Download - Ganhos para a tecnologia brasileira
UM MOVIMENTO MAIS PROFUNDO NA TERRA
UMA PUBLICAÇÃO MENSAL DA FUNDAÇÃO DE AMPARO À PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO
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h os logia
----- ...... ile1ra O RECÉM-CAIADO NUPUTEC VAI BUSCAR O MERECIDO RETORNO AO INVESTIMENTO PAUUSTA EM PESQUISA
NUPLITEC Núcleo de Patenteamento
e Licenciamento de Tecnologia
8 FAPESP cria o Núcleo de Patenteamento e Licenciamento de Tecnologia para a proteção da propriedade intelectual dos inventos resultantes de pesquisas por ela financiadas
20 Pesquisadores do IAG/USP descobriram que as correntes de convecção no interior da Terra são mais profundas do que se supunha e incluem o manto inferior
Capa e ilustração: Hélio de Almeida
32 Os cientistas alertam para o risco
de recrudescimento da transmissão da doença de Chagas no Brasil, por
meio de espécies silvestres do barbeiro
EDITORIAL
MEMORIAS
OPINIÃO
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOL0GICA
CIÊNCIA
TECNOLOGIA
HUMANIDADES
LIVRO
LANÇAMENTOS
ARTE FINAL
5 6 7
8 20 42
50 56 57 58
42 Os valores-limite de financiamento aos projetos do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas aumentaram 50%
46 A Opto Eletrônica, empresa de São Carlos, desenvolveu, para a Companhia Vale do Rio Doce, medidores de distância a laser que garantem maior precisão do local de parada dos vagões de minério
50 Livro resgata a história do planejamento urbano no Brasil, ao reunir 329 imagens de plantas e vistas de cidades brasileiras, entre o século XVI e o início do XIX
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 1000 • 3
.:IAPESP
PESQUISA FAPESP É UMA PUBLICAÇÃO MENSAL
DA FUNDAÇÃO DE AMPARO À PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROF. DR. CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ PRESIDENTE
PROF. DR. PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO VICE-PRESIDENTE
CONSELHO SUPERIOR ADILSON AVANSI DE ABREU ALAIN FLORENT STEMPFER
CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ FERNANDO VASCO LEÇA DO NASCIMENTO
FLÀVIO FAVA DE MORAES JOSÉ JOBSON DE ANDRADE ARRUDA MAURÍCIO PRATES DE CAMPOS FILHO
MOHAMED KHEDER ZEYN PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO
RICARDO RENZO BRENTANI VAHAN AGOPYAN
CONSELHO TÉCNICO-ADMINISTRATIVO PROF. DR FRANCISCO ROMEU LANDI
DIRETOR PRESIDENTE
PROF. DR. JOAQUIM J. DE CAMARGO ENG LER DIRETOR ADMINISTRATIVO
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EQUIPE RESPONSÁVEL
CONSELHO EDITORIAL PROF. DR. FRANCISCO ROMEU LANDI
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EDITORA CHEFE MARILUCE MOURA
EDITORA ADJUNTA MARIA DA GRAÇA MASCARENHAS
EDITOR DE ARTE HÉLIO DE ALMEIDA
EDITORES CARLOS FIORAVANTI (CI~NCIA)
MARCOS DE OLIVEIRA (TECNOLOGIA) MÁRIO LEITE FERNANDES (TEXTO)
DIAGRAMAÇÃO E PRODUÇÃO GRÁFICA TÁNIA MARIA DOS SANTOS
COLABORADORES ANA MARIA FlORI CLAUDIA IZIQUE
DÉBORA GUTERMAN EDUARDO STOPATO
EVANILDO DA SILVEIRA LUCAS ECHIMENCO MARGARETH LEMOS
MAURO BELLESA RENATA SARAIVA
ULISSES CAPOZOLI WAGNER DE OLIVEIRA
FOTOLITOS E IMPRESSÃO GRAPHBOX-CARAN
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ECONÔMICO
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4 · MAIO DE 1000 • PESQUISA FAPESP
Pesquisa FAPESP no exterior
Recientemente recibimos, em calidad de donación, un ejemplar de la revista Pesquisa FAPESP. Después de evaluarla, llegamos a la conclusión que la misma es de sumo interés para los especialistas que nos visitan, pues su temática esta enmarcada entre las de nuestro Centro de Información.
La Biblioteca de Ciencia y Tecnologia está interesada en recibir la información más relevante en las temáticas científicos-técnicas; por este motivo pedimos que evalúe la posibilidad de hacérnosla llegar de forma sistematica. Nuestro Instituto le agradeceria tal empefi.o.
ESTH ER PONTE
Biblioteca Nacional de Ciencia y Técnica Academia de Ciencias de Cuba
Havana, Cuba
Quiero felicitados por la magnifica revista que he recebido, sus materias muy completas, objetivas y precisas. Por esto mismo, solicito a Ud. la posibilidad de enviaria em castellano o en ingles, pues en vostro idioma se confunde y se pueden distorsionar las informaciones. Quedo muy agradecido por la gentileza y comprensión.
PABLO E . B ECKER
Santiago, Chile
A revista Pesquisa FAPESP deverá estar disponível na Internet, em inglês e espanhol, nos próximos meses. A edição impressa da revista nesses dois idiomas está ainda sendo estudada.
Pesquisa FAPESP no Brasil
O Laboratório de Biogeoquímica Ambiental da Universidade Federal de Rondônia desenvolve trabalhos de monitoramento da contaminação por mercúrio e outros metais pesados na bacia do rio Madeira, Estado de Rondônia, e conta com uma
equipe de professores pesquisadores, alunos de graduação e pós-graduação, bolsistas e não bolsistas, e graduandos colaboradores das pesquisas. São pesquisadores de diversas áreas do conhecimento e seria de extremo interesse termos à disposição os exemplares da revista Pesquisa FAPESP regularmente.
P RISCILA AND~A SALVIONI G AL!
Universidade Federal de Rondônia Porto Velho, RO
Suplemento SOO anos
Gostaria de parabenizar os autores do documento SOO anos de Ciência e Tecnologia no Brasil. De fato, é uma história emocionante e deve ter emocionado, igualmente, seus responsáveis, à medida que iam registrando os nomes daqueles que fizeram ciência e tecnologia de maneira maiúscula entre nós.
Entretanto, embora seu nome tenha sido citado no destaque a Rocha e Silva, o nome de André Dreyfus não foi lembrado no lugar apropriado. Quando se fala em Theodosius Dobzhansky- merecidamente citado entre os estrangeiros- o nome de Dreyfus está omitido, quando deveria vir em primeiro lugar, pois foi quem, de fato, constituiu a célula original da genética entre nós. Seus melhores alunos e continuadores como Pavan, Brito da Cunha, Freire-Maia e Rosina de Barros, aí estão citados porque seus primeiros momentos na pesquisa científica tinham Dreyfus na vanguarda.
O lugar de André Dreyfus deve ser incluído, forçosamente, como destaque, dado seu pioneirismo, no Brasil, na área de genética e na formação dos mais ilustres geneticistas brasileiros. Aliás, aqueles merecidamente citados no artigo.
P ROF. DR. JosE CARLOS BARBERIO
Prof. Titular aposentado/USP São Paulo, SP
EDITORIAL
Das patentes aos recursos para inovação
Apoiar a pesquisa em ciência e tecnologia não é só financiá-la
Aproteção à p_:oprie.dade intelectua~ de inventos que tem ongem em pesqmsas que financia vem preocupando a FAPESP há
algum tempo. Natural, porque se o registro de qualquer patente- a forma por excelência de proteção a essa propriedade - implica despesas, seu licenciamento e a concessão do direito de uso produzem receitas. E tratam-se de receitas de forma alguma desprezíveis para os responsáveis diretos pelos inventos que geraram paten-tes, para as instituições ou empre-sas que as detêm e, pensando-se em escala, para o país de onde saiu -- -
Não fosse isso, a capa desta edição poderia ter sido a reportagem sobre uma nova descoberta no campo dos movimentos das placas tectônicas, ou seja, que esses movimentos podem ser muito mais profundos do que se pensava. Uma equipe de pesquisadores paulistas concluiu que eles podem ocorrer a uma profundidade, pelo menos no Brasil, de até 700 quilômetros, contra os 100 ou 200 quilômetros que estavam estabelecidos, até então, como li-
mite dessa fascinante inquietação interior da Terra.
Em área muito diversa e de inte-resse capital para a saúde pública, a
o pedido de registro. Em outras pa-lavras, uma atitude de descaso para : "O descaso
epidemiologia, falamos sobre resultados recentes de uma pesquisa que constatou a existência de duas diferentes linhagens de Trypanosoma cruzi, uma historicamente associada à doença de Chagas em seres humanos, e outra que tem animais silvestres como hospedeiros. A matéria também traz o alerta de vários pesquisadores para os riscos de recrudescimento da transmissão da doença, a
com a proteção à propriedade inte-lectual costuma corresponder a 1
uma injustificável perda de receitas I
e divisas para todas as partes que
para com a
propriedade
bancam o risco do investimento em pesquisa científica e tecnológica.
intelectual
As preocupações da FAPESP com o tema ganharam forma mais consistente em dezembro do ano
causa perda
de receitas"
passado, quando ela promoveu um seminário com especialistas do país e do exterior para debater a questão das patentes em profundi-dade. E tornaram-se mais objetivas com uma nova iniciativa: a criação do Núcleo de Patenteamento e Licenciamento de Tecnologia, o Nuplitec, aprovada pelo Conselho Superior da Fundação em sua reunião de 1 O de maio passado. Agora em fase de implantação, o Nuplitec é tema da reportagem de capa desta edição de Pesquisa FAPESP.
Dada a relevância do tema para a pesquisa brasileira, a escolha não poderia ser outra. O Brasil, enquanto responde por 1 o/o da produção científica mundial, considerando-se os artigos científicos publicados e indexados pelo Institute for Scientific Information (ISI), aparece com uma modestíssima participação de 0,05% no total de patentes concedidas pelo Escritório de Patentes e Marcas dos Estados Unidos (USPTO), no período de 1980 a 1998. Portanto, iniciativas concretas para alterar esse quadro pífio têm que ser valorizadas.
despeito do sucesso das campanhas · de erradicação do barbeiro, transmissor do mal de Chagas.
Notícia importante no campo da tecnologia é o aumento da ordem de 50% nos limites de financiamento oferecidos pela FAPESP para projetos apoiados no âmbito de seu Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE). Merece destaque também os medidores de distância a laser desenvolvidos por uma pequena companhia paulista para a Vale do Rio Doce que, à maneira de um radar sofisticado (valendo-se de sinais luminosos, em vez de ondas de rádio), indicam com precisão o local mais adequado para os vagões do trem carregado de minério de ferro pararem e suas caçambas serem viradas para o descarregamento do material. O sistema já está sendo utilizado na estrada de ferro da empresa, no Espírito Santo.
Por fim, não poderíamos deixar de destacar a matéria sobre um belo livro que mostra, com 329 imagens, um percurso do planejamento urbano no Brasil, entre os séculos XVI e XIX. Boa leitura!
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 1000 • 5
Pioneiro incompreendido e injustiçado Ele inventou o telégrafo e a telefonia sem fio, mas o Brasil recusou suas descobertas
Era o ano de 1893. Em São Paulo, o padre gaúcho Roberto Landell de Moura (1861- 1928), então um simples vigário em Campinas, faz uma demonstração de um invento seu, que permitia, segundo ele, a uma pessoa falar com outra a muitos quilômetros de distância, sem necessidade de
fio, mas utilizando-se de ondas de rádio. Poucos acreditaram. Mas de fato, da avenida Paulista, ele realiza, com sucesso, a experiência, comunicando-se com o Alto de Santana, a cerca de oito quilômetros. Era a primeira vez no mundo que se fazia tal experimento. Afinal, o italiano Guglielmo Marconi, que ficou como o inventor do rádio, só realizaria sua transmissão radiotelegráfica mais de um ano depois. Ninguém deu importância à façanha do padre, que ganharia a fama de feiticeiro. Seu laboratório
6 • MAIO OE 2000 • PESQUISA FAPESP
Patente do telégrafo sem fio, obtida nos Estados Unidos, em 1904
Landell de Moura previu a transmissão de imagens
c
Réplica do transmissor de
ondas, feita < z
pelo Cientec, ~
e a patente do !5 @
invento: aparelhos ~
interessaram ~ z
a industriais i2 fi! norte-americanos L_ ___ ....:.::.,.,=----------------- <
r&vOiameto JWim6cio de O T d'afnrot.mento •ean:tirio ...
d2• Húeleo de ferro doee 8• Eiao centr-a b• porc:e
b4 • guia 8' • c~• do eixo b2 • ewtremidede do eixo IC .. chlwe de tjuste b3- orifidoa da pon:t1 C • tubo ftexíttel e boeel M •btlteria f • Bobina de Ruhmkorlf f • enrol.mento primitio
r • erwot.meoto secundirio G e G" • Condensadores fcLimp.CS.
em Campinas foi destruído por fanáticos e somente em 1900 ele conseguiu obter no Brasil a patente de seu invento. De novo, desinteresse geral. E Landell de Moura foi para os Estados Unidos. Ali, obteve as patentes de três inventos: a telefonia sem fio, a telegrafia sem fio e o transmissor de ondas. Foi notícia no New York Herald e industriais norte-americanos tentaram adquirir os direitos dos aparelhos. O padre recusou. Os benefícios deveriam ser do Brasil. Mas aqui, mais uma vez, ninguém o apoiou.
OPINIÃO
EVARISTO MARZABAL NEVES
A (ignorada) função social do Genoma O impacto do projeto da X. fastidiosa atinge os agronegócios
Aceitando convite da diretoria científica, no lançamento do Projeto Genoma FAPESP (14/10/97), fiz uma apresentação sobre a
importância econômica da citricultura brasileira. No momento, justificava-se tal apresentação, pois se iniciava o maior projeto científico já realizado no Brasil, cujo desafio era o seqüenciamento genético da bactéria Xylella fastidiosa, fitopatógeno responsável pela clorose variegada dos citros (CVC).
Pouco mais de dois anos ( 06/011 2000), os pesquisadores fechavam o genoma do primeiro fitopatógeno já seqüenciado no mundo e, em
cola, superando as barreiras não-tarifárias (técnicas e fitossanitárias, principalmente) e valorização social da terra; na sustentação e manejo ambiental correto; na captação de divisas e substituição competitiva de importação; na formação de capital, de renda e agregação de valor regionais; na ativação dos elos da cadeia produtiva; tributos, taxas e impostos recolhidos e distribuídos nos municípios; na dinâmica e desenvolvimento regional de
outros setores da economia. A compreensão do feito tem
efeito retardado com os ganhos sociais que estão por vir. Para explicar
21/02, os laboratórios e cientistas receberam do Estado de São Paulo o reconhecimento público da relevância do trabalho concluído.
"É de suma a função social dos projetas Genoma FAPESP (Xylella fastidiosa), Genoma Funcional e Genoma Xanthomonas (cancro cítrico) para a sociedade, tenho usado o expediente de começar formulando a seguinte questão: supondo que o país tenha perdido a guerra no conhecimento científico, controle e combate às pragas e doenças (onde se incluem
importância A mídia exultou o feito, mas ex
plorou timidamente suas extensões e contribuições sociais no tempo, o que pode não ter chamado a atenção da população, não familiarizada com pesquisa científica, muito menos com o termo genoma, e ansiosa por soluções imediatas.
mensurar os
efeitos do
projeto na
agricultura"
Para se medir os efeitos da relação social benefício-custo é preciso ir mais além do que a glorificação do feito no ambiente acadêmico. O que o torna notório é medir, no tempo, seus impactos alocativos e distributivos se espalhando socialmente, senão o povo fica sem saber por que investir milhões de dólares no mapeamento de uma bactéria.
O seqüenciamento é o passo inicial para a enorme contribuição que a pesquisa científica presta à agricultura brasileira, visando à produção e ganhos sociais de produtividade e a abertura de um sem-número de perspectivas para a prevenção, controle ambiental e monitoramento correto de pragas e moléstias.
Ademais, é de suma importância antever e mensurar, a posteriori, os impactos diretos e indiretos na geração de emprego e ativação do mercado de trabalho; na ocupação racional da área agrí-
· a CVC e o cancro cítrico) na citricultura, e que não houvesse mais nenhum pé de laranja, quais os efeitos alocativos e distributivos que impactariam a economia do país?
Talvez seja por aí que se abre o caminho da difusão, da adoção de tecnologias e transferência de ciência da microesfera científica para a macroesfera do conhecimento popular. Atinge-se a percepção de um universo que aprenderá a esperar e passará a entender o quanto o país perderia na biossegurança, na alocação doméstica de fatores produtivos e divisas externas sem os resultados da pesquisa científica.
Nesta direção, "com o poeta indo onde o povo está': certamente, colher-se-ão os frutos do tremendo impacto social dos projetas Genoma na agricultura, nos agronegócios e na sociedade brasileira. ·
EVARISTO MARzABAL NEVES, professor titular da ESALQ! USP (Piracicaba, SP).
PESQUISA FAPESP • MAIO DE 1000 • 7
CAPA
PATENTES
• A pesq!JISa queva1a~
mercauo FAPESP cria Nuplitec para apoiar inventos e licenciamentos
CLAUDIA IZIQUE
FAPESP está implantando o Núcleo de atenteamento e Licenciamento de Tec-nologia (Nuplitec) para a proteção da propriedade intelectual dos inventos resultantes de projetos por ela financia
dos e, sobretudo, para o seu respectivo licenciamento. "A patente é a forma mais definitiva de proteção da propriedade intelectual, mas, em si, ela é um item de despesa. O que importa é o licenciamento e o direito de uso", enfatiza José Fernando Perez, diretor científico da Fundação.
O Nuplitec vai conferir ao patenteamento o caráter de um negócio, buscando ativamente o mercado para o invento. ''A patente e o licenciamento serão processos simultâneos': explica Perez. O Núcleo será mobilizado tão logo o pesquisador e o assessor da Fundação responsável pelo acompanhamento do projeto considerem que o invento é original e tem potencial de mercado. A FAPESP distribuirá aos pesquisadores um roteiro de avaliação do projeto, com o objetivo de apoiar a decisão dos interessados de patentear um invento. O questionário inclui perguntas relativas à viabilidade técnica, maturidade do projeto, potencial de mercado, necessidade de protótipo, custos e controle do uso da patente (ver box).
Para confirmar a originalidade de seu projeto, os pesquisadores poderão consultar o Derwent, do Institut for Scientific Information, (dii.derwent.com) um dos maiores bancos de patentes do mundo, disponível des-
8 • MAIO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
de dezembro para as universidades e instituições de pesquisas paulistas. Esse banco de dados também estará acessível às empresas que participam dos programas Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) e Parceria para Inovação Tecnológica (PITE). As informações sobre patentes já registradas podem ainda ser obtidas no banco de dados do Escritório de Patentes e Marcas dos Estados Unidos (USPTO), da IBM ou nos arquivos do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), que reúnem mais de 20 milhões de documentos sobre patentes concedidas desde 1920, ainda não disponíveis em meio eletrônico.
Os quesitos originalidade e potencial de mercado serão confirmados pela Coordenação de Tecnologia, responsável pelo gerenciamento do Nuplitec, e assessores ad hoc. "Se os pareceres forem favoráveis, o Núcleo auxiliará os inventores a redigir o relatório e fará o depósito de patente no Brasil, por meio do INPI
e/ou uma patente provisória no exterior, para assegurar o registro", diz Edgar Dutra Zanotto, coordenador-adjunto da diretoria científica da Fundação. A FAPESP está formalizando convênio com o INPI para facilitar o registro de patentes.
uando houver necessidade de construção de um protótipo do invento, o Nuplitec poderá buscar apoio de centros de pesquisa especializados, afirma Zanotto. Esse parceiro técnico será res
ponsável pela confecção do produto, observando a possibilidade de produção em escala, custo e disponibilidade do material a ser utilizado e a possibilidade real de controle do uso da patente.
O próximo passo é buscar, junto com o pesquisador, as empresas interessadas na aquisição ou licenciamento do invento. Se dentro de um prazo de 12
~ meses a nova tecnologia for negociada com sucesso, o Nuplitec contratará escritório especializado para dar forma final à patente e depositá-la definitivamente no Brasil e/ou nos países onde houver potencial de mercado. Neste caso, a FAPESP ficará com a titularidade da patente, compartilhando proporcionalmente os rendimentos líquidos do invento com o pesquisador e a universidade ou instituição de pesquisa, na forma prevista na Lei de Patentes. ''A FAPESP assume o risco e compartilha os benefícios", resume Perez. "Temos escala para justificar o custo da operação."
Esgotado o período de um ano, se o invento não despertar o interesse do mercado, o Nuplitec se retira da negociação para o licenciamento e os inventores devem continuar o processo de patenteamento por
conta própria. A FAPESP seguirá à frente do projeto apenas em casos excepcionais, de tecnologias muito inovadoras e promissoras. "Só vamos bancar o que tiver mercado", sublinha Zanotto.
O Nuplitec terá uma estrutura enxuta. Além da Coordenação de Tecnologia, farão parte do Núcleo um profissional com experiência em marketing e comércio de tecnologia, um analista de patentes, responsável pela redação para o depósito inicial, e dois estagiários, estudantes de Direito que se especializarão em propriedade industrial e contratos de licenciamento.
O Núcleo crescerá junto com a demanda, estimada em mais de uma centena de patentes por ano, no Estado de São Paulo. "O sucesso do projeto será medido por dois indicadores: o da cultura de proteção da propriedade intelectual e o do retorno do licenciamento': afirma Perez. Ele aposta na capacidade da
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 1000 • 9
FAPESP de mobilizar pesquisadores e no seu potencial de avaliação dos projetos. "Já começamos a avaliar proposta de patente e licenciamento de um projeto e nos surpreendemos com a qualidade de análise feita pelos assessores da Fundação. Há detalhes técnicos e de consistência do invento que demonstram a nossa capacidade de avaliação", adianta.
O processo de implantação do Núcleo está apenas se iniciando. Os formulários encaminhados pela Fundação aos pesquisadores e assessores estão sendo alterados para incluir questões que pretendem levar os interessados a observar a originalidade e o potencial de mercado do seu invento. "Estaremos alerta para realizar essa prospecção de inventos': diz o diretor-científico da FAPESP.
FAPESP assume riscos, diz Perez (acima); e banca o que tiver mercado, completa Zanotto (à esq.)
bro do ano passado. No encontro, cinco especialistas do Brasil, Estados Unidos e Israel relataram as estratégias de diferentes instituições de pesquisas, analisaram as dificuldades da proteção à propriedade intelectual no Brasil e indicaram os melhores caminhos para que as instituições assumissem uma posição de defesa dos trabalhos de seus pesquisadores. Concluíram
que, sem uma política clara e eficaz de proteção à propriedade intelectual, será praticamente impossível para as instituições avançarem nos
Perez espera que, além da cultura de proteção de inventos, o Nuplitec estimule o desenvolvimento de competências na área de propriedade intelectual, gerando, por exemplo, a implementação de cursos de pós-graduação de Direito nesta área.
Ele adianta, ainda, que a FAPESP não pretende restringir a atuação do Núcleo aos projetos desenvolvidos por universidades ou instituições de pesquisa. Também poderão contar com o apoio do Nuplitec os
projetos de inovação tecnológica desenvolvidos por pequenas empresas e os projetos elaborados em parceria entre empresas, universidades e institutos de pesquisas. "Neste caso, a titularidade do invento será das empresas e da FAPESP", ressalva Perez.
A idéia de estimular a patente e o licenciamento de inventos surgiu no workshop Propriedade Intelectual e Patentes, promovido pela FAPESP, em dezem-
I O • MAIO DE 1000 • PESQUISA FAPESP
acordos de licenciamento com as empresas. Desse debate, nasceu o projeto do Nuplitec, que foi aprovado pelo Conselho Superior da Fundação, no dia 10 de maio deste ano.
Em defesa da tecnologia nacional
O registro de patentes é uma forma indireta de avaliar o potencial de inovação tecnológica de um país. No Brasil, mais de uma centena de escritórios de advocacia são especializados no registro de patentes. Isso sem falar nos departamentos específicos mantidos pelas grandes universidades, como USP e Uni
camp, pelos institutos de pesquisa e fomento, como o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ou por fundações e empresas, como a Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Petrobras. Ainda assim, o número de depósitos anuais de patentes no INPI variou entre 11.000 e 17.000, na última década. O número de patentes expedidas, no mesmo período, oscilou de 2.500 a 4.000, sendo que 80% eram de titularidade estrangeira. A situação é mais grave quando se constata que a participação brasileira correspondeu a 0,05% do total de patentes concedidas pelo USPTO, nos Estados Unidos, entre 1980 e 1998. Esse percentual foi similar ao obtido por países como a Irlanda e o México, e inferior ao da África do Sul, Israel e Coréia, que têm estágio de desenvolvimento científico comparável ao do Brasil. "Estamos atrasados", cons-
tata Perez. ''A FAPESP, através do Nuplitec, quer criar uma cultura que valorize a proteção da propriedade intelectual e investir no retorno que resultará de seu licenciamento."
É bem verdade que, nos países desenvolvidos, as empresas são as principais responsáveis pela geração de patentes. Nos Estados Unidos, por exemplo, cerca de 3% das patentes são depositadas por universidades ou instituições de pesquisa. No Brasil, essa proporção é muito menor. E pior: pesquisadores e instituições inúmeras vezes perdem a oportunidade de buscar mercado para inventos com potencial de aplicação industrial, abrindo mão de direitos que poderiam resultar num expressivo retorno econômico.
A dificuldade dos pesquisadores brasileiros se deve, em grande parte, a problemas operacionais, tais como a falta de informação, descuido, inexistência ou despreparo dos escritórios especializados em patentes nas universidade e institutos de pesquisa e ao alto custo do depósito de patentes internacionais.
Para superar essa dificuldade algumas instituições adotaram medidas para a proteção dos inventos gerados nas atividades de pesquisa. A Fiocruz, do Rio de Janeiro, foi das primeiras a adotar, na década de 80, uma re
gulamentação interna de proteção à propriedade intelectual dos inventos. "Os pesquisadores publicavam tudo e a instituição não tinha qualquer controle sobre proteção intelectual. E a novidade é o requisito básico de qualquer invento", conta Maria Celeste Emerick, coordenadora de Gestão Tecnológica da Fiocruz.
Essa iniciativa foi o primeiro passo para a criação de uma nova cultura de proteção entre os seus pesquisadores. "Começamos a fazer palestras, falar sobre patentes e suas vantagens e colocamos à disposição de nossos técnicos o Banco de Patentes do INPI." Hoje, a busca de informações é uma rotina para os pesquisadores. ''Aprendemos a fazer patentes. Mesmo que a instituição contrate um escritório especializado para o seu registro, é preciso que o pesquisador esteja atento e informado e saiba redigir o documento de patentes", diz Maria Celeste.
Há dez anos, a Fiocruz criou um escritório para o registro de patentes, ao mesmo tempo em que descobriu a importância de estar atenta ao comportamento e à organização do mercado, para poder avaliar corretamente a potencialidade comercial dos seus inventos. A Fiocruz tem, hoje, 15 patentes concedidas no exterior, em três países diferentes, nenhuma delas ainda licenciadas. No Brasil, das 12 patentes concedidas, já estão licenciadas o ZIGZAIDS, um jogo educativo sobre Aids, dirigido a adolescentes; uma vela à base de plantas que afasta o mosquito Aedes aegypti; um kit com antígeno contra a doença de
NUPLITEC Núcleo de Patenteamento
e Licenciamento de Tecnologia
Quando patentear um invento
Muitas invenções nunca são patenteadas. Outras são retidas até que se completem ou até que o mercado esteja pronto para recebê-las. Só algumas são processadas rapidamente . Portanto, várias questões devem ser respondidas antes que uma tecnologia seja patenteada.Aqui estão elas:
Originalidade e viabilidade técnica • O invento é original no nível internacional? • Foi efetuada uma busca de patentes? • Há um protótipo para demonstração?
Maturidade do invento
• A tecnologia não é prematura, dado o mercado atual? • Os possíveis interessados perceberão a sua utilidade? • O invento está pronto para produção em escala ou
terá que ser desenvolvido pelo licenciado? • Quem deverá investir mais para torná-lo fabricável?
Mercado potencial • Alguém precisa de tal invento? • Há produtos similares no mercado? • Em caso positivo, esta invenção é mais barata, melhor
que os similares ou apresenta vantagens sobre eles? • Quem são os possíveis clientes para o invento? • Quais são os diferentes mercados para o invento? • Há estimativa de mercado atual e futuro?
Licenciamento
• O protótipo pode ser usado para facilitar o licenciamento?
• O inventor está interessado em demonstrar o invento aos potenciais licenciadores?
Custos • Será necessária patente internacional? • O faturamento previsto cobrirá os custos
de patenteamento?
Dificultadores • Será possível impor e controlar o uso da patente? • Necessita de aprovação ou certificação
governamental?
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 2000 • li
a sua dificuldade em construir protótipos. "Tínhamos vários interessados no licenciamento da sonda, mas a borracha usada no protótipo era cara porque só é produzida na Malásia. Percebemos que estávamos apenas no meio do caminho e
que era preciso mvestir também no desen
volvimento do produto, pensando em grande escala."
Maria Celeste Emerick (acima) conta que a Fiocruz tem 12 patentes concedidas no Brasil.
A solução foi buscar apoio do Centro Federal de Educação Tecnológica ( Cefet) para desenvolver o protótipo com viabilidade comer
A Petrobras tem 643 , diz Marta Jacob (ao /ado)
Chagas; e um bioinseticida cujo desenvolvimento exigiu da empresa investimentos de US$ 1 milhão, e que já está sendo reescalonado para o mercado.
Mas foi prospectando o mercado para uma sonda nasofaringe que a Fiocruz constatou outro problema:
cial. O primeiro projeto a ser desenvolvido pelo novo parceiro será o protótipo de uma cadeira anti-refluxo. O Cefet será responsável pelo estudo de viabilidade econômica do projeto e análise dos custos do material e demais aspectos de mercado. Só depois desses
INPI:em busca do tempo perdido
José Graça Aranha, que há menos de um ano ocupa o cargo de presidente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), tem pela frente um grande desafio: recuperar a credibilidade e reorganizar os serviços de atendimento aos usuários do órgão. "O INPI estava nas páginas policiais, sem rumo, sem uma missão ou política definidas", ele afirma.
Quando ele assumiu o cargo, em junho do ano passado, 40 mil processos de registro de patente e 240 mil pedidos de registro de marcas se acumulavam nas estantes. "A desmotivação dos funcionários contribuía para o atraso", diz. Mas ele atribui a morosidade do Instituto a problemas gerenciais e administrativos e à "forma como era vista a questão das patentes': Ele conta, por exemplo, que determinados processos con-
12 • MAIO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
siderados "sensíveis" eram esquecidos. Outros tantos dependiam de parecer do Serviço Nacional de Informações (SNI), já extinto. "Encontramos processo de ·1985, sem solução."
Inspirado em modelos organizacionais adotados pelos mais de 30 institutos de propriedade intelectual de diversos países, que ele conheceu enquanto trabalhou na Organização Mundial da Propriedade Industrial, em Genebra, na Suíça, Graça Aranha reviu práticas, métodos e sistema de classificação do INPI brasileiros de tal forma a torná-los compatíveis com aqueles adotados no exterior. "E os processos começaram a se mover." Hoje, o número de processos de patentes atrasados caiu para menos de 30 mil e os de pedido de registro de marcas para algo em torno de 170 mil. A meta
é acelerar o exame dos processos, reduzindo o período de tramitação dos processos dos atuais e intermináveis dez anos para quatro anos, seguindo o padrão da grande maioria dos institutos estrangeiros.
Há, no entanto, outros problemas a serem resolvidos como, por exemplo, o da falta de pessoal. Desde 1995, pelo menos 30% dos funcionários do órgão se aposentaram e o Instituto implantou, a partir de 1997, política de terceirização de mão-de-obra, por meio da qual o INPI emprega 295 pessoas. Os funcionários fixos somam, hoje, 560. A terceirização, no entanto, está sendo contestada pelo Ministério Público. "Temos que buscar uma saída definitiva para esse problema." O modelo por ele desejado é transformar o INPI numa agência executiva, com independência financeira e um plano de cargos e salários próprios, conforme pre-
resultados, será possível partir para a identificação das empresas eventualmente interessadas no produto. "Os investimentos no desenvolvimento do produto são quase iguais ou maiores que os investimentos em pesquisa': constata Maria Celeste. "E esse é, hoje, o nosso maior gargalo."
D o lado das grandes empresas, a situação é diferente. A Petrobras, por exemplo, com um faturamento anual de US$ 20 bilhões, é a campeã de registras de patentes. A empresa coleciona um total de
643 patentes concedidas no Brasil e 1.498 no exterior em pelo menos dez países. A Petrobras tem a titularidade das patentes. "Somos o maior gerador de tecnologia no país", garante Marta Metello Jacob, consultora técnica do Setor de Comercialização de Tecnologia e Propriedade Industrial.
O Setor de Comercialização de Tecnologia funciona há 30 anos e a empresa já tem bem desenvolvida uma cultura de proteção aos seus esforços de inovação tecnológica. O desenvolvimento das pesquisas pode ser
visto no artigo 239 da Lei no 9279, sobre a Propriedade Industrial.
Responsabilidade - Ele credita à ineficiência histórica do INPI uma parte da responsabilidade pela falta de uma cultura de proteção à proprieda-
acompanhado pelo Setor por meio da Intranet. "Padronizamos os procedimentos para o envio do relatório do que a invenção representa em termos de melhoria de custo ou tempo de trabalho", detalha a consultora. Esses relatórios servem de base para a fundamentação do documento de depósito da patente que é elaborado pelo Setor de Comercialização, também responsável pela confirmação da originalidade do projeto. "Trabalhamos com 80% de certeza", ela diz.
São depositadas patentes de inovações tecnológicas que já estão em operação nos diversos centros de operações da empresa. "Fazemos isso para evitar que outras empresas usem a nossa tecnologia sem pagar ou desenvolvam projetos semelhantes e nos impeçam de continuar usando o nosso", explica Marta Metello Jacob.
Mais que isso, o depósito de patentes no exterior tem o objetivo de divulgar a imagem da Petrobras e
do Brasil no exterior. "Faz mais efeito do que pa
Graça Aranha sonha com a independência financeira do INPI
gar uma página inteira de anúncio no The New York Time': ela afirma. "Funciona como uma espécie de marketíng da empresa e do Brasil no exterior." •
aposta na imensa capacidade de inovação tecnológica do país. E exemplifica: em 1997, os países em desenvolvimento registraram 6 mil pedi-
de intelectual no país. "Os pesquisadores preferem publicar os inventos para aferir produtividade a patenteá-los", constata. Esse mesmo descuido pode ser observado no desinteresse das empresas em registrar marcas. "Do total de empresas registradas nas Juntas Comerciais, apenas 15% procuram o registro do INPI."
Registra, ainda, que o banco de dados da entidade, que reúne cerca de 20 milhões de documentos de patentes, desde 1920, tem média muito baixa de consulta, algo em torno de mil por ano. Esses dados não estão disponíveis
em meio eletrônico, mas espalhados por uma área de 5 mil metros quadrados, o que certamente desestimula a consulta. "O INPI de Cuba, país que não tem qualquer capacidade de investimento, também acumula 20 milhões de documentos de patentes, não informatizados, e recebe o dobro de consultas;' ele compara. Ressalva que o Instituto cubano é mais enxuto e organizado que o brasileiro: as pastas com documento ocupam área muito menor, de 600 metros quadrados.
dos de patentes, sendo que metade era tecnologia gerada no Brasil.
Admite que a posição relativa do país no mundo desenvolvido é diferente. No ranking das patentes concedidas nos Estados Unidos em 1996, o Brasil é líder da quarta divisão, ao lado de Porto Rico, Gana e Zimbábue. "E por não se tratar de um campeonato de futebol, o líder da quarta divisão não é promovido, automaticamente, para a terceira," ironiza. O INPI, ele diz, tem que colaborar para mudar esse quadro. "Precisamos recuperar o tempo perdido."
Apesar das dificuldades dos pesquisadores, Graça Aranha
PESQUISA FAPESP · MAIO OE 2000 • 13
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
JORNALISMO CIENTÍFICO
A imprensa entre a ciência e a ética
Congresso debate a qualidade da divulgação dos trabalhos científicos
N um cenário de transição entre um mundo dominado
por chips e computadores para outro em que reinarão os genes e o DNA, a Associação Brasileira de Jornalismo Científico (ABJC), que congrega jornalistas da área de todos os estados brasileiros, realizou, em Florianópolis, entre os dias 2 e 5 de maio, o 6° Congresso Brasileiro de Jornalismo Científico. Com o tema geral O jornalismo científico diante da ética na Ciência e na imprensa, o evento teve como objetivo a troca de
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experiências profissionais e a apresentação de trabalhos de jornalismo e divulgação científica, em diversos minicursos, mesas-redondas, conferências e painéis.
A modernidade, a separação entre ciência e ética e fundamentação do conhecimento foram temas debatidos pelos professores de jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Eduardo Meditsch e Orlando Tambosi. Para Meditsch, o jornalismo é uma forma de conhecimento diferente da ciência, porque é voltado para um público abrangente e revela o fato em si mesmo. "Os cientistas, por sua vez, dirigem sua produção para a comunidade científica e abstraem aspectos de diferentes fatos", afirmou. "No entanto, o jornalismo também deve
ser visto como uma forma de conhecimento, porque oferece um ângulo a mais para a compreensão da realidade." E é exatamente por isso que essa atividade, tal qual a do cientista, deve ser regida pela ética. Dois outros professores de jornalismo da UFSC, Francisco Karam e Nilson Lage, defenderam a idéia de que cada profissão tem que ser gerida por um código de ética diferenciado, pois cada uma desenvolve um trabalho diferente.
O código de ética do jornalismo, no entanto, é ineficaz, segundo avaliação de jornalista José Hamilton Ribeiro, presidente da ABJC. "Com ou sem código de ética a imprensa vive da mesma maneira", declarou. "Cada empresa de comunicação tem seu próprio código. Cada uma de-
senvolve seu produto de acordo com seus interesses e critérios de censura:' O professor Karam, da UFSC, acrescentou que é preciso que os objetivos da mídia sejam objeto de discussão nos meios de comunicação. Segundo o professor, existem centenas de processos contra jornalistas por publicarem informações erradas, mas não há um fórum dentro da categoria para debater isso. O jornalista Sérgio Murilo de Andrade, secretário-geral da Federação Nacional dos Jornalistas Profissionais (Fenaj), disse que o código de ética é bom, mas é lido por poucos jornalistas e ensinado em poucas escolas.
Cobertura especializada - Outro ponto debatido no Congresso foi a qualificação dos jornalistas. O presidente da ABJC e André Singer, editor da revista Superinteressante, concordaram que o jornalismo caminha para a especialização e que os profissionais terão que conhecer mais as áreas que pretendem seguir. Para Ribeiro, o jornalismo científico e a ciência feitos no Brasil estão, em geral, abaixo das expectativas. Ele disse que, para melhorar o jornalismo, "só fazendo jornalismo': ou seja, o profissional deve trabalhar muito, errar até acertar. ''A ciência pode avançar com investimentos e mudança de postura dos pesquisadores", explicou. "Hoje,
bertas de genes que causam doenças, quando na verdade é muito mais que isto. Mas a cura das doenças e a imortalidade são o que as pessoas querem saber e por isso o projeto é apresentado dessa maneira:'
André Singer foi mais ameno e falou sobre a atuação da revista Superinteressante, da qual é o editor. "A Superinteressante não é uma revista científica, mas uma publicação que trata de ciência e tecnologia e ajuda na criação de uma cultura científica no Brasil", explicou. "Na revista, que
os cientistas brasileiros não são comprometidos com a socieda Ribeiro: jornalismo caminha para a especialização
de e não se vêem na obrigação de divulgar seus trabalhos. Já os jornalistas, penso que eles devem estudar e trabalhar mais."
A apresentadora da TV Cultura de São Paulo e professora de telejornalismo, Mônica Teixeira, seguiu o mesmo caminho de Ribeiro e criticou o jornalismo brasileiro. "Há uma cultura no país que quer ver coisas ruins e a imprensa mostra isso", disse. "Com o jornalismo científico não é diferente. Um exemplo é o caso do projeto genoma humano, que é mostrado apenas como desco-
está entre as dez mais lidas do país, buscamos mostrar a beleza e o fascínio da ciência, para prender a atenção do leitor. Infelizmente esse aspecto nem sempre é bem visto pelos pesquisadores, que não gostam de ver seus trabalhos 'simplificados'."
Complexo de inferioridade - A brasileira Andrea Kauffmann não é jornalista, mas também trabalha com divulgação científica. Ela é editora sênior da Nature e uma das responsáveis pela escolha dos artigos de
cientistas do mundo todo que terão o privilégio de serem publicados nas páginas da prestigiosa revista inglesa. Em sua palestra, Andrea disse que a Nature é a revista mais rigorosa na escolha dos artigos científicos e por isso a publicação de um artigo em suas páginas traz prestígio e reconhecimento para o autor. Ela explicou que os critérios para publicação são científicos e não jornalísticos e que todos os editores da revista são cientistas, inclusive ela, que é bióloga.
Quanto ao fato de pesquisadores brasileiros publicarem tão pouco na Nature, Andrea acredita que isso se deve a um certo complexo de inferioridade deles. "Complexo que não deveria existir", garantiu. "Competência o pesquisador brasileiro tem; o que ele não tem é a infra-estrutura, recursos. Talvez por isso ache que seu trabalho é de pior qualidade. Não é. Para publicar, tem de enviar os artigos. E os brasileiros têm condições de fazer isso."
O painel de encerramento do Congresso apresentou os projetas de divulgação científica de duas fundações de amparo à pesquisa, a de São Paulo, FAPESP, e a de Minas Gerais, Fapemig. Mariluce Moura, gerente de comunicação da FAPESP, apresentou o case de divulgação na imprensa do seqüenciamento do genoma da Xylella fastidiosa, pesquisa desenvolvida por cerca de 200 cientistas financiados pela Fundação e um marco da ciência brasileira. Liliane Nogueira,
da Fapemig, mostrou o projeto Minas Faz Ciência, cujo carro-chefe são programas de dois minutos veiculados pela TV Educativa de Minas Gerais.
O encerramento do Congresso com as fundações serviu para mostrar que já existe uma produção científica de qualidade e de resultados no Brasil, assim como a consciência da importância da divulgação desse tipo de trabalho, tanto por parte dos pesquisadores como dos jornalistas. •
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 2000 • IS
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
AVALIAÇÃO DE PROJETOS
FAPESP procura novos assessores Pesquisadores com experiência podem se inscrever pela Internet
AFAPESP está ampliando o número de assessores que avaliam
e acompanham, até a conclusão, os projetos de pesquisa que lhe são enviados. Nos últimos anos, além de ter registrado um extraordinário crescimento na demanda de solicitações dentro de suas linhas regulares de fomento, a Fundação implantou uma série de novos programas especiais, cujos projetos dependem da análise de dois assessores para serem aprovados ou denegados. Em 1999, por exemplo, foram encaminhados 12.475 pedidos de financiamento, entre bolsas, auxílios tradicionais, em suas diversas modalidades, e auxílios a projetos de pesquisa dos vários programas especiais da instituição, sobrecarregando de trabalho os 9.244 assessores já relacionados pela Fundação. Por isso, o diretor científico da FAPESP, José Fernando Perez, entende que é necessário expandir o número de assessores. A participação está aberta para todo pesquisador que tenha experiência documentada em pesquisa. "O pesquisador pode propor seu próprio nome ou o de um colega para nosso quadro de assessores", explica Perez. As inscrições podem ser realizadas pela Internet na página www. watson.fapesp. br.
Análise pelos pares - O sistema adotado pela FAPESP para avaliação de projetos é a análise pelos pares, ou seja, um cientista analisa a solicitação de pesquisa de outro cientista da mesma área de conhecimento. Esse critério é adotado nas mais importantes agências de fomento do mundo.
16 · HAlO OE 2000 • PESQUISA FAPESP
Os pesquisadores que fazem essas análises tornam-se assessores ad hoc da FAPESP, ou seja, não mantêm com ela qualquer vínculo formal e funcionam como seus assessores para a finalidade específica da avaliação de projetos. Os pareceres sobre o mérito desses projetas são encaminhados às coordenações de área da diretoria científica da Fundação (uma para cada grande área do conhecimento) que, considerando os vários aspectos abordados, os consolidam em recomendações de aprovação ou denegação das solicitações de financiamento. "Todas as decisões estão, portanto, vinculadas simultaneamente aos pareceres dos assessores e às normas da FAPESP': afirma Perez. Os assessores também acompanham o projeto durante todo o tempo da pesquisa, até o relatório final.
Prestar assessoria ad hoc para a FAPESP é uma atividade não remunerada. "O não pagamento é uma praxe internacional, funciona em geral como contrapartida ao financiamento que o assessor já recebeu ou poderá receber para suas próprias pesquisas': explica Perez. Isso vale para· a maioria dos assessores, que é de São Paulo, mas não pode se estender para os especialistas de outros estados e do exterior que também prestam a mesma assessoria, porque legalmente os financiamentos da Fundação só podem ser concedidos aos pesquisadores baseados em São Paulo. A assessoria dos demais é um ato de cooperação habitual para a comunidade científica.
"O importante no trabalho do assessor é ele avaliar a importância científica do proje-
to e a metodologia utilizada, a competência da equipe e o orçamento apresentado. Verificar a relação custo-benefício e o risco da pesquisa dar certo ou não. Resumindo, é preciso ponderar os benefícios, os custos, a relevância e a viabilidade do estudo", explica Perez.
Sigilo e confiança - O processo de avaliação e acompanhamento dos projetas tem outro quesito importante: o sigilo. O assessor se compromete a não revelar o conteúdo do projeto, que deve ser tratado como confidencial. Ele não pode revelar sua identidade, nem para o interessado, nem para terceiros. Tudo porque o sucesso do sistema depende da confiança que se deposita no assessor e do sigilo que também a FAPESP se compromete a exercer. E para dar garantias nesse sentido, a Fundação toma algumas providências, como evitar a indicação de um assessor da mesma instituição do solicitante.
Outra preocupação é evitar a escolha de um assessor que tenha alguma ligação especial com o solicitante que dificulte ou mesmo impeça um parecer isento, ou seja, que interponha um potencial conflito de interesses. E para isso, a FAPESP envia a cada assessor, junto com o projeto a ser analisado, uma carta com os critérios a serem observados antes mesmo do início da avaliação (ver box). Se ele concluir que sua posição em relação ao solicitante efetivamente configura algum conflito de interesses, deve devolver o projeto.
A indicação do assessor específico para cada solicitação é feita pelo coordenador de cada área do conhecimento científico. Por exemplo, em Ciências Biológicas existem sub-áreas de botânica, genética, farmacologia e mais dez campos de atuação. Junto aos coordenadores de área nmcionam os coordenadores adjuntos, prestando assessoria interna para a área científica da FAPESP.
Critérios de avaliação - Para o professor Francisco Bezerra Coutinho,
Isenção e credibilidade Para preservar a credibilida
de de seus procedimentos de avaliação e evitar constrangimentos, a FAPESP envia a cada assessor ad hoc uma lista de critérios a ser observada antes da análise do projeto. A lista contém os seguintes itens que, se respondidos afirmativamente, representam potencial conflito de interesses, deixando ao assessor toda a liberdade de recusar a análise: 1) participação atual ou anterior
no projeto;
coordenador-adjunto da área de Ciências Exatas da FAPESP, na maior parte das vezes, é muito difícil para o coordenador escolher um assessor. "Às vezes, um bom cientista é um assessor limitado, que responde laconicamente o parecer", avalia. "Existem bons cientistas que não são bons assessores", concorda Rogério Meneghini, coordenador-adjunto da área de Ciências Biológicas. Para ele, a cultura de assessoria ainda é pouco desenvol-
2) colaboração regular em atividades de pesquisa ou publicação com um dos pesquisadores solicitantes, nos últimos anos;
3) relação orientador-orientando com o solicitante;
4) interesse comercial do assessor na pesquisa proposta;
5) relação familiar do assessor com um dos proponentes; ou
6) qualquer relação anterior com o solicitante que possa ser percebida como impeditiva para um parecer isento.
vida no Brasil. "Os pareceres são muito diferentes nos Estados Unidos e na Europa. Lá, eles são mais abrangentes e mais proflmdos, e gasta-se mais tempo nas análises", afirma Meneghini. "Aqui, as respostas são curtas, mas, na média, os pareceres são muito bons." Ele credita esse descompasso à maior competitividade existente no exterior, exigindo avaliações mais rigorosas.
Alguns solicitantes se valem do direito garantido pela FAPESP de recorrer de uma decisão negativa, por meio de um pedido de reconsideração fundamentado na discussão das objeções levantadas pelo assessor ad hoc. Nesses casos, a FAPESP reenvia o projeto ao mesmo assessor, pode enviá-lo a um segundo "e até a um terceiro, para uma arbitragem final, quando os dois primeiros pareceres são diferentes e opostos': diz Paula Monteiro, coordenadora-adjunta da área de Ciências Humanas.
Dentre as áreas que necessitam de um maior número de assessores estão a de engenharia e de saúde, segmentos com maior número de pedidos. Em todas, existem solicitantes que tentam saber quem é assessor de seu projeto. "Eles tentam adivinhar, mas, normalmente, erram", afirma Coutinho. Por isso, é importante ter uma maior diversidade de assessores ajudando a garantir o sigilo e a isenção que cerca a aprovação dos projetas. •
PESQUISA FAPESP • MAIO OE 2000 17
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
ESTRATÉGIAS
concentram em áreas como ensino em escola pública e enfermagem, onde os salários não são altos. Elas representam apenas 28o/o dos oito milhões de empregos em profissões consideradas bem pagas, com renda anual superior a US$ 40 mil, de acordo com Ruzena Bajcsy,
Presidente da SPBC e ministro: cumprimentos efusivos
da Fundação Nacional de Ciências (National Science Foundation). A proporção de mulheres parece ter estabilizado nas diversas áreas profissionais, com exceção do direito
Fundos setoriais em debate
A comunidade científica paulista recebeu bem a visita do Ministro da Ciência e Tecnologia (MCT), Ronaldo Sardenberg, à FAPESP, no dia 16 de maio. Ele esclareceu uma série de pontos dos projetos dos fundos setoriais para pesquisa, encaminhados ao Congresso Nacional pelo governo federal. Na platéia do auditório da Fundação estavam a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Glaci Zancan, diretores de 28 sociedades científicas ligadas à SBPC e diversos representantes de institutos de pesquisa e universidades. Mesmo os mais críticos ao encaminhamento da política científica e tecnológica do governo elogiaram a atitude do ministro em dialogar com os pesquisadores. Sardenberg falou da necessidade e da importância dos fundos como uma das soluções
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para suprir os recursos para pesquisa do MCT, além de expandir a interação entre a comunidade acadêmica e o setor produtivo (veja entrevista do ministro na edição 52 de PESQUISA FAPESP). Os fundos previstos são de informática, telecomunicações, energia, recursos hídricos, mineral, transporte e espacial. Estão em estudo os fundos de saúde, agronegócios e aeronáutica. O ministro também esclareceu que a perspectiva dos fundos incorpora o conjunto da ciência, tanto em aplicações tecnológicas como básicas. Agora é esperar a aprovação dos primeiros fundos, que devem agrupar um total de R$ 1,2 bilhão no próximo ano.
Homens, mulheres e o trabalho
As mulheres ocupam mais da metade dos 21 milhões de empregos profissionais nos Estados Unidos. Mas ganham relativamente menos que os homens, já que suas atividades se
e da medicina. O percentual de mulheres nas atividades ligadas à matemática e ciências da computação, profissões com prestígio e salários em alta, caíu nos anos 90. Essas áreas, além de serem disputadíssimas pelos homens, se caracterizam por uma jornada extensa de trabalho, o que conflita com as responsabilidade familiares tipicamente femininas, de acordo com a pesquisa. Nas áreas acadêmicas ( college and university faculties), a participação das mulheres
estabilizou no final dos anos 90. Mas elas estão sub-representadas em algumas especialidades médicas bem pagas, como cardiologia e cirurgia ortopédica, por exemplo. Tendem a trabalhar menos horas que os homens e a ocupar posições financeiramente menos gratificantes. Virgínia Valian, psicóloga do Hunter College, atribui essa relativa desvantagem das mulheres no mercado à percepção de que os homens são mais adequados para trabalhos importantes. Desde a infância, ela analisa, homens e mulheres desenvolvem "esquemas de gênero" (gender schemas), um conjunto de expectativas subconscientes do papel dos sexos que incluem desde as funções de cada um dentro de casa até a competência profissional. Esse "esquema", transposto ao mercado de trabalho, coloca as mulheres em desvantagem, até mesmo quando seu desempenho e credenciais são iguais às dos homens.
Ciência e tecnologia ganham ministério
O primeiro-ministro reeleito da Espanha, José Maria Azna anunciou a criação de um novo Ministério da Ciência e Tecnologia para responder à necessidade de pesquisa, inovação e à 'revolução tecnológica', informa a Nature. O novo ministério será responsável pela política de pesquisa básica e aplicada, tecnologia da informação e telecomunicações. Compreenderá também aquelas atividades de pesquisa que estavam espalhadas pelos outros ministérios, além de incorporar o Conselho Superior de Pesquisa Científica do país. A política do ministério em relação à pesquisa básica e aplicada seguirá as 'linhas de ação' estratégicas definidas no Plano Nacional de Pesquisa 2000-04. O governo pretende utilizar esse plano para identificar as áreas de pesquisa em que a Espanha pode ser mais competitiva. A nova ministra será Ana Birulés, economista e, desde 1997,
diretora geral da gigante de telecomunicações Retevisión. Ela era anteriormente vice-presidente do Departamento de Indústria do governo regional da Catalunha. O Ministério da Educação e Cultura, que era responsável, até então, por ciência e educação superior, será liderado por Pilar dei Castillo, presidente do Centro de Investigação Sociológica, do governo, desde 1996.0 governo acredita que a situação
social e econômica da Espanha faz deste o momento certo para tentar elevar o apoio à pesquisa ao nível dos países mais desenvolvidos. Atingir esse objetivo vai exigir estreita colaboração com o setor privado - uma das primeiras tarefas do ministério será criar um fundo de pesquisa biomédica em conjunto com a indústria farmacêutica.
A Aids e a segurança nacional
O governo Clinton declarou a Aids uma ameaça potencial à segurança nacional e vai destinar US$ 245 milhões, no ano fiscal de 2001, para combater a doença em outros países. O Conselho de Segurança Nacional, que normalmente trata de ameaças de guerra e terrorismo, terá a responsabilidade de traçar uma estratégia internacional para a Aids, diz a Nature. A decisão se pauta num relatório divulgado no ano passado, que concluiu que a doença poderia causar instabilidade política na África, Ásia e nos países da antiga União Soviética.
Ásia, África e a globalização
A Associação Latino Americana de Estudos de Ásia e África ( ALADAA) promove o seu X Congresso, entre os dias 26 e 29 de outubro, na Universidade Cândido Mendes, no Rio de Janeiro, em torno do tema Cultura, Poder e Tecnologia: África e Ásia face à Globalização. Estarão em pautas questões como Estado, democracia,
pluripartidarismo e conflitos atuais; mudanças tecnológicas, trabalho e sindicato, cooperação internacional entre os três continentes, história africana e asiática, além de arte, literatura, cultura e religião. Os interessados devem procurar a secretaria do Congresso: Universidade Cândido Mendes- Centro de Estudos Afro-AsiáticosTelefone (OXX21) 516-7157 ou (OXX21) 518-3129 e-mail: [email protected] site ALADAA: http:/www. colmex.mx/centros/ ceaa/aladaa/default.htm
Congresso debate a Bioética
As pesquisas de novas drogas e tecnologias, os cuidados com a saúde, as condições de atenção à saúde das comunidades e a repercussão ambiental do desenvolvimento humano serão temas de debate do III Congresso Brasileiro de Bioética e o I Congresso de Bioética
do Conesul, ambos promovidos Sociedade Brasileira de Bioética, e que se realizará em julho, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). O encontro reunirá profissionais de Saúde, Ciências Humanas, Direito e de outras áreas de conhecimento. Estão programados, ainda, cursos pré-congresso, com vagas limitadas e que exigem inscrição antecipada, e encontros informais com especialistas em Bioética. Os interessados devem procurar a Secretaria Executiva do Congresso. Fone/fax (OXX51) 311 7350 ou pelo e-mail Imgrings@pro. via- rs.com. br
Prêmio para cientistas
Em comemoração aos 100 anos da Fio cruz, que aconteceu em 25 de maio, foi lançado no Rio de Janeiro, no dia 16 de março, o Prêmio Fundação Oswaldo Cruz - Grupo EMS Sigma Pharma de Ciência e Tecnologia em Saúde. Dividido em sete categorias, o prêmio será concedido a pesquisadores e médicos com trabalhos científicos relevantes nas áreas de produtos naturais, biologia molecular, vetores de doenças endêmicas, doenças parasitárias e infecciosas, hipertensão, transplantes de órgãos sólidos e saúde pública. Os interessados poderão ter acesso ao regulamento e edital através do site www.fiocruz.br/vppqe, ou pelo e-mail [email protected]. O prazo de inscrição vai até 14 de julho.
PESQUI SA FAPESP · MAIO DE 2000 • 19
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Plumas de material mais quente originam-se provavelmente na camada 0", no limite entre o manto inferior e o núcleo externo. Migram pelo manto e nem sempre chegam à crosta.
As plumas causam extenso vulcanisno quando atingem a superfície.
As correntes de convecção podem afastar duas placas e gerar plumas, que assim chegam à superfície.
MANTO INFERIOR
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Em conseqüência da proximidade com o núcleo externo e do aumento de temperatura de cerca de 1.000 graus, a camada O" apresenta uma composição heterogênea, diferente das rochas do manto.
À medida que mergulha, a placa ganha calor, perde consistência e se confunde com o manto.
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O núcleo externo tem movimento turbulento, com velocidades de centímetros por minuto.
O manto, por se deformar muito lentamente, apresenta velocidades de convecção de apenas alguns centímetros por ano.
As placas podem encontrar resistência do manto inferior e movimentar-se quase horizontalmente.
wana, ao se fracionar, deu origem às atuais África, América do Sul e Antártica (ver ilustração acima).
O ponto dé partida de Wegener para estabelecer a teoria das placas tectônicas foi a semelhança entre as costas do Brasil e da África Ocidental, que ele viu como peças que se encaixam num enorme
quebra-cabeça. Wegener pensou que os continentes se deslocavam à deriva, flutuando como enormes balsas rochosas sobre uma camada de rochas fundidas, que seria o manto. Comprovou-se a idéia de deslocamento dos continentes, mesmo o manto sendo sólido e não fundido (as rochas do manto apenas se comportam de maneira pastosa, quando vistas numa escala de milhões de anos). Desde essa época, pesquisadores de todo o mundo mapeiam as trajetórias das diversas placas, mas somente nas últimas décadas é que as cor-
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rentes de convecção no interior da Terra, ligadas diretamente à movimentação das placas, começaram a ser detectadas, por meio da tomografia sísmica, técnica que mapeia as estruturas do interior do planeta atravessadas pelas ondas geradas em terremotos.
A equipe da USP investigou uma área que forma um retângulo de 1. 700 quilômetros de comprimento por 1.000 quilômetros de largura, mergulhando a 1.400 quilômetros de profundidade, na Bacia do Paraná e arredores (ver mapa da pág. 24). A primeira fase do trabalho, restrita a um retângulo de 800 quilômetros por 400 quilômetros, terminou em 1995. Foi bem-sucedida a ponto de justificar a etapa atual, que começou em julho de 1997 e deve estar concluída em julho próximo.
Nesse projeto, Estrutura da Crosta e Manto Superior no Sudeste do Brasil, com um financiamento de R$ 173,4 mil da FAPESP, Assumpção conduziu os le-
Escudo do /
PLACA SUL-AMERICANA
Cráton do Congo
Brasil Central ~
)c.,~ ?:P
embora não tão intensa quanto Tristão da Cunha
vantamentos de campo e a interpretação de dados com a participação do geofísico alemão Martin Schimmel, que faz pós-doutoramento na USP. No Brasil, os dados coletados durante o projeto têm sido utilizados também em outras pesquisas pela Universidade de Brasília, pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo (IPT) e pelo Observatório Nacional do Rio de Janeiro.
No início, os pesquisadores da USP e de Carnegie, mais diretamente envolvidos com esse trabalho, utilizaram como fontes de dados as ondas de choque liberadas por terremotos, as ondas P (longitudinais, que chegam primeiro à superfície) e S (transversais), das diferentes regiões do planeta. Publicada na revista Nature de 4 de novembro de 1995, essa pesquisa preliminar revelou, entre os municípios de São José do Rio Preto, Ribeirão Preto e Franca, no interior de São Paulo, a existência de uma estrutura interpretada como um antigo conduto vulcânico no manto, causado por
uma pluma. Deduzidas a partir de estudos em computador e em escala reduzida de laboratório, as plumas são colunas de rocha quente que se originam a grandes profundidades no manto, sobem à superfície e causam extenso vulcanismo. Nos últimos anos, as plumas estão sendo finalmente detectadas, como a que dá origem à Ilha da Islândia no Atlântico Norte. Segundo Assumpção, esse material vindo do interior da Terra pode perfurar a crosta, como enormes projéteis, e teve um papel importante no processo de ruptura do supercontinente Gondwana.
O pedaço de pluma fóssil- não mais ativa, portanto- do interior paulista situa-se entre 200 e 700 quilômetros de profundidade e tem a largura aproximada de 300 quilômetros. A temperatura dessa estrutura, de acordo com os dados obtidos, está em torno de 1.700 graus Celsius, pelo menos 200 graus Celsius acima da região a seu redor. Segundo Assumpção, essa estrutu-
PESQUISA FAPESP · MAIO OE 1000 • 23
ra já esteve no meio do oceano Atlântico, associada ao arquipélago de Tristão da Cunha, território do Reino Unido, de origem vulcânica, no meio do Atlântico Sul.
Em seguida, a ruptura do Gondwana, que originou os atuais territórios da África e América do Sul, fez nascer o Oceano Atlântico, há 130 milhões de anos. Evidentemente, as placas tectônicas ainda não se aquietaram. Ainda hoje, no assoalho marinho, onde a crosta é menos espessa, o deslocamento das placas produz fraturas por onde brota material quente do manto. Esse é o mecanismo responsável pela Cordilheira Mesa-Oceânica ou Dorsal Atlântica, de que o arquipélago Tristão da Cunha é parte. Trata-se de uma área em que as plumas ainda se encontram ativas - o chamado hot spot ou ponto quente.
Os dados obtidos na Bacia do Paraná indicam que um pedaço da pluma, a coluna de material quente do manto, desviou-se para oeste e, desse modo, acompanhou o movimento da Placa Sul-Americana, estando hoje inativa e, portanto, fóssil. Na avaliação dos pes-
24 • MAIO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
quisadores, apenas essa descoberta já traz uma importante contribuição ao estudo da dinâmica de placas. O Brasil localiza-se bem no centro da Placa Sul-Americana, que se afasta para oeste à velocidade de 1,5 centímetro ao ano. Como a própria Placa Africana desloca-se para o leste à mesma velocidade, os dois continentes se distanciam entre si à velocidade total de três centímetros ao ano.
Seguindo para oeste, em conseqüência da movimentação do manto, a pluma do interior paulista manteve-se sob a Bacia do Paraná até hoje. Pouco antes da ruptura do Gondwana, havia sido responsável por extensos
derrames de rocha vulcânica (os basaltos), que cobriram a superfície por mais de mil quilômetros, a partir do ponto de origem. Desse modo, os pesquisadores explicam uma característica geológica da Bacia do Paraná, os derrames de basalto. O basalto, rocha vulcânica de cor escura, ao se transformar em solo ao
longo de milhões de anos, deu origem aos solos vermelhos e férteis do Paraná e parte do interior paulista, que ajudam a manter uma das mais produtivas agriculturas do país.
No estudo mais recente, Assumpção e Schimmel delimitaram melhor a coluna de material quente, o pedaço de pluma fóssil, por meio de 38 estações sismográficas distribuídas ao longo da área de estudo, que se estende de Brasília até parte do Paraná. Tiveram, para isso, de viajar cerca de 20 mil quilômetros nos três anos que a pesquisa já toma. A cada dois meses, os pesquisadores ou os técnicos viajavam até as estações para coletar os dados que eram armazenados pelos sismógrafos computadorizados. Instalados em pequenos abrigos normalmente dentro de fazendas, os sensores registravam as vibrações do solo detectando diariamente terremotos ocorridos no mundo todo. De vez em quando, gravavam também os pequenos tremores, de baixa intensidade, verificados no Brasil.
A velocidade com que as ondas de choque de sismos chegam às estações depende da temperatura e das rochas que atravessam. Assim, os pesquisadores traçaram um perfil da litosfera (a crosta mais uma pequena parte rígida do manto superior) e do manto até uma profundidade de 1.400 quilômetros. Imagens feitas em computador permitiram também a visualização da pluma, contida no manto (acima).
Uma das conseqüências da dinâmica de placas é a formação de montanhas, como acontece no oeste da América do Sul, onde ficam os Andes. Essa cadeia montanhosa, que segue do Chile à Colômbia, originase do choque da Placa Sul-Americana com outra placa tectônica, a Placa de Nazca, localizada sob o Oceano Pacífico. O choque faz com que a placa mais pesada (Nazca) mergulhe sob a placa mais leve (América do Sul), que navega em direção oposta. O choque das placas amassa e torna mais espessa a borda da placa mais leve. No caso das placas Sul-Americana e de Nazca, o espessamento da borda ocidental da Placa
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Sul-Americana resultou na estrutura dos Andes, um processo ainda ativo, e responsável pelos freqüentes terremotos e vulcões dos países andinos como o Equador e a Colômbia.
O avanço técnico dos detectores, ao longo dos anos 90, permitiu o salto qualitativo na coleta de dados e o refinamento do modelo de placas tectônicas proposto por Wegener. Com investigações cada vez mais profundas no manto, foi possível saber, por exemplo, que nos processos de subducção -como é chamado o mergulho de uma placa sob a outra - a destruição da placa em mergulho só acontece a grandes profundidades, às vezes a mais de 1.000 ou 2.000 quilômetros.
" á está superado o modelo anterior, que supunha a placa em mergulho se dissolvendo a profundidades de apenas 700 quilômetros': comenta Schirnmel.
"Em vez disso, ao mergulhar, mantém-se intacta, sem se dissolver:' Embora constituída pelo mesmo material do manto, a placa é mais fria, mais rígida e mais pesada - portanto, afunda mais facilmente. Os novos recursos tecnológicos permitiram saber também que uma placa pode mudar sua inclinação e, de um mergulho quase vertical, passar a um movimento horizontal. "O que se sabe hoje, com segurança, é que os sismos profundos, que ocorrem até 700 quilômetros abaixo da Placa Sul-Americana, estão ligados ao mergulho da Placa de Nazca", diz Assumpção. "É provável também que a placa continue mergulhando a maiores profundidades." A tomografia indicou um bloco de rochas mais frias a aproximadamente 1.300 quilômetros abaixo da região Sudeste do Brasil, numa faixa que se estende de Brasília a Curitiba, que parece ser um pedaço da Placa de Nazca.
A descoberta da pluma sob a Bacia do Paraná surpreendeu. Os pesquisadores pretendiam estudar a região para uma comparação com outras áreas consideradas geologicamente muito antigas, como algumas regiões do Canadá. O interesse era descobrir como a litosfera terrestre foi formada nessas áreas conhecidas como crátons, um termo que define as pro-
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víncias geológicas que sofreram pouca ou nenhuma deformação desde o pré-Cambriano, há pelo menos 600 milhões de anos.
Outro objetivo do trabalho era determinar a espessura da crosta e da placa litosférica no Sudeste, até então desconhecida, e investigar a possibilidade de que elas pudessem conter blocos tão antigos quanto o do cráton São Francisco, na bacia do Rio São Francisco, em Minas Gerais. O cráton São Francisco, com aproximadamente 3 bilhões de anos, é uma das estruturas mais antigas do planeta. Agora, o trabalho da USP definiu a espessura do cráton, que se estende da superfície a até cerca de 300 quilômetros de profundidade. Revelou também a existência da pluma fóssil evidenciando o arraste da crosta pelo manto superior.
Para Assumpção, ainda é cedo para avaliar se a descoberta da pluma fóssil pode auxiliar em trabalhos como a previsão de sismos, especialmente na borda de atrito das placas. A contribuição imediata, a seu ver, é mostrar que o manto superior se desloca com a crosta e assim conhecer os esforços a que está submetida uma placa, mesmo em sua porção interior. Nessas áreas também podem ocorrer sismos freqüentes. "Uma razão para os sismos pode ser a concentração de tensões devido a variações de espessura
da litosfera", explica. É o que pode estar acontecendo em uma faixa com tremores de terra constantes que corta o Estado de Goiás no sentido sudoeste-nordeste. A região apresenta um comportamento semelhante ao da região central dos Estados Unidos, onde está satisfatoriamente estabelecida a relação entre sismos e menor espessura da litosfera.
O s pesquisadores da USP acreditam que a descoberta da estrutura das plumas, associada à compreensão das grandes profundidades de mergulho das placas, possa levar a um interesse maior na
investigação da reg~ao de cantata entre a base do manto e o núcleo líquido da Terra (a esfera líquida do centro da Terra tem, em seu interior, um núcleo sólido). Essa região limítrofe é a camada D" (lê-se D duas linhas), situada a aproximadamente 2.700 quilômetros da superfície. É uma área de reações físicas e químicas bastante complexas entre o núcleo líquido e o manto pastoso, cuja forma lembra os dentes irregulares de uma serra de disco.
Os geofísicos estimam que nessa região esteja localizado o mecanismo básico das correntes de convecção, o mesmo tipo de força que faz a água fervendo circular de baixo para cima em uma panela. "Tudo
que desce tem que subir", argumenta Schimmel para estabelecer a relação entre o mergulho de placas formado por material frio e as correntes ascendentes de material a elevadas temperaturas. Segundo a teoria em vigor, o calor do núcleo da Terra resulta da enorme energia gr-avitacional que deu origem ao planeta há 4,6 bilhões de anos, com a importante contribuição adicional da radioatividade natural. Quando a Terra se formou, o calor era tanto que derreteu tudo. O ferro, mais pesado, foi para o centro, onde está até hoje. Pode ser que, nos próximos anos, também essas idéias consagradas sejam revistas, a partir do que agora se sabe a respeito da movimentação das placas tectônicas e da convecção no manto. •
PERFIL:
• MARCELO SOUSA DE ASSUMPÇÃO tem 49 anos. Fez a graduação em Física pelo Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e o doutorado em Geofísica na Universidade de Edinburg, na Escócia. É professor do Instituto Astronômico e Geofísico desde 1974. Projeto: Estrutura da Crosta e Manto Superior no Sudeste do Brasil Investimento: R$ 173.478,14
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CIÊNCIA
AMBIENTE '
Uma ameaça à qualidade da água Biólogas encontram 20 espécies de algas que contaminam represas
Quando, no verão de 1996, mais de 40 pacientes de uma clínica
de hemodiálise morreram em Caruaru, no Estado de Pernambuco, levouse algum tempo para se descobrir a causa do problema. A água que abastecia a clínica, soube-se depois de muitos testes, continha toxinas produzidas pelas cianofíceas. Esses organismos são também conhecidos como cianobactérias ou algas azuis, um grupo de seres vivos muito antigo, que está na Terra há pelo menos 2,5 bilhões de anos e é considerado um elo de ligação entre as bactérias verdadeiras e as algas, com características de ambos.
Em condições normais, as cianobactérias e os demais organismos aquáticos convivem de modo equilibrado em lagos e reservatórios. Não há dominância de uma determinada espécie em detrimento de outra. Mas, quando há algum tipo de interferência, que enriquece a água com nitrogênio e fósforo, a chamada eutrofização, algumas espécies passam a ser dominantes: multiplicam-se de forma excessiva e dão origem ao fenômeno chamado floração, ou bloom. Essas fiorações formam uma densa massa na superfície da água, que altera o equilíbrio ecológico e cria problemas.
Algumas espécies de cianobactérias produzem toxinas e as suas florações podem causar mortandade de peixes e de outros animais ou até mesmo de seres humanos, como ocorreu em Caruaru. As cianobactérias ocorrem nos mais diversos tipos de ambientes
Lagoa com cianobactérias na zona sul de São Paulo: acúmulo de esgotos
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aquáticos e terrestres. Em lagos e represas, as espécies planctônicas, isto é, aquelas que vivem soltas na massa d'água, são as que freqüentemente causam florações.
A eutrofização é um fenômeno cada vez mais freqüente. Pode ser conseqüência de despejos de esgotos, doméstico ou industrial, de adubação das lavouras, de piscicultura e da criação de animais como bois e porcos nas proximidades da água. Um passo muito importante para a compreensão desse problema foi dado pelo
de São Paulo, aparece também na represa Billings. Ocorre em conjunto com espécies do gênero Microcystis, formando fi orações. Os testes para determinar se a alga é tóxica ou não ainda estão em andamento.
Outra espécie nova é a Coelosphaerium evidenter-marginatum, encontrada num lago eutrófico no Parque Estadual das Fontes do Ipiranga, zona sul da cidade de São Paulo. Um trabalho sobre essa espécie, que não é tóxica, já foi publicado na revista alemã Algological Studies. A terceira es-
No Brasil, há poucos especialistas nessa área específica. Normalmente, dizem as pesquisadoras, os laboratórios que fazem testes de toxicidade não têm especialistas para identificar as cianobactérias. Vem daí o interesse em desenvolver trabalhos em conjunto para, no futuro, ter um banco de dados com informações precisas sobre as espécies brasileiras.
Patrim ônio genético- A bióloga Maria Teresa de Paiva Azevedo, que trabalhou com Célia no projeto, é a res-
r-----------------. o ponsável pelo Banco de ~ Cultura de Cianobacté-~ rias, criado no Laborató~ rio de Cultura de Algas ~ do Instituto de Botânica. ~ < "' < ~
Nesse banco, são mantidas culturas isoladas de
~ material recolhido da na-" 'Z tureza. "Podemos garantir :1 § que em cada tubo de en-~ saio depositado no Ban~ co de Cultura existe apes ~ <
nas uma única espécie, com o mesmo patrimônio genético", diz ela.
A Sphaerocavum, comum em reservatórios, e . .. . .. uma Coelosphaerium, não-tóxica: espécies novas A área do Estado de
São Paulo foi o foco
projeto Cyanophyceae!Cyanobacteria Planctônicas do Estado de São Paulo, realizado entre 1997 e 1999, que contou com um financiamento da FAPESP de R$ 32,9 mil, mais US$ 47,9 mil. Coordenado pela bióloga Célia Leite Sant' Anna, pesquisadora do Instituto de Botânica da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, o projeto identificou 20 espécies potencialmente tóxicas de cianobactérias encontradas no Brasil, sendo 13 no Estado de São Paulo. O projeto descobriu ainda três espécies novas para a ciência, uma delas colocada num gênero novo.
A equipe do Instituto de Botânica deu o nome de Sphaerocavum, que significa "esfera oca", ao novo gênero que descobriu. O nome sugerido para a espécie é Sphaerocavum brasiliensis, encontrada em lagos urbanos eutróficos na cidade de São Paulo e em Montevidéu, no Uruguai. No Estado
pécie nova descrita é a Microcystis panniformis, encontrada em várias represas do Estado, como a Billings, Guarapiranga, Barra Bonita e Americana. Os testes sobre a toxicidade ainda estão em andamento.
Identificação - O projeto tinha dois objetivos fundamentais. Um deles era conhecer a biodiversidade das cianobactérias planctônicas (as que flutuam na água) do Estado de São Paulo. O outro era detalhar o desenvolvimento, a variabilidade morfológica e a distribuição geográfica das espécies potencialmente tóxicas no Brasil. "Esses resultados poderão subsidiar, de forma mais prática e segura, os programas de monitoramento de florações de cianobactérias", afirma Célia.
Segundo ela, a taxonomia das cianobactérias é bastante complexa e exige observações das diferentes etapas do desenvolvimento das espécies.
principal deste projeto, mas as biólogas examinaram também amostras de cianobactérias potencialmente tóxicas provenientes de outros Estados. Normalmente, essas amostras são enviadas por técnicos das companhias de saneamento. Trata-se de um intercâmbio habitual, especialmente quando há dúvidas com relação à identificação das algas.
O intercâmbio mais freqüente das pesquisadoras do Instituto de Botânica, porém, é com técnicos da Cetesb e da Sabesp, os órgãos do governo paulista ligados à preservação do meio ambiente e ao abastecimento público, respectivamente. "Nosso intercâmbio funciona há mais de dez anos", diz a bióloga Marta Condé Lamparelli, gerente da divisão de análises hidrobiológicas da Cetesb.
Manual ilustrado - As pesquisadoras pretendem preparar um manual ilustrado, descrevendo as espécies de cia-
PESQUISA FAPESP · MAIO DE lOOO • 29
Espalhadas pelo Brasil O caso de Caruaru é o mais
sério verificado até agora com relação aos efeitos das algas tóxicas. Mas não é o único. Em 1990, uma floração da cianobactéria Anabaena solitaria, na represa de Guarapiranga, que abastece um terço da cidade de São Paulo, provocou forte cheiro de inseticida na água que chegava às casas. Imediatamente, registrou-se um aumento nos casos de dermatites, diarréias e vômitos, especialmente em crianças.
Na Lagoa da Barra, no Rio de Janeiro, uma floração de Synechocystis aquatilis f. salina causou mortandade de peixes. Proliferações de Microcystis aeruginosa em um lago na cidade paulista de Araras mataram pombos e, num lago do Jardim Zoológico de São Paulo, foram responsáveis pela morte de vários patos.
Técnicos da Cetesb informam que o controle da água destinada ao abastecimento é feito colocando-se algicidas, como sulfato de cobre ou peróxido de hidragênio, nas represas. Nem sempre resolve, pois a morte das algas acaba por liberar suas toxinas na água. "A solução ideal é evitar que o corpo d'água seja eutrofizado': dizem as biólogas Marta Condé Lamparelli e Maria do Carmo Carvalho, dessa empresa. Ou seja, impedir que os mananciais sejam contaminados por esgotos ou outras fontes de poluição.
Atualmente, grupos internacionais de pesquisadores priorizam o estudo de uma espécie extremamente agressiva e competitiva, a Cylindrospermopsis raciborkii, que se alastrou rapidamente em represas e lagos brasileiros.
Uma das espécies tóxicas mais comuns no Brasil é Anabaena spiroides. Geralmente, forma flora-
30 • MAIO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
ções em corpos d'água eutrofizados. Outras espécies do mesmo gênero, A. solitaria e A. planctonica, também estão entre as mais conhecidas algas produtoras de toxinas. Contudo, não são as mais bem distribuídas no Brasil. A honra cabe à Microcystis aeruginosa, espécie bastante competitiva e encontrada com facilidade em nossas
Célia e Maria Teresa: perigo crescente
represas, cuja toxina causa amorte de peixes e animais de criação, como gado bovino e patos.
A explicação para a presença cada vez maior das algas tóxicas está na eutrofização. "Temos observado que a distribuição das espécies potencialmente tóxicas está aumentando rapidamente à medida que aumenta o número de represas eutrofizadas no Estado': afirma Célia.
nobactérias potencialmente tóxicas. Esse manual poderá ser utilizado por técnicos da Sabesp, da Cetesb e das empresas de saneamento de outros Estados. Além disso, os resultados da pesquisa, sobre mais de 80 espécies de cianobactérias planctônicas, serão repassados ao Biota-FAPESP, o programa que mapeia a fauna e a flora do Estado de São Paulo.
O próximo passo das pesquisadoras é definir as linhagens tóxicas no Banco de Cultura de Cianobactérias. Para isso, já começaram a mon
tar um laboratório no Instituto de Botânica. No isolamento e identificação das toxinas, contarão com a colaboração de outra pesquisadora do Instituto, Luciana Retz de Carvalho, doutora em Fitoquímica pelo Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP). •
PERFIS:
• CÉLIA LEITE SANT' ANNA
formou-se em Ciências Biológicas pelo Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), onde também fez mestrado e doutorado. Pesquisadora do Instituto de Botânica desde 1976, assumiu este ano a direção da Divisão de Fi-
totaxonomia do Instituto. • MARIA TERESA DE PAIVA A ZEVE
DO formou-se em Biologia nas Faculdades Brás Cubas, em Mogi das Cruzes, e fez o doutorado na Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro. Desde 1986 é pesquisadora do Instituto de Botânica. Projeto: Cyanophyceae/Cyanobacteria Planctônicas do Estado de São Paulo Investimento: R$ 32.911,00, mais US$ 47.907
mesmo tempo, ser reconhecido. Conta, para isso, com mecanismos tão sutis que às vezes parece um convidado. "O T. cruzi só sobrevive se encontrar uma célula, penetrar e ficar lá': explica o médico Walter Colli, do Instituto de Química da USP, que estuda a relação entre o parasita e a célula hospedeira desde os anos 70. Segundo ele, descobrindo como o protozoário entra na célula e como sobrevive dentro dela, seria possível identificar as vias metabólicas que permitiriam o desenvolvimento de drogas inibidoras dos processos de reconhecimento, de adesão ou de invasão, de ambos os lados, e assim causar amorte do Trypanosoma.
Cada vez mais perto -O laboratório de Bioquímica de Parasitas, co-dirigido por Colli e pela bióloga Maria Júlia Manso Alves, descobriu uma nova família de moléculas chamadas GIPLs ou glicoinositolfosfolipídeos. Existem na membrana do parasita em grandes quantidades e são similares às chamadas âncoras, que inserem proteínas nas membranas celulares. Conhecendo a composição da membrana do parasita, pode ficar mais fácil entender as reações químicas que ocorrem quando uma célula, o protozoário, encontra outra, do corpo humano.
Júlia conta que está muito perto de desvendar os mecanismos de adesão e de penetração utilizados pelo parasita, como resultado do projeto Trypanosoma cruzi: Interação Parasita-Hospedeiro, que contou com R$ 480 mil, concedidos pela FAPESP ao laboratório dos dois pesquisadores nos últimos quatro anos. Não é a primeira vez que esse laboratório da USP contribui no combate à doença de Chagas.
Nos anos 80, Júlia descobriu uma família de glicoproteínas que denominou Tc-85, também associada à entrada do parasita na célula. Recente-
mente, identificou, em um dos membros da família da Tc-85, um trecho específico que poderia ser bloqueado para inibir a adesão celular. Em outros termos, Júlia sabe agora que existe um receptor na célula hospedeira quereconhece uma molécula do T. cruzi e deixa que o parasita se instale no organismo. Ela espera em um ano finalizar o trabalho a que se dedica, o mapeamento fino da Tc-85.
Vacina de DNA - Aos poucos, as peças do intrincado quebra-cabeÇ,a da doença de Chagas vão se encaixando. Na Unifesp, o grupo da bioquímica Nobuko Yoshida conseguiu avançar
na identificação e caracterização d.e moléculas envolvidas na sinalização celular na relação parasita-hospedeiro. Uma delas, presente em formas específicas do T. cruzi encontradas no barbeiro, é a gp82, uma glicoproteína (proteína que contém açúcar) que parece participar do processo de entrada do parasita na célula.
Esse é um dos resultados do projeto Aspectos da Imunobiologia do Trypanosoma cruzi: Interação com Células do Hospedeiro Mamífero e Indução da Resposta Imune, que começou no ano passado e segue até 2003, com um financiamento de R$ 350 mil, mais US$ 300 mil, da FAPESP.
O grupo de Nobuko conseguiu também demonstrar que a imunização com DNA é capaz de conferir resistência contra o T. cruzi e levar à
destruição do parasita. Além da produção de anticorpos específicos, essa imunização estimula as células do sistema imune a produzir interferongama, uma substância que desempenha um papel importante no controle da infecção. A equipe espera que esses estudos ajudem a viabilizar uma vacina que melhore o prognóstico da doença e evite que os doentes desenvolvam sua forma mais grave.
Mas o desenvolvimento de vacinas e de medicamentos não depende apenas dos achados científicos. Esbarra também, segundo os pesquisadores, no desinteresse da indústria farmacêutica em produzir e comer
cializar medicamentos que seriam dirigidos basicamente para populações muito pobres, de países subdesenvolvidos. O raciocínio predominante é que, em relação a outras doenças, como a malária e a dengue, a doença de Chagas não justifica altos investimentos com a produção de novos quimioterápicos.
Municípios infestados -Resta, portanto, o caminho mais prático: o
controle permanente dos barbeiros, considerado "a melhor vacina': "A experiência acumulada desde a década de 1950 demonstra que a transmissão da doença de Chagas pode ser interrompida por meio do uso adequado de inseticidas, aliado à melhora habitacional e à educação", observa Liléia Diotaiuti, diretora do Laboratório de Triatomíneos e Epidemiologia da Doença de Chagas, do Instituto René Rachou, de Belo Horizonte (MG).
Mesmo assim, o controle do barbeiro não pode ter data para acabar, alerta a pesquisadora. Segundo ela, esse trabalho deve considerar duas situações epidemiológicas distintas. A primeira envolve espécies nativas de barbeiros, originárias de ambientes silvestres - caatinga, mata úmida e cerrado, por exemplo-, que apresen-
PESQUI SA FAPESP • MAIO DE 1000 • 33
CIÊNCIA
DOENÇA DE CHAGAS
Portas ainda abertas ao barbeiro
Espécies silvestres não são combatidas, mas transmitem o parasita
H á razões de sobra para se inquietar em relação à doença
de Chagas, um mal ainda incurável, típico dos países subdesenvolvidos, que atinge de 4 a 5 milhões de pessoas no Brasil e de 16 a 18 milhões em toda a América Latina. Já se avançou bastante, é verdade. Campanhas realizadas desde os anos 80 pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) reduziram em 90% a propagação da doença no Brasil, por meio do controle das populações de barbeiros, os insetos transmissores do protozoário causador da doença de Chagas, o Trypanosoma cruzi. Agora está prevista para 2001 a erradicação total dos barbeiros domiciliados.
Não é o bastante. Avessos à euforia que cresce à medida que se aproxima o aparente fim da transmissão da doença de Chagas em alguns países, como no Uruguai, Chile, Argentina e no Brasil, os cientistas reconhecem o sucesso da campanha, a forma mais rápida e mais barata de controle epidemiológico. Mas alertam: o abandono progressivo do combate ao barbeiro deixa a porta aberta para a doença voltar e o inseto novamente infestar as casas. Outra razão para preocupação é que espécies silvestres do barbeiro, capazes de transmitir o parasita- e que não foram eliminadas pelos agentes da Funasa -, estão chegando mais próximas das casas.
Em fevereiro deste ano, num congresso na London School of Hygiene and Tropical Medicine, em Londres, os biólogos Bianca Zingales, do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), e Marcelo Briones,
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da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp ), comunicaram que de fato são duas, e não apenas uma, as linhagens de Trypanosoma cruzi que causam a doença. Uma linhagem - a mais agressiva- está associada a humanos, e a outra, a animais silvestres (ver box). Por um lado, essa conclusão agrava a situação, ao indicar que há um inimigo que até agora tinha se
ocultado à sombra de outro. Por outro, responde a uma pergunta que sempre havia intrigado os cientistas: como uma única espécie, o T cruzi, poderia provocar manifestações tão diferentes da doença?
Descrita em 1909 pelo médico sanitarista mineiro Carlos Ribeiro Justiniano Chagas (1879-1934), que nomeou o parasita em homenagem ao médico paulista Oswaldo Cruz (1872-1917), a doença de Chagas apresenta uma fase aguda, com febre alta, aumento do baço e até alterações cardíacas. Depois, dá uma trégua- de até 30 anos. Entre 60% e 70% dos infectados não apre-
sentam sintomas. De 20% a 30% dos doentes desenvolvem a forma cardíaca, com risco de morte súbita; de 8% a 10% sofrem dilatação do esôfago ou intestino; e 3% apresentam complicações no sistema nervoso. A única droga atualmente disponível, o benzonidazol, é extremamente tóxica e resolve somente as complicações na fase aguda da doença.
Para fechar o cerco do combate ao T cruzi não basta, portanto, eliminar o barbeiro. É preciso conhecer melhor o parasita e seus mecanismos de interação com o organismo e, ainda, insistir no desenvolvimento de novas drogas. Não é fácil. Os próprios pesquisadores reconhecem que o T cruzi é "um inimigo perigoso e inteligente': que consegue invadir as células do hospedeiro sem enfrentar resistência. Pior: é acolhido e protegido no interior da célula, onde se multiplica.
Para penetrar nos tecidos do organismo humano, o parasita precisa reconhecer a superfície da célula e, ao
Bianca: linhagens explicam os sintomas diferentes
Briones: comparações entre Colli: estudo do intrigante Júlia: descobrindo como o parasita entra na célula os ancestrais do tripanossoma comportamento do T. cruzi
tam grande capacidade de adaptação ao ambiente construído pelo homem. Essas espécies, que já vivem em torno das casas, estão sempre tentando a colonização de novos espaços.
Desse modo, podem instalar novos focos de transmissão.
A segunda situação diz respeito às áreas infestadas pelo Triatoma infestans, uma das espécies de barbeiro
adaptadas às casas. O T. infestans originou-se provavelmente na região andina de Cochabamba, na Bolívia, de onde se dispersou para o Peru, Chile, Paraguai, Argentina, Uruguai e
Genes revelam nova linhagem
Bianca Zingales e Marcelo Briones trabalharam intensamente, durante a década de 90, pesquisando as diferenças biológicas, bioquímicas e filogenéticas (relativas à história evolutiva das espécies) entre as cepas ou linhagens de Trypanosoma cruzi. Por fim, concluíram que a doença de Chagas poderia mesmo ter origens diferentes. Já havia uma suspeita da existência de grupos diferentes de T. cruzi, mas foram eles que verificaram o que outros pesquisadores haviam tentado antes.
Nos anos 80, o professor inglês Michael Miles, da London School of Hygiene and Tropical Medicine, deu-lhes uma pista, ao analisar poucas cepas de T. cruzi e sugerir que poderiam ser divididas em dois grupos. Em 1993, coube a um estudante de doutoramento, Ricardo Peres do Souto, então com 26 anos, pós-graduando do Instituto de Química da USP, orientado de Bianca, mudar a direção dos fatos. Ao analisar 16 cepas por meio de PCR (reação em cadeia de polimerase), Souto obtinha ape-
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nas dois padrões de amplificação de uma região do gene do RNA ribossômico, um material considerado fidedigno para estudos filogenéticos.
"O seqüenciamento desses genes permite estabelecer a história das espécies': ensina Bianca. Era o passo que faltava. Ricardo Souto confirmava, assim, a hipótese de Miles, o primeiro a sugerir a presença dos dois grupos. Em 1996, estudos realizados com a Fiocruz e a Universidade da Califórnia, de Los Angeles, estabeleceram definitivamente a presença das duas linhagens ftlogenéticas, por meio da análise de uma amostra maior, de 90 cepas, isoladas de barbeiros, humanos e animais silvestres, originárias de cinco países da América do Sul.
Esses resultados provêm de dois projetas, o Genoma de Trypanosoma cruzi: Cariótipo Molecular, Mapeamento de Genes e Disrupção Gênica e Linhagens Filogenéticas de Trypanosoma cruzi: Caracterização Epidemiológica, Evolutiva e Bioquímica, que contaram, respectivamente, com financiamentos de R$ 26,8 mil
e R$ 58 mil, da FAPESP. Desde março de 1998, Bianca e Briones- com a ajuda de dois especialistas da Fundaç?.o Oswaldo Cruz (Fiocruz), José Rodrigues Coura e Octavio Fernandes - analisaram desta vez cerca de 300 cepas provenientes de 12 Estados brasileiros.
O que se observou é que uma linhagem está associada a humanos, e a outra, a animais silvestres. Cada uma delas está associada, respectivamente, aos dois ciclos da doença, um doméstico e outro silvestre. A ligação entre os dois se dá quando barbeiros silvestres se domiciliam e trazem o parasita para dentro das casas.
"Nos pacientes de zonas endêmicas havia uma elevada predominância de uma linhagem, a T. cruzi 2, com uma alta incidência de doença cardíaca", relata Bianca. "Por outro lado, pacientes da Amazônia, que não é uma região endêmica, tinham T. cruzi de uma linhagem mais branda, a T. cruzi 1." A análise de cepas de países como Colômbia, Venezuela, Bolívia e México confirmou a
Brasil. Fora de seu ambiente natural, vive exclusivamente em casas e mantém uma relação muito próxima com o homem e os animais domésticos.
Sua equipe acompanha também a ocorrência de outras espécies de barbeiro pelo país. "Sabemos hoje que existe transmissão humana da doença de Chagas no sertão do Ceará, por meio do Triatoma brasiliensis': diz Liléia. "Verificamos também a infestação pelo Triatoma pseudomaculata na periferia da cidade de Sobral, a segunda maior cidade do Ceará."
Os especialistas recomendam: o controle do transmissor deve ser feito inclusive em áreas onde há casos recentes, como na Amazônia. Aos 70 anos, 42 dos quais dedicados à
associação das duas linhagens.
O quadro se tornou ainda mais claro no ano
epidemiologia da doença de Chagas, o médico José Rodrigues Coura, diretor do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), do Rio de Janeiro, conta que na região Norte, em conseqüência do desmatamento, barbeiros do tipo silvestre estão migrando para as casas e colocam em risco a saúde de seus moradores.
Para dimensionar o risco de adaptação dos barbeiros ao domicílio, Coura construiu casinhas de madeira cobertas de palha no Médio e Alto Rio Negro. Deixava as casas desabitadas,
voltava um tempo depois e encontrava barbeiros silvestres. Seu trabalho mostrou que o foco potencial é a comunidade de piaçaveiros, fabricantes de cordas com fibras vegetais, já atacados pelo barbeiro silvestre. E, lembre-se, apenas um inseto pode criar uma colônia numa casa, já que cada fêmea pode pôr em torno de 400 ovos ao longo da vida.
Coura não se tranqüiliza. "Se não forem erradicados os focos remanescentes, nos Estados da Bahia, Tocantins, Minas Gerais, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Sul, onde ain
da existem mais de 100 municípios infestados pelo barbeiro, a doença pode voltar, como aconteceu com a dengue e com a malária': diz. Em outras palavras, pode-se perder o que já se fez nas áreas controladas. •
passado, por meio de um Os transmissores: estudo na Mata Atlântica associa os tatus e os ...
tral comum entre 88 milhões e 40 milhões de anos atrás. Segundo ele, um ancestral de T cruzi teria se espalhado amplamente há 250 milhões de anos, quando todos os continentes estavam ligados.
estudo realizado na Mata Atlântica: todas as 26 amostras de T cruzi coletadas de tatus e micos-leões-dourados infectados eram de uma mesma linhagem, a mesma encontrada em cepas humanas, enquanto 85% dos gambás estavam infectados com a linhagem relacionada ao ciclo silvestre. Já os barbeiros, com cepas de T cruzi das duas linhagens. ... micos-leões-dourados à linhgem de T. cruzi que infecta as pessoas
Quando as Américas se separaram, entre 170 e 100 milhões de anos atrás, as duas linhagens de T cruzi também se distanciaram: uma, a T cruzi 1, permaneceu na América do Sul, infectando predominantemente marsupiais, e outra, na América do Norte, O resultado era claro:
havia uma associação preferencial da linhagem T cruzi 1 com uma determinada classe de mamíferos, os gambás (marsupiais muito primitivos), enquanto a outra, a T cruzi 2, estava associada com primatas, mamíferos placentários- e ambas estavam presentes no ciclo silvestre. Mais: as duas linhagens apresentavam características epidemiológicas
diferentes. Uma associada à doença e muito mais virulenta. A outra, causando a forma indeterminada da doença.
Foi ainda mais fascinante o que veio depois. Marcelo Briones, após seqüenciar genes de RNA ribossômico de tripanossomas, teceu a história evolutiva das duas espécies e concluiu: ambas tiveram um ances-
convivendo com os mamíferos placentários. Entre cinco e dois milhões de anos, as duas Américas voltaram a ficar unidas, pelo istmo do Panamá. Resultado: ocorreu uma monumental movimentação de animais de um lugar para o outro. Com a invasão de animais placentários vindos do norte, chega a linhagem T cruzi 2 do parasita, e ambas se misturam.
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 2000 • 35
CIÊNCIA
Tartaruga-de-pente: em risco, no litoral de Pernambuco
cerca de 300 mil anos após o Big Bang, quando era cerca de mil vezes menor e mais quente que hoje. É o resultado de dez dias de observações realizadas pelo telescópio do projeto Boomerang (Balloon Observations of Millimetric Extragalactic Radiation and Geophysics), entre o final de 1998 e o início de 1999, em um balão ao redor da Antártida. O telescópio do Boomerang registrou pela primeira vez, em alta resolução, a chamada radiação cósmica de microondas, comprovada em 1991 pelo satélite Cobe, dos Estados Unidos. As imagens revelam centenas de regiões com variações mínimas, da ordem de 100 milionésimos de grau Celsius, na temperatura de microondas. Os padrões complexos dessa organização confirmam as previsões de que as ondas de som podem viajar desde os primórclios do universo e criar estruturas que evoluíram até se tornarem aglomerados de galáxias ou superaglomerados. Os resultados, publicados na Nature de 27 de abril, coroam o trabalho de 36 equipes de 16 universidades do Canadá, Itália, Reino Unido e Estados Unidos. •
Os homens e as tartarugas
Um estudo da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) estima que cerca de 50 tartarugas marinhas acabem morrendo, todo ano, em conseqüência da ação dos pescadores e dos próprios pesquisadores. Já na lista de animais em risco de extinção, esses répteis podem ser presos em redes de arrasto e trazidos para a terra, junto com os peixes e outros animais. Por essa razão, os especialistas do Grupo de Estudos de Sirênios, Cetáceos e Quelônios ( GESCQ) da UFPE procuram convencer os pescadores para que deixem de usar essas redes. Já há um avanço: os pescadores tornam-se importantes auxiliares na descrição dos hábitos de cada espécie. No litoral de Pernambuco a equipe encontrou até mesmo tartarugas gigantes (Dermochely cariaceia), além da tartarugaverde ( Chelonia mydas), a cabeçuda (Careta careta) e atartaruga-de-pente (Eretmochely imbricata). O grupo de estudos, que há dois anos acompanha o ciclo reprodutivo das tartarugas, verificou também
que a ação humana, mesmo quando bem-intencionada, pode prejudicar o desenvolvimento das tartarugas: ao reorganizar os ninhos, para melhorar as condições de sobrevivência dos embriões, os pesquisadores notaram que a própria manipulação reduz a eclosão dos ovos. •
Flagrantes da infância do universo
Pode parecer efusivamente alegórica, mas a imagem abaixo deixou exultantes os cosmólogos do mundo inteiro. Ela indica, em detalhes, as estruturas que formavam o universo há 14 bilhões de anos,
Imagem do Boomerang: o universo como há 14 bilhões de anos
Novo medicamento a partir do boldo
Um tipo de boldo comum no Brasil, da espécie Vernonia condensata e conhecido como alumã, é a mais nova esperança para a criação de um novo analgésico e antiinflamatório . Uma pesquisa feita na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) comprovou em testes em tubos de ensaio e com animais de laboratório as propriedades medicinais da planta. O estudo mostrou que o uso da planta, além de não ter apresentado qualquer efeito tóxico, não afeta a mucosa do estômago e inibe a formação de úlceras, um dos efeitos colaterais mais comuns dos analgésicos. •
A recontagem dos genes
Quantos genes, afinal, tem o ser humano? Nos últimos anos, o cálculos indicavam que poderia ter entre 64 mil e 120 mil. Mas, de acordo com estudos divulgados em maio na revista Nature Genetics, o total pode variar agora de 30 mil a 34 mil genes. Ainda não é conclusivo. Outra pesquisa, na mesma publicação, sugeriu que o DNA humano teria mesmo ao redor de 120 mil genes. As diferenças se devem, provavelmente, à técnica empregada, com base nos fragmentos de DNA chamados ESTs (etiquetas de seqüências expressas). Pensava-se que houvesse uma relação direta entre o número de ESTs e o de genes. Pode não ser assim, pois se acumulam as evidências de que um único gene pode ongmar mais de uma EST. •
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 2000 31
CIÊNCIA
ÉTICA
Salvar, uma decisão dramática Público e futuros administradores aceitam a seleção de pacientes
Dois homens, feridos nwn desastre de automóvel, chegam a wn
pronto-socorro de um hospital público, na periferia de São Paulo. Um tem 25 anos. O outro, 65 anos. Só há uma vaga para internação. Qual deles deve ser atendido? A pergunta foi feita a dois grupos. Um representava o público em geral. O segundo, estudantes de administração hospitalar. Os resultados foram bem diferentes.
O público em geral optou pelo homem de 65 anos. O mais velho, determinaram essas pessoas, teria mais necessidade do tratamento que uma pessoa mais nova. Os estudantes deram prioridade ao homem de 25 anos. Seu argumento foi o de que as despesas feitas pelo hospital, nesse caso, teriam um benefício bem maior. Esse tipo de reação ganhou força com o tempo de aprendizado dos alunos. Entre os estudantes do primeiro ano, a proporção a favor do homem de 25 anos foi de 51,5%. Entre os estudantes do quarto e último ano, chegou a 92%.
"Um dos fatos mais relevantes desse trabalho é a opção dos estudantes de administração hospitalar pela alternativa que dê menos gastos ao hospital", diz Paulo Antônio de Carvalho Fortes, professor de Ética da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador da pesquisa. "Mas uma das conclusões mais importantes é o próprio fato de os usuários do sistema público de saúde aceitarem que é preciso haver critérios para definir quem terá prioridade no atendimento", acrescentou.
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A pesquisa, chamada O Dilema de Decidir Quem Deve Viver, realizada com o apoio da FAPESP, colheu os depoimentos, numa de suas etapas, de 400 pessoas, homens e mulheres, que acompanharam parturientes atendidas no Hospital Público de Diadema, um dos municípios mais pobres da área metropolitana de São Paulo. A área foi escolhida porque a pesquisa queria ouvir pessoas carentes e sem outra opção de atendimento a não ser uma unidade do serviço público de saúde.
Em outra etapa, foram ouvidos 64 alunos do primeiro ano e 25 do quarto e último ano de um curso de graduação em administração hospitalar de São Paulo. A instituição na qual se realiza o curso pediu sigilo em torno do seu nome, em troca da autoriza-
ção para a realização da pesquisa entre seus alunos. Nos dois casos, foram apresentadas 15 opções, nas quais os entrevistados deveriam escolher entre um e outro caso como tendo preferência para o atendimento (ver tabela) .
É a primeira vez que se realiza uma pesquisa desse tipo no Brasil. "Há pesquisas semelhantes na Austrália, na Inglaterra e nos Estados Unidos, mas envolvendo apenas situações de terapia intensiva, transplantes e novas tecnologias': informa. "Em países como a França ou a Inglaterra, essa pesquisa nem poderia ser realizada, pois para um cidadão desses países é inconcebível que não haja vaga para um tratamento e tenha que ser feita uma escolha': diz. "Na França, nos últimos anos, houve apenas um caso de não-atendimento, considera-
do como om1ssao de socorro a um paciente e o responsável está preso:'
No Brasil, afirma o professor, as carências do sistema público de saúde são tão grandes que a população se conformou com a existência de desigualdades no acesso ao tratamento médico. Um sinal disso é a proporção relativamente pequena, de 5%, de pessoas que se recusaram a responder na íntegra ao questionário. Nas pesquisas inglesas e australianas, as recusas variaram entre 30% e 40%. "O baixo índice de recusa é mais um indicador de que nossa sociedade admite a necessidade de haver critérios sociais para escolhas deste tipo", declara Fortes.
Uma característica das respostas do público em geral foi a preferência constante pelas pessoas socialmente mais carentes. A preferência pelo idoso de 65 anos com relação ao adulto de 25 anos é um exemplo disso, de acordo com Fortes. Outro exemplo foi o fato de o público em geral ter optado pelo socorro a uma criança de 1 ano, em confronto com
uma criança de 7 anos. Mais uma vez, os estudantes de administração hospitalar tiveram reação contrária. Os estudantes de primeiro ano preferiram a criança de 7 anos na proporção de 60%. No quarto ano, o índice pulou para 71%.
Outra diferença surgiu no caso de duas pessoas, uma fumante e outra não-fumante, atendidas com uma crise de bronquite. Cerca da metade das pessoas entrevistadas entre o público em geral optou pelo atendimento ao fumante, provavelmente entendendo que fumar não deve ser considerado como fato r de discriminação negativa. Entre os estudantes, 84% dos alunos do último ano fizeram a opção pelo não-fumante. Os alcoólatras, porém, tiveram condenação geral. Para o público, pessoas com esse vício "procuram a doença". Já um caso envolvendo uma mulher com HIV positivo, doente de pneumonia, provocou compaixão entre os entrevistados do público em geral. Ela foi considerada vítima de uma situação.
Opções claras - Outras preferências que ficaram muito claras foram as do atendimento a uma mulher casada, com relação a uma mulher solteira; a uma mãe de três filhos, com relação à mãe de um filho; a uma mulher com relação a um homem; a uma mulher com hepatite, com relação a uma alcoólatra. No caso das entrevistas com estudantes, um dos objetivos foi o de avaliar até que ponto os alunos do último ano absorveram os valores passados pelo curso. Em alguns casos, houve mesmo inversão de valores entre os dois grupos. Por exemplo, no primeiro ano, a preferência de atendimento, com 75%, foi para um homem empregado que sofrera uma crise cardíaca. No último ano, a preferência passou a ser para um homem desempregado, com 64%.
De acordo com Fortes, os médicos costumam dizer que, quando colocados diante de uma decisão desse tipo, se guiam por critérios exclusivamente técnicos. Mas é inegável que critérios sociais e médico-sociais também são levados em conta. Por isso, ele pre-
Dilemas apresentados a usuários do Hospital Público de Diadema e a alunos de curso de administração hospitalar em São Paulo
OPÇÃO I OPÇÃO 2 CAUSA CRITÉRIO ESCOLHAS DOS ALUNOS DO ATENDIMENTO ENVOLVIDO I0 ANO 4° ANO
Criança de I ano Criança de 7 anos Acidente de carro Idade I· 60% I -71%
Criança de 7 anos Homem de 65 anos Acidente de carro Idade I- 82,9% I- 100%
Homem de 25 anos Homem de 65 anos Acidente de carro Idade 1-51,5% I- 92%
Mulher Homem Acidente de carro Sexo I- 76,5% I -72%
Mulher com 3 Mulher com I Broncopneumonia Responsabilidade social I- 96,8% I- 92% filhos menores filho menor
Mulher casada Mulher solteira Broncopneumonia Responsabilidade social I- 70% I- 64%
Homem empregado Homem desempregado Crise cardíaca Condição econômica I- 75% 2-64%
Mulher com renda familiar Mulher com renda familiar Crise de diabetes Condição econômica I- 82,8% I- 56% de R$ 500,00 de R$ 3.000,00
Professor de colégio Trabalhador na construção Crise cardíaca Mérito social I- 50% I -72% estadual de 40 anos civil de 40 anos
Trabalhador na construção Padre católico Enfarte do miocárdio Mérito social I- 92% I- 100% civil com 2 filhos menores
Operário metalúrgico Pastor evangélico Enfarte do miocárdio Mérito social I -76% I- 68% sem filhos
Homem fumante Homem não-fumante Crise de bronquite Estilo de vida I- 59,4% 2-84%
Mulher de 25 anos Mulher de 25 anos Pneumonia Estilo de vida I- 54,6% 2-84% e HIV positivo e diabética
Mulher de 40 anos com hepatite Mulher de 40 anos e alcoólatra Problemas hepáticos Estilo de vida I- 92,2% I- 64%
Homem de outra cidade Homem residente na cidade Acidente de carro Vínculo da clientela I- 53,1% 2-72%
Fonte: Paulo Antonio Fortes, Fac. Saúde Pública - USP
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tende realizar o mesmo levantamento também com médicos e outros profissionais da saúde. "Só assim será possível tirar conclusões sobre as motivações dos médicos ao tomar decisões que vão além de critérios técnicos", afirma.
Fortes diz que é contra a idéia de que devam existir critérios que não sejam técnicos para definir prioridades no atendimento. Mas admite que diante das dificuldades para o atendimento universal, no sistema de saúde brasileiro, isso se transforma numa utopia. Então, afirma, se for necessária a existência também de critérios sociais ou médico-sociais, "eles precisam ser fruto de um debate e do consenso na sociedade".
Duas linhas - Para o professor, há duas linhas bem nítidas de critérios para as opções na cul
Fortes: "critérios devem ser consenso na sociedade" tura brasileira. Uma é a que chama de ética utilitarista, que procura tomar decisões com base no custo-benefício. A outra tende a privilegiar os menos favorecidos. "O balizamento nessa situação de diversidade ética deve ser dado pela garantia de respeito à dignidade humana", declara. "Para isso, deve ser obedecida a regra de que cada indivíduo deve ser tratado como um fim em si mesmo, não somente como um meio para a satisfação de interesses de terceiros, da ciência, de cientistas ou de interesses industriais e comerciais."
Os critérios técnicos alegados pelos médicos, em geral, se fundamentam no que é apresentado como uma objetividade científica. Entre eles estão a eficácia clínica; a possibilidade de ações preventivas; a vulnerabilidade da doença à tecnologia existente; o tempo necessário para o tratamento; a gravidade da doença; e a situação de emergência.
Os critérios não-técnicos, por sua vez, nem sempre são apresentados com tanta clareza. "São utilizados critérios médico-sociais, como cooperação, idade, sexo, progresso
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da ciência, qualidade do benefício, custo-eficácia, custo-benefício, força de trabalho potencialmente afetada e recuperada, potencial de vida, qualidade ajustada de anos de vida e ambiente de suporte para a continuidade do tratamento", diz Fortes. A eles se unem critérios sociais, ce>mo condições familiares, utilidade social, barreiras para o acesso à continuidade do tratamento, mérito social, responsabilidade social, nível de renda e produtividade.
Posições diferentes- Não se pode dizer que os médicos adotem uma posição ou outra com relação a dilemas éticos capazes de ultrapassar questões técnicas. Isso depende da postura geral do hospital em que trabalha e da própria posição individual. Fortes cita, como exemplo, o Instituto da Criança, quando lá trabalhava, em meados dos anos 80. Mesmo se recebesse um paciente enviado por engano por outro hospital ou de outro município, a criança era sempre considerada responsabilidade do
~ hospital. "Ela só saía, se fosse o ~ caso, com um encaminhamen~ to negociado e pactuado com
outro hospital", afirma. Outro ponto sublinhado
por Fortes é o fato de o Brasil, em termos internacionais, não estar tão ruim assim quanto à disponibilidade de leitos hospitalares. A proporção recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é de quatro leitos por 1.000 habitantes. O Brasil tem 3,2. Logicamente, estamos muito longe de países como a França, com 9,2 leitos por 1.000 habitantes, e Alemanha, com 8,3. Mas o principal problema brasileiro, segundo o professor, é a existência de enormes disparidades
o • o • •
regwna1s e miCrorregwnais. Fortes chama a atenção
para tentativas de introdução no Brasil de um procedimento introduzido nos Estados Unidos, o managed care (cuidados administrados), no qual o mé
dico é obrigado a se submeter a normas de controle administrativo que acabam por limitar sua autonomia no que se refere às decisões sobre as necessidades no tratamento de uma pessoa. Fortes destaca que o Conselho Regional de Medicina de São Paulo vem reagindo contra essas tentativas. "O sistema está avançando muito nos Estados Unidos, mas enfrenta resistências em muitos setores e o Congresso an1ericano pretende instituir regras a respeito': declara. •
PERFIL:
• PAULO ANTONIO DE CARVALHO
FoRTES, tem 49 anos e leciona no Departamento de Prática de Saúde Pública na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). É mestre em Pediatria e doutor em Saúde Pública. Faz parte do Conselho Nacional de Ética na Pesquisa (Conep). Projeto: O Dilema de Decidir Quem Deve Viver Investimento: R$ 5.700,00
CIÊNCIA
SAÚDE PÚBLICA
Guerra à osteoporose Estudo alerta sobre os riscos do baixo consumo de cálcio
A té o final deste ano, num universo de 16 milhões de mulhe
res brasileiras com mais de 55 anos de idade, 4,5 milhões poderão desenvolver a osteoporose, uma doença mais comum em idosos, caracterizada pela diminuição de 20% a 25% da densidade óssea, expondo os ossos a um risco maior de fraturas. Preocupada em encontrar meios de reduzir esse problema, uma equipe do Núcleo de Investigação em Nutrição do Instituto
da FAPESP -, a nutricionista Doris Lucia Martini Lei pretendia levantar dados para fortalecer os programas preventivos. O ponto de partida é que a prevenção da doença deve ser feita ainda na infância e adolescência, quando convém consumir mais cálcio. O trabalho contou também com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
tionário preliminar sobre alimentação, atividade física e conhecimento sobre prevenção da doença. Desses, 242 responderam a perguntas específicas, que indicaram o consumo de cálcio.
O resultado indicou que predomina a desinformação acerca do combate à osteoporose. Na maior parte dos casos, a atividade física é orientada por razões estéticas, não pela preocupação com a saúde. E mais: é praticamente o mesmo nas três escolas o nível de desinformação dos adolescentes a respeito da importância do cálcio na nutrição durante o crescimento. "Os pais dos alunos das esco
las particulares possuem uma maior escolaridade, mas essa
i? característica não implica uma ~ alimentação mais adequada", § comenta Doris. Face aos dados ~ apurados, a equipe do Institu-
to de Saúde preparou folhetos com explicações sobre a importância do cálcio e as medidas de prevenção da osteoporose.
de Saúde do Estado de São Paulo, da Secretaria de Estado
Osso normal (à esquerda) e descalcificado: dieta adequada na adolescência pode prevenir problemas na velhice
A pesquisadora conta que há também fatores inevitáveis que ampliam o risco de perda
da Saúde de São Paulo, fez uma pesquisa com 442 jovens de 14 a 19 anos, quando o consumo de cálcio torna-se ainda mais premente, por causa da formação da massa óssea.
As conclusões são preocupantes: apenas uma pequena parcela do grupo estudado (cerca de 10%) tem uma alimentação adequada em relação ao consumo de cálcio. A ingestão média desse mineral é de apenas dois terços do recomendado para que se possa prevenir a osteoporose. Na adolescência, o mínimo sugerido é de 1.300 miligramas de cálcio por dia, o equivalente, entre outras possibilidades, a dois copos grandes de leite (um pela manhã e um à noite), duas fatias de queijo e um iogurte ou uma taça de pudim de leite. Também é importante tomar sol, para o organismo produzir vitamina D, que ajuda na absorção de cálcio dos alimentos.
Por meio dessa pesquisa- O Papel do Cálcio na Prevenção da Osteoporose, com um financiamento de R$ 9,2 mil
Doris entregou questionários a 860 alunos de três escolas do ensino médio da cidade de São Paulo, duas particulares e uma pública. Como a participação era voluntária, 442 alunbs (52% do total) responderam ao ques-
Doris: mais leite, queijo, sol e exercícios físicos
de massa óssea, como a raça (brancos e amarelos são mais suscetíveis), a constituição física (quanto maior a densidade óssea, mais improvável será o desenvolvimento da osteoporose) e o sexo (as mulheres, após a menopausa, ficam mais expostas ao problema), além de heranças genéticas. Por outro lado, a ingestão adequada de cálcio e o abandono da vida seden-tária são fatores controláveis. •
PERFIL:
• DORIS LUCIA MARTIN! LEI, 48 anos, graduada em Nutrição, com mestrado e doutorado pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) . É pesquisadora do Núcleo de Investigação em Nutrição do Instituto de Saúde, da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Projeto: O Papel do Cálcio na Prevenção da Osteoporose Investimento: R$ 9.210,00
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 1000 • 39
CIÊNCIA
GENOMA
Cerco progressivo ao amarelinho Tabaco, proteínas e cola são fontes de estudo sobre a Xylella
Os pesquisadores do Projeto Genoma Funcional estão
anunciando três novas contribuições científicas para a elucidação dos mecanismos de patogenicidade da bactéria Xylella fastidiosa, agente causador da Clorose Variegada dos Citros (CVC), o popular amarelinho. Depois de concluído o seqüenciamento dos genes desse microrganismo, 21 grupos de cientistas estão debruçados sobre o resultado do genoma Xylella para entender o funcionamento da bactéria e, posteriormente, elaborar estratégias para livrar os laranjais brasileiros da praga da CVC.
A primeira novidade resolve um dos problemas do estudo da Xylella que é a falta de um modelo experimental de planta para estudos da doença. O professor Sílvio Lopes, do Laboratório de Biologia Molecular da Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp ), concluiu um estudo junto com sua equipe indicando uma variedade de tabaco (Nicotiana tabaccum) que poderá ser usada como modelo experimental. Quando inoculado artificialmente com a bactéria Xylella, o tabaco permite uma rápida colonização, pelo patógeno, de seu sistema vascular e expressa os sintomas nas folhas em pouco tempo.
Outro estudo é um banco de dados com as proteínas sintetizadas pela Xylella, disponibilizado pelo Laboratório de Química de Proteínas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp ). Segundo o pesquisador Marcus Bustamante Smolka, um mapa com 816 proteínas da bactéria recebe os últimos preparativos para estar disponível em breve na Internet, servindo ou-
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tras instituições que trabalham no Programa Genoma Funcional.
O terceiro estudo identificou uma goma produzida pela bactéria que permite a ela se fixar no xilema (sistema vascular da planta) e no aparelho sugador dos insetos que transmitem a doença. "A Xylella vive em locais muito turbulentos e a cola assegura a sobrevivência dela", explica Felipe Rodrigues da Silva, pesquisador do Centro de Biolo-
gia Molecular e Engenharia Genética da Unicamp. "Detectamos que a bactéria faz esse tipo de cola e conseguimos induzi-la a produzir tal substância em laboratório. Agora, estamos analisando a bioquímica dessa cola- chamada de fastidiana- que é um polissacarídeo, um tipo de açúcar:' No futuro, o estudo dessa cola e das proteínas da Xylella poderá contribuir para a elaboração de um bactericida ou de uma outra estratégia para eliminar o amarelinho.
Laranjeira não dá - Todas as novas descobertas estão disponíveis para o
trabalho dos outros laboratórios, numa integração que tem sido uma característica do Programa Genoma da FAPESP. No tabaco, por exemplo, será possível testar a função dos diversos genes que, aparentemente, estão envolvidos na capacidade de a Xylella colonizar e causar doença em laranjeiras. O estudo, que identificou essa planta como modelo experimental, foi recentemente aceito para publicação
pela revista Plant Disease, da Sociedade Americana de Fitopatologia.
As laranjeiras demoram muito tempo para manifestar os sintomas e nem todas se infectam quando inoculadas artificialmente com o patógeno. "Às vezes, inoculamos dez plantas e apenas três ou cinco apresentam sintomas depois de três meses a um ano, inviabilizando seu emprego nas pesquisas", afirma Lopes. "Com as plantas de tabaco, que foram inoculadas, aconteceu o contrário. Todas expressaram sintomas nas folhas em no máximo 60 dias após as inocula-
ções."Vale lembrar que o tabaco foi a única espécie vegetal que apresentou alta suscetibilidade à Xylella dentre as mais de 20 espécies pesquisadas:'
Outra novidade do Projeto Genoma Funcional é a reestruturação dos estudos em quatro subáreas. ''A divisão visa a acelerar o desenvolvimento do projeto e aumentar o intercâmbio entre os grupos", explica o professor Jesus Aparecido Ferro, da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Jaboticabal, um dos dois coordenadores do projeto, junto com Ana Cláudia Rasera, do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP).
A decisão de reestruturar o Genoma Funcional partiu de uma sugestão do comitê de assessores externos que analisou o andamento do programa e indicou uma nova organização para os estudos. O parecer foi acatado pela diretoria científica da FAPESP, que chamou todo o grupo para uma reunião no dia 27 de abril último, quando as novas estratégias foram anunciadas e discutidas. Assim, ficou definido que cada subárea terá um subcoordenador e dois assessores externos. Esses subcoordenadores mais os coordenado-
res do projeto vão se reunir mensalmente e analisar as metas dos trabalhos acertadas no mês anterior. Todos os participantes terão uma nova ferramenta para se comunicar. No site www.lbm.fcav.unesp.br os pesquisadores farão relatórios atualizados todos os meses com o curso das pesquisas. "Cada grupo dirá o que deu certo e o que não deu. As tentativas negativas são importantes para que não haja repetições de procedimentos e nem tempo gasto inutilmente", afirma o professor Ferro.
A dança dos grupos - As subáreas estão divididas em quatro grupos: crescimento, transformação, DNA-array
proteoma e fisiologia. O primeiro vai estabelecer método de crescimento da bactéria Xyllela em cultura a ser usado por todos os pesquisadores do projeto. Esse grupo é coordenado por Márcio Rodrigues Lambais, do Departamento de Ciência do Solo da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz (Esalq) da USP. O grupo de transformação desenvolve técnicas de manipulação genética para obter um sistema que faça a transferência e o desligamento dos genes da bactéria. A coordenação é de Suely Lopes Gomes, do Departamento de
Bioquímica do Instituto de Química da USP, e de Marilis do Valle, do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP.
No grupo de DNA-array proteoma estão sendo identificados quais genes são responsáveis pela infecção na planta e quais geram a doença. Nessa subárea também estão alojados os grupos que identificam e analisam todas as proteínas sintetizadas pela Xylella. A coordenação é de José Camillo Novello, do Departamento de Bioquímica da Unicamp, e de Regina Costa de Oliveira, do Núcleo Integrado de Biotecnologia da Universidade de Mogi das Cruzes. Na úl-
Ferro: reorganização acelera o projeto. Ao lado, xilema da folha de tabaco com a presença, no centro, da Xylel/a . Na página anterior, à esquerda, planta de tabaco normal e, à direita, infectada
tima subárea, a de fisiologia, estão reunidos grupos de estudo sobre a ecologia, fisiologia, bioquímica e epidemiologia da bactéria, sob a coordenação de Luis Eduardo Aranha Camargo, da Esalq-USP.
A reorganização dos estudos do Programa Genoma Funcional representa mais que uma estratégia na batalha para derrotar o amarelinho. É uma contribuição que gera conhecimento para esse novo modo operativo e coletivo de estudo, ainda inédito como programa de pesquisa da ciência brasileira. •
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 1000 • 41
TECNOLOGIA
PEQUENAS EMPRESAS
Aumentam recursos para inovação FAPESP amplia em 50% o limite de financiamento do PIPE
M uitas novidades marcaram a divulgação do sétimo edital
do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP, no mês de maio. A mais importante é o aumento de 50% nos valores-limite de financiamento, em comparação com os seis últimos editais. Agora, na primeira fase, a empresa pode receber até R$ 75 mil (antes, o valor era de R$ 50 mil), para a elaboração de pesquisa de viabilidade técnica do projeto. Na segunda fase, quando o projeto é efetivamente desenvolvido, o teta passa a ser de R$ 300 mil (contra R$ 200 mil anteriores), disponibilizados num período de dois anos.
Outra mudança refere-se à adoção da exigência de um Plano de Negócios que deverá ser elaborado pela empresa, mostrando os caminhos da viabilidade econômica do resultado da pesquisa. Será um relatório com o detalhamento do mercado a ser atingido pelo produto ou sistema e as possíveis formas de comercialização. Para elaborar esse documento, as empresas podem contar com a orientação do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Se-
42 • MAIO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
brae) de São Paulo, conforme acordo entre esse órgão e a FAPESP.
este ano, está programado o investimento total de R$ 1 O milhões para o PIPE. A partir do sétimo
edital também passa a valer a possibilidade de o responsável técnico, também chamado de coordenador da pesquisa, requerer uma bolsa da FAPESP, desde que ele não pertença ao quadro de funcionários da
Inovação Tecnológica
O aumento do teta dos investimentos é uma forma de ampliar a participação da fundação no ambiente empresarial. "Essa decisão visa a dar maior oportunidade aos pro-
empresa nem seJa um dos sócios.
O PIPE atende projetas de pesquisa- com conteúdo de inovação tecnológica- de empresas sediadas no Estado de São Paulo com, no máximo, 100 funcionários. O programa recebeu, até o sexto edital, 330 inscrições de empresas que se candidataram à aprovação de seus projetas. Dessas solicitações, até o início de maio, 11 O foram aprovadas para a primeira fase, sendo que 44 estavam na segunda fase.
Total de recursos- Dentre as empresas com projetas aprovados estão representantes de 29 cidades paulistas. A capital lidera com 31 projetas, vindo a seguir Campinas, com 22, São José dos Campos, 19, e São Carlos, 8. Somando os projetas da primeira e segunda fase, a FAPESP investiu, a fundo perdido, R$ 8,6 milhões e US$ 2,4 milhões desde o final de 1997. Para
jetas mais caros. Não queremos perder bons
projetas de tecnologia de ponta que, normalmente, são os que exigem valores maiores", afirma o professor Francisco Antônio Bezerra Coutinho, coordenador-adjunto da área de ciências exatas da FAPESP. O financiamento é utilizado pela empresa na compra de equipamentos, material de consumo e em serviços de terceiros, inclusive de consultarias.
"O aumento da verba reflete o sucesso do PIPE, que se tornou mais ambicioso e mais ousado. "Queremos atrair mais empresas com potencial de desenvolvimento tecnológico", afirma José Fernando Perez, diretor científico da fundação. "Estamos seguindo o que a maior agência de fomento dos Estados Unidos, a National Science Foundation (NSF), fez há um ano, aumentando em 100% o auxílio às pequenas empresas." Naquele país, um projeto apro-
vado na primeira fase recebe um valor de até US$ 100 mil e, na segunda, até US$ 400 mil. "Se a NSF fez isso é porque a inovação tecnológica nas pequenas empresas tem que ser, também aqui, estimulada", afirma Perez. "Queremos contribuir para favorecer a percepção da importância da incorporação do conhecimento tecnológico ao produto."
Uma das intenções do PIPE é, justamente, ampliar a fronteira de pesquisa para fora do meio acadêmico. A tendência mundial é concentrar a maior parte das investigações científicas e tecnológicas em ambiente empresarial. "Dessa forma, o subsídio
que fornecemos por meio do PIPE é totalmente aceitável, inclusive do ponto de vista da Organização Mundial do Comércio", analisa Perez. A OMC, vez por outra, implica com subsídios dados por diversos governos, alegando que isso tira a competitividade de mercado.
Outro aspecto do PIPE é criar espaço dentro das empresas para pesquisadores de todas as áreas. Embora não seja exigida a presença de profissionais do ambiente acadêmico para dirigir o projeto, é possível o envolvimento de pesquisadores aposentados, recém-graduados ou em afastamento sabático, observada a dedicação mí-
Avaliação do projeto "O fundamental de um pro
jeto é que ele contenha uma boa idéia e uma apresentação correta, demonstrando que o coordenador e pesquisador principal sabe executar o trabalho", afirma o professor Coutinho. Esse princípio é que deve nortear a análise posterior à entrega das solicitações na FAPESP. Porém, a metodologia de análise dos projetos obedece aos mesmos parâmetros das bolsas de estudo e os outros diversos programas da fundação. O projeto é encaminhado a, no mínimo, dois assessores externos, no caso do PIPE (veja matéria na página 16), para análise do conteúdo e sua viabilidade.
Os assessores, na avaliação do projeto, conferem particu-
lar importância nos seguintes itens:
Objetivos: se bem definidos e compatíveis com o prazo proposto. Metodologia: se bem escrita e adequada aos objetivos propostos. Inovação tecnológica: se produzirá inovação com impacto comercial ou social.
• Competência e experiência prévia do pesquisador e equipe: se suficientes para garantir a plena viabilidade do projeto.
• Capacidade de a empresa desenvolver ou negociar a inovação decorrente do projeto.
• Justificativa do orçamento apresentado.
nima de 20 horas semanais para a execução dos trabalhos.
Cronogramas semestrais - O pesquisador responsável deve cuidar da preparação técnica da solicitação à fundação, acompanhar toda a execução dos trabalhos e fazer os relatórios técnicos parciais e final do projeto. A partir deste edital, além dos relatórios anuais, as empresas terão que apresentar relatórios sintetizados e cronogramas semestrais de desembolso. Com essa medida, a empresa estabelece metas para uma etapa de seis meses atreladas aos gastos que serão necessários nesse período. Ela só receberá o financiamento da etapa seguinte se demonstrar ter gasto o combinado no semestre anterior.
O sétimo edital marca a data-limite para entrega de propostas para o dia 30 de junho. A divulgação ocorreu no mês de maio por meio de anúncio veiculado em 12 jornais do Estado de São Paulo, abrangendo periódicos diários da cidade de São Paulo, região do ABC, Bauru, Campinas, São José dos Campos, São José do Rio Preto, Araraquara, Ribeirão Preto e São Carlos.
Dentre as novidades futuras do PIPE, ainda em estudo, está a possibilidade de financiar a fase 3, quando o produto entra em linha de produção. "Estamos preocupados em viabilizar os projetos bem-sucedidos. Para isso, estamos estudando a criação, com outras entidades e órgãos de financiamento, de fundos específicos para implementar a fabricação de produtos desenvolvidos dentro do PIPE", informa Perez. •
PESQUISA FAPESP HAlO DE 2000 • 43
TECNOLOGIA
QUÍM ICA
Análise automática e robotizada
Estação de trabalho acelera exame químico de várias substâncias
Esqueça a figura tradicional do técnico de laboratório especia
lizado em análises de alimentos e outras substâncias, sempre às voltas com pipetas, tubos de ensaio, béqueres e bicos de bunsen. Já está disponível para os profissionais do setor a Estação de Trabalho Espectrofotométrica, um analisador químico totalmente automático e robotizado, capaz de quantificar, por exemplo, a presença de elo-
reto, ferro, nitrito, sulfato e sílica na água, ou detectar cianeto, sulfeto, fosfato e amônia em efluentes domésticos ou industriais. Permite ainda medir a concentração de cálcio e fósforo em rações ou cálcio, magnésio e fósforo em plantas, além de muitas outras aplicações. Tudo realizado em menor tempo que os métodos tradicionais.
A estação foi desenvolvida pela Femto, uma empresa sediada na capital paulista, sob a coordenação do físico Lídio Kazuo Takayama. O projeto Estação de Trabalho Espectrofotométrica teve o apoio da FAPESP dentro do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), por meio de um financiamento total de
R$ 114 mil, distribuídos em duas fases. Até o mês de abril, a Femto havia vendido duas estações. Uma para a Fundação do Meio Ambiente de Goiás (Femago) e outra para o Laboratório de Referência Animal do Ministério da Agricultura (LARA). São dois exemplos que demonstram ser amplo o campo de ação da estação. Ela serve às indústrias, órgãos de proteção ambiental, institutos de pesquisa e empresas diversas que fazem análise de alimentos, de solos e de plantas ou atuem na área de tratamento de água.
A utilização da estação de trabalho informatizada e robotizada exerce uma série de vantagens em relação aos métodos manuais. A primeira é
Por dentro da Estação de Trabalho Espectrofotométrica
A substância a ser analisada é inserida nos tubos de ensaio do carrossel de amostras após a digestâo (preparo do material). Tanto a amostra como os reagentes são aspirados pela bomba peristáltica.
As válvulas V2 e VJ, que ficam em cima dos braços do carrossel dos reagentes, e as VS e V6, sobre as amostras, gerenciam o trabalho de aspiração e, posteriormente, da injeção. Os volumes pré-programados dos reagentes e da amostra são armazenados dentro das bobinas 8 I e 82.
Depois, os dois conteúdos são injetados, pela bomba peristáltica, para a bobina 83, onde ocorre a reação entre amostra e reagente.
Em seguida, o material é levado à cu beta de fluxo do espectrofotômetro representada pela letra À,
que seleciona o comprimento de onda do parâmetro (por exemplo, cálcio, ferro, cloretos) a ser analisado e indica a sua concentração. O carregador que pode ser, por exemplo, água destilada, serve para transportar a amostra e os reagentes.
As válvulas VI e V4 evitam a sobrepressão ou vácuo na tubulação quando a bomba peristáltica estiver ligada.
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CARREGADOR
6 Carrossel dos reagentes Carrossel das amostras
Descarte
uma redução de custos operacionais e gerenciais. A automatização traz uma série de benefícios, como aumento na velocidade do processamento, controle de qualidade quase em tempo real, redução de erros, aumento da segurança, redução de descarte de produtos químicos e melhora na comunicação e serviços.
A análise laboratorial utilizando espectrofotômetro não-automatizado ainda é largamente utilizada. Mas as estações robotizadas com bom suporte de software terão um papel importante, sobretudo nos laboratórios que trabalham com grandes quantidades de análises.
Ações rápidas - A Femto iniciou suas atividades com o desenvolvimento e fabricação de espectrofotômetros de luz visível e de ultravioleta. Posteriormente, foi a primeira a fabricar no Brasil o espectrofotômetro de infravermelho, que não necessita de reagentes. A empresa, desde a sua fundação em 1989, direciona suas ações para alcançar o mesmo patamar de desenvolvimento tecnológico de suas correspondentes estrangeiras. As ações da empresa se concentram no desenvolvimento do produto, na montagem e no controle de qualidade, deixando a fabricação dos componentes dos equipamentos para outras indústrias, de forma terceirizada.
A estrutura organizacional da Femto é familiar, formada pela associação do coordenador do projeto, Lídio Takayama, com mais dois irmãos, Francisco e Mary. Uma das funções dos três é sempre acompanhar as principais novidades acadêmicas e empresariais no Brasil e no exterior.
A idéia da estação espectrofotométrica automatizada persegue Lídio desde o início da década de 80. Com a invenção do sistema Flow Injection Analysis (FIA), análise por injeção em fluxo, a análise laboratorial de componentes de alimentos ou de efluentes (resíduos domésticos ou liberados pela produção industrial) ganhou em eficiência em comparação com os métodos tradicionais de manipulação.
Economia de tempo - Na técnica FIA, a amostra objeto da análise é colocada em um tubo contendo reagente e depois redirecionada para um detector. Entretanto, restava um problema que deixava Lídio Takayama incomodado. Os aparatos montados para proceder à análise não eram facilmente
Takayama: mesmo nível
das indústrias similares
mais avançadas do exterior
/ intercambiados em operações envolvendo diversos tipos de reagentes e de amostras. Assim, se, após uina operação para detectar a presença de sulfato, fosse necessário analisar a presença de cloreto, seria obrigatório a remontagem do aparelho com nova configuração. O processo todo se tornava trabalhoso. Daí que, desde a concepção da estação de trabalho, a função do operador se limita a fazer uma nova programação no computador do aparelho, quando houver necessidade de outra reação química. Isso representa uma grande economia de tempo e de produtos em relação a espectrofotômetros anteriores.
Lídio Takayama conta que uma análise de demanda química de oxigênio (DQO), fundamental para análises ambientais, que normalmente leva mais de 3 horas utilizando técnicas convencionais, ficou
pronta em apenas 12 minutos na nova máquina.
Até setembro deste ano, quando termina a fase 2 do projeto, deverão estar concluídos novos testes, como o de detecção de carbono orgânico total (TCO) em efluentes, para determinar a presença de gorduras em fa-
relos de soja ou de trigo e medir o nível de proteínas em alimentos em geral, por meio da presença de nitrogênio. O tempo estimado para toda essa análise é menor que 15 minutos.
Embora ainda não totalmente finalizada, a estação de trabalho da Femto começa a ganhar os primeiros concorrentes em países como França e Canadá. No entanto, as perspectivas comerciais da empresa brasileira são bem atraentes. As especificações e características da máquina a mantém num patamar altamente competitivo, com preços mais baixos em relação aos estrangeiros.
Novos negócios - Como o aparelho é útil a vários ramos da atividade industrial, Lídio estima vender até 6 unidades neste ano, aumentando, depois, as vendas para 10 ou 12 unidades anuais. O preço médio de
cada unidade será de R$ 35 mil, um valor superior ao previsto inicialmente, mas muito abaixo do preço dos concorrentes.
Para atender às novas demandas, a Femto contratou recentemente um novo funcionário e estuda contratar outros dois. Lídio ressaltou ainda que "sem o envolvimento da FAPESP teria sido muito mais difícil financiar o projeto, dado o atual custo dos juros no Brasil". •
PERFIL:
• L!DIO KAzuo TAKAYAMA, 51 anos, formou-se em Física na Universidade de São Paulo (USP). Fez pósgraduação no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Projeto: Estação de Trabalho Espectrofotométrica Investimento: R$ 114.741,00
PESQUISA FAPESP · MAIO OE 1000 • 45
TECNOLOGIA
ENGENHARIA ELÉTRICA
Luz laser pára o trem de minério
Equipamento de pequena empresa controla vagões da Vale do Rio Doce
Cinco pequenas caixas de cor laranja instaladas ao longo dos
trilhos da linha férrea da Companhia Vale do Rio Doce, no Estado do Espírito Santo, fazem parte do mais novo sistema para o posicionamento exato das caçambas que devem ser viradas para o descarregamento do minério de ferro. As caixas são medidores de distância a laser que garantem maior precisão do local de parada dos vagões e substituem o homem em um trabalho inóspito proporcionado pelo eleva- ~ do grau de material particulado em suspensão existente no local. Com isso, a Vale é a única companhia do gênero no mundo a adotar tal sistema.
bricação em série deve começar até o final deste ano. Segundo o coordenador do projeto, o engenheiro Mário Antônio Stefani, a solicitação da Vale fez a Opto modificar o formato industrial previamente imaginado para o aparelho. O medidor foi adaptado para ganhar resistência física e funcio-
O medidor a laser fica instalado rente aos trilhos com blindagem especial para evitar poeira
A inovação foi desenvolvida pela Opto Eletrônica, uma empresa de São Carlos que obteve financiamento da FAPESP, dentro do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE). No total, serão investidos R$ 23,2
.__ _________ ____J e água de chuva
mil até o mês de setembro, quando esse projeto - chamado Medidor de Distância a Laser com Alcance de 20 metros para Uso Industrial- será finalizado.
Esse medidor funciona como um radar, informando a distância entre o emissor e o alvo. A diferença é que, em vez de ondas de rádio, o equipamento usa· um sinal luminoso produzido por um feixe de laser. O primeiro protótipo do medidor ficou pronto em novembro de 1998 e a fa-
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nar em ambiente hostil como é o transporte de minério. Por isso, a caixa recebeu uma blindagem especial de aço, sendo ainda selada contra água da chuva.
"Os principais obstáculos que impediam o bom funcionamento do sensor laser estão sendo superados': afirma Stefani. Como exemplo havia o excesso de pó presente no ambiente, motivado pela movimentação do minério existente nos vagões. Cada vagão tem capacidade para carregar
até 90 toneladas. As nuvens de poeira, a princípio, interferiam na leitura do laser, que revelou alta "sensibilidade" para ultrapassar aquelas mais densas. "Fizemos todas as adequações necessárias para o sensor laser funcionar em plenas condições nesse ambiente hostil", informa Stefani.
Essa versão terá muita utilidade em outras aplicações, tais como aferir a posição e a largura de lingotes de aço em siderúrgicas, verificar o volume de grãos e granulados em geral, em silos, caminhões e vagões, e medir comprimentos e larguras de madeira em serranas.
Está prevista a confecção de um medidor portátil que poderá ampliar o uso desse aparelho, nos mercados de construção civil e arquitetura. Esse equipamento portátil também poderá ser usado como sensor de posicionamento de robôs em linhas de montagens industriais.
O desafio apresentado à Opto pela Vale do Rio Doce era vencer os limites do raio de ação encontrado em outros tipos de medidores existentes no mercado, que alcançam no máximo 50 centímetros. Nas insta-
lações da Vale, os vagões carregados circulam normalmente a cerca de dois metros do local onde é possível instalar um medidor. A distância, no entanto, pode chegar até 7 metros. O aparelho fica conectado a um braço hidráulico, que arrasta o vagão, movido por um motor de 800 cv, equivalente à força de dez motores 1.0 de carros populares. Entre os requisitos estabelecidos pelo cliente da Opto estavam precisão centimétrica, tempo de resposta do sensor laser de no máximo um vigésimo de segundo e feixe de laser com potência máxima de cinco miliwatts. "O limite de potência é imposição de normas internacionais de segurança", diz Stefani.
ponentes são mais eficientes, mais baratos e ocupam menos espaço que os gases e os espelhos utilizados na técnica hélio-neônio. "Foi mais ou menos como passar da válvula para o transistor", compara Castro.
Assim, de uma hora para outra o laser fabricado pela Opto não era mais páreo para o novo concorrente. E medidas extremas e rápidas foram tomadas, como a adoção do novo componente. Foi uma decisão correta e o crescimento da empresa foi grande e rápido. A Opto começou o ano de 2000 com 100 funcionários e
sões. A primeira é a básica, dedicada à pesquisa e desenvolvimento. A segunda cuida da fabricação dos implementas laser e componentes ópticos de precisão. E a terceira está voltada para a produção de filmes finos utilizados em refletores de "luz fria", outro nicho de mercado muito promissor. Nessa área, a Opto já é o maior fabricante nacional de refletores odontológicos. "Exportamos 45% da nossa produção", reforça Castro.
Produtos desse tipo inauguram com freqüência novos segmentos in
dustriais, o que significa ~ o dizer criação de empregos
mais qualificados. Na Opto, os funcionários têm perfis que vão de técnicos de grau médio a engenheiros, mestres e doutores, além de 20 vendedores fixos. "Nesse setor não é possível manter vendedores genéricos", explica Castro. As especificações e aplicações exigem o conhecimento de inúmeros detalhes que somente quem se especializa consegue entender.
Rápido crescimento - Desafios inesperados marcaram a história da Opto Eletrônica. Nascida em 1985, a empresa era a única a fabricar no Brasil emissores de raios laser de hélio-neônio, um tipo de produto em franco crescimento, naqueles tempos, nos Estados Unidos. Tratava-se de um equipamento incorporado a múltiplas aplicações nas áreas médicas e afins, tais como fotocoaguladores,
Stefani, à direita, e o engenheiro Soares, da Opto, na área da Vale
É, justamente, o caminho que a Opto quer seguir, incorporando conhecimento a seus produtos. •
bisturis movidos a laser, entre outros. Não era um produto de venda direta ao consumidor. A Opto fazia o emissor de laser e não o produto final.
Com o tempo, a empresa percebeu que faltava no mercado brasileiro produtos finais com plena utilização do laser. "No Brasil, na época, não havia quase aplicativos': lembra Jarbas Caiado de Castro, um dos sócios da empresa. Foi assim que a Opto passou a desenvolver equipamentos completos com venda direta ao consumidor, chegando a um total de 100 tipos de produtos à base de laser. A empresa cresceu muito até o final da década de 80, saltando de 6 para 70 funcionários.
Mas, em 1989, foi lançado, nos Estados Unidos, um novo tipo de emissor laser, desta vez acionado por diodos semicondutores. Esses com-
um faturamento anual da ordem de R$ 13 milhões. Hoje, a linha de produtos da Opto vai de microscópios oftalmológicos de altíssima definição a fotocoaguladores a laser para cirurgias de retina, além de sistemas de precisão de imagens do olho, tornando possível executar a coagulação de microfissuras nesse órgão. Acrescente-se a isso outros inúmeros equipamentos de uso industrial.
"Fomos os pioneiros na produção de equipamentos de laser industriais no Brasil': reforça Castro. "Estamos num segmento que movimenta anualmente, no mundo, mais deUS$ 100 milhões. Esperamos crescer pelo menos 20% este ano", afirma.
Reflexos da luz -A Opto tem seis sócios e está estruturada em três divi-
PERFIS:
• MÁRIO ANTONIO STEFANI, engenheiro mecânico e eletrônico graduado na Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC-USP). Fez mestrado e doutorado no Instituto de Física de São Carlos (USP) . • JARBAS CAIADO DE CASTRO, físico graduado no Instituto de Física de São Carlos (USP), onde também fez mestrado e é, atualmente, professor titular. Doutorou-se no Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos. Projeto: Medidor de Distância a Laser com Alcance de 20 metros para Uso Industrial. Investimento: R$ 233.221,00
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 2000 • 47
TECNOLOGIA
ODONTOLOGIA
No tamanho da boca brasileira
Dentistas têm novas moldeiras de arcadas dentárias
Em setembro deste ano, uma nova geração de moldeiras de ar
cadas dentárias estará disponível para os cerca de 150 mil dentistas que trabalham no país. Os novos produtos são o resultado de 20 anos de pesquisas do professor Artêmio Luiz Zanetti, titular da Clínica de Prótese Parcial Removível da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (FOUSP). Há dois anos, ele se associou com a empresa Teccom, que produz instrumentos para a área médica, com o objetivo de levar em frente o projeto Desenvolvimento da Moldeira de Transferência - Técnica Zanetti, que faz parte do Programa Parceria para Inovação Tecnológica (PITE) da FAPESP.
A concretização do trabalho teve início em 1977, quando o professor Zanetti constatou a dificuldade dos alunos em obter boas reproduções (modelos) de arcadas dentárias. "Com isso, resolvi realizar um estudo das dimensões dos arcos dentários do biótipo brasileiro ao tomar como base 400 arcadas, sendo 200 superiores e 200 inferiores, obtidas de 100 alunos da FOUSP e 100 da Universidade São Francisco, de Bragança Paulista, onde também lecionava", relata Zanetti.
A coleta da estrutura da arcada se faz com a moldeira carregada com uma massa maleável, que serve para a gravação da base dentária quando da necessidade de
Zanetti: número de consultas diminui
uma dentadura. Logo em seguida a massa se solidifica e serve como parâmetro para os trabalhos protéticos. Em 1980, com base nesse trabalho, Zanetti estudou sete tipos de moldeiras -cinco importados e dois nacionaisutilizados na prática odontológica. A conclusão indicou a incompatibidade das dimensões das moldeiras com os arcos dentários estudados.
Sem recursos - "Nenhuma delas servia", lembra o professor, recém-
manufaturar um dente ou As moldeiras serão vendidas em kits com até 16 peças
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aposentado, referindo-se ao estudo comparativo que realizou com as sete moldeiras. "Constatei que os dentistas tinham à mão uma ferramenta inadequada", acrescentou. Zanetti não possuía os recursos para aproveitar industrialmente suas observações. Com o tempo, desenvolveu uma técnica, com a qual o dentista pode realizar, numa única sessão, todo o trabalho que normalmente leva o paciente a várias visitas ao consultório.
O uso do articulador é um dos principais segredos do método do professor da USP. "Após concluir a faculdade, o profissional deixa de lado o articulador, uma ferramenta indispensável para a captação das medidas dos pacientes", afirma Zanetti. De acordo com uma pesquisa feita pela Teccom, dos 150 mil dentistas que trabalham no Brasil, apenas 16 mil usam o articulador. Esse aparelho mede a posição dos maxilares do paciente e as características de sua oclusão, ou seja, a maneira como ele fecha a boca. Assim, as novas moldeiras vão ajudar a todos, dentistas e pacientes. •
PERFIL:
• ARTÊMIO Lurz ZANETTI, 70 anos, formou-se em Odontologia na USP. Aposentou-se no ano passado e, atualmente, é professor da Universidade da Cidade de São Paulo (Unicid) e da Universidade Camilo Castelo Branco (Unicastelo), Campus IX, de Campinas. Projeto: Desenvolvimento da Moldeira de Transferência -Técnica Zanetti Investimento: R$ 194.000,00 da FAPESP e R$ 96.250,00 da empresa
TECNOLOGIA
Led's: polímeros geram luz a partir da corrente elétrica
A vanguarda em pontos luminosos
Não há aparelho eletrônico sem aquelas pequeninas luzes brilhantes e coloridas que possuem funções variadas como avisar que o rádio ou o monitor do computador estão ligados ou, ainda, que o celular está recebendo ligações. Esses dispositivos luminosos nos comunicam o que está. ocorrendo e nos ajudam a entender esses equipamentos cada vez mais engenhosos. São conhecidos como LED's (Light Emitting Diodes ou Diodos emissores de luz). A última palavra entre esses dispositivos eletroópticos são os OLED's, chamados de orgânicos, produzidos com polímeros (um tipo de plástico) com propriedades elétricas que geram luz, quando da passagem de corrente elétrica. Os leds comuns são compostos por semicondutores inorgânicos como silício e gálio. Os Oleds são mais luminosos, oferecem mais cores, consomem menos energia e custam dez vezes menos. Tecnologia de ponta domi-
nada por países como Estados Unidos, Inglaterra, Japão e Alemanha, que agora está disponível no Brasil. O ineditismo brasileiro é da empresa Optanica, de Recife, instalada na Incubadora de Empresas de Base Tecnológica do Estado de Pernambuco (Incubatep). A inovação foi desenvolvida nos laboratório de Física da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Em 1998, a tecnologia foi transferida para a empresa. A pesquisa foi liderada pelo pesquisador Antônio Vaz, hoje um dos dois sócios da Optanica. A empresa vai fabricar, inicialmente, brindes como chaveiros e cartões que emitem luz. No próximo ano, a previsão é iniciar a produção de displays com a tecnologia OLED para calculadoras e celulares. •
Uma patente para o suco de cana
Essa ninguém esperava. Uma nova tecnologia de extração da garapa foi patenteada nos Estados Unidos. A empresa Jucana Juice, de Woodland
Hills, na Califórnia, pediu o registro pioneiro de um novo método de processamento de suco de cana-de-açúcar que resulta em um líquido concentrado do produto. Sem explicar como funciona esse processo, a empresa, conforme notícia vinculada no site Bevtech, pretende também vender a garapa misturada a outros sucos, refrigerantes, chás e bebidas alcoólicas. Um dos sócios da empresa, Thomas Remby, diz esperar um novo mercado para produtores de cana nos Estados Unidos e em outros países. Ele afirma que o novo método produz um suave suco de coloração amarela e delicado aroma, além de um preço atrativo. •
Um jeito rápido de tirar água de coco
Quem tentou ou viu alguém retirar água de um coco sabe da dificuldade em perfurar a grossa camada de casca exterior que envolve o fruto. Imagine essa dificuldade em nível industrial com milhares de unidades por dia para
Simples e compacta, capaz de processar 1.800 cocos/h
processar. Pensando nisso, o pesquisador Fernando Abreu da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária -Embrapa Agroindústria Tropical, de Fortaleza, Ceará, desenvolveu uma máquina que quebra o coco com mais rapidez. Num país tão propício ao plantio e ao consumo dos produtos do coco, como é o Brasil, essa máquina é muito bem-vinda. Ela proporciona agilidade industrial na extração da água a ser embalada. A máquina processa 1.800 frutos por hora, quebrando-os ao meio, e 500 litros de água/h. "A importância da máquina está no fato de o consumo de água de coco, no país, crescer 20% ao ano", afirma Abreu. A pesquisa, iniciada em 1997, já resultou na venda de seis máquinas e ganhou o primeiro lugar na área de processamento de alimentos na exposição Ruraltech, que aconteceu em Londrina, no último mês de abril. A máquina é produzida pela Cemag S/A, de Fortaleza. Cada unidade custa R$ 11 mil, sendo que 30% desse valor são de royalties destinados à Embrapa. Esse retorno propiciou a elaboração de novas pesquisas do grupo de Fernando Abreu, agora na área de técnicas de conservação da água após a extração. "Controlando a temperatura da água, em refrigeradores, conseguimos um período de armazenagem de 60 dias sem perda de qualidade e sem a necessidade de conservantes" anuncia Abreu. A pesquisa teve financiamento da Finep e do Sindicato dos Produtores de Frutas do Ceará. •
PESQUISA FAPESP • HAlO DE 2000 • 49
HUMANIDADES
HISTORIA
Imagens do passado colonial
Livro de Nestor Goulart reúne vistas e plantas de cidades do Brasil antigo
Quarenta anos de pesquisa em arquivos brasileiros, portu
gueses e holandeses acabam de resultar em uma verdadeira pérola editorial da história do urbanismo brasileiro. O livro Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial (Edusp/Imprensa Oficial, 414 págs. R$ 80,00), do arquiteto e historiador Nestor Goulart Reis, reúne 329 imagens de
em arquivos de todo o território nacional e ainda no exterior, esses desenhos fazem parte de um conjunto de mais de mil plantas com as quais Reis, auxiliado por uma equipe de 20 pessoas do Laboratório de Estudos sobre Urbanização, Arquitetura e Preservação (LAP) da FAU/USP, descobriu, no decorrer dos últimos 40 anos, a força que o planejamento urbano teve no Brasil Colonial. A pesquisa do LAP pode ser vista também em CD-ROM e em um kit educacional de 35 pôsteres que está percorrendo escolas públicas de todo o país.
Os desenhos - alguns feitos em aquarela - podem ser considerados
po, transformando-as em espelhos dos burgos medievais europeus. Sobretudo no litoral, onde era preciso resguardar-se da invasão de povos 1mm1gos.
Já no século XVII, conta o pesquisador, começa-se a agregar um planejamento de ruas em forma de xadrez para reforçar a segurança e o controle militar, diante do crescimento populacional da colônia. "A partir do século XVII e no decorrer do XVIII, a população colonial passou de 300 mil para 3 milhões de habitantes, a grande maioria vivendo em centros urbanos desenvolvidos em decorrência do ciclo do ouro, e
Vista da parte sul da cidade de São Paulo em 1821 : poucas casas, uma cena bem distante da futura metrópole superpovoada
plantas e vistas de cidades como Salvador, Rio de Janeiro, Recife, Cananéia, São Paulo e muitas outras, entre o século XVI e o início do XIX. O livro, que contou com o apoio da FAPESP, pode ser encontrado na Fundação de Pesquisa Ambiental (Fupam) da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU/USP).
Completamente desconhecidos do público por estarem dispersos
50 • MAIO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
verdadeiras expressões artísticas de seus autores. E que autores são esses? Na maior parte das vezes, engenheiros militares enviados por Portugal para garantir a segurança da colônia. Daí o fato de o nascimento de Salvador, em 1549, por exemplo, ter se dado com a presença de um mestre de fortificações. A preocupação com a segurança fez de portas e muros elementos muito comuns nas urbes brasileiras daquele tem-
não só em Minas Gerais", narra Reis. "Era preciso racionalizar a defesa militar, daí a presença quase constante do planejamento simétrico de ruas, em forma de xadrez." Esse tipo de concepção era tão presente, que até o quilombo do Rio Vermelho, localizado em um bairro de Salvador, foi planejado dessa maneira. "Além disso, o planejamento urbano era completo, então havia áreas das cidades destinadas a comportar, por
~ exemplo, a que determina-o ~ va que todas as janelas e lí portas deviam ter a mesma 5 ;;: altura e outra segundo a .. .,; qual as ruas não podiam re-i ceber nomes em tu pi:' Uma 1.s rápida olhadela no livro de "" : Reis já permite ver que cida-~ des como Recife e Salvador ~ tinham muito das portu~ guesas, como Porto e Lisboa. :i o
~ Fazendo escola - Os cursos ;;;;
de urbanismo ministrados hoje no Brasil quase nada herdaram do planejamento urbano colonial, mas muitos engenheiros militares daquele tempo - alguns portugueses, outros franceses, alemães ou italianos - fizeram escola por aqui. Foi o caso do português José Fernandes Pinto Alpoim,
"Fiuvius Grandis": desenho de Frans Post, de 1639, mostra a fortaleza dos Reis Magos, em Natal que, além de ter construí
Área do Morgado de Santa Bárbara, em Salvador: desenho de 1764-1785
exemplo, os índios - está certo que longe das habitações dos portugueses", explica. "Não existiam, assim, moradores de rua; estes começaram a existir no final do século XIX."
A intensidade da vida urbana naquele tempo também se expressava por meio de espaços culturais. "Vila Bela, capital do Mato Grosso em meados do século XVIII, tinha uma casa de ópera em que eram encena-
dos de 80 a 90 espetáculos teatrais por ano", diz o pesquisador. "E as igrejas eram espaços para músicos e compositores." A partir de 1750, conforme diz Reis, Portugal decidiu marcar enfaticamente sua presença na América. A arquitetura serviulhe para deixar claro que o território português além-mar era bastante diferente do espanhol. "Havia normas de planejamento, como, por
do o Palácio dos Governadores do Rio de Janeiro e o de Ouro Preto, fez um plano simétrico para a cidade de Mariana, em Minas Gerais, em 17 46. "Ele reativou as aulas militares no Rio de Janeiro, escrevendo manuais de artilharia e de arquitetura e foi a partir de seus cursos que se formaram a Academia Militar de Agulhas Negras e a Escola Politécnica do Rio de Janeiro", afirma Reis.
O italiano Antônio José Landi, juntamente com outros astrônomos, geógrafos e engenheiros estrangeiros, integrou a
expedição portuguesa responsável pelo reconhecimento da bacia amazônica no século XVIII, que colaboraria para as melhores delimitações entre os territórios portugueses e os espanhóis naquela região. Segundo o Tratado de Tordesilhas (1494), aquelas terras pertenciam aos espanhóis, mas há tempo os portugueses vinham ocupando a porção ocidental da linha. Até que, em 1750, o Tra-
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 2000 • 51
"Dezenho por ldea da Cidade de São Paulo", a partir do Morro do Chá: 1765-1775
tado de Madri definiu que aquelas terras passariam a pertencer oficialmente ao reino portugês. A missão não obteve sucesso, devido à ausência dos castelhanos em um encontro marcado na povoação de Mariuá, no coração da baía amazônica. Porém, Landi resolveu ficar em Belém do Pará, onde morou até o fim da vida. Lá, ele construiu o Palácio dos Governadores, a Igreja de Sant' Ana e a Capela de São João Batista, tendo contri-
buído para a formação de uma mentalidade arquitetônica iluminista na região. Alguns brasileiros aprendizes dos estrangeiros também tiveram seguidores, como José Antônio Caldas.
Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial apresenta as representações de nossos centros urbanos de acordo com a ordem cronológica em que esses se desenvolveram na história. Assim, primeiro vêem-se as plantas e vistas das cidades dos Esta-
dos nordestinos - Bahia, Alagoas, Sergipe, Ceará, etc. Depois, as do Sudeste, seguidas pelas do Sul, Brasil Central e finalmente do Norte. A intensa e longa pesquisa da equipe de Nestor Goulart Reis contou com o apoio imprescindível da FAPESP e do CNPq. "Em 1974, a FAPESP chegou a nos dar uma câmara fotográfica profissional que permitia fazer reproduções em chapas planas de 4 x 5 polegadas, com altíssima resolução", conta. "Além das inúmeras viagens que tivemos de fazer, devido à dispersão dos documentos."
Para o pesquisador, a grande contribuição que Imagens de Vilas e Cidades
do Brasil Colonial tem a oferecer à historiografia nacional é introduzir as fontes iconográficas e o planejamento urbano como documentos. "Quando estudamos a história do Egito ou da Grécia, sempre levamos em conta a história da arte e da arquitetura daqueles povos", diz. "No Brasil, até então, a história só vinha sendo contada por documentos escritos, principalmente pela herança burocrática portuguesa': continua.
Para ele, que descobre sem-
L5~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~ ~ preumupectonowada r: g vez que coloca uma lupa
~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~==~~~==~~~~ sobre os desenhos, o que ~ temos pela frente, a partir ~ da pesquisa, é uma nova õ forma de ver a história do 8 " Brasil. Que seja assim. • s 8 ::>
~ PERFIL: g
~----------------------------------jl""·---j ~ • NESTOR GOULART REIS FI-
~ LHO, 69 anos, é graduado em ~ Ciências Sociais pela Facul-, § :; dade de Filosofia, Letras e 2.
Espaço urbano habitado: figuras representando usos e costumes no Brasil, na Índia e em Macau: 1779
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§ Ciências Humanas da USP e :: u em Arquitetura e Urbanis
mo pela FAU/USP, onde é professor titular de História da Arquitetura e Estética.
HUMANIDADES
ANTROPOLOGIA
A lente de Jean Rouch Vídeo recupera a vida e a obra do antropólogo francês
Aciência, ~o contrário do q~e s: convencwna pensar, nao e
avessa ao imaginário. Jean Rouch que o diga. Aclamado como precursor do cinema-verdade, o antropólogo que buscava, com o olho da câmera, ver além do olhar humano, tem sua máquina direcionada para si.
Sob coordenação de Sylvia Caiuby Novaes, o projeto Jean Rouch no Brasil. Subvertendo Fronteiras: Cinema e Antropologia, dos alunos de pós-graduação em Antropologia Social da USP Ana Lúcia Ferraz, Edgar Teodoro da Cunha, Paula Morgado e Renato Sztutman, é um vídeo que suscita a discussão sobre o uso da imagem na ciência social.
jetos de estudo, mas como sujeitos de uma realidade", comenta. Assim, nada de representação ou cortes.
A visita de Rouch ao Brasil impulsionou o trabalho do grupo, antes restrito à discussão. Como participante da 3a Mostra Internacional do Filme Etnográfico, no Cinusp, Rouch reafirmou a importância do cinema como meio de registrar as culturas em via de transformação ou desapa-
Sylvia. Mais uma vez, aparece a relevância da oralidade, que, unida às técnicas do plano e som direto por ele implementadas, contribuiu para o nascimento da Nouvelle Vague francesa, que pode ser vista na filmografia de Godard.
Rouch formou-se em engenharia civil no início dos anos 40. Assim que a França foi invadida, durante a 2a Guerra Mundial, ele foi trabalhar na África.
Primeiro, na Nigéria, onde, entre a construção de uma ponte e outra, filmou os curtas Les Magiciens de Wanzerbe, em 1948, sobre os ritos mágicos, e Circoncision,
um ano depois, sobre um rito de circuncisão de crianças de Hombori, uma aldeia do Mali.
Mas foi no Senegal que, ao ver os negros, que com ele construíam uma ponte, ini-
o o
Ciarem um n-tual ao som de uma trovoada, fez seu filme preferido, Les Maitres Fous,
O documentário, feito a partir de cenas de filmes, entrevistas com o antropólogo e imagens de sua visita ao Brasil, em 1996, recebeu um auxílio para edição da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) no valor total de R$ 64 mil.
Rouch na África: usando o candomblé para discutir o colonialismo
em que usou o candomblé para discutir o colonialismo.
"Numa primeira abordagem, Rouch mostra o quanto há de cons
. trução no que fala um antropólogo e um cineasta e, num segundo momento, usa o cinema para provocar uma reflexão da realidade que, para ele, só é entendida se reconstruída", observa Sylvia.
Não se trata, porém, de uma criação ficcional restrita ao entretenimento. A ficção poderia ser usada, desde que como um subsídio à pesquisa. Por isso, lembra Sylvia, "Rouch propõe a antropologia compartilhada, em que os personagens não deveriam ser vistos somente como ob-
recimento. A partir da imagem o antropologista fazia análises estruturais e teóricas .
Seu principal campo de estudo, a África dos anos 50, em processo de liberdade tardia, é formada por sociedades da oralidade. Assim, seria o cinema a sua representante e não a linguagem escrita, a tese etnológica. "Ele propõe a antropologia visual, compartilhada, para romper as amarras do colonialismo': diz Sylvia.
É a discussão iniciada por Vertov e Flaherty. "Precisava-se criar uma linguagem própria do cinema, dissociada da teatral e da literária': afirma
Na década de 60, Rouch, estimulado por Edgar Morin, filmou Chronique d'un été. O sociólogo propôs a ele que voltasse seu olhar para a própria cultura, a cultura parisiense. As filmagens, feitas no verão, com a cidade deserta, questionam, por meio de entrevistas, o ideal de felicidade.
Hoje, Rouch, aos 83 anos, continua filmando por Paris. Inveja Manoel de Oliveira, cineasta português quase dez anos mais velho do que ele, por estar também em atividade. E começa a ver alguma graça em fil-mes vtswnários. •
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HUMANIDADES
Mesa de invenções: kits de Física feitos pelo professor da USP Fuad Daher Saad, que quer trazer a ciência para o real
EDUCAÇÃO
Professores de volta à sala de aula Pró-Ciências revê métodos tradicionais de ensino de ciências
Foi há muito tempo, nos tempos do colégio, mas você, com cer
teza, ainda não se esqueceu da terrível sensação de mal-estar e desespero: o professor preenche todo o espaço da lousa com fórmulas matemáticas; alguém levanta o braço e pergunta: "Tio, para que serve isso tudo?" E a resposta: "No futuro, na universidade, você vai saber o porquê". Para não fazer o aluno esperar tanto tempo foi idealizado o Programa de Apoio ao Aperfeiçoamento de Professores de Ensino Médio em Matemática e Ciências, o Pró-Ciências, fruto de um convênio entre Ca-
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pes/SEMTC/Secretaria de Estado da Educação e a FAPESP. O projeto, coordenado pela professora MarHia Sposito, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), foi iniciado em 1996 e realizará, de 1 a 3 de junho (na Fundação Universitária para o Vestibular, Fuvest, na rua Alvarenga, 1.945/51, Cidade Universitária), a sua II Mostra de Projetos, apresentando ao público os resultados de 52 pesquisas.
"O Pró-Ciências quer investigar novas metodologias de ensino por meio de projetos inovadores que repensem a formação dos professores, melhorando o domínio que esses têm dos conteúdos curriculares, pelo contato com os avanços produzidos dentro do espaço universitário", explica Marília. Convidados por um edital da FAPESP, professores das grandes universidades paulistas en-
viaram propostas de cursos para um comitê científico. Os aprovados contataram as delegacias de ensino de sua região e estruturaram um programa de aulas para seus colegas da rede pública de ensino. Transformados em alunos, os mestres puderam, então, a partir da apresentação de novas técnicas didáticas, reavaliar como ensinavam seus pupilos.
"Foi uma boa interação entre universidade e comunidade, aproximando os acadêmicos do cotidiano dos professores da rede pública, com programas voltados para a reposição do conteúdo científico precariamente absorvido por esses últimos em sua formação universitária", afirma Marília Sposito. "Para o professor universitário, por sua vez, foi um banho de realidade, pois muitos dentre eles não avaliavam o grau de dificuldade que seus colegas do ensino mé-
dia enfrentavam para dominar os conteúdos e as próprias condições de trabalho", completa a coordenadora do Pró-Ciências.
Um dos entusiastas do Programa Pró-Ciências é o professor Fuad Daher Saad, do Instituto de Física da USP, coordenador do projeto Demonstrações em Física. "É preciso retomar uma visão crítica do ensino e só passar aos alunos o que faça sentido, que esteja ligado ao real e que ele possa entender por meio da experimentação efetiva e não apenas com fórmulas jogadas numa lousa", avisa Saad. Para tanto, em suas aulas, o físico ensinou os professores a usar a criatividade e, com pouco dinheiro, inventar demonstrações das equações e conceitos da Física. Com garrafas plásticas de refrigerante, canudos, arames, papel usado, vidros, etc., Saad desenvolveu kits (descritos em apostilas para os professores repetirem em sala de aula) de experiências que mostram fenômenos como eletricidade, vácuo, vapor, magnetismo e conceitos de óptica. "Só dessa forma poderemos despertar o interesse pela ciência nos jovens
biente artificial: é melhor dar ao aluno a capacidade de observar o real, de analisar o grande laboratório que é a natureza, sem custos e de uma riqueza imensa", defende.
A professora Maria do Carmo Calijuri, do Departamento de Hidráulica de Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos (USP), igualmente foi buscar soluções no meio ambiente. Coordenadora do projeto Educação Ambiental: a Bacia Hidra-
Resposta positiva - ''A avaliação que temos do Programa Pró-Ciências é das mais animadoras, se levarmos em conta a resposta positiva dos professores do ensino médio participantes e pelo grande número de pedidos para participar de novos cursos que recebemos", conta Marília Sposito. "Mas creio que faltou ousadia e pensar melhor a concepção de novos métodos e a relação entre professor-aluno, na medida em que fica
mos mais voltados para a reposição de conteúdos, uma tarefa que monopolizou boa parte dos nossos esforços", reflete a docente. Outro ponto que preocupa a coordenadora é a restrição dos projetas a áreas específicas do Estado de São Paulo. "Não temos abrangência total e a oferta de cursos concentrou-se em regiões próximas às universidades que ofereciam as aulas, deixando de lado áreas muito carentes, como o Vale do Ribeira, muito fracamente atendido", revela.
Marília: professores ganharam um banho de realidade
e, ao mesmo tempo, inserir a universidade na comunidade, articulando a competência acadêmica com a rede pública, uma troca boa em ambos os sentidos", avalia.
"Por isso, adverte Marília, é preciso que o Pró-Ciências tenha apoio para uma nova etapa que permita ao programa atender essas regiões e a demanda por mais cursos." Apesar das observações, a coordenadora é otimista sobre os resultados. ''A reper
Outra defensora dessa interface é a professora Reiko Isuyama, do Instituto de Química da USP, coordenadora da pesquisa Capacitação em Serviço de Professores de Química do Ensino Médio, também parte do PróCiências. "Isso nos coloca em contato com o real e podemos ajudar os professores mostrando a eles que a habilidade de decorar fórmulas é algo sem sentido, pois o importante no ensino das ciências é deixar claro para o aluno que devemos compreender a realidade que nos cerca", diz. Em seu projeto, Reiko combate um clichê de longa data. "Não é necessário ter um laboratório caro para aprender Química, pois é um am-
gráfica como Método de Abordagem e Ensino, integrante do Pró-Ciências, Maria do Carmo levou os professores da rede pública para conhecer de perto sistemas ecológicos e diferentes ecossistemas a fim de que, no futuro, eles conduzissem experiências sobre qualidade de água, etc., em campo com seus alunos. "Eles aprenderam a se posicionar como parte do meio ambiente e não como meros espectadores, o que tocou as suas sensibilidades para o problema da preservação dos ecossistemas", conta. "Certamente, isso será passado para os jovens, num efeito multiplicador fundamental e que prova a importância de trazer a comunidade mais para perto do que se está desenvolvendo nos meios universitários': afirma.
cussão na rede pública foi das mais favoráveis, aproximamos universidade e comunidade efetivamente e o ponto forte foi, sem dúvida, a inventividade dos pesquisadores em criar materiais e experimentos adequados às exigências e carências dos professores da rede pública de ensino médio': afirma a coordenadora.
Marília também espera bons resultados da II Mostra de Projetas do Programa Pró-Ciências. "Ela permitirá, como na sua edição anterior, uma troca intensa entre os vários pesquisadores, permitindo que se conheçam melhor e divulguem suas experimentações naquilo que elas possuem de melhor, formalizando o caráter inovador do programa", explica. •
PESQUISA FAPESP · MAIO DE 2000 • 55
LIVROS- .·
MARIANGELA ALVES DE LIMA
Um novo papel para o ator Estudo analisa as novas atribuições do intérprete teatral
Por dois séculos a historiografia do teatro ocidental marcou a origem do seu objeto de estudo no momento em que o atar despe o
traje sacerdotal e torna-se porta-voz da consciência crítica disseminada nas composições trágicas e cômicas. Submetia-se à autoridade de Aristóteles situando no passado o cortejo dionisíaco e elegendo como objeto privilegiado para a reflexão a arte imiscuída na esfera da vida profana da cidade.
É diversa a função que a pólis contemporânea reserva ao intérprete. Por essa razão, torna-se insuficiente a serenidade de uma postura fenomenológica. Preso à engrenagem de uma máquina de representação análoga às máquinas de produção de bens de consumo, o intérprete estaria agora destinado a produzir signos-mercadoria. Não pode intuir um devir ou expressar as diferenças porque sacrificou seu corpo singular à repetição.
Corpo do Ato r, livro de Caio César Souza Camargo Próchno, (EditoraAnnablume/FAPESP) detém-se nessa posição contingente do intérprete (é o modo de produção capitalista que a determina) e reivindica uma outra atribuição para o atar contemporâneo. Dando ao assunto um tratamento ensaístico, adota uma postura judicativa ao analisar a inserção do atar no sistema capitalista: "Tal seguidor dos favores mercantis esquece e renega as advertências, os gritos e poesias do deus Dioniso. Talvez não se pudesse considerá-lo um verdadeiro atar, mais parece um mercenário, não merece as investidas do deus-metamorfose, seduziu-se pelo deus-mercadoria, internalizou a barbárie do valor de troca:' (pág. 51).
Para mitigar esse mal-estar histórico, o autor invoca, como o fizeram Nietzsche e outros teóricos deste século, a presença mítica de Dioniso. Um inventário dessas poéticas contido no livro as faz convergir para a reivindicação de um teatro sagra-
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do, onde oficia um intérprete-sacerdote. A carapuça, na verdade, assenta melhor a uns do que a outros. Não dá certo, por exemplo, associar Stanislavski e Brecht a um teatro "onde o grito de Dioniso se anuncia desde um tempo imemorial, proveniente de um fundo sem-fundo a contrapor abertamente esse tempo espacializado de produção de quinquilharias ... " (pág. 36).
Não é isento de riscos o clamor pela origem sagrada. O livro tangencia várias vezes a negação da
história, ao opor às contradições deste tempo um chamamento mítico alicerçado na pré-história. A impressão é de que os gravíssimos problemas de alienação do atar seriam solucionados por uma conversão sincera a uma divindade arcaica.
Bem mais pragmáticos, os atares entrevistados para o livro indicam estratégias para um trânsito razoavelmente gratificante entre a dualidade do "simulacro" e da "metamorfose': São atares capazes de preservar uma subjetividade que ultrapassa as injunções do mercado de trabalho. E não o fazem sustentados por uma profissão de fé, mas, antes, pelo reco-nhecimento e exploração astuta das
brechas onde é possível enraizar representações inovadoras ou realizar prospecções sob velhos e desgastados códigos. Ainda não "internalizaram a barbárie" e são por isso antagonistas explícitos, além de alternativas viáveis, para a representação narcísica.
O livro desdobra outras questões. A imagem do simulacro é a do corpo "belo, asseado, musculoso, sem rugas." Quem a cultua não desejará ver outra coisa no teatro. Quem a produz se recusará à fragilidade e à operosidade. Estarão assim, público e intérpretes, presos a um círculo anatematizado com o rótulo de "prostituição mercenária.
M ARIANGELA ALVES DE LIMA é crítica de teatro.
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f ilosofia da ciência
mario bunge FÍSICA E
FILOSOFIA
Física e Filosofia
Este novo título da prestigiosa Coleção Debates, da Editora Perspectiva, traz uma coletânea de artigos do físico teórico e filósofo da ciência Mario Bunge. Ao longo dos dez densos artigos que compõem este livro, o professor de Lógica e Metafísica da Mc'Gill University,
do Canadá, discute os temas mais delicados da Física, em especial a microfísica. Bunge disseca as questões mais espinhosas com um texto saboroso que mistura teoria e crítica filosófica.
Força e Luz
Um lançamento da Editora Unesp dos mais interessantes. O professor de História Social e pesquisador do Centro de História da Ciência, da USP, Gilda Magalhães, analisa como se deu a relação entre a introdução da eletricidade e a modernização
do Brasil da República Velha. Os resultados são surpreendentes, com respostas a várias indagações contemporâneas, como o porquê de a instalação da eletricidade não ter tido o sucesso de outros países, o que, segundo o autor, é uma das fontes de nosso atraso tecnológico até os dias atuais. Leitura fascinante.
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I Psicanálise lacaniana ' (-----1
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Psicanálise lacaniana
O tema desta edição da Iluminuras (dentro da coleção Leituras Psicanalíticas) é dos mais árduos, mas Márcio Peter de Souza Leite (diretor geral da Escola Brasileira de Psicanálise) consegue superar, com seu texto claro, que o leitor se perca em meio às divagações
de Lacan. O detalhe importante é que o autor dispôs-se a enfrentar uma platéia de kleinianos para falar, com sucesso, das teorias lacanianas sem que os dois mundos colidissem. Indicado para aqueles que gostariam de adentrar esse universo movediço e complexo, guiados pela mão segura de um especialista.
REVISTAS
Bioplanet
A revista científica chilena (com o subtítulo "Biotecnologia para sus negocias", que pode ser encontrada pelo site www.bioplanet.net) chega ao seu terceiro número, com destaque para uma análise detalhada do estado dos estudos biotecnológicos
no Japão, em que se percebe como a mesma agressividade empresarial nipônica é transferida para esse campo científico. Ainda nesta mesma edição, um artigo sobre os peixes transgênicos e de como a modificação da estrutura genética de salmões pode incrementar o seu crescimento e os benefícios comerciais.
Science
O volume 288 (número 5467), de 5 de maio, da celebrada revista científica traz uma boa surpresa para os cientistas brasileiros. Na seção "News Focus", página 801, deste número, há um longo artigo, assinado por Michael Hagmann, intitulado
carinhosamente de "A Genome Cinderella Story", que trata do bem-sucedido Projeto Genoma Xylella, iniciado em 1997 pela FAPESP. A reportagem conta como foi a escolha da Xylella fastidiosa, a formação da rede ONSA, um consórcio de laboratórios que realizou o seqüenciamento, e o sucesso dos resultados.
História
Eis o primeiro número do segundo ano desta publicação quadrimestral da Imprensa Oficial do Estado em parceria com o Arquivo do Estado (informações sobre assinaturas à Rua Voluntários da Pátria, 596, São Paulo, CEP 02010-000, fone 011 6221-2306). Entre
os vários artigos: uma descrição do funcionamento e dos serviços do Arquivo do Estado; uma matéria sobre os percalços do historiador e suas escolhas profissionais; a apresentação de pesquisas sobre antigas revistas, entre essas a Revista do Brasil, A Cigarra e A Revista Feminina.
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