João Aníbal Henriques
Castro LaboreiroParque Nacional da Peneda-Gerês
por João Aníbal Henriques
Existem lugares que estão prenhes de memórias
e de vida. Neles subsistem memórias ancestrais,
marcadas nas rochas firmes que as sustentam,
em laivos de ritos que se repetem milenarmente
e que quase tocam a eternidade. Castro
Laboreiro, no Concelho de Melgaço, no Norte de
Portugal, é um excelente exemplo de um espaço
assim. Nele convivem muitas gerações que se
cruzam nos seus quereres, nos seus sonhos e nas
suas emoções, repetindo-se num monumento
cíclico eterno que surge perenes nas paredes, no
chão e nas rochas do lugar.
Castro Laboreiro
Com uma história ancestral, provavelmente contemporânea do nascimento da espécie humana na Terra,
Castro Laboreiro ganha o seu topónimo do seu velho e vetusto castelo – ou castro – que estrategicamente
colocado no topo do morro nos deixa perceber que importância teve este lugar na definição dos limites
territoriais do nosso País.
Castro Laboreiro
Castro LaboreiroO castelo ou castro, atribuído na literatura mais antiga ao
período romano, surge durante o romantismo como sendo de
origem árabe, facto que se sustenta na efectiva influência que
os norte-africanos tiveram na consolidação do espaço
territorial do El-Andaluz. Sabe-se hoje, no entanto, que o
castelo é muito mais velho do que isto e que, no deambular
transumante da pré-história, seria já um local de extrema
importância, pelo menos durante o período de veraneio.
As suas raízes celtas, imbuídas no espírito das muitas tribos
que aqui estavam sedeadas e que se digladiavam de forma
permanente protegendo-se nos fortes e contra-fortes que as
serranias proporcionavam, é uma certeza inultrapassável que
ajuda a percebe melhor a forma consentânea que o espaço
apresenta quando relacionada com a existência ambígua dos
seus primeiros ocupantes.
Parque Nacional da Peneda-Gerês
Hoje, milhares de anos depois desse período áureo de Castro Laboreiro, a população continua a viver de forma
cruza entre as “inverneiras”, ou seja, os espaços de habitação situados nos vales que envolvem o lugar,
como Bico, Cailheira, Curveira, Bago de Cima e Bago de Baixo, Ameijoeira, Laceiras, Ramisqueira, João Lavo,
Barreiro, Acuceira, Podre, Alagoa, Dorna, Entalada, Pontes, Mareco, Ribeiro de cima e Ribeiro de Baixo e as
“brandas” os espaços ocupados durante o período estival e situados na regiões mais altas que envolvem a
localidade. As principais “brandas” são Vila, Várzea Travessa, Picotim, Vido, Portelinha, coriscadas, Falagueiras,
Queimadelo , Outeiro, Adofreire, Antões, Rodeiro, portela, Formarigo, Teso, Campelo, Curral do Gonçalo, Eiras,
Padresouro, Seara, e Portos. O ritual de passagem de trecos e tarecos entre as duas casas pelas famílias
castrejas, repete-se ainda hoje numa espécie de ritual cíclico que perpetua a própria Alma Lusitana neste lugar
tão especial.
Castro Laboreiro
Os dólmenes situados junto à localidade, ainda
hoje motivo que redobra o interesse por uma
visita, atestam e testemunham a herança simbólica
e sagrada de um espaço que provavelmente só
assim explica a sua longevidade.
De facto, com uma situação geográfica extrema,
Castro Laboreiro viveu durante milénio num
isolamento muito profundo, facto que
contextualiza a excelente preservação dos seus
monumentos mas, também, a manutenção quase
se poderia dizer inusitada de uma estrutura de
pensamento que se consolida à medida em que os
séculos vão passando. Certo, no entanto, é que as
agruras do tempo e do clima e até a própria
produtividade da terra são insuficientes para
explicar a teimosia humana em permanecer por
aqueles lados, isto se não tivermos em linha de
conta a beleza natural que envolve todo o espaço e
que é de tal forma impactante que se torna difícil
de descrever.
Situada em pleno Parque Nacional da Peneda-
Gerês, que seria por si só motivo que chegaria para
explicar o interesse de a visitar, a localidade de
Castro Laboreiro vale ainda a pena pelos seus
excelentes restaurantes e magnífica gastronomia
que oferecem aromas e sabor a uma visita ao local.
Mas no alto, alcandorado nas penhas que protegem a fronteira, o castelo sobrevive ainda, assente nas
ruínas que sobreviveram a um raio que o destruiu por completo no Século XIV e que Dom Dinis mandou
reconstruir.
O caminho íngreme e difícil, num acesso que só é possível fazer-se durante o Verão, transporta-nos até a
mais de 1000 metros de altura, deixando antever, aqui e ali, pequenos panos das antigas muralhas. Só
quando chegamos lá acima, já bem perto das enormes rochas onde está alicerçada a entrada principal,
começamos a perceber o assombroso daquele local. Uma paisagem sem fim, num conjunto de planos
infinitos que reforçam a sensação de pequenez e de insignificância que este tipo de locais sempre nos trás.
Classificado como Monumento
Nacional desde 1944, o Castelo de
Castro Laboreiro foi conquistado por
Dom Afonso Henriques em 1141
que lhe terá construído uma torre
de menagem isolada que lhe
conferiu a configuração tradicional
dos castelos românicos.
Castro Laboreiro
Castro LaboreiroDepois de consolidada a Nacionalidade e de
terminadas as lutas fratricidas que deram
corpo à independência de Portugal, Castro
Laboreiro nunca perdeu da sua importância
estratégica, facto que se percebe através de
uma análise linear à forma como se situa a
sua muralha relativamente à fronteira galega.
No seu interior, abaixo do marco geodésico
que ocupa o espaço onde estava outrora a
torre medieval, existe ainda o redil onde se
juntava o gado das redondezas, protegido
pelos muros grossos das investidas sempre
terríveis de inimigos e animais selvagens.
Em suma, Castro Laboreiro e o seu velho
castelo são uma das pérolas inesquecíveis de
Portugal. Valem a distância necessária para lá
chegar e justificam por si só o passar por lá
uns dias de férias.
Parque Nacional da Peneda-Gerês