolas vizinhas para que os mesmos procedimentos fossem adotados pelas demais;
II publicar as produções de alunos e professores, visando à valorização e difusão do conhecimento;
III convidar um especialista no tema para ratificar a qualidade das produções dos alunos e legitimar os conhecimentos construídos;
IV realizar um período de culminância das atividades, com exposições, apresentações artísticas e demonstrações para a comunidade.
A(s) atividade(s) coerente(s) como uma concepção da escola como produtora de conhecimento e de vivências democráticas é(são) APENAS (A) I (B) II (C) II e III (D) II e IV (E) III e IV
Tipo de questão: escolha múltipla com mais de uma alternativa correta.
Conteúdo avaliado: publicação das produções de alunos e professores.
Autor: Jussara Margareth de Paula Loch
Alternativa correta: D Comentários:
A alternativa que responde corretamente à questão 37 é a D. A publicação das
produções de alunos e professores, visando à valorização e difusão do conhecimento,
e a realização de um período de culminância das atividades, com exposições,
apresentações artísticas e demonstrações para a comunidade são formas de
proporcionar a publicização das produções realizadas, assim como de qualificar o
conhecimento construído em determinado período sobre determinado tema. A relação
dialética da construção do conhecimento prevê, segundo Freire, três momentos: ação
X reflexão X ação. Nesta perspectiva, a sistematização e a socialização irão contribuir
para a qualificação do processo de aprendizagem, na medida em que haverá partilha
entre diferentes conhecimentos, visões e perspectivas.
ENADE Comentado 2008: Pedagogia 79
LISTA DE CONTRIBUINTES
Afonso Strehl
Ana Lúcia Souza de Freitas
Beatriz Kulisz
Elaine Turk Faria
Helena Sporleder Côrtes
Isabel Cristina de Moura Carvalho
Jussara Margareth de Paula Loch
Leunice Martins de Oliveira
Marcos Villela Pereira
Maria Conceição Pillon Christofoli
Maria Helena Camara Bastos
Maria Inês Côrte Vitoria
Maria Waleska Cruz
Nadja Hermann
Patricia Pinto Wolffenbuttel
Rosana Maria Gessinger
Rosane da Conceição Vargas
Zuleica Almeida Rangel