// Revista da Faculdade de Direito // número 3 // primeiro semestre de 2015
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OS PACTOS DE ALFABETIZAÇÃO: UMA ANÁLISE JURÍDICA DE POLÍTICAS PÚBLICAS VISANDO À EFETIVAÇÃO DO DIREITO À EDUCAÇÃO.Carlos José Teixeira de Toledo*
*Possui graduação em Direito pela Uni-versidade de São Paulo (1991) e mestra-do em Direito pela Universidade de São Paulo (1997). É procurador do Estado desde 1993, tendo exercido atribuições de Conselheiro Eleito do Conselho Supe-rior da PGE/SP, Procurador Chefe da Pro-curadoria Judicial e Procurador Chefe do Centro de Estudos da PGE/SP. É professor universitário, lecionando na Universidade Nove de Julho (UNINOVE) desde 2002 e na Universidade São Judas Tadeu, des-de 2013. É subcordenador do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito do Estado na Escola Superior da Procurado-ria Geral do Estado de São Paulo. Atuou como Presidente do Conselho Curador da Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado (2009-2010) e Presidente do Con-selho de Administração da SPPREV - São Paulo Previdência (2009-2011) Tem expe-riência na área de Direito, com ênfase em Direito Constitucional e Direito Administra-tivo, atuando principalmente nos seguin-tes temas: administração pública, direito constitucional, direito administrativo, patri-mônio cultural, servidores públicos, direito à informação.
ResumoNas últimas décadas, o Brasil tem avançado no processo de universalização do acesso à educação formal, o que nem sempre resulta em ganhos qualitativos que garantam a aquisição, pelos educandos, das habilidades e competências essenciais para o domínio da escrita e da leitura. O reconhecimento dessa insuficiência tem levado os atores envolvidos no processo educacional a propor e implementar políticas públicas que buscam promover a articulação institucional para atuação com foco determinado: garantir que o processo de alfabetização confira aos educandos uma proficiência considerada compatível com a idade e permitindo os avanços posteriores no processo educacional. Nosso intuito nesse artigo é analisar duas políticas públicas desse feitio – o Programa de Alfabetização na Idade Certa, do Estado do Ceará e o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, de âmbito federal – conjugando instrumentos tradicionais da análise de políticas públicas com uma visão jurídica de política pública com enfoque nos arranjos institucionais.Palavras-chave: políticas educacionais; alfabetização; qualidade do ensino; avaliação de políticas públicas.
AbstractBrazil has been moving forward with the process of providing universal access to formal education in recent de-cades. However, that does not always result in the acquisition of core skills and competencies necessary to the mastery of writing and reading. The recognition of this insufficiency has led the agents involved in the educational process to propose and implement public policies which promote institucional articulation focusing to ensure the effectiveness of the literacy process in the early years of elementary school, giving students a proficiency con-sidered compatible with their. The purpose of this article is to analyse two of those public policies, “Programa de Alfabetização na Idade Certa”(Literacy Program at the Appropriate Age), performed in the State of Ceará and the “Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa” (National Pact for Literacy at the Appropriate Age), performed in federal level, combining traditional tools of public policy analysis and a legal view of public policy focused on institucional arrangements.Keywords: educational politces; literacy; teaching quality; public policy analisys.
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1. O desafio de garantir efetivamente o direito à educa-
ção, em seu mais básico elemento: a alfabetização.
Oideário iluminista que presidiu a emancipação na-
cional fez inscrever, no rol de direitos da primeira
Carta Constitucional, a garantia de “instrução pri-
mária, e gratuita a todos os cidadãos” (art. 179, XXXII).
Alguns anos passados da outorga de nossa primeira
Constituição, é produzida a lei que viria a efetivar tal di-
reito, a Lei nº 15 de outubro de 1827, que dispõe que
“em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos,
haverão as escolas de primeiras letras que forem neces-
sárias” (art. 1º) e estabelece medidas administrativas ne-
cessárias para tal intento, tais como o concurso público
e os requisitos para o desempenho do magistério, piso
e teto salarial dos docentes e até mesmo um esboço de
currículo mínimo.1
Passados quase duzentos anos, é certo que o Estado Bra-
sileiro ainda não conseguiu desempenhar a contento a tare-
fa a que se atribuiu desde sua gênese. Neste contexto, ob-
serva-se especialmente a dificuldade com a aprendizagem
da leitura e escrita, bem como da compreensão de textos,
o que é observado em relatório da OCDE sobre a aplicação
do exame PISA2 em estudantes brasileiros.3
No exame PISA de 2012, com foco nas habilidades de lei-
tura, o Brasil demonstrou evolução em relação ao exame
análogo, realizado em 2009, constatando-se, todavia que
cerca de metade dos estudantes participantes – 49% para
ser exato – não alcançou o nível 2, considerado aceitável
para a faixa etária examinada, o que coloca o país em situ-
ação nada alentadora, se comparado aos demais países do
mundo desenvolvido e mesmo em relação a outras demo-
cracias latino-americanas.4
Tal diagnóstico comparativo é desconfortável, consideran-
do que estamos nos referindo a um direito que é de natu-
reza universal, em vista dos diversos compromissos assu-
midos no bojo dos sistemas de direitos humanos de que o
Brasil é partícipe.5
Em período mais recente, destaca-se a Declaração Mun-
dial Sobre Educação Para Todos, aprovada pela Confe-
rência Mundial sobre Educação para Todos , realizada em
Jomtien, Tailândia (1990). Tal declaração veio acompanha-
da de um Plano de Ação para satisfazer as necessidades
básicas de aprendizagem, dentre as quais se destacam as
de leitura e escrita.6 Cabe destacar também, no referido
documento, que a atividade educacional deve estar enfo-
cada na aprendizagem efetiva, com ênfase na qualidade
do processo educacional, concluindo: “Daí a necessidade
de definir, nos programas educacionais, os níveis desejá-
veis de aquisição de conhecimentos e implementar siste-
mas de avaliação de desempenho” (art. 4).
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Os compromissos firmados na Declaração de Jomtien foram
renovados e reafirmados na Declaração adotada pela Cúpula
Mundial de Educação, em Dakar, Senegal, realizada em abril
de 2000, que estabeleceu metas temporais para elevação da
qualidade do ensino. Em agosto desse mesmo ano de 2000
foi realizada a Cúpula do Milênio das Nações Unidas, de que
resultou a chamada “Declaração do Milênio”, estabelecendo
a meta de que, até 2015, “crianças de toda parte, tanto me-
ninos como meninas sejam capazes de completar um curso
de ensino primário; e que meninos e meninas tenham igual
acesso a todos níveis de educação”.
Portanto, o direito à educação é objeto de especial atenção
por parte dos sistemas internacionais de proteção dos di-
reitos humanos, sendo que o Brasil é signatário de todos os
compromissos acima mencionados e vincula-se, portanto,
às regras e metas neles estabelecidas.7
Ademais de ser um direito humano, o direito à educação é
também um direito fundamental, reconhecido nos arts. 6º
e 205 da Constituição Federal. A par de sua fundamentali-
dade dotá-lo de características que são ínsitas aos direitos
dessa espécie – como a intangibilidade, irrenunciabilidade,
imprescritibilidade, inalienabilidade, etc. – podemos apontar
no direito à educação características especiais tais como:
a) Essencialidade: trata-se de direito que é condição ne-
cessária para exercício de outros direitos fundamentais,
entre outros: o direito à informação, ao trabalho e à partici-
pação política, ou seja, ao exercício da cidadania, em seu
mais amplo sentido.
Nesse sentido, a aquisição das habilidades e competência
básicas, de que a alfabetização é a expressão mais sinté-
tica, é sem dúvida nenhuma a porta de entrada de outros
direitos fundamentais – e basta lembrar que ainda hoje os
analfabetos são inelegíveis para os cargos políticos por ex-
pressa disposição constitucional,8 sendo que certamente
não têm acesso a quaisquer cargos, empregos ou funções
públicas em face das mínimas exigências de qualquer con-
curso ou processo seletivo.
Não é por outra razão que em seu relatório para a 68ª As-
sembleia Geral da ONU, realizada em 2013, o Relator Espe-
cial para o Direito à Educação, Kishore Singh, observou que
“[...]o direito à educação é um direito abrangente (é essen-
cial para o exercício de todos os demais direitos), por tal ra-
zão a educação deve ser considerada a base para a agenda
de desenvolvimento pós-2015[...]”. (ONU, 2013)
b) Multifuncionalidade: adotando-se a classificação pro-
posta por Jellinek, o direito à educação tanto pode fun-
cionar como direito de status negativus – o que se afirma,
por exemplo, no reconhecimento da liberdade de apren-
der, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e
o saber (art. 206, II) – como de status positivus – por meio
da prestação do serviço educacional pelo Estado (art. 208
e 211) – também tendo aspectos de status activus – na
medida em que se afirma a gestão democrática do ensino
público (art. 206, VI).
c) Relevância da dimensão objetiva: visto que embora te-
nha uma dimensão subjetiva, eis que é voltado “ao pleno
desenvolvimento da pessoa” (art. 205), há no reconheci-
mento de tal direito, “uma dimensão autônoma, que trans-
cende a perspectiva subjetiva” (Sarlet, 2013: 308).
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Tal aspecto se revela especialmente pela natureza obrigató-
ria da educação básica (208, I), o que revela a natureza dú-
plice dessa posição jurídica: é ao mesmo tempo um direito
e um dever. E isso se evidencia pelo aspecto eminentemen-
te social da atividade educacional, em mais de um aspecto,
pois: a) a educação é necessariamente um processo social,
visto que “a educação consiste num processo de socializa-
ção metódica das novas gerações” (Durkheim, 1978: 41);
b) os resultados do processo educacional têm impacto não
apenas na esfera do indivíduo, pois deles depende enorme-
mente a realização dos objetivos coletivos enunciados no
art. 3º da Constituição Federal.
Essa natureza especial do direito fundamental à educação
vai se revelar especialmente pela complexidade das opera-
ções necessárias para tornar efetivo esse direito, sendo que
somente por meio da ação governamental devidamente pla-
nejada e coordenada é que o processo educativo alcançará
os ambiciosos objetivos traçados pela norma constitucional.
É justamente esse processo de integração e coordenação,
que resulta do desenho de competências institucionais esta-
belecido na Constituição Federal que passaremos a examinar.
2. A prestação do serviço educacional na Federação
Brasileira
As tensões entre o poder central e os impulsos autonomis-
tas locais perpassam a história do Estado-nação brasileiro
desde a origem, marcada por movimentos separatistas no
primeiro quartel de sua emancipação, sendo tais impulsos
um dos principais vetores da derrubada da monarquia e im-
plantação do regime republicano.
Ao longo da história constitucional republicana, percebe-se
o movimento pendular entre processos centrípetos e cen-
trífugos de distribuição dos poderes políticos, sendo que a
Constituição de 1988 estabeleceu um modelo extremo de
descentralização, ao elevar os municípios ao status de enti-
dade federativa,9 no que veio a resultar em arranjo alcunha-
do pela doutrina como “federação tripartite” ou “trilateral”
(Bonavides, 2011, p.347)
Esse novo equilíbrio estabelecido entre as três esferas do
poder político trouxe ainda mais complexidade à vida polí-
tico-institucional e não é isento de questionamentos, dada
as assimetrias existentes, que se revelam especialmente na
discrepância entre a atribuição de tarefas e a capacidade
financeiro-administrativa dos entes da nova federação.10
No âmbito da coordenação da atuação estatal, com vistas
a propiciar o direito à educação, é pertinente a constatação
de Bucci e Vilarino:
Consideradas, todavia, a realidade socioeconômica bra-
sileira e as efetivas condições dos Municípios, o modelo
artificial de federação adotado tem sido um fator a mais
a dificultar o desenvolvimento da Educação em âmbito
nacional. É certo que há Município se Estados em tese
preparados para a prestação do serviço público educacio-
nal que lhes é incumbido, mas há outros, como é sabido,
sem as condições adequadas, o que os faz dependentes
das políticas públicas da União. São os vários Brasis exis-
tentes. Ainda que preservadas as características locais, a
Educação deve ser garantida com qualidade nos termos
assegurados pela Consitutição Fedral, em todo o território
nacional, a todos os cidadãos do País. (2013, p. 119)
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Historicamente, a afirmação do direito à educação, nos
moldes em que atualmente se estabeleceu no Texto Cons-
titucional vigente, foi objeto de uma luta de gerações, em
prol da afirmação do ensino público – em contraste dos
defensores da primazia do ensino privado ou confessional
– dotado das características de laicidade, obrigatoriedade,
gratuidade e universalidade.
Este último aspecto – a universalidade – é certamente o
mais relacionado aos ideais de igualdade e de democra-
tização, visto que a garantia de acesso aos níveis iniciais
de ensino é uma conquista relativamente recente.11 As-
sociado ao ideal de universalização e democratização,
assiste-se a partir do final dos anos 50 uma expansão
das redes estatais de ensino, por meio da criação das
redes municipais – o que também responde ao fenômeno
de contínuo êxodo rural e crescimento dos centros urba-
nos (Freitas e Bicas, 2009).
Nesse contexto, ganha força a concepção de que a des-
centralização do ensino favorece a autonomia didática e a
democratização da gestão escolar, o que acaba se refletin-
do no desenho de coordenação institucional estabelecido
na Constituição Federal de 1988.
Em tal desenho, no plano da produção legislativa, não obs-
tante a competência privativa da União para instituir as di-
retrizes e bases da educação nacional (art. 22, XXIV), rema-
nesce aos Estados e Distrito Federal a competência para
legislar, de forma concorrente, sobre educação (art. 24, IX),
não se excluindo a competência municipal para produzir
normas suplementares que atendam às suas peculiarida-
des locais (art. 30, II).
No âmbito da competência de atuação, as três esferas fo-
ram contempladas, sendo que à União, além de organizar
e financiar sua própria rede de ensino, coube exercer fun-
ção redistributiva e supletiva, de forma a garantir equa-
lização de oportunidades educacionais e padrão mínimo
de qualidade do ensino mediante assistência técnica e fi-
nanceira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios
- art. 211, § 1º, com redação dada pela Emenda Constitu-
cional nº 14, de 1996.12
Revelador do destaque dado ao papel dos Municípios, na
topologia do art. 211, a definição de suas atribuições é es-
tabelecida no § 2º do mesmo artigo, cabendo-lhes a atu-
ação no ensino fundamental e na educação infantil.13 Aos
Estados e o Distrito Federal, o § 3º determina a atuação
prioritária no ensino fundamental e médio.14
A necessidade de atuação colaborativa é mencionada tan-
to no caput do dispositivo, quanto em seu § 4°, que esta-
belece como meta comum dos entes a universalização do
ensino obrigatório.
A par da repartição de competências, aqui resumida,15 hou-
ve a preocupação de garantir recurso mínimos à atividade
educacional, com base em percentual da receita de impos-
tos arrecadados e recebidos por transferência, por cada
ente federativo (art. 212). Tal disposição veio a ser comple-
mentada pela criação do FUNDEF (Fundo do Desenvolvi-
mento da Educação Fundamental) pela Emenda Constitu-
cional nº 14, de 1996, fundo que veio a ser substituído de
forma aprimorada pelo FUNDEB (Fundo de Desenvolvimen-
to da Educação Básica), por força da Emenda Constitucio-
nal nº 53, de 2006.
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A criação de tais Fundos teve por preocupação propiciar uma
distribuição equitativa dos recursos, de maneira a “assegurar,
no financiamento da educação básica, a melhoria da quali-
dade de ensino, de forma a garantir padrão mínimo definido
nacionalmente.”16 Não há como não relacionar tal disposição
com os objetivos enunciados no art. 3º do Texto Fundamental,
todos voltados à formação de uma sociedade que contemple
um patamar mínimo de direitos condizente com a dignidade
pessoal e que favoreça o desenvolvimento coletivo.
3. Os pactos em favor da alfabetização na idade certa
Apesar de todos os esforços realizados nas últimas duas
décadas, é certo que a percepção geral é de que o Estado
Brasileiro, conquanto tenha sido bem sucedido na univer-
salização do acesso ao ensino fundamental,17 não tem sido
capaz de garantir que tal acesso redunde em efetivo do-
mínio das competências e habilidades básicas necessárias
ao “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”,
conforme alvitra o art. 205 da Constituição Federal.
Essa realidade se tornou mais clara a partir da implantação,
a partir da década de 90, de processos avaliativos em nível
federal – o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB)
– sendo que vários Estados também implantaram processos
congêneres – a exemplo do SARESP do Estado de São Pau-
lo e do Spaece no Ceará, para usar de dois exemplos.
Percebe-se, desde então, a busca dos atores políticos-
-institucionais em conciliar o ideal de descentralização,
gestão democrática e autonomia pedagógica, consagrados
na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação,18 com o imperativo de estabelecer padrões uni-
formes de qualidade do ensino em âmbito nacional, o que
se revela pela elaboração dos Planos Nacional de Educa-
ção,19 das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educa-
ção Básica,20 dos Parâmetros Curriculares Nacionais, entre
outras medidas que buscam estabelecer a coordenação de
atuação dos entes federativos na prestação educacional.
Em período mais recente, percebe-se que os entes políticos
e demais atores envolvidos no processo educacional se de-
ram conta da necessidade de centrar esforços nos anos ini-
ciais de escolarização, o que se evidenciou especialmente
em face da mudança da idade de ingresso no mundo escolar,
com a ampliação do ensino fundamental de 8 (oito) para 9
(nove) anos e ingresso aos 6 (seis) anos de idade, por força
do disposto na Lei nº 11.277, de 6 de fevereiro de 2006.
Esse esforço conjunto vem sendo formatado na forma de
Pactos pela Alfabetização na Idade Certa, com o envolvi-
mento de diversos atores governamentais e não governa-
mentais, em torno da formulação de uma política espe-
cífica para os anos iniciais de escolarização, envolvendo
medidas de gestão, avaliação, práticas pedagógicas e de
formação docente.
O modelo inicial se deu com a experiência do Estado do
Ceará, a partir de 2006, sendo que houve a replicação do
modelo em nível nacional, a partir de 2012. Para melhor
compreensão, vamos analisar de forma separada os dois
programas.
3.1. O PAIC – Programa Alfabetização na Idade Certa, do
Estado do Ceará
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Em 2004, a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará
criou o Comitê Cearense para a Eliminação do Alfabetis-
mo Escolar,21 instância que contou com a participação de
instituições de variada natureza e realizou um diagnóstico
da situação do processo de alfabetização no Estado, cujo
principal aspecto foi a avaliação da aprendizagem de leitura
e escrita das crianças que estavam cursando a 2ª série do
Ensino Fundamental nas escolas públicas de 48 municípios
cearenses. Além de outros aspectos no tocante à formação
dos professores e à prática de ensino, observou-se então
que somente 40% dos alunos da amostra de quase 8.000
alunos foram considerados alfabetizados (Marques; Ribei-
ro; Ciasca, 2008).
A partir de tal constatação e das recomendações constan-
tes no relatório final do Comitê,22 a Associação dos Prefei-
tos do Estado do Ceará (APRECE) e a já citada UNDIME/
CE, com a parceria técnica e financeira do UNICEF, cria-
ram o Programa Alfabetização na Idade Certa - PAIC, por
meio da celebração de um pacto de cooperação, visando
desenvolver ações conjuntas em cinco áreas: avaliação da
aprendizagem, gestão educacional, gestão pedagógica,
educação infantil e literatura infantil.
Fixou-se, nesse programa, que o processo de alfabetização
deveria estar consolidado no 2º ano do Ensino Fundamen-
tal, o que corresponderia à antiga 1ª Série, na terminologia
anterior à Lei nº 11.277/2006.
Em 2007, o grupo político que capitaneava a iniciativa assu-
miu o Governo Estadual,23 o que fez que houvesse um enga-
jamento maior da Secretaria Estadual da Educação, que as-
sumiu a coordenação do programa e passou a investir mais
recursos no apoio aos municípios cearenses, que acabaram
por aderir em sua totalidade ao pacto de colaboração.
Cabe observar que naquele Estado, o ensino é fortemente
municipalizado,24 sendo que aproximadamente 80% das
receitas dos Municípios são decorrentes de repasses da
União e do Estado.25
Para desenvolvimento das atividades do programa, houve
a criação de estruturas próprias na Secretaria da Educação
do Ceará: uma Coordenadoria de Cooperação com os Mu-
nicípios (COPEM) para atuar na relação colaborativa com
os entes municipais sem onerar a gestão da rede própria
do Estado; e Núcleos Regionais de Cooperação com os
Municípios (NRCOMs) nas 20 Coordenadorias Regionais de
Desenvolvimento da Educação (CREDES).
O arranjo institucional compreendeu também a criação de
equipes nos municípios, em moldes semelhantes à COPEM,
de tamanho variável, lideradas por um gerente municipal.
A colaboração entre o Estado e Municípios é formalizada
por meio de um Protocolo de Intenções extremamente sin-
gelo, no qual são fixadas de forma bastante genérica as
responsabilidades dos entes pactuantes.26
A par desse instrumento, criou-se um Comitê de Articula-
ção, dotado de funções consultivas e fiscalizadoras, sendo
que as entidades participantes são vinculadas por um Ter-
mo de Parceria, que é igualmente sucinto e genérico.27
O embasamento legal do programa e dos instrumentos
acima mencionados se deu por meio da Lei Estadual nº
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14.026, de 17 de dezembro de 2007, que basicamente:
a) fixou os objetivos do programa, sendo: um objetivo
mediato, referente à garantia de que os alunos che-
guem ao 5º ano do ensino fundamental sem distorção
de idade, série e com o domínio das competências de
leitura, escrita e cálculo adequados à sua idade e ao
seu nível de; e um objetivo imediato que é garantir a
aquisição, por todas as crianças de 7 (sete) anos, das
competências de leitura e escrita esperadas nesta ida-
de (art. 2º).
b) estabeleceu os eixos do Programa, a saber: I - Edu-
cação Infantil; II - Gestão Pedagógica – Alfabetização
e Formação de Professores; III - Gestão da Educação
Municipal; IV - Formação do Leitor; V - Avaliação Exter-
na de Aprendizagem (art. 3º).
c) autorizou a Secretaria da Educação autorizada a fir-
mar acordos de cooperação técnica e financeira com
os municípios cearenses, com universidades públicas
e seus institutos ou fundações universitárias de pes-
quisa e pós-graduação e, ainda, com instituições de
fomento à pesquisa (art. 4º); bem como a Fundação
Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e
Tecnológico – FUNCAP, a conceder bolsa de pesqui-
sa e de extensão tecnológica a servidores públicos, ou
não, com o objetivo de realizar pesquisas e ministrar
treinamentos e capacitação das equipes da Secretaria
da Educação e dos técnicos e professores da rede mu-
nicipal de ensino (art. 5º).
Essa lei foi complementada posteriormente pela Lei nº
15.276, de 28 de dezembro de 2012, que estabelece de
forma mais detalhada o regime de concessão de bolsas de
pesquisa e extensão tecnológicas, estabelecendo os crité-
rios de seleção, atividades pertinentes, prazo de vigência e
tabela de valores de acordo com titulação e características
da atividade desempenhada.
Ainda no plano legal, foi promulgada lei instituindo Prêmio
Nota Dez, destinado às escolas públicas que obtenham os
melhores resultados de alfabetização, expresso por meio
de índice próprio (Índice de Desempenho Escolar – Alfabe-
tização – IDE-ALFA).28 As 150 escolas premiadas têm o en-
cargo de estabelecer cooperação técnico-pedagógica com
as 150 escolas com piores índices de desempenho.
Destaque-se ainda a Lei Estadual nº 14.023, de 17 de de-
zembro de 2007, que estabelece os critérios de repasse de
receitas do ICMS destinadas ao Município, sujeitos à atri-
buição discricionária do Estado, nos termos do art. 158, pa-
rágrafo único, II da Constituição Federal. Tal diploma vincula
18% (dezoito por cento) desse repasse ao Índice Municipal
de Qualidade Educacional de cada município, formado pela
taxa de aprovação dos alunos do 1 º ao 5º ano do ensino
fundamental e pela média obtida pelos alunos de 2º e 5º
ano da rede municipal em avaliações de aprendizagem.
Essa é, em suma, a base jurídico-normativa do PAIC, sen-
do que omitimos as normas regulamentadoras produzidas
pelo Poder Executivo, que apenas detalham os aspectos já
mencionados sobre a execução do programa.
Quanto aos resultados, os dados do Sistema Estadual de
Avaliação de Alfabetização – SPAECE-ALFA, apontam uma
melhoria dos índices de proficiência dos alunos desde a im-
plantação do programa, que pode ser visualizado nos dia-
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gramas abaixo, extraídos de Gusmão e Ribeiro (2011). A
primeira tabela diz respeito aos vários graus de proficiência
aferidos na avaliação aplicada aos alunos no 2º ano de en-
sino fundamental.
A seguir, temos a evolução do grau de proficiência do alu-
nado, ao longo dos anos de aplicação do programa, distri-
buídos pelo território do Estado:
Esclareça-se que embora coordenado pela Secretaria de
Educação do Estado, o processo avaliativo do PAIC foi
estabelecido a partir da Matriz de Referência do Centro
de Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE) da Universida-
de Federal de Minas Gerais. Os instrumentos de avaliação
foram elaborados com participação de especialistas da-
quela Universidade e da Universidade Federal do Ceará
e a aplicação é feita pelo Centro de Políticas Públicas e
Avaliação Educacional (CAED) da Universidade Federal de
Juiz de Fora.29
O desenho organizativo da avaliação, baseado na participa-
ção de instituições universitárias em sua elaboração e apli-
cação parece ser capaz de afastar qualquer dúvida quan-
to a eventual distorção dos resultados por interferência de
agentes municipais ou estaduais.
3.2. O Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC).
Inspirado pelo modelo cearense, o Governo Federal insti-
tuiu, em julho de 2012, por meio da Portaria nº 867 do Mi-
nistro da Educação, o Pacto Nacional de Alfabetização na
Idade Certa - PNAIC, estabelecendo objetivo menos ambi-
cioso em relação ao modelo cearense, qual seja, o de alfa-
betizar as crianças até, no máximo, os oito anos de idade,
ao final do 3º ano do ensino fundamental.30
A bem da verdade, tal meta já havia sido fixada em política
precedente, no chamado Programa Todos pela Educação,
formalizado no Decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007,
programa esse que já continha os principais ingredientes
do PNAIC. Todavia, tratava-se de política que contemplava
objetivos mais abrangentes que o PNAIC.31
Tabela 1 (abaixo) - Escala de inter-pretação do Space Alfa.
Figura 2 (abaixo) - Mapa do Ceará por nível de proeficiência dos mu-nicípios cearenses no Space Alfa - 2007 a 2010.
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183
Recentemente, essa mesma meta foi estabelecida legal-
mente, por meio do Plano Nacional de Educação – Lei nº
13.005/2014 – meta nº 5.
O PNAIC tem como objetivos (art. 5º da Portaria nº
867/2012):
I - garantir que todos os estudantes dos sistemas pú-
blicos de ensino estejam alfabetizados, em Língua Por-
tuguesa e em Matemática, até o final do 3º ano do en-
sino fundamental;
II - reduzir a distorção idade-série na Educação Básica;
III - melhorar o Índice de Desenvolvimento da Educa-
ção Básica (IDEB);
IV - contribuir para o aperfeiçoamento da formação dos
professores alfabetizadores;
V - construir propostas para a definição dos direitos de
aprendizagem e desenvolvimento das crianças nos três
primeiros anos do ensino fundamental.
Para que possam se beneficiar das ações do PNAIC, os
Estados e Municípios devem aderir ao Pacto, o que é feito
mediante acesso a Sistema informatizado próprio do Minis-
tério da Educação (SIMEC).
Embora os termos de adesão não estejam disponibilizados
para acesso público, conseguimos obter uma cópia dos ter-
mos aplicáveis aos Estados-membros. Trata-se, na verda-
de de dois documentos: um “Termo de Adesão ao PNAIC”,
que estabelece de forma mais genérica a responsabilidade
dos partícipes; um outro “Termo de Adesão às ações do
Pacto” onde estão detalhadas as medidas de execução do
programa. Em resumo, os entes governamentais se com-
prometem basicamente a:
• alfabetizar todas as crianças em língua portuguesa e
em matemática até, no máximo, os oito anos de idade,
ao final do 3º ano do ensino fundamental;
• realizar avaliações anuais universais, aplicadas pelo
INEP, junto aos concluintes do 3º ano do ensino funda-
mental; bem como aplicar a Provinha Brasil, no início e
no final do 2º ano, utilizando-se do sistema informatiza-
do para tabular os resultados;
• participar das instâncias de gestão do Pacto e mobi-
lizar todos os atores – comunidade, pais, alunos, edu-
cares, etc – em prol dos objetivos do pacto.
• no caso dos Estados, apoiar os municípios que te-
nham aderido às Ações do Pacto, para sua efetiva im-
plementação.
Tal como no PAIC, as ações do Pacto Nacional são arti-
culadas em eixo de atuação, a saber (art. 6º da Portaria nº
867/2012):
A) formação continuada de professores alfabetizadores,
o que se dá por meio de programas de formação dos
professores alfabetizadores das escolas das redes de
ensino participantes das ações do Pacto e pela forma-
ção e constituição de uma rede de professores orienta-
dores de estudo; tal eixo é apoiado especialmente por
meio da concessão de bolsas com recursos do FNDE,
conforme adiante explicaremos.
B) materiais didáticos, literatura e tecnologias educa-
cionais, o que se dá especialmente com a articulação
do PNAIC com o Programa Nacional do Livro Didático
– PNLD e com o Programa Nacional Biblioteca na Es-
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cola – PNBE.
C) avaliação, que compreende a aplicação de vários
instrumentos, especialmente a aplicação anual da Pro-
vinha Brasil aos estudantes das escolas participantes,
pelas próprias redes de ensino, no início e no final do
2º ano do ensino fundamental e avaliação externa uni-
versal do nível de alfabetização ao final do 3º ano do
ensino fundamental, aplicada pelo INEP.
D) gestão, controle e mobilização social, que prevê a
articulação entre as várias instituições envolvidas, por
meio de uma estrutura em vários níveis:
a) Comitê Gestor Nacional: responsável pela coor-
denação e avaliação em âmbito nacional, presidi-
do pela Secretaria Executiva do Ministério da Edu-
cação, com participação dos titulares e suplentes
da Secretaria de Educação Básica (SEB), da Se-
cretaria de Educação Continuada, Alfabetização,
Diversidade e Inclusão (SECADI), da Secretaria de
Articulação com os Sistemas de Ensino (SASE), do
FNDE, do INEP, do Conselho Nacional dos Secre-
tários Estaduais de Educação (CONSED), da União
dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME)
e representantes de outros órgãos e entidades que
o Comitê julgar conveniente;
b) Coordenação Institucional: comitê composto,
em cada estado, por representante do MEC, da
Secretaria de Estado da Educação, da UNDIME
no estado, da União dos Conselhos Municipais de
Educação (UNCME) no estado, do Conselho Es-
tadual de Educação, da(s) Instituições de Ensino
Superior (IES) formadora(s) em atuação no estado
e de outras entidades que a Coordenação julgar
conveniente, responsável pela mobilização e a
proposição de soluções para temas estratégicos,
no âmbito do estado;
c) Coordenação Estadual: a cargo de cada Secre-
taria de Estado da Educação, responsável pela
gestão, supervisão, monitoramento no âmbito da
rede estadual e pelo apoio à implementação das
ações do Pacto nos municípios;
d) Coordenação Municipal: a cargo da Secretaria
Municipal de Educação, responsável pela gestão,
supervisão, monitoramento das ações do Pacto no
âmbito da rede municipal e pela interlocução com
a coordenação estadual.
Ainda em 2012, houve o envio ao Congresso da Medi-
da Provisória nº 586, posteriormente convertida na Lei nº
12.801, de 24 de abril de 2013, que dispõe sobre o apoio
técnico e financeiro da União aos entes federados, no âm-
bito do PNAIC. Em resumo, a lei estabelece:
• suporte à formação continuada dos professores al-
fabetizadores e formação inicial e continuada de pro-
fessores com capacitação para a educação especial;
tal suporte se dá por meio de concessão de bolsa para
profissionais da educação, conforme categorias e pa-
râmetros definidos em ato do Ministro de Estado da
Educação, e o desenvolvimento de recursos didáticos
e pedagógicos, entre outras medidas.
• reconhecimento dos resultados alcançados pelas
escolas e pelos profissionais da educação no desen-
volvimento das ações pactuadas, por meio de auxílio
financeiro concedido nos termos da legislação do Pro-
grama Dinheiro Direto na Escola (Lei no 11.947, de 16
de junho de 2009).
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• assistência técnica da União aos entes federados que
aderirem ao pacto, na forma a ser regulamentada pelo
Ministério da Educação, que deverá também estabele-
cer as atividades a serem implementadas para alcançar
o objetivo da lei e as metas a serem cumpridas.
• introdução, no currículo das instituições de ensino
superior, de disciplinas específicas de alfabetização,
nos termos de regulamentação do MEC.
É interessante observar que houve, na tramitação no Con-
gresso Nacional, alguns acréscimos interessantes em rela-
ção ao texto original da Medida Provisória, especialmente:
a) a inclusão de disposições que contemplam a alfabetiza-
ção na educação especial (art. 2º, I e § 4º); e b) a fixação de
marco temporal para o atendimento das metas do PNAIC, a
saber, 31 de dezembro de 2022 (art. 3º, III).
Também em dezembro de 2012 foi editada a Portaria nº 1.458
do Ministério da Educação, que estabeleceu as linhas básicas
de atuação do eixo de formação continuada e definiu cate-
gorias e parâmetros para a concessão de bolsas de estudo e
pesquisa no âmbito do PNAIC, a serem custeadas pelo Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, regula-
mentando, assim, um dos instrumentos de auxílio previstos na
MP nº 586/2012. Em fevereiro de 2013 foi editada a Portaria
nº 90, que estabeleceu o valor máximo das bolsas do PNAIC.
Ressalte-se que a concessão de bolsas pelo FNDE já é prática
de outros programas do MEC, tendo sido disciplinada em suas
linhas gerais pela Lei nº 11.273, de 6 de fevereiro de 2006.
O Conselho Deliberativo do FNDE também produziu instrumen-
tos normativos disciplinadores do procedimento de concessão
das bolsas do PNAIC, inclusive estabelecendo seus valores, em
complemento à já citada Portaria nº 1.458 do MEC.32
Essa é, em suma, a estrutura normativa e institucional do PNAIC.
Por se tratar de uma política implantada há poucos anos,
não há análises quantitativas que permitam, com base nas
avaliações aplicadas pelo INEP, constatar se houve impacto
positivo na alfabetização nos níveis iniciais de ensino.
4. Análise das políticas públicas abordadas, em uma vi-
são jurídica.
A literatura analítica em políticas públicas pode nos oferecer
vários enfoques possíveis acerca das referidas políticas pú-
blicas, iluminando aspectos relevantes para compreendê-
-la, tais como: a) a tipologia da política; b) a formação e
implementação da política; c) as relações entre os atores no
processo de política pública, etc (Secchi, 2014).
Interessa-nos, nesse trabalho, sem embargo de todo esse
referencial, certamente útil para a profunda compreensão
de uma política pública, abordar aspectos que dizem res-
peito à institucionalidade jurídica da política e a forma como
os instrumentos jurídicos promovem a articulação dos ato-
res institucionais nela engajados. Frise-se a preocupação
com tal articulação, pois, “sabendo que na Federação bra-
sileira todas as esferas políticas detêm alguma parcela do
poder normativo e executivo sobre a Educação, é neces-
sário compreender qual a racionalidade que organiza (ou
deveria organizar) a convivência federativa, nessa matéria,
entendendo as tarefas que cabem a cada uma delas” (Bucci
e Vilarino, 2013, p. 118).
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Faremos essa análise a partir de alguns quesitos, adiante
descritos:
a) Aderência aos valores constitucionais: as políticas
públicas concretizam uma ponderação entre direitos,
interesses e valores previstos no texto constitucional. É
interessante mapear como a política realiza tal ponde-
ração, o que se mostra especialmente apropriado, em
se tratando de política que busca realizar um direito de
natureza social.
b) Consistência jurídica dos instrumentos de articu-lação político-administrativa: neste tópico, cabe ob-
servar como se estabelecem do ponto de vista a com-
petência dos agentes responsáveis pela política, como
tais papéis são coordenados, quais os instrumentos
normativos, negociais e elementos processuais são uti-
lizados para promover a execução da política pública.
c) Sustentabilidade jurídico-financeira – a execução
das políticas públicas depende da conjugação de vá-
rias condicionantes, mas certamente preocupa espe-
cialmente aos juristas da área pública a previsão de
recursos que possam ser adequadamente alocados do
ponto de vista jurídico. Quer dizer, não basta que haja
um recurso disponível – o que seria uma preocupação
meramente econômica – mas sim que ele esteja juridi-
camente disponível, atendendo às regras do sistema
orçamentário-financeiro, que estabelecem uma série
de controles quanto ao dispêndio de recursos pela Ad-
ministração Pública.
e) Controle e responsabilidade – outra análise que é
importante do ponto de vista jurídico é mapear a res-
ponsabilidade dos agentes envolvidos na execução da
política pública e os meios de controle existentes. A
frouxidão de instrumentos de controle/responsabilida-
de certamente responderá em grande parte pela inefi-
ciência de determinada política
Assim, passemos à análise, com base nos quesitos acima
mencionados:
4.1. Aderência aos valores constitucionais
As políticas acima mencionadas possuem evidente congru-
ência com os valores mais caros da nossa Ordem Cons-
titucional, a começar dos fundamentos da República Fe-
derativa do Brasil, constantes do art. 1º – especialmente a
dignidade da pessoa humana e a cidadania – e dos objeti-
vos constantes do art. 3º - haja vista que a mínima qualida-
de no processo educacional é condição necessária para a
realização de todos os desideratos ali constantes.
Também há plena correspondência com os princípios cons-
titucionais da educação, especialmente a garantia de pa-
drão de qualidade – art. 206, VII – visto que o processo
educacional não consiste em mero procedimento formal ou
burocrático, mas deve propiciar efetivamente a aprendiza-
gem, que é o núcleo essencial desse direito. Pode-se dizer
que, se há um “mínimo existencial” no tocante ao direito à
educação, esse certamente diz respeito à alfabetização, o
que é o foco das políticas estudadas.
Aliás, ambas as políticas estão em consonância com a
abordagem de políticas públicas com enfoque em direitos,
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preconizada pelo sistema das Nações Unidas a partir do
Pacto Internacional de Direitos Econômicos Sociais e Cul-
turais. Tal abordagem busca garantir a concretude e efetivi-
dade dos direitos sociais, conforme esclarece Rosemblüth:
Sin embargo, existe uma indefinición muy grande em tor-
no a la noción de derechos sociales. Estos suelem estar
fraseados de modo genérico, abstracto. Por ello requieren
de um contenido específico y operacional que permita de-
terminar um nível de ejercicio básico de tales derechos, por
debajo del cual la ciudadanía de las personas resulta vul-
nerada (2013 p. 75).
Nesse sentido, o MEC já vinha, antes mesmo do PNAIC,
buscando estabelecer quais os objetivos de aprendizagem
adequados nos diferentes estágios do ensino fundamental:
Artigo 49 – O Ministério da Educação, em articulação com
os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, deverá en-
caminhar ao Conselho Nacional de Educação, precedida
de consulta pública nacional, proposta de expectativas de
aprendizagem dos conhecimentos escolares que devem
ser atingidos pelos alunos em diferentes estágios do Ensi-
no Fundamental (art. 9, § 3º, desta Resolução).33
Houve, nesse sentido, a produção de documento pela Se-
cretaria de Educação Básica do MEC que busca estabele-
cer “Elementos Conceituais e Metodológicos para Defini-
ção dos Direitos de Aprendizagem”, no qual são detalhadas
quais são as conquistas esperadas durante o Ciclo de Alfa-
betização (1º a 3º ano do ensino fundamental).34 Tal docu-
mento, todavia, ainda não foi submetido à consulta pública
acima referida, até o presente momento.
Não obstante, o reconhecimento, estabelecido no documen-
to dos Pactos estudados, de que há níveis de proficiência
que devem ser necessariamente alcançados nos anos ini-
ciais do ensino fundamental e que tais resultados consistem
não apenas numa prioridade política, mas num direito do
educando, é certamente um avanço no tocante à efetivação
desse direito social consagrado no Texto Constitucional.
Nesse sentido, os processos avaliativos previstos nos Pac-
tos são não apenas instrumentos de avaliação da política
pública, mas também medidas de garantia da efetivação
desse direito fundamental, na medida em que servem para
diagnosticar in itinere a eficácia do processo educacional
e propiciar as intervenções pedagógicas necessárias para
sanar as dificuldades encontradas (Gusmão e Ribeiro,
2011, p. 18).
4.2. Consistência jurídica dos instrumentos de articula-
ção político-administrativa
Em vista do quadro institucional já retratado, no tocante aos
desafios que o sistema federativo brasileiro impõe à pres-
tação do serviço educacional, pode-se dizer que a ideia de
um “Pacto” entre os entes federativos é um elemento cen-
tral das políticas públicas estudadas.
É curioso observar que, não obstante a Constituição Fede-
ral preveja a edição de leis complementares que “fixarão
normas para a cooperação entre a União e os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio
do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional”
(art. 23, par. único), leis essas que jamais foram produzi-
das,35 os entes federados vêm estabelecendo relações de
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colaboração para exercício de suas competências comuns,
por meio de outros instrumentos.
No âmbito educacional, a própria Lei de Diretrizes e Bases
da Educação, ao tratar, no seu Título IV, “Da Organização
da Educação Nacional”, já estabelece o dever de colabo-
ração entre os entes políticos e discrimina os papéis que
eles desempenharão em um desenho que, se não chega a
estabelecer formalmente um “Sistema Nacional de Educa-
ção”, permite um grau adequado de coerência na prestação
desse serviço em âmbito nacional.
Também a recém-promulgada Lei do Plano Nacional de
Educação dedica um artigo especialmente ao tema da co-
laboração entre os entes federativos – art. 7º.
Nas políticas que examinamos, o instrumento que con-
substanciaria a articulação entre os atores governamen-
tais envolvidos seriam os próprios termos que formalizam
o “Pacto”, estabelecendo a divisão de responsabilidades
para atingir os objetivos comuns.
Porém, constamos, não sem admiração, que os instrumen-
tos formais em questão são de uma singeleza que beira a
irrelevância do ponto de vista jurídico. Distanciam-se muito
do que seriam os tão conhecidos convênios, que possuem
um tratamento normativo bastante exigente no que tange a
seus requisitos formais e substanciais, mormente quando
deles advém o repasse de recursos.36
O Protocolo de Intenções do PAIC Cearense é basicamen-
te um documento político-simbólico, o que não retira dele
alguma utilidade em termos de promover a efetivação da
política pública, pois como observa Gomes,
a liderança técnica da SEDUC, com a mesma equipe que
havia comandado uma mudança similar na política educa-
cional em Sobral, e a liderança política do governador do Es-
tado são fatores extremamente importantes no processo de
implantação do programa, sobretudo pelos sinais externos
que transmitiram às administrações municipais: clareza na
definição do tema como prioridade nas agendas políticas;
comunicação eficiaente das metas; e o estabelecimento de
mecanismos institucionais de articulação Estado-Municípios
independentemente de coloração partidária. (2011, p. 12).
Mas, não custa lembrar, a política adveio de uma mobili-
zação mais ampla que se iniciou no âmbito do Comitê Ce-
arense para Eliminação do Analfabetismo Escolar, com a
participação de Municípios, instituições universitárias e da
Unesco. A formação da política se deu, portanto, por meio
da constituição de uma rede de políticas públicas, ou seja,
uma estrutura de interações, predominantemente infor-
mais, entre atores públicos e privados envolvidos na formu-
lação e implementação de políticas públicas [...] As redes
de políticas públicas são compostas de atores públicos e
privados que se sintam motivados para debater e agir em
torno de temas de intesse comum. (Secchi, 2014, p. 119).
Certamente, essa organização preexistente, ao lado da própria
eficácia alcançada, responde em grande parte pela sustenta-
bilidade da política no tempo, visto que ela deu seus primei-
ros passos antes mesmo da assunção de sua coordenação
pelo Executivo Estadual e vem sendo executada desde então,
mesmo após a saída do Governador que a adotou em 2007.
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Apesar da singeleza do Protocolo cearense, observa-se que
houve um cuidado especial na criação de instâncias admi-
nistrativas que se responsabilizassem pela coordenação e
acompanhamento das ações em âmbito municipal – a cha-
mada Coordenadoria de Cooperação com os Municípios e
os Núcleos Regionais de Cooperação com os Municípios.
Outro aspecto a se destacar no modelo cearense diz res-
peito à preocupação com o oferecimento de apoio técnico
da Secretaria de Educação aos Municípios, para melhoria
da qualidade da gestão do serviço municipal de educação,
em aspecto como: recrutamento e formação dos recursos
humanos, procedimentos de controle, estabelecimento de
planos de carreira, fortalecimento das instâncias escolares
etc. (Gusmão, 2011, p. 17).
Um elemento importante no arranjo foi a adoção de medidas
indutoras, valendo-se de instrumentos jurídicos que estavam
disponíveis, mas que foram adaptados a tal finalidade, espe-
cialmente: a) a utilização de indicadores educacionais como
critérios para cálculo do repasse do ICMS (Lei Estadual nº
14.023/2007); b) a utilização de medidas de fomento como
bolsas de pesquisa e estudo e premiações. Cuida-se de me-
didas que Morand (1999, p. 159-186) bem caracteriza como
típicas de um Estado incitador, em que o direito desempenha
um papel persuasivo e que consistem em ferramenta impor-
tante na modelagem das políticas públicas.
Todos esses aspectos parecem apontar para a efetiva institu-
cionalização do PAIC no Ceará, no sentido apontado por Bucci:
Pode-se definir institucionalizar, no sentido da ação go-
vernamental, como a iniciativa de estabelecer um deter-
minado padrão de organização – permanente e impesso-
al, formalmente desvinculado da pessoa do governante
ou do gestor que desencadeia a ação -, que atua como
fator de unidade de vários centros de competência em
articulação, visando à composição de distintos interes-
ses, meios e temporalidades, em função da ideia diretriz
(2013, p. 236)
Nesse sentido, parece provável que, baseado no grau de
institucionalização e na legitimação política que tal política
parece ter alcançado, ela venha a transitar de “política de
governo” para “política de Estado”, ainda na esteira das ob-
servações de Bucci (2013, p. 242).
O Pacto federal, por sua vez, segue praticamente o mesmo
modelo do programa cearense. Todavia, é preciso reconhe-
cer que já havia alguns elementos do PNAIC em políticas
precedentes, especialmente no Plano de Ações Articuladas
(PAR) estabelecido no bojo do Programa Todos pela Educa-
ção, instituído pelo Decreto n 6.904/2007.
Também o eixo de formação de professores do PNAIC herda
vários aspectos do precedente Programa Pró-Letramento,
como o estabelecimento de parcerias com instituições uni-
versitárias para desenvolvimento e produção dos materiais
para os cursos, e para formação e acompanhamento dos
professores orientadores/tutores, que ministrarão o curso
aos professores alfabetizadores.
O eixo de materiais didáticos, literatura e tecnologias edu-
cacionais, também é tributário de programas já existentes:
o Programa Nacional do Livro Didático – PNLD e com o
Programa Nacional Biblioteca na Escola – PNBE.
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De tudo isso, percebe-se que o processo de criação da
política pública no âmbito federal obedeceu à lógica incre-
mental, nos termos propostos por Lindblom (2014).
Observa-se que no plano federal, também estão presente par-
te dos elementos indutores do PAIC cearense, especialmente
o custeio de bolsas dos participantes do curso de formação.37
Os instrumentos que formalizam a adesão ao PNAIC são
mais elaborados do que o Protocolo cearense, mas tam-
bém não correspondem aos requisitos legais dos convê-
nios. Aliás, a adesão se dá mediante simples “clique” em
sistema do MEC, por parte do dirigente cadastrado na refe-
rida plataforma – o que, do ponto de vista jurídico, gera sé-
rias dúvidas em relação à validade do referido documento,
haja vista que a competência para a adesão é regulada em
normas internas de cada ente.
No modelo federal não se percebeu a preocupação de es-
timular a melhoria da gestão escolar no âmbito das demais
unidades federadas, ao contrário do modelo do PAIC Cea-
rense, que estabeleceu, conforme já esclarecemos um eixo
específico – o eixo Gestão Municipal da Educação, para pro-
mover o desenvolvimento das capacidades de diagnóstico e
planejamento e na difusão da cultura do acompanhamento
das escolas e monitoramento dos indicadores educacionais.
Houve a preocupação de criar instâncias de Gestão, Contro-
le e Mobilização Social, conforme já mencionamos. Porém,
tais instâncias têm natureza de “comitês” e não de equipes
gestoras permanentes. No site do PNAIC não se encontram
relatórios de acompanhamento e na guia “cronograma”, as
últimas datas de atividades do programa remontam a de-
zembro de 2013.38 Segundo relato colhido em publicação
do CEALE/UFMG e disponibilizado no site do PNAIC, em
alguns Estados essa instância sequer foi implantada, mes-
mo depois de um ano de funcionamento do programa.39
Conforme se pode perceber, o PNAIC não atingiu ainda o
mesmo grau de institucionalização que o PAIC cearense.
Não há dúvida de que a tarefa de coordenação é mais com-
plexa, pois ao invés de 184, são 5.420 municípios aderentes
ao Pacto Nacional, além de 26 Estados e o Distrito Federal.
Mas parece-nos além da questão da escala, não hou-
ve a mesma preocupação de criar estruturas próprias de
gestão e estabelecer um maior envolvimento com os par-
ceiros do que a mera alocação de recursos financeiros
(bolsas) e materiais (livros, jogos, etc.). Porém, talvez seja
precoce a avaliação acerca da iniciativa, haja vista que as
atividades de avaliação – elemento essencial de sua im-
plementação – ainda não ultimadas com a realização da
Avaliação Nacional de Alfabetização, ao final do 3º ano
do ensino fundamental.
4.3. Sustentabilidade jurídico-financeira
No que tange à sustentabilidade jurídico-financeira, obser-
va-se a existência de uma normativa própria para garantia
do financiamento dos recursos a serem alocados na edu-
cação básica, a começar das normas constitucionais que
garantem a vinculação constitucional de impostos – art. 212
– e a constituição do FUNDEB - Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação – no art. 60 do ADCT, com reda-
ção dada pela Emenda Constitucional nº 53/2006.
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Porém, não basta haver a garantia de recursos, pois a
sustentabilidade jurídico-financeira está relacionada dire-
tamente com a atividade de planejamento orçamentário e
pela articulação das normas financeiras, ou seja, o Plano
Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a
Lei Orçamentária Anual (LOA).
No âmbito do direito à educação, não podemos nos esque-
cer que há um plano setorial – o Plano Nacional de Educa-
ção – sendo que foi recentemente aprovado o plano que
vigorará no decênio 2014-2024 (Lei nº 13.005/2-14). Tal di-
ploma estabelece, em seu art. 10:
Art. 10. O plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e
os orçamentos anuais da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios serão formulados de maneira a
assegurar a consignação de dotações orçamentárias com-
patíveis com as diretrizes, metas e estratégias deste PNE e
com os respectivos planos de educação, a fim de viabilizar
sua plena execução.
Assim, os programas e metas estabelecidos nos quatros
instrumentos devem estar alinhados, o que, reconheça-se,
nem sempre é observado, o que se deve também pelo fato
de que tais diplomas correspondem a distintos ciclos na
atividade governamental que é essencialmente dinâmica.
Essa discrepância é anotada, por exemplo, em avaliação do
TCU acerca do cumprimento do PPA:
77. O MEC reconhece que é necessário utilizar instrumen-
tos mais precisos para medir o nível de alfabetização das
crianças de até oito anos. Por isso, um dos quatro eixos do
Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa consiste
nas avaliações, com destaque para a aplicação, junto aos
alunos concluintes do terceiro ano do ensino fundamental,
de uma avaliação externa universal, pelo Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep),
denominada Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA),
cujo primeiro objetivo (http://portal.inep.gov.br/web/saeb/
ana) é avaliar o nível de alfabetização dos educandos.
78. Segundo a SEB/MEC (peça 7, p. 9), a ANA será anual,
censitária, externa e de larga escala.
79. Dessa forma, pode-se afirmar que o número trazido
pelo Relatório de Avaliação do PPA para mensurar o per-
centual de crianças alfabetizadas até os oito anos, com
base na PNAD, não é o mais adequado para se mensurar
o atingimento da Meta 5 do PLPNE. É desejável, portanto,
a partir da implementação da ANA pelo Inep, que o MEC
reveja a forma de mensuração da quantidade de crianças
de oito anos de idade consideradas alfabetizadas.40
Outra dificuldade diz respeito à própria conjuntura econô-
mica, que pode vir a impactar nos programas e metas pre-
vistos nos instrumentos orçamentários. Recentemente, o
Ministério do Planejamento Federal anunciou contingencia-
mento orçamentário de cerca de 9,4 (nove) bilhões na Pasta
da Educação,41 o que certamente terá impacto em diversos
programas educacionais, forçando o gestor a realizar esco-
lhas difíceis – e certamente impactando a meta constante
do recém-aprovado PNE, no sentido de ampliar o gasto em
educação em termos de percentual do PIB, ao longo dos
próximos anos (meta 20).
4.4. Controle e responsabilidade
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Neste tópico, ressalte-se desde logo que uma premissa
das políticas analisadas é estabelecer uma matriz de res-
ponsabilidades, entre os aderentes dos pactos, o que é um
elemento que favorece a compreensão de quais as tarefas
devem ser desempenhadas por cada um dos atores envol-
vidos no programa.
Outro aspecto que favorece a efetividade das políticas é a
focalização que as caracteriza, o que facilita o diagnóstico
dos entraves na sua execução e a avaliação do alcance dos
objetivos almejados.
Nesse sentido, o PAIC cearense demonstra uma preocupa-
ção acentuada com a construção dos instrumentos e rotinas
de avaliação desde sua origem, o que permite o acompa-
nhamento pari passu dos resultados obtidos. Constata-se
que existe no Estado “uma cultura de avaliação educacio-
nal, disseminada nas diferentes esferas que compõem o
sistema educacional cearense” (LIMA, 2012, p. 56).
Um possível aprimoramento das políticas estudadas, é o es-
tabelecimento de metas graduais e progressivas que possam
servir de parâmetro para avaliação do ritmo de progresso em
direção à meta final fixada: garantir a alfabetização de todos
os alunos na idade certa. Nesse sentido, alerta Bucci:
Uma dimensão essencial nas políticas públicas, que é a da
coordenação, tanto de comportamento como de expectati-
vas, também se apresenta em relação ao tempo. Como es-
quema cognitivo, as políticas públicas, idealmente conside-
radas, devem permitir a compreensão dos mecanismos de
coordenação da ação governamental no tempo, isto é, o en-
tendimento de como cada elo da cadeia de atos que integra
o processo pode levar ao seguinte, considerado o feixe de
reações dos diversos elementos envolvidos. (2013, p. 145)
Acerca das instâncias de gestão e controle, já tecemos algu-
mas considerações no tópico 6.2, que apontam no sentido
da adequação do arranjo estabelecido no PAIC/CE e da apa-
rente insuficiência da solução adotada em âmbito federal.
Uma observação adicional, extraída da leitura dos materiais
do PAIC/CE e da literatura que analisou tal política é que hou-
ve o envolvimento de atores não governamentais e de insti-
tuição acadêmicas, especialmente no processo de controle e
avaliação da política pública. Esse é um diferencial importan-
te, pois o processo de controle e avaliação não pode se limi-
tar às próprias instâncias administrativas que implementam a
política, sob pena de insuficiência do processo de controle,
por falta de objetividade e distanciamento.
5. Reflexões conclusivas
Sem embargos das considerações críticas que tecemos,
parece-nos que tais políticas representam um importante
passo no sentido da evolução da atuação dos entes fede-
rados, de forma coordenada, para fins de promover a efeti-
vação do direito à educação de uma forma substancial, que
pode ser traduzida como direito à aprendizagem.
Esse direito à aprendizagem embora não se inicie pela alfa-
betização – visto que a porta de entrada da educação formal
é a educação infantil – tem na aquisição das capacidades
de leitura e escrita um passo decisivo, capaz de conformar
todo o restante da trajetória educacional das crianças que
iniciam o ensino fundamental.
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Essa nova perspectiva se encontra em consonância com a
concepção trazida de políticas públicas com enfoque em
direitos, disseminada nos documentos internacionais sobre
educação, conforme enfatiza Kishore Singh:
Orientados por un enfoque basado en los derechos hu-
manos, los objetivos en materia de educación deberían
formularse como derechos exigibles, con las responsabi-
lidades correspondientes de los gobiernos para con sus
ciudadanos en el cumplimiento de los objetivos y las me-
tas. (ONU 2013)
Ademais, essas políticas favorecem uma institucionali-
zação em sentido estrito, visto que são construídas em
torno de uma ideia-diretriz – conforme clássico ensina-
mento de Hauriou, “ideia da obra a realizar” (2009, p.21)
– capaz de imantar os esforços dos atores, objetivando
sua atuação e favorecendo a permanência como política
de Estado.
Os resultados produzidos no programa gestado no Esta-
do do Ceará mostram resultados promissores, sendo que
a articulação ali estabelecida entre os partícipes demonstra
que é possível utilizar a complexa engrenagem do federa-
lismo brasileiro para construir políticas pública concertadas
e eficientes.
A reprodução do modelo no âmbito federal ainda não está
suficiente maduro para permitir conclusões, mas caso se
replique o sucesso do paradigma estadual, representará um
notável avanço na prática de políticas públicas voltadas à
realização do direito à educação em sua face mais sensível
e essencial.
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Notas
1. “Art. 6º Os professores ensinarão a ler, escrever, as quatro operações de aritmética, prática de quebrados, decimais e proporções, as noções mais gerais de geometria prática, a gramática de língua nacional, e os princípios de moral cristã e da doutrina da religião católica e apostólica romana, pro-porcionados à compreensão dos meninos; preferindo para as leituras a Constituição do Império e a História do Brasil”.
2. “O PISA – Programa Internacional de Avaliação de Alunos – é uma pesquisa trienal de conhecimentos e competências de estudantes na faixa dos 15 anos de idade, realizada nos países da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e em países convidados. O PISA represen-ta o compromisso dos países membros da OCDE em acompanhar os resultados dos sistemas de educação, traduzidos pelo desempenho dos alunos, a partir de um marco de referência internacional comum. De forma cooperativa, essa avaliação reúne não apenas o trabalho de especialistas dos países membros, mas também interesses comuns desses países, voltados para políticas públicas. O programa foi criado no final dos anos 90 e a primeira ava-liação foi realizada no ano 2000. O Brasil participa do PISA desde sua primeira aplicação, como país convidado. Em 2006, participaram do PISA, além dos 30 países membros da OCDE, 27 países convidados, entre eles cinco sul-americanos: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia e Uruguai. No total, o PISA 2006 foi aplicado a cerca de 400 mil de estudantes de 15 anos, representando um universo de aproximadamente 20 milhões de estudantes de 57 países que, em conjunto, representam quase 90% da economia mundial.” (INEP, 2008, p. 21).
3. “La mayoría de las escuelas brasileñas en la educación básica son escuelas públicas urbanas; tanto estas como las públicas rurales obtuvieron bajo desempeño en PISA, de modo que la mayoría de las escuelas brasileñas en PISA se encuentra bajo el Nivel 2 de desempeño. De otra parte, son pocas las escuelas privadas que están en el Nivel 1 de desempeño y ninguna debajo. (...)El análisis sugiere la necesidad de que se establezcan políticas educativas destinadas a mejorar la calidad de las competencias de los alumnos brasileños. Es cierto que las evaluaciones nacionales ya muestran que los alumnos brasileños tienen un importante problema con las destrezas lingüísticas y eso afecta el rendimento escolar en todas las áreas, incluso en ciencias y ma-temáticas. Por eso, una de las metas de la educación nacional debe ser mejorar la competencia lectora. (OCDE, 2009, p. 103)
4. No ranking de leitura do PISA 2012 o Brasil está 55° lugar dos 65 países avaliados, com 410 pontos, abaixo de Uruguai (411), México (424), Costa Rica e Chile (ambos com 441 pontos). Os dez primeiros colocados fizeram pontuação entre 518 e 570.
5. Dentre os quais, podemos destacar: a) no âmbito da OEA: a.1) a Declaração Interamericana dos Direitos e Deveres do Homem (1948, art. XII) e a.2.) o Protocolo de San Salvador (1988); b) no sistema da ONU: b.1) a Declaração Universal dos Direitos Humanos (art. 26); b.2) a Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959); b.3) a Convenção relativa à luta contra as discriminações na esfera do ensino (1960); e b.4) o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos e Sociais.
6. “1. Cada pessoa - criança, jovem ou adulto - deve estar em condições de aproveitar as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas ne-cessidades básicas de aprendizagem. Essas necessidades compreendem tanto os instrumentos essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a solução de problemas), quanto os conteúdos básicos da aprendizagem (como conhecimentos, habilidades, valores e atitudes), necessários para que os seres humanos possam sobreviver, desenvolver plenamente suas potencialidades, viver e trabalhar com dignidade,
D
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participar plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de vida, tomar decisões fundamentadas e continuar aprendendo. A amplitude das ne-cessidades básicas de aprendizagem e a maneira de satisfazê-las variam segundo cada país e cada cultura, e, inevitavelmente, mudam com o decorrer do tempo. ” (Art. 1º, item 1).
7. Para compreensão mais detalhada desse arcabouço normativo internacional, vide Ranieri (2013)
8. “Art. 14. [...]§ 4º São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos”.
9. Assinale-se a posição de José Afonso da Silva, que, com ponderáveis razões,considera o Município um componente da federação, mas não uma entidade federativa (2013, p. 476-7).
10. Essa tensão se revela, às vezes, em embates entre as entidades federativas, do que é exemplo o contencioso jurídico-constitucional acerca da im-plementação do Piso Nacional para os Profissionais do Magistério da Educação Básica – Lei nº 11.738/2008, que veio a ser objeto da Ação Direita de Inconstitucionalidade nº 4.167, sendo que por força de liminar concedida naquele processo, a referida lei somente passou a produzir efeitos em 27 de abril de 2011, com a conclusão o julgamento de mérito pelo Supremo Tribunal Federal.
11. Observe-se, por exemplo, o analfabetismo entre 1940 (56%) e 2010 (9,6%) (IBGE, 2012).
12. O texto de 1988 não discrepa substancialmente da ideia de atuação redistributiva e supletiva da Administração Federal: “§ 1º A União organizará e financiará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, e prestará assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o desenvolvimento de seus sistemas de ensino e o atendimento prioritário à escolaridade obrigatória”.
13. Redação dada pela EC 14/96. O texto original era um pouco diverso: “§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e pré--escolar”.
14. Parágrafo introduzido pela EC 14/96.
15. Para exame mais completo e minucioso, vide Bucci e Vilarino (2013).
16. Art. 60, § 1º do ADCT, com redação dada pela EC 53/2006.
17. Acerca da universalização do ensino formal no Brasil, vide IPEA (2014), que observa, no tocante ao alcance dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio: “O primeiro indicador da meta A do ODM 2 é a taxa de escolarização líquida da população de 7 a 14 anos no ensino fundamental, que cresceu de 81,2% para 97,7%, de 1990 a 2012. O nível é tão elevado que, para todos os efeitos práticos, considera-se universalizado o acesso ao ensino fun-damental no País.
18. Destaque-se nesta lei: Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pe-dagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público.
19. Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001 e Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014.
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20. Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010, do Conselho Nacional de Educação.
21. Participaram de tal comitê várias entidades e órgãos: Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), União dos Dirigentes Municipais de Edu-cação (UNDIME/CE), Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP/MEC), Secretaria da Educação do Estado do Ceará (SEDUC), contando também com a participação das principais universidades cearenses.
22. Disponível em: <http://www.paic.seduc.ce.gov.br/images/biblioteca/relatorio_final_comite_cearense _eliminacao_analfabetismo/revista_unicef.pdf. Acesso em: 21 jul. 2015.
23. Esclareça-se que o principal ator político no Comitê de Eliminação do Analfabetismo Escolar era o então Deputado Estadual Ivo Gomes, do conheci-do clã cearense, que havia atuado como Secretário Municipal da Educação de seu irmão, Cid Gomes, quando era prefeito de Sobral (1996-2004). Com a eleição deste para o Governo Estadual, em 2006, assumiu a Chefia de Gabinete do Governo.
24. Segundo dados colhidos por Gusmão e Ribeiro (2011).
25. Fontinele, Tabosa e Simonassi (2011).
26. Disponível em: <http://www.paic.seduc.ce.gov.br/images/PASTA_TATIANA/protocolo.pdf>. Acesso em: 21 jul. 2015.
27. Disponível em: http://www.paic.seduc.ce.gov.br/images/PASTA_TATIANA/termo_de_parceria_paic.pdf>. Acesso em: 21 jul. 2015.
28. Lei Estadual nº 14.371 , de 19 de junho de 2009.
29. Vide a propósito da avaliação do PAIC: Marques, Ribeiro e Ciasca (2008); Lima, Pequeno e Melo (2008)
30. Sobre a adequação do que seria a “idade certa” para alfabetização, trata-se de decisão político-pedagógica bastante controversa, mas que refoge ao nosso objetivo discutir. Vale transcrever, todavia, o comentário de Gomes (2013): “A princípio pode parecer filigrana, mas esse é um ponto central para todos os sistemas de ensino na implantação de ações voltadas para assegurar a alfabetização inicial. De certa maneira, o processo de alfabetização se estende por todo o primeiro ciclo do ensino fundamental (1º ao 5º ano). A aquisição plena de determinadas competências básicas exige uma apropriação sistemática, gradual, que vai sendo burilada ao longo dessa fase escolar. Entretanto, considerando nosso contexto educacional de baixa proficiência na língua e os objetivos a que se propõe o Pacto Nacional, é relevante saber: Que competências um aluno deve demonstrar para ser considerado al-fabetizado? Em que idade ou em que ano/série ele necessariamente deve apresentá-las? Trata-se de um recorte de política pública, sujeito a chuvas e trovoadas, e também às guerras teóricas e metodológicas ligadas à alfabetização”.
31. Tais objetivos estão consolidados nas 28 diretrizes constantes do art. 2º do Decreto, entre as quais consta: “Art. 2o A participação da União no Compromisso será pautada pela realização direta, quando couber, ou, nos demais casos, pelo incentivo e apoio à implementação, por Municípios, Distrito Federal, Estados e respectivos sistemas de ensino, das seguintes diretrizes:(...)II - alfabetizar as crianças até, no máximo, os oito anos de idade, aferindo os resultados por exame periódico específico;”.
32. Resolução/CD/FNDE nº 4, de 27 de fevereiro de 2013 e Resolução/CD/FNDE nº 12, de 8 de maio de 2013.
33. Resolução CNE/CEB nº 7, de 14 de dezembro de 2010.
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34. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=18543:direitos-de-aprendizagem-do-ciclo-de-alfabetiza-cao-do-ensino-fundamental&catid=323:orgaos-vinculados&Itemid=97> Acesso em 24 jul. 2015.
35. A única exceção conhecida é a Lei Complementar nº 140/2011, que “Fixa normas, nos termos dos incisos III, VI e VII do caput e do parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal, para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorren-tes do exercício da competência comum relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora; e altera a Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981”.
36. Vide art. 116 da Lei Federal nº 8.666/93 e, no âmbito federal, o Decreto nº 6.170/2007.
37. Também havia a previsão inicial de instituição de premiações, conforme relata Gomes (2013, p. 5), mas ao que parece a ideia não foi levada adiante.
38. Disponível em: <http://pacto.mec.gov.br/images/pdf/cronograma_30012013.pdf>. Acesso em: 25 jul. 2015.
39. “Denise Maria Lopes aponta que, pelo menos na região Nordeste, é preciso avançar na criação de conselhos. Segundo ela, é fundamental envolver toda a sociedade em torno da alfabetização infantil e fazercom que isso se transforme em uma prática constante. ‘Lutar por esses conselhos é dever dos coordenadores locais e secretários. Em janeiro fizemos uma reunião com a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), aqui no Rio Grande do Norte, para tentar mobilizar os secretários acerca do Pacto, e abordamos a questão da criação desse conselho, que faz parte do documento do Pacto. Mas a criação ainda não aconteceu”, recla-ma Denise” (Letra – Jornal do Alfabetizador. Belo Horizonte, CEALE/UFMG mar/abr. 2014, p. 10). Disponível em: <http://pacto.mec.gov.br/images/pdf/Jornal%20Letra%20A%2037-Especial%20PNAIC-Verso%20WEB.pdf>. Acesso em 25 jul. 2015.
40. TCU, Plenário, AC-1089-14/14-P, j. 30.04.2014. Disponível em: www.tcu.gov.br>. Acesso em: 25 jul. 2015.
41. Vide: <http://g1.globo.com/economia/noticia/2015/05/cidades-saude-e-educacao-lideram-valor-de-cortes-no-orcamento.html>. Acesso em : 25 jul. 2015.
Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeuhttp://www.usjt.br/revistadireito/