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GESTALT-TERAPIA
Pressupostos teóricos e técnicas1
Eudson Souza Menezes2
RESUMO: Este artigo discute a Gestalt-Terapia como prática psicoterapêutica.
Destacam-se as importantes contribuições da Psicologia da Gestalt, com a sua teoria do
campo perceptual e adoção do método fenomenológico para o estudo dos fenômenos
psicológicos. Além disso, destaca-se a Teoria organísmica de Kurt Lewin que fornecem
a abordagem gestáltica as noções de auto-regulação e a compreensão do organismo
como todo. Quanto às influências filosóficas, discutem-se as contribuições da
Fenomenologia, do Humanismo e do Existencialismo para a consolidação da
abordagem gestáltica. Neste trabalho serão apresentados alguns conceitos e técnicas que
diferenciam a Gestalt-Terapia como abordagem psicoterapêutica.
PALAVRAS-CHAVE: Gestalt-Terapia. Psicologia da Gestalt. Filosofias
fenomenológico-existenciais. Conceitos e técnicas.
INTRODUÇÃO
A Gestalt-Terapia é uma abordagem psicoterapêutica desenvolvida por Fritz
Perls, Laura Perls e Paul Goodman na década de 1950 nos Estados Unidos. Essa
abordagem é caracterizada por ser estruturada em um complexo arcabouço teórico que
vai da Psicologia da Gestalt, passando pela Psicanálise3 de Freud, chegando às filosofias
existenciais-fenomenológicas, destacando-se como notórias influencias filósofos como
Martin Heidegger, Martin Buber.
Dentro das três forças4 que estão presentes na construção da Psicologia como
ciência e como prática clínica, a Gestalt-Terapia está classificada como pertencente a
1 Artigo apresentado à disciplina Teorias da Consciência III, do Curso de Psicologia da Universidade
Federal do Maranhão, ministrado pelo Professor Doutor Jadir Machado Lessa.2 Bacharelando, quaro período, do Curso de Psicologia da Universidade Federal do Maranhão.3 Neste trabalho, não abordaremos as contribuições da Psicanálise para a formação da Gestalt-Terapia.4 As três forças que definem a psicologia como ciência são a Psicanálise de Freud com a sua ênfase no
estudo do inconsciente como fenômeno psicológico, o Behaviorismo que estuda os fenômenos
psicológicos como relações entre os organismo com o ambiente e o Humanismo que estuda a
consciência como relação existente entre o sujeito e o mundo, onde suas questões existenciais emergem
como fenômenos.
corrente humanista, estando ao lado da Análise Centrada na Pessoa, da Daseianálise, da
Logoterapia e do Psicodrama.
2 AS INFLUÊNCIAS TEÓRICAS NA GESTALT-TERAPIA: A PSICOLOGIA
DA GESTALT.
A primeira grande influencia para a constituição da Gestalt-Terapia no campo
teórico está fundada nos estudos desenvolvidos pela Psicologia da Gestalt, cujos
principais representantes são Max Wertheimer, Wolfgang Kohler e Kurt Koffka. Esses
psicólogos estavam voltados para o estudo do fenômeno da aprendizagem, da percepção
e solução de problemas por meio de uma teoria de fundo5 (RIBEIRO, 1985, p. 65).
A Psicologia da Gestalt tem como fundamento de estudo dos fenômenos da
aprendizagem e percepção e da solução de problemas como decorrentes da “realidade
do campo visto como um todo” (RIBEIRO, 1985, p. 65). Para essa abordagem
psicológica, esses fenômenos não são visto como constituídos de partes que juntas os
formam, mas que esses fenômenos são um todo completo. Em outras palavras, a
percepção que um observador tem de uma imagem não é resultado da soma dos
elementos que formam essa imagem, mas são resultados da configuração desses
elementos dentro de um campo.
O que a Psicologia da Gestalt propõe é que os fenômenos sejam estudados
como totalidades que são únicas em dado momento e em relação às condições que o
observador está naquele momento. Essa perspectiva é extremamente importante para a
fundamentação da Gestalt-Terapia, pois enfatiza que um mesmo objeto, relato ou
lembrança pode adquirir novos significados diante das condições atuais em que o cliente
se encontra no setting terapêutico. Tanto para a Psicologia da Gestalt quanto para
Gestalt-Terapia não há dados, mas apenas fenômenos.
Os fenômenos apenas se constituem como tais enquanto relação entre a
consciência e o objeto. Como dístico que se tornou a imagem da Fenomenologia de
Edmund Husserl a “consciência e sempre consciência de alguma coisa”, o fenômeno
terapêutico apenas se constitui quando o cliente direciona a sua consciência para relatar
fatos de sua vida para o terapeuta. Os acontecimentos passados da vida do cliente
apenas se tornam fenômenos quando esse verbaliza para o terapeuta esses
5 As teorias de fundo que podem ser citadas estão a Teoria do Campo de Kurt Lewin e a Teoria
Holísitica de Kurt Goldstein que também influenciaram a Gestalt-Terapia.
acontecimentos. Essa verbalização faz que esses acontecimentos “tornem de volta a
vida”, pois a verbalização se configura com as situações presentes perante o cliente,
tanto na sua vida fora do setting terapêutico quanto dentro dela.
O relato do passado não se junta aos elementos presentes na vida do cliente: ele
se reconfiguram. É importante que se faça a distinção entre “juntar elementos” e “(re)
configurar elementos”. Juntar elementos pressupõe que um objeto é previamente algo
definido e que sofreu um processo de fragmentação que pode ser revertido pela
recolocação de suas “peças”. Por outro lado, (re) configurar tem um significado
diferente: os elementos que compõe um objeto podem lhe fornecer novos significados
que emergem das configurações possíveis desses elementos dentro de um determinado
campo perceptual.
Assim, um cliente pode relatar que em determinada situação se sentiu
humilhado devido a fala de uma determinada pessoa e que sente raiva em relação a essa
pessoa. Poderíamos perguntar ao cliente: “O que essa pessoa lhe falou para você se
sentir humilhada?” Essa pergunta poderia ser seguida por: “Como você estava se
sentindo naquele momento em que essa pessoa lhe falou isso?” Aqui estamos pensando
em um contexto em que o cliente pode ter se sentido humilhado diante da fala do sujeito
devido a outros problemas que estavam em questão na consciência do cliente e que se
configuraram a fala do sujeito emergindo o fenômeno a humilhação.
Então diante do relato da sua situação existencial presente naquele momento, o
cliente pode atribuir, a partir das perguntas feitas pelo terapeuta, novos significados
àquele momento. O cliente pode se tornar consciente que aquela pessoa não lhe tratou
de modo ríspido, mas que devido as suas condições existências entendeu a fala do
sujeito como uma atitude de humilhação. Agora, diante dos novos elementos que se
configuram aquele momento, o cliente pode atribuir um novo significado aquele
momento.
Em relação a essa reformulação do campo perceptual na prática clinica, Ribeiro
discorre que:
[...] a ação psicoterapêutica deverá levá-lo [o cliente] a uma correção deste campo perceptual ou uma reestruturação do mesmo. Assim, quando alguém se sente “curado”, podemos dizer que seu campo perceptual foi reestruturado, que boas figuras provocaram a reestruturação de seu campo total. Neste caso, aconteceu uma aprendizagem e a solução de problemas se deu através de introvisões. (1985, p. 66)
A asserção de Ribeiro sobre a reestruturação do campo perceptual como
elemento importante na Psicologia da Gestalt que influenciou a Gestalt-Terapia toca em
um ponto importante: a aprendizagem como elemento importante na terapia. Na prática
terapêutica não é apenas importante que o cliente se torne consciente de elementos que
estruturam a sua subjetividade, mas que, a partir dessa conscientização, seja capaz de
traçar novas possibilidades para a sua existência. A Gestalt-Terapia, como pertencente a
corrente humanista e fenomenológico-existencial, tem como fundamento de “fé” que o
cliente, ao se dispor como sujeito na clínica, possa se tornar capaz de dirigir a sua vida.
2.1 As leis do campo perceptual
A preocupação em definir o fenômeno como resultante da configuração de
elementos levou a Psicologia da Gestalt a formular leis que regem a formação do campo
perceptual. Segundo Ribeiro (1985), as leis do campo perceptual foram desenvolvidas
por Wertheimer para o estudo do campo visual, mas que são valiosas para compreender,
dentro da clinica gestáltica, como se estruturam os fenômenos psicológicos na vida
existencial dos clientes.
O primeiro princípio da organização do campo perceptual elencado pela
Psicologia da Gestalt é o princípio da proximidade. Segundo esse princípio, os
elementos próximos no tempo e no espaço são percebidos juntos. Dentro da clínica,
poderíamos supor que esse princípio está presente em relatos de pacientes que afirmam
que a sua fala ou atos a alguém foi determinante no acontecimento de um evento
danoso. Poderíamos criar um hipotético setting terapêutico onde ocorre o seguinte
diálogo:
Cliente – Eu matei meu pai! E me sinto muito culpado por isso!
Terapeuta – Como você matou seu pai?
Cliente – Eu disse que eu queria que ele morresse e ele morreu de infarto à
noite.
Diante de tal relato, poderíamos perguntar em que situação o cliente falou isso.
Como relato hipotético, poderíamos dizer que o cliente falou isso em pensamento e que
na noite do dia em que pensou tal desejo seu pai morrera. Diante da proximidade
temporal desses dois acontecimentos formou o fenômeno da culpa da morte.
Nesse caso, o trabalho do terapeuta é fazer que o cliente perceba que esses dois
fatos não são indicativos da culpa da morte. Poderíamos perguntar ao cliente o que lhe
motivou a dizer isso e se o seu pai apresentava problemas cardíacos anteriormente. O
nosso cliente hipotético poderia dizer que o pai lhe maltratava muito, que lhe exigia um
desempenho acadêmico que não poderia realizar e que, quanto à saúde, o pai já
apresentava um histórico de problemas cardíacos que não dava o devido cuidado. Então
o terapeuta poderia levar o cliente a perceber que os seus sentimentos de raiva em
relação ao seu pai eram compreensíveis diante daquela situação e que a morte dele não
estava sob controle do cliente.
O segundo princípio do campo perceptual é a similaridade. Segundo esse
princípio, elementos que estão em condições iguais são vistos como fazendo parte da
mesma estrutura.
Quanto a esse princípio poderíamos criar uma situação hipotética onde uma
cliente relata dificuldades de relacionamento amoroso. A cliente relata que tem
dificuldades em dar prosseguimento aos seus relacionamentos, pois se sente angustiada
quando percebe que os seus namorados querem lhe propor o casamento. Quando está
consciente dessa possibilidade, a cliente relata que se torna ríspida com os seus
namorados, o que termina como o rompimento desses relacionamentos.
No setting terapêutico, poderia ocorrer o seguinte dialogo:
Cliente – Eu acabo com todos os meus relacionamentos!
Terapeuta – Você poderia explicar como você acaba com os seus
relacionamentos.
Cliente – Quando eu percebo que quando os meus namorados querem casar
comigo eu começo a agir de forma ríspida. Começo a brigar, a dizer que eles têm outras
e que são todos iguais, pois todos traem.
Diante disso, o terapeuta pode perguntar a cliente quando isso começou a
ocorrer. A cliente poderia relatar que essas atitudes começaram a ocorrer a partir do
relacionamento com o seu segundo namorado. Esse lhe havia pedido em casamento,
mas que lhe trocara por outra após o pedido de noivado. A partir desse acontecimento
quando ela percebia que seus outros namorados poderiam lhe pedir em casamento, a
cliente adotava atitudes a fim de impedir que aquela situação ocorresse. Perguntada qual
seria o indicativo de um possível pedido de noivado, a cliente poderia dizer que os
comentários sobre como ela se imaginaria com o namorado daqui a dez anos feitos por
eles lhe serviam como forte indicativo. Ela relataria que foi a atitude similar que o
segundo namorado teve na ocasião do abandono.
O terceiro princípio desenvolvido por Wertheimer é o princípio denominado de
direção. Segundo esse princípio, tendemos a ver as figuras de uma forma tal que elas
seguem uma única direção. O princípio da direção poderia ser representado, na clínica,
por um relato hipotético de um cliente que não consegue construir novas possibilidades
para a sua existência.
O quarto princípio que formam as leis do campo na Psicologia da Gestalt é o
princípio da disposição objetiva. Esse princípio descreve que uma figura é vista como
estável mesmo quando os estímulos que levaram a sua percepção original estão agora
ausentes. O princípio da direção objetiva é mais claramente visto no relato de paciente
que atribuem um único significado a acontecimentos do passado. A configuração desses
acontecimentos é tal que o cliente afirma que não há possibilidade para uma possível
mudança. Fritz Perls argumenta que o neurótico é carente de possibilidades para superar
a sua neurose. Então, uma das funções do terapeuta da Gestalt-Terapia é fazer que o seu
cliente veja, a partir do seu relato, novas formas de lidar com situações que lhe
ocorreram no passado e com as que estão se processando no momento da terapia.
O quinto princípio é denominado de destino comum. Segundo Ribeiro (1985,
p. 69), esse principio informa que um elemento pertencente a um grupo maior, quando
deslocado, tende a forma um novo grupo. Esse princípio é fundamental na clínica
gestáltica, pois é o que possibilita a formação de novas cadeias de significados na vida
existencial do cliente. Os acontecimentos do passado do cliente, via de regra, não
podem ser alterados, mas os seus significados sim. Portanto, cabe ao terapeuta que, no
diálogo com o seu cliente, o leve a partir da reconfiguração dos acontecimentos do seu
passado a construir um novo fenômeno para aqueles acontecimentos.
O sexto princípio que formam as leis do campo perceptual é denominado de
pragnanz. Segundo esse princípio, as figuras são formadas da melhor maneira possível.
Na clínica, esse princípio pode ser aplicado nas situações em que o cliente se sente
impotente diante de situações ocorridas no passado. O que o terapeuta deve levar o
cliente a percebe em seu próprio relato é que naquela situação as suas possibilidades de
ação e compreensão foram definidas pelas condições presentes naquele momento.
2.2 O Todo e a Parte
As noções de Todo e Parte são de fundamental importância para a construção
da Psicologia da Gestalt e da Gestalt-Terapia. Segundo Ribeiro (1985), essas noções são
importantes, pois permite a compreensão do fenômeno psicológico como uma totalidade
indivisível. Para a Psicologia da Gestalt, a compreensão dos fenômenos é imediata e
qualquer tentativa de análise por decomposição de seus elementos resulta em um dado
que não corresponde mais àquele fenômeno.
O todo e a parte se formam dentro de um campo perceptual para adquirir um
significado específico. O todo e a parte são, para a Psicologia da Gestalt e Gestalt-
Terapia, de natureza diferente entre si. Ao atentar para o todo e para a parte, a
Psicologia da Gestalt afirma que o fenômeno psicológico é formado por elementos que
não podem ser agrupados de maneira linear ou causal. Alem do mais, o todo e a parte
são instâncias conceituais móveis. Dentro de um campo perceptual, diferentes
elementos podem se constituir como todo para uma pessoa enquanto que para outro
sujeito esses elementos podem ser visto apenas como partes.
Segundo Weis (1967, Apud Ribeiro, 1985, p. 71):
[...] Todas as partes do campo desempenham algum papel na estruturação perceptual. Assim, o problema para o gestaltista não é tanto como o dado é solucionado, mas como é estruturado. Por que razão, de todas as alternativas possíveis, emerge a estrutura atual. Um dos princípios diz que, dado um todo perceptual, parte da percepção será figura [todo] e o resto fundo [parte] (grifo acrescentado).
Isso é importante, pois na prática clinica, o terapeuta da Gestalt-Terapia não
trabalha com noções fixas de todo e parte, mas atenta para os elementos que o cliente
relata procurando identificar o que para o cliente se apresenta como todo e o que se
apresenta como parte e como essa configuração veio a ser estabelecida. Essa percepção
é importante, também, pois permite ao terapeuta identificar o desenvolvimento do
cliente dentro da relação terapêutica. De um encontro para o outro, o cliente pode
elaborar questões que indicam que o seu foco existencial se deslocou para elementos
que anteriormente não havia dado suficiente atenção: elementos que julgava como
partes de outra totalidade, mas que emergem como situações existenciais completas em
si mesmas.
2.3 A Figura e o Fundo
Tanto a Psicologia da Gestalt quanto a Gestalt-Terapia, são caracterizadas por
explicitar as noções de figura e fundo como elementos importantes para a construção
de seu arcabouço teórico.
Para a Gestalt-Terapia a situação existencial do cliente é construída sobre
elementos que ele elenca como figura e fundo. A figura, no setting clínico, seria os
elementos existenciais que o cliente considera como importantes (explícita ou
implicitamente) para a construção da sua subjetividade. A figura poderia ser
compreendida como as questões que mais se evidenciam na fala desse cliente.
Por sua vez, o fundo são os elementos presentes na vida do cliente que ele não
dá a devida atenção. Na situação clínica, o trabalho do terapeuta é fazer que o cliente se
torne consciente desses elementos. O cliente pode construir o discurso da sua vida
apenas sobre aqueles elementos que lhe estão mais evidentes e negligenciar esses
elementos que em seu relato apenas são fundo.
Na prática clínica é preciso que o cliente “reconfigure” a sua imagem
perceptual sobre determinado evento a partir da relação dos elementos que
anteriormente eram o fundo. Ao relacionar esses novos elementos, o cliente pode
perceber que o significado que atribuía a determinada situação era resultado da
percepção de alguns elementos e que diante da conscientização desses novos elementos
a sua percepção é atualizada, levando a concluir que o significado daquela situação pode
ser outro.
3 KURT GOLDSTEIN, A TEORIA ORGANÍSMICA E AS INFLUÊNCIAS
SOBRE FRITZ PERLS
Uma marcante influência no desenvolvimento da Gestalt-Terapia é os estudos
desenvolvidos por Kurt Goldstein.
Fritz Perls fora aluno e assistente de Goldstein em um centro de tratamento
para soldados com lesões cerebrais, decorrentes da Primeira Guerra. Em seus estudos,
Goldstein percebeu que alterações cerebrais provocavam alterações de personalidade.
Dessa maneira, a teoria organísmica advoga que alterações na partes que formam um
todo tende a provocar uma nova configuração desse todo. Além disso, Goldstein
considerava cada caso clínico como constituindo um todo cujo significado estava
circunscrito como esse fenômeno veio a se estruturar. Dessa maneira, a teoria
organísmica de Goldstein não admitia a construção de generalizações que poderiam ser
estendidas a outros casos (Granzotto, 2005, p. 75)
Goldstein (Apud, Ribeiro, 1985, p. 107) concebe o organismo como um todo,
sendo o que ocorre as suas partes afetam esse todo. Portanto, a teoria de Goldstein
considera que esse todo não é apenas formado por componentes orgânicos, mas também
por componentes ambientais.
Segundo Ribeiro (1985), a teoria organísmica concebe a pessoa como unidade
que é integrada e consistente. Para Goldstein, a organização é uma característica natural
do indivíduo, enquanto que a sua desorganização é vista como patológica.
Além disso, o organismo é visto como constituído por partes que são diferentes
do todo. O estudo de componentes isolados não permite a compreensão do todo como
totalidade, pois as partes funcionam de forma completamente do todo. Isso que dizer
que o todo só pode ser apreendido por meio de si mesmo, pois é controlado por leis
específicas para o seu funcionamento. A compreensão de uma parte, portanto, não é
indicativo da compreensão do funcionamento do todo.
O princípio da auto-regulação é um elemento presente na teoria de Goldstein
que irá influenciar a Gestalt-Terapia de Perls. Segundo esse princípio, o organismo
procura atingir um estado de equilíbrio que permita o funcionamento adequado do todo.
Dessa maneira, não existe gestaltens boas ou más, pois elas são as respostas adequadas
que o organismo encontrou para a manutenção de seu equilíbrio.
Além do mais, o princípio da auto-regulação tem a perspectiva de conceber o
equilíbrio como dinâmico, não como elemento estático. Consequentemente, o que
poderíamos considerar como patológico na Gestalt-Terapia seria as formas encontradas
pelo cliente para manter o princípio da auto-regulação como não adequado as situações
que se apresentam ao cliente. A neurose para a Gestalt-Terapia seria uma forma
inadequada que o organismo encontrou para manter a auto-regulação que não possuía a
capacidade de se adequar as novas situações existenciais.
Essa perspectiva de auto-regulação pode ser vista nas noções de figura natural
e figura não natural (RIBEIRO, 1985, p. 109). Para Goldstein, as figuras naturais são
aqueles elementos que se adéquam a totalidade do organismo. Entre outras palavras, as
figuras naturais são harmônicas dentro do campo que circunscreve figura e fundo.
Por sua vez, a figura não natural são os elementos que não se adéquam a
configuração do campo perceptual. Essas figuras tendem a se destacar do campo
perceptual possuindo uma dinâmica diferente desse campo. No caso das neuroses, é
perceptível que as ações do sujeito neurótico durante a manifestação dessa patologia são
completamente autônomas em relação ao funcionamento do sujeito como totalidade.
Dentro do campo metodológico, a teoria organísmica de Goldstein influenciou
a Gestalt-Terapia de forma que o fenômeno psicológico deve ser apreendido em sua
totalidade, evitando-se a tendência de se analisar partes isoladas desse fenômeno.
4 AS INFLUÊNCIAS FILOSÓFICAS: A FENOMENOLOGIA, HUMANISMO E
EXISTENCIALISMO
As bases fenomenológicas que a Gestalt-terapia possui vieram por meio da
teoria do campo da Psicologia da Gestalt. Para Boris (1992 Apud MOREIRA, 2009,
p.5) a fenomenologia é fundamento metodológico comum as todas as abordagens
existenciais. Segundo Gomes e Castro (2010), a clínica fenomenológica é descrita, pela
prática médica, como uma abordagem que prima pela descrição exaustiva dos sintomas.
Karl Jaspers (1883-1969) foi pioneiro na utilização da Fenomenologia no estudo das
patologias mentais. Ele publicou o livro Psicopatologia geral.
Gomes e Castro (2010) utilizam o termo clínica fenomenológica para designar
práticas psicoterapêuticas que são conhecidas como abordagens fenomenológico-
existenciais. Essas abordagens são caracterizadas pela junção de uma filosofia a uma
metodologia para o estudo dos fenômenos das relações entre experiência e consciência.
A fenomenologia, enquanto proposta metodológica, preocupa-se com o estudo
do fenômeno. Segundo Janet (Apud GOMES e CASTRO, 2010, p. 82), o fenômeno é
fato em movimento que se transforma a cada instante. É essa definição que se agrega ao
termo Fenomenologia. Ainda segundo Gomes e Castro (2010), a fenomenologia tem
como preocupação principal entender a formação da subjetividade, que é a relação do
sujeito cognoscente com o objeto para produzir conhecimento. Edmund Husserl6
pretendia que a fenomenologia fosse o método único para todas as ciências. A proposta
da fenomenologia era ser um método capaz de fazer um conhecimento rigoroso acerca
do processo de pensamento (noesis) e acerca da compreensão do objeto (noema).
Dentro da Fenomenologia, as noções de o que e como, emergem como
preocupações fundamentais para o método fenomenológico. Ao definir o que como
noção, a Fenomenologia argumenta que os acontecimentos não são dados fixos. Esses
acontecimentos não possuem uma identidade a priori, mas são capazes de possui um
significado a partir da relação desse acontecimento com o sujeito que se apresenta como
consciência de alguma coisa. Já a noção de como emerge com importante fundamento
para a Fenomenologia, pois é responsável pela descrição como o acontecimento se
estabelece com a consciência a fim de produzir o fenômeno.
6 Para uma melhor compreensão da Fenomenologia desenvolvida por Edmund Husserl Cf. GOTO,
Tommy Akira. Introdução à Psicologia Fenomenológica: a nova psicologia de Edmund Husserl. São
Paulo: Paulus, 2008.
Dentro das contribuições da fenomenologia para a Gestalt-terapia, o conceito
de limite de contato é fundamental para a construção teórica do fenômeno psicológico
visto como totalidade. Dessa forma, Perls, ao utilizar o conceito de limite de contato,
rompe com a visão dualista ainda presente na maioria das abordagens psicológicas de
seu tempo que constroem suas bases teóricas a partir de um homem divido entre mente
e corpo, em causas internas e externas (MOREIRA, 2009; FIGUEIREDO, 1991).
Quanto ao Existencialismo dentro da Gestalt-Terapia, Boris (Apud Moreira,
2009) traça as influencias existenciais da Gestalt-Terapia ao pensamento de Kierkegard
e Nietzsche em relação a subjetividade; de Edmund Husserl em relação a noção de
intencionalidade que fundamentará a concepção de consciência desenvolvida por Perls;
de Heidegger em relação ao dasein que é o fundamento da perspectiva do homem como
capaz de realizar as categorias da existência; o pensamento sartreano que concebe o
homem como responsável pela sua própria existência e o pensamento de Martin Buber
em relação ao diálogo que será determinante na construção da Gestalt-Terapia dos
conceitos de relação e encontro.
Para Figueiredo (1991) e Moreira (2009), as influências do Existencialismo
estão presentes na noção de fuga de contato do neurótico. Para Perls, o que caracteriza a
fuga de contato do neurótico é a perda da “liberdade de escolha, não pode
selecionar meios apropriados para seus objetivos finais porque não
tem a capacidade de ver as opções que lhe estão abertas” (Perls,
1988, p. 31).
Para Matson (1985) e Ribeiro (1999), o humanismo, que é outra importante
influência na Gestalt-Terapia, busca a construção da pessoa saudável como uma gestalt
integrada. O humanismo busca dar ao cliente suporte para que ele construa a sua
autonomia. O importante é que ele venha a compreender que ele é um projeto, um vir-
a-ser que se faz no enfrentamento no mundo.
O humanismo tem seus fundamentos filosóficos na Fenomenologia de Edmund
Husserl. A fenomenologia rompe com a visão explicativa na construção do saber
científico até então hegemônica e propõe a construção de um conhecimento descritivo.
Para Husserl, a construção de um saber explicativo deixa de lado toda a vitalidade do
fenômeno. Ao propor um modelo descritivo, Husserl pretende demonstrar que o
fenômeno é uma inter-relação entre sujeito-objeto. Nessa relação, sujeito é objeto
inexistem independentemente um do outro. Ambos, portanto, fazem-se mutuamente. O
fenômeno se faz evidente apenas para uma consciência que é sempre uma consciência
de alguma coisa. Por conseguinte, a fenomenologia descarta a construção de
conhecimento científico por uma via causal e constrói um modelo de conhecimento que
privilegia a relação intrínseca entre sujeito-objeto.
5 OS FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA GESTALT-TERAPIA: OS CONCEITOS
A Gestalt-terapia foi desenvolvida nos anos 1950 por Fritz Perls, tendo como
co-fundadores Paul Goodman e Ralph Hefferline. A Gestalt-terapia é caracterizada por
buscar o desenvolvimento do cliente por meio awareness. O awareness é fundamental
para que o cliente tome consciência das suas relações como o mundo interno (consigo
mesmo) e com o mundo externo (a sua relação com os outros).
O awareness pode ser considerado como a pedra basilar da Gestalt-Terapia.
Embora seja um conceito fundamental a sua tradução para a língua portuguesa é difícil,
pois esse termo possui múltiplas significações:
Awareness é uma palavra que não possui correspondente preciso em nosso idioma. Em geral é traduzida por ‘consciência’, porém seu significado é muito mais amplo. No sentido psicológico, o equivalente em inglês de ‘consciência’ seria consciousness. Awareness, porém, possui uma conotação que transcende este sentido, envolvendo um aspecto maior de ‘consciência’. Assim, awareness pode significar ‘consciência’, ‘conhecimento’, ‘ciência’, ‘atenção’, ‘percepção’, ou ‘sensação da presença de algo. (BARROS Apud STEVENS, 1977a, p. 11)
O melhor termo em língua portuguesa para designar awareness é tornar-se
presente. O tornar-se presente não envolve apenas a tomada de consciência de
elementos que o cliente antes não havia dado a devida atenção. O tornar-se presente
envolve, além disso, a idéia que a vida existencial do cliente está em constante
movimento. As coisas não são, mas estão em um estado que é permanentemente
modificado. Ao se dar conta desse aspecto, o cliente começa a perceber que a sua
situação existencial lhe permite a escolha de outras possibilidades de existência.
O tornar-se presente pode ser também compreendido como:
Nela fica implícito o caráter dinâmico e de processo no termo ‘fluxo’; a finalidade do método de facilitar a discriminação e de promover a maior precisão no contato com a figura emergente, através do termo ‘focalizado’; e ‘associativo’, na medida em que a focalização poderá levar à produção de novas cadeias de relações de significado. (LOFFREDO, 1994, p. 128).
Além disso, o tornar-se presente pode ser também compreendido como a
conscientização do cliente em relação ao seu campo perceptual:
Awareness é, para Perls, a sua habilidade humana de estar em contato com seu campo perceptual total. É a capacidade de estar em contato com sua própria existência, de notar o que ocorre dentro de você ou à sua volta, de conectar com o ambiente, com outras pessoas e com você mesmo; saber a que você está sensível ou o que está sentindo ou pensando; como você está reagindo neste momento. Awareness não é somente um processo mental: ela envolve todas as experiências, sejam elas físicas ou mentais, sensórias ou emocionais. É um processo conjunto no qual a totalidade do organismo está engajada: ‘Awareness é como a brasa de um carvão, que provém de sua própria combustão (o organismo total)’. (PERLS, HEFFERLINE E GOODMAN, 1951/1973, p. 106 Apud VERAS, 2005, p. 44)
O tornar-se presente permite ao cliente tomar compreensão da sua vida
existencial como uma totalidade. Ele deixa de se ver como objeto dividido e toma
consciência que é um todo. Todas as suas ações e pensamentos expressam não facetas
dividas de sua personalidade, mas expressam sim a vivência de um ser total, indivisível.
Na terapia o cliente se percebe, de início, como ser dividido, onde a neurose se expressa
como elemento marcante da sua vida. Pensa-se que o cliente que procura a clínica busca
a integração de suas partes divididas. Então, conclui-se que o terapeuta tem como um
dos seus objetivos fazer que o cliente deixe de ser ver como ente dividido e se perceba
como totalidade. Essa imagem de totalidade apenas se torna emergente e presente
quando o cliente aceita a manifestação da neurose como elemento constituinte de sua
totalidade. O que ocorre é que o cliente vê as ações que constituem a sua neurose como
elemento estranho a sua própria vida. A neurose é um intruso para o cliente. É apenas
quando o cliente aceita a neurose como elemento que faz parte da sua existência e que
lhe diz muito sobre si como ente no mundo, é que o cliente pode vislumbrar a
integração e se ver como um todo.
Outro importante conceito que está intimamente relacionado com o conceito de
awareness é o conceito de aqui e agora. Aqui e agora se apresentam como noções que
evocam as influências da Psicologia da Gestalt e da Fenomenologia, bem como do Zen-
budismo. A Gestalt-Terapia na sua prática clínica não visa a construção de explicações
causais, o que é evidente em outras abordagens como a Psicanálise e o Behaviorismo.
Qualquer teoria que busque explicações causais está pressupondo que o
fenômeno tem uma origem e que se desenvolveu por meio de uma sucessão de
elementos que formam uma cadeia. Para essa perspectiva, o fenômeno é
incompreensível a partir do seu momento presente; é preciso que se faça uma análise
retrospectiva a fim de encontrar os seus elementos causais.
A Gestalt-Terapia discorda dessa posição. Para essa abordagem, o momento
presente é o elemento mais importante para a compreensão do fenômeno psicológico.
Os elementos que constituem o fenômeno estão presentes no momento em que o cliente
relata a sua vida ao terapeuta. Mesmo que o cliente relate o que aconteceu no passado, o
terapeuta deve fazer que o cliente atente que esse relato não é passado, pois lhe evoca,
no presente, sensações e sentimentos. Perguntas como “Como você está se sentindo ao
falar isso? Você está notando a mudança da sua voz ao falar isso?” podem fazer com
que o cliente se dê conta do aqui e agora da sua situação existencial. Loffredo (1994
Apud, VERAS, 2005, p. 126) argumenta que a noção de aqui e agora desenvolvida por
Perls tem forte influencia da filosofia de Henri Bergson. Bergson argumenta que o
tempo não é uma instância fisicamente mensurável, mas que o tempo é uma
temporalidade. Passado, Presente e Futuro não são instâncias estanques entre si.
Passado, Presente e Futuro são um amálgama. A divisão espacial do tempo é útil como
instrumento metodológico paras as Ciências Naturais, mas para o fenômeno psicológico
se mostra como instrumento deficiente. Como pode o terapeuta denominar de passado
aquilo que faz um cliente chorar ou sentir vergonha no momento em que fala?
Dessa maneira é importante para o terapeuta que escolhe a Gestalt-Terapia
como profissão-de-fé leve o seu cliente a perceber que aquilo que ele fala é uma
gestalten inacabada que lhe exige que seja “fechada”.
O último tripé conceitual fundamental na Gestalt-Terapia é a famosa noção de
figura e fundo. Essa noção já foi anteriormente explicada quando abordamos as
influências da Psicologia da Gestalt para a formação da Gestalt-Terapia. Segundo essa
noção, a percepção de um acontecimento como fenômeno é decorrente da organização
de elementos que emergem como figura (aquilo que é mais evidente para o cliente) e
elementos que formam a moldura para a figura que é denominada de fundo (aquilo que
se mostra como elemento irrelevante para o cliente, mas que é fundamental para a
elaboração da figura enquanto fenômeno).
Bezerra (2007) destaca que um dos conceitos também importantes para a
Gestalt-Terapia é o conceito de necessidade. Esse conceito guarda uma íntima relação
com a teoria organísmica de Goldstein. Tanto para essa teoria quanto para a Gestalt-
Terapia, as gestalten são formadas a partir de necessidades que devem ser supridas para
a manutenção do equilíbrio. Dessa forma, as patologias na Gestalt-Terapia são
concebidas como gestalten inacabadas que não foram fechadas. E, na prática clínica,
cabe ao terapeuta junto com o cliente identificar essas gestalten para que sejam fechadas
da melhor forma possível.
O conceito de contato é um elemento capital na Gestalt-Terapia. Esse conceito
diz respeito às zonas de contato que constituem zonas que formam a existência de todos
os sujeitos. Para a Gestalt-Terapia a percepção do mundo e de si mesmo, é construída a
partir das relações que as zonas de contato estabelecem entre si. Segundo Stevens
(1977), o contato é formado por três: mundo exterior; mundo interior e atividade de
fantasia.
A zona de contato que é denominada de mundo exterior é a zona que o cliente
percebe o que está a sua volta. O que o cliente vê, ouve, cheira fazem parte dessa zona.
Algumas vezes, na situação terapêutica é preciso que o cliente se torne consciente
(torne-se presente) do mundo externo. Muitas vezes o cliente está envolvido nas zonas
de fantasia que não permitem que ele perceba o outro a sua volta.
A segunda zona de contato é representada pelo mundo interior. Na Gestalt-
Terapia o corpo é uma valiosa fonte de auto-conhecimento. Os exercícios corporais que
são desenvolvidos pela Gestalt-Terapia têm a função de fazer o cliente perceber aquilo
que o seu corpo diz. Ao relatar situações, o cliente exibe uma série de reações corporais:
a voz diminui de volume, o corpo de encolhe, etc. Portanto, essas alterações corporais
são importantes na terapia e é necessário que o terapeuta leve o cliente a se tornar
consciente disso, pois o seu corpo fala também dos seus sentimentos.
A terceira zona de contato é a zona da atividade de fantasia. É nessa zona de
contato que são estabelecidas as relações entre passado, presente e futuro. Na clínica,
pode-se clientes que estão imersos em acontecimentos que estão no passado ou em
expectativas em relação ao futuro. O que acontece quando um cliente está “preso” a
uma dessas instâncias é que o seu contato com o aqui e agora, o presente, é deficiente
ou ausente. Então, a postura do terapeuta é fazer que o cliente torne o passado ou futuro
ao seu devido termo e entre em contato com o presente. O passado e o futuro são
importantes para a vida psíquica do cliente, contudo, a sua relação existencial deve estar
voltada para o aqui e agora.
6 AS TÉCNICAS: O TRABALHO DO TERAPEUTA NA CLÍNICA
GESTÁLTICA
A Gestalt-Terapia é caracterizada por ser uma abordagem psicoterapêutica rica
em técnicas. Dentro deste trabalho destacaremos algumas dessas técnicas para
demonstrar a grande versátilibilidade da abordagem gestáltica na clínica.
A técnica mais conhecida da Gestalt-Terapia é a técnica da cadeira quente7.
Essa técnica consiste em dispor duas cadeiras, uma de frente para outra, onde o cliente
irá sentar nelas alternadamente. Quando estiver em uma das cadeiras, o cliente deverá
agir de uma forma e quando estiver na outra cadeira deverá agir de maneira diferente. O
princípio dessa técnica é fazer que o cliente entre em contato com partes de sua
personalidade que não dá a devida atenção, que pode ser resultante de medo, vergonha,
etc. Portanto, o cliente irá entrar em contato com a parte rejeitada da sua personalidade
(Cf. MARTÍN, 2008, p. 154).
O exercício das zonas de consciência é uma técnica importante na Gestalt-
Terapia, pois leva o cliente a se tornar consciente das zonas de consciência que são
responsáveis pela sua relação com o mundo, tanto o mundo externo e interno. Esse
exercício é feito da seguinte maneira: estando o cliente relaxado (sentado ou deitado) e
de olhos fechados, peca que ele diga a seguinte frase:
Cliente – Agora tenho presente...
Essa frase será preenchida com que o cliente estiver sentindo no momento, seja
sensações corporais, sensações que ocorrem ao seu redor ou pensamentos que lhe
ocorrem. O importante nessa técnica é leva o cliente a tornar-se consciente como essas
zonas de consciência são responsáveis pela percepção que o cliente tem de si mesmo e
do mundo (Cf. STEVENS, 1977, p. 25).
Uma das técnicas mais simples da Gestalt-Terapia é a técnica do sim... e... ,
em contraposição ao sim... mas.... Essa técnica visa desenvolver a autonomia no cliente
que é muitas das vezes carente dessa autonomia (MARTÍN, 2008). A execução dessa
técnica consiste que o cliente diga uma situação que lhe exija uma tomada de decisão e
onde ocorrer a conjunção “mas” ele substitua por “e”. Em uma situação hipotética um
cliente pode falar o seguinte:
Cliente – Eu quero ir a Belo Horizonte, mas não posso ir por causa das provas
do final do curso.
7 Em inglês essa técnica é conhecida como hot seat.
Terapeuta – Repita essa frase colocando “sim” e “e”.!
Cliente – Sim, eu quero ir a Belo Horizonte e não vou a essa cidade porque
tenho que fazer as provas do final do curso.
Uma técnica similar que tem como objetivo desenvolver a autonomia e a
responsabilidade de si mesmo é a técnica de tornar-se responsável. É técnica é usada
no setting terapêutico individual ou em grupo, pois é considerada como um jogo, o que
implica que não pode ser usada em situações fora da terapia. O cliente deve dizer que
sente ou faz algo e se torna responsável por isso (MARTÍN 2008).
Cliente – Eu estou zangado com a minha mãe.
Terapeuta – Responsabilize por isso.
Cliente – Eu estou com zangado com minha mãe e me responsabilizo por isso.
Outra técnica importante é a transformação de perguntas em afirmações.
Essa técnica também objetiva dar ao cliente desenvolver a autonomia. Toda pergunta
deve ser transformada em afirmação:
Cliente – Você está lendo esse livro?
Terapeuta – Transforme essa pergunta em afirmação.
Cliente – Eu vejo que você está com esse livro e o está lendo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Gestalt-Terapia é uma abordagem psicológica que privilegia a tomada de
uma ação de conscientização do cliente em relação a sua vida existencial. Diante disso,
a abordagem desenvolvida por Fritz Perls vai buscar fundamentos teóricos nas mais
variadas fontes.
A Gestalt-Terapia busca seus fundamentos teóricos na Psicologia da Gestalt,
passando pela Psicanálise, chegando, por fim as filosofias existenciais e a
Fenomenologia.
A Psicologia da Gestalt fornece o método fenomenológico a Gestalt-Terapia,
pois justifica a constituição de uma abordagem psicoterapêutica que descarta modelos
explicativos a priori e busca na relação entre terapeuta e cliente a construção de
significados. Portanto, o terapeuta, na abordagem gestáltica, não aparece como um
identificador de patologias psicológicas, mas como sujeito que ajudar o cliente a
clarificar a sua vida existencial, pois a própria terapia emerge como um dos elementos
que constituem a condição existencial desse cliente.
Além de fornecer o método fenomenológico, a Psicologia da Gestalt emprestou
a Gestalt-Terapia as leis sobre o campo perceptual que fundamentam a compreensão,
para o terapeuta, sobre como os significados são construído pelo cliente diante da
estruturação dos elementos que compõe um acontecimento.
Quanto, a teoria organísmica de Kurt Lewin, percebe-se que a Gestalt-Terapia
toma emprestado uma perspectiva positiva em relação a condição de restabelecimento
do cliente. Primeiramente, a idéia que o organismo é um todo é fundamental para pensar
o cliente como uma totalidade. Nessa perspectiva, o adoecimento não é apenas de uma
parte especifica (corpo ou mente), mas é visto como o adoecimento do organismo
inteiro, pois a modificação de uma determinada parte do organismo resulta em uma
reconfiguração desse organismo como um todo. Na clínica gestáltica, essa perspectiva é
vista quando o cliente relata a sua condição existencial, pois o cliente não adoece apenas
de uma parte: ele adoece como todo existencial. A sua doença se manifesta em todas as
instancias da sua vida (na escola, na família, etc.).
O Humanismo e o Existencialismo aparecem, também, como importantes
contribuições para a formação da abordagem gestáltica. O Humanismo fornece à
abordagem de Fritz Perls a crença no homem como centro. O homem como totalidade e
a sua constituição como fundamento de toda a relação na clínica é a preocupação
máxima da Gestalt-Terapia como prática psicoterapêutica.
Junto a essa perspectiva, emerge o Existencialismo. O Existencialismo torna o
homem como responsável pela sua própria existência. O significado da existência
apenas emerge quando o homem se coloca no mundo como ente sem um sentido a
priori. Na clínica gestáltica, essa influencia aparece como a preocupação que o terapeuta
tem de fazer que o seu cliente tome a responsabilidade sobre si mesmo em relação a sua
existência. Para o Existencialismo e para a Gestalt-Terapia, não há como o homem
dividir a sua responsabilidade da sua existência com o outro. De uma forma ou de outra,
o homem sempre será responsável por si mesmo.
A Gestalt-Terapia é, por fim, caracterizada por possui conceitos e técnicas que
lhe são únicas. Dentro do referencial teórico da Gestalt-Terapia, destacam-se os
conceitos de awareness, contato, necessidade e aqui e agora. E quanto as técnicas que
são numerosas, podemos destacar as técnicas da cadeira quente, sim... e ...,
REFERÊNCIAS
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FIGUEIREDO, L. C. Matrizes do pensamento psicológico. Rio de Janeiro: Vozes, 1991.
GRANZOTTO, Rosane Lorena. Gênese e construção de uma “filosofia da gestalt” na Gestalt-Terapia, 2005. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Santa Catarina, Santa Catarina.
GOMES, William Barbosa; CASTRO, Thiago Gomes de. Clínica Fenomenológica: do método de pesquisa para a prática psicoterapêutica. v. 26, n. especial, Psicologia: Teoria e Pesquisa, 2010, pp. 81-93.
GOLDSTEIN, Kurt. The Organism. Nova Iorque: American Book, 1939.
LOFFREDO, A. M. A cara e o rosto: ensaio sobre Gestalt- Terapia. São Paulo: Escuta, 1994.
MATSON, Floyd W. Teoria Humanista: A terceira Revolução em Psicologia. In: GREENING, Thomas C. (org.). Psicologia Existencial–Humanista. Rio de Janeiro: Zahar, 1985. p.67-82.
MARTÍN, Ángeles. Manual prático de psicoterapia gestalt. Petrópolis: Vozes, 2008.
MOREIRA, Virgínia. A Gestalt-terapia e Abordagem Centrada na Pessoa são enfoques fenomenológicos? v. 15, n. 1..Revista da Abordagem Gestáltica, 2009, pp. 3-12.
PERLS, F. S.; HEFFERLINE, R.; GOODMAN, P. Gestalt-terapia. São Paulo: Summus, 1997.
RIBEIRO, José Ponciano.Gestalt-terapia: refazendo um caminho. 2 ed. São Paulo: Summus, 1985.
____________________. Gestalt-terapia de curta duração. São Paulo: Summus,1999.