-
0
SIMONE ALVES SCARAMUZZA
O BEM-ESTAR DOCENTE NO CONTEXTO DE ESCOLAS
INCLUSIVAS: UM ESTUDO COM PROFESSORES DA REDE
MUNICIPAL DE ENSINO DE JI-PARAN RO
Dissertao apresentada ao curso de Mestrado, do
Programa de Ps-Graduao Educao da
Universidade Catlica Dom Bosco, como parte dos
requisitos para obteno do grau de Mestre em
Educao.
rea de Concentrao: Educao
Orientadora: Flavins Rebolo
UNIVERSIDADE CATLICA DOM BOSCO
CAMPO GRANDE - MS
FEVEREIRO 2015
-
1
-
2
-
2
Descobri que a felicidade no algo que acontece; no o
resultado da boa sorte ou do acaso. No algo que o dinheiro possa
comprar ou que o poder possa controlar. No depende de
acontecimentos. A felicidade, na realidade, um estado que precisa
ser preparado, cultivado e defendido por todos ns
(Csikszentmihalyi, 1992)
-
3
DEDICATRIA
Aos meus pais Osano e Maria Isabel
Ao Genivaldo
A minha irm Rozane e ao Jonatha
Ao meu irmo Eduardo e sua famlia
As minhas avs Dolores e Creuza (in memoriam) e aos meus avs Antnio e Lourival
A todos os docentes
-
4
AGRADECIMENTOS
Agradeo imensamente a minha orientadora Professora Doutora Flavins Rebolo,
por ter me inspirado e encaminhado na pesquisa.
Da mesma forma agradeo as professoras do Programa: Marta Regina Brostolin,
Maria Aparecida de Sousa Perrelli , Maria Cristina Lima Paniago, Ruth Pavan e Mariluce
Bittar (in memoriam) que se fizeram presentes durante esta caminhada acadmica.
Meus agradecimentos tambm vo para a CAPES/PROSUP, por ter financiado a
pesquisa com uma bolsa de estudos que foi imprescindvel para que conseguisse realizar este
trabalho.
Fao aqui um agradecimento especial aos docentes investigados por terem
colaborado com esta pesquisa e SEMED de Ji-Paran, por ter oportunizado a realizao da
pesquisa nas escolas da Rede.
Aos meus colegas de turma do mestrado e do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre
Formao, Trabalho e Bem-estar Docente GEBem, por terem contribudo com o apoio e
companhia durante este perodo de formao acadmica.
minha famlia: meu pai Osano, minha me Maria Isabel, minha irm Rozane,
meu cunhado Jonatha, meu irmo Eduardo, minha cunhada Jane e a minha sobrinha Isabelly
por terem compreendido minha ausncia e, por diversas vezes, terem me ouvido e dado fora
durante este processo.
Em especial, agradeo ao meu esposo Genivaldo, por ter me apoiado em minhas
preocupaes e anseios durante este processo.
Agradeo a todos que fizeram parte de minha trajetria de vida e, ao longo da
pesquisa, puderam colaborar comigo. Enfim, para os que de alguma forma contriburam nesta
dissertao de mestrado, muito obrigada!
-
5
SCARAMUZZA, Simone Alves. O Bem-Estar Docente no Contexto de Escolas
Inclusivas: um estudo com professores da rede municipal de ensino de Ji-Paran RO.
Campo Grande, 2015. 167p. Dissertao (Mestrado) Universidade Catlica Dom Bosco.
RESUMO
Este trabalho vincula-se linha de pesquisa Prticas Pedaggicas e suas Relaes com a
Formao Docente do PPGE em Educao da Universidade Catlica Dom Bosco. Nesta
pesquisa buscou-se investigar os fatores que possibilitam ou dificultam o bem-estar dos
professores que atuam nos anos iniciais do ensino fundamental, em escolas da Rede
Municipal de Educao de Ji-Paran, Rondnia, e que possuem alunos deficientes inclusos.
Os objetivos especficos foram: identificar o grau de satisfao/insatisfao desses professores
com o trabalho docente e com sua formao inicial e continuada e identificar as estratgias de
enfrentamento utilizadas pelos professores frente s situaes adversas do cotidiano escolar.
O referencial terico apoia-se na Psicologia Positiva com os autores: Csikszentmihalyi; Jesus;
Rebolo; Seligman, entre outros; e em autores das Cincias da Educao: Tardif e Lessard;
Nvoa; Imbernn, entre outros que abordam o trabalho e a formao docente. Utilizando a
abordagem qualitativa, os dados foram coletados por meio de questionrio e entrevistas
semiestruturadas. O questionrio foi aplicado em outubro e novembro de 2013 em vinte
professores, sendo dois homens e seis mulheres. As entrevistas foram realizadas com seis
professoras, no perodo de janeiro a abril de 2014. Os resultados mostram que a maioria dos
docentes est satisfeita com o trabalho. As docentes entrevistadas afirmaram que, no incio da
carreira, as emoes vividas foram de medo e insegurana, mas que tambm houve
encantamento; sobre a formao, algumas afirmaram que a graduao no contribuiu de
forma efetiva para a docncia; apontam a precariedade das condies de trabalho e
consideram a incluso como necessria e desafiante, mas que no houve a preparao
necessria dos professores para atuar de forma eficiente com os alunos com deficincias. O
enfrentamento das dificuldades para a realizao do trabalho foi feito por meio dos
planejamentos de aula, diviso da classe por nvel de desenvolvimento, com reforo, com o
distanciamento do problema e com buscas de informaes e contedos na internet. Esses
enfrentamentos contriburam para a construo do bem-estar dessas professoras.
Palavras-Chave: Bem-estar docente. Educao Inclusiva. Trabalho Docente. Professores.
-
6
SCARAMUZZA, Simone Alves. The well being Lecturer in the School Context
Inclusive: a study of teachers of municipal Ji -Paran teaching - RO. Campo Grande,
2015. 167p. Dissertation (Master ) Dom Bosco Catholic University.
ABSTRACT
This work is linked to the to a research on teaching practices and their relations with the
training PPGE Lecturer in education at the Catholic University Dom Bosco. This study aimed
to investigate the factors that enable or difficult the well- being of teachers who work in the
early years of elementary school, at the Municipal Network of schools in Ji-Parana, Rondnia,
and have included disabled students. The specific objectives were to identify the level of
satisfaction / dissatisfaction of these teachers with teaching and with their training and to
identify the coping strategies used by teachers against the adverse situations of everyday
school life. The theoretical framework is based on Positive Psychology to the authors as:
Csikszentmihalyi; Jesus; grinding wheel; Seligman, among others; and authors of Educational
Sciences: Tardif and Lessard; Nvoa; Imbernon, among others that address the work and
teacher training. Using a qualitative approach, data were collected through questionnaire and
semi-structured interviews. The questionnaire was administered in October and November
2013 with about twenty teachers, two men and six women. Interviews were conducted with
six teachers, from January to April 2014. The results show that the majority of teachers are
satisfied with the work and envoriment. The teachers interviewed said that early in his career,
the experienced emotions were fear and insecurity, but there was also charming; on training,
some of them said that graduation did not contribute effectively to the teaching; point to poor
working conditions and consider inclusion as necessary and also challengable, but this
requires the necessary preparation of teachers to work effectively with students with
disabilities. The face difficulties to carry out the work was done through lesson plans, class by
level of development division, with reinforcement, with the distance of the problem and
search for information and content on the Internet. These confrontations have contributed to
the construction of the welfare of these teachers.
Keywords: Teacher Welfare. Inclusive Education. Teaching Work. Teachers.
-
7
LISTA DE SIGLAS
AEE Atendimento Educacional Especializado
APAE Associao de Pais e Amigos dos Excepcionais
CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira
PPGE Programa de Ps-Graduao em Educao Mestrado e Doutorado
SEMED Secretaria Municipal de Educao de Ji-Paran
UCDB Universidade Catlica Dom Bosco
UNESCO Organizao das Naes Unidas para a Educao, Cincia e Cultura
-
8
FIGURA
Figura 01 Esquema demonstrativo de fases da carreira docente proposto por
Huberman (2007, p. 47).......................................................................................................
29
-
9
MAPA
Mapa 01 localizao aproximada das escolas municipais de Ji-Paran investigadas
nesta pesquisa......................................................................................................................
65
-
10
LISTA DE GRFICOS
Grfico 01 Perfil scio demogrfico dos docentes participantes da
pesquisa................................................................................................................................
75
Grfico 02 Nvel de formao dos docentes participantes da
pesquisa................................................................................................................................
76
Grfico 03 Deficincias dos alunos includos atendidos pelos docentes participantes
da pesquisa...........................................................................................................................
77
Grfico 04 Grau de satisfao dos docentes com os fatores do componente da
atividade laboral..................................................................................................................
79
Grfico 05 Grau de satisfao dos docentes com os fatores do componente
relacional..............................................................................................................................
81
Grfico 06 Grau de satisfao dos docentes com os fatores do componente
scioeconmico....................................................................................................................
84
Grfico 07 Grau de satisfao dos docentes com os fatores do componente
infraestrutural.......................................................................................................................
86
Grfico 08 Grau de satisfao dos docentes com o estado geral de tenso (estresse)
pessoal..................................................................................................................................
88
Grfico 09 Grau de satisfao dos docentes com a sensao de bem-estar no
trabalho/na escola.................................................................................................................
89
-
11
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Distribuio de matrculas de alunos deficientes nos anos iniciais do
ensino fundamental da Rede Municipal de Educao de Ji-Paran..................................
48
Quadro 02 Matrculas de alunos no Municpio de Ji-paran, Rondnia............... 64
Quadro 03 - Quadro de trabalhos encontrados com o levantamento realizado no banco
de teses da CAPES...........................................................................................................
66
Quadro 04 - Perfil das docentes entrevistadas.................................................................. 103
-
12
SUMRIO
1. INTRODUO.............................................................................................................. 14
2. FORMAO DE PROFESSORES, EDUCAO INCLUSIVA E BEM-ESTAR
DOCENTE.........................................................................................................................
21
2.1 A formao de professores histria e tendncias no Brasil........................................ 22
2.1.1 Profissionalidade, profissionalizao e trabalho docente................................... 26
2.1.2 A formao docente continuada para a atuao no contexto de escolas inclusivas.... 36
2.2 A Escola Inclusiva contextualizando o processo de incluso dos alunos deficientes
(histria, legislaes, conceitos)..........................................................................................
40
2.2.1 A educao inclusiva nas escolas da Rede Municipal de Educao de Ji-Paran
Rondnia..............................................................................................................................
45
2.3 O bem-estar docente....................................................................................................... 48
2.3.1 Pensando a formao continuada para uma prtica educativa inclusiva que
possibilite o bem-estar docente............................................................................................
56
3. DESCREVENDO OS PROCEDIMENTOS DA PESQUISA E O CAMPO
EMPRICO ........................................................................................................
62
3.1 Quem est sendo investigado? Apresentando e contextualizando os professores......... 62
3.2 Dos procedimentos da reviso de literatura um levantamento sobre os estudos j
efetivados.............................................................................................................................
66
3.3 O questionrio como um instrumento de coleta de dados............................................. 69
3.4 A entrevista semiestruturada como procedimento de coleta de dados........................... 71
4. DIALOGANDO COM OS DADOS PRODUZIDOS COM O QUESTIONRIO..
74
4.1 Perfil scio demogrfico dos professores participantes da pesquisa............................ 74
4.2 Grau de satisfao dos docentes com os fatores dos quatro componentes do
trabalho.................................................................................................................................
78
4.3 O grau de satisfao dos professores com os fatores de estado geral de tenso
(estresse) pessoal e a sensao de bem-estar no trabalho/na escola inclusiva: o que falam
os docentes sobre questes ligadas satisfao e a atividade docente e as estratgias de
enfrentamento utilizadas......................................................................................................
87
-
13
4.3.1 Grau de satisfao com os fatores com os fatores de estado geral de tenso
(estresse) pessoal e a sensao de bem-estar no trabalho/na escola....................................
87
4.3.2 Aspectos que facilitam ou possibilitam a satisfao dos professores com o/no
trabalho.................................................................................................................................
90
4.3.3 Aspectos que impedem ou dificultam a satisfao dos professores com o/no
trabalho.................................................................................................................................
96
4.3.4 As estratgias de enfrentamento dos professores para superar as dificuldades e
alcanarem o bem-estar........................................................................................................
100
5. DIALOGANDO COM OS DADOS PRODUZIDOS COM AS ENTREVISTAS....
102
5.1 A escolha pela profisso................................................................................................ 104
5.2 O que dizem as docentes sobre o processo formativo................................................... 108
5.3 O incio da carreira: as impresses e emoes vividas e relatadas pelas
docentes...............................................................................................................................
117
5.4 As percepes das docentes sobre a prtica educativa.................................................. 122
5.5 O processo de incluso de alunos deficientes nas salas regulares: o que pensam e
dizem as docentes.................................................................................................................
127
5.6 As estratgias de enfrentamento utilizadas pelas docentes para superar as
dificuldades do dia a dia da atividade laboral......................................................................
136
6. CONSIDERAES FINAIS .......................................................................................
141
7. REFERNCIAS.............................................................................................................
145
APNDICES
Apndice A Questionrio................................................................................................. 156
Apndice B Roteiro de entrevista semiestruturada.......................................................... 160
Apndice C Modelo Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.............................. 162
Apndice D Convite enviado aos professores................................................................ 166
-
14
1. INTRODUO
Meu envolvimento com a educao inclusiva voltada para os alunos deficientes
teve incio na graduao, onde tive a oportunidade de participar como bolsista do Programa
Institucional de Iniciao Cientfica PIBIC/UNIR/CNPq no perodo de 2009-2010. Naquele
perodo desenvolvi, no mbito do projeto Incluso escolar e prticas pedaggicas voltadas s
pessoas com necessidades educativas especiais, o subprojeto Currculo e Educao
Inclusiva: em busca de aproximaes, que tinha por objetivo, investigar junto aos professores
da Rede Municipal de Educao de Ji-Paran quais as concepes sobre a educao inclusiva
e quais as propostas metodolgicas utilizadas pelos docentes frente a incluso de alunos
deficientes nas salas regulares. Com esta pesquisa verificou-se que, embora grande parte dos
professores soubesse de alguma forma conceituar a educao inclusiva, naquele momento eles
no tinham ferramentas metodolgicas adequadas para efetivar a educao inclusiva. Os
resultados apontaram a existncia de uma ampla fragilidade referente s discusses sobre a
temtica. Mostraram ainda que os professores no possuam conhecimentos adequados a
respeito do currculo diferenciado e de sua importncia na promoo de mudanas no mbito
escolar (SCARAMUZZA, 2011).
Posteriormente, em 2011, retornei ao mesmo campo para investigaes que
pudessem subsidiar a elaborao do trabalho de concluso do curso de Pedagogia intitulado
Educao Inclusiva: reflexes necessrias, um debate emergente. Para este trabalho, foi
realizada uma pesquisa em quatro (04) escolas que tambm fizeram parte da pesquisa
anterior. O objetivo era produzir uma comparao entre os dados da primeira pesquisa com os
-
15
novos e quais mudanas tinham ocorrido no mbito da educao inclusiva. Esta pesquisa
permitiu identificar que, naquele momento, a Rede Municipal de Educao de Ji-Paran ainda
no apresentava em sua totalidade uma educao inclusiva com a qualidade e a efetivao
desejada pelos instrumentos normativos legais. Tal situao deixou evidente que ainda se
fazia necessrio investir na formao de professores e que era preciso rever as estruturas
administrativa, pedaggica e fsica das escolas.
Com as pesquisas realizadas na graduao, foi possvel perceber a necessidade de
pesquisar algumas questes que implicavam a efetivao da educao inclusiva no mbito das
escolas municipais de Ji-Paran, tais como, as diversas realidades existentes na constituio
do trabalho docente, o processo de incluso de alunos com deficincia e sua relao com a
gerao de insatisfao e satisfao dos professores. Cabe mencionar que naquele momento,
no dispunha de um campo terico capaz de subsidiar provveis respostas a estas questes, o
que foi possvel com minha insero no Programa de Ps-Graduao em Educao
Mestrado da Universidade Catlica Dom Bosco UCDB.
Pensar em educao inclusiva nas escolas da Rede Municipal de Ensino ,
sobretudo, refletir sobre um atendimento que tem como pblico, educandos com
caractersticas diversificadas. Para isso, preciso que as instituies escolares proporcionem
um ambiente de aprendizagem que seja seguro e acessvel para todos que dele necessita.
possvel afirmar que, as prticas pedaggicas em uma escola inclusiva precisam refletir uma
abordagem mais diversificada, flexvel e colaborativa (PACHECO et al., 2007, p.15). Nessa
dissertao, optou-se por trabalhar com o termo alunos deficientes, por concordar com Rosana
Glat e Marcia Pletsch (2011) quando consideram que o termo necessidade educacional
especial no o mesmo que deficincia (GLAT; PLETSCH, 2011, p. 22). Cabe mencionar
que para essas autoras, o termo necessidade educacional especial abrange a toda uma
demanda que ultrapassa os alunos com deficincia. Assim, no contexto desta dissertao,
entende-se como alunos deficientes, aqueles que apresentam deficincias sensoriais (auditiva
e visual), intelectual (mental), fsicas ou mltiplas; transtornos globais do desenvolvimento
(autismo, sndrome de Asperger, de Rett etc.); e altas habilidades (superdotao). (GLAT;
PLETSCH, 2011, p. 20).
A partir da experincia na graduao, bem como das leituras efetivadas no
PPGE/UCDB, levantou-se os seguintes questionamentos: Quais so os fatores que
possibilitam a construo do bem-estar para os professores que atuam em sala regular e que
tem alunos com deficincia inclusos? Qual o grau de satisfao e insatisfao dos
professores com a sua formao inicial e continuada e como essa formao contribuiu, ou
-
16
no, para a melhoria do bem-estar docente? Quais so as estratgias de enfrentamento dos
professores s situaes adversas no cotidiano escolar inclusivo?
Visando responder essas perguntas, destaca-se como objetivo geral da
investigao, compreender os fatores que possibilitam a construo do bem-estar docente para
os professores atuantes nas salas de ensino regular que tenham alunos com deficincia. Os
objetivos especficos so: Identificar o grau de satisfao e insatisfao com os fatores do
trabalho dos professores atuantes nas salas de ensino regular que tenham alunos com
deficincia inclusos; Identificar o grau de satisfao e insatisfao dos professores com a
formao inicial e continuada e como essa formao contribuiu, ou no, para a melhoria do
bem-estar docente; Identificar as estratgias de enfrentamento utilizadas pelos professores
frente s situaes adversas do cotidiano escolar.
Compreender as caractersticas do trabalho docente, do bem-estar e do mal-estar,
e a caracterizao da escola inclusiva no municpio de Ji-Paran RO impeliu investir na
pesquisa, esperando contribuir para a melhoria, tanto de estratgias de relacionamento entre
diversos contextos educativos, como tambm, disponibilizando reflexes que inspirem
mudanas, principalmente na promoo de polticas pblicas que visem o bem-estar para os
docentes.
A partir das questes elencadas e dos objetivos propostos, em um levantamento
sobre estudos j efetivados, percebeu-se que existem trabalhos que discutem formao de
professores, educao inclusiva e bem-estar/mal-estar docente. Entretanto, no foram
encontrados trabalhos que articulem essas temticas, ou seja, que as abordem em uma nica
pesquisa como fonte de interesse. Outro aspecto a ser considerado, o fato de que no
contexto geogrfico de pesquisa desta dissertao, no se encontrou nenhum trabalho a
respeito da temtica. O referido levantamento foi realizado junto ao banco de dados da
CAPES e teve como recorte temporal, o perodo entre 2010 e 2014.
Foi encontrado um total de vinte e um (21) trabalhos no levantamento realizado.
Ao efetuar uma primeira leitura dos trabalhos, verificou-se que dezesseis (16) deles no
tinham vnculo com as temticas que compem esta dissertao e, por isso, estes trabalhos
foram desconsiderados, ou seja, nenhum desses estudos realizados articulou a questo do
bem-estar com a formao docente e/ou a educao inclusiva.
Destaca-se que dos trabalhos selecionados, existe um total de cinco (05) estudos
que contribuem com as anlises do bem-estar dos professores, articulando-se com a questo
da formao docente, com as estratgias de enfrentamento e/ou com a prtica educativa dos
professores. Sendo assim, os trabalhos selecionados contriburam na identificao de como os
-
17
docentes conseguem construir o bem estar em seus contextos de trabalho. Destaca-se que as
anlises desses trabalhos esto descritas mais detalhadamente no Captulo II desta dissertao.
Os estudos encontrados so importantes por analisarem o bem-estar e mal-estar
dos professores. Destaca-se que esta dissertao est apoiada no campo terico da psicologia
positiva, na qual se inserem as concepes de mal-estar e bem-estar docente.
Leite e Gonalves (2009) destacam que a psicologia positiva um campo de
investigao que tem por objetivo, quebrar com o aspecto de profisso curativa e cientfica da
psicologia e passa a problematizar os efeitos positivos que os indivduos constroem sobre si e
sobre o seu trabalho. Assim, elencam-se como ponto investigativo deste campo, os aspectos
ligados aos estados afetivos positivos do indivduo, sendo eles: felicidade, resilincia,
otimismo, gratido, contentamento, qualidade de vida, satisfao com a vida etc. (LEITE;
GONALVES, 2009, p.1). Para Snyder e Lopes (2009),
[...] a cincia e a prtica da psicologia positiva esto direcionadas para a
identificao e a compreenso das qualidades e virtudes humanas, bem como
para o auxlio no sentido de que as pessoas tenham vidas mais felizes e mais
produtivas. (SNYDER; LOPES, 2009, p. 19).
Nessa perspectiva, o campo de pesquisa da psicologia positiva definido pelo
interesse em entender como e por que
[...] algumas pessoas so mais resilientes do que outras quando se deparam
com os reveses da vida, no padecem de doenas ocupacionais e so capazes
de enfrentar as adversidades percebendo aspectos positivos que podero
lev-las ao crescimento (LEITE; GONALVES, 2009, p.1).
Leite e Gonalves (2009) elencam que a psicologia positiva foi iniciada com os
estudos desenvolvidos sobre felicidade a partir da dcada de 1970 e, posteriormente, passaram
a ser chamados de bem-estar subjetivo. As autoras acima apontam que Diener foi o
responsvel pelo agrupamento das definies de bem-estar subjetivo e felicidade, definindo-as
em trs categorias e, destacam-nas, como sendo a primeira que
[...] compreende o bem-estar atravs de critrios externos, como a virtude e
tem um carter normativo, j que define aquilo que desejvel. Assim, a
felicidade no concebida de modo subjetivo, mas pela posse de um valor
digno de se almejar. A segunda categoria concentra-se na autoavaliao do
bem-estar subjetivo, e tem sido denominada de satisfao da vida. Nesta
categoria so considerados os critrios que levam a uma pessoa a perceber
sua vida como boa. Na terceira categoria, o bem-estar definido a partir de
-
18
experincias emocionais prazerosas, sendo, [...] a preponderncia dos afetos
positivos sobre os negativos (LEITE; GONALVES, 2009, p. 2-3).
Mediante a diviso das categorias expostas, fica evidente que a partir deste
agrupamento os estudos sobre bem-estar subjetivo so importantes por proporcionarem
compreender como os aspectos positivos, bem como negativos, influenciam na sade fsica e
psicolgica dos indivduos, na sua relao social, na realizao pessoal e profissional, na
felicidade e satisfao com a vida em geral.
Nesta pesquisa, inteno entender quais os fatores que possibilitam a construo
do bem-estar docente para os professores atuantes nas salas de ensino regular que tenham
alunos com deficincia inclusos no mbito escolar. Para isso, elencou-se como referencial
terico, autores que tratam do bem-estar subjetivo, tais como: Csikszentmihalyi (1992); Jesus
(2007, 1998); Rebolo (2008, 2012a, 2012b ); Marchesi (2008); Picado (2009); Seligman
(2009); e outros que versam sobre o tema. Com relao formao e ao trabalho docente
elencou-se Tardif e Lessard (2012); Nvoa (1999, 2007); Imbernn (2009), entre outros que
compem a anlise na perspectiva do trabalho e da formao docente, uma vez que o bem-
estar dos professores tem implicaes diretas com seus processos formativos e com
desenvolvimento da atividade profissional.
Para a realizao do estudo em tela, optou-se pelo mtodo de pesquisa com
abordagem qualitativa. Foi utilizado como tcnica de coleta de dados, questionrio com
questes fechadas e abertas e, como procedimento da pesquisa, entrevistas semiestruturadas.
Ressalta-se que a primeira etapa da pesquisa foi a aplicao do questionrio junto
aos professores dos anos iniciais do ensino fundamental da Rede Municipal de Ensino de Ji-
Paran, Rondnia e que atendem alunos deficientes nas salas regulares. Este instrumento foi
utilizado com a finalidade de coletar dados sobre o contexto scio demogrfico dos
participantes da pesquisa, os indicadores de grau de satisfao e insatisfao com os fatores
do trabalho, e ainda, a satisfao com a atividade docente e a percepo referente prtica
educativa mediante o processo de incluso de alunos deficientes nas salas de aula regulares.
A segunda etapa da pesquisa foi a realizao das entrevistas semiestruturadas
junto s docentes que participaram da primeira etapa, e que concordaram em contribuir com
esta fase do estudo. Ressalta-se que apenas mulheres aceitaram contribuir nesta segunda etapa
da pesquisa. A partir de um roteiro preliminar, as entrevistas semiestruturadas foram
realizadas individualmente com cada docente e teve como objetivo, identificar a partir das
falas, os fatores que possibilita a construo do bem-estar docente.
-
19
A pesquisa teve como campo emprico, as escolas da Rede Municipal de
Educao do Municpio de Ji-Paran, Estado de Rondnia.
Esta dissertao encontra-se estruturada em quatro captulos. O primeiro captulo
refere-se s questes da formao de professores, educao inclusiva e bem-estar docente. No
primeiro tpico deste captulo, problematiza-se o processo de constituio da formao de
professores, seu marco histrico e legal, bem como, aborda as questes da profissionalidade,
profisso docente e as complexidades que envolvem o trabalho dos professores
contemporneos. Discute-se tambm a questo da formao continuada de professores
considerando a educao inclusiva. O segundo tpico faz referncia ao processo histrico de
constituio da educao inclusiva e seu percurso de implantao no municpio de Ji-Paran,
RO. O terceiro e ltimo tpico, apresenta o campo terico do bem-estar docente e trata da
questo da formao continuada como uma possibilidade de desenvolvimento de bem-estar.
O Captulo II apresenta a abordagem metodolgica adotada, os instrumentos e
procedimentos utilizados para a coleta de dados e os passos que foram percorridos para
anlise dos dados. Tambm contextualiza o local da pesquisa.
O Captulo III diz respeito apresentao e discusso dos dados produzidos com a
aplicao do questionrio. Ressalta-se que o captulo dividido em trs tpicos. O primeiro
tpico traz o perfil scio demogrfico dos participantes da pesquisa. O segundo tpico
apresenta os dados com relao ao grau de satisfao dos professores quanto aos fatores dos
quatro componentes do trabalho (scioeconmico, infraestrutural, relacional, laboral). No
terceiro tpico apresentado o grau de satisfao dos professores com relao aos fatores de
estado geral de tenso (estresse) pessoal e sensao de bem-estar no trabalho/na escola. Neste
tpico tambm so apresentadas e discutidas as respostas dos professores para as perguntas
abertas do questionrio. Sendo assim, so analisados os fatores que possibilitam ou facilitam a
satisfao no trabalho, os fatores que dificultam ou impedem a satisfao no trabalho e, ainda,
as estratgias de enfrentamento que os professores indicaram utilizar para superao das
dificuldades em seu trabalho docente.
O Captulo IV traz as anlises dos dados produzidos a partir das entrevistas. As
falas foram analisadas em categorias, que permitiram entender o que as docentes percebem
sobre os motivos que as levaram escolha da profisso, processo formativo, incio da carreira,
prtica educativa, processo de incluso e as estratgias de enfrentamento que estas docentes
utilizam.
Por ltimo so apresentadas algumas consideraes, fruto das experincias e
compreenses a partir do trabalho desenvolvido nesta pesquisa. O processo de escrita foi
-
20
sendo construdo e reconstrudo, sempre tendo como eixo orientador, os objetivos propostos e
a reviso de literatura, bem como a discusses e as contribuies do PPGE/UCDB luz do
campo terico adotado (psicologia positiva e bem-estar subjetivo).
-
21
2. FORMAO DE PROFESSORES, EDUCAO INCLUSIVA E BEM-
ESTAR DOCENTE
Este captulo refere-se formao de professores, educao inclusiva e bem-estar
docente. Assim, no primeiro tpico, aborda-se o processo de constituio da formao de
professores e os marcos histricos e legais que marcaram a profisso docente. A partir da
compreenso do processo de constituio da docncia e da formao de professores, o tpico
ainda aborda a profissionalidade, a profissionalizao e as complexidades que envolvem o
trabalho dos professores contemporneos. Tambm discute a formao continuada de
professores considerando a educao inclusiva.
No segundo tpico, apresenta-se a discusso sobre o processo de constituio da
educao inclusiva, ou seja, a questo do processo histrico da excluso e de como vem se
garantindo o acesso do aluno deficiente aos ambientes escolares regulares. Ainda neste tpico,
feito uma anlise sobre o percurso de implantao da educao inclusiva no municpio de Ji-
Paran-RO.
No terceiro tpico, abordado o tema que trata do bem-estar docente, bem como
os componentes do trabalho e as estratgias de enfrentamento que possibilitam aos
professores o bem-estar. Aborda-se ainda, a formao continuada de professores como
possibilidade de desenvolvimento do bem-estar.
-
22
2.1 - A formao de professores histria e tendncias no Brasil
A profissionalizao docente se deu inicialmente no sculo XVII, onde os
registros histricos apontam a criao do primeiro curso de formao para professores, sendo
este curso institudo por So Joo Batista de La Salle em 1684, em Reims, com o nome de
Seminrio dos Mestres (DUARTE apud SAVIANI, 2009, p.143). Isso revela que na
Europa que primeiramente se v a necessidade de cursos de formao, visando docncia e
s posteriormente, esses cursos passam a ser implantados em outros pases. As instituies
para formar os professores eram chamadas de Escolas Normais e surgiram para atender as
demandas sociais aps a Revoluo Francesa. Essas escolas normais tinham a funo de
preparar os professores para a instruo da classe popular, tendo em vista que essas classes
eram responsveis pela execuo do trabalho fabril. Antnio Nvoa (1999) aponta que a
segunda metade do sculo XVIII foi determinante na histria da educao e profisso docente
no contexto europeu, onde, no perodo citado (sculo XVIII), por toda a Europa procura-se
esboar o perfil do professor ideal (NVOA, 1999, p. 15).
No Brasil, a problemtica da formao de professores em cursos especficos se
deu a partir da independncia do pas, considerando que existia a necessidade de organizar a
instruo popular (SAVIANI, 2009). J no perodo colonial, os responsveis pelo processo de
alfabetizao eram os jesutas, e isso acontecia, devido necessidade da catequizao dos
indgenas. Vale ressaltar que desde o perodo do Brasil colnia no havia a preocupao com
a formao docente. Vicentini e Lugli (2009) apontam que no perodo colonial, os futuros
mestres eram uma espcie de adjuntos e lecionavam acompanhados de um velho mestre
(professor mais experiente), sendo que os adjuntos podiam exercer a profisso a partir dos
doze anos de idade. Destacam ainda que nesse perodo, no havia currculo especfico de
capacitao para o trabalho docente. De acordo com Dermeval Saviani (2009) na Lei das
Escolas de Primeiras Letras, promulgada em 15 de outubro de 1827, que a preocupao com
a formao docente teve lugar pela primeira vez na histria do Brasil. Segundo o referido
autor,
[...] essa lei foi responsvel por determinar que o ensino, nessas escolas,
deveria ser desenvolvido pelo mtodo mtuo, a referida lei estipula no artigo
4 que os professores devero ser treinados nesse mtodo, s prprias custas,
nas capitais das respectivas provncias. Portanto, est colocada a a exigncia
propriamente questo pedaggica. (SAVIANI, 2009, p. 144).
-
23
No perodo de 1827 1890, o que prevalecia como diretriz para a formao nas
escolas normal eram os conhecimentos a serem transmitidos pelos professores aos alunos, ou
seja, a preocupao durante os cursos era o domnio de contedos a serem ensinados nas
escolas primrias e no em como esses contedos deveriam ser tratados na sala de aula, ou
seja, as tcnicas didticas (SAVIANI, 2009).
O perodo de 1890 1932 considerado como o de estabelecimento e expanso
das escolas normais, tendo em vista que nesse perodo que se deu a reforma da instruo
pblica no estado de So Paulo. Saviani (2009) mostra que essa reforma foi marcada por dois
pontos: primeiro, houve o enriquecimento do contedo curricular e, segundo, a nfase aos
exerccios prticos de ensino, bem como a instalao de uma escola modelo de aplicao em
anexo a Escola Normal. Essa reforma se tornou referncia a outros Estados brasileiros.
Para Bernardete Gatti (2010) no final da dcada de 1930 que se d incio a
formao em nvel superior a partir de cursos em nvel de bacharelado com a extenso de
mais um ano de disciplinas voltadas para a rea da educao para a obteno de licenciatura.
Segundo a autora, esta formao, conhecida como 3+1, estava direcionada para que os
docentes atuassem no ensino secundrio. Saviani (2009) mostra que, entre os anos de 1932 e
1939 passou-se a uma nova fase, onde os adventos dos institutos de educao deram espao
para uma educao vista no apenas como objeto de ensino, mas tambm como
oportunidade de pesquisa.
Os primeiros institutos implantados (o primeiro no Distrito Federal e o segundo
em So Paulo) foram inspirados no pensamento iderio da Escola Nova. Nesse novo modelo
de curso, abandonou-se a ideia dos cursos oferecidos pelas Escolas Normais e passou-se a
pensar em Escola de Professores. Para isso, incluram-se no currculo, j no primeiro ano,
disciplinas de cunho pedaggico, ou seja, disciplinas especificamente voltadas para a prtica
docente, sendo elas,
1) biologia educacional, 2) sociologia educacional, 3) psicologia
educacional,4) histria da educao, 5) introduo ao ensino, contemplando
trs aspectos: a) princpios e tcnicas; b) matrias de ensino abrangendo
clculo, leitura e linguagem, literatura infantil, estudos sociais e cincias
naturais; c) prtica de ensino, realizada mediante observao,
experimentao e participao, como suporte ao carter prtico do processo
formativo. (SAVIANI, 2009, p.146).
A fala supracitada mostra que os primeiros cursos de pedagogia no foram
pensados especificamente para a formao de professores de crianas, ou seja, professores
-
24
alfabetizadores, mas sim, voltados para atender os cursos em licenciatura que trabalhavam
disciplinas especficas, como por exemplo, Letras, Cincias, Filosofia, entre outros. Vicentini
e Lugli (2009) afirmam que, os Cursos de Pedagogia eram em nvel de bacharelado formavam
apenas tcnicos em educao. No entanto, as autoras destacam que, se os bacharis tcnicos
em educao quisessem lecionar, deveriam cursar as disciplinas de licenciaturas em cursos
normais, que aceitavam egressos de outros cursos superiores. Para Gatti (2010) esse modelo
denominado 3+1 (bacharelado complementado com mais um ano de disciplinas na rea da
educao/licenciatura) tambm garantia aos formados ministrar disciplinas no ensino
secundrio, hoje denominado de ensino mdio. A autora relata ainda que [...] no ano de
1986, o ento Conselho Federal de Educao aprova o Parecer n. 161, sobre a reformulao
do curso de Pedagogia, que faculta a esses cursos oferecer tambm formao para a docncia
de 1 4 srie do ensino fundamental [...] (GATTI, 2010, p.1357).
Para essa mesma autora, a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional Lei
N. 9394/96, de 20 de dezembro de 1996, prope alteraes no que concerne a formao
docente, pois ela definiu prazos para a transio de nvel de formao dos professores. Tal
transio havia sido marcada para acontecer no perodo de dez anos, sendo denominada de
decnio da educao, ou seja, tinha-se o prazo de dez anos para que os docentes adquirissem
formao em nvel superior.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional LDB 9394/96, quando de sua
aprovao, estabelecia no Ttulo VI Dos profissionais da educao, no Art. 61 que a
formao de profissionais da educao deveria ter como fundamentos para atender aos
objetivos dos diferentes nveis e modalidades de ensino e s caractersticas de cada fase do
desenvolvimento do educando nos inciso I - a associao entre teorias e prticas, inclusive
mediante a capacitao em servio (BRASIL, 1996, Art. 61) e II - aproveitamento da
formao e experincias anteriores em instituies de ensino e outras atividades (BRASIL,
1996, Art. 61). No Art. 62 inferia que para atuar na educao bsica os professores deveriam
ser formados [...] em nvel superior, em curso de licenciatura, de graduao plena,
admitindo-se como formao mnima para o exerccio do magistrio na educao infantil e
nas quatro primeiras sries do ensino fundamental, a oferecida em nvel mdio, na modalidade
Normal (BRASIL, 1996, Art. 62).
Posteriormente, o Art. 61 da referida Lei de Diretrizes e Bases da Educao foi
alterado pela Lei n 12.014, de 6 de agosto de 2009. Com a alterao, no Art. 61 passaram a
serem considerados profissionais da educao escolar bsica os que esto em efetivo exerccio
e so formados em cursos reconhecidos. No inciso I, se prev que professores so os
-
25
profissionais habilitados em nvel mdio ou superior para a docncia na educao infantil e
nos ensinos fundamental e mdio. O Art. 62 foi alterado pela redao da Lei n 12.796, de 4
de abril de 2013. Com a nova redao deste artigo,
A formao de docentes para atuar na educao bsica far-se- em nvel
superior, em curso de licenciatura, de graduao plena, em universidades e
institutos superiores de educao, admitida, como formao mnima para o
exerccio do magistrio na educao infantil e nos 5 (cinco) primeiros anos
do ensino fundamental, a oferecida em nvel mdio na modalidade normal.
(BRASIL, 1996, Art. 62).
Mesmo com as posteriores alteraes da Lei de Diretrizes e Bases da Educao
Nacional, pode-se perceber que, no que se refere formao dos profissionais, permaneceu-se
admitindo os profissionais com formao em magistrio para atuar na educao infantil e nos
cinco primeiros anos do ensino fundamental da educao bsica.
Aps a LDB 9394/96, foi no ano de 2000, que o Ministrio da Educao publicou
a Proposta de Diretrizes Para a Formao Inicial de Professores da Educao Bsica em Curso
de Nvel Superior. Esta proposta, encaminhada ao Conselho Nacional de Educao, tinha por
objetivo,
[...] construir uma sintonia entre a formao inicial de professores, os
princpios prescritos pela Lei de Diretrizes e Bases da Educao
Nacional/LDBEN, as normas institudas nas Diretrizes Curriculares
Nacionais para a educao infantil, para o ensino fundamental e para o
ensino mdio, bem como as recomendaes constantes dos Parmetros e
Referenciais Curriculares para a educao bsica elaborados pelo Ministrio
da Educao (BRASIL, 2000, p.6).
Segundo Gatti (2010), no ano de 2002 foi promulgado as Diretrizes Curriculares
Nacionais Para a Formao de Professores, e posteriormente, as Diretrizes Curriculares para
cada curso de licenciatura. A autora aponta que mesmo com os ajustes propostos nas
Diretrizes, fica evidente a prevalncia do [...] oferecimento de formao com foco na rea
disciplinar especfica, com pequeno espao para a formao pedaggica (GATTI, 2010, p.
1357). Assim, para Gatti (2010),
Adentramos o sculo XXI em uma condio de formao de professores nas
reas disciplinares em que mesmo com as orientaes mais integradoras
quanto a relao formao disciplinar/formao para a docncia, na prtica
ainda se verifica a prevalncia do modelo consagrado no incio do sculo
XX para as licenciaturas [...] (GATTI, 2010, p. 1357).
-
26
O curso de Pedagogia foi regulamentado pela resoluo n. 1, de 15 de maio de
2006. Tal resoluo prope as Diretrizes Curriculares e estabelece que este curso, deve formar
para a licenciatura, atribuindo aos formandos funo de atuar como docentes na educao
infantil; nos anos iniciais do ensino fundamental (1 ao 5 ano); no ensino mdio na
modalidade normal; na educao profissional na rea de servios e apoio escolar; e em outras
reas nas quais sejam previstos conhecimentos pedaggicos, conforme estabelecido no Art. 4
da referida resoluo. Gatti (2010) aponta que com esta resoluo a licenciatura em Pedagogia
passa a ter uma complexidade curricular em funo da [...] disperso disciplinar que se
impe em funo do tempo de durao do curso e sua carga horria. (GATTI, 2010, p.
1358).
Refletir sobre os processos de formao de professores, permite entender que ainda
existem desafios para a educao que se refletem nas questes ligadas profissionalidade,
profissionalizao e trabalho docente.
2.1.1 - Profissionalidade, profissionalizao e trabalho docente
Historicamente, a educao tem sido colocada como uma forma do ser humano
transmitir para geraes mais novas os costumes, as tradies e os conhecimentos que haviam
adquirido, ou seja, os saberes acumulados ao longo histria. Entretanto, educar no formato
desenvolvido dentro de instituies, s foi possvel [...] a partir do sculo XV, no seio de
uma sociedade disciplinar, erigida no conjunto das transformaes que produzem a
modernidade (COSTA, 1995, p. 64).
A questo da profissionalidade da profisso docente ainda complexa, pois a
profissionalidade do professor no tinha sido encarada como uma profisso e talvez ainda
permanea no sendo vista desta forma. Para tratar desta questo, importante refletir sobre o
trabalho do professor. Para Eurize Pessanha (2004) a escola um [...] produto histrico da
atividade produtiva [...] (PESSANHA, 2004, p. 15) que necessita [...] ser pensada a partir
das determinaes fundamentais que so as relaes de trabalho e as relaes sociais de
produo (PESSANHA, 2004, p. 15).
A autora aponta que o trabalho do professor [...] um trabalho prioritariamente
intelectual, com um lado terico-prtico que o tornaria um trabalho intelectual/manual [...]
-
27
(PESSANHA, 2004, p. 24), e por isso, envolve caractersticas diferentes de um trabalho
produtivo desenvolvido dentro de outros setores da sociedade, tais como o fabril. A esse
respeito, a autora aponta que essa questo envolve vrias discusses sobre a proletarizao ou
no proletarizao do profissional professor, tais como, se um ofcio ou um emprego, se o
professor dentro do contexto da escola um funcionrio ou no, se o trabalho docente
improdutivo.
Pessanha (2004) aponta que no h discordncia para se [...] analisar o professor
como uma categoria profissional: a sua categorizao como um funcionrio (PESSANHA,
2004, p. 27), pois
[...] a origem dessa condio estaria relacionada com o momento em que,
com o surgimento do capitalismo, d-se a separao entre a sociedade civil e
o Estado e, neste processo, o ensino passa a ser encarado como dever do
Estado, saindo do mbito da Igreja. a partir deste momento que se inicia a
profissionalizao do magistrio, at ento exercido pelos religiosos. Esta
vinculao ao Estado se materializava, e se materializa at hoje, no s na
contratao de professores pelo Estado como tambm atravs das licenas
para lecionar, concedidas, exclusivamente pelos rgos do Estado, mesmo
para professores formados ou que lecionam em escolas particulares
(PESSANHA, 2004, p. 27).
A partir do que evidenciado pela autora, pode-se compreender que a classe
social dos professores [...] est ligada aos processos de industrializao, urbanizao,
ampliao da rea de servios e do setor pblico, isto , do trabalho no-manual [...]
(PESSANHA, 2004, p.71).
Outra questo que a autora aponta que a docncia era uma profisso almejada
por mulheres que desejavam ascender socialmente, ou pelo menos garantir a sua no
decadncia dentro da estrutura social. Assim, a profisso de professora era desejvel para
mulheres de determinada classe social, no caso mulheres pobres e sem famlia, com uma
perspectiva de, se no ascender socialmente, pelo menos no decair para um meio de vida
no-decente (PESSANHA, 2004, p.71).
Pessanha (2004) inspirada em estudos realizados por Afrnio Peixoto aponta
alguns indcios para o fato de o magistrio ser uma profisso para mulheres. Lembra ainda
que o magistrio uma atividade procurada por mulheres desde o incio da profisso, pois por
pagar pouco, no interessava aos homens que preferiam concorrer com outros homens nas
carreiras destinadas ao sexo masculino. A autora destaca o fato de que, se o magistrio
elementar fosse desenvolvido por homens, esses (os homens) seriam vistos como possuidores
de anomalias.
-
28
A docncia um processo que envolve nos cursos de formao de professores os
saberes necessrios para o desenvolvimento da prtica pedaggica. A respeito dos saberes,
Tardif (2006) aponta que estes implicam em
[...] um processo de aprendizagem e de formao; e, quanto mais
desenvolvido, formalizado e sistematizado um saber, como acontece com
as cincias e os saberes contemporneos, mais longo e complexo se torna o
processo de aprendizagem, o qual, por sua vez, exige uma formalizao e
uma sistematizao adequadas. [...], assim que atingem um certo grau de
desenvolvimento e de sistematizao, os saberes so integrados a processos
de formao institucionalizados coordenados por agentes educacionais
(TARDIF, 2006, p. 35).
Vale destacar ainda que, para Tardif (2006), o saber docente [...] um saber
plural, formado pelo amlgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formao
profissional e de saberes disciplinares, curriculares e experienciais (TARDIF, 2006, p. 36).
pelo processo de formao que os professores adquirem os saberes inerentes ao
desenvolvimento profissional. Entretanto, outros saberes so desenvolvidos no decorrer da
prtica educativa do professor e acabam sendo incorporados ao corpo de conhecimentos do
docente.
No que se refere profissionalidade da profisso docente, Maria Roldo (2005)
aponta que esta profissionalidade pode ser definida como aquele conjunto de atributos,
socialmente construdos, que permitem distinguir uma profisso de outros muitos tipos de
actividades, igualmente relevantes e valiosas. (ROLDO, 2005, p.108). Para a referida
autora, a profissionalidade da profisso se d a partir do sculo XIX, pois nesse perodo que
comea a estruturao dos professores como grupo de maior visibilidade social, o que
possibilitou
[...] gradualmente, passos na sua profissionalizao entendida como o
caminho para o estatuto da profissionalidade das quais se destaca como
relevante a institucionalizao da necessidade de formao para poder
exercer a actividade, o que implicou o incio da configurao de um conjunto
de saberes que devem sustentar o exerccio [...] (ROLDO, 2005, p.110).
Assim, profissionalidade o processo de construo de um corpo de
conhecimentos dentro da profisso. Sacristn traz a definio de que profissionalidade [...]
a afirmao do que especfico na ao docente, isto , comportamentos, conhecimentos,
destrezas, atitudes e valores que constituem a especificidade de ser professor (SACRISTN,
1999, p.65). Outra definio defendida a de que [...] profissionalidade o conjunto de
-
29
caractersticas de uma profisso que enfeixam a racionalizao dos conhecimentos e
habilidades necessrios ao exerccio profissional [...] (GATTI, 2010, p. 1360).
Diante das definies de profissionalidade, fica evidente que para se tornar
professor, preciso que os indivduos tenham uma formao, ou seja, passem por
cursos/licenciaturas que do ou pelo menos deveriam dar todo o suporte terico e didtico
para que a profisso passe a ser vista como tal, e no como um dom dado por Deus, ou como
uma misso para quem gosta de criana. Nesse sentido,
[...] a profissionalidade de professores implica a obteno de um espao
autnomo, prprio sua profissionalidade, com valor claramente
reconhecido pela sociedade. No h consistncia em uma profissionalizao
sem a constituio de uma base slida de conhecimentos e formas de ao
(GATTI, 2010, p. 1360).
Nos cursos de formao, tanto inicial (licenciaturas) como continuada, os
docentes esperam adquirir uma base de conhecimentos necessrios para o trabalho docente,
pois na atuao docente, [...] a interveno pedaggica do professor influenciada pelo
modo como pensa e como age nas diversas facetas da sua vida (SACRISTAN, 1999, p. 66).
Faz-se necessrio apontar ainda que o desenvolvimento profissional do professor
est, segundo Huberman (2007), vinculado tambm aos ciclos de vida profissional. A esse
respeito, Huberman (2007), prope um modelo sequencial normativo do ciclo de vida
profissional de professores a partir de um levantamento emprico de literaturas que tratam
dessa temtica. De acordo com o autor, o modelo proposto mostra que para um determinado
perodo de atuao, os professores vivem determinadas fases comuns na docncia, conforme
apresentado no esquema demonstrativo de fases da carreira docente de Huberman (2007, p.
47).
Figura. 01 Esquema demonstrativo de fases da carreira docente proposto por Huberman (2007, p. 47).
Fonte: Huberman (2007, p. 47).
-
30
No esquema proposto pelo autor fica evidente que, para cada perodo de anos
vividos pelo docente na carreira, o profissional passa por determinadas fases, entretanto, vale
ressaltar que para o autor, este um modelo esquemtico e especulativo (HUBERMAN,
2007, p. 48). Este modelo de anlise possibilita compreender que dependendo de como o
profissional professor passa por determinada fase, de como ele a interpreta e de como essa
fase vai se consolidar, ao final da carreira este docente poder chegar a um desinvestimento
sereno ou amargo, isto , ou ele chega concluso de que tudo valeu a pena/positiva ou de
que nada valeu a pena/negativa.
Assim, faz-se necessrio pensar no que constitui o trabalho docente. Para Tardif e
Lessard (2012) a categoria trabalho deve ser analisada como sendo o lugar onde os docentes
desenvolvem atividades que incorporam saberes especficos para a atuao profissional. Os
autores apresentam uma anlise sobre o trabalho mercantil e, onde se encaixa na lgica desse
modelo, o trabalho docente.
Para Tardif e Lessard (2012, p.16), o trabalho produtivo/industrial tem por base
uma lgica produtiva mercadolgica guiada por cinco postulados que fundamentam o
trabalho, sendo:
O trabalho industrial produtor de bens materiais o paradigma do trabalho;
Esse paradigma estende sua hegemonia terica e prtica s demais atividades humanas;
Os agentes sociais se definem por suas posies no sistema produtivo;
As posies centrais so ocupadas pelos detentores (capitalistas) e os produtores (operrios) de riquezas materiais;
Enfim, o sistema produtivo o corao da sociedade e suas relaes sociais.
Vale analisar o lugar da escola considerando a lgica social para a produo
industrial. Para os autores citados, a escola a responsvel por preparar os filhos dos
operrios para o mercado de trabalho. Assim, apontam que a escola, bem como os docentes,
tem um lugar secundarizado na lgica produtiva, ou seja,
[...] o ensino visto como uma ocupao secundria ou perifrica em relao
ao trabalho material produtivo. A docncia e seus agentes ficam nisso
subordinados esfera da produo, porque sua misso primeira preparar os
filhos dos trabalhadores para o mercado de trabalho. O tempo de aprender
no tem valor por si mesmo; simplesmente uma preparao para a
verdadeira vida, ou seja, o trabalho produtivo, ao passo que,
comparativamente, a escolarizao dispendiosa, improdutiva ou, quando
muito, reprodutiva (TARDIF; LESSARD, 2012, p. 17).
-
31
A funo da escola moderna o de ocupar o tempo dos filhos dos operrios e de
prepar-los para o futuro torn-los aptos para o mercado de trabalho. Diante de tais
apontamentos, pode-se verificar que os docentes desempenhavam atividades improdutivas,
uma vez que ensinar no gera nenhum produto mercadolgico. Entretanto, os autores
evidenciam que o novo modelo social que vem se impondo, no corresponde a esse
pensamento postulado que tem a escola como funo secundarizada. Para isso, apresentam
argumentos que desvelam tal pensamento construdo ao longo da histria. Nesse sentido, os
autores colocam que [...] longe de ser uma ocupao secundria ou perifrica em relao
hegemonia do trabalho material, o trabalho docente constitui uma das chaves para a
compreenso das transformaes atuais das sociedades do trabalho (TARDIF; LESSARD,
2012, p. 17).
A escola pode ter adquirido novos posicionamentos ou funes diante das
transformaes que a sociedade vem sofrendo no que se refere, principalmente, ao mundo
trabalho. na escola que tem o processo institucionalizado de aprendizagem, ou seja, um
modo de ensinar que no se v em outros setores formativos da sociedade, tais como, igreja,
famlia, organizaes, entre outros. na escola que se tem um processo que favorece a
aprendizagem sistematizada por contedos, objetivos, competncias e habilidades. Desse
modo, cabe ressaltar que,
[...] a escolarizao supe, historicamente, a edificao e a
institucionalizao de um novo campo de trabalho, a docncia escolar no
seio da qual os modos de socializao e de educao anteriores sero ou
remodelados, abolidos, adaptados ou transformados em funo dos
dispositivos prprios do trabalho dos professores na escola. Nesse sentido, se
as interaes cotidianas entre os professores e os alunos constituem bem o
fundamento das relaes sociais na escola, essas relaes so, antes de tudo,
relaes de trabalho, quer dizer, relaes entre trabalhadores e seu objeto de
trabalho. (TARDIF; LESSARD, 2012, p. 23).
O trabalho docente no tem sido uma tarefa fcil, por se tratar de uma atividade
complexa que envolve, entre outros fatores, as relaes interpessoais, as questes de
infraestrutura, socioeconmicas e laborais. Entre outras questes que dificultam a atividade
docente, ressalta-se o fato de que o professor trabalha com outros seres humanos, o que
envolve a necessidade de interao entre o professor e os alunos, bem como, entre os demais
agentes envolvidos no processo de ensino aprendizagem.
-
32
partindo de tais apontamentos que os autores evidenciam a complexidade do
fazer docente, uma vez que a atividade docente tem se mostrado uma tarefa que, antes de
tudo, requer a interatividade entre o trabalhador (professor) e o seu objeto de trabalho
(aluno), isto , o professor em seu fazer, precisa contar com a disponibilidade e a vontade de o
aluno querer para aprender (TARDIF; LESSARD, 2012). Entretanto, vale destacar que apesar
de no ter mostrado fcil, a atividade docente pode possibilitar o bem-estar docente. Com
relao ao trabalho desenvolvido por professores, Nvoa (2011), argumenta que,
[...] ao contrrio de outros profissionais, o trabalho docente depende da
colaborao do aluno [...]. Ningum ensina a quem no quer aprender. [...]
no possvel ser um professor se no h algum que aprenda. O problema
se torna ainda mais complicado se considerarmos as circunstncias da
presena do aluno, que no produto de um ato de vontade, mas antes, de
uma obrigao social e familiar (NVOA, 2011, p. 229).
Tardif e Lessard (2012), tambm apontam que os professores desenvolvem uma
rdua tarefa, pois sempre precisam motivar seus alunos para que eles aprendam, alm de
evidenciarem o fato da obrigatoriedade de que os alunos devem ir escola para aprender os
contedos escolares. Nesse sentido, afirmam que [...] os alunos so clientes forados,
obrigados que so a ir para a escola (TARDIF; LESSARD, 2012, p. 35). Os autores trazem
ainda para a discusso questes como [...] a centralidade da disciplina e da ordem no
trabalho docente, bem como a necessidade quase constante de motivar os alunos (TARDIF;
LESSARD, 2012, p.35), por evidenciarem que os professores [...] se confrontam com o
problema da participao de seu objeto de trabalho os alunos no trabalho de ensino e
aprendizagem (TARDIF; LESSARD, 2012, p.35).
mediante as situaes mencionadas que se verifica que o trabalho docente no
tem sido uma tarefa fcil, pois envolve muitas questes. Uma delas justamente o fato de os
alunos, em alguns casos, colocarem resistncia no processo de aprendizagem, o que prejudica
o fazer dos professores. Outra implicao que tem dificultado o trabalho docente refere-se ao
processo de transformao da sociedade, principalmente, com referncia s questes de
noes de valores, moralidade, tica, entre outras. A respeito das transformaes sociais,
Bauman (2002) aponta que estas transformaes tem alterado a definio da funo da escola,
colocando-a em declnio, pois considera que o produto que se oferece para a sociedade
moderna, no possvel encontrar. Sendo assim, o produto que a escola dispunha, ou seja, o
conhecimento, j no est mais somente sob o domnio da escola e do professor, mas sim
-
33
disponvel em diversas formas, tais como na em mdias de comunicao, internet, entre
outros. Assim,
No mundo da modernidade lquida, a solidez das coisas, tanto quanto a
solidez dos laos humanos, ressentido como uma ameaa; qualquer
juramento de fidelidade, qualquer compromisso duradouro, que dir eterno,
pressagia um futuro carregado de obrigaes que constrangem a liberdade de
movimento e reduzem a habilidade de aproveitar novas, ainda
desconhecidas, oportunidades, quando elas, inevitavelmente surgem
(BAUMAN, 2002, p. 48).
O autor anuncia que nos tempos da modernidade slida, a famlia, constituda por
pai e me, mostrava aos seus filhos o quo importante era aprender, pois o conhecimento era
um saber que jamais algum poderia roubar e/ou retirar da pessoa, entretanto, na
contemporaneidade, alguns alunos tem visto tal perspectiva como horripilante. Bauman
(2002) faz compreender que o processo institucionalizado para promover, foi feito para um
mundo slido, durvel e eternizado. Na sociedade contempornea/lquida a escola
supostamente se apresenta desencaminhadora, intil e incapaz, uma vez que os conhecimentos
esto amplamente disponveis. Isso faz com que os alunos no entendam a necessidade de
aprender, o que dificulta o fazer pedaggico dos professores que tem tido dificuldades para
entender seu verdadeiro papel na contemporaneidade.
As transformaes sociais tm efetivado alguns efeitos sobre o comportamento
social dos indivduos. Rebolo, Nogueira e Soares (2010) apontam que na sociedade ps-
moderna houve alteraes no modo de viver das pessoas, uma vez que os indivduos
tornaram-se consumistas e apticos, tanto perante os problemas sociais e humanos, como
tambm, pela
[...] falta de energia, sentimentos e motivaes, ainda que suas aes
demonstrem uma intensiva mobilidade que busca acompanhar as mudanas.
Indivduos indiferentes s instituies sociais (REBOLO; NOGUEIRA;
SOARES, 2010, p. 111).
Segundo as autoras, essas transformaes configuram tambm mudanas sobre as
relaes, e produz um jeito de viver baseado no medo, uma vez que o modelo de
relacionamento propicia [...] a clausura, o individualismo, o no se mobilizar pelo outro, a
indiferena (REBOLO; NOGUEIRA; SOARES, 2010, p. 111). Para as autoras, esse novo
modelo social passa longe dos pressupostos educacionais, tais como, solidariedade,
-
34
coletividade, democracia, relaes humanas com rede de apoio, confiana e
comprometimento.
Neste contexto, os docentes, entre outras questes, tm que lidar com as
transformaes sociais, a falta de interesse dos alunos e com os saberes que esto em
constante transformao. possvel entender que os docentes estejam em constante formao
para aquisio de novos saberes. A esse respeito, Tardif (2006) fala sobre os saberes
necessrios que os professores devem ter e adquirir na prtica educativa.
O autor argumenta que os saberes no podem ser somente a transmisso de
contedos e conhecimentos j constitudos ao longo de sua vida, por meio de aprendizagem
em cursos. A prtica docente deve integrar [...] diferentes saberes, com os quais o corpo
docente mantm diferentes relaes (TARDIF, 2002, p. 36). Nesse sentido, o autor ainda
esclarece que [...] o saber docente como um saber plural, formado pelo amlgama, mais ou
menos coerente, de saberes oriundos da formao profissional e de saberes disciplinares,
curriculares e experienciais (TARDIF, 2006, p.36).
Tardif (2006) aponta ainda os saberes que so constitudos pela formao
profissional e argumenta que so estes saberes que formam o conjunto de conhecimentos e
contedos transmitidos pela instituio formadora (universidade, escolas normais, entre
outras) e aprendidos pelos docentes em formao. Cabe destacar que para o autor a prtica
docente no apenas um objeto de saber das cincias da educao, ela tambm uma
atividade que mobiliza diversos saberes que podem ser chamados de pedaggicos (TARDIF,
2006, p.37). O autor tambm apresenta outros saberes que constituem o conjunto de saberes
que formam o corpo de conhecimento necessrio para a prtica docente, so eles: os saberes
disciplinares, os saberes curriculares e os saberes experienciais. A esse respeito, Almeida e
Biajone (2007), argumentam que so as diversas articulaes entre a prtica e os saberes dos
professores que permitem formar [...] um grupo social e profissional que, para existir, precisa
dominar, integrar e mobilizar tais saberes, o que condio sine qua non para a prtica
(ALMEIDA; BIAJONE, 2007, p. 286).
Esses profissionais da educao vivem grandes tenses sociais que so
provocadas pelas mudanas que vem ocorrendo tanto no mbito social, como tambm no
campo poltico e econmico (BAUMAN, 2002). Isso faz refletir na necessidade dos docentes
apresentarem respostas e adaptaes a essa realidade movida pela informao, que se coloca
cada vez mais mutvel, exigente e global (PICADO, 2009). Diante disso, evidencia-se que o
ambiente escolar cada vez mais tem sofrido com as transformaes que a sociedade vem
-
35
passando. Isso tem se refletido nos espaos escolares, conforme descrito por Lessard e Tardif
(2011),
A escola se parece com um estacionamento, e a funo docente assimilada
a uma forma de vigilncia. Os jovens esto na escola porque a sociedade no
quer que eles estejam em outro lugar, principalmente na rua ou no shopping,
e porque no h ou no h mais alternativa escola para ocupar os jovens.
Esses jovens da televiso e da internet consomem as aulas e aqueles que as
ministram como consomem um programa de televiso, um clip ou uma
publicidade; eles permanecem ou zapeiam; tm uma relao emotiva
gosto ou no gosto e utilitarista com o saber para que serve saber
isso? Os docentes s vezes vivem mal essas evolues e constatam,
impotentes, que no so capazes de concorrer com a mdia cada vez mais
invasora e eficaz, pelo seu poder de seduo (LESSARD; TARDIF, 2011, p.
258).
Tais colocaes deixam evidente o cenrio social em que os docentes devem
atuar, ou seja, um ambiente em que o seu objeto de trabalho (aluno) j no demonstra
interesse em aprender, haja vista a disponibilidade e a oferta de conhecimento que se tem
acesso. Este novo cenrio tem implicado sobre o mal-estar e o bem-estar dos professores,
obrigados a atuarem nesse ambiente conturbado, onde no se tem mais to definido a funo,
tanto da escola, como dos docentes (LESSARD; TARDIF, 2011). Traz-se para esse quadro, a
reflexo das condies formativas em que os docentes esto se aperfeioando e tambm o
campo de atuao em que esto inseridos. importante destacar a contribuio de Hypolito
(1999, p. 91) para quem,
[...] os processos de formao, de de-formao e de desqualificao docente
continuam ocorrendo significativamente, no processo de trabalho. Assim,
no s as formas de controle tcnico e ideolgico, mas tambm as pssimas
condies de trabalho a que os professores e professoras esto submetidos
interferem no que se entende por formao e profissionalizao; ou seja, h
aspectos subjetivos e objetivos que constroem e so construdos no processo
de trabalho, e que determinam muito mais as prticas docentes do que a
formao inicial.
Como possvel observar, o ambiente de atuao profissional dos professores tem
impelido repensar os processos formativos, uma vez que por meio destes que os docentes
tero subsdios para refletirem sua prtica, bem como tero estratgias para superar as
complexidades impostas pelas transformaes da funo social da profisso. Uma das
possibilidades para o reconhecimento da docncia enquanto profisso a luta por uma
-
36
formao continuada que favorea a atividade docente, assunto que se apresenta no prximo
tpico.
2.1.2 - A formao docente continuada para a atuao no contexto de escolas inclusivas
Quando se fala em uma escola inclusiva, tem-se como pensamento que esta seja
um ambiente acolhedor, que propicia a todos os alunos, condies de locomoo, e acima de
tudo, que garanta o aprendizado em seus amplos aspectos, ou seja, tanto de socializao,
como tambm dos contedos e conhecimentos que so oferecidos dentro do ambiente escolar.
Espera-se que os profissionais que atuam nesses espaos estejam preparados e qualificados
para oferecerem um atendimento educacional de qualidade a todos os alunos,
indiferentemente de gnero, raa, etnia, sejam eles pessoas com deficincias ou no, ou seja, a
diversidade que compe o ambiente escolar.
Francisco Imbernn (2002) aponta para a necessidade de que a educao se volte
para o novo modelo social democrtico que se apresenta. O autor coloca que a educao deve
ser [...] plural, participativa, solidria, integradora (p.7). Mediante ao postulado pelo autor, a
formao de professores deve contemplar o novo cenrio social, uma vez que so os cursos de
formao que vo, ou pelo menos deveriam contemplar espaos de discusses para que os
docentes passem a tomar conscincia de sua funo social. Destaca-se ainda que a funo
social da educao j no mais a mesma que se tinha no passado, ou seja, muitas mudanas
ocorreram em relao a funo da escola e dos professores. Mediante tais apontamentos, faz-
se necessrio
[...] uma redefinio importante da profisso docente e que se assumam
novas competncias profissionais no quadro de um conhecimento
pedaggico, cientfico e cultural revistos. Em outras palavras, a nova era
requer um profissional da educao diferente. (IMBERNN, 2002, p.12).
Diante deste contexto, Imbernn (2002) assinala a necessidade de uma formao
continuada que contemple tanto as experincias docentes, como tambm, o campo terico.
preciso que o processo de formao terico no se desvincule das prticas dos professores que
j esto em exerccio.
A esse respeito, Nvoa (2009) aponta que h necessidade dos cursos de formao
contemplar espaos de trocas de experincias, pois para ele, o campo terico formativo est
-
37
distante do campo prtico de atuao dos professores que ensinam. O autor evidencia que
existe muito discurso sobre o campo de atuao da docncia, questiona-se muito sobre como
deveria ser, mas na prtica, no h nada que ajude realmente os docentes, pois
[...] o campo da formao de professores est particularmente exposto a este
efeito discursivo, que tambm um efeito de moda. E a moda , como todos
sabemos, a pior maneira de enfrentar os debates educativos. Os textos, as
recomendaes, os artigos e as teses sucedem-se a um ritmo alucinante
repetindo os mesmos conceitos, as mesmas ideias, as mesmas propostas
(NVOA, 2009, p.2).
Os espaos formativos devem contemplar a troca de conhecimentos entre os
professores em processo de formao e os j experientes, uma vez que essa troca tambm por
si s se caracteriza como formativo para os docentes. Isso quer dizer que quando a formao
privilegia a troca de experincia, ela possibilita aos docentes em exerccio, a reflexo sobre a
sua prpria prtica educativa. Entretanto, Canrio (1998, p. 15) coloca que nos cursos de
formao isso tem acontecido de forma contrria, j que [...] a formao, em vez de
contribuir para transformar os professores em profissionais reflexivos parece incentiv-los a
serem cada vez mais trabalhadores estudantes em que o estudo tende a entrar em conflito
com o investimento profissional.
Na sociedade lquida, termo emprestado de Baumam (2002), a escola tem se
apresentado em crise. Oliveira (2009) aponta que a crise institucional e o fracasso no processo
de assegurar o ensino e a aprendizagem faz com que seja necessrio buscar alternativa para
contrapor tal situao. Para isso, faz-se imprescindvel mudana no plano poltico
educacional, do qual no deve fugir o tema da formao inicial e continuada dos docentes. Tal
tema deve ser o eixo norteador das polticas para educao, uma vez que para a formao
inicial e continuada deve ser estabelecida como o principal fator para transpor as dificuldades
que so e esto postas na sociedade e na escola. Para a autora, a mudana na postura de tais
polticas que assegurar a garantia da [...] democratizao do ensino e a qualidade da oferta
educacional numa proposta de educao inclusiva (OLIVEIRA, 2009, p. 257), pois [...]
formar professores competentes e qualificados pode ser o alicerce para que se garanta o
desenvolvimento das potencialidades mximas de todos os alunos, entre eles, os com
deficincias (grifo do autor) (OLIVEIRA, 2009, p. 257).
Oliveira (2009) ainda sustenta que,
Considerar a educao inclusiva uma diretriz para a educao brasileira
deveria, obrigatoriamente, envolver novos aportes tericos, metodolgicos e
-
38
de formao docente, uma vez que fundamentos epistemolgicos que
sustentam a ideia de incluso educacional apontam exaustivamente para uma
ideia de diversidade, heterogeneidade, aprendizagem e rejeio aos
processos de excluso ocasionados pelo sistema educacional, seja de
crianas e jovens comuns ou com deficincia (OLIVEIRA, 2009, p. 258).
Pensar em uma poltica que garanta a educao inclusiva pressupe investimento
na formao tanto inicial quanto continuada dos professores. A esse respeito, Pilar Snchez,
Rogelio Abelln e Andrs Frutos (2012) a partir de estudos desenvolvidos no contexto
europeu sugerem que a proposta de um ensino unificado, de uma educao que contemple a
todos, obriga
[...] abandonar a clssica separao entre a formao do professor especial e
a do professor em geral: h que efetuar uma integrao de conhecimentos
provenientes de ambos os sistemas. Isso pressupe que a formao do
professor deve ser mais especializada para atender diversidade dos alunos,
e por sua vez, a formao especial deve ser mais generalista [...]
(SNCHEZ; ABELLN; FRUTOS, 2012, p. 136).
Os autores mostram a necessidade dos cursos de formao alinharem seus
contedos curriculares a fim de que ambos possam possibilitar uma formao mais ampla no
sentido de efetivamente desenvolver a educao inclusiva. Para que os docentes adquiram os
saberes necessrios para a atividade educativa, preciso que a formao contemple contedos
e saberes que possibilite aos docentes uma atuao que permita proporcionar o
desenvolvimento de uma educao inclusiva de qualidade, pois nas escolas
[...] fica patente o despreparo dos educadores em geral quanto ao
conhecimento sobre as peculiaridades de um determinado tipo de
deficincia/incapacidade, e este um aspecto que se destaca nesta trama,
principalmente pela ausncia de uma poltica de formao continuada capaz
de promover o desenvolvimento profissional dos professores (FERREIRA;
FERREIRA, 2007, p. 36-37).
Considerando os apontamentos acima, possvel afirmar que as instituies
escolares ainda no esto preparadas para equacionar os problemas educacionais. A este
respeito, os autores mostram que vivencia-se momentos e instncias,
[...] na educao em que coexistem a incapacidade da escola para ensinar
todos os seus alunos e a presena de fato de alunos com deficincia, que so
estranhos pra ela. To estranhos que ela parece resistir em reconhec-los
como seus alunos, em desenvolver sua formao, em reconhecer um
-
39
processo educativo relevante para eles. Parece prevalecer no conjunto da
cultura escolar a concepo de que o lugar da pessoa com deficincia fora
da escolar regular (FERREIRA; FERREIRA, 2007, p.37).
possvel compreender que a falta de preparo dos docentes est relacionada ao
fato de que na maioria dos cursos de formao inicial, no h uma previso da prtica
educativa que contemple as dificuldades e a diversidade dos alunos, mas sim modelos de
desenvolvimento idealizados por alunos que aprendem, colocando as prticas educativas na
linha da excluso de alunos que no se enquadrem nesse modelo, nesse caso, os alunos com
deficincia. Outro fator a considerar no processo educativo diz respeito s responsabilidades
atribudas aos docentes. Ges (2007) afirma que,
Mesmo havendo concordncia quanto viso de que o professor no poderia
ser responsabilizado sozinho, ante o cumprimento das novas metas, as
situaes comentadas indicam que lhe atribuda uma carga excessiva. Ele
, de fato, um agente central no atendimento ao aluno especial, assim como
aos demais alunos. Sem negar o mrito de esforos individuais e propostas
localizadas, o fato que o professor no tem tido experincias formativas
suficientes ou suporte humano e material necessrio para lidar com as novas
demandas do trabalho pedaggico (GES, 2007, p.77).
A autora traz em cena a situao dos docentes, pois fica a cargo destes promover o
processo educativo inclusivo, o que pode se traduzir em situaes de desconforto na atuao
profissional. No que concerne s condies de trabalho dos docentes, a sociedade traz para a
escola uma carga excessiva de trabalho que recaem sobre os docentes. Nesta direo, Jos
Freire (2011) coloca que,
O professor dever assumir e prestar contas de suas tarefas didticas
escola, aos pais e sociedade e ainda, participar da gesto escolar junto
comunidade. Nesta perspectiva, o professor em geral, visto como agente
responsvel pela mudana educativa, o que o leva a manifestar reaes
contraditrias diante das exigncias que esto alm da sua formao. A
ampliao de suas funes docentes, no contexto da reforma educativa, tem
contribudo para um sentimento de insegurana, desencanto. (FREIRE,
2011, p.48-49).
O processo de incluso dos alunos com deficincia faz com que os docentes saiam
de uma tradicional zona de conforto profissional onde os alunos eram sempre
homogeneizados todos aprendiam, e passam a receber em suas salas, alunos com supostas
-
40
dificuldades para aprenderem, lanando desafios que, na maioria das vezes, a formao dos
professores no d conta de resolver, desestabilizando a prtica educativa. nesse contexto
que Kenneth Zeichner (1993) aponta que a formao deve ajudar os professores no
desenvolvimento de atitudes, saberes e capacidades essenciais para a prtica educativa que
privilegie a diferena dos alunos. Quando a formao dos professores d conta de ofertar os
subsdios necessrios para trabalhar com as diferenas inseridas nos ambientes escolares, ou
seja, das diferenas sociais, de raa, gnero, etnia e, acrescentando a este conjunto de
diferenas, os alunos deficientes, o docente poder desenvolver estratgias para melhorar sua
atuao profissional.
Considerando o exposto neste tpico, faz-se necessrio compreender como se deu
o processo histrico de constituio da educao inclusiva, as polticas e os conceitos que a
permeiam. No tpico a seguir, aborda-se a contextualizao do processo de incluso dos
alunos deficientes.
2.2 - A Escola Inclusiva contextualizando o processo de incluso dos alunos deficientes
(histria, legislaes, conceitos)
Este tpico tem por objetivo refletir sobre as polticas de atendimento especfico
as pessoas com deficincias. Problematiza a possvel escola inclusiva para atender as
especificidades dos estudantes deficientes.
Pensar na pessoa deficiente significa refletir sobre indivduos os quais
historicamente foram negados muitos direitos e esteve excludo do convvio social, haja vista
a incompreenso das diferenas individuais, principalmente por parte das famlias presas aos
dogmas tradicionais. Tal situao ocorria devido a diversos fatores, os quais se destacam o
misticismo e ocultismo ligados religio. A esse respeito Marcos Mazzota (2001) afirma que
at o sculo XVIII, as noes a respeito da deficincia eram basicamente ligadas a
misticismo e ocultismo, no havendo base cientfica para o desenvolvimento de noes
realsticas (MAZZOTA, 2001, p.16). Para pessoas com deficincias diversas, negava-se
convivncia social, sendo que estas viviam ignoradas, a margem da sociedade. O autor ainda
destaca que outro fator propiciador da excluso era a religio, pois, ao pregar a perfeio
divina, tornava o individuo deficiente impuro, provocando ainda mais a sua marginalizao da
condio humana.
-
41
No mbito internacional houveram vrios movimentos e convenes mundiais
que possibilitaram o atendimento educacional inclusivo. O documento Orientaes para a
Incluso: garantindo o acesso Educao para todos1 publicado em 2005 pela Organizao
da Naes Unidas para a Educao, Cincia e Cultura (UNESCO), aponta cronologicamente a
evoluo dos movimentos internacionais para a garantia dos direitos para a incluso, dentre
eles, elenca-se alguns, tais como:
1948 Declarao Universal dos Direitos Humanos: que assegura o direito
educao elementar gratuita e obrigatria para todas as crianas;
1989 Conveno da ONU sobre os Direitos da Criana: que assegura os
direitos de todas as crianas educao sem qualquer discriminao;
1990 Declarao Mundial sobre Educao para todos (Declarao de
Jomtien): que assegura o direito a educao para todos independentemente de suas
diferenas particulares;
1993 Normas da ONU sobre a Equiparao de Oportunidades para Pessoas
com Deficincias (norma 6): que no s afirma a igualdade de direitos de todas as
crianas, jovens e adultos, como tambm estabelece que a educao deve ser
ministrada num ambiente de escola integradora e em escolas regulares;
1994 Declarao de Salamanca e Referencial para Ao em Educao de
Necessidades Especiais: que assegura que as escolas devem receber todas as
crianas independentemente de suas condies fsicas, intelectuais, sociais,
emocionais, lingusticas ou outras. Isto inclui crianas com deficincias, e
superdotadas, crianas de rua e crianas trabalhadoras, crianas de populaes
remotas ou nmades, crianas minorias lingusticas, tnicas ou culturais e crianas
de outras reas ou grupos desfavorecidos ou marginalizados;
2000 Frum sobre Educao Mundial: que estabelece que at 2015 todas as
crianas tenham acesso e recebam uma educao primria obrigatria e gratuita.
Tais movimentos internacionais fizeram com que os governos pensassem em
polticas educacionais que atendessem aos princpios dos documentos firmados nestas
convenes. Cabe mencionar que a poltica educacional para a incluso de alunos deficientes
tambm constitui parte da histria da educao no Brasil.
1 UNESCO, 2005, p.11-12
-
42
Historicamente, a educao brasileira revela que o atendimento a pessoas com
deficincia iniciou-se no final do sculo XIX com a criao de instituies especializadas para
atender a demandas de indivduos cegos com o Instituto dos Cegos, denominado de Instituto
Benjamin Constant e com o Instituto N