1
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO AMAZÔNAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
PPGECEM/REAMEC
MARIA LÍDIA PAULA LEDOUX
Saberes Docentes como mediadores Didáticos e Conceituais na Formação Inicial de Professores de Matemática
Belém/Pará 2016
2
MARIA LÍDIA PAULA LEDOUX
Saberes Docentes como mediadores Didáticos e Conceituais na Formação Inicial de Professores de Matemática
Tese apresentada à banca examinadora do
Programa de Pós-Graduação em Educação em
Ciências e Matemáticas (PPGECEM) da Rede
Amazônica de Educação em Ciências e
Matemática (REAMEC), como exigência parcial
para à obtenção de Doutora em Educação
Matemática, sob a orientação do Prof. Dr. Tadeu
Oliver Gonçalves.
Área de concentração: Educação Matemática
Linha de Pesquisa: Formação de Professores
Polo: Universidade Federal do Pará - UFPA
Belém/Pará 2016
3
Dados Internacionais de Catalogação na Fonte.
Ficha catalográfica elaborada automaticamente de acordo com os dados fornecidos pelo(a) autor(a)
Permitida a reprodução parcial ou total desde que citada a fonte
P324s LEDOUX, Maria Lídia Paula.
Saberes Docentes como Mediadores Didáticos e Conceituais na Formação Inicial de Professores de Matemática / Maria Lídia Paula LEDOUX. -- 2016
187 f. ; 30 cm. Orientador: TADEU OLIVER GONÇALVES.
Tese (doutorado) - Universidade Federal de Mato Grosso, Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática. Cuiabá, 2016. Inclui bibliografia.
1. SABERES DOCENTES. 2. FORMAÇÃO INICIAL. 3.
4
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E
MATEMÁTICA – REAMEC Avenida Fernando Corrêa da Costa, 2367 – Boa Esperança – Cep. 78060900 –
FOLHA DE APROVAÇÃO TÍTULO: "Saberes Docentes como Mediadores Didáticos e Conceituais na Formação Inicial de Professores de Matemática" AUTOR: Doutoranda Maria Lídia Paula Ledoux Tese de doutorado defendida e aprovada em: 25 de novembro de 2016
Belém, 25 de novembro de 2016
5
Ao meu maior tesouro
Meus filhos Patrícia e Leonn que são razão de minha existência e o meu grande suporte
psicológico para prosseguir na busca de novos saberes e quando foi necessário, souberam
dizer a palavra certa que eu precisava ouvir, o incentivo quando pensei em desistir, o abraço
apertado quando me sentia desprotegida, o beijo quentinho quando me senti fragilizada e
souberam suportar minhas constantes ausências.
Ao meu maior exemplo (in memória)
Minha mãe Lídia que na essência de seu analfabetismo foi minha maior educadora e na
ausência do saber formalizado, soube me dar grandes lições ensinando-me que uma vida
se constrói da luta, da persistência e na resistência daqueles que acreditam que o querer é
o começo do caminho para se chegar a ter, o sonho que se quer sonhar. E eu queria, fiz o
caminho, persistir e realizei o sonho que havia sonhado um dia. Obrigada minha querida
mãe por teus valiosos ensinamentos.
6
AGRADECIMENTOS
Pela tua existência na minha vida, Por nunca te afastares de mim, Por não me deixares desistir no meio do caminho, Pela felicidade de conhecer a tua palavra, Por fazeres de mim quem sou, Meu Deus e meu Senhor, Muito obrigada! Por me deixarem existir, Pelos grandes ensinamentos, Pela doação de serem meus pais, Por me deixarem crescer livre, Pelo amor e pela dádiva da vida, Meus queridos pais Lídia e Luiz Antônio, Muito obrigada! Pela beleza d’alma que vocês se tornaram, Por me presentearem com suas presenças, Por me amarem e se deixarem amar, Por compartilharem comigo suas vidas, Por serem o meu melhor e maior presente, Meus amados filhos Patrícia e Leonn, Muito obrigada! Pelas vezes que precisei me distanciar de vocês para seguir meu rumo, Por compreenderem minhas constantes ausências, Pelo carinho e respeito que sempre me dispensaram, Pelo que vocês representam para mim, Por tudo que a amizade de vocês significa na minha vida, Meus queridos irmãos José, Célia, Guiomar, Luiz, Luiza, Paulino e os que já se foram, Muito obrigada! Pela disponibilidade de ser um informante, Por me permitirem entrar nos teus segredos docentes, Por se deixarem entusiasmar pela pesquisa, Por compartilharem comigo seus saberes, Por me deixarem contar suas confidências, Professores de Matemática da Microrregião do Salgado, Muito obrigada! Por todas as vezes que me acompanhou nas viagens de campo, Pelas risadas provocadas por suas trapalhadas, Pelo carinho e respeito que sempre me dispensou, Por escutar as minhas angústias na produção da tese, Por me acompanhar nesta caminhada, Meu amigo Mauro Célio Pantoja, Muito obrigada!
7
Pela nobreza d’alma tocantinense, Pelas escutas em momentos de incertezas, Por saber me dizer a palavra certa, Por me brindar com a alegria da tua presença, Por teres te tornado minha irmã de alma, Profa. Dra. Elisangela Melo, Muito obrigada, minha amiga! Pela solicitude incomparável na travessia de formação, Pela escuta sensível quando necessário, Por mostrar os caminhos a serem trilhados, Pelo compartilhamento de saberes produzidos, Pela capacidade de conduzir o conhecimento de maneira prazerosa, Profª. Drª. Terezinha Valim Oliver Gonçalves, Muito obrigada, minha amiga! Pelas idas e vindas, as vezes mais idas do que vindas, Por todas as vezes que endurecestes teu olhar para dizer onde eu devia melhorar, Pelas vezes que roubei teu tempo para me presentear com tuas sabias palavras, Pelas vezes que peguei tua mão e te pedi: me guia, Por tudo isso e pelo não dito, Prof. Dr. Iran Abreu Mendes, Muito obrigada, meu amigo!
Pelo olhar de cumplicidade quando foi necessário, Pelas vezes que me fez repetir algo para se tornar verdade, Por me fazer alcançar a maioridade intelectual de maneira prazerosa, Por me mostrar o caminho sem tirar os espinhos, Pelas feridas epistemológicas abertas agora já cicatrizadas, Prof. Dr. Tadeu Oliver Gonçalves, Muito obrigada, meu sempre orientador! Por me deixarem ver o que precisava ser visto, Por compartilharem comigo seus saberes, Por permitirem a troca de conhecimentos, Pela disponibilidade de fazer a leitura deste texto, Por me apontarem a direção a ser seguida, Professores da Banca de Defesa, Muito obrigada!
A todos aqueles que de uma forma ou de outra irão deitar seu olhar na leitura deste texto tornando-o um instrumento vivo todas as vezes que estas páginas forem lidas, refletidas, criticadas e/ou usadas na construção de outros saberes, de outros conhecimentos que possam contribuir com a formação de professores de Matemática para o contexto Amazônico. Muito obrigada!
8
Pedacinhos coloridos de cada vida que passa pela minha e que vou costurando na alma. Nem sempre bonitos, nem sempre felizes, mas me acrescentam e me fazem ser quem sou. Em cada encontro, em cada contato, vou ficando maior...em cada retalho, uma vida, uma lição, um carinho, uma saudade...que me torna mais pessoa, mais humano, mais completo. E penso que é assim mesmo que a vida se faz: de pedaços de outras gentes que vão se tornando parte da gente também. E a melhor parte é que nunca estaremos prontos, finalizados... haverá sempre um retalho novo para adicionar à alma. Portanto, obrigada a cada um de vocês, que fazem parte da minha vida e que permitem engrandecer minha história com os retalhos deixados em mim. Que eu também possa deixar pedacinhos de mim pelos caminhos e que eles possam ser parte das suas histórias. E que assim, de retalho em retalho, possamos nos tornar, um dia, um imenso bordado de ‘nós’.
(“Sou feita de retalhos”, Cora Coralina)
9
[...] vivemos um tempo de fascínio pela imagem, pelo espetáculo que parece captar-nos, envolver-nos no movimento, no efêmero, esvaziando memórias, quebrando o sentido das coisas que garantiam estabilidade e segurança. A vida quotidiana esconde-se concreta e dramática atrás do ecrã das aparências; a consciência da imprevisibilidade, a percepção de que muitos processos escapam à capacidade de intervenção do homem comum, condiciona o desejo de participação, reprime a vontade de indignação, convida ao isolamento, ao retorno ao mundo estreito das relações imediatas e superficiais, da valorização dos objetos e de sua posse. A desordem, a complexidade deste tempo de mudança, de passagem, insinua-se na escola, revela-se na fluidez do ambiente que nela se vive, na diversidade de mensagens que se captam no cenário dos seus espaços, na evolução, por vezes contraditórias, das relações partilhadas pelos seus protagonistas (CAVACO, 1991).
10
RESUMO Esta é uma pesquisa de natureza qualitativa, que traz como foco de investigação, os saberes de professores egressos do curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal do Pará, Campus universitário de Castanhal. Esses professores desenvolvem suas práticas docentes nas escolas públicas da Microrregião do Salgado, contexto em que foi realizado a pesquisa de campo, com o objetivo de investigar os saberes docentes de professores egressos para compreender de que forma estes podem ser entendidos como mediadores didáticos e conceituais na formação inicial de professores de Matemática. Das observações no campo de investigação, desenvolvi uma arquitetura para conceituar as três dimensões de saber: Saber Pessoal do Professor; Saber da Formação e Saber da Prática Docente, na perspectiva de compreender como o conceito de saber está inter-relacionado nos processos que demandam valores, crenças e práticas culturais de uma determinada sociedade. Fizeram parte desta pesquisa, oito professores licenciados em Matemática. Os instrumentos para a constituição das informações foram questionário, entrevista e registro em diário de campo. Como metodologia de análise, fiz uso da Análise Textual Discursiva, que se insere em movimentos de produção e reconstrução das realidades investigadas. Das análises, emergiram cinco categorias que deram origem as unidades de significados: Formação Inicial: prática formativa baseada em conteúdos; Lacunas da Formação: comprometimento da prática na sala de aula; Saberes do Conhecimento Específico: sentidos e significados; Prática Docente: aprendendo a ser professor na prática da sala de aula e, Saberes Docentes: mediadores da/na formação inicial. A análise dessas unidades vem ao encontro da tese por mim defendida de que as experiências práticas vivenciadas por professores egressos dos cursos de Licenciatura em Matemática, são capazes de promover o desenvolvimento de saberes docentes e servir de base para propiciar a mediação didático e conceitual em processo formativos, na perspectiva de minimizar as lacunas de formação e formar professores diferenciados para atuarem na Educação Básica. Os resultados apontam para a proposição de que é possível formar professores de forma diferenciada, considerando a presença de elementos como: um ensino mediado pela pesquisa; de metodologias de ensino diferenciadas; da residência pedagógica ao longo da formação e de constantes processos de revisão e reformulação no PPC do curso. A pesquisa revela notas que incidem sobre a formação inicial de professores de Matemática, configuradas em processos que demandam atitudes procedimentais, considerando: Promover no âmbito da formação inicial, procedimentos em que as ações de aula sejam aproximativas da realidade educacional, como um exercício necessário ao professor em formação; Integrar conhecimentos específicos e conhecimentos pedagógicos, com vistas a promover a base de entendimento necessária para proporcionar ao professor em formação, o sentimento de pertencimento de sua profissão; Inserir o ensino, a pesquisa e a extensão como elementos articuladores e promovedores de uma aprendizagem significativa na formação inicial de professores de Matemática. Nesta proposição, manifesto a compreensão de que uma formação diferenciada se dá a partir da abertura ao diálogo, aos desafios, às inovações e as mudanças necessárias à formação de professores capazes de compreender a importância de seu papel social e de sua relação com o mundo. PALAVRAS-CHAVE: Saberes Docentes. Formação Inicial. Professores de Matemática.
11
ABSTRACT This is a qualitative research that brings, as investigation focus, the teacher knowledge of the Mathematics Teachers Graduates of the Federal University of Pará, Campus of Castanhal. These teachers develop their teaching practices in public schools in the micro-region of Salgado, which was the context where it was done a field research in order to investigate the graduating teachers' knowledge to understand how these can be understood as didactic and conceptual mediators in the initial training of mathematics teachers. Through the observations in the field of research, I developed an architecture to conceptualize three dimensions of knowledge: Teacher Personal Knowledge; Training Knowledge and Knowledge of Teaching Practice, in order to understand how the concept of knowledge is interrelated in processes that require values, beliefs and cultural practices of a given society. Eight qualified teachers in mathematics were taken as part of this research. The instruments to establish the information were questionnaire, interview and journaling field. As analysis methodology, I made use of the Discursive Textual Analysis that is part of the production and reconstruction movements of the investigated realities. From the analysis, five categories emerged that originated the units of meaning: Initial Teacher Education: training practice-based content; Shortcoming on Teacher Training: Practice Commitment in the classroom; Knowledge of the specific knowledge: Senses and Meanings; Teaching Practice: learning to be a teacher in the practice of the classroom, and Teachers knowledge: initial training mediators. The analysis of these units is in line with the thesis defended by me that the practical experiences experienced by the mathematics teachers graduates are able to promote the development of teaching knowledge. In addition, they can be used as basis to provide the didactic and conceptual mediation in training process in order to minimize the shortcoming on teacher Training and form different teachers to work in Basic Education. The results point to the proposition that it is possible to train teachers differently, considering the presence of elements such as teaching mediated by research; differentiated teaching methodologies; pedagogical residence throughout the training and constant revision and reformulation on the processes of the PPC of the course. This research reveals notes that focus on initial training of mathematics teachers, organized in processes that require procedural actions, considering: Promote in initial training, procedures in which the class actions are close to the educational reality as an essential practice to the teacher in training; Integrate specific knowledge and teaching skills, in order to promote the basis of understanding needed to provide those teachers, the feeling of belonging to their profession; Insert teaching, research and extension as articulators elements and promoters of a significant learning in the initial training of mathematics teachers. In this proposition, I manifest the understanding that a differentiated formation takes place from the opening to dialogue, to the challenges, to the innovations and to the necessary changes to the training of teachers able to understand the importance of their social role and their relationship with the world. Keywords: Teaching Knowledge. Initial Training. Mathematics Teachers.
12
LISTA COMPARTILHADA
Lista de Quadros
Quadro 1 – Nº de Escolas públicas na Microrregião do Salgado...........................................60
Quadro 2 – Nº de alunos matriculados nas Escolas Públicas................................................61
Quadro 3 – Índice de Desenvolvimento Educação Básica.....................................................61
Quadro 4 - Escolaridade de professores da Educação Básica por região.............................65
Quadro 5 – Lotação de Professores por Rede de Ensino......................................................94
Quadro 6 – Quantitativo de informantes da pesquisa............................................................96
Quadro 7– Colaboradores selecionados................................................................................97
Quadro 8 – Conceituação de Saber numa concepção filosófica..........................................118
Lista de Gráficos
Gráfico 1 – Distribuição dos Cursos de Licenciatura em Matemática....................................65
Gráfico 2 – Quantitativo de professores que trabalham com Matemática............................101
Gráfico 3 - Formação Acadêmica dos Informantes .............................................................102
Gráfico 4 – Instituição da Formação Inicial dos Informantes................................................103
Gráfico 5 – Quantitativo de informante por gênero,,,,,,,........................................................104
Gráfico 6 – Nível de atuação docente dos informantes........................................................104
Gráfico 7 – Tempo de atuação docente dos informantes.....................................................105
Gráfico 8 – Quantitativo de informantes que manifestaram interesse .................................106
Lista de Figuras
Figura 1 – Matéria publicada no Jornal Beira do Rio. Ed. mar/abr. de 1986.........................73
Figura 2 - Matéria publicada no Jornal Beira do Rio. Ed. mar/abr. de 1986..........................73
Figura 3 - Panorâmica do Campus Universitário de Castanhal.............................................74
Figura 4 - Distância entre o Campus de Castanhal e os municípios.....................................75
Figura 5 - Localização da Mesorregião do Nordeste Paraense.............................................80
Figura 6 – Localização da Microrregião do Salgado..............................................................81
Figura 7 - Delimitação Espacial do Campo de investigação..................................................92
Figura 8 – Localização das Unidades Regionais de Educação.............................................93
Figura 9 – Arquitetura Conceitual.................................................................................121
Figura 10 – Movimento de Integração de Saberes ........................................................174
Lista de Siglas
AC – Arquitetura Conceitual
ATD – Análise Textual Discursiva
13
CNE – Conselho Nacional de Educação
CODEC - Companhia de Desenvolvimento Econômico do Pará
CONSEPE - Conselho Superior de Ensino e Pesquisa
CRUTACs – Centros Rurais Universitários de Treinamento e Ações Comunitárias
CUNCAST – Campus Universitário de Castanhal
FACMAT – Faculdade de Matemática
FADESP – Fundação de Amparo ao Desenvolvimento da Pesquisa
FUNAI – Fundação Nacional do Índio
GETI – Grupo de Educação da Terceira Idade
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
IEMCI – Instituto de Educação Matemática e Científica
IFPA – Instituto Federal do Pará
IMPA - Instituto de Matemática Pura e Aplicada
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
LDB – Lei de Diretrizes e Bases
MEC – Ministério da Educação e Cultura
NDE – Núcleo Docente Estruturante
PPC – Projeto Pedagógico de Curso
PARFOR – Plano Nacional de Formação de Professores para a Educação Básica
PPGECM - Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemáticas
REUNI – Reestruturação e Expansão das Universidades Federais
SBM - Sociedade Brasileira de Matemática
SEDUC – Secretaria Estadual de Educação
SEMED – Secretaria Municipal de Educação
URE – Unidade Regional de Educação
UEPA - Universidade do Estado do Pará
UFRA - Universidade Federal Rural da Amazônia
UFPA – Universidade Federal do Pará
UFOPA – Universidade Federal do Oeste do Pará
UNIFESSPA – Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura
14
SUMÁRIO
Primeiras Palavras.............................................................................................16
SEÇÃO I – Memórias
1. Memórias do tempo vivido e não do tempo contado..........................................21
Infância encantada – ausências sentidas...............................................................23
Formação Inicial - vencendo desafio.......................................................................29
Formação Permanente – necessidade constante...................................................34
Formação no Mestrado – divisor de águas.............................................................35
Formação doutoral - experiência pessoal intransferível..........................................38
Docência no Ensino Superior – experiências que marcam....................................41
Encontrando-me com o problema de pesquisa ...................................................47
Epílogo desta Seção..........................................................................................................52
SEÇÃO II – Cenário
2. Cenário da investigação.........................................................................................54
Aspectos socioculturais do cenário...........................................................................56
Para compreender a educação no Estado do Pará...................................................59
Formação Inicial de Professores de Matemática no Pará ........................................64
Universidade Federal do Pará - UFPA.......................................................................68
Campus Universitário de Castanhal - CUNCAST......................................................72
Faculdade de Matemática - FACMAT........................................................................76
Delimitação do contexto investigado..........................................................................80
Epílogo desta Seção..................................................................................................83
SEÇÃO III – Métodos
3. Movimento entre os métodos que sustentam esta Pesquisa ............................86
Abordagem metodológica da investigação................................................................88
Instrumentos de recolhimento de informações..........................................................94
Colaboradores envolvidos nesta investigação...........................................................97
Tratamento das informações constituídas................................................................100
Procedimento de análise teórica-conceitual.............................................................107
Epílogo desta Seção.................................................................................................112
15
SEÇÃO IV – Saberes
4. Saberes de Professores de Matemática............................................................115
Formação Inicial: prática formativa baseada em conteúdo................................ 124
Lacunas de Formação: comprometimento da prática na sala de aula............... 133
Saberes do conhecimento específico: sentidos e significados..........................138
Prática Docente: aprendendo a ser professor na sala de aula.............................143
Saberes Docentes: mediadores da/na formação inicial........................................148
Epílogo desta Seção.............................................................................................158
SEÇÃO V – Últimas Palavras
5. Conhecimentos como modificadores de Prática...............................................160
Escritas do Contexto... a influência das águas....................................................161
Escritas de Si...a maioridade intelectual................................................................163
Escritas do Outro... as histórias que se quer contar.............................................167
Escritas da Escrita... entre teorias, relatos e reflexões.........................................170
REFERENCIAS.........................................................................................................186
APÊNDICES
Apêndice A – Questionário
Apêndice B – Roteiro da Entrevista
16
Primeiras palavras
Realizar pesquisas, fazer descobertas e buscar compreender um dado
fenômeno é o que move um pesquisador. Porém, quando ainda estamos em um
processo de estar e não de ser pesquisador, existe a preocupação sobre a ação de
pesquisar. Essa preocupação transforma-se em ansiedade quando somos postos
diante do desafio de realizar uma pesquisa para a definição, argumentação e
sustentação de uma tese. Logo nos perguntamos: O que é uma Tese? Tese é a
palavra originada do grego θέσις, que se constitui em uma proposição intelectual que
se apresenta para ser defendida por alguém e discutida em uma comunidade
acadêmica, com base em determinadas hipóteses e pressupostos.
A Tese de doutorado é um trabalho acadêmico de investigação complexa e
aprofundada sobre determinado tema. Contém abordagem teórica definida, formulada
em evidências de fatos a partir de pesquisa (teórica, de campo, documental,
experimental, histórica ou filosófica) na área em que se situa, elaborada dentro de
uma metodologia específica. O texto da tese caracteriza-se pela defesa de uma ideia
original, de um ponto de vista ou pelo questionamento acerca de um determinado
assunto e deve ser defendido em público, para um grupo de doutores, como condição
para obtenção do título de doutor.
A partir deste entendimento, a escrita de uma tese é um movimento que envolve
investigação, reflexão, compreensão e produção textual, com vistas a responder a
uma determinada pergunta, pois o que move o pesquisador são as perguntas e não
as respostas. Na tentativa de responder as minhas perguntas, lancei-me ao campo de
investigação para encontrar as respostas a estas inquietações.
Quando iniciamos o plano de uma investigação, precisamos que ter claro a
direção que queremos seguir, para que o caminho a ser percorrido possa levar-nos
ao encontro das respostas, ao objeto de investigação. Para tanto, minha primeira
preocupação foi definir o objetivo da pesquisa, que intencionou analisar os saberes
docentes de professores de Matemática da Microrregião do Salgado para
compreender de que forma estes podem ser entendidos como mediadores didáticos
e conceituais na formação inicial de professores. Isto, na perspectiva de sustentar a
tese de que “as experiências práticas vivenciadas por professores egressos do curso
de Licenciatura em Matemática são capazes de promover o desenvolvimento de
17
saberes docentes e servir de base para propiciar a mediação didática e conceitual em
processos formativos, na perspectiva de minimizar as lacunas de formação e formar
professores diferenciados para atuarem na Educação Básica”.
Definidos o objetivo e a tese, outra preocupação se fez. Pensar as questões
que iriam nortear esta investigação e algumas indagações se manifestaram: os
saberes docentes podem ser entendidos como mediadores didáticos e conceituais na
formação inicial de professores de Matemática? As lacunas de formação
comprometem as práticas docentes de professores de Matemática em ambiente de
prática? Que sentidos e que significados os professores de Matemática atribuem aos
saberes específicos da área do conhecimento? Os professores de Matemática que
estão nas salas de aula da Educação Básica conseguem fazer o cruzamento dos
saberes próprios do contexto com os saberes científicos produzidos na formação
inicial?
O material básico para realizar esta pesquisa constituiu-se das entrevistas com
professores de Matemática da Microrregião do Salgado. Isto, com o propósito de
descrever e analisar a essência do objeto estudado, a partir da visão de mundo dos
professores licenciados em Matemática em seu contexto de prática, em que a lógica
reside na interpretação do vivido e das realidades significativas do sentido da vida
desses informantes.
Esta intencionalidade de investigação demandou organizar um roteiro de
entrevista, de forma a trazer informações acerca dos saberes docentes que estão
vinculados a três dimensões: Saberes Pessoais do Professor (nas/das inter-relações
pessoais); Saberes da Formação (na formação inicial e contínua); Saberes da Prática
Docente (da relação estabelecida entre essas aprendizagens na construção de
conceitos).
Para discorrer sobre as questões aqui propostas, o texto foi escrito no formato
de seções e subseções. Este formato permite que a escrita seja feita no sentido de
integrar fatos, acontecimentos, passagens, que foram juntando-se ao longo da
pesquisa e podem ser referidas em um único texto, porque a escrita é um todo
organizado e relacionado a um conjunto de circunstâncias da ação principal, em que
é feita na perspectiva de anunciar, discutir e sintetizar as reflexões demandadas dessa
ação.
18
Ressalto a importância e a necessidade de anunciar os indicadores de cada
uma das seções como forma de facilitar o entendimento e a compreensão da leitura.
Assim como, fazer ao final de cada seção, uma síntese em forma de epílogo para
fechar as ideias que foram discutidas e anunciar as que constam da seção seguinte.
A primeira seção intitulada Memórias do tempo vivido e não do tempo
contado, emerge no/do processo de visitação da memória para discorrer sobre o
tempo por mim vivido e das entradas de outros elementos que foram significativos
neste percurso. Para tanto, essa escrita se inicia com parte da minha infância e se
estende até o meu encontro com a problemática que me desafiou a fazer esta
investigação.
A segunda seção que denominei de Cenário da investigação, é ambiente
oportuno para explicitar as dimensões continentais e as características peculiares do
Estado do Pará. Dessa maneira, trazendo algumas informações acerca do
desenvolvimento econômico e educacional da região, apontando dados sobre a
formação inicial de professores de Matemática no Estado, fazendo referências às
instituições formadoras, focando na Universidade Federal do Pará, no Campus
Universitário de Castanhal e na Faculdade de Matemática como parte do cenário de
investigação. Por fim, delimito o espaço no qual centrei a pesquisa nos onze
municípios da Microrregião do Salgado, onde os aspectos culturais são fortemente
marcados pelas práticas da pesca artesanal e da agricultura.
Na terceira seção que se intitula Movimento entre os métodos que
sustentam esta pesquisa, fiz o caminho em meio aos métodos usados nesta
investigação, apontando os principais indicadores, a abordagem metodológica da
pesquisa de campo, a delimitação espacial do campo de investigação, os
instrumentos utilizados para o recolhimento das informações constituídas. Aponto
ainda, os critérios para selecionar os colaboradores envolvidos na pesquisa. Identifico
os colaboradores que participam desta investigação que apresentam características
parcialmente similares, pois todos são professores licenciados em Matemática,
lotados em escolas públicas da Microrregião do Salgado. Apresento, também, o
tratamento das informações iniciais já apontando alguns resultados. Por fim, o
detalhamento do procedimento de análise teórico-conceitual baseada na Análise
Textual Discursiva.
19
Ainda nesta seção faço referências às obras que deram suporte à análise e
interpretação do tema proposto nesta investigação. Isto, a partir da interlocução entre
as concepções surgidas dos diálogos com os colaboradores, com as teorias
produzidas pelos estudiosos da temática investigada e nas ideias desta pesquisadora.
Considerando, dessa maneira, que o conhecimento não se produz de forma isolada,
mas na integração de ideias e de conhecimentos produzidos coletivamente que se
complementam em processos contínuos de busca.
Na quarta seção intitulada Saberes de Professores de Matemática, elaborei
ensaios acerca dos saberes de professores de Matemática da Microrregião do
Salgado. A partir da análise do material empírico, encontrei recorrências e
singularidades nos relatos dos colaboradores que participaram desta pesquisa, que
deram origem a cinco categorias de análise intituladas: FORMAÇÃO INICIAL: prática
formativa baseada em conteúdos; LACUNAS DA FORMAÇÃO: comprometimento da
prática na sala de aula; SABERES DO CONHECIMENTO ESPECÍFICO: sentidos e
significados; PRÁTICA DOCENTE: aprendendo a ser professor na prática da sala de
aula, e SABERES DOCENTES: mediadores da/na formação inicial.
Para sustentar as unidades de análise, tomo como principal base referenciada,
a Teoria da Docência como uma profissão humana defendida por Maurice Tardif. Ao
final deste processo analítico, construo algumas proposições que poderiam ser
recomendadas na formação inicial de professores de Matemática para a Educação
Básica no cenário investigado, como forma de contribuir para possíveis mudanças no
que se refere ao formato dos cursos de Licenciatura em Matemática.
A quinta e última seção que denominei de Últimas Palavras, constitui-se de
um resgate do vivido na/da trajetória de formação doutoral e dos achados no campo
de investigação em que outras vozes ecoaram e foram tomadas a termo para uma
breve análise, como registro da relevância dessa interlocução na finalização das
ideias construídas. Desta forma, considero estas últimas palavras uma maneira de
expressar, compartilhar e socializar o caminho percorrido, os atropelos, os erros, os
acertos, os desafios, os ganhos, os achados, as descobertas e as contribuições desta
investigação, como forma de dizer até daqui a pouco, quando a inquietação fizer outra
provocação, levar-me para outras paragens, fazer outras descobertas e começar um
novo percurso investigativo, com uma única certeza: o conhecimento é um processo
20
mutável e não absoluto. Portanto, ser professor é ter como pressuposto básico ser um
pesquisador.
É importante destacar que após a qualificação da tese, por sugestão da banca,
fiz um retorno ao campo de investigação para fazer a escuta de outros informantes
(barqueiro1 e curraleiro2), considerando que esses sujeitos poderiam acrescentar
informações significativas no que se refere aos saberes próprios da cultura local.
Portanto, nesta seção faço a interlocução com os relatos dos informantes, na
perspectiva de dialogar com esses saberes e compreender sua importância como
mediadores de saberes matemáticos em sala de aula na Educação Básica.
Desta forma, estas últimas palavras não têm características de conclusão ou
de considerações finais. Prefiro pensar que a escrita deve ser vista como um convite
para um encontro com outros investigadores de saberes docentes, na perspectiva de
fazer de nossas conclusões inconclusas, trilhas que possam ser percorridas por
estudantes, professores e pesquisadores que se preocupam e têm interesse em saber
mais acerca de Saberes Docentes de Professores de Matemática.
1 Profissional que desenvolve suas atividades na construção de embarcações navais 2 Profissional que desenvolve suas atividades na construção de currais de pesca
21
1. Memórias do tempo vivido e não do tempo contado
Abre-se o portão gradeado do jardim com a
docilidade da página que uma frequente
devoção interroga. E lá dentro os olhares não
necessitam fixar-se nos objetos que já estão
cabalmente na memória... (“Lhaneza”,
BORGES, 2009).
Abre-se os idos da memória para deixar-me levar pelas lembranças e resgatar
dos episódios vividos, os momentos que foram significativos ao longo da minha
travessia pessoal, da formação acadêmica e da experiência profissional. Esse resgate
contribuiu na promoção de um processo autoformativo a partir das manifestações que
estão plenamente colocadas em minha memória.
As manifestações espontâneas sobre as histórias de vida e a trajetória de
formação são escritos cada vez mais frequentes em pesquisas que demandam
conjeturar estudos nas ciências sociais, nos quais, colocando-nos como protagonistas
sentimo-nos livres para compartilhar fatos e acontecimentos da nossa vida pessoal e
experiência profissional. Nesse olhar para mim, consigo reviver e rememorar histórias
que estavam guardadas para serem ditas, faladas, contadas, narradas em momentos
mais ou menos intimistas no meu convívio social ou para serem guardadas na
“caixinha” do esquecimento, uma vez que nossa memória é seletiva3.
Para dar conta de expressar o que vai na minha memória, organizei esta seção
em sete subseções: Infância encantada... ausências sentidas; Formação
Inicial...vencendo desafios; Formação Permanente... necessidade constante;
Formação no Mestrado... divisor de águas; Formação doutoral... uma experiência
pessoal intransferível; Docência no Ensino Superior... experiência marcante;
3 LEDOUX, M. L. Paula. Fragmentos deste texto fazem parte do artigo intitulado “UM OLHAR DE SI
NAS TRAVESSIAS DE FORMAÇÃO”, apresentado no VI Congresso Internacional de Pesquisa
(Auto)Biográfica – CIPA - ISSN: 2178-60676. Rio de Janeiro. Brasil, 2014
22
Encontrando-me com o problema da pesquisa... escuta sensível, no sentido de
refazer o percurso que vai da minha infância até o momento presente. Nessa visitação
interior permito-me, como sujeito, autora e narradora, deslocar-me entre as histórias
vividas, dando significado ao conhecimento de mim mesma, sabendo, contudo, que
[...] quando contamos nossas histórias e experiências para os outros, de forma escrita
ou oral, elas deixam de ser somente nossas, pois passam a fazer parte da vida do
outro (LARROSA, 1998, p. 38).
Estes escritos têm sentidos e significados que estão fortemente marcados na
minha história de vida e que ficarão permanentemente guardados na minha memória.
E para que o tempo que foi vivido faça sentido para aqueles que forem deitar seu olhar
nas linhas desta história, faço uso das palavras de Miles Franklin (1941) para vos dizer
que:
[...] esta história é sobre a minha própria pessoa – não tenho qualquer
outro objetivo ao escrevê-la. Não há qualquer enredo nesta história,
porque não houve na minha vida ou em qualquer outra vida do meu
conhecimento. Pertenço a uma classe cujos indivíduos não têm tempo
para enredos, mas para fazer o seu trabalho sem se darem a esse
luxo (In: NÓVOA, 2000, p. 81).
Na minha história também não houve tempo para qualquer enredo. Ao narrar,
visitei minha memória e caminhei por entre os riscos, rabiscos e tramas que foram se
desenhando ao longo desse percurso. Em alguns momentos foi necessário fazer a
costura de alguns retalhos, que foram sendo cortados e recortados ao longo dessa
história, o que possibilitou certa ordenação para dar sentido e significado à escrita
deste texto. Então, começo fazendo o movimento reflexivo de olhar de fora para
dentro, pelo qual eu consiga me ver para me conhecer.
Esse processo reflexivo no entendimento de Veiga-Neto (2002, p. 24), “[...] é
olhar para dentro de si mesmo para ver como o eu se reflete sobre si mesmo. ” Assim,
os significados, os sentidos, as interpretações, as experiências estão estreitamente
ligadas aos registros guardados na memória daquilo que estou narrando. Ao partilhar
as minhas histórias, busco na memória os eventos que marcaram o percurso do tempo
vivido na/da minha história que começa em uma infância de encantos e de ausências.
23
Infância encantada... ausências sentidas.
Para a feitura desta escrita busco os sinais de uma infância vivida em
ambientes cobertos de fantasia, de imaginação, em que ser criança era apenas ser
criança. Fui criança no tempo em que a imaginação apontava a direção para que
fizéssemos a viagem para o mundo encantado do faz-de-conta, onde era possível ser
aquilo que quiséssemos ser - uma fada, uma bruxa – tanto faz o personagem ou a
história inventada, pois a imaginação pode fazer de uma criança o que ela quiser.
Inclusive, ser feliz. Falar de nossas histórias é fazer um exercício que de certa forma
nos envolve em uma expectativa de refletir, de avaliar, de responder questões que o
tempo tinha se encarregado de levar para o esquecimento. Eis que minha infância
vem me visitar.
Minha infância foi vivida em um povoado no interior do estado do Pará, sendo
a décima primeira filha, de um total de treze irmãos. Minha memória “[...] que no
sentido básico do termo, é a presença do passado” (MORAES, 2000, p. 23), ajuda-
me a lembrar de que as coisas que aprendi na infância foram-me ensinadas por minha
mãe.
Não houve tempo para aprender com meu pai, sua ausência ocorreu desde
muito cedo em minha vida. Não tive a oportunidade de conviver com ele, de saber do
que gostava, de ouvir o som de sua voz, de sentar em seu colo ou de sentir o afago
de suas mãos. Tenho poucas lembranças da pessoa física de meu pai, a imagem mais
forte que ficou guardada em minha memória foi o dia de sua morte, pois “[...] a
memória guarda quase sempre a história das feridas abertas sobre certos períodos
que não passam” (MORAES, 2000, p. 30). As lembranças desse dia permanecem
fortemente guardadas. Lembro-me de um grande movimento de pessoas na nossa
casa e, na minha ingenuidade de criança, tudo não passava de uma festa, pois nesta
fase ainda não se tem percepção de vida e de morte.
O conceito de vida (PIAGET, 1998), evolui de forma sequencial e em estágios
que vão ocorrendo ao longo de toda a infância. Com a morte de meu pai, minha mãe
assume a condução da família, e mesmo não tendo o domínio da leitura e da escrita,
já sinalizava aos filhos, a importância da escola como espaço de formação.
Naquela época (década de 1950), as famílias eram quase sempre muito
numerosas e isto contribuía consideravelmente para dificultar o acesso à formação
24
escolar. No entanto, mesmo sem ter o domínio do saber escrito, minha mãe foi a maior
incentivadora para que fizéssemos uma formação mínima que fosse, em suas
palavras - a única riqueza que lhes posso deixar de herança é o saber - mesmo
desconhecendo a dimensão de suas palavras e nem a que “saber” estava se referindo,
fazia-nos entender que não queria que seus filhos fossem analfabetos como ela.
As quatro primeiras séries do curso primário (hoje anos iniciais do Ensino
Fundamental) foram feitas em uma escola pública, onde as salas de aula eram muito
grandes, as carteiras escolares eram coletivas (sentavam duas ou três crianças
juntas). O ensino era feito pelo método tradicional, ou seja, [...] era verbalista, centrado
no uso de livros-texto e na palavra do professor, cuja principal função era a
transmissão de informações que deveriam ser memorizadas e repetidas.
(KRASILCHIK, 1986, p. 07). As turmas eram multisseriadas4 e a aprendizagem se
dava na base do castigo para o aluno que não correspondesse às “exigências” da
professora, não no sentido de aprender, mas em obedecer. Lembro que fiquei de
castigo algumas vezes de braços abertos e de rosto virado para a parede, outras, de
joelhos sobre os caroços de milho. Essas práticas forçavam-nos a decorar os
números, a gramática, o ponto de história, de geografia e das ciências.
A professora era generalista, tinha que dar conta de ensinar todas as
disciplinas. No ensino de Ciências, em especial, a professora detinha-se a ensinar o
que estava no livro didático, [...] não se trabalhava ciências com vistas à formação
pessoal e social do aluno (SANTOS, 2001, p.31). Lembro de uma experiência que
constava do livro, em que deveríamos colocar um pedaço de algodão em um pires,
em seguida colocar um grão de feijão, regar todos os dias para que crescesse. Não
consigo lembrar se no momento em que a professora nos solicitava para fazer o
experimento, havia alguma orientação sobre os resultados que seriam alcançados ou
por que fazê-los. Fazíamos apenas por [...] curiosidade epistemológica (FREIRE,
1992, p. 32). O que sei é que a experiência foi frustrante, após oito ou dez dias, o pé
de feijão morria e nunca entendi qual era o sentido da observação. Não posso afirmar
se aquela forma de ensinar ciências tinha a finalidade de:
4 Turmas formadas por alunos de diversas séries numa mesma sala de aula, tendo somente um (a) professor (a) para ministrar todas as disciplinas. Também conhecida como Educação Geral.
25
[...] proporcionar aos alunos meios para emitirem julgamentos refletidos sobre os problemas da sociedade ou tornar a ciências mais acessível e mais atraente de diferentes capacidades e sensibilidades e preparar os jovens para o papel de cidadão numa sociedade democrática (SANTOS, 1996, p. 38).
Ou se era apenas para cumprir as disciplinas que faziam parte da grade
curricular, determinada pelo sistema de ensino. Percebo que quando estudei ciências
não tinha a noção de que aprender ciências implicava, entre outras coisas, em
perceber a produção e utilização do saber científico, estimulando e despertando a
curiosidade do aluno para fazer suas descobertas. Hoje com o avanço da tecnologia
e da acessibilidade ao conhecimento, aprender ciências passou a ter outro significado,
as crianças lidam com experimentos de forma mais lúdica e prazerosa.
Com as aulas de Matemática a prática era pior. Aprender matemática era
somente para os “iluminados” que gostavam de lidar com números e fórmulas. A
disciplina era vista (e ainda é) como a grande vilã da reprovação, da repetência e da
evasão escolar. Aprender as quatro operações (somar, dividir, multiplicar e subtrair)
básicas, era um verdadeiro sofrimento, éramos coagidos a aprender, o lema era “ou
aprende ou apanha”.
As aulas eram “reforçadas” aos sábados, com a prática da sabatina5, que tinha
como objetivo fazer os alunos decorarem a tabuada, e quando isto não acontecia e as
respostas não eram corretas, a professora castigava os alunos, batendo com a
palmatória6 na palma da mão daqueles que erravam as respostas, sempre com ar de
superioridade, às vezes, eu diria até, com certo prazer e arrogância, ainda que, [...] a
arrogância não seja sinal de competência nem a competência é a causa da arrogância
(FREIRE, 1992, p.165).
Ela, no entanto, fazia questão de demonstrar que era a autoridade máxima na
sala de aula, que era a dona do conhecimento, estava ali para ensinar,
desconhecendo que [...] ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as
5 Verificação oral de memorização de conteúdo. 6 Peça circular de madeira, provida de um cabo, com a qual se castigavam crianças, batendo-lhes com ela na palma da mão. Esta prática foi muito utilizada por professores das escolas públicas na década de 1950, como forma de castigo para alunos com dificuldade de aprendizagem, especialmente em operações matemáticas.
26
possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção (Ibid., p. 52). O aluno,
por sua vez, tinha o dever e a obrigação de aprender.
Aprender matemática nas quatro primeiras séries do ensino fundamental foi
uma experiência muito dolorosa e traumática na minha vida escolar. O ensino desta
disciplina não se baseava na utilidade deste conhecimento, não se atribuía os devidos
valores ao ensino desta ciência ou seus significados para o dia a dia de quem
aprendia.
Segundo D’Ambrosio (1998), cinco são esses valores. O valor utilitário que
atende às necessidades próprias do indivíduo; o valor cultural que ultrapassa os
aspectos étnicos, antropológicos, sociais e políticos; o valor formativo que se
desenvolve pelo raciocínio e a clareza do pensamento matemático; o valor sociológico
que trata da própria universalidade inerente à matemática e o valor estético que tem
como característica, a forma diferenciada e particular que cada indivíduo tem para
absorver os conhecimentos matemáticos. Na minha infância a denotação atribuída
pelos alunos à disciplina de matemática, era do medo, do castigo, da coerção, não
tínhamos a percepção da importância desses conhecimentos para a vida.
A respeito dos aspectos abordados, guardo em minha memória as boas
lembranças desse tempo, os momentos vividos de forma descontraída. Exemplo disso
era a hora da merenda escolar, em que comíamos pupunha com farinha, a jaca
debaixo da jaqueira, a manga comida no alto dos galhos. Outra boa lembrança eram
as traquinagens e as brincadeiras de criança em que brincávamos de roda, pira se
esconde, pular corda, amarelinha e, muitas outras brincadeiras que as crianças de
hoje já não brincam. O que é lamentável, pois essas brincadeiras eram formas
expressivas e prazerosas de integração e socialização entre os alunos.
Apesar das marcas deixadas pela não aprendizagem de conteúdos
matemáticos e de outras disciplinas, sem dúvida, este é um tempo que tem lugar
especial em minha memória. Isto, pois que, aqui significa um tempo de intenso prazer
pela simplicidade dos pés descalços, do caderno encapado com papel de pão e
costurado à mão, da sacolinha de pano para carregar os livros, da saia pregueada e
da blusa branquinha lavada com anil, de acordar cedinho, tomar café com farinha de
mandioca e correr para a escola, pois lá era o lugar que eu queria estar. Boas
lembranças.
27
Quando terminei as quatro primeiras séries do ensino primário as coisas
mudaram, minha mãe entregou-me a uma família que morava na capital do estado do
Pará para trabalhar como doméstica e continuar os estudos. Essa mudança se deu
por não haver no povoado onde morávamos, séries mais avançadas, os professores
que ali davam aula, tinham como formação, uma série acima das que ensinavam.
Nessa vinda para a capital do estado, perdi o encantamento de criança, pois
trabalhava muito e não tinha mais tempo para as brincadeiras. O tempo que me
sobrava, dedicava para estudar, pois sempre acreditei que era por meio do estudo
que eu poderia mudar o rumo da minha vida.
Cursei a 5ª série do ensino primário em uma escola pública do bairro onde eu
morava e desta série guardo a lembrança de uma professora que marcou esta fase
de minha vida escolar por sua prática em sala de aula. Ela me falava da importância
de continuar os meus estudos (naquela época quem terminava a 5ª série já podia se
considerar formado), talvez ela não soubesse, mas [...] às vezes, mal se imagina o
que pode passar, a representar na vida de um aluno um simples gesto do professor.
(FREIRE, 1992, p. 47).
Segundo o autor, é digna de nota a capacidade que tem a experiência
pedagógica para despertar, estimular e desenvolver em nossos alunos o gosto de
querer bem e da alegria sem a qual a prática pedagógica perde a beleza, o
encantamento e o sentido.
A prática docente não perde seu rigor científico se passear também por estes
caminhos a que o autor se refere e, em suas palavras, [...] é preciso reinsistir em que
não se pense que a prática educativa vivida com afetividade e alegria prescinda da
formação científica séria e da clareza política dos educadores e das educadoras.
(Ibid., p.161).
Ao terminar a 5ª série fiz o curso ginasial e para ingressar nesta modalidade de
ensino precisei passar por um exame de admissão, ou seja, um teste classificatório
para poder obter a vaga. Esta foi a primeira forma de exclusão social que passei.
Considero como exclusão, pelo fato de que as vagas existentes não atendiam à
demanda e por este fato todos deveriam ser submetidos ao teste para que os
melhores pudessem consegui-las.
28
Terminado o curso ginasial, fiz o curso Técnico em Contabilidade e quando
finalizei este curso não pude avançar na minha formação escolar por força das
circunstâncias - ou estudava ou trabalhava. Neste momento, minha única opção era
trabalhar para poder me manter. Precisei esperar pelo tempo, para prosseguir nos
estudos. No entanto, nunca perdi a esperança e nem deixei de acalentar o sonho de
um dia poder ter uma formação no ensino superior que me preparasse para o mercado
de trabalho.
Antes de avançar nesta escrita devo informar que ao propor a feitura deste
memorial analítico descritivo, assumo uma postura reflexiva em que, ao visitar minha
história, reviver minhas experiências, passo por um processo de autoformação, pois
estou me submetendo a um processo de olhar para si, ou seja, um olhar-me, na
perspectiva de fazer desta escrita, uma reinvenção de mim mesma como pessoa e
como profissional, considerando que a autoformação (WARSCHAUER, 2005) nada
mais é do que um trabalho do sujeito sobre si mesmo para desenvolver a implicação
pessoal e social. Neste desenvolvimento é importante considerar as implicações que
este processo representa, pois:
[...] o desafio neste conhecimento de si mesmo não é apenas
compreender como nos formamos por meio de um conjunto de
experiências, ao longo da nossa vida, mas sim tomar consciência de
que este reconhecimento de si mesmo como sujeito, mais ou menos
ativo ou passivo segundo as circunstâncias, permite à pessoa, daí em
diante, encarar o seu itinerário de vida, os seus investimentos e os
seus objetivos na base de uma auto-orientação possível, que articule
de uma forma mais consciente as suas heranças, as suas
experiências formadoras (JOSSO, 2004, p. 4).
Neste pensar, consigo me dar conta de como fui me construindo na pessoa que
sou, sem ter por perto a presença de pessoas como meus pais, que poderiam servir
de termômetro para me dizer quando avançar ou quando recuar. Apesar da distância
e da inexistência dessa presença, ainda assim foram as minhas referências no que se
refere aos valores morais e religiosos. Aprendi que o caráter, a integridade, a
idoneidade e a lealdade são heranças que servem para construir sob bases sólidas,
seu próprio itinerário de vida. Desta forma, partilho minhas experiências de vida e de
formação, ancoradas nas memórias guardadas, que se revelam nos percursos de
29
minha trajetória pessoal e profissional, em um... rasgar-se e remendar-se...
continuamente, como sabiamente já dizia Guimarães Rosa.
Assim, apesar das ausências sentidas, caminhei em meio às dificuldades sem,
contudo, deixar de acreditar que avançar no meu crescimento intelectual seria uma
escolha minha e isto se daria a partir de uma formação inicial. Este reviver e
rememorar contribuiu para a compreensão de como me tornei uma educadora, como
transformei minhas práticas docentes a partir das travessias de formação inicial e
permanente.
Formação Inicial... vencendo desafios
Quando a vida nos desafia a assumir responsabilidades que de certa forma têm
implicações diretas na condução de processos que demandam resultados imediatos
e satisfatórios para atendimento às necessidades de uma determinada sociedade,
somos levados a refletir sobre os significados e os sentidos daquilo que nos propomos
a assumir. Ao me ver na condução de uma realidade que tinha desafios educacionais
a serem vencidos e expectativas a serem atendidas, fui em busca de uma formação
que me preparasse para dar os primeiros passos na complexa caminhada pelas trilhas
da experiência profissional7.
O início dessa preparação decorreu do ingresso no curso de Licenciatura em
Pedagogia, na Universidade Federal do Pará, Campus Universitário de Castanhal, na
perspectiva de buscar a base teórica necessária para sustentar o desenvolvimento de
minha prática. Isto, especialmente por já desenvolver atividades na área da Educação,
sem ter a formação inicial adequada, pois os conhecimentos básicos e a base teórica
que sustentavam esta ação foram construídos na formação técnica no curso de
Magistério.
A partir do andamento do curso de Licenciatura percebia que a formação que
estava recebendo era baseada em teorias que de certa forma não se aproximavam
da realidade que eu estava vivenciando. Apesar desse distanciamento, tentava
aproximar os aspectos teóricos que embasavam as discussões no processo formativo
7 Fragmentos destes escritos fazem parte do texto de minha Dissertação de Mestrado, defendida em
julho de 2005.
30
às tomadas de decisão no exercício da função e na condução dos encaminhamentos
que demandavam conhecimentos sobre os aspectos político-educacionais.
Sob essa prerrogativa meu olhar em relação às instâncias formadoras de
profissionais da educação para estarem na condução de salas de aulas, de
coordenação pedagógica, de gestores educacionais, dentre outros espaços, se
revelavam nas relações de poder entre as diversas teorias presentes no processo
formativo e as de caráter existencial no exercício da função. Este fato contribuía,
crescentemente, para que as discussões acerca dos rumos da educação, do ensino
e da transformação da escola, ficassem como interrogativas em minha cabeça.
Durante os quatro anos na graduação, algumas disciplinas (Introdução à
Educação, Estrutura e Funcionamento da Educação Básica, Psicologia do
Desenvolvimento e da Aprendizagem) trouxeram teorias significativas para minha
formação e contribuíram para o desenvolvimento de minha prática. Esses
conhecimentos proporcionaram-me bases que naquele momento eram importantes
para desempenhar o papel político-educacional de um processo organizacional na
educação do município.
Apesar dos conhecimentos proporcionados, ainda assim me sentia inquieta e
por muito tempo minha memória esteve ocupada por inquietações decorrentes do
processo de formação inicial. Essas inquietudes levaram-me a refletir para
compreender o sentido e o significado do percurso vivido durante esse processo e
para buscar os registros feitos durante essa formação. [...] é preciso que a experiência
fale de si para poder voltar-se sobre si e compreender-se (SOARES, 2001, p. 47).
Nesse sentido, consigo compreender que [...] a memória é um fenômeno sempre
atual, onde o passado, mais que construído, é reconstruído, num plano efetivo e
mágico (SANTOS, 1996, p. 12), que me leva a reviver esse processo de uma forma
serena. Agora consigo olhar o tempo e o espaço de formação a partir de uma
maturidade ainda não existente no tempo vivido, considerando que o tempo que está
sendo contado nunca é o tempo do fato ocorrido (CLANDININ & CONNELLY, 2011).
Desta forma, cada fato ocorrido representou um momento especial em minha
vida, sendo registrado em minha memória com a intencionalidade que este fato
representou e contribui para que a minha história fosse construída de [...] pequenos
fragmentos que não tem meio nem fim (O’BRIEN, 1991, p. 39 apud CLANDININ &
CONNELLY, 2011, p. 158).
31
Assim o tempo passou e, em meio a todas as dificuldades, limitações e
obstáculos, tornei-me professora das séries iniciais. E, não mais que de repente, me
vi diante de uma sala de aula, em uma turma de estudantes do Ensino Médio para
ministrar aulas de Sociologia. Esse cenário fez-me ver que a formação que havia
recebido não me preparou para o enfrentamento da realidade que ora se apresentava
e nem para me iniciar na profissão de forma efetiva, pois [...] um professor é antes de
tudo, alguém que sabe alguma coisa e cuja função consiste em transmitir esse saber
para os outros (TARDIF, 1991, p. 31). Mas, aqui cabe uma pergunta: Se eu não tinha
a formação adequada para estar em uma sala de aula do Ensino Médio ensinando
Sociologia, porque aceitei a função? Isto é facilmente explicável.
Há momentos na vida que os caminhos que percorremos nem sempre são
frutos de nossas escolhas. Mas, das escolhas que o próprio acaso faz por nós. Nesses
momentos o aspecto econômico e a própria sobrevivência tornam-se mais fortes do
que os nossos ideais.
No entanto, tinha a consciência de que com a formação recebida eu teria lugar
em uma sala de aula com estudantes das séries iniciais e não em uma turma do 1º
ano do Ensino Médio. Porém, as coisas nem sempre são como idealizamos, pois a
realidade da educação está aquém do ideal. A sala de aula das escolas públicas, das
regiões mais afastadas dos grandes centros, tem como regente o indivíduo que tem
uma formação, não importando se é específica ou não. O que importa é não deixar o
estudante sem professor, e para isso mecanismos são usados para lotar professores
com a prerrogativa da carência de profissionais qualificados.
Apesar de não ter uma formação específica em Sociologia, durante a formação
inicial tive disciplinas (Introdução à Sociologia; Sociologia I, II e III) na matriz curricular
do curso de Pedagogia, que de certa forma, acrescentaram-me a base para me
aventurar na busca de outros conhecimentos na área e preparar-me para fazer um
bom trabalho com essa turma. Afinal, era nessa classe que eu estava tendo a
oportunidade de experienciar algo novo e pôr em prática os conhecimentos
apreendidos na formação inicial.
Esse choque de realidade entre o ser e o estar professora serviu para tomar
consciência acerca da minha formação, no sentido de buscar preparar-me para fazer
a ação de ser docente de forma diferenciada, contribuindo para que mudanças
ocorressem na vida daqueles estudantes que buscavam na escola, a esperança de
32
se tornarem pessoas melhores. Desta forma, estar professora de Sociologia poderia
ser uma oportunidade para desenvolver uma habilidade que ainda não sabia que
tinha, mas que poderia vir a ter.
Nesse pensar, me vi sendo desafiada a ensinar sociologia para jovens e
adolescentes que acreditavam que eu poderia ajudá-los a avançar em sua formação
escolar. Portanto, eu não poderia deixar de contribuir para com esse avanço. Posso
afirmar que dar aulas de Sociologia em uma turma com sessenta estudantes do 1º
ano do Ensino Médio foi uma experiência de extrema relevância para me iniciar na
vida docente. Considero que este “batismo docente” ocorreu com toda pompa e
circunstância.
No entanto, essa experiência apresentou-se sob dois extremos. Primeiro, de
forma encantadora, porque estava tendo a oportunidade de experienciar novas
práticas, novos desafios. Segundo, de forma assustadora, por não saber como
começar, como agir, como me portar diante dos estudantes. O meu “eu pessoal” e o
meu “eu profissional” durante muito tempo trabalharam com medo do desconhecido,
medo de não acertar, mesmo porque, não é possível [...] separar o eu pessoal do eu
profissional, sobretudo, numa profissão fortemente impregnada de valores e de ideias
e muito exigente do ponto de vista do empenhamento e da relação humana (NÓVOA,
1998, p. 17). Nesse momento, como professora, me vi diante de um dos maiores
desafios: saber conduzir a minha sala de aula e mediar o ensino.
Para Schön (2000), o professor é desafiado a todo o momento a uma tomada
de decisão coerente frente aos desafios que se repetem cotidianamente no interior da
sala de aula. Porém, nem sempre essa decisão é tarefa fácil para um professor em
início de carreira. Ele ainda é inseguro, precisa aprender a ver e ver como, o que
pressupõe, segundo Wittgenstein (1984), que determinadas capacidades aprendidas
são atitudes diferentes de um mesmo processo constitutivo dos significados que
atribuímos à nossa experiência.
No entanto, mesmo temendo todas as adversidades que a prática docente
poderia proporcionar-me fui ao encontro do desafio de ser professora, afinal, [...] o
professor é uma pessoa e parte dessa pessoa é o professor (NÓVOA, 1998, p. 45). A
pessoa parte desta professora, também percebeu que o discurso da escola estava
distanciado das teorias aprendidas na formação inicial. Que o fazer docente ainda
33
estava ancorado em práticas conteudistas e essencialmente tecnicistas, no que se
refere aos métodos e técnicas para ensinar.
Passado esse primeiro momento e já refeita do impacto inicial, o que me
importava era saber que mesmo sem a experiência efetiva da sala de aula, pois a
prática de ensino que tive a oportunidade de experienciar durante a formação inicial
resumiu-se na carga horária da disciplina de Estágio Supervisionado. Nesta,
ficávamos nas escolas fazendo regência de classe e, posteriormente, deveríamos
entregar um relatório, que a meu ver, pouco contribuiu para o desenvolvimento de
minha prática de ensino, pois essa preparação é incipiente para um profissional se
iniciar na carreira docente. No entanto, essa ausência não foi impedimento para eu
começar minha prática docente de maneira responsável. Isto se deu de uma única
forma. Não me deixei levar pela apatia da sala de aula e não perdi o encantamento
do ato de ensinar.
Perder esse encantamento seria o fim de um começo e fechar os olhos às
práticas que transformam crianças de “carne e osso” em “boneco de pau” como
sinalizado por Rubem Alves (1986) em sua obra “Pinóquio às avessas”. Ou ainda,
práticas disciplinadoras que visavam a homogeneização em uma tentativa de matar
a curiosidade natural e espontânea da criança, como bem coloca Foucault (1987) em
sua obra Vigiar e punir, fazendo da sala de aula um lugar onde ninguém quer estar.
Como professora-formadora quero reportar-me a uma sala de aula, onde seja
possível explorar o que ela tem para oferecer, onde eu consiga ver além de quatro
paredes, do quadro, do giz, das aulas maçantes, do conteúdo pelo conteúdo. É
preciso pensar, ver e sentir a sala de aula como o lugar da festa do conhecimento, da
interrogação, do espanto. O lugar onde todos queiram estar. É nesse lugar que quero
me fazer professora. E como professora não posso esquecer-me da essencialidade
do componente estético da formação do educador, que Freire (1992) tanto defende.
A minha convivência no ambiente de prática me fez ter a certeza de que nunca
estamos prontos, seja como profissional, seja como pessoa. Estamos em constante
processo de formação, haverá sempre um espaço a ser preenchido entre o que foi
aprendido e a construção do novo que se dará a partir de um processo de formação
permanente.
Neste pensar, fui à busca de construir novos saberes, pois:
34
[...] é sabendo que se sabe que uma pessoa se prepara para saber mais. Se tivéssemos um saber absoluto, já não poderíamos continuar sabendo, pois que este seria um saber que não estaria sendo. Quem tudo soubesse já não poderia saber, pois não indagaria. O homem como um ser histórico, inserido num permanente movimento de procura faz e refaz constantemente o seu saber (FREIRE, 1992, p. 33).
Com a formação inicial dei os primeiros passos na constituição de alguns
saberes que estiveram presentes na minha trajetória profissional. No entanto, essa
formação já não respondia às minhas expectativas, e [...] quando um professor
expressa essa vontade é porque sente necessidades, desejos, inquietações,
ansiedades (GONÇALVES & GONÇALVES, 1998, p. 108), que se manifestam de
dentro para fora e este desejo me levou a buscar novos conhecimentos na área
educacional por meio da formação permanente.
Formação Permanente... necessidade constante
Das minhas vivências no ambiente de prática, naturalmente foram juntando-se
fragmentos e retalhos que precisavam ser costurados para definir um norte para
continuar a caminhada. Convivendo com essa realidade, resolvi que estava na hora
de voltar a investir na minha formação, pois [...] a formação permanente do professor
deve apoiar-se fundamentalmente em uma análise, na reflexão e na intervenção da
prática pedagógica do professor em exercício mediante o processo de reflexão,
análise e integração (IMBERNÓN, 1994, p. 8).
Uma Pós-Graduação em nível de Especialização na área de Educação foi o
primeiro passo para essa nova fase de minha formação. Desta forma, ingressei no
curso de Especialização em Educação Ambiental e Conservação dos Recursos
Hídricos, do Centro de Educação da Universidade Federal do Pará. Essa formação
contribuiu para me fazer ver que a formação de um professor também perpassa pela
necessidade de compreender a importância dos aspectos ambientais para a
preservação e continuação das espécies vivas, conhecimentos que um professor deve
ter para ir além do conteúdo que está posto para ser ensinado, mas de um conteúdo
que deve ser ensinado.
35
Ainda em busca de saberes que fortalecessem minhas práticas pedagógicas,
fiz outro curso de especialização, desta vez em Gestão Educacional na Universidade
do Estado do Pará. Isto, com vistas a preparar-me para mediar as questões
educacionais que circundavam, em meio às práticas de sala de aula e de outros
ambientes da escola em que desenvolvia atividades técnicas-pedagógicas na
supervisão de ensino.
Os saberes aprendidos nos cursos de especialização foram significativos e
contribuíram para que minha prática profissional fosse modificada no sentido de refletir
o quanto eu precisava saber mais para fazer melhor. Para tanto, procurei outros
conhecimentos que pudessem contribuir com a minha vontade de melhorar e mudar
aquilo que eu estava fazendo. Assim, fui em busca de uma formação permanente,
desta vez em nível de Mestrado.
Formação no Mestrado... divisor de águas
Neste retorno à academia para a formação agora em nível de Pós-Graduação
Stricto Sensu, convivendo diariamente com outras fontes do saber, sentindo o sabor
e o cheiro do conhecimento, do novo e da descoberta, levou-me a perceber que [...] a
educação permanente é um processo que busca um desenvolvimento pessoal, social
e profissional ao longo da vida, com a finalidade de melhorar tanto sua qualidade como
da coletividade (IMBERNÓN, 1994, p. 16).
Continuei minha travessia de formação, desta vez num curso de Mestrado por
razões não só de natureza pessoal, mas principalmente profissional. Pois considero
que o crescimento do educador está na essência de seu desenvolvimento intelectual
e que a formação permanente deve fazer parte do seu cotidiano. A fim de estar em
constante processo de preparação e assim contribuir positivamente com a educação
de seu país, de seu estado, de sua cidade, de sua escola, de seus pares, na
perspectiva de relacionar as teorias apreendidas às práticas pedagógicas vivenciadas
nos espaços escolares e no dia a dia da sala de aula.
Na vontade de prosseguir na construção de novos saberes, ingressei no
Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemáticas, do antigo
Núcleo Pedagógico de Apoio e Desenvolvimento Científico/NPADC (atual Instituto de
36
Educação Matemática e Científica - IEMCI), da Universidade Federal do Pará, para
cursar o Mestrado em Educação em Ciências e Matemáticas.
A princípio, um curso de Mestrado em Educação em Ciências e Matemáticas
parecia pouco familiar para uma Pedagoga. Porém, a vivência com as outras áreas
(Física, Biologia, Química, Matemática) do conhecimento, me fez ter a clareza de que
havia feito a escolha certa. Pois assim estava tendo a oportunidade de discutir
formação de professores sob vários olhares. Sem dúvida, esta foi a melhor forma para
construir saberes em tempo e espaço, aos conhecimentos já adquiridos em minha
experiência profissional sem, contudo, esquecer que a formação permanente implica,
entre outros aspectos, [...] em desenvolver as qualidades emocionais/afetivas,
políticas e conhecimentos (domínio do conteúdo e metodológico) que requerem uma
formação que abranja as dimensões humanas, política, epistemológica e ética, entre
outras (D’AMBROSIO, 1998, p. 43).
O curso de Mestrado trouxe para mim o inimaginável. Esta afirmação faz-se
com base nos anos que passei na universidade como discente. Primeiro fazendo o
curso de graduação, posteriormente duas habilitações e por último dois cursos de
especialização. Durante esse período jamais havia tido oportunidade de discutir
Educação, Educação Matemática, Formação de Professores, Saberes de
Professores, entre outros, à luz das teorias defendidas por teóricos que discutem as
Ciências da Educação. Ou seja, a partir das leituras de obras de autores
internacionais, como Bourdieu, Bachelard, Chevallard, Dewey, Gauthier, Moran,
Nóvoa, Schön, Shulman, Stenhouse, Tardif, Zeichner e de autores nacionais como
Aragão, Chaves, D’Ambrosio, Fiorentini, Freire, Gonçalves, Gonçalves e Gonçalves,
Nacarato, Pimenta, Valente, Veiga-Neto, entre outros que foram estudados ao longo
da formação, que me possibilitaram construir saberes que eu não imaginava existir. O
que estes saberes acrescentaram-me talvez não consiga expressar, porque as
palavras me faltam. Mas sei o que eles podem proporcionar-me: os primeiros passos
para minha maioridade intelectual.
A partir de então acreditei que uma nova forma de pensar e fazer docência seria
possível. Assim como seria possível quebrar paradigmas situados nos ambientes de
aprendizagem, especialmente nas escolas públicas, onde ideias como para ensinar
basta saber o conteúdo; o que importa é cumprir o programa, entre outras práticas
37
comuns nas escolas, em que tive a oportunidade de desenvolver atividades tanto
como docente quanto como técnica.
Além dos aspectos abordados acima, a vivência no curso de mestrado também
me proporcionou uma outra forma de ver a Matemática. Aqui aconteceu meu primeiro
encontro com uma matemática que eu não conhecia: a Educação Matemática. Esta
afirmativa faz-se das lembranças guardadas do tempo vivido nas séries iniciais.
Quando fui apresentada a uma matemática em que os conteúdos não tinham
significados para mim, que serviam para me punir, humilhar-me e me ver como uma
pessoa incapaz de aprender, provocando um sentimento de repulsa em relação a esta
disciplina ao longo da minha vida escolar.
No entanto, essa aversão foi dissipada quando conheci a Educação
Matemática, o que me fez compreender que a matemática que me foi “ensinada”, era
uma matemática fria, sem vida. A partir das bases epistemológicas que discutem a
Educação Matemática aprendi que é possível ensinar conteúdos matemáticos de
forma significativa para quem aprende. Também foi durante este processo de
formação no mestrado que encontrei minha identidade como professora-formadora,
aspecto este que será melhor detalhado na subseção que trata da Docência no Ensino
Superior.
Portanto, minha formação no curso de Mestrado em Educação em Ciências e
Matemáticas foi o grande marco (divisor de águas) de minha vida acadêmica, sob
vários aspectos. Pelo imensurável alargamento dos conhecimentos apreendidos, do
salto dado do ponto de vista do saber, do meu prazer intelectual, de minha habilidade
profissional e da própria formação interna decorrida sob [...] uma articulação
conscientemente elaborada entre atividade, sensibilidade, afetividade e ideação
(JOSSO, 2004, p. 48) e dos conhecimentos externos adquiridos ao longo do curso
que foram se construindo a partir das interações, das intervenções e das relações
estabelecidas nesse processo.
Neste percurso, tive meu primeiro contato com os saberes de docentes
professores de modo sistemático e científico, quando me propus a fazer meu texto
dissertativo na perspectiva de me encontrar no campo de investigação em meio aos
saberes da formação de professores em serviço. Desta feita, a pesquisa para
trabalhar estes aspectos foi realizada com estudantes do curso de Licenciatura em
Matemática, na qual enveredei pelo caminho dos saberes.
38
Dada a proximidade com os saberes da formação, da experiência etc., tenho
perseguido essa linha de investigação nos meus escritos, nas minhas orientações de
TCC, inclusive incentivando estudantes da graduação a desenvolverem pesquisas na
área. Mas, apesar do meu crescimento intelectual e das mudanças decorridas em
minha formação, o que sei ainda é pouco para fazer bem o que faço. Preciso estar em
constante processo de aprender, razão essa que me levou à busca de uma formação
doutoral.
Formação doutoral... uma experiência pessoal intransferível
Na contemporaneidade, a formação de professores exige que esta ocorra com
base nas necessidades apontadas pelas demandas sociais. Formar professores é,
sem dúvida, uma ação que requer preparação intelectual para o desenvolvimento de
práticas responsáveis no fazer profissional.
Portanto, a formação permanente é uma necessidade pessoal intransferível.
Não existe formação inicial sem que o professor-formador esteja preparado para
formar professores, especialmente, aqueles que vão desenvolver suas práticas
docentes na Educação Básica. Esses professores devem ser preparados para o
desempenho de suas atividades de maneira eficaz, na perspectiva de minimizar as
lacunas de formação que são construídas desde os primeiros anos de escolaridade e
se estendem por toda a vida acadêmica de nossos estudantes. Estudantes esses que
serão os futuros professores nas mesmas escolas onde receberam essa formação
deficitária.
Assim, pensar em uma formação em nível de doutorado é urgente e necessário.
Considerando-se que ao profissional professor atribui-se a responsabilidade de
satisfazer as necessidades formativas de uma sociedade. Esta que, por longo tempo
habituou-se a receber um modelo fragmentário do conhecimento e foi massificada em
seus direitos a uma educação em que sejam respeitadas não só o querer aprender,
mas, principalmente, que os conhecimentos ensinados sejam geradores de
aprendizagens significativas e promovedores de mudanças.
39
Neste pressuposto, como professora-formadora de professores para a
Educação Básica8 permito-me afirmar que a minha formação doutoral tem contribuído
significativamente para a compreensão de que formar professores é muito mais do
que depositar teorias distanciadas do contexto dos aprendentes. É ser capaz de
compreender que a formação de professores está centrada nos conhecimentos,
fazeres e saberes das áreas do conhecimento e que estes podem e devem ser
somados aos saberes próprios da cultura e dos hábitos sociais que são significativos
neste processo.
Ingressar em um curso de Pós-Graduação em nível de Doutorado, na área de
concentração em Educação em Ciências e Matemática é uma necessidade
primeiramente pessoal. Isto, pela vontade de estar em contínuo processo de
formação, mas também profissional, na busca de conhecimentos que me deem
suporte para melhor desenvolver minha prática docente.
Assim, compreendo que os saberes apreendidos nesta formação, irão
contribuir para a melhoria da qualidade do ensino da instituição de que faço parte, pois
certamente, minha prática docente também será modificada. Além da oportunidade
de realizar pesquisas sobre questões pertinentes aos processos formativos de
professores, entre outros contextos em que me permitir investigar, pois o homem por
ser um ser curioso é levado a fazer suas buscas e suas próprias descobertas.
Desta maneira, fazer uma formação seja em que nível for, é ter a
responsabilidade e o comprometimento de tornar esses conhecimentos públicos a
partir da socialização com seus pares, pois o novo deve ser anunciado, compartilhado,
divulgado e este compartilhar foi e está sendo feito, quando me coloquei a serviço da
comunidade acadêmica, quando do meu ingresso na docência superior, tendo a
oportunidade de desenvolver diariamente com os estudantes de graduação, os
conhecimentos que estão sendo aprendidos por meio das teorias discutidas e do
fortalecimento das reflexões feitas a cada novo conhecimento adquirido durante a
formação doutoral. Pela experiência modificadora que vem ocorrendo durante esta
formação, estou a cada dia sendo provocada a pensar o impensado e fazer o exercício
para aprender a inventar o objeto.
8 Sou professora da Universidade Federal do Pará, lotada na Faculdade de Matemática do Campus
Universitário de Castanhal – CUNCAST/UFPA
40
Com a formação doutoral em andamento transitei em meio a um turbilhão de
informações, conhecimentos e saberes que me provocaram reflexões acerca da
formação recebida. Desses momentos destaco a convivência no Grupo de Pesquisa
de Formação de Professores Transformar. Foi imprescindível na consolidação dos
saberes apreendidos, pois que nesses encontros, tive a oportunidade de discutir
teorias essenciais à formação, consolidando o aprendido nas disciplinas trabalhadas
no processo de formação doutoral.
De todas as disciplinas cursadas ficaram as aprendizagens, os conhecimentos
que foram teorizados, mas algumas delas foram especialmente importantes nesse
processo das quais destaco: Bases Epistemológicas da Pesquisa no Ensino de
Ciências e Matemática. A partir das discussões das teorias que fundamentam esta
disciplina, como Pierre Bourdieu, Boaventura de Sousa Santos, entre outros,
trouxeram para mim conhecimentos que passaram a fazer parte de minhas leituras e
práticas na formação de professores de Matemática.
A disciplina Pesquisa Narrativa foi outro grande ganho, pois aprendi com
Clandinin e Conelly que [...] as experiências são as histórias que as pessoas vivem.
As pessoas vivem histórias e no contar dessas histórias se reafirmam. Modificam-se
e criam novas histórias. As histórias vividas e contadas educam a nós mesmos e aos
outros (2011, p.27).
Outra disciplina que trouxe grandes contribuições para a minha formação foi a
Identidade do Professor de Matemática, que durante seu desenvolvimento tive a
oportunidade de conhecer as teorias defendidas por Pierre Bourdieu e Yves
Chevallard. Com Bourdieu. Aprendi, por exemplo, que [...] a análise da lógica da
prática estaria, sem dúvida, mais avançada se a tradição escolar não tivesse
constantemente abordado a questão das relações entre teoria e a prática em termos
de valor (2013, p. 47).
Com Chevallard (1985) aprendi que é no fazer cotidiano e nas formas de se
relacionar com o objeto que o professor desenvolve sua identidade. No entanto, essa
identidade não será suficiente se o professor não souber transformar o saber a ser
ensinado em um objeto de ensino.
Neste exercício reflexivo, penso sempre na minha sala de aula, nos professores
que eu estou formando, como estou formando, para que estou formando. Esse
41
processo de reflexão sobre a prática teve início quando entrei para a docência superior
como professora-formadora no Curso de Licenciatura em Matemática da Universidade
Federal do Pará, Campus Universitário de Castanhal.
Docência no Ensino Superior... experiência marcante
A preparação profissional construída no curso de mestrado possibilitou meu
ingresso na docência superior, permitindo-me discutir com os estudantes do curso de
Licenciatura em Matemática questões pertinentes à formação de professores, à
educação e à pesquisa. Isto, na perspectiva de oferecer aos futuros profissionais, os
conhecimentos básicos necessários para que sejam capazes de compreender a
importância de seu papel no contexto social.
Antes de avançar nesta discussão, compartilho os momentos que antecederam
minha entrada na sala de aula no curso de Licenciatura em Matemática. No dia em
que fui tomar posse na unidade para qual fiz o concurso, fui informada que os
estudantes de uma determinada turma, estavam na sala de aula aguardando-me. Isto
me inquietou e alguns questionamentos foram suscitados. Como me aguardando?
Que disciplina vou trabalhar? Que turma? Onde está a ementa? Não tenho um Plano
de Ensino? Após encerrada a parte burocrática (assinar Termo de Posse, entregar
documentação etc.), saí à procura de uma sala de aula onde tivesse estudantes
aguardando um professor. Algum tempo depois, encontrei uma sala com estudantes,
perguntei se eram do curso de Matemática e se estavam aguardando professor.
Responderam que sim. Perguntei qual seria a disciplina, responderam - parece que é
metodologia do trabalho científico e acadêmico. Entrei na sala, apresentei-me à turma
e perguntei que semestre estavam cursando, responderam que estavam no oitavo
semestre. Outra inquietação se fez. Como uma turma que está encerrando o curso
ainda não teve uma disciplina que deveria ser trabalhada no primeiro semestre? Mas
eu estava bem ali, na frente deles e decidi que seria a professora de metodologia do
trabalho científico e acadêmico que eles precisavam ter.
Sem ter um plano de ensino e sem ementa, não fiz como a professora da
parábola da Rolha Pedagógica9, que na ausência de lâminas de apresentação, de
livros, de material didático, de recursos eletrônicos não conseguia saber o que fazer
9 Texto usado em Dinâmicas de Grupo, de autor desconhecido.
42
com seus alunos. Ao contrário, fiz como o supervisor de ensino da mesma parábola,
que era um docente de alma e mudou a situação encontrada naquela sala de aula
quando avistou uma rolha sobre um móvel. Tomou-a e com serenidade iniciou um
diálogo com as crianças.
- Alguém sabe o que é isto? Perguntou o supervisor.
- Uma rolha! Gritaram os alunos surpresos.
- Muito bem. E de onde vem a rolha?
- Da garrafa. Uma máquina a coloca. De uma árvore. Da cortiça. Da madeira.
Respondiam as crianças animadas.
- E o que dá para fazer com madeira? Continuava entusiasta, o supervisor.
- Cadeiras. Uma mesa. Um barco! As crianças respondiam animadas.
- Muito bem, então teremos um barco. Quem se anima a desenhá-lo? Quem faz um
mapa na lousa e indica o porto mais próximo para o nosso barquinho? Escrevam a
qual estado brasileiro corresponde. E qual é o outro porto mais próximo que não é
brasileiro? A qual país corresponde? Alguém lembra que personagens famosos
nasceram ali? Alguém lembra o que produz esse país? Por acaso, alguém conhece
alguma canção desse lugar? E assim, começou uma aula variadíssima de desenho,
geografia, história, economia, música etc.
Eu não tinha uma rolha. Mas, tinha um pincel, um quadro e uma vontade muito
grande de começar ali, naquele momento. Então, peguei o pincel e fiz um ponto no
centro do quadro. E disse a turma:
- Este é o conteúdo de nossa aula de hoje! Todos me olharam assustados.
Perguntei ao estudante que estava mais próximo de mim:
– O que você está vendo?
– Um ponto! - Respondeu.
Então perguntei:
– Você considera que este é um ponto de partida ou um ponto de chegada?
Entregando-lhe o pincel, pedi que fosse ao quadro e fizesse uso do ponto da
maneira que melhor lhe conviesse.
O estudante levantou, foi ao quadro e fez um desenho a partir do ponto. E todos
os 23 estudantes da turma foram convidados a fazer o mesmo. Essa foi a forma
encontrada para interagir com os estudantes neste primeiro contato e deixar o
ambiente mais leve e descontraído. Todos ficaram eufóricos para ter a melhor ideia,
43
fazer o melhor desenho. Em seguida, pedi que olhassem para o quadro e
descrevessem o que estavam vendo. O que se via era um misto de (casas, árvores,
nuvens, pássaros, rios, sol, figura humana, coração, vasos, flores etc.) de desenhos.
Sugeri que apagassem todos os desenhos que representavam objetos
concretos. Depois de um tempo o único desenho que ficou no quadro foi a figura que
representava um coração. Perguntei por que não apagaram aquele desenho.
Responderam que o coração não era algo aparente, palpável e que para descobrir
seu funcionamento não bastava olhar, precisava aprofundar-se para compreender seu
mecanismo.
O fato de terem deixado esta figura serviu para iniciarmos as discussões sobre
a importância da pesquisa na formação de professores e para lhes dizer que aqui
estava o ponto de partida para uma investigação. Isto é, uma pesquisa se faz na busca
de encontrar aquilo que não está aparente, que precisa ser investigado, descoberto
para criar corpo e forma. Só existe pesquisa se houver perguntas a serem
respondidas. E a pergunta se fez: O que vocês querem investigar na feitura do TCC?
Mas, isto seria o tema da próxima aula.
Foi dessa forma singular, que comecei minha prática docente no curso de
Licenciatura em Matemática, da Universidade Federal do Pará, no Campus
Universitário de Castanhal, estimulando e provocando os estudantes a realizarem
pesquisa.
A prática de fazer uso da pesquisa foi obtida durante o mestrado, que se deu
em grande parte, por me estimular a fazer pesquisa sobre a formação de professor e
isso eu trouxe para a minha prática docente. Desta forma, a pesquisa passou a ser
um dos recursos metodológicos frequentemente utilizados para ensinar. O meu
desafio maior passou a ser não só de mediar o ensino, mas principalmente o de
provocar os estudantes a fazerem pesquisa e aprenderem pela construção do
conhecimento, a partir da problematização da realidade.
Neste exercício desafiador, encontrei minha identidade de professora-
formadora, pois é na relação com o objeto que construímos nossa identidade
(CHEVALLARD, 1985). O processo de construção de minha identidade profissional
decorreu da concepção do trabalho docente, da relação com a profissão e da
convivência no contexto social em que desenvolvo minha prática.
44
Para Blin (1997), o contexto social onde se desempenha determinada profissão
é fundamental para a consolidação da sua identidade profissional. A identidade
profissional pode ser entendida como [...] algo em construção, com base nos sentidos
que os sujeitos vão produzindo na condição singular em que se encontram inseridos
em suas trajetórias de vida e em suas diferentes atividades e formas de relações
(SCOZ, 2011, p. 28).
Dubar (2000) sinaliza que a identidade profissional é um fenômeno complexo,
produto dos mecanismos de socialização secundária do indivíduo e que apresenta
continuidades e descontinuidades, com o que designa por identidade herdada do
sujeito e como identidade atribuída ao sujeito pelos outros. Neste sentido, identidade
profissional será sempre forjada num jogo de interações sociais, onde o contexto
organizacional, as características biográficas do indivíduo e os seus percursos
formativos desempenham um papel fundamental.
Desta forma, o olhar que faço hoje é de dentro para fora. Esse olhar me deixa
ver as mudanças ocorridas não só no meu jeito de ser, mas principalmente no meu
modo de mediar o ensino. Todos os dias, ao me dirigir à sala de aula tenho um único
pensamento: hoje vou fazer melhor do que ontem. Essa preocupação sempre esteve
presente desde o primeiro momento de meu ingresso como professora-formadora no
curso de Licenciatura em Matemática. Por ser uma Pedagoga de formação, não fui
bem aceita pelos professores da chamada “linha dura”, que tinham um olhar de pouco
caso, de superioridade, que por serem formados em Matemática acreditavam que
podiam comportar-se como “semideuses” e subjugar aqueles que tinham formação
em outra área.
Sentia a hostilidade desses professores, especialmente quando colocava meus
posicionamentos em momentos de discussão. No entanto, não me via diferente deles.
Apesar de não ter uma formação específica na área da Matemática, via-me como uma
educadora, ou melhor dizendo, como uma educadora Matemática, que na
conceituação de Fiorentini e Lorenzato (2009, p. 4):
[...] é aquele que realiza seus estudos utilizando métodos
interpretativos e analíticos das ciências sociais e humanas, tendo
como perspectiva o desenvolvimento de conhecimentos e práticas
pedagógicas que contribuam para uma formação mais integral,
humana e crítica da formação do aluno e do professor.
45
Posso afirmar, tomando como base a conceituação dos autores, que ser
educador matemático é chamar para si a responsabilidade de se fazer compreender
pelos estudantes no sentido de mediar a formação não como algo burocrático, tedioso
e sem atrativos, mas de maneira prazerosa e motivacional. Dessa maneira
evidenciando que a formação em Matemática não se resume aos números, mas da
soma de vários elementos didáticos (ensino, aprendizagem, metodologia, mediação,
avaliação, instrumentos) e conceituais (teorias, conhecimentos, conteúdos,
pensamentos, ideias, dentre outros). Esse, mediados pelo professor formador,
subsidiam a formação com vistas a preparar o professor para o exercício docente,
considerando inclusive o enfrentamento de todos os dilemas (salas superlotadas,
escolas sucateadas, professor mal remunerado, entre outros), que são comuns à
profissão em uma dada cultura.
Portanto, apesar desse clima hostil encontrado inicialmente em meu ambiente
de trabalho, não me deixei intimidar e fui aos poucos conquistando meu espaço junto
àqueles que realmente me importava: os estudantes do curso de Licenciatura em
Matemática, afinal estava ali naquele lugar por eles e para eles. E da minha vivência
com as dez turmas do curso, fui absorvendo tudo aquilo que demandava dos
estudantes tanto ao que se refere à identidade de querer ser um professor de
Matemática, quanto à insatisfação, frustação, desapontamento, indignação entre
outras situações que eram vividas por esses estudantes durante a formação inicial na
Licenciatura em Matemática.
Estes fatos levaram-me de volta a um tempo, quando vivenciei todas essas
situações no período da formação na Licenciatura em Pedagogia. Não diferente
desses estudantes, minha formação inicial também ocorreu neste Campus
Universitário e também vivenciei a não compreensão das informações que me eram
passadas, pois em dados momentos elas me pareciam utópicas e distanciadas
demais da realidade em que desenvolvia minha prática.
Essa percepção levou-me a aceitar, algum tempo depois, o convite para
assumir, inicialmente a vice direção e, posteriormente, a direção da Faculdade de
Matemática, em que tive a oportunidade de experienciar o lado burocrático da
administração. Momento esse que me permitia sentir o antagonismo da formação
inicial de professores, dada às questões-problemas (professores-formadores que não
46
ministravam suas aulas, subestimavam a capacidade de aprender dos estudantes,
especialmente das meninas, professores-formadores que tinham prazer em reprovar
90% da turma, professor-formador estrela – eu já sei, se vira para aprender –,
conteúdos distanciados da realidade do professor em formação etc.), que se
desenhavam no dia a dia da sala de aula.
Durante o exercício da função de diretora da Faculdade de Matemática, ficava
a observar o marasmo das aulas ministradas por professores, especialmente de
professores de área específica. Observava que os estudantes vinham para a sala,
assistiam à aula e iam embora. Isto era muito pouco para quem quer formar
professores para a Educação Básica. Era preciso fazer mais. Havia certo
distanciamento entre os estudantes e os professores formadores. Alguns sequer
sabiam a área dos professores formadores, o que esses professores pesquisavam.
Com isto, os estudantes não sabiam como se aproximar para começar uma relação
para futuras orientações de Trabalho de Conclusão de Curso – TCC.
Havia, portanto, a necessidade de promover maior proximidade entre
professores-formadores e os estudantes por meio de eventos em que ambos
pudessem ser envolvidos como ocorreu na I Mostra de Pesquisas em Pós-Graduação:
socializando saberes investigados, momento em que todos os professores da
faculdade apresentaram as pesquisas realizadas por eles nos cursos de mestrado e
doutorado. Também na I Mostra de Projetos em Matemática: integrando Ensino,
Pesquisa e Extensão na Formação de Professores, quando os estudantes em fase de
conclusão de curso apresentaram suas intenções de pesquisa para a feitura do
trabalho de conclusão de curso. Momento em que houve grande debate sobre o tripé
que sustenta a universidade: o ensino, a pesquisa e a extensão.
Ainda na perspectiva de promover a integração entre professores formadores
e os estudantes, a Faculdade de Matemática foi organizando o IV EPAMM – Encontro
Paraense de Modelagem Matemática. Evento em que conseguimos reunir mais de
quatrocentas pessoas de vários municípios do estado, que vieram participar do
evento. Todas essas ações foram pensadas na perspectiva de fazer da formação de
professores de Matemática um processo que vai além de depositar conteúdos, que a
universidade é muito mais do que sala de aula, quadro e giz.
Todas as questões relacionadas ao ensino, aprendizagem, pesquisa, extensão
aqui abordadas instigaram-me a realizar pesquisa para encontrar meios de contribuir
47
com a melhoria do contexto ora apresentado. Foi dessa forma que ocorreu meu
encontro com o problema de pesquisa doutoral.
Encontrando-me com o problema da pesquisa... escuta sensível
Para a realização de uma pesquisa sempre é essencial que haja uma
motivação que impulsione e leve a enfrentar os desafios na perspectiva de encontrar
respostas para as nossas indagações.
A formação inicial de professores de Matemática tem sido, ao longo dos últimos
anos, minha maior motivação para realizar pesquisas que tragam respostas as minhas
inquietações no que se refere à formação de professores de Matemática. Essas
inquietações surgem das escutas, das conversas e das angústias sentidas ao ouvir o
professor em formação anunciar que o que ele aprende (quando aprende) no curso
de Licenciatura em Matemática não tem significado. Ou seja, não atende a suas
necessidades formativas no desenvolvimento profissional, para atendimentos futuros
aos alunos que nascem e vivem em uma realidade que está distanciada daquilo que
lhe foi ensinado e/ou que aprendeu na formação inicial. A escuta sensível aqui referida
[...] é própria do pesquisador, se apoia na empatia. O pesquisador deve saber sentir
o universo afetivo, imaginário e cognitivo do outro para buscar compreender de dentro,
suas atitudes, comportamentos e sistema de ideias, de valores, de símbolos e de
mitos (FRAIHA-MARTINS, 2014, p. 36).
Essas escutas levaram-me a fazer reflexões acerca de minha prática docente
e ficava me perguntando: Como formar um professor de Matemática para desenvolver
uma prática docente na Educação Básica? O que fazer para mudar a condução desse
processo formativo? Eu não conseguia aceitar o comportamento da maioria dos
estudantes que se deixavam subjugar pelos professores formadores ao aceitarem ser
tratados como não salvos. Expressão usada por alguns professores formadores da
“linha dura”, para denominar os estudantes em formação que já ficavam reprovados
em disciplinas optativas ofertadas no primeiro semestre do curso, em que numa turma
de 50 estudantes somente 15% a 20% conseguiam aprovação. Estes eram
denominados de “salvos”, um comportamento totalmente antipedagógico, no meu
modo de ver.
48
Ao inquietar-me com estas situações, dizia a mim mesma: alguém precisa
dizer-me o que fazer? Como fazer? Seguindo o exemplo do Senhor Palomar
(CALVINO, 1994), que ao contemplar as ondas à beira da praia pensou: [...] não são
"as ondas" que pretendo observar, mas uma simples onda e pronto (Ibid., p. 7). Foi
com este pensamento que determinei aquilo que iria observar. No entanto, não se
pode observar uma parte sem considerar o todo. De acordo com o senhor Palomar,
[...] não se pode observar uma onda sem levar em conta os aspectos complexos que
concorrem para formá-la e aqueles também complexos a que essa dá ensejo (Ibid., p.
11).
Preciso voltar meu olhar para a questão principal deste processo: formar
professores de Matemática. Para tanto, deveria aproximar-me daqueles que já haviam
passado por este processo e que poderiam sinalizar questões que estariam
diretamente relacionadas aos aspectos positivos, negativos e às lacunas de formação
inicial em Matemática. Neste sentido, essa proximidade deveria ocorrer com os
professores de Matemática que desenvolvem suas práticas docentes nas escolas
públicas da Microrregião do Salgado.
A escolha da Microrregião do Salgado é pertinente, por ser desta microrregião
o maior contingente de estudantes que ingressam nos cursos de Licenciaturas em
Matemática no Campus Universitário de Castanhal e porque é o meu contexto de
atuação profissional. Portanto, eram esses egressos que eu deveria ouvir, na
perspectiva de obter informações que certamente iriam contribuir para fazer melhorias
no processo de formação inicial de professores de Matemática.
Além das questões acima, outra indagação a ser feita em relação ao processo
de formação de professores está situada no que aponta Silva (1999), que se refere à
importância de saber qual conhecimento deve ser ensinado e aprendido nos cursos
de formação inicial. Considerando, dessa maneira, que a divisão disciplinar que está
presente nas propostas curriculares trabalhadas nas instituições formadoras tem
contribuído para a fragmentação do conhecimento.
Neste processo de indagação tenho a compreensão de que os cursos de
formação inicial de professores precisam e devem ser embasados tanto no
conhecimento que vai constituir-se quanto nas identidades que serão constituídas.
Pois o desenho curricular de um curso de formação (SILVA, 1999), além de uma
questão de conhecimento, é também uma questão de identidade, posto que:
49
[...] pensar a identidade exige pensar também a diferença. Identidade
e diferença configuram entidades inseparáveis e mutuamente
determinadas, o que implica rejeitar a perspectiva que toma uma como
origem da outra. Essa afirmativa pode ser justificada: é por meio da
relação com o outro que nossa identidade se produz. Ao compartilhá-
la com outros, estabelecemos o que nos é próprio, o que nos distingue
dos demais. A marca da diferença, assim, está presente no processo
de construção de nossa identidade (SILVA, 1999, p. 8).
Neste pensar, o autor provoca-nos a refletir sobre o reconhecimento das
diferenças (de gênero, étnico-raciais, religiosas etc.) presentes no cotidiano das
instituições formadoras e que se articulam nas conhecidas “grades curriculares”, que
expressam claramente na sucessão do conteúdo a ser ensinado e aprendido,
independente de quem aprende ou como aprende.
Corazza (2001) assinala que é importante ter um olhar mais atento sobre o que
realmente o desenho curricular de um curso de formação quer quando delimita os
conhecimentos a serem ensinados por professores-formadores em suas salas de aula
aos estudantes, que já trazem um conhecimento que não está sistematizado em
nenhum programa de formação. Apenas traz consigo aquilo que vê, ouve e vivencia
com seus pares, nos espaços em que transita.
Esse conhecimento confronta-se com os saberes sistematizados baseados nos
livros didáticos, nos planos de aula e nos desenhos curriculares, que estão postos
pelos sistemas de ensino. Portanto, deve-se pensar em uma proposta de formação
de professores para a Educação Básica, que considere a pluralidade de concepções,
tendências, referenciais, teorias pedagógicas e metodológicas, bem como a
experiência prática no ensino e na atuação em contextos escolares e não escolares.
Todos esses aspectos abordados pela autora são relevantes na busca do
entendimento de como as propostas dos cursos de formação se desenham, como
estas se efetivam e como são mediadas no interior das salas de aulas. Isto porque a
vida cotidiana revela-se local privilegiado de contradição, em que constituem e
(re)definem a realidade, as possibilidades de sua interpretação e as alternativas para
uma intervenção. Portanto, [...] trazer a vida cotidiana para o cenário de formação,
significa colocar o foco sobre os professores, professoras, alunos e alunas que dão
visibilidade à sala de aula (OLIVEIRA, 2006, p. 44).
50
Michel Certeau (1998) estuda essa produção cotidiana de saberes que buscam
evidenciar os processos pelos quais os “praticantes da vida cotidiana” burlam e usam
de modo “não autorizado” as regras e produtos que os poderosos lhes impõem. É
nesses grupos que vamos identificar os professores de Matemática que estão nas
escolas, sendo criticados e desvalorizados pelas chamadas “autoridades
educacionais”.
Ainda para o autor, essas autoridades criam “maneiras de fazer”, tecendo redes
de ações reais, que não são e não poderiam ser meras repetições de uma ordem
social, de uma proposta curricular ou de formação pré-estabelecida e explicadas no
abstrato. Os professores que estão nas escolas tecem redes de práticas pedagógicas
que, através de “usos e táticas” de praticantes que são, inserem na estrutura
social/curricular criatividade e pluralidade, modificadores das regras e das relações
entre o poder instituído e a vida dos que a eles estão, supostamente, submetidos.
Oliveira (2006) comunga desse pensamento, apontando a riqueza da vida
cotidiana bem como a importância de torná-la foco de nossas atenções e acrescenta:
[...] é fundamental reconhecer que em seus fazeres cotidianos, os
professores estão não apenas modificando suas práticas em virtude
das circunstâncias de cada momento, mas, também em processo de
formação continuada, seja como “auto formação”, por meio de seus
próprios processos de reflexão, seja como formação continuada,
através da interação com os colegas, obras e autores da área ou de
cursos formais de “reciclagem” (p. 46).
Dessa forma, a prática docente aparece, portanto, como espaço privilegiado de
produção de conhecimentos para além do estabelecido nas propostas oficiais e,
sobretudo, como importante espaço de formação, especialmente no que se refere às
formas criativas e particulares pelas quais professores e professoras buscam para
desenvolver os processos de ensino-aprendizagem de seus alunos, pois:
[...] cada forma nova de ensinar, cada conteúdo trabalhado, cada
experiência particular só pode ser entendida junto ao conjunto de
circunstâncias que os torna possível, o que envolve a história de vida
de sujeitos em interação, sua formação e a realidade local específica,
com as experiências e saberes anteriores de todos, dentre outros
elementos da vida cotidiana (OLIVEIRA, 2006, p. 46/47).
51
Observa-se no pensamento da autora que o cotidiano é um ambiente rico de
elementos que são singulares e se constituem das vivências dos sujeitos. Portanto,
nenhuma proposta de formação de professores deve ser pensada e elaborada sem
que essas singularidades sejam levadas em consideração.
Neste sentido, a formação inicial deve ser compreendida como processo cuja
meta é munir o profissional para encontrar soluções práticas, adequadas às vivências
em ambiente de prática, considerando que essa preparação situa-se entre as
perspectivas macro e micro curriculares, em diversos contextos, que correspondem a
diferentes fases e etapas de concretização.
Portanto, compreender os processos de formação inicial, reais e complexos
que existem nos sistemas de ensino superior e nas práticas dos professores
formadores de cada instituição formadora é um desafio que se posta aos
pesquisadores da área, na medida em que investigar sobre, nos leva a um território
desconhecido. No entanto, é preciso e necessário aprender mais sobre as propostas
contidas nos cursos de formação inicial. Na perspectiva de traçar caminhos que
conduzam à inserção de saberes significativos e que permita perceber a importância
de uma formação para além do reducionismo dos desenhos curriculares e das
programações tecnicamente definidas.
Assim, é imprescindível visualizar o todo da ação formativa. Pois entendo que
a concepção curricular que norteia a condução do curso de formação inicial de
professores de Matemática do Campus Universitário de Castanhal deve ter a
preocupação de traçar o perfil desse conjunto de sujeitos. Respeitando, dessa
maneira, sua pluralidade com vistas a prover o professor de Matemática para uma
prática docente significativa e singular do lugar de cada um. Lugar esse que se
constrói nas/das vivências sociais, históricas, culturais, na ação de fazer, de saber
fazer, do aprender e do ensinar conhecimentos matemáticos.
Desta forma, pensar no problema de investigação deve levar o pesquisador a
situar-se no processo de modo a permitir fazer [...] uma análise crítica do estado atual
do conhecimento em sua área de interesse, comparando e contrastando abordagens
teórico-metodológicas utilizadas, de modo a identificar pontos de consenso, bem
como controvérsias, regiões de sombra e lacunas que merecem ser esclarecidas.
(MAZZOTTI, 1994, p. 27). Essa imersão contribui para que o pesquisador consiga
52
definir melhor seu objeto de investigação e, consequentemente, selecionar teorias,
procedimentos e instrumentos visando facilitar o processo de busca do conhecimento
pretendido.
Portanto, o problema desta pesquisa doutoral está situado nos saberes
docentes de professores de Matemática da Microrregião do Salgado e perspectiva
trazer significativas contribuições para que mudanças ocorram visando minimizar as
lacunas de formação inicial de professores de Matemática. Isto, com projeções futuras
de propor melhorias na reformulação do PPC do curso de licenciatura em Matemática.
Assim como, da criação de grupos de estudos na área de formação de professores e
de projetos de extensão para atendimento aos profissionais da educação.
Dessa forma, este visitar a memória contribuiu para a compreensão de como
me tornei uma professora e transformei minhas práticas docentes a partir das
travessias de formação inicial e permanente. Esse tempo de travessia levou-me a
fazer um olhar de fora para dentro e compreender que as limitações da formação
devem ser consideradas como elementos constitutivos desse processo. São bastante
necessárias à medida que se transformam em instrumentos de reflexão para um
crescimento tanto intelectual quanto profissional.
Epílogo desta Seção
Nesta primeira seção rememorei parte de minha infância, de meu percurso de
formação e minha trajetória profissional. Revisitar o tempo vivido se deu das minhas
memórias e que por serem por mim lembradas, fazem parte das minhas verdades.
Considerando que [...] não existe a tal verdade verdadeira, ela é um sonho, pura ficção
(VEIGA-NETO 2002, p. 15), as minhas verdades vão ser sempre verdades provisórias
ou temporárias.
Se essas verdades são provisórias, isto quer dizer que sempre haverá tempo
para que as minhas verdades se construam e se reconstruam, para que outras
verdades se estabeleçam. Razão pela qual é aconselhável ter a humildade
epistemológica de ver, compreender e aceitar novas verdades.
Desta forma, minha memória foi capaz de contar parte da história do tempo
vivido. Na contação desta história, comungo das ideias de Magda Soares (1991), ao
considerar que quando contamos nossa história:
53
[...] vamos bordando a nossa vida, sem conhecer por inteiro o risco;
representamos o nosso papel, sem conhecer por inteiro a peça. De
vez em quando, voltamos a olhar para o bordado já feito e sob ele
desvendamos o risco desconhecido; ou para as cenas já
representadas. (p. 25).
Ao sair do argumento memorialístico que me levou a contar um pouco de minha
história e trajetória profissional, entro no cenário da investigação - a Microrregião do
Salgado - que representa o todo da ação investigativa, sem, contudo, desprezar as
partes desse contexto. É o que vai discorrer a próxima seção.
54
2. Cenário da investigação
“Sou um pouco de todos que conheci, Um pouco dos lugares que fui,
Um pouco das saudades que deixei E sou muito das coisas que gostei”.
(Antoine de Saint-Exupéry).
O lugar em que passamos a interagir durante certo tempo, não deve ser visto
apenas como uma porção do espaço ou um ponto imaginário, em uma coordenada
espacial percebida e definida pelo homem, por meio de seus sentidos. Mas é ter esse
lugar como parte do ambiente em que convivemos e interagimos com pessoas, com
a cultura, com os costumes e com as crenças. Ou ainda, como algo que consolida
coisas que se constroem e são construídas nesse lugar, que vão se aderindo às
próprias características que lá estão situadas.
Quando esse lugar é o espaço que escolhemos para servir de cenário para
realizar uma pesquisa há, de certa forma, uma atração que vai além do aspecto
investigativo e se posta ao emotivo. Isto, quando nos deixamos envolver pela beleza
e pela feição de cada ponto observado e de cada imagem construída.
Nessa vivência ocorre um processo de intensa troca, em que o interesse a priori
perde o status principal para ser ocupado por outras relações. Estas só são percebidas
ao se anunciar a saída do lugar que inicialmente forneceria apenas aquilo que de lá
fosse possível saber. Portanto, o lugar que serviu de cenário para esta investigação
é, sem dúvida, um ambiente que tem seus encantos pelas próprias características de
ser um espaço que reúne beleza e riqueza natural. Isto faz da Microrregião do Salgado
um cenário envolvente e acolhedor.
Assim, nesta seção, faço a contextualização do cenário onde desenvolvi a
investigação. Descrevo algumas das características gerais do Estado do Pará, como
forma de situar dentro deste universo, os aspectos relevantes sobre as dimensões
continentais do estado. Assim como o desenvolvimento econômico, cultural, ambiental
e educacional, perpassando pela Universidade Federal do Pará, pelo Campus
Universitário de Castanhal e pela Faculdade de Matemática. Ambientes que fazem
55
parte deste cenário, pois estão diretamente envolvidos na formação dos professores
de Matemática da Microrregião do Salgado.
Aspectos socioculturais do cenário
O Estado do Pará tem características10 que lhe são próprias pela mistura de
ritmos, raças, costumes e crenças que nascem, se desenvolvem e convivem
harmoniosamente neste lugar. O estado é povoado por pessoas de várias regiões do
país. Sua população miscigenada é formada a partir de índios, negros e descendentes
de imigrantes asiáticos e europeus. Na sua formação, o estado teve um elevado
número de imigrantes portugueses, espanhóis, italianos e japoneses, além das muitas
influências africanas e indígenas.
O Estado do Pará insere-se na Amazônia Oriental, sendo cortado pela linha do
Equador no seu extremo norte. Está situado na região Norte do Brasil, na maior
floresta tropical do mundo, abriga uma fantástica diversidade de recursos naturais.
Tem dimensões continentais, sendo um dos maiores estados da Região Norte,
corresponde a 1/4 da Amazônia Legal, com uma extensão territorial de 1.247.950,003
quilômetros quadrados que corresponde a 14,66% de todo o território brasileiro, onde
estão localizados os seus 144 municípios.
Esses municípios dividem-se em Mesorregiões, que se subdividem em
Microrregiões. Desta forma, o estado está dividido em seis Mesorregiões: Baixo
Amazonas composta por 15 municípios; Belém com 11 municípios; Marajó com 27
municípios; Nordeste com 38 municípios; Sudeste com 39 municípios, sendo a maior
mesorregião e Sudoeste com 14 municípios.
Essas mesorregiões estão subdivididas em cinco Microrregiões: Bragantina,
Cametá, Guamá, Salgado, Tomé-Açu. Essa extensão territorial faz do Pará, o
segundo maior estado do Brasil e está inserido na planície amazônica. A Microrregião
do Salgado, lugar em que desenvolvemos a pesquisa de campo é composta por onze
municípios. De acordo com Pará (2014), os 11 municípios limítrofes com o Oceano
Atlântico, que compõem a Zona Fisiográfica do Salgado são: Colares, Curuçá,
Magalhães Barata, Maracanã, Marapanim, Salinópolis, São Caetano de Odivelas, São
João da Ponta, São João de Pirabas, Terra Alta e Vigia.
10 Dados extraídos de: http:/wikipedia.or/ki, acessado em 20/05/2015
56
O nome Pará originou-se do tupi, ‘pa rá’ que significa ‘mar’, designação do
braço direito do Amazonas, que ao confluir com o rio Tocantins alarga-se muito
parecendo o mar. Daí veio a denominação da capitania do Grão-Pará, estabelecida
em 1616. Esta, em 1823 tornou-se a província do Pará e, com a Proclamação da
República, em 1889 passou a denominar-se estado do Pará (GONÇALVES, 2006).
O estado é o mais populoso da região norte, com 7,9 milhões habitantes.
(Contagem populacional realizada pelo Instituto de Geografia e Estatística – IBGE em
2013). A maioria da população reside em áreas urbanas (68,5%), na zona rural habita
31,5% da população paraense. A densidade demográfica é de 6,07hab/km², o que
demonstra que o estado é pouco povoado. Quanto à distribuição da população
segundo o sexo, 49,6% são mulheres e 50,4%, são homens. (IBGE, 2010).
A história da colonização do Estado do Pará tem início em 1616, pelos
portugueses com a construção do Forte do Presépio na baía de Guajará. Dando
origem posteriormente, à cidade de Belém, atual capital do estado. Conforme dados
da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), o território do Pará concentra 34 etnias
indígenas, espalhadas em 298 povoações, totalizando mais de 39 mil índios. Também
possui comunidades negras remanescentes de antigos quilombos.
A capital do estado, Belém, reúne em sua região metropolitana cerca de 2,1
milhões habitantes, sendo a maior população metropolitana da região Norte. Outras
cidades importantes do estado são Abaetetuba, Altamira, Ananindeua, Barcarena,
Castanhal, Itaituba, Marabá, Parauapebas, Redenção, Santarém e Tucuruí.
O desenvolvimento econômico do Estado do Pará efetiva-se a partir do
diagnóstico do espaço para a produção de políticas públicas e considera seis
questões essenciais: a dimensão geográfica; a baixa densidade demográfica; a rede
urbana, com enormes distâncias de acesso; a história econômica com base no
extrativismo florestal; os novos investimentos como o agronegócio, a verticalização da
produção mineral e a questão político-institucional, que tem reflexos na economia do
estado, tendo como principais atividades o extrativismo, a agricultura, a pecuária e a
indústria.
Segundo dados da Companhia de Desenvolvimento Econômico do Pará –
CODEC, o Pará destaca-se no crescimento industrial, apresentando em 2015 a
melhor colocação na avaliação de risco para investimento entre os estados brasileiros.
57
Este crescimento aponta o estado como maior produtor de minérios (bauxita,
manganês, cobre, caulim e ferro) do Brasil a partir de 2017.
No que se refere ao agronegócio, o Pará tem características favoráveis por
possuir clima adequado, solo fértil, grande incidência de luz e abundância de água,
ideal para a cadeia de grãos. Nos polos de Paragominas, Santarém e Santana do
Araguaia foram produzidos em 2015, 900 mil toneladas de soja, e 600 mil de milho.
Vale destacar que esses polos têm potencial para a produção de 900 milhões de
toneladas de soja por ano.
Além da produção local é escoada pelos portos paraenses uma média de 30
mil toneladas de soja vinda de Mato Grosso, cenário oportuno para a instalação de
indústria de óleo vegetal e proteína animal. Ainda sobre o agronegócio, o Pará é o
maior produtor nacional de dendê, biocombustível e óleo de palma. Em estimativas
feitas pela CODEC, em 2017, o estado será o primeiro produtor de cacau do Brasil.
O estado do Pará também se destaca como sendo o maior produtor de açaí do
Brasil. Somente em 2015 foram produzidos um milhão de toneladas. O açaí deixou de
ser consumido somente pelos paraenses, pessoas de fora do estado e até de outros
países consomem o açaí, razão essa que tornou a iguaria nacional e
internacionalmente conhecida.
Como obra prima da Amazônia, o Pará possui uma variedade de atrativos
naturais e culturais e oferece inúmeras oportunidades de negócios, moveleiro,
restaurante, parques temáticos e resorts. Em 2015, a capital, Belém recebeu o título
internacional de Cidade Criativa da Gastronomia, concedido pela UNESCO. Dessa forma,
a capital paraense torna-se referência mundial em gastronomia e passa a integrar uma
rede de cidades que buscam desenvolvimento de maneira sustentável e de modo
socialmente justo.
O Pará tem o maior potencial hidroviário da região. Com 62% do total de água
da Amazônia, além de 20 mil quilômetros navegáveis. Possui também, uma extensa
malha rodoviária que liga o Pará ao resto do Brasil, principalmente pela BR 163, a
Cuiabá-Santarém e da BR158 que atravessa sete estados.
Na agricultura o Pará destaca-se como o maior produtor brasileiro de dendê,
de mandioca e de pimenta-do-reino. O estado é o segundo maior produtor de abacaxi
do país. Nas regiões de terra firme, são cultivadas principalmente, a mandioca e a
58
pimenta-do-reino, cujo estado é o maior produtor nacional. Nas regiões de várzea,
onde o solo é mais rico, são cultivados o arroz, a juta, o feijão, o milho e o coco-da-
baía, além de outros produtos como a laranja, cacau, café, cana-de-açúcar, banana e
feijão.
É o estado com a maior criação de bubalinos do Brasil, em sua maioria, criados
na ilha de Marajó e o quinto maior rebanho de bovino. Os rebanhos de bovinos e
suínos são encontrados principalmente na região sudeste do estado com
aproximadamente 14 milhões de cabeças de gado. Existem ainda criações de aves,
ovinos e equinos. A pecuária é mais desenvolvida na porção sudoeste do Pará.
A produção industrial do estado se concentra quase que totalmente nos
arredores da capital, Belém. As principais atividades industriais estão relacionadas ao
setor alimentício, madeireiro, químico e minerais não metálicos. Os produtos
produzidos de maior destaque são as bebidas, o cimento e os tecidos de juta. Apesar
da grandeza e da riqueza do estado, alguns alimentos como frutas, grãos e laticínios
ainda são importados de outros estados para suprir a necessidade da população
paraense.
Apesar dos programas de incentivo, a exemplo, Programa de Municípios
Verdes, que estimula a produção com responsabilidade ambiental e social, reduzindo
o desmatamento na região. De acordo com o PDI 2011-2015, o estado do Pará
continua apresentando uma dinâmica de desorganizações socioambientais. Estas são
marcadas pela ocupação desordenada e caótica, que tem resultado em degradação
de seus recursos naturais e empobrecimento social. Desta feita, a [...] extração de
ferro e outros provenientes da exploração mineral, com apoio estatal, atraem grandes
investimentos em infraestrutura, sem, contudo, sinalizar para a sustentabilidade do
desenvolvimento de longo prazo (p. 32). Isto tem provocado danos ao meio ambiente
e merecido atenção e cuidados no desenvolvimento de um planejamento ambiental,
capaz de descobrir formas sustentáveis de aproveitamento econômico dos recursos
naturais.
No entanto, a cultura do desmatamento ainda é prevalecente pela rentabilidade
a curto prazo, porém expressa um modelo de desenvolvimento que tem se revelado
ecologicamente depredador, socialmente perverso e politicamente injusto. É
importante a proposição de uma lógica econômica e ecológica que remunere os
59
serviços ambientais de proteção florestal, com vistas a preservar o ecossistema em
toda a sua diversidade.
Afastando-me das características que tratam dos aspectos culturais,
econômicos e ambientais, considero relevante fazer referências aos aspectos
educacionais, centrando a atenção na Microrregião do Salgado onde se desenvolveu
esta pesquisa.
Para compreender a Educação no Estado do Pará
O desenvolvimento educacional de um determinado contexto está
condicionado a fatores espaciais e temporais que interferem direta ou indiretamente
nesse processo. Desta forma, o crescimento de um país depende do crescimento dos
estados, que por sua vez, dependem do crescimento de suas regiões. Porém, o
crescimento de uma determinada região não poderá ocorrer de forma plena, se suas
singularidades, potencialidades e peculiaridades não forem consideradas nesse
processo. Portanto, para que esse desenvolvimento ocorra, necessariamente deve-
se conhecer as características próprias de cada região, na perspectiva de reconhecer
as transformações dos cenários urbano e rural decorrentes desse desenvolvimento.
Para compreender a educação no Estado do Pará lançamos um breve olhar
para o desenvolvimento educacional na perspectiva de compreender suas
especificidades, pois dada a extensão territorial e a diversidade cultural, esse
desenvolvimento pode ser determinado pela cultura local ou pelo processo de
aculturação.
Os estudos realizados por Silva (2015), que traz dados sobre a Educação no
Estado do Pará, sinalizam que na educação do estado o processo de aculturação e
de assimilação se dá da mesma forma. Ou seja, o contexto e o modo de formação
podem determinar a orientação de práticas de professores que atuam ou atuarão
nesse contexto.
Nesse sentido, esse processo assinala as mudanças que podem ocorrer em
uma sociedade por meio da composição de elementos culturais externos, que
decorrem da interação social e do contato entre culturas e não somente da
sobreposição de uma cultura a outra. No Estado do Pará esse processo é fortemente
marcado pela pluralidade de indivíduos que habitam este lugar, oriundos de diversas
60
culturas e acabam trazendo para cá culturas diferenciadas, que ocorrem em períodos
históricos distintos, dependendo apenas da existência do contato entre culturas
diversas. No entanto, a aculturação não tira totalmente a identidade social de um povo.
Suas singularidades e potencialidade são mantidas, interferem e direcionam os
aspectos educacionais de uma determinada sociedade.
No caso da Microrregião do Salgado a cultura está associada às práticas da
pesca artesanal de subsistência de pequena escala. Esta, sem fins lucrativos,
realizada por pescadores autônomos, que fazem uso de ferramentas relativamente
simples como a feitura de redes, de currais e a construção de barcos para a captura
do pescado.
A cultura da pesca e da agricultura da Microrregião do Salgado tem relação
direta com a educação, pois as escolas são povoadas por filhos e/ou parentes de
pescadores, agricultores e comerciantes que fazem a formação escolar nas 867
escolas localizadas nos 11 municípios da Microrregião do Salgado. Nessas escolas
são ofertadas as modalidades de ensino que corresponde a Educação Básica, ou
seja, Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, como podemos
observar no quadro 1.
QUADRO 1 – Número de Escolas Públicas na Microrregião do Salgado
Município Número de Escolas Públicas por nível de Ensino
Educação Infantil Ensino Fundamental Ensino Médio
Colares 23 35 06 Curuçá 58 74 03
Magalhães Barata 17 28 01 Maracanã 70 87 01
Marapanim 46 53 02 São Caetano de Odivelas 31 39 01
São João de Pirabas 28 30 01 São João da Ponta 12 11 01
Salinópolis 23 36 04 Terra Alta 13 17 02
Vigia de Nazaré 35 73 06
TOTAL 356 483 28
FONTE: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP/MEC Censo Escolar de 2012 – Acessado em Nov/2014
Ao longo dos últimos anos o setor educacional vem se desenvolvendo e a
população educacional da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e do Ensino
Médio dos municípios da Microrregião do Salgado somam hoje 76.177 estudantes,
61
que é considerado um contingente significativo como pode ser observado no quadro
2.
QUADRO 2 – Número de alunos matriculados nas Escolas Públicas - 2014
Municípios
Número de alunos matriculados por nível de ensino
Educação Infantil
Ensino Fundamental Ensino Médio
Colares 626 2.492 530 Curuçá 1.312 7.768 1.827
Magalhães Barata 321 1.791 440 Maracanã 1.098 6.768 1.444
Marapanim 918 6.031 1.669
São Caetano de Odivelas 591 3.445 1.005 São João de Pirabas 743 4.774 1.120 São João da Ponta 244 1.128 215
Salinópolis 1.382 8.415 2.111 Terra Alta 204 2.109 852
Vigia de Nazaré 1.641 9.336 2.148 TOTAL 8.759 54.057 13.361
FONTE: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP/MEC –
Censo Escolar de 2012 – Acessado em nov. / 2014
Essa população educacional passou nos últimos quatro anos pela avaliação de
desempenho e os índices de desenvolvimento educacional, segundo dados do
Instituto de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB.
Os resultados são satisfatórios, como se observa no quadro 3, pois esses
resultados têm alcançados os índices que foram estabelecidos pelas metas do
Ministério da Educação – MEC e certos municípios ultrapassaram essas metas.
QUADRO 3 – Índice de Desenvolvimento Educacional – IDEB
Municípios
Índices alcançados Metas esperadas
2007 2009 2011 2013 2007 2009 2011 2013
Colares 2,8 3,9 3,8 3,9 3,0 3,3 3,7 4.0
Curuçá 2,9 3,3 3,7 3,1 2,8 3,2 3,8 4.0
Magalhães Barata 3,2 3,4 4,0 3,4 2,8 3,1 3,5 3,8
Maracanã 3,2 4,2 3,9 4,0 2,7 3,1 3,5 3,8
Marapanim 2,7 3,0 3,8 2,9 2,4 2,9 3,3 3,6
Salinópolis 3,4 3,3 3,9 3,2 3,0 3,3 3,7 4,0
São Caetano 2,9 3,2 3,7 3,2 2,3 2,7 3,1 3,4
São João de Pirabas 3,0 3,4 3,7 4,0 2,7 3,2 3,7 4,0
São João da Ponta 2,7 3,0 - 4,4 2,4 2,7 - 3,4
Terra Alta 2,7 3,0 3,9 3,3 2,5 2,8 3,2 3,5
Vigia de Nazaré 3,3 3,5 4,3 3,4 3,1 3,5 3,9 4,2
FONTE: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP/MEC Acessado em Nov/2014
62
Observa-se que os municípios de Maracanã e São João de Pirabas apresentam
melhor desempenho, obtiveram média acima da meta estabelecida durante os quatro
anos em que o índice foi medido. Esses resultados do ponto de vista quantitativo são
satisfatórios. No entanto, o aspecto qualitativo pode estar situado nas alterações
significativas nos indicadores de fluxo como: taxas de aprovação, reprovação e
evasão, ficam pouco evidenciados nos indicadores de desempenho em exames
padronizados como o IDEB e outros.
Longe de exercer qualquer julgamento, esses resultados são surpreendentes,
considerando uma situação muito comum nos municípios da microrregião. No período
de safra dos cultivos produzidos (colheita da pimenta-do-reino, da laranja, do feijão ou
na fabricação da farinha de mandioca), muitos alunos abandonam as salas de aula
para juntarem-se aos seus pais e desta forma, contribuírem com a economia
doméstica. Nesse período, o ensino fica em segundo plano, a prioridade é a colheita.
Portanto, há um esvaziamento nas salas de aula e com a perda de conteúdo, de
provas ou qualquer outra ação a escola fica prejudicada.
No entanto, não cabe aqui fazer críticas a esse comportamento, pois essas
atividades são responsáveis pelo aumento da renda familiar. Essa cultura é
fortemente marcada pelo abandono escolar, levando crianças, jovens e adolescentes
a servirem de mão de obra em atividades braçais onde não há exigência quanto à
idade e nem escolaridade. Nos dois municípios (Maracanã e São João de Pirabas)
em destaque no Quadro 3, a secretaria municipal de educação tem adotado medidas
preventivas (mudando o período de férias, por exemplo) para evitar esse
esvaziamento, o que pode contribuir para justificar os resultados apresentados.
O fato de ausentar-se por um determinando período das atividades escolares
pode ocasionar a perda do interesse pela escola e esses alunos acabam por evadir-
se. Os alunos que retornam, permanecem na escola e avançam em sua formação
escolar, esses serão os futuros profissionais que estarão desenvolvendo suas
atividades em diversos segmentos do contexto social da microrregião ou fora dela.
Ser professor é uma dessas áreas de atuação, que tem levado jovens a
optarem pela profissão por ser uma área de fácil acesso ao mercado de trabalho e,
consequentemente, garantias de estabilidade econômica. Isto, além do status social
que é atribuído ao professor que atua nas escolas públicas da microrregião. Nesse
63
lugar comum da sala de aula, esse professor ganha notoriedade por ser ele, aquele
que pode representar a possibilidade de mudanças no contexto em que se insere.
No entanto, o quantitativo de professores licenciados na microrregião ainda é
considerado insuficiente para atendimento ao público estudantil. Fato este que as
vagas ofertadas nos concursos públicos, são preenchidas por profissionais que
residem em outros municípios. Esses profissionais após aprovados vêm ao município
somente nos dias de suas aulas (e quando vem). Conforme o desabafo da diretora de
uma escola pública estadual visitada durante a pesquisa de campo - esses
professores que vêm fazer concurso para o interior, só querem ocupar a vaga, não
querem trabalhar, só aparecem aqui de vez em quando. Acho isso errado, pois nossos
alunos continuam não tendo aula pela falta do professor.
Essa é uma situação comum nos onze municípios em que realizei a pesquisa
de campo. Visitei escolas em que havia muitas turmas sem professor e o número de
alunos que ficam pelos corredores chamou minha atenção. Em conversa com a
direção das escolas fui informada de que esses alunos ficam sem aula pela ausência
do professor, especialmente, o professor de Matemática que tem de cinco a seis aulas
por turno. Ele trabalha duas horas aulas por turma, então quando ele falta, são três
turmas que ficam sem professor. Neste caso, os alunos que já tem certa aversão da
disciplina, acabam por ficar desestimulados e os resultados são pouco exitosos, pois
ocorre maior número de reprovação e/ou de alunos que ficam em dependência de
estudo na referida disciplina.
O ensino da Matemática nas escolas públicas da Microrregião do Salgado
ainda é um problema para os dirigentes municipais que convivem com três situações.
Primeiro não realizam concurso público para a área e quando realizam as vagas são
ocupadas por profissionais que residem em outros municípios. Segundo, tentam
resolver o problema lotando profissionais de outras áreas (Física, Ciências Naturais)
do conhecimento para ensinarem Matemática. Por fim, contratam estudantes do curso
de Licenciatura em Matemática para suprir a ausência do profissional que tem uma
Formação Inicial em Licenciatura em Matemática. Apesar do avanço da formação de
professores pelo Plano Nacional de Formação de Professores para a Educação
Básica - PARFOR, ainda existem casos de professores leigos atuando em sala de
aula dos municípios investigados.
Para Gonçalves (2006):
64
Em muitos municípios ainda se faz presente a necessidade do professor leigo como alternativa e, muitas vezes, devido ao pequeno número de alunos por série ou a falta de disponibilidade de professores, há também a necessidade de classes multisseriadas (GONÇALVES, 2006, p. 66).
Essas questões são comuns nos municípios investigados, cada um deles tem
uma situação em particular, escolas funcionando em situações precárias não só por
falta de professores habilitados, mas também, pela carência de outros elementos
necessários para fazer do ensino uma ação responsável e de qualidade.
Ainda existem escolas em lugares inóspitos, funcionando de qualquer jeito, em
qualquer lugar. Normalmente são escolas multisseriadas, que funcionam na sala da
casa da professora, do líder comunitário ou em barracões das associações de
agricultores ou pescadores. Os alunos que compõem essas turmas multisseriadas, na
maioria das vezes estão em desnível idade/série e os professores que estão à frente
na condução dessas turmas, frequentemente têm como formação o Técnico em
Magistério, entre outras questões que são demandadas dessa realidade.
A formação inicial de professores de Matemática que desenvolvem suas
atividades docentes nas escolas da Microrregião do Salgado, a maioria é feita pelas
instituições públicas estabelecidas na cidade de Castanhal, que é a via de acesso
para esses professores. No município de Castanhal existem instituições públicas de
nível superior, que recebem o fluxo de estudantes que buscam uma formação inicial
em nível superior.
Formação Inicial de Professores de Matemática no Pará
No Cadastro Nacional de Cursos disponível no Sistema e-MEC existem 66
cursos de Licenciatura em Matemática, distribuídos por 30 municípios do Estado do
Pará. Dos quais, 29 (44%) funcionam em instituições públicas e 37 (56%) em
instituições privadas. Em relação à modalidade de oferta no Estado do Pará,
aproximadamente 31% do total de cursos de Licenciatura em Matemática são
oferecidos na modalidade presencial e 69% são ofertados à distância, conforme
mostra a Gráfico 1 a seguir.
65
Gráfico 1 - Cursos de Licenciatura em Matemática no Estado do Pará. Fonte: Sistema e-MEC do Ministério da Educação (2011)
Embora tenha sido verificado o crescimento da oferta de cursos de Licenciatura
em Matemática nos últimos anos, ainda há necessidade de expandir o número de
cursos pelo Estado do Pará. Haja vista que apenas 21% dos 144 municípios
paraenses ofertam cursos que formam professores de Matemática.
Segundo os dados do Educacenso de 2009 apontados no Quadro 4, observa-
se que 45,97% de professores da região Norte não tinha formação de nível superior,
considerado bem acima do percentual nacional de 32,19%. Esses dados confirmam a
necessidade de investir em cursos de licenciatura voltados para realizar a qualificação
em nível superior do grande contingente de docentes da Educação Básica da região
Norte.
Quadro 4 - Escolaridade de Professores da Educação Básica por Região/2009
Região
Professores da Educação Básica
TOTAL Escolaridade
Fundamental Médio Superior
Norte (Pará)
166.009 (70.783)
1.866 (741)
74.460 (38.996)
89.683 (31.046)
Nordeste 598.703 6.701 299.523 292.479
Centro-Oeste 140.948 864 27.851 112.233
Sudeste 786.179 1.526 163.597 621.056
Sul 286.139 1.523 58.889 225.727
Brasil 1.977.978 12.480 624.320 1.341.178
Fonte: INEP (2011)
66
Esses dados servem de base para discussões que fomentam a necessidade
urgente de formar profissionais para atuarem na educação da região e capacitar os
que já desenvolvem atividades no magistério. A implantação de cursos de graduação
é responsabilidade assumida pela maior universidade da região Norte do país, a
Universidade Federal do Pará – UFPA. Atualmente oferta 38 turmas do Curso de
Licenciatura em Matemática, pelo Plano Nacional de Formação de Professores para
a Educação Básica – PARFOR. Estas, situadas em 29 municípios do estado,
somando um quantitativo aproximado de 650 alunos, que já desempenham atividades
docentes na rede pública de ensino, sem terem a formação inicial em Matemática.
A formação inicial é o primeiro passo de um longo e permanente processo
formativo e se constitui da base preparatória do profissional para dar início à sua
carreira docente. Isto, considerando que esse professor ao concluir sua formação
inicial está longe de ser um profissional pronto e amadurecido no momento em que
recebe a sua habilitação profissional (PONTE, 1995). Essa preparação é apenas o
começo do caminho a ser percorrido para a construção de uma formação que permita
a esse profissional [...] compreender e problematizar a realidade, intervir na própria
atuação e avaliá-la. (VEIGA, 2004, p. 97).
Ainda sobre formação inicial, os estudos realizados por García (2006) destacam
que a formação inicial de professores deve contribuir não só para o desenvolvimento
pessoal, mas principalmente para a aquisição de uma atitude reflexiva acerca dos
processos de ensino e de aprendizagem em sua prática profissional. Portanto, é
importante considerar que os cursos de licenciatura que têm como principal
objetivo/missão formar professores para a Educação Básica não dão conta de formar
esse profissional de forma eficiente, razão pela qual existe um caminho a ser
construído durante a carreira docente, que é de competência do professor.
Essa construção se faz da inserção dos diversos elementos, que vão se
configurar ao longo desse caminho. A base construída na formação inicial servirá
como alicerce para que esse professor seja capaz de fazer a integração dos
conhecimentos específicos de sua área de formação aos diferentes conhecimentos
que se constrói e são construídos em ambientes e contextos em que ocorre a prática
docente. No que se refere à Licenciatura em Matemática, D’Ambrosio (1998), afirma:
67
[...] dificilmente um professor de Matemática formado em um programa tradicional estará preparado para enfrentar os desafios das modernas propostas curriculares. As pesquisas sobre a ação de professores mostram que em geral o professor ensina da maneira como lhe foi ensinado (p.37).
A assertiva do autor nos leva a considerar que a formação recebida nos cursos
de licenciaturas tradicionais num formato 3+1, que são práticas comuns nas
instituições formadoras, contribui significativamente para que os egressos dos cursos
de Licenciaturas estejam saindo com uma formação frágil e incipiente para o exercício
docente. Neste pensar, Nóvoa (1998), afirma:
[...] a formação de professores é influenciada por inúmeros fatores que
devem ser estudados adequadamente, para que assim se possa
intervir de maneira construtiva na formação dos acadêmicos que
futuramente estarão regendo atividades didáticas em sala de aula. (p.
25).
A formação inicial de professores é uma questão que deve ser estudada
adequadamente para que futuros professores possam sair desse processo com bases
teórico-práticas, que tenham capacidade de preparar esses profissionais para
saberem desempenhar o exercício docente com vistas às mudanças no contexto
social. Papel esse que deve ser desempenhado pelas intuições formadoras.
No Estado do Pará a formação de professores tem sido um grande desafio,
dada as dimensões territoriais e a diversidade desse estado, o que dificulta o referido
processo.
Para Gonçalves (2006):
Esta dificuldade é agravada pelas condições geográficas e humanas do estado: rios, florestas densas, estradas precárias, grandes distâncias que separam a capital dos municípios, período de chuvas, falta de compromisso dos políticos para com a educação, que devido às características peculiares da região, exige um tratamento diferenciado. Em consequência disso, muitas localidades do estado são difíceis de serem atingidas por projetos e programas de melhoria (GONÇALVES, 2006, p. 67).
Em se tratando da Microrregião do Salgado a formação da maioria dos
profissionais que desempenham o exercício docente nas salas de aula das escolas
dessa microrregião, é feita pelas instituições formadoras estabelecidas no município
68
de Castanhal, via de acesso a todos os municípios que estão localizados na
Mesorregião Nordeste Paraense. Entre estas, a Universidade Federal do Pará.
Universidade Federal do Pará - UFPA
Para trazer informações acerca de uma das maiores instituições de ensino
superior da região Norte do País, foi necessário realizar levantamento nos arquivos
da instituição, especialmente, no primeiro Plano de Desenvolvimento Institucional –
PDI, para o período de 2001-2010 e no último PDI para o período de 2011-2015, na
perspectiva de levantar as informações necessárias para a construção desta
subseção.
A Universidade Federal do Pará ao longo de mais de meio século de existência,
reconhecida como a maior instituição de ensino superior dos Trópicos Úmidos, tem
[...] a missão imprescindível na produção, socialização e transformação do
conhecimento na Amazônia, como alavanca para a formação de cidadãos capazes de
promover a construção de uma sociedade sustentável local, regional e planetária (PDI
2011-2015, p. 29), constituindo-se patrimônio coletivo e social. Portanto, sua
singularidade reside na condição histórica de reinventar-se nos diferentes momentos
do seu percurso. Neste contexto, o grande desafio da universidade para o século XXI
é, [...] avançar numa arquitetura de governança institucional democrática e
cosmopolita, num estilo de inserção proativa, alinhada com transformações e
tendências do mundo contemporâneo (Idem, p. 32).
De acordo com Gonçalves (2006), a Universidade Federal do Pará foi, por muito
tempo a única instituição de ensino superior no estado do Pará, com sua história de
lutas, conquistas e doações, tanto pessoal como patrimonial. Ainda segundo o autor,
a UFPA foi a primeira universidade federal da Amazônia e a oitava do gênero no país,
instalada em 31 de janeiro de 1959, em sessão presidida pelo então Presidente da
República Juscelino Kubitscheck. Com este ato, encerrava-se assim, uma luta de
vários anos da comunidade paraense para ter sua universidade. Marcando, desse
modo, uma nova história cultural do estado e da região.
Com base nas informações do PDI (2001-2011), a UFPA tem consciência da
importância de seu papel no desenvolvimento do Estado do Pará. Deste modo, a partir
de 1986, estendeu de forma mais sistemática suas ações ao interior do Estado, numa
69
tentativa de democratizar o acesso ao ensino superior a milhares de pessoas que
estavam excluídas do ambiente universitário em decorrência das distâncias e das
dificuldades de trânsito entre os diversos municípios e entre esses a capital. Desde
aquele ano, então, de forma sistemática e contínua, tem a UFPA formado e fixado
profissionais especializados no interior da Amazônia.
Desta forma, sua organização institucional se estrutura em dez outras, ou seja,
a universidade está espalhada em todas as microrregiões do Estado do Pará, como
se fosse [...] uma espécie de Universidade-rede, com uma moldura que favorece
ações educativas e científicas em todos os níveis (PDI 2001-2010, p. 21).
Considerando as dimensões continentais do Estado do Pará, a UFPA vem ao
longo do tempo empreendendo esforços para o atendimento à crescente demanda
das regiões, mesorregiões e microrregiões do estado, compartilhando essa
responsabilidade com novas instituições de ensino superior (p. 33), surgidas nos
últimos anos, como a Universidade Federal do Oeste do Pará - UFOPA criada em
2009 e a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará – UNIFESSPA criada em
2013, que contribuem para a redução das desigualdades regionais e fortalecimento
político-administrativo como unidade da federação. Vale destacar que antes de serem
transformadas em universidades, tanto a UFOPA quanto a UNIFESSPA foram
campus da Universidade Federal do Pará, compondo a Universidade Multicampi.
Na condição de instituição acadêmica em permanente movimento dentro do
contexto amazônico, a universidade desempenha o importante papel de condutor do
desenvolvimento da região, contribuindo para [...] gerar, difundir e aplicar o
conhecimento nos diversos campos do saber, visando à melhoria da qualidade de vida
do ser humano em geral, e em particular do amazônida, aproveitando as
potencialidades da região mediante processos integrados de ensino, pesquisa e
extensão (PDI 2001-2010, p. 24).
Consciente da importância de seu papel no desenvolvimento do Estado do
Pará, a UFPA, a partir de 1986, estendeu de forma mais sistemática suas ações ao
interior do Estado, numa tentativa de democratizar o acesso ao ensino superior a
milhares de pessoas que estavam excluídas do ambiente universitário em decorrência
das distâncias e das dificuldades de trânsito entre os diversos municípios e entre
esses a capital (PDI 2001-2010, p. 72).
70
Desta forma, o compromisso assumido pela universidade com a região
amazônica, é busca construir a sua identidade. Esse comprometimento leva ao
Processo de Interiorização da UFPA, que teve início em 1971, sob o modelo renovado
das ações de extensão dos Centros Rurais Universitários de Treinamento e Ações
Comunitárias - CRUTACs, do final da década de 60.
Em 1986 o Projeto de Interiorização da UFPA foi aprovado quando foram eleitos
oito campi para o desenvolvimento do trabalho. As prefeituras dos municípios onde
foram instalados os campi aderiram à proposta e em contrapartida, cederam prédios
para a instalação da sede do campus e servidores para o apoio administrativo,
vigilância e motoristas. Em maio de 1986 representantes das universidades
amazônicas elaboraram o primeiro Projeto Norte de Interiorização, que incorporou
objetivos, metas e estratégias já delineadas pela UFPA.
O Plano de Desenvolvimento da UFPA para o período de 2001-2010, trouxe
como um de seus sete eixos estruturantes, a Universidade Multicampi. Em 2004 o
Conselho Superior de Ensino e Pesquisa – CONSEPE aprova a Resolução no 3.211,
com pressupostos e diretrizes do novo modelo, pactuados pela comunidade
acadêmica.
Promover o acesso ao ensino superior no segundo maior estado brasileiro tem
sido um dos grandes desafios assumidos pela UFPA, formalmente há 30 anos,
quando foi aprovado o Programa de Interiorização da Universidade, com a Resolução
no 1.355, de 1986. Antes do ensino superior ser levado pela instituição a quase todos
os cento e quarenta e quatro municípios do estado de forma planejada, apenas 150
dos 25 mil professores da rede pública possuíam habilitação superior para o
magistério, era essa a realidade encontrada no contexto amazônico.
Mudar essa realidade foi um dos principais objetivos dos cursos oferecidos pela
UFPA, instalados a partir de 1986, em oito municípios-sede localizados em cada uma
das seis Mesorregiões do Estado: Campus de Santarém (hoje Universidade Federal
do Oeste do Pará – UFOPA), localizado na mesorregião do Baixo Amazonas; Campus
de Soure, localizado na mesorregião do Marajó; Campus de Castanhal, localizado na
mesorregião Metropolitana de Belém; Campus de Altamira, localizado na mesorregião
Sudoeste do Pará; Campus de Abaetetuba, Bragança e Cametá, localizados na
mesorregião Nordeste e o Campus de Marabá (hoje Universidade Federal do Sul e
Sudeste do Pará – UNIFESSPA) localizado na mesorregião Sudeste.
71
Na década de 1990 o programa de interiorização foi redimensionado a partir de
um projeto integrado de ensino, pesquisa e extensão, para que os cursos passassem
a contribuir mais com o desenvolvimento social de cada região paraense. Foi preciso
definir vocações econômicas locais e fazer investimentos estratégicos em áreas que
valorizassem esses perfis. Nessa perspectiva, houve por parte da instituição a
preocupação de [...] pensar a universidade a partir do Pará como um todo,
considerando as potencialidades e as vocações locais, em vista da formação de
quadros profissionais comprometidos com os rumos do desenvolvimento do Estado e
da região (PDI 2001-2010, p.72).
Ainda de acordo com o PDI, na cidade de Altamira fomentaram-se mais
fortemente as Ciências Agrárias, atendendo à demanda da economia agropecuária
no sudoeste paraense. Em Castanhal ganhou força a Medicina Veterinária, em
atenção à forte atividade pecuária. Em Santarém foram criados cursos que
valorizassem o estudo da rica biodiversidade do Baixo Amazonas, como as Ciências
Biológicas, a Física Ambiental, mas também Direito, Sistema de Informações e
Processamento de Dados. Em Marabá, as Engenharias de Materiais e de Minas e
Meio Ambiente, além de Geologia e Ciências Agrárias, acompanhando as atividades
agropecuárias e especialmente minerárias no sudeste do Estado. Em Soure, o
turismo, na tentativa de qualificar a atividade desenvolvida tradicionalmente de forma
espontânea no arquipélago do Marajó. Em Bragança, as Ciências Biológicas,
principalmente, e a Engenharia de Pesca, mais recentemente, privilegiando estudos
sobre o vasto ecossistema dos manguezais na região e economia da pesca. Este
campus conta hoje com cursos de Mestrado e Doutorado na área Engenharia de
Pesca e Ciências Biológicas.
O cenário de dificuldades para a consolidação da agora chamada Universidade
Multicampi ganha novos contornos ao longo do tempo, mas os avanços da instituição
são inegáveis e deixam boa margem de contribuição para o desenvolvimento de um
dos Estados mais estratégicos para a região amazônica. Atualmente existem cinco
universidades públicas atuando no território paraense: Universidade Federal do Pará
(UFPA), Universidade do Estado do Pará (UEPA), Universidade Federal Rural da
Amazônia (UFRA) e as mais recentemente criadas Universidade Federal do Oeste do
Pará (UFOPA), Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA) e um
Instituto Federal de Educação do Pará – IFPA.
72
A existência dos campi universitários consolida a Universidade Multicampi e
realiza sonhos de milhares de estudantes que buscam uma formação que antes não
acreditavam se tornar realidade, razão que não resta dúvida de que [...] o Projeto de
Interiorização veio ao encontro dos anseios da população do interior do Pará,
representando o pagamento parcial e o resgate de uma dívida de todos nós, membros
da universidade que tínhamos com a população do interior, afirma Gonçalves (2000,
p. 85). Atualmente a UFPA conta com os campi de Abaetetuba, Altamira, Bragança,
Breves, Cametá, Capanema, Soure, Tucuruí e Castanhal. Este último faz parte do
cenário de investigação.
Campus Universitário de Castanhal - CUNCAST
As informações constantes desta subseção estão embasadas no Histórico do
Campus11 e nos Relatórios de Gestão, que contém informações gerais sobre Campus
Universitário de Castanhal.
O processo de implantação do ensino superior em Castanhal teve início em
1965, por meio do Núcleo de Educação e do Serviço de Extensão. Sediada em prédios
improvisados, a Universidade Federal do Pará ofereceu cursos de extensão em
Língua Portuguesa, Literatura Brasileira e Didática. A partir de 1972 o Centro de
Educação da UFPA realizou Cursos Polivalentes para o Ensino Fundamental, e foi
graças a esta iniciativa que o Ensino Médio (antigo 2º Grau) e o Técnico em Magistério
(antigo Ensino Normal) foram implantados nas microrregiões bragantina, guajarina e
salgado, zonas de abrangência.
Diante da necessidade de se firmar uma estrutura universitária definitiva para o
crescimento e funcionamento de novos cursos de graduação, a Universidade Federal
do Pará, na pessoa do senhor reitor Aracy Amazonas Barreto, em parceria com a
Prefeitura Municipal de Castanhal, na pessoa do senhor Almir Tavares Lima12, assinou
no dia 14 de abril de 1978 o convênio para a implantação do Campus Universitário da
Universidade Federal do Pará no município, através do Núcleo de Educação e do
Serviço de Extensão.
11 Disponível em: www.campuscastanhal.ufpa.br 12 As informações referentes ao Campus de Castanhal, fazem parte das pesquisas realizadas para a reformulação do PPC (em andamento) do Curso de Licenciatura em Matemática do Campus Universitário de Castanhal/UFPA, do qual esta pesquisadora faz parte da equipe de reformulação.
73
Na figura a seguir, se observa a nota do jornal Beira Rio que faz referência ao
Projeto de Interiorização que implanta novos campus em Abaetetuba e Castanhal.
FIGURA 1: Matéria publicada no Jornal Beira do Rio. Edição de março/abril de 1986.
Fonte: Universidade Federal do Pará - UFPA
Na sequência observa-se o registro do lançamento da pedra fundamental de
criação do Campus Universitário de Castanhal.
FIGURA 2: Matéria publicada no Jornal Beira do Rio. Edição de março/abril de 1986.
Fonte: Universidade Federal do Pará - UFPA
Os primeiros cursos de Licenciatura Plena ofertados pelo Campus de
Castanhal em 1978 foram Letras e Matemática e, logo depois, Pedagogia, no período
regular. Em regime intervalar, diversos outros cursos tiveram passagem pelo Campus
74
de Castanhal, como Ciências Sociais (1994 e 1999), Geografia (1987 e 1998),
Administração (1995, 1997 e 1998) e História (1987 e 1995). A partir do ano 2000, o
Curso de Educação Física foi implantado no campus, no período regular e em 2001 o
Curso de Medicina Veterinária, ambos únicos no interior do estado.
O Campus Universitário de Castanhal ganhou extensão física e hoje conta com
infraestrutura que totaliza uma área de 23.000 m2, aproximadamente. Com uma área
construída de 12.548 m2 distribuída por áreas descentralizadas, que comporta salas
de aula, laboratórios, auditórios, biblioteca, quadra de esporte, piscina, sala de
ginástica, gabinetes para professores e um complexo para o corpo gestor.
Vale destacar que o curso de Medicina Veterinária funciona no Campus II,
criado especialmente para o curso de Veterinária, pois o Campus I não comportava
os laboratórios e o atendimento aos animais de pequeno e grande porte, feito
diariamente à sociedade castanhalense, além da oferta do curso de Mestrado e
Doutorado na área de Ciência Animal.
FIGURA 3 - Foto Panorâmica do Campus Universitário de Castanhal da UFPA
Fonte: Foto panorâmica do Campus I - Arquivo da FACMAT
De acordo com dados informados no Relatório Anual de Gestão (dez/2014), o
Campus de Castanhal conta com um quadro de cento e dez professores efetivos do
Magistério Superior da UFPA e dois substitutos, além de nove professores cedidos
pela prefeitura do município de Castanhal para atuarem no Programa de Extensão do
Grupo de Estudos da Terceira Idade - GETI. O referido campus conta ainda com 52
servidores técnico-administrativos, sendo 42 do quadro permanente da UFPA, um da
FADESP e nove cedidos pela Prefeitura do Município de Castanhal.
75
O Campus Universitário de Castanhal recebe discentes de todos os municípios
circunvizinhos. Para melhor visualizar a distância entre o município em que estão
localizados o campus e os municípios da Microrregião do Salgado, foi necessário
construir um mapa especificamente para configurar essas informações.
No mapa a seguir, é possível visualizar a distância percorrida em quilômetros
pelos discentes, para chegar ao município de Castanhal, onde se localiza o campus
universitário.
FIGURA 4 – Distância entre o Campus de Castanhal e os municípios da Microrregião do Salgado.
FONTE: Elaborado especialmente para a Tese – Acervo da Pesquisadora
Ainda de acordo com dados informados no Relatório Anual de Gestão
(dez/2014), o quadro de discentes do Campus de Castanhal é de aproximadamente
2.700, distribuídos nos cursos de graduação em: Matemática, Pedagogia, Letras com
76
habilitação em Português, Letras com habilitação em Espanhol, Educação Física,
Sistema de Informação, Engenharia da Computação, Medicina Veterinária e
Administração.
Ciente da sua importância para a região e em plena consonância com os
princípios norteadores da Universidade Federal do Pará, o Campus Universitário de
Castanhal assume como um dos pilares essencial de atuação social os princípios de
gerar, difundir e aplicar o conhecimento de diferentes áreas do saber. Dessa maneira
possibilitando aos cidadãos perspectivas de transformar a realidade, por meio das
ações de ensino, pesquisa e extensão, valorizando e respeitando as peculiaridades
locais e as diferenças culturais, no sentido de proporcionar o desenvolvimento
regional. Em consonância com esses princípios, a Faculdade de Matemática –
FACMAT é uma subunidade do Campus Universitário de Castanhal, que vem, ao
longo dos anos atendendo as comunidades locais e circunvizinhas com oferta do
curso de Licenciatura em Matemática.
Faculdade de Matemática - FACMAT
A melhoria da qualidade da educação, no que diz respeito à Matemática,
perpassa pelo reconhecimento das causas que dificultam a aprendizagem dos
conteúdos dessa disciplina e das deficiências na formação dos docentes da área, por
meio de diagnóstico sistêmico do problema.
O estudo “Panorama dos recursos humanos em Matemática no Brasil:
premência de crescer”, elaborado no ano de 2001 pela Sociedade Brasileira de
Matemática (SBM) em conjunto com o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA),
apontava situações críticas tais como: a dificuldade de atração de estudantes para a
área de Matemática; o desequilíbrio entre demanda e oferta de profissionais; o baixo
nível de conhecimento matemático dos acadêmicos e egressos dos cursos superiores;
a insuficiente qualificação dos docentes em programas de pós-graduação e a pequena
interação dos cursos de Matemática com o setor produtivo e com outras áreas da
ciência. O estudo também indica caminhos a partir da elaboração de um documento
em que aponta diversas sugestões. Entre estas, a revisão dos cursos de licenciatura,
incentivando inovações curriculares nas estruturas dos cursos.
77
Com base neste pressuposto, a Faculdade de Matemática do Campus de
Castanhal, da Universidade Federal do Pará, vem amadurecendo as discussões em
torno da construção de um novo Projeto Pedagógico de Curso - PPC, desde a entrada
em vigor da Resolução no 3.633 de 18/02/2008 do Conselho Superior de Ensino,
Pesquisa e Extensão - CONSEPE que aprovou o novo Regulamento de Graduação.
Na época, as regras recém-aprovadas para a graduação exigiam a revisão e a
adequação dos projetos pedagógicos da UFPA. Em especial, o artigo 137 do
Regulamento de Graduação que estabeleceu um prazo de 120 dias para a adequação
dos Projetos Pedagógicos de Curso a contar do início da vigência do regulamento.
O período máximo estabelecido no Regulamento de Graduação não foi
cumprido pela Faculdade de Matemática do Campus de Castanhal. Na época, o
quantitativo de professores (cinco) era insuficiente para assumir a reestruturação do
Projeto Pedagógico do Curso - PPC, frente à grande carga de trabalho docente. Pois
que era necessário atender às necessidades de gestão acadêmica, disciplinas,
orientações de trabalhos de conclusão de curso, pesquisa e extensão das turmas
existentes nos períodos intensivo, extensivo e interiorização.
A partir da adesão da Universidade Federal do Pará à Reestruturação e
Expansão das Universidades Federal – REUNI, esse quadro mudou, proporcionando
o aumento da oferta de vagas em cursos de graduação, melhoria da infraestrutura,
criação de novos cursos e contratação de novos professores.
A partir das novas contratações propiciadas pelo REUNI, o corpo docente da
Faculdade de Matemática passou de cinco para quatorze professores, fato que
contribui para intensificar as discussões acerca da atualização, adequação e
reformulação do PPC, face às novas demandas e legislações que vinham sendo
amadurecidas desde a entrada em vigor do novo Regulamento de Graduação em
2008.
Levando-se em consideração que o PPC que está em vigor datado de 1992 e
da tentativa não exitosa de reformulação em 2008, em setembro de 2010, através da
Portaria CUNCAST no 077/2010, foi formada a comissão responsável pela condução
do processo de reformulação. Apesar dos esforços empenhados por esta comissão,
não houve avanços significativos, pois ainda existe grande resistência por parte de
professores de área, em fazer mudanças no formato do PPC, considerando a
manutenção do formato bacharelesco do curso.
78
Em 2016, a partir da Resolução CNE/MEC – 2, de 01 de julho de 2015, que
define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior
(cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos de
segunda licenciatura) e para a formação continuada, uma nova tentativa de
reformulação do PPC do curso de Licenciatura em Matemática teve início. Pois há a
necessidade de fazer ajustes tanto na carga horária total do curso, quanto na inserção
de novas disciplinas que venham atender as novas diretrizes curriculares.
Os novos PPC devem atender, especialmente, às orientações contidas nos
Artigos 11, 12 e 13 da Resolução CNE/MEC – 2/2015, que tratam dos núcleos (de
estudos de formação geral, de aprofundamento e de estudos integradores). Devem
contemplar uma carga horária mínima de 3.200h e ter uma duração de no mínimo 8
semestres ou 4 anos. Para atendimento a esta nova Resolução criou-se Núcleos
Docentes Estruturantes – NDE13, para conduzir a proposta de elaboração do novo
Projeto Pedagógico de Curso – PPC.
Em 2010, quando eu assumi a direção da Faculdade de Matemática, foi iniciado
um processo de construção de uma nova identidade do curso de Licenciatura em
Matemática do CUNCAST. Essa proposta perpassava por uma avaliação crítica do
que vem sendo realizado em termos educacionais, até o presente momento,
reafirmando e melhorando ações que tenham funcionado ao longo do tempo,
abandonando antigas práticas que não vêm contribuindo para a elevação da
qualidade do curso. E por fim, lançando novos olhares e experimentando novas
práticas pedagógicas que possam promover a inovação transformadora da educação
no município de Castanhal e dos municípios circunvizinhos.
Em resposta a esta demanda, o novo PPC do curso de Matemática deve
privilegiar a interdisciplinaridade e transversalidade de conhecimentos. Estabelecendo
neste contexto a sua identidade, para que o ensino de Matemática possa ter maior
conexão com o cotidiano e a realidade dos estudantes. De modo que seja ampliada a
visão da importância e da aplicabilidade do conhecimento matemático a outras áreas
do saber humano.
13 Esta pesquisadora faz parte como membro do Núcleo Docente Estruturante
79
Durante os três anos que estive à frente da direção da faculdade14, tive o
cuidado de fazer o registro de todas as demandas e situações surgidas diariamente.
Esses registros serviam de instrumentos para a elaboração do Relatório Anual de
Gestão da subunidade. Em cada registro que ficou os muitos desafios a serem
enfrentados desafios pela Faculdade de Matemática do Campus de Castanhal, para
a construção de uma proposta de formação de professores de Matemática em que
haja o equilíbrio entre as inúmeras restrições impostas pela legislação vigente relativa
ao curso, a devida proporção entre os conteúdos matemáticos, pedagógicos e das
áreas afins na matriz curricular, a estruturação da pesquisa e da extensão no âmbito
do curso, a maior interação da universidade com as escolas e com a comunidade
local, além da consolidação da política de estágios.
Consciente da relevância do seu papel, o curso de Licenciatura em Matemática
da Faculdade de Matemática do Campus Universitário de Castanhal da Universidade
Federal do Pará assume o compromisso de responder às demandas acadêmicas e
da sociedade, enfrentando com propriedade os desafios do desenvolvimento do
ensino da Matemática no contexto local, regional, estadual e nacional.
Neste sentido, a Faculdade de Matemática reconhece a importância da
construção democrática de seu Projeto Pedagógico como um dos pilares que
sustentam a educação de qualidade esperada pela sociedade. Propõe soluções
inovadoras para as desafiantes questões que se apresentarem, com a colaboração e
em permanente diálogo com os segmentos envolvidos.
Portanto, o Curso de Licenciatura em Matemática do Campus Universitário de
Castanhal deve ser embasado nas demandas sociais para atendimento às
necessidades formativas da sociedade. Desta forma, corresponder aos anseios das
premissas norteadoras, que constituem o alicerce sobre o qual será formada uma
nova geração de docentes da área de Matemática, contribuindo, desta forma, com a
elevação da qualidade da educação da Microrregião do Salgado, do município de
Castanhal, do Estado do Pará e do Brasil.
14 Estive à frente da direção da Faculdade de matemática no período de 2010 a 2013
80
Delimitação do contexto investigado
A pesquisa foi centrada nos onze (Colares, Curuçá, Magalhães Barata,
Maracanã, Marapanim, São Caetano de Odivelas, São João de Pirabas, São João da
Ponta, Salinópolis, Terra Alta e Vigia de Nazaré) municípios da Microrregião do
Salgado, localizada na Mesorregião Nordeste Paraense. A Microrregião do Salgado é
uma das microrregiões do estado do Pará, pertencente à Mesorregião Nordeste
Paraense.
A população da Mesorregião do Nordeste Paraense foi estimada
em 2014 pelo IBGE em 264.612 habitantes. Possui uma área total de 5.784,561 km²,
como se observa no destaque em vermelho na figura 5 a seguir.
FIGURA 5 – Localização da Mesorregião do Nordeste Paraense Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.
Na Mesorregião Nordeste, localiza-se a Microrregião do Salgado que ocupa
uma área total de 5.784,561Km², com uma população aproximada de 264.612
habitantes (IBGE, 2014), que estão distribuídos nos onze municípios que compõem a
Microrregião, de acordo com o destaque em vermelho na figura 6 a seguir.
81
FIGURA 6 – Localização da Microrregião do Salgado Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.
Para sinalizar dados acerca dos onze municípios que pertencem a
Microrregião, destaca-se: a área, a população, o quantitativo de escolas, o número de
estudantes e o quadro docente de cada um desses municípios aqui dispostos em
ordem alfabética.
Colares - o município tem uma área de 613 km², com população estimada em
11.682 habitantes (IBGE, 2015). O município conta com 41 escolas públicas que
atendem uma população de 2.492 estudantes de Ensino Fundamental e 530 do
Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela conta com um corpo docente de 211
professores.
Curuçá - o município tem uma área de 676,3279 km², com uma população
estimada em 37.800 habitantes, (IBGE, 2015). O município conta com 77 escolas
públicas que atende uma população de 7.768 estudantes de Ensino Fundamental e
1.827 do Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela, conta com um corpo
docente de 389 professores.
82
Magalhães Barata - o município tem uma área de 328,1559 km², com uma
população estimada em 8.279 habitantes, (IBGE, 2015). O município conta com 29
escolas públicas que atende uma população de 1.791 estudantes do Ensino
Fundamental e 440 do Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela, conta com
um corpo docente de 140 professores.
Maracanã - o município tem uma área de 855,664 km², com uma população
estimada em 28.656 habitantes, (IBGE, 2015). O município conta com 88 escolas
públicas que atende uma população de 6.878 estudantes do Ensino Fundamental e
1.444 do Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela, conta com um corpo
docente de 454 professores.
Marapanim - o município tem uma área de 795,987 km². Sua população
estimada em 27.368 habitantes, (IBGE, 2015). O município conta com 55 escolas
públicas que atende uma população de 6.031 estudantes do Ensino Fundamental e
1.699 do Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela conta com um corpo
docente de 331 professores.
Salinópolis - o município tem uma área 217.856 km², com uma população
estimada em 39.078 habitantes (IBGE, 2015). O município conta com 40 escolas
públicas que atende uma população de 8.415 estudantes do Ensino Fundamental e
2.211 do Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela, conta com um corpo
docente de 361 professores.
São Caetano de Odivelas - o município tem uma área de 743,466 km² com
uma população estimada em 17.420 habitantes (IBGE, 2015). O município conta com
40 escolas públicas que atende uma população de 3.445 estudantes do Ensino
Fundamental e 1.005 do Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela, conta com
um corpo docente de 242 professores.
São João da Ponta - o município tem uma área de 195,918 km², com uma
população estimada em 5.795 habitantes (IBGE, 2015). O município conta com 12
escolas públicas que atende uma população de 1.128 estudantes do Ensino
Fundamental e 215 do Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela, conta com
um corpo docente de 55 professores.
São João de Pirabas - o município tem uma área de 705,542 km², com uma
população estimada em 21.991 habitantes (IBGE, 2015). O município conta com 31
83
escolas públicas que atende uma população de 4.774 estudantes do Ensino
Fundamental e 1.120 do Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela, conta com
um corpo docente de 272 professores.
Terra Alta - o município tem uma área de 206,4 km², com uma população
estimada em 11.120 habitantes (IBGE, 2015). O município conta com 19 escolas
públicas que atende uma população de 2.109 estudantes do Ensino Fundamental e
852 do Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela, conta com um corpo docente
de 182 professores.
Vigia de Nazaré - o município tem uma área de 539,079 km², com uma
população estimada em 51.173 habitantes (IBGE, 2015). O município conta com 79
escolas públicas que atende uma população de 9.336 estudantes do Ensino
Fundamental e 2.148 do Ensino Médio. Para atendimento a essa clientela, conta com
um corpo docente de 529 professores.
É importante destacar que em cada um desses municípios encontramos
particularidades e curiosidades que foram registradas durante as visitas realizadas
diretamente nas escolas estaduais, municipais e secretarias municipais de educação
de todos os onze municípios da Microrregião do Salgado. Os contatos com secretários
municipais de educação, diretores de escolas, coordenadores pedagógicos e
professores, foi uma experiência enriquecedora, pois tive a oportunidade de conhecer
um pouco da realidade educacional da Microrregião.
Essa proximidade, de certa forma contribuiu para juntar informações
suficientes, não só para identificar os possíveis colaboradores desta pesquisa, mas
como também para refletir sobre a importância de melhor formar professores para
desenvolverem seu exercício prático na Educação Básica dessa microrregião.
Epílogo desta Seção
Esta seção trouxe informações sobre o cenário da pesquisa na perspectiva de
tornar evidente as características do estado. Os aspectos educacionais dos onze
municípios da Microrregião do Salgado investigados que, apesar de pertencerem à
mesma microrregião, cada um deles tem características próprias, que foram
destacadas no texto.
84
Como descrito nesta seção, o Pará tem características que lhes são próprias e
que fazem deste estado um lugar diferenciado dos demais estados da federação. Tem
mistura de ritmos, de raças, de costumes e de crenças que nascem, se desenvolvem
e convivem neste lugar. Sua dimensão territorial é povoada por pessoas de várias
regiões do país, sendo sua população miscigenada, formada a partir de índios, negros
e descendentes de imigrantes áticos e europeus.
Fiz destaques à educação da microrregião. Processo este fortemente marcado
pela pluralidade de indivíduos que habitam o estado, que são oriundos de diversas e
diferenciadas culturas. No caso da Microrregião do Salgado, a cultura está associada
às práticas da pesca artesanal de subsistência sem fins lucrativos e da pesca
artesanal de pequena escala. São realizadas por pescadores autônomos, que fazem
uso de ferramentas relativamente simples, assim como constroem seus barcos e
currais para a pesca e apreensão do pescado.
Outro aspecto aqui referido é o que ocorre no período da safra, quando há certo
esvaziamento nas salas de aula, momento em que os estudantes se juntam aos pais
para ajudar na colheita. Esta é a forma que as famílias encontram para aumentar a
economia doméstica. Após o período da safra os estudantes retornam (quando
retornam) à escola.
Há casos em que esses estudantes abandonam a escola e só retornam no ano
letivo seguinte. Fato que provoca um esvaziamento nas salas de aula, havendo a
necessidade de um procedimento denominado de integração, quando alunos de uma
turma se juntam a outra para poder configurar-se uma turma, porque uma turma deve
ter no mínimo onze alunos efetivamente matriculados.
Assim, a partir de um olhar prospectivo, esta pesquisa pode contribuir na
instauração de uma nova compreensão da formação de futuros professores de
Matemática. Isto, com vistas à reformulação do PPC do Curso de Licenciatura em
Matemática da Faculdade de Matemática do Campus Universitário de Castanhal, da
Universidade Federal do Pará – UFPA. Realizado por meio de um processo crítico-
reflexivo, na perspectiva de formar professores de Matemática mais próximos da
escola, da sala de aula e das demandas sociais. Partir das informações constituídas
no campo de pesquisa, realizada com professores de Matemática, que desenvolvem
suas práticas na Microrregião do Salgado, egressos da UFPA e colaboradores desta
85
pesquisa, que certamente podem trazer informações relevantes, que serão
trabalhadas no processo de análise da quarta seção.
A terceira seção a seguir, discorre sobre o caminho feito entre os métodos que
sustentaram esta investigação, tendo como principais indicadores, a abordagem
metodológica para a realização da pesquisa de campo; os instrumentos utilizados
para a recolha das informações, já apontando os primeiros resultados a partir dos
dados informados nos questionários. Por fim, o detalhamento do processo de análise
teórica-conceitual que se faz por meio da Análise Textual Discursiva.
86
3. Movimento entre os métodos que sustentam esta pesquisa
Não acredito que haja um único design para a metodologia de uma investigação… [uma] boa metodologia para um estudo, tal como um bom design para um barco, deve ajudá-lo a atingir o destino de modo seguro e eficiente. (Maxwell, 1996).
Ao fazer o design de um barco, deve-se estar atento a todos os elementos que
compõem essa estrutura na perspectiva de que o resultado final, possibilite navegar
de forma segura na direção que se quer chegar. Da mesma forma, a metodologia de
investigação deve ser vista como a bússola que aponta os rumos que o pesquisador
deverá seguir, para obtenção das informações necessárias à compreensão de seu
objeto de estudo. No entanto, ela não pode ser vista como amarras que prendem o
pesquisador ao método, nem tão pouco como uma camisa de força ou viseira. Mas,
como uma caixa de ferramentas ou lente (DELEUZE e GUATTARI, 1995).
A metodologia deve ser entendida como mediadora do caminho a ser seguido.
Mas, não deve ser castradora da criatividade do pesquisador, pois o ambiente
investigado pode apontar outros rumos que nem sempre estão contemplados no
método escolhido. Portanto, o pesquisador deve sim, adotar um procedimento
metodológico, mas precisa ter claro que uma pesquisa de campo sempre pode
surpreender com situações que fogem ao que determina o método. Situações estas
que só são identificadas a partir do olhar, do ver e do enxergar do pesquisador no
cenário em que a investigação acontece.
Ao levar em consideração que o objeto de estudo desta investigação está
centrado nos sentidos e significados que foram atribuídos pelos colaboradores aos
saberes docentes, que são construídos tanto na formação inicial quanto nas práticas
docentes, me conduz a ter como objetivo analisar os saberes docentes de professores
de Matemática da Microrregião do Salgado, para compreender de que forma estes
podem ser entendidos como mediadores didáticos e conceituais na formação inicial
de professores. O que me leva a sustentar a tese por mim assumida de que as
experiências práticas vivenciadas por professores egressos do Curso de Licenciatura
87
em Matemática promovem o desenvolvimento de saberes docentes que podem servir
de base para propiciar a mediação didático e conceitual em processos formativos, na
perspectiva de minimizar as lacunas de formação e formar professores diferenciados
para atuarem na Educação Básica, a partir do diálogo entre os saberes próprios do
contexto e os saberes específicos da área do conhecimento. Logo, a pertinência desta
pesquisa inscreve-se em um movimento amplo de investigação, que me levou a
apontar as indagações, que se configuram nas questões que norteiam esta
investigação, a saber:
A formação inicial deixa lacunas que podem comprometer as práticas de sala de aula de professores de Matemática?
Que sentidos e que significados os professores de Matemática atribuem aos saberes específicos da área do conhecimento?
O distanciamento existente entre os conhecimentos específicos da área de formação e o contexto em que o professor desenvolve sua prática, contribui para as dificuldades encontradas para o ensino da Matemática?
Os saberes docentes de egressos do curso de Licenciatura em Matemática podem ser compreendidos como mediadores didáticos e conceituais na formação inicial de professores de Matemática?
Definidas as questões norteadoras, passo a explicitar as teorias, o cenário, os
sujeitos e os instrumentos que são cada uma das partes do todo desta investigação,
que intenciona compreender de que forma os saberes docentes podem ser vistos
como mediadores didáticos e conceituais na formação de professores de Matemática.
Nesta investigação, a Mediação é compreendida como um elemento
necessário para o desenvolvimento de ações humanas. No entanto, as teorias que
fundamentam o conceito de Mediação, é detalhada na quarta seção que faz
abordagens acerca dos Saberes Docentes como mediadores na/da formação inicial.
Momento em que as vozes dos colaboradores desta pesquisa são analisadas e vistas
como instrumentos mediacionais indispensáveis para o desenvolvimento de ações
humanas, em qualquer circunstância da vida social. Sendo a formação de professores
uma ação humana, deve, portanto, ser mediada pelos elementos constitutivos que
são construídos a partir das interações entre o ensinar e o aprender em ambiente de
formação.
88
Assim, definidos o objetivo, a tese e as questões que norteiam esta
investigação, foi possível apontar a abordagem e a modalidade da pesquisa que
assumo nesta investigação. Desta forma, nesta terceira seção ocupo-me em
apresentar as características metodológicas assumidas nesta investigação, na
intenção de fazer o percurso que me levou a optar pelo estudo em uma abordagem
qualitativa. Esta abordagem permitiu reduzir a distância entre teoria e os dados, entre
o contexto e a ação na realização de estudos, em que a interação entre o pesquisador
e os colaboradores que participam da investigação ocorra de maneira espontânea.
Assim, permitindo que as informações sejam constituídas na sua inteireza e
complexidade. Neste sentido, minha preocupação residiu em organizar as
informações de maneira sequencial e ordenada, para que haja a compreensão do
caminho percorrido em meio aos métodos que sustentam esta investigação.
Inicialmente fiz referências ao tipo de abordagem metodológica adotada para a
realização da pesquisa de campo, considerando a complexidade dos fenômenos, as
características associadas e as estratégias para o desenvolvimento das análises das
informações constituídas no universo investigado. Em seguida, apresentei os
instrumentos utilizados para a recolha das informações que foram constituídas
individualmente no campo de pesquisa, explicitando as razões que me levaram a fazer
uso dos instrumentos referidos. Na sequência descrevi o tratamento do
material/informações apresentando às primeiras análises dos dados obtidos no campo
de investigação a partir da aplicação dos questionários.
Sigo demarcando o método para a análise teórico-conceitual das informações,
que ocorre por meio da Análise Textual Discursiva proposta por Moraes e Galiazzi
(2011). Encerrei a seção retomando o desenvolvimento proposto, apresentado em
forma de Epílogo. Ressalta-se que as informações constituídas no campo de
investigação foram trabalhadas ao longo das seções, sempre que julgar necessário
fazer uso desses relatos para dar leveza e veracidade à escrita.
Abordagem metodológica da investigação
Ao discorrer este tópico compartilho os momentos que antecederam a escolha
do tipo de abordagem para a investigação que estava me propondo a realizar. No
processo de escrita do texto em que deveria apontar os procedimentos metodológicos
adotados para realizar a investigação, me vi diante de diversas abordagens de
89
pesquisa. Nesse momento perguntava-me: Qual a melhor abordagem para que minha
pesquisa consiga fazer um caminho metodológico seguro? Era preciso definir o tipo
de modalidade de estudo ideal para dar conta da minha investigação, dada a
diversidade das modalidades existentes em pesquisa qualitativa em ciências sociais.
Considerando essa diversidade outras indagações surgiram: É uma pesquisa
Etnográfica? É uma pesquisa Participante? É uma Pesquisa-ação? É uma pesquisa
do tipo Estudo de Caso?
Como minha intenção foi compreender saberes, concepções, comportamentos
e não descrever sistematicamente, medir ou comparar o contexto investigado, minha
pesquisa tinha características de uma pesquisa de natureza qualitativa descritiva e
analítica. Isto porque intencionava descrever e analisar a essência do objeto
estudado, a partir da concepção de mundo dos professores licenciados em
Matemática em seu contexto de prática, em que a lógica reside na interpretação do
vivido e das realidades significativas desses sujeitos.
Para tanto, busquei apoiar-me em Strauss e Corbin (1990) que defendem a
pesquisa qualitativa como uma abordagem que permite conjeturar diferentes
denominações para diferentes pesquisadores. Pois esta pode ser entendida como um
tipo de investigação em que os resultados obtidos são derivados de diversos meios
como: observação, entrevistas, registros em vídeo, anotações de campo, entre outros
instrumentos que o pesquisador pode lançar mão para constituir informações. Razão
que faz da pesquisa qualitativa uma abordagem usada frequentemente em
investigações realizadas nas Ciências Sociais. Especialmente em Educação, por
possibilitar maior aproximação entre o pesquisador e os informantes em contexto
natural, em que se situa o objeto de investigação, possibilitando a geração de
resultados e teorias compreensíveis e empiricamente credíveis. Neste sentido:
Os métodos qualitativos devem ser utilizados para descobrir e compreender o que está por trás de cada fenômeno sobre o qual pouco ou nada se sabe [...] e permite conhecer os pormenores complexos do fenômeno, difíceis de descobrir com os métodos quantitativos (STRAUSS e CORBIN, 1990, p.19).
Para estes teóricos a pesquisa qualitativa possibilita que os processos de
análise e/ou interpretação incluam técnicas para o tratamento dos dados, levando à
90
construção de relatórios escritos e orais por meio de comentários interpretativos, que
podem ter uma natureza teórica ou não.
Ao ponderar que minha pesquisa tinha uma natureza qualitativa descritiva, o
Estudo de Caso seria a abordagem metodológica mais adequada para a minha
proposta de investigação. Tomando como principal referência teórico-metodológica,
os estudos realizados por Robert K. Yin (2015). O autor afirma que esta abordagem
dará suporte ao investigador que procura respostas para o “como” e o “porquê” do
objeto investigado. Como referências complementares aproprio-me dos estudos
realizados por Chizzotti (2006), Ventura (2007), entre outros, que fazem discussões
acerca do estudo de caso.
O Estudo de Caso tem sua origem nos estudos antropológicos de Malinowski
e na Escola de Chicago (CHIZZOTTI, 2006). Posteriormente teve seu uso ampliado
para o estudo de eventos, processos, organizações, grupos, comunidades etc. Como
modalidade de pesquisa, o Estudo de Caso proporciona algumas vantagens ao
pesquisador (VENTURA, 2007), pois além de estimular novas descobertas, por conta
da flexibilidade do seu planejamento, proporciona a multiplicidade de dimensões de
um problema. Desta maneira focalizando-o como um todo, apresentando simplicidade
nos procedimentos, além de exigir uma análise em profundidade dos processos e das
relações entre eles.
Para realizar esta escolha ponderei três aspectos. Primeiro, por possibilitar
fazer uso de um ou mais instrumentos para produzir, intencionalmente, as
informações para a elaboração do corpus da pesquisa proposta. Segundo, pelo fato
de não seguir uma linha rígida de investigação, o que me possibilitaria recuar ou
avançar nos procedimentos de escuta dos colaboradores. No entanto, o fato de não
seguir uma linha rígida de investigação não significa dizer que pesquisas que utilizam
esta abordagem tenham menor rigor em seus procedimentos de recolha e análise das
informações, ou que se coloque em dúvida seus resultados. Schwartz (1993) é
contrário a este rigor afirmando que [...] esta vontade de querer impor um “modelo
forte” de rigor metodológico na pesquisa qualitativa, o que “mutilaria suas
possibilidades de descoberta” (p. 266). É importante destacar que, mesmo seguindo
uma linha menos rígida, não dá ao pesquisador, autonomia para fazer sua
investigação de qualquer jeito, pelo contrário, este deve ter rigor científico e redobrar
os cuidados com as generalizações.
91
Neste sentido, na realização de uma pesquisa, o pesquisador deve estar em
constante “vigilância epistemológica” (BOURDIEU, 1996). Ser epistemologicamente
vigilante é ser cuidadoso no sentido de privilegiar o conhecimento por meio da reflexão
crítico-teórica, que deve estar presente em todo o processo da investigação. Essa
vigilância deve ocupar-se de saber fazer uso de fontes seguras, no processo de
produção do conhecimento, com permanente e constante atenção. Isto, para evitar a
contaminação do processo de produção científica, pelas noções auto evidentes do
senso comum. Ao ter uma postura vigilante, o pesquisador cria condições para fazer
uma pesquisa séria e de qualidade15.
Por fim, o terceiro aspecto ponderado foi a necessidade de transmitir na íntegra,
a complexidade das situações reais com as quais vivenciei no contexto investigado,
no período de recolhimento das informações constituídas durante minha permanência
no campo de investigação.
Além dos aspectos referidos, considerei ainda, a necessidade de compreender
os comportamentos e as concepções dos sujeitos dos onze municípios que compõem
a Microrregião do Salgado. Pois, apesar de pertencerem a uma mesma microrregião,
têm hábitos, concepções, costumes e práticas diferenciadas. Neste sentido, o Estudo
de Caso possibilitou a inquirição empírica, que permitiu investigar saberes docentes
dentro de um contexto da vida real, onde múltiplas fontes de evidência são utilizadas
(YIN, 2015). Estão postas nesse cenário, dada a pluralidade de saberes e de práticas
docentes dos sujeitos investigados, pois a força do estudo de caso, como método de
investigação, é a sua capacidade de lidar com uma ampla variedade de evidências.
Essas evidências podem vir de várias fontes: documentação, registros em arquivos
entrevistas, observação direta, observação participante, e artefatos físicos etc. (YIN,
2015, p. 107), encontradas no campo de investigação.
Para delimitar de forma espacial o campo de investigação fiz uma primeira
aproximação, realizando levantamento de dados junto ao Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística – IBGE, para localizar a Microrregião do Salgado. Os dados
obtidos estão dispostos na Figura 7 de maneira a permitir uma visualização do macro
para o micro espaço em que concentrei a investigação.
15 LEDOUX. P. Um Olhar de Si nas Travessias de Formação. In: VI Congresso Internacional de
Pesquisa (Auto)Biográfica – CIPA. Rio de Janeiro, 2014. ISSN: 2178-60676.
92
FIGURA 7 - Delimitação espacial do campo de investigação Fonte: Elaborado pela pesquisadora com base em dados do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Acesso: março de 2014.
A partir da delimitação espacial fui em busca de identificar os possíveis
colaboradores desta pesquisa. Fato que ocorreu inicialmente, da visita à Secretaria
Estadual de Educação – SEDUC, para levantar informações acerca das Unidades
Regionais de Educação – URE, que respondem pelos municípios que estão situados
na Microrregião do Salgado. Com as informações obtidas foi possível identificar que
os onze municípios da Microrregião do Salgado são jurisdicionados por quatro
Unidades Regionais de Educação – URE, como se observa na Figura 8.
93
FIGURA 8 - Localização das Unidades Regionais de Educação Fonte: Elaborado pela pesquisadora com base nos dados da Pesquisa de Campo – abril de
2014.
A partir destes direcionamentos, visitei as quatro Unidades Regionais de
Educação em busca de informações acerca do quantitativo de professores licenciados
em Matemática lotados nas escolas públicas dos municípios jurisdicionados. As
informações fornecidas pelas unidades só davam conta de dados referentes aos
professores que estavam lotados em sala de aula, trabalhando com a disciplina de
Matemática nas escolas da rede estadual de ensino. Vale destacar que as
informações que constam do sistema de lotação da Secretaria Estadual de Educação
são de professores que estão lotados por disciplina, não sendo possível identificar a
área de formação.
Para obter as informações dos professores de Matemática lotados na rede
municipal de ensino enviei documento oficializando a solicitação das informações
junto às Secretarias Municipais de Educação – SEMED dos onze municípios que
fazem parte da Microrregião do Salgado. Para facilitar o retorno das informações,
solicitei às secretarias municipais que encaminhassem os dados via correio eletrônico.
No entanto, com exceção de quatro municípios (Colares, Curuçá, Maracanã e
Marapanim), as demais secretarias municipais não responderam à solicitação,
havendo a necessidade de deslocar-me a sete municípios distintos, para obter as
informações diretamente junto às secretarias municipais.
94
Os dados informados pelas URE e pelas SEMED no que se refere à lotação
dos professores que trabalham com a disciplina de Matemática estão dispostos
quantitativamente no quadro 5 a seguir.
Quadro 5 – Lotação de Professores por rede de ensino
Município Rede Estadual de Ensino
Rede Municipal de Ensino
Total de Professores lotados
Colares 09 09 18
Curuçá 12 03 15
Magalhães Barata 02 03 05
Maracanã 04 12 16
Marapanim 03 23 26
São Caetano de Odivelas 03 02 05
São João de Pirabas 02 03 05
São João da Ponta 01 04 05
Salinópolis 18 10 28
Terra Alta 05 09 14
Vigia de Nazaré 21 11 32
TOTAL 80 89 TOTAL GERAL: 169
Fonte: Elaborado pela autora com base na Pesquisa de Campo - agosto de 2014.
De posse desses dados obtive a totalidade de professores lotados nas escolas
públicas dos municípios da Microrregião do Salgado, que estavam trabalhando com a
disciplina de Matemática. Até este momento ainda não havia conhecimento acerca da
formação desses professores.
A partir desses dados, o primeiro passo foi pensar nos instrumentos para o
recolhimento de informações, que permitissem fazer a aproximação e as primeiras
indagações junto aos informantes. Isto, para obter informações mais gerais no que se
refere à formação acadêmica, prática docente, tempo de atuação no exercício
profissional, além de fornecer dados para constituir os critérios para selecionar os
colaboradores.
Instrumentos de recolhimento de informações
Na intenção de constituir as informações foi necessário pensar em instrumentos
que me permitissem fazer o recolhimento dessas informações no campo de
investigação, que aqui é visto [...] não como uma instância de verificação de uma
problemática, mas como o ponto de partida desta problematização (KAUFMANN,
2013, p. 44). Para tanto, fiz uso de dois instrumentos principais: questionário e
95
entrevista. No âmbito desta pesquisa utilizei a terminologia recolhimento das
informações para me referir ao trabalho realizado nos onze municípios da Microrregião
do Salgado, cenário desta investigação.
O primeiro instrumento utilizado foi um questionário. Para Minayo (2005), os
questionários [...] se configuram como dispositivos normatizados e padronizados, que
captam a presença ou a ausência de determinada característica ou atribuição no
indivíduo (p.133). Ao fazer uso do questionário o pesquisador deve ter cuidado na
elaboração desse instrumento, pois este deve ter [...] uma sequência de questões
precisas, concretas. A sequência das questões deve ser lógica e o conjunto coerente:
o discurso sem nexo e o “pot-pourri” devem ser sistematicamente combatidos
(KAUFMANN, 2013, p. 75).
As questões postas neste primeiro instrumento tinham como finalidade, não só
obter informações iniciais no que se refere a idade, sexo, tempo de atuação em sala
de aula, nível de atuação dos informantes. Mas, especialmente, para responder às
questões que serviram como critérios para selecionar os colaboradores desta
pesquisa. Os quatro critérios de seleção definidos por mim foram: ser licenciado em
Matemática (a pesquisa tem como principal sujeito de investigação o professor
licenciado em Matemática); ter feito a formação na UFPA no Campus de Castanhal
no período de 2002/2012 (por se o Campus de Castanhal o lugar que recebe o
estudante que vem da Microrregião e onde desenvolvo minha prática docente. Quanto
ao período, por acreditar que o professor que fez a formação até 2012, já teria tempo
de experiência de sala de aula); ser natural ou residir por pelo menos cinco anos
na microrregião (o professor que não é natural ou reside no município não interage
com a cultura e com as questões da educação local); estar em sala de aula na escola
pública no desempenho de suas funções (é importante que o sujeito da pesquisa
esteja em sala de aula da Educação Básica, convivendo com os desafios postos
diariamente na sala de aula).
A aplicação deste primeiro instrumento foi necessária para que houvesse uma
redução no número de informantes. Por ser a pesquisa de abordagem qualitativa, não
teria como fazer esta investigação com a totalidade de 169 professores lotados nas
escolas públicas da Microrregião do Salgado identificados junto aos órgãos
educacionais. Fato que inviabilizaria o uso da entrevista compreensiva sugerida por
Kaufmann (2013), para fazer o registro oral, necessário para identificar as possíveis
96
categorias emergentes a partir dos relatos dos colaboradores envolvidos nesta
pesquisa. Ressalta-se que o instrumento foi aplicado aos professores de todos os
onze municípios, no entanto, em razão dos critérios definidos foram selecionados
colaboradores nos municípios de Curuçá, Marapanim e Terra Alta. A partir do
tratamento dos dados apontados nos questionários e considerando os quatro critérios
de seleção, foi possível eleger oito colaboradores, como pode ser observado no
quadro 6.
Quadro 6 – Quantitativo de informantes da pesquisa
MUNICÍPIOS Nº de
Infor.
Quest. Aplica.
Quest. Resp.
Natural Mun.
UFPA Campus
Corte cronológico (2002/2012)
Manifestou Interesse
Colaborador Selecionado
Colares 18 13 07 03 02 00 04 00 Curuçá 15 11 09 07 04 03 03 03
Magalhães Barata
05 05 03 01 01 00 00 00
Maracanã 16 11 07 03 01 00 03 00 Marapanim 26 19 15 08 05 05 03 03 São Caetano 05 03 02 02 01 00 02 00 São João da Ponta
05 05 02 00 01 00 02 00
São João de Pirabas
05 05 04 01 02 02 00 00
Salinópolis 28 21 15 07 03 00 03 00 Terra Alta 14 09 07 03 02 02 02 02 Vigia de Nazaré 32 22 17 06 05 00 02 00
TOTAL 169 124 88 41 27 12 24 08
FONTE: Elaborado pela pesquisadora, com base nos dados informados nos questionários da pesquisa de campo. Jan/fev. 2015
Dois aspectos são importantes destacar para compreensão dos números
apresentados nas duas primeiras colunas do Quadro 6. Quando realizei o primeiro
levantamento apontado no Quadro 5 (p. 94), que corresponde ao quantitativo de
professores lotados nas escolas públicas, tanto da rede estadual quanto da rede
municipal de cada um dos onze municípios no segundo semestre de 2014, o quadro
de docentes lotados que trabalhavam com a disciplina de Matemática era de 169
professores.
Os dados informados no quadro 6 modificam-se no momento da aplicação dos
questionários pelas seguintes razões. A primeira razão é porque nem todos os
professores lotados nas escolas municipais eram concursados. Alguns eram
contratados e, geralmente no final do ano estes contratos são encerrados e no início
do ano letivo seguinte, os professores não são recontratados. Este fato justifica o
número de questionários aplicados ser menor que o número de informantes. A
97
segunda razão é porque nas escolas municipais existem professores lotados em sala
de aula, que ainda são estudantes do curso de Licenciatura em Matemática. A terceira
razão é que há professores licenciados em outras áreas (Física, Ciências Naturais),
que estão em sala de aula trabalhando com a disciplina Matemática. Uma quarta e
última razão, existe uma dupla vinculação, ou seja, o mesmo professor trabalha na
rede estadual e na municipal ao mesmo tempo. Desta forma, explica-se porque o
número de questionários aplicados é menor que o número de informantes e maior que
o número de questionários respondidos.
Colaboradores envolvidos nesta Investigação
Os oito sujeitos que foram selecionados passam a ser considerados nesta
pesquisa como colaboradores. Todos têm características similares. São egressos do
curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal do Pará, Campus
Universitário de Castanhal, no período de 2002 a 2012, lotados em salas de aula das
escolas públicas da Microrregião do Salgado. O período justifica-se por optar em
trabalhar com professores egressos do curso da década de 2002 a 2012, pois
considerei que estes já teriam um tempo significativo de atuação em sala de aula no
exercício docente, após terem concluído o curso de Licenciatura em Matemática.
Expresso a seguir, algumas informações a respeito dos oito colaboradores
envolvidos nesta pesquisa, a partir dos dados informados nos questionários. Esses
dados foram organizados em um quadro tendo como indicativos: o município a que
pertencem, o nome fictício usado no texto, a formação, a idade, tempo de sala de aula
e o nível de escolaridade que atua.
Quadro 7 - Colaboradores selecionados
Município Nome fictício
Formação Idade Tempo de sala de aula
Nível atuação
Curuçá
Fernando Mestre em Educação Matemática 34 anos 11 anos Ensino Fundamental
Carlos Licenciado em Matemática 32 anos 10 anos Ensino Médio
Bruno Especialista em Matemática Básica 37 anos 15 anos Ensino Fundamental
Marapanim Paulo Licenciado em Matemática 35 anos 12 anos Ensino Médio
Julia Especialista em Matemática Fundamental
29 anos 8 anos Ensino Fundamental
Jorge Especialista em Docência do Ensino Superior
33 anos 10 anos Ensino Fundamental
Terra Alta Clara Licenciado em Matemática 31 anos 9 anos Ensino Fundamental
João Licenciado em Matemática 28 anos 5 anos Ensino Fundamental
FONTE: Organizado pela pesquisadora com base na pesquisa de campo – Março/2015
98
Vale destacar que alguns dos colaboradores tem um tempo maior de atuação
na sala de aula, em decorrência de já desenvolverem atividade docente mesmo sem
terem a formação inicial. Alguns destes colaboradores iniciaram na profissão quando
tinham somente a formação no Magistério, dada a necessidade do profissional
professor nessa microrregião.
A partir da seleção dos colaboradores, elaborei um roteiro com questões
semiestruturadas que permitiu fazer a escuta por meio de relatos no que se refere a:
Saberes da formação inicial; Saberes da prática docente; Lacunas da formação inicial
e Saberes docentes como mediadores no processo de formação inicial.
Em se tratando da técnica de entrevista optei pela Entrevista Compreensiva
(KAUFMANN, 2013), que tem como princípio a formalização de um conhecimento
pessoal advindo do trabalho de campo, não como uma simples técnica, mas como [...]
um método de trabalho diferenciado e com propósitos claros, visando à produção
teórica a partir dos dados e está situada no cruzamento de diversas influências, pois
constitui de fato um método muito específico, com uma forte coerência interna
(KAUFMANN, 2013, p. 27). O que me levou a ter na entrevista, uma fonte inesgotável
de informações, cuja compreensão nunca se dará em sua totalidade. Por isto,
havendo a necessidade de retomadas constantes às informações constituídas, na
tentativa de encontrar saberes escondidos que não foram ditos, mas ficaram nas
entrelinhas das frases entrecortadas de silêncio.
Neste sentido, considero a entrevista não apenas como [...] uma simples
técnica de recolhimento de dados (Ibidem, p. 89), mas, principalmente, como descritor
de uma rede conceitual, que se compõe dos sentidos e significados atribuídos pelos
professores de Matemática da Microrregião do Salgado aos saberes docentes.
Com o roteiro de entrevista já organizado entrei em contato via e-mail com os
oito colaboradores selecionados para agendar data, hora e local para a realização das
entrevistas. Esta ação demandou tempo, pois em alguns casos não conseguia
agendar dia e hora para realizar a entrevista. Em outros, os encontros agendados para
entrevista ocorriam na própria escola em que esses colaboradores trabalham, durante
os intervalos das aulas e o tempo era muito exíguo para realizar uma entrevista em
que esses colaboradores pudessem se colocar de maneira mais tranquila.
99
Houve situações em que os encontros apesar de estarem agendados, não
ocorriam por razões outras não previstas. Sempre havia uma situação que impedia
e/ou atrapalhava o momento da entrevista, havendo a necessidade de outras idas ao
município. Este fato me levou a optar por outra via de acesso para entrevistá-los,
passei a fazer uso da internet e enviar o roteiro de entrevista para o correio eletrônico
dos colaboradores e desta forma viabilizar o retorno dos roteiros já respondidos.
Para fazer o registro dos relatos dos colaboradores em seus contextos de
prática, fiz uso da narrativa como ferramenta de escuta. Isto se justifica por ser o
método de escuta narrativa, um caminho para pensar e falar sobre a experiência.
Kaufmann (2013) defende que [...] toda pesquisa deveria poder ser exposta de forma
seguida, uma espécie de narrativa argumentativa (p. 149). Esse argumento do autor
preconiza a relevância do uso da narrativa como ferramenta de escuta em pesquisas
de natureza qualitativa, especialmente, quando intenciona dar voz aos colaboradores,
pois estudar é uma experiência de vida, seria a palavra-chave para a Educação, como
assinala John Dewey (1976).
O uso da narrativa como ferramenta de escuta, nesta proposta de investigação,
permitiu fazer reflexões acerca dos saberes docentes que estão vinculados a três
dimensões: Saberes Pessoal do Professor (o que ele aprendeu do convívio escolar,
familiar etc.); Saberes da Formação (o que aprendeu em processo de formação inicial
ou permanente) e Saberes da Prática Docente (a relação estabelecida entre o que já
sabia com o que aprendeu na construção de conceitos para o desenvolvimento de
sua prática docente diária).
As dimensões do saber acima apontadas permitiram uma aproximação entre
contexto investigado e o objeto de investigação, na perspectiva de compreender como
os saberes docentes podem ser entendidos como mediadores didáticos e conceituais
na formação de professores de Matemática. A partir da interação da pesquisadora
com o ambiente investigado outros elementos surgiram, resultando, certamente em
outros conhecimentos e interpretações não previstas. Pois a produção do
conhecimento não é um empreendimento isolado, [...] é uma construção coletiva da
comunidade científica, um processo continuado de busca, no qual cada nova
investigação se insere complementando ou contestando contribuições anteriormente
dadas ao estudo do tema (MAZZOTI, 1994, p. 27).
100
A necessidade de fazer uso de dois instrumentos (questionário e entrevista)
principais se deu pelo fato de não excluir de forma imediata, nenhum possível
informante. Isto é, todos os professores trabalhando com a disciplina de Matemática,
lotados nas escolas públicas da Microrregião do Salgado seriam, a princípio, um
colaborador em potencial. As respostas dadas aos questionários trouxeram
informações que após organizadas, agrupadas e estudadas do ponto de vista dos
critérios estabelecidos, tive condição de determinar quantos e quais seriam os
professores que fariam parte do segundo momento da investigação. Aqueles com os
quais fiz a pesquisa propriamente dita, fazendo uso da entrevista para ouvir os relatos
desses colaboradores.
Além dos dois instrumentos citados, não descartei outros materiais que foram
constituindo-se ao longo de minha permanência no campo de investigação. Estes, que
podiam variar em termos de formalidade, mas que acrescentaram informações de
grande relevância. Destacando-se: observações, conversas informais, anotações no
caderno de campo, materiais não escritos como fotos etc., que me apropriei para
garantir maior volume de material produzido intencionalmente para a elaboração do
corpus da análise empírica ou conceitual da investigação proposta.
É importante destacar que durante os dois anos e meio que permaneci no
campo de investigação, além da escuta dos colaboradores selecionados, não pude
abster-me de fazer o registro de outros informantes que poderiam certamente trazer
contribuições a esta pesquisa, com informações sobre um saber próprio da cultura
local. Esses outros informantes se referem ao barqueiro e ao curraleiro que fazem uso
de um saber próprio no exercício de suas atividades diárias, sem se dar conta da
importância desse saber. Os relatos desses informantes foram registrados e usados
como parte da construção da quinta seção que se constitui das últimas palavras,
trazendo abordagens acerca dos conhecimentos como modificadores de práticas.
Tratamento das informações constituídas
Descrevo sucintamente, sequenciando esta seção, a forma de tratamento das
informações que foram constituídas por meio dos questionários aplicados aos
informantes. As informações foram organizadas e agrupadas, visando a construção
101
de indicadores para a análise empírica do material, com vistas a selecionar os
colaboradores.
Para realizar esta análise tomei como base referenciada, Minayo (2005), que
defende que a organização dos questionários é uma estratégia de investigação que
combina métodos e técnicas, pois que é possível trabalhar em um único instrumento,
informações quantitativas e qualitativas, o que permite uma descrição mais rica e
completa dos fenômenos, aqui demonstradas graficamente.
A análise dos questionários teve dois propósitos. Primeiro, selecionar os
colaboradores desta investigação. Segundo, organizar graficamente os dados
quantitativos de maneira a permitir a visualização das informações construídas no
primeiro momento da investigação. Assim, os Gráficos de 2 a 8 trazem as informações
relativas às questões que foram abordadas no questionário.
No Gráfico 2 os dados informados referem-se ao quantitativo de professores
lotados nas escolas públicas que trabalham com a disciplina Matemática, tendo as
seguintes áreas de formação: Licenciatura em Matemática, Licenciatura em Física e
Licenciatura em Ciências Naturais. Mostra ainda, a situação do contrato de trabalho
desses profissionais e a dupla vinculação, ou seja, os professores têm vínculos
empregatícios tanto com a rede de ensino municipal quanto a estadual, como já
informado.
Gráfico 2 – Quantitativo de Professores que trabalham com a disciplina Matemática nas escolas da Microrregião do Salgado.
Fonte: Organizado pela pesquisadora a partir dos dados informados no campo de pesquisa.
88
28 23 17 13
169
0
50
100
150
200
Licenciadosem
Matemática
Contratoencerrado
Duplovínculo
Licenciadosem Ciências
Naturais
Licenciadosem Física
Total
Total geral de informantes
102
Como observado no gráfico 2, ainda existem escolas que têm em seu quadro
docente professores licenciados em outras áreas trabalhando com a disciplina de
Matemática, pela ausência do licenciado na área. De acordo com dados informados
pelo Censo Escolar de 2015, divulgado pelo Ministério da Educação (MEC), quase
40% dos professores do Brasil não tem formação adequada. Ainda segundo o MEC,
o quantitativo de 200.816 docentes de escolas públicas do país, ministram aulas em
disciplinas nas quais não são formados.
Em outros casos, registrou-se a contratação de estudantes dos cursos de
licenciatura em Matemática para estarem em sala de aula. Esta não é uma
constatação somente das escolas da Microrregião do Salgado. Segundo dados
informados pelo MEC, 90.20416 das vagas existentes nas escolas públicas do país,
ainda são ocupadas por professores que se quer têm formação superior.
No Gráfico 3 as informações referem-se à formação acadêmica dos professores
que responderam aos questionários, totalizando 88 informantes. Desses, dezessete
tem curso de Especialização e um tem Mestrado.
Gráfico 3 – Formação Acadêmica dos Informantes Fonte: Organizado pela pesquisadora a partir dos dados informados nos
Questionários.
Ao levar-se em consideração que um dos critérios para ser um informante seria
ser licenciado em Matemática, observa-se que dos 88 que responderam ao
16 Dados disponíveis em: http://portal.inep.gov.br/basica-censo
88
17
1 00
25
50
75
100
Graduação Especialização Mestrado Doutorado
Formação acadêmica
103
questionário 100% tem a formação exigida. Contudo, a formação permanente desses
informantes ainda é considerada pouco expressiva, pois geralmente a formação
permanente ofertada pelas instituições formadoras é de difícil acesso a esses
profissionais. Pois são ofertadas em período em que esses professores estão em sala
de aula ou, por vezes, essa formação é paga, despesa essa que foge ao planejamento
orçamentário desses profissionais.
No Gráfico 4 os dados referem-se à instituição onde o informante fez o curso
de licenciatura em Matemática. Vale destacar que um dos critérios para participar da
pesquisa foi de que o informante teria que ter feito o curso de Licenciatura em
Matemática na Universidade Federal do Pará – UFPA, Campus Universitário de
Castanhal no período de 2002 a 2012. Porque a pesquisa intencionava trabalhar
somente com egressos do curso de Licenciatura em Matemática do referido campus.
Gráfico 4 – Instituição da Formação Inicial dos Informantes Fonte: Organizado pela pesquisadora a partir dos dados informados nos Questionários.
Do total de 88 informantes, 43 fizeram a formação inicial na Universidade
Federal do Pará, o que corresponde a 48,86%. Este percentual é significativo, do
ponto de vista de que desse total, 27 que corresponde a 62,79%, fizeram a graduação
no Campus Universitário de Castanhal, ou seja, são egressos do curso de Licenciatura
em Matemática.
Outra informação que a pesquisa revelou, apontada no Gráfico 5, foi quanto ao
gênero dos informantes. Dos 88 informantes que responderam aos questionários,
76,14% (67) são homens e 23,86% (21) são mulheres.
43
25
11 90
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
UFPA UEPA UVA Outra
Instituição de Ensino
UFPA
UEPA
UVA
Outra
104
Gráfico 5 – Quantitativo por gênero dos Informantes. Fonte: Organizado pela pesquisadora a partir dos dados informados.
Estes dados apontam que o número de mulheres atuando como professoras
de Matemática ainda é pouco expressivo em relação ao número de homens. Este
resultado transcorre pela velha retórica defendida pelos profissionais da “linha dura”
da área de que o curso de Matemática não foi feito para mulheres. No entanto, este
quadro já começa a mudar, pois se observa presença significativa da figura feminina
nas salas de aula dos cursos de Licenciatura em Matemática do Campus Universitário
de Castanhal.
No Gráfico 6 a seguir, os dados referem-se ao nível e modalidade de ensino
em que os informantes desenvolvem suas práticas docentes.
Gráfico 6 – Nível de atuação docente dos Informantes.
Fonte: Organizado pela pesquisadora a partir dos dados informados nos Questionários.
67
21
0
10
20
30
40
50
60
Masculino Femimino
Gênero
Masculino
Femimino
59
29
0 00
10
20
30
40
50
60
70
EnsinoFundamental
Ensino Médio Educação Infantil Ensino Superior
Prática docente - nível de ensino
105
É possível observar que o Ensino Fundamental é o nível de escolaridade com
maior índice de atuação dos informantes, seguido do Ensino Médio. Isto significa que
todos os informantes são lotados com hora aula. Cada professor lotado com hora aula
representa uma carga horária de cinco a seis horas aulas por turno. O professor de
Matemática assume essa carga horária, porque a Matemática é uma disciplina da
base comum nacional (LDB 9.394/96). Tem uma carga horária alta, que deve ser
cumprida nas oitocentas horas e nos duzentos dias letivos estabelecidos pelos
sistemas de ensino, para o cumprimento do programa curricular estabelecido para
cada ano escolar.
No Gráfico 7 a seguir, os dados referem-se ao tempo de atuação em sala de
aula dos informantes, considerado como um dos critérios para selecionar os
colaboradores, o corte cronológico de 2001 a 2012.
Gráfico 7 – Tempo de atuação docente dos Informantes Fonte: Organizado pela pesquisadora a partir dos dados informados nos Questionários.
O que se observa no gráfico é que a maioria dos informantes têm de cinco a
dez anos de atuação em sala de aula. Fato que de certa forma indica que o professor
que fez a Licenciatura em Matemática no período referido, entrou no mercado de
trabalho logo após ter terminado o curso de formação inicial. Significa que a maioria
tem uma boa experiência de sala de aula, o que se configura com o plano de corte da
década de 2002 a 2012, em que considerei que o informante egresso já deveria ter
certa experiência de sala de aula.
39
2623
0
10
20
30
40
50
De cinco a dez anos Mais de dez anos De um a quatro anos
Tempo de docência
106
No Gráfico 8 a seguir, os dados apontados referem-se ao número de
informantes que manifestaram interesse em ser um colaborador da pesquisa e
dispuseram seus endereços eletrônicos para contatos futuros desta pesquisadora
como um possível colaborador.
Gráfico 8 – Quantitativo de informantes que manifestaram interesse em ser um colaborador.
Fonte: Organizado pela pesquisadora a partir dos dados informados nos Questionários.
O que se observa no Gráfico 8 é um número pouco expressivo de informantes
que manifestaram interesse em ser um colaborador. Observei que houve por parte do
informante, certo receio em participar da pesquisa, havia sempre um ar de
desconfiança. Apesar de ter sido explicitado a intenção da pesquisa, ainda assim
havia professores que me perguntavam se os dados seriam usados pela secretaria
municipal de educação. Nesses momentos de indecisão era necessário informar que
os dados seriam usados única e exclusivamente para fins acadêmicos. Portanto, dos
24 informantes que manifestaram interesse em ser um colaborador, somente oito
foram selecionados para participarem da pesquisa por conta dos critérios de seleção.
Os dados apontados nos questionários foram organizados na forma de
gráficos, como visto. No entanto, das observações, das conversas informais e dos
registros feitos nas inúmeras idas e vindas no campo de investigação, surgiu a ideia
de construir uma Arquitetura Conceitual (KAUFFMAN, 2013), em que essas
informações pudessem ser organizadas. Portanto, a construção desta arquitetura
conceitual se deu a partir da interpretação das informações constituídas ao longo da
investigação. Isto, na perspectiva de ter uma visão das três dimensões (Saber Pessoal
24
64
0
10
20
30
40
50
60
70
Sim Não
Interesse em ser um colaborador
Sim
Não
107
do Professor, Saber da Formação e Saber da Prática) de saber, como forma de
organizar as ideias e conceitos que foram se construindo. E, dessa forma, ter a
percepção sobre o objeto investigado, com vistas a aproximar-me de futuros
encaminhamentos no procedimento de análise teórico-conceitual, que estão
demonstrados na Arquitetura Conceitual, que faz parte da quarta seção em que faço
a análise teórico-conceitual dos relatos dos colaboradores.
Procedimentos de Análise teórico-conceitual
Para realizar a análise dos textos produzidos no campo de investigação, tomo
como base referenciada a Análise Textual Discursiva – ATD proposta por Moraes e
Galiazzi (2011), que corresponde a uma metodologia de análise de dados qualitativos
que busca interpretar e construir novas compreensões a partir dos relatos dos
colaboradores.
Outro aspecto que me levou a fazer a escolha por este método é porque esse
tipo de análise pode ser entendido como uma aprendizagem. Insere-se em
movimentos de produção e reconstrução das realidades, combinando em seus
exercícios de pesquisa hermenêutica e a dialética. Desta forma, tende a perceber
seus objetos de pesquisa como discursos, não como fenômenos ou conceitos
isolados.
A Análise Textual Discursiva - TAD como um método de análise tem a
preocupação tanto com os aspectos descritivos quanto com os interpretativos. Ou
seja, tanto analisa o que está expresso no texto quanto analisa o próprio texto. O que
de certa forma deixou-me confortável nessa escolha, considerando que é preciso
compreender que não há descrição sem interpretação. (ORLANDI, 1999, p. 60).
A Analise Textual Discursiva enquanto uma metodologia de análise é vista por
Moraes e Galiazzi (2011), não como um conjunto rígido de procedimentos, mas como
um conjunto de orientações, abertas, reconstruídas em cada trabalho de pesquisa (p.
141). Desta forma, a ATD insere-se em movimentos de produção e reconstrução das
realidades investigadas.
Neste sentido,
[...] as transformações que pretende se constituem nos próprios movimentos de construção de novas compreensões dos fenômenos e
108
discursos com que se envolve, não exigindo teorias externas para orientar suas ações de transformação. Nisso a autoria e competência argumentativa assumem papel central (MORAES E GALIAZZI, 2011, p.151).
Nessa perspectiva, a ATD possibilita expressar sentidos e significados às
nossas interações com a diversidade de sujeitos envolvidos na investigação. Assim
como, trata as informações do ponto de vista de sua intencionalidade e resulta em
novas compreensões, a partir das análises das informações constituídas
intencionalmente para esta investigação.
A análise referida dar-se-á por meio da articulação de categorias, a partir dos
relatos dos colaboradores que pressupõe criar proposições teóricas que apontaram
as primeiras considerações daquilo que a pesquisa se propôs a realizar. Isto é,
compreender de que forma os saberes docentes podem ser entendidos como
mediadores didáticos e conceituais na formação inicial de professores de Matemática.
Portanto, o processo de análise consiste em [...] um constante ir-e-vir agrupar e
desagrupar, construir e desconstruir e de constantes retomadas, avaliando-se com
frequência tudo o que já foi realizado para refazê-lo ou melhorá-lo (MORAES e
GALIAZZI, 2011, p. 187).
Para a análise conceitual não pensei em categorias prévias, pois esta análise
teria maior significado se essas categorias emergissem de forma gradativa, a partir
das informações construídas e da relação que se estabeleceu entre elas.
Considerando que numa pesquisa qualitativa o pesquisador deve ser capaz de
reconstruir seu entendimento e perceber o sentido naquilo que escreve, de onde
escreve, como escreve e para que escreve. Isto, na perspectiva de compreender que
o processo de escrita é uma forma de criar novos conhecimentos e abrir outros
horizontes.
Desta maneira, as categorias construídas de forma emergente podem criar um
movimento de análise mais flexível, em que o pesquisador tenha melhor compreensão
de uma parte do todo a partir de unidades isoladas. Ou seja: [...] cada categoria de
análise passa a construir uma perspectiva de exame, um direcionamento do olhar
dentro do todo (MORAES e GALIAZZI, 2011, p. 155).
109
Ao fazer uso da ATD, tinha a clareza de que as informações constituídas
deveriam passar por um processo que Moraes e Galiazzi (2011) denominam de
processo auto-organizado, que gira em torno de três movimentos.
O primeiro movimento é feito pela desmontagem dos textos ou unitarização.
Neste movimento, ocorre o que os autores denominam de explosão de ideias, a partir
da uma leitura aprofundada e compreensiva dos textos que foram construídos em
campo, na perspectiva de encontrar possíveis unidades de análise. Visto de outra
forma é necessário inicialmente juntar todo o material produzido que forma o corpus
do texto. Assim fazer o processo de imersão de leituras e releituras para,
posteriormente, fazer a separação, o isolamento ou fragmentação, que vai criar uma
grande desordem.
No segundo movimento, essas unidades de análises devem ser organizadas a
partir de conteúdos recursivos e/ou aproximativos, formando a base para a construção
das categorias: [...] o que se propõe na análise textual discursiva é utilizar as
categorias como modos de focalizar o todo por meio das partes (MORAES E
GALIAZZI, 2011, p. 27). Essas categorias vão surgir a partir dos relatos dos
colaboradores, que geraram focos de sentidos e, após terem sido agrupados,
apontaram o surgimento de possíveis unidades de significados.
O terceiro movimento ocorre da impregnação dos textos, momento em que o
pesquisador inicia um processo de captação do novo. Este processo [...] exige que o
pesquisador faça uma impregnação mais aprofundada nos materiais da análise. Isso
possibilita a emergência de novas compreensões, processo que se concebe funcionar
por auto-organização (MORAES e GALIAZZI, 2011, p. 134). Essa compreensão
encerra a sequência de análise, pois aqui ocorre a interlocução com as teorias que
servem de base para fundamentar as discussões e provocar o surgimento do novo,
por via da interpretação da questão de investigação,
Apesar desse processo possibilitar uma visão mais detalhada do material para
realizar a análise conceitual de forma mais abrangente, isto não significa que a análise
vai dar conta tanto das categorias surgidas das relações entre os elementos contidos
no texto do corpus, quanto das categorias que podem emergir desse processo. Isso,
pois:
110
[...] nenhuma análise pode abranger o fenômeno investigado em sua totalidade. Nenhum discurso pode ser descrito de modo integral. Os resultados de qualquer análise sempre apresentam apenas uma
versão parcial e incompleta dos fenômenos investigados (MORAES e GALIAZZI, 2011, p. 132).
Portanto, ao realizar a análise o pesquisador deve ter em conta que por mais
que ele faça a análise em sua totalidade, ainda assim, haverá aspectos que não foram
identificados ou não foram percebidos nos momentos de impregnação do material
constituído, pois todo pesquisador deve estar preparado para lidar com os limites do
processo.
Além da impregnação ou dos mergulhos mais profundos no material de análise
constituído, é necessário que o pesquisador se atente para o conjunto de
pressupostos que irão fundamentar seu trabalho. A esse respeito, Moraes e Galiazzi
(2011), sinalizam que:
[...] dependendo dos pressupostos que fundamentam o trabalho, a análise pode ter diferentes encaminhamentos e resultados. Esses pressupostos podem ser de natureza ontológica, epistemológica e axiológica, correspondendo aos modos de entender a realidade, a produção do conhecimento e a valores (p. 135).
O que é sinalizado pelos autores chamou minha atenção, pois esta foi uma de
minhas preocupações e um cuidado que precisei ter ao realizar a análise dos relatos
dos colaboradores. Posto que, estes são concebidos como tendo uma natureza
comum, que é inerente a todos da Microrregião do Salgado, mas sem desconsiderar
a natureza de cada um deles em particular, no sentido ontológico do termo.
Outro aspecto que mereceu minha atenção é quanto aos valores desses
informantes. Estes devem ser vistos como um aspecto central no processo de análise,
pois esses sujeitos têm pressupostos axiológicos constituídos, que devem ser
respeitados no momento de se lidar com esses relatos que estão impregnados de
valores, de conceitos etc. Neste sentido, há que considerar ainda que cada um dos
informantes construiu princípios epistemológicos ao longo de sua formação, que
foram/são consolidados e/ou reforçados em seu ambiente de prática. O que me levou
a ter um cuidado maior ao realizar a análise conceitual das informações constituídas.
Assim, o envolver-se com a Análise Textual Discursiva exige do pesquisador:
111
[...] assumir-se nos movimentos de seu próprio pensamento, na procura de novos sentidos que necessitam ser produzidos ao longo do processo, sem ter ponto de chegada previsto. [...] nisso, o processo também solicita que o pesquisador também se assume como autor das verdades que vai constituindo e expressando (MOARES e GALIAZZI, 2013, p.170).
Além dos aspectos sinalizados, um especial cativou-me no uso da ATD. É o
que se refere à capacidade de integrar o comunicar com o aprender e o transformar,
que é o que se intenciona com os possíveis resultados desta pesquisa, como já
sinalizado no final da primeira seção.
Ao tomar-se como base os três movimentos apontados por Moraes e Galiazzi
(2011) e impregnada pelos textos de campo, sentia-me segura para ir ao encontro das
unidades de significados, que foram atribuídas pelos colaboradores aos relatos feitos
às indagações que deram corpo na montagem do texto de análise. Dessa forma foi
possível eleger cinco categorias que deram origem às unidades de significados de
análise, que foram pensados na seguinte sequência: FORMAÇÃO INICIAL: prática
formativa baseada em conteúdos; LACUNAS DA FORMAÇÃO: comprometimento da
prática na sala de aula; SABERES DO CONHECIMENTO ESPECÍFICO: sentidos e
significados; PRÁTICA DOCENTE: ensinando e aprendendo a ser professor na sala
de aula e, SABERES DOCENTES: mediadores da/na formação inicial.
Neste sentido, esta pesquisa justifica-se por sua intencionalidade, à medida
que, entrar na discussão que tenha como ponto de partida os Saberes, somos
conduzidos a revisitar a literatura para visualizar os vários significados que são
atribuídos à palavra Saber. No entanto, tomei aqui como interlocução preferencial, a
Teoria da Docência como profissão de interações humanas, defendida por Maurice
Tardif, sem, contudo, ignorar os demais teóricos que discutem a temática investigada.
Assim, no âmbito desta pesquisa, fui provocada a refletir sobre as
singularidades e potencialidades dos saberes docentes que se desenham no cenário
da pesquisa, de modo a sistematizar as compreensões de saberes no campo das
teorias e das práticas, a partir das concepções dos colaboradores envolvidos. Estas
são razões que sustentam esta pesquisa. Pois são aspectos relevantes de serem
investigados e que têm me provocado enquanto pesquisadora, a partir das
inquietações surgidas das minhas reflexões e das vivências no ambiente de prática
docente. Isto, na perspectiva de suscitar contribuições para a valorização dos saberes
112
docentes que se desenham no cenário da pesquisa, dada sua relevância, viabilidade
e inovação, tanto do ponto de vista social quanto científico.
Desta forma, os conhecimentos sistematizados serão devolvidos ao cenário
investigado, por meio de seminários, estudos em grupo, ação de extensão e outras.
Para que possam ser viabilizadas, tendo como objetivo maior, devolver aos
colaboradores envolvidos na investigação, o conhecimento constituído, visando sua
utilização de forma útil. Isto, para que esses resultados possam ser socializados,
compartilhados e publicados, para servir de referencial para estudos posteriores. Os
resultados de pesquisas realizadas com o uso da ATD [...] podem ser entendidos
como uma combinação de comunicação, aprendizagem e intervenção (MOARES e
GALIAZZI, 2013, p. 136), o que de certa forma, pode vir a ser um provocador de
mudanças no contexto investigado.
Reafirmo que a feitura deste percurso metodológico tem como pressuposto
conduzir a investigação para responder ao seu principal objetivo: analisar os saberes
docentes de professores da Microrregião do Salgado, para compreender de que forma
estes podem ser entendidos como mediadores didáticos e conceituais na perspectiva
de minimizar as lacunas na formação inicial de professores de Matemática.
Assim sendo, é importante não perder o fio condutor da investigação, razão
essa que me deixa à vontade para dizer que aqui fiz referência a um indicativo do
possível percurso que a pesquisa seguiu. Visto que este caminho não estava preso
às amarras dos métodos, por conseguinte, outros elementos metodológicos puderam
ser incorporados e/ou utilizados no decorrer da pesquisa. Pois esta pesquisadora tem
responsabilidades sociais sobre o conhecimento que foi produzido. Portanto, podendo
agir sobre esse conhecimento dando-lhe um toque de pertencimento.
Epílogo desta Seção
Retomo a ideia inicial desta seção em que descrevo os caminhos que foram
percorridos para a definição, organização, sistematização e análise das informações
constituídas no campo de investigação. Aqui desenhei o caminho metodológico que
foi trilhado nesta pesquisa, com vistas a estabelecer uma identificação, uma
verificação e uma análise dos saberes docentes de professores de Matemática da
Microrregião do Salgado. Desta forma a metodologia foi o fio condutor para me guiar
113
em cada pequeno passo dado na busca por uma teoria explicativa para cada sentido
e para cada significado, que foram expressados e refletidos de diferentes formas pelos
colaboradores a partir de seu contexto real.
A compilação das informações trouxeram respostas ao objetivo principal desta
pesquisa que se propôs analisar os saberes docentes de professores da Microrregião
do Salgado para compreender de que forma estes podem ser entendidos como
mediadores didáticos e conceituais na formação inicial de professores de Matemática,
pois compreender os saberes docentes dos professores de Matemática da
Microrregião do Salgado é possibilitar a mediação entre os saberes didáticos e
conceituais na perspectiva de contribuir para minimizar as lacunas de formação inicial
de professores de Matemática.
A pesquisa de campo foi centrada nos onze municípios (Curuçá, Colares,
Magalhães Barata, Maracanã, Marapanim, São Caetano de Odivelas, São João da
Ponta, São João de Pirabas, Terra Alta, Vigia de Nazaré e Salinópolis) que fazem
parte da Microrregião do Salgado, localizada na Mesorregião Nordeste do Estado do
Pará. Tendo como sujeitos os professores Licenciados em Matemática, lotados nas
escolas públicas da Microrregião. As informações foram constituídas por meio de
questionário e entrevistas com questões semiestruturadas.
A Análise Textual Discursiva foi a base referenciada para a elaboração,
organização e análise das categorias emergentes, que decorreu do processo de
interlocução dos relatos dos colaboradores, dos interlocutores teóricos e de minhas
intervenções. Pois a escrita é sempre compartilhada por meio das vozes implicadas
nessa construção.
Nesta seção apresentei os primeiros resultados quantitativos da pesquisa que
foram identificados por meio dos questionários aplicados aos informantes, em que as
questões postas, serviram de instrumento para a seleção dos colaboradores.
Ressalta-se que as citações que estão postas ao longo no corpo do texto, são
destacadas em itálico e não aspado. Assim como, faço uso do sistema autor-data para
referenciar as citações. Ressalta-se ainda, que a partir das orientações recebidas na
qualificação da tese, houve a necessidade de fazer uma retomada ao campo de
pesquisa para ouvir outros informantes no que se refere às informações de um saber
da cultura local, produzido pelos construtores de barco e de curral de pesca.
114
Finalizo julgando relevante anunciar que a seção que se segue, busca nas
análises dos textos de campo inferir sobre a questão de investigação que incide sobre
os saberes docentes de professores de Matemática da Microrregião do Salgado.
Momento em que ocorre a interlocução entre os relatos dos colaboradores, as teorias
que discutem a temática e as intervenções da pesquisadora.
115
4. Saberes de Professores de Matemática
Estas são mistura de “você” e “eu”, do
participante e do pesquisador – são notas
sobre o que você fez, sobre o que eu fiz com
você, sobre o que estava ao nosso redor,
sobre o lugar onde estávamos, sobre
sentimentos, sobre eventos correntes e sobre
lembranças de fatos passados. (CONNELLY E
CLANDININ, 2011).
É chegado o momento em que preciso libertar-me de minhas amarras,
desvencilhar-me dos meus medos e começar uma conversa em que “eu” e “vocês”
possamos nos afinar e conseguir encontrar o equilíbrio necessário para juntos
construirmos nossas verdades e tornarmos também verdadeiros os sons que vão
ecoar dessas conversas.
É aqui e agora que acontece o encontro com um turbilhão de informações. Elas
constituíram-se ao longo dessa caminhada e, que após vistas, revistas, lidas e relidas,
provocaram os primeiros entendimentos para o surgimento das unidades iniciais de
significados. Isto, na perspectiva de construir o corpus desta composição textual,
articulando a voz dos colaboradores, às teorias que discutem a temática e à
interpretação desta pesquisadora. Fatos que, em meio a relatos, também me
causaram incertezas e provocaram sensação de medo, o que sinalizava que estava a
viver a elaboração de uma tese.
Desta forma, esta seção que denomino de Sobre Saberes de Professores de
Matemática, tem como objetivo dar voz aos colaboradores, por meio da Análise
Textual Discursiva (MORAES e GALIAZZI, 2011), já detalhada na terceira seção, que
permitirá fazer reflexões acerca das descrições e das formações discursivas. Neste
sentido, esta seção propõe-se a fazer a análise das categorias que deram origem às
unidades de significados, que emergiram a partir das informações constituídas no
campo de investigação. Setor em que os colaboradores fizeram seus relatos,
deixando-se levar pelos saberes e pelos conhecimentos resultantes do convívio
pessoal e profissional no contexto investigado.
116
Antes de dar início à análise das unidades de significados, compartilho por meio
de uma arquitetura conceitual, informações que foram constituindo-se ao longo de
minha permanência no campo de pesquisa. Assim, da soma dessas informações
surgiram conceitos, que apontam na direção de uma formação do professor, por via
das inter-relações que se estabelecem em contexto social, pessoal e profissional.
Nesta pesquisa compreende-se Arquitetura Conceitual – AC como o termo que
define tipos de construções e práticas para fazer uso de conceitualismos. É
caracterizada pela introdução de ideias e pensamentos que são organizados de forma
a facilitar seu entendimento (KAUFMANN, 2013).
Para a construção da Arquitetura Conceitual apropriei-me das informações e as
organizei, tendo como base principal o Saber e o Conhecimento que estão
intrinsecamente relacionados à formação do professor. Nesse sentido, tanto o saber
quanto o conhecimento são elementos essenciais que determinam, não só o poder
exercido sobre o objeto, mas o fazer uso do objeto.
Dessa forma faz-se necessário inicialmente, ter a compreensão das
conceituações que diferenciam Saber e Conhecimento, considerando que esta
pesquisa tem como principal objeto de estudo o Saber Docente, que pode ser visto
como o conjunto de elementos que estão contidos no movimento exercido pelo
docente para ensinar determinado conhecimento.
Para falar da diferença entre Saber e Conhecimento tomo como base
referenciada os estudos realizados por Michel Foucault (2008), que aponta o porquê
de um conceito se diferenciar do outro. Enquanto o Conhecimento corresponde à
constituição de discursos sobre classes de objetos julgados cognoscíveis. Isto é, à
construção de um processo complexo de racionalização, de identificação e de
classificação dos objetos, o Saber designa o processo pelo qual o sujeito do
conhecimento, ao invés de ser fixo, sofre uma modificação durante o trabalho que ele
efetua na atividade de conhecer. Em outras palavras, pode-se dizer que o
conhecimento é mais denso, mais consistente, enquanto o saber é sutil e em
constante mudança. Neste pensar, [...] o saber é o conjunto de elementos, formados
de maneira regular por uma prática discursiva e indispensáveis à constituição de uma
ciência, apesar de não se destinarem necessariamente a lhe dar lugar, pode-se
chamar saber (FOUCAULT, 2008. p. 208).
117
Compreende-se, considerando o pensamento do autor, que um saber é sempre
parte de um todo, em que o sujeito ao posicionar-se em determinado contexto pode
estar falando de um saber que foi adquirido e transformado em momento de aplicação
prática. Nas palavras do autor:
[...] o saber também é o espaço em que o sujeito pode tomar posição para falar dos objetos de que se ocupa em seu discurso [...] um saber é também o campo de coordenação e de subordinação dos enunciados em que os conceitos aparecem, se definem, se aplicam e se transformam [...] finalmente, um saber se define por possibilidades de utilização e de apropriação oferecidas pelo discurso. Há saberes que são independentes das ciências (que não são nem seu esboço histórico, nem o avesso vivido); mas não há saber sem uma prática discursiva definida, e toda prática discursiva pode definir-se pelo saber que ela forma (FOUCAULT, 2008, p. 209).
Portanto, fazer reflexões acerca dos saberes docentes que se originam da/na
subjetividade e dos conhecimentos científicos configurados na formação inicial e na
prática docente, é dispor-se a lidar com um emaranhado de conceitos, critérios,
propostas, teorias e práticas, que são ao mesmo tempo essência e forma de ação
educativa.
Para Tardif (2014) a questão do saber dos professores constitui-se, atualmente,
a preocupação central de várias correntes de pesquisas, as quais se proclamam
partidárias de diversas concepções do saber e do ensino. No entanto, essas
pesquisas só poderão ser validadas se:
[...] os pesquisadores saírem de seus laboratórios, saírem de seus gabinetes na universidade, largar seus computadores, largar seus livros e [...] ir diretamente aos lugares onde os profissionais do ensino trabalham para ver como eles pensam e falam, como trabalham na sala de aula, como transformam programas escolares para torná-los efetivos, como interagem com os pais dos alunos, com seus colegas etc. (TARDIF, 2014, p. 258).
Neste sentido é necessário pensar que investigar sobre saberes de professores
não é se interessar pelo que os professores deveriam ser e fazer, mas, pelo que eles
são, fazem e sabem realmente, a partir do estudo do conjunto dos saberes
mobilizados e utilizados pelos professores em todas as suas atividades docentes.
118
Portanto, discutir saberes subjetivos por meio dos relatos dos colaboradores é, sem
dúvida, um desafio a ser vencido, considerando as diversas conceituações apontadas
pelos teóricos que têm contribuído com debates, que se travam no interior dos
espaços de formação.
Assim, na construção desta seção, intenciono falar de um saber
contemporâneo, que foi expressado pelos colaboradores em seus ambientes de
prática, a partir de suas concepções, dos sentidos e dos significados sobre Saber. No
entanto, para falar de saber neste contexto atual, necessário se faz retomar as
concepções que foram sendo construídas ao longo da história. Pois que é nesse
percurso que os atuais conceitos são embasados. Para tanto, busco em pensadores
como Platão, Aristóteles, Foucault, Descartes e Kant, conceituações sobre o que é
Saber numa concepção filosófica.
Quadro 8 – Conceituação de Saber numa concepção filosófica
Platão O “saber” denota uma opinião verdadeira acompanhada de uma explicação e de um pensamento fundado na episteme. A episteme é o "lugar" onde o homem "faz a sua história".
Aristóteles O “saber” consiste na busca da verdade, ou seja, dos princípios e causas do real, que se dá por meio da arte, da ciência e da sabedoria.
Foucault O “saber” se define por possibilidade de utilização e apropriação oferecidas pelo discurso.
Descartes Define “saber” como um tipo particular de certeza subjetiva produzida pelo pensamento racional.
Kant Delibera “saber” como um ter por verdadeiro suficiente, tanto subjetivo como objetivamente.
FONTE: Elaborado pela pesquisadora para designar saber na concepção dos teóricos.
Na concepção desses pensadores, o Saber perpassa pelo pensamento
subjetivo dos sujeitos pensantes que são organizados por meio da interação com os
objetos - instituições, pessoas, lugares - que o homem vai se construindo como
membro de uma sociedade, de uma cultura, como sujeito singular que tem uma
história também singular (CHARLOT, 2013). Portanto, essas concepções de saber
não se distanciam de uma visão mais atual de teóricos como Gauthier et al (1998),
Tardif (2002/2014), Schön (1983) e Shulman (1986a), que têm desenvolvido
pesquisas sobre saberes de professores.
119
Para Tardif (2002), a noção de saber remete a um sentido amplo que engloba
os conhecimentos, as habilidades (ou aptidões) e as atitudes dos docentes, ou seja,
aquilo que foi muitas vezes chamado de saber, saber fazer e saber ser. (p. 60). Os
estudos realizados pelo autor estão centrados em compreender os diversos saberes
que os sujeitos constroem e que são construídos por meio das diferentes interações.
Ações estas que ocorrem nas instituições de formação, na formação profissional, nos
currículos, na prática cotidiana e das relações que se estabelecem entre os sujeitos e
seus saberes.
Tardif chama a atenção para a existência de um saber específico, aquele que
é feito da soma de todos os outros saberes no fazer cotidiano da profissão. Neste
sentido, o autor defende a tese de que a existência de um saber efetivamente
específico à classe profissional de professores que é o saber da ação pedagógica
resulta da relação de complementação estabelecida entre os demais saberes do
professor. No meu entendimento, esse saber específico faz-se no cotidiano,
construído de diferentes e variadas formas de apropriação de fontes, que são
mobilizadas pelo profissional, em resposta às necessidades surgidas no exercício da
profissão que faz do saber docente, um Saber Plural (TARDIF, 2014).
Nesta perspectiva, Tardif defende a Teoria da Docência como profissão de
interações humanas. Tal teoria baseia-se no argumento de que:
A presença de um “objeto humano” modifica profundamente a própria natureza do trabalho e a atividade do trabalhador. A presença de outrem diante do trabalhador conduz, inevitavelmente, a um novo modo de relação do trabalhador com seu objeto: a interação humana (TARDIF e LESSARD, 2014, p. 28/29).
Em concordância com os autores, considero a docência como uma atividade
eminentemente humana. Portanto, ensinar é trabalhar com seres humanos, sobre
seres humanos, para seres humanos (ibidem, p. 31), razão essa que me leva a tomar
a Teoria da Docência, como a base principal para desenvolver a análise das unidades
de significados.
Em relação aos saberes mobilizados pelo professor, Gauthier (1998) aponta
que esses saberes são resultados da soma de seis outros saberes - saber disciplinar,
120
saber curricular, saber das ciências da educação, saber da tradição pedagógica, saber
experiencial e saber da ação pedagógica. Para Gauthier, ao somar esses saberes, o
professor, de certa forma, está fazendo uma espécie de reservatório para se
abastecer sempre que houver necessidade de responder a uma situação real de
ensino, do/no lugar onde o professor desenvolve sua prática e onde ele mobiliza os
saberes da profissão, em um movimento diário entre o ser e o fazer da/na ação de
ensinar.
Em se tratando do lugar de aquisição dos saberes profissionais dos
professores, que na concepção de Platão, pode ser visto como o "lugar" onde o
homem "faz a sua história" considera-se que o processo de constituição do
profissional professor, não se restringe ao presente (GAUTHIER et al, 1998), ele se
dá dentro de uma característica temporal e espacial, em que os conhecimentos
foram/são construídos em meio às trajetórias de vida pessoal, profissional, familiar e
escolar de cada profissional.
Os saberes de professores são questões que estão na ordem do dia, que tem
provocado a realização de pesquisas que visam auxiliar a mobilização de saberes e
competências que são ensinadas nas escolas e que se constituem em aspectos ainda
pouco conhecidos da epistemologia da prática.
Nesta pesquisa, defendo que os saberes dos professores são construídos por
um movimento entre as três dimensões de saber: Saber Pessoal do Professor, Saber
da Formação e Saber da Prática Docente, que serviram de base para a elaboração
da arquitetura conceitual. Fator que permitiu compreender as vias de construção
desses saberes, considerando os modos e as formas encontradas para sua aquisição.
Especialmente, neste caso, em que os conceitos se formam a partir dos ritmos, das
entonações e dos silêncios que podem mudar o sentido desses saberes.
121
FIGURA 9 – Arquitetura Conceitual das três dimensões de Saber
FONTE: Elaborado pela pesquisadora para conceituar as três dimensões de saber
Nesta Arquitetura Conceitual demonstra-se a interligação da formação
conceitual das três dimensões do saber, na perspectiva de compreender como o
conceito de saber está inter-relacionado nos processos que demandam valores,
crenças e práticas culturais de uma determinada sociedade. Assim como, estão
interligados ao conhecimento de cada um desses sujeitos, pois tanto o Saber quanto
o Conhecimento são elementos de um conjunto estruturante da/na formação do
homem como ser social.
Nesta pesquisa compreende-se o Saber Pessoal do Professor como primeira
dimensão, na perspectiva de Tardif (2014), ao defender que esse saber se constrói
antes mesmo dos professores começarem a ensinar oficialmente. Pois estes já
sabem, de muitas maneiras, o que é ensino por causa de toda a sua história escolar
anterior. Para o autor, [...] as experiências formadoras vividas na família e na escola
se dão antes mesmo que a pessoa tenha desenvolvido um aparelho cognitivo
aprimorado para nomear e indicar o que ela retém dessas experiências (p. 67).
122
Ainda segundo Tardif (2014), pesquisas mostram que esse saber herdado da
experiência escolar anterior é muito forte, que ele persiste através do tempo e que a
formação universitária não consegue transformá-lo nem muito menos abalá-lo, pois
[...] uma boa parte do que os professores sabem sobre o ensino, sobre os papéis do
professor e sobre como ensinar provém de sua própria história de vida, principalmente
de sua socialização enquanto aluno (Ibidem, p. 68). Portanto, esse saber pode ser
visto como um saber temporal, que se constrói ao longo da história de vida escolar e
familiar dos professores e, se expande a um saber profissional construído durante sua
carreira docente.
Compreende-se ainda o Saber da Formação como segunda dimensão, como
um saber que tem suas bases construídas a partir das experiências familiares ou
escolares anteriores, que dimensiona, ou pelo menos norteia, os investimentos e as
ações durante a formação inicial universitária. Segundo Tardif (2014), os alunos
passam pelos cursos de formação inicial para o magistério, sem modificar
substancialmente suas crenças anteriores a respeito do ensino. Tão logo começam a
trabalhar como professores, sobretudo, em contexto de adaptação intensa que vivem
quando começam a ensinar, são essas mesmas crenças e maneiras de fazer que
reativam para solucionar seus problemas profissionais.
Como professora formadora de professores de Matemática, convivo
diariamente com situações que me exigem buscar elementos que ao serem
mobilizados no ambiente em que desenvolvo minha prática docente, facilitam o
processo do ensinar e do aprender, a partir da resolução de problemas decorrentes
dessa ação. Sejam eles de ordem prática ou teórica presentes no desenvolvimento
da profissão. Durante esse processo aproprio-me de saberes que foram/são
construídos não só durante a formação inicial, mas das experiências vivenciadas ao
longo da vida. Assim como das interações, das trocas e da soma de outros elementos
que são mobilizados no desenvolvimento do exercício profissional. Portanto, o saber
da formação inicial não se distancia totalmente de um saber herdado de experiências
escolares anteriores, ou seja, de um saber já construído anteriormente.
Desta forma, o Saber da Prática Docente coma terceira dimensão, aqui é visto
como o saber que foi construído a partir do acúmulo dos saberes da formação
profissional, dos saberes disciplinares e dos saberes curriculares, que se incorporam
efetivamente na prática docente. E, [...] na impossibilidade de controlar os saberes
123
disciplinares, curriculares e da formação profissional, o professor produz ou tenta
produzir saberes através dos quais ele compreende e domina sua prática (TARDIF,
2014, p. 48). No entanto, [...] esses saberes lhe permitem, em contrapartida,
distanciar-se dos saberes adquiridos fora dessa prática (Ibidem). Esse
distanciamento, certa forma, compara o professor a um executor de tarefas, pois
estaria agindo de forma mecânica na transmissão de saberes na sala de aula.
No meu entendimento como professora formadora de professores, um
professor nunca age mecanicamente, pois o profissional professor se faz da soma de
diversos e variados elementos que direta ou indiretamente, provocam mudanças
nesse processo formativo. Portanto, ao desempenhar a ação docente, o professor não
ignora os saberes que foram acumulando-se ao longo da formação. Ao acumularem
os saberes da formação profissional, saberes disciplinares e saberes curriculares, de
certa forma, também acumulam saberes experienciais. Estes são modificados pela
própria natureza da prática docente, ou seja, em cada ação docente o professor
apropria-se de saberes que são necessários ao desenvolvimento daquela ação, pois
[...] é no exercício cotidiano de sua função que os condicionantes aparecem
relacionados a situações concretas que não são passiveis de definições acabadas e
que exigem improvisação e habilidade pessoal (TARDIF, 2014, p. 49).
Em uma situação real, esses condicionantes são mediados pelas relações e
interações que os professores estabelecem com outros professores, com os
profissionais da escola, com os alunos e demais atores sociais presentes em contexto
em que ocorre a prática docente. Na verdade, o saber da prática docente compõe-se
de vários saberes provenientes de diferentes fontes e da inserção de variados
elementos que se movimentam, se articulam e são mobilizados em ambiente de
prática.
A partir da compreensão das três dimensões de saber, me encaminho ao
tratamento das cinco categorias emergentes que surgiram das informações
constituídas no campo de investigação, a saber: Formação Inicial; Lacunas da
Formação; Saberes do Conhecimento Específico; Prática Docente e Saberes da
Formação. Para o surgimento dessas categorias, os textos foram fragmentados para
uma leitura mais densa e os fragmentos deram origem a cada uma das cinco unidades
de análise, que se constituíram dos elementos de significados expressados nos
relatos dos colaboradores e foram intituladas da maneira a seguir. FORMAÇÃO
124
INICIAL: prática formativa baseada em conteúdos; LACUNAS DA FORMAÇÃO:
comprometimento da prática na sala de aula; SABERES DO CONHECIMENTO
ESPECÍFICO: sentidos e significados; PRÁTICA DOCENTE: ensinando e
aprendendo a ser professor de Matemática na sala de aula e, SABERES DOCENTES:
mediadores da/na formação inicial.
Ressalta-se que os colaboradores são identificados neste texto, por nomes
fictícios como forma de manter o anonimato, como já informado na terceira seção.
Dessa forma, apresento a primeira unidade de análise em que faço abordagens
acerca da formação inicial como prática formativa baseada em conteúdos, como
sendo a unidade de significado que dá início ao aprofundamento das análises que se
seguem.
FORMAÇÃO INICIAL: prática formativa baseada em conteúdos
Ao considerar que a formação inicial é um aspecto que está no núcleo das
questões postas nesta investigação, comungamos das ideias defendidas por Flores
(2003), ao afirmar que a [...] formação inicial constitui o primeiro passo de um longo e
permanente processo formativo, ao longo de toda a carreira, que prepara apenas para
a entrada na profissão (p. 139).
A formação apontada na afirmativa constitui-se da base preparatória do
profissional para dar início a sua carreira docente. Assim considerando que esse
professor ao concluir sua formação inicial está longe de ser um profissional pronto e
amadurecido, no momento em que recebe a sua habilitação profissional (PONTE,
1995). Essa preparação é apenas o começo do caminho a ser percorrido para a
construção de uma formação que permita a esse profissional [...] compreender e
problematizar a realidade, intervir na própria atuação e avaliá-la (VEIGA, 2004, p. 97).
Os estudos realizados por García (2006) destacam que a formação inicial de
professores deve contribuir não só para o desenvolvimento pessoal, mas
principalmente para a aquisição de uma atitude reflexiva acerca dos processos de
ensino e de aprendizagem em sua prática profissional.
Colocando-me nesta afirmativa de García, retomo os momentos vivenciados no
processo de formação inicial. Sempre acreditei que a formação recebida faria de mim
uma profissional capaz de desenvolver minha profissão com eficácia. No entanto, a
125
formação inicial não me preparou o suficiente para meu desempenho profissional.
Senti de forma intensa, cada dificuldade que se fez presente na sala de aula da
Educação Básica. Fosse pela ausência de teorias aproximativas à sala de aula, fosse
pela ausência de uma prática mais efetiva.
Essas dificuldades levavam-me a fazer reflexões acerca da minha formação e
deram-me uma certeza: sempre havia algo a ser acrescentado na minha formação,
pois a formação no curso de licenciatura fez-se distanciado da realidade em que iria
desenvolver minha prática. Para Pereira-Diniz (2007) esse distanciamento é um dos
dilemas enfrentados pelos cursos de formação de professores, pois:
[...] falta de integração entre a Licenciatura e a realidade onde os licenciandos irão atuar constitui um outro “dilema” enfrentado pelos cursos de formação de professores. Em outras palavras, há pouca integração entre os sistemas que formam os docentes, as universidades, e os que absorvem: as redes de ensino fundamental e médio. Essa desarticulação reflete, talvez a separação entre teoria e prática existente nos cursos de formação de professores (PEREIRA-DINIZ, 2007, p.61/62).
É importante, portanto, considerar que os cursos de licenciaturas que têm como
principal objetivo/missão formar professores para a Educação Básica, não vêm dando
conta de preparar esse profissional de forma satisfatória. Razão pela qual existe um
caminho a ser construído durante a carreira docente, que é de competência do
professor. Essa construção faz-se da inserção dos diversos elementos que vão
configurar-se ao longo desse caminho. Essa base servirá como alicerce, para que
esse professor seja capaz de fazer a integração dos conhecimentos específicos de
sua área de formação, aos diferentes conhecimentos que se constrói e são
construídos em ambientes e contextos em que ocorre a prática docente.
No que se refere à Licenciatura em Matemática, D’Ambrosio (1998) afirma que
[...] dificilmente um professor de Matemática formado em um programa tradicional
estará preparado para enfrentar os desafios das modernas propostas curriculares. As
pesquisas sobre a ação de professores mostram que em geral o professor ensina da
maneira como lhe foi ensinado (p. 37). A afirmativa do autor leva-me a considerar que
a formação recebida nos cursos de licenciaturas tradicionais em um formato 3+1,
comumente praticado nas instituições formadoras, contribui significativamente para
126
que os egressos dos cursos de Licenciaturas em Matemática estejam saindo com uma
formação frágil e incipiente para o exercício docente. A este respeito, Nóvoa (1997)
sinaliza que:
[...] a formação de professores é influenciada por inúmeros fatores que
devem ser estudados adequadamente, para que assim se possa
intervir de maneira construtiva na formação dos acadêmicos que
futuramente estarão regendo atividades didáticas em sala de aula (p.
25).
Concordo que a formação de professores é influenciada por inúmeros fatores,
que estão relacionados aos aspectos estrutural, organizacional e sistêmico. No curso
de formação de professores de Matemática de faço parte como professora formadora
de disciplinas pedagógicas, tenho observado que o formato do curso ainda se faz na
perspectiva de preparar o matemático e não o professor de Matemática. Essa
preparação é completamente distanciada na realidade da Educação Básica, lugar
onde esse professor vai desenvolver sua profissão.
A ausência de sentidos, de significados, do sentimento de pertencimento da
profissão tem ficado à espera de mudanças que ainda não ocorreram. E apesar das
constantes propostas de reformulação do PPC do curso de Licenciatura em
Matemática, a formação ainda se faz da mesma maneira, ou seja, três anos de
conhecimentos específicos e um ano de conhecimentos pedagógicos. Nesse sentido,
Menezes (1986) considera que o licenciando é concebido pela universidade como um
meio-bacharel, com tinturas de pedagogia. Em se tratando de professor de
Matemática, essa formação deve especialmente [...] ser capaz de articular e
potencializar as conquistas no que tange à dimensão educativa dessa área de
conhecimento, tanto na perspectiva prática quanto teórica (PRATES &
ROMANOWSKI, 2014, p. 89).
Deste modo, a formação deve transcorrer pelo processo de habilitar o
profissional para desempenhar suas funções no ambiente de prática. Espaço onde
ocorre a reflexão e o aperfeiçoamento constante das práticas educativas, em que se
faz e refaz a produção do saber e das competências adquiridas em processos
formativos. Neste sentido, a formação de professores pode ser compreendida como
um processo que deve preparar o profissional do ensino, na perspectiva de promover
mudanças no contexto social, pois [...] a formação inicial visa a habituar os alunos –
127
futuros professores – à prática profissional dos professores de profissão e a fazer
deles práticos “reflexivos” (TARDIF, 2014, p. 288). Isso significa dizer que:
[...] os programas de formação de professores devem ser organizados em função de um novo centro de gravidade: a formação cultural (ou geral) e a formação científica (ou disciplinar) através das disciplinas contributivas (psicologia da aprendizagem, sociologia da educação, didática etc.), devem ser vinculadas à formação prática, que se torna, então, o quadro de referência obrigatório da formação profissional. Formação geral e formação disciplinar não podem mais ser concebidas na ausência de laços com a formação prática (Ibidem, p. 289).
A organização referida pelo autor é o ideário desejado para responder às
necessidades que se postam dentro das salas de aula, em cursos de formação de
professores, seja de Matemática ou de outra licenciatura. No entanto, apesar das
reformas que têm ocorrido ao longo do tempo nos programas de formação inicial,
estes ainda se mantêm sem mudanças significativas, no que se refere aos modelos
tecnicistas, em que o professor é formado sob bases dicotômicas, distanciando a
teoria da prática. Nesse contexto, os processos formativos vêm sendo arrastados ao
longo do tempo sob duas linhas paralelas: de um lado a teoria e de outro a prática.
A aproximação entre teoria e prática ocorre de forma sutil, quando são
ofertadas disciplinas pedagógicas durante a formação. Especificamente, quando são
ofertadas as disciplinas de Prática de Ensino e de Estágio Supervisionado, momento
em que o professor em formação, faz sua primeira aproximação com a realidade da
escola e com a sala de aula. No entanto, o tempo destinado para estar na escola
vivenciando as práticas e os estágios não consegue abarcar a quantidade de
informações que estão no chão da escola e que o professor em formação deveria
conhecer para aprender sobre elas e nelas intervir quando necessário for.
No caso específico da Licenciatura em Matemática do Campus Universitário de
Castanhal, essa aproximação ocorre de maneira vaga, não sendo suficiente para
preparar o professor para o exercício da profissão. Durante as disciplinas práticas
ofertadas, os processos ocorrem em descompasso com as necessidades formativas.
Isto é, nas disciplinas de Prática de Ensino (I, II, III e IV), os professores em formação
pouco se deslocam às escolas da Educação Básica. Em alguns casos, essas práticas
128
resumem-me a micro aulas dadas de um determinado conteúdo ao professor da
disciplina.
Quanto à disciplina de Estágio Supervisionado (I, II, III e IV), a aproximação da
escola se faz de forma aparente. No Estágio Supervisionado I, os professores em
formação devem ir à escola de Educação Básica, para observar o funcionamento da
unidade escolar. Ter conhecimento de como se dá a relação entre os sujeitos
(professores, alunos, direção, pais e comunidade) que convivem diariamente na
escola, conhecer o Projeto Político Pedagógico, assim como projetos desenvolvidos
por professores e demais profissionais da escola. Devem observar como ocorre a
integração da escola com a comunidade, compreender a dinâmica e o funcionamento
do sistema de ensino como um todo. No Estágio Supervisionado II, retornam à escola,
para observar as aulas dadas pelo professor da disciplina. No Estágio III, os
professores em formação vão à escola para fazer regência de classe nos Anos Finais
do Ensino Fundamental. E por fim, no Estágio Supervisionado IV, os professores em
formação, fazem regência de classe em turmas do Ensino Médio. É importante
ressaltar que essa regência deve ser feita com a presença do professor da disciplina
na sala de aula, e o estagiário nunca deve substituir o professor da classe, o que
ocorre com certa frequência.
Desta forma, é importante considerar que o estágio:
[...] não se resume à aplicação imediata, mecânica, instrumental de técnicas, princípios e normas aprendidas na teoria. O estágio é um processo criador, de investigação, explicação, interpretação e intervenção na realidade. Não é reprodução automática do já sabido (LÜDKE, 1994 apud PEREIRA-DINIZ, 2007, p.62).
Esta concepção de estágio é o desejável para a formação do professor. No
entanto, o estágio ainda ocorre de forma aligeirada, não correspondendo às
necessidades formativas de futuros professores de Matemática. Na maioria dos
casos, esse processo decorre da visitação do local de estágio em momentos
esporádicos, o que não dá conta de cumprir a carga horária mínima17 para o período
de estágio. Durante essas visitas, os professores em formação devem fazer registros
17 De acordo com a Resolução 02 CNE/MEC, de julho de 2015, a carga horária deve ser de no mínimo 400 horas.
129
em formulários próprios, para posterior construção de relatório de estágio, para ser
entregue como atividade final da disciplina e obter nota. No entanto, esse relatório
deveria ser visto como um documento vivo que oferece subsídios para a revisão dos
cursos de formação do educador e melhoria da qualidade do ensino na escola
(LÜDKE, 1994).
Durante o período de estágio, os professores em formação ficam vulneráveis e
sujeitos a boa vontade dos profissionais da escola. Não havendo, portanto, o efetivo
acompanhamento dos professores formadores nos locais de estágios. O que é
lamentável, pois em alguns casos o estágio torna-se um processo acelerado, em que
os professores em formação solicitam ao professor da disciplina em que vai estagiar,
para assinarem as fichas de estágios. Estes, por sua vez, assinam essas fichas para
se verem livres do incômodo de ter um estagiário em suas salas de aula. Portanto, a
ausência do professor orientador leva o professor em formação a encarar o estágio
simplesmente como uma exigência acadêmica necessária para a aquisição do
diploma (Ibidem). E não como um exercício preparatório para o professor em formação
fazer as primeiras aproximações com o ambiente em que futuramente irá desenvolver
sua prática. Este é um exercício necessário para o professor em formação, pois
possibilita fazer reflexões acerca do contexto em que se desenvolve o processo
educacional de um determinado contexto social.
Como se observa, muitos são os problemas relacionados ao processo de
formação inicial de professores e muito há que ser feito, pois que a essência dos
programas de formação nas reformas educacionais e dos programas de avaliação e
certificação de professores consiste tão somente em agrupar habilidades,
conhecimentos disciplinares e pedagógicos necessários à realização das atribuições
docentes num determinado contexto de ensino (SHULMAN, 1986).
Na formação inicial na Licenciatura em Matemática do Campus Universitário de
Castanhal em que os colaboradores desta pesquisa fizeram sua formação, não se
distancia do que aponta Shulman de que a formação ainda se faz com base em
habilitar o professor para o desempenho profissional. O que é sinalizado pelo autor,
tem relação com o primeiro relato feito por Fernando, ao se referir à formação inicial
recebida, que apesar de ter sido concluída em 2008, poucas foram as mudanças
ocorridas no PPC do curso até os dias atuais.
130
[...] durante minha formação inicial, pouco do que estudei na faculdade estava relacionado com as práticas de sala de aula. Lembro-me de quando iniciei, eu pensava que iria aprender matemática para saber ensinar na escola básica... me enganei. Então, pouco contribuiu para minha prática de sala de aula, mesmo porque eu lecionava nos anos iniciais (FERNANDO).
O relato de Fernando nos remete a uma constatação: é urgente e necessário
realizar estudos que deem conta de analisar a formação inicial oferecida pelas
instituições formadoras aos futuros professores. Uma vez que, o professor em
formação cria expectativas no que se refere à habilitação para o exercício da profissão
- quando iniciei, pensava que iria aprender matemática para saber ensinar na escola
básica... me enganei –. Aqui se observa certa frustação, que pode ter consequências
desastrosas.
É preciso ter a clareza de que a estrutura da formação inicial deve possibilitar
uma análise global das situações educativas que, devido a uma carência ou a
insuficiência da prática real, limitam-se predominantemente a simulações dessas
situações (PERRENOUD, 1999). É necessário, portanto, que esse processo estrutural
tenha suas bases fundadas na integração de conhecimentos específicos do conteúdo
e conhecimentos pedagógicos, necessários ao desenvolvimento da prática em sala
de aula. O que ainda está distante da realidade, pois [...] pouco do que estudei na
faculdade estava relacionado com as práticas de sala de aula, afirma Fernando.
O relato de Fernando aponta as consequências do processo de formação
inicial. Existe, portanto, uma interferência estrutural na formação desse professor,
havendo sempre a necessidade de buscar outras formas de produzir conhecimentos
sobre as práticas de sala de aula e dos saberes que lhe são específicos.
Em se tratando dos saberes aprendidos na formação inicial aproprio-me das
vozes de Carlos, Julia, Bruno e Paulo que fazem referências a aprendizagem de um
[...] saber do conteúdo de forma teórica e com poucas horas de prática docente
(CARLOS). O relato de Carlos sinaliza a realidade encontrada nos cursos de
formação, ou seja, uma formação baseada em conteúdos, como sinaliza Julia ao
afirmar que aprendeu [...] apenas os conhecimentos teóricos... e reforçado por Bruno
que relata ter um [...] saber construído daquilo que aprendi dos conhecimentos da
Matemática, do cálculo, do raciocínio lógico que foram ensinados. Paulo complementa
estes relatos ao afirmar que, [...] aprendi saberes acerca dos conceitos matemáticos
131
como: aritmético, algébrico, geométrico... que nem sempre são aplicáveis na sala de
aula da Educação Básica, onde desenvolvo minha prática.
No relato de Paulo fica evidente que os conhecimentos específicos da área de
formação estão distanciados do contexto de prática, pois esses conhecimentos ...nem
sempre são aplicáveis na sala de aula da Educação Básica, onde desenvolvo minha
prática (PAULO).
Os saberes apontados por Carlos, Julia, Bruno e Paulo estão configurados no
que Shulman (1986) denomina de saber disciplinar, que trata de um saber produzido
por pesquisadores e cientistas nas disciplinas científicas e não um conhecimento
produzido a respeito do mundo e integrado à universidade sob forma de disciplinas.
Para Tardif (2014), os saberes disciplinares são:
[...] os saberes que correspondem aos diversos campos do conhecimento, aos saberes de que dispõe a nossa sociedade, tais como se encontram hoje integrados nas universidades, sob a forma de disciplinas, no interior das faculdades e de cursos distintos. Os saberes disciplinares (por exemplo, matemática, história, literatura etc.) que são transmitidos nos cursos e departamentos universitários independentemente das faculdades de educação e dos cursos de formação de professores (p. 38).
Os saberes apontados pelo autor estão presentes no dia a dia do professor,
sob a forma de programas escolares (objetivos, métodos e conteúdos), que cabe ao
professor transformar esses conteúdos em conhecimentos ensináveis. No entanto,
para conhecer os conteúdos é preciso ir além do conhecimento dos fatos e dos
conceitos de um determinado domínio e compreender a estrutura da matéria, pois o
conhecimento do conteúdo é o que se refere à quantidade e à organização do
conhecimento por si mesmo na mente do professor (SHULMAN, 1986).
Nesse sentido, o professor sabe que ter conhecimento do conteúdo é
importante, porém não é o suficiente. Para ensinar é preciso muito mais do que
apenas conhecer a matéria. Shulman (1986) chama a atenção para o fato de que o
professor deve saber não só o conhecimento da matéria a ser ensinada, mas
principalmente deve ter o conhecimento pedagógico do conteúdo e o conhecimento
curricular.
Segundo o autor, o conhecimento pedagógico dos conteúdos vai além do
domínio da matéria pela matéria, envolve o conhecimento da maneira de como
132
ensinar determinado conteúdo. Inclui ainda, a representação das ideias, das
analogias, das ilustrações, dos exemplos, das explicações e das demonstrações.
Visto de outra forma, é a maneira pela qual o conteúdo é formulado para torná-lo
ensinável e compreensível para quem aprende.
Os saberes apontados por Carlos, Julia, Bruno e Paulo são resultados de
práticas formativas, baseadas em conteúdos distanciados do contexto em que esse
profissional irá desenvolver sua prática docente. Esse distanciamento decorre em
razão dos cursos de formação de professores ainda serem desenvolvidos em modelos
aplicacionistas e, ao se tornarem professores de Matemática descobrem os limites de
sua formação acadêmica. Tardif (2014) apoiado em (WI-DEEN et al., 1998), traz críticas
a esse modelo de formação.
[...] os cursos de formação para o magistério são globalmente idealizados segundo um modelo aplicacionista do conhecimento: os alunos passam um certo número de anos a assistir aulas baseadas em disciplinas constituídas de conhecimentos proposicionais [...] quando a formação termina, eles começam a trabalhar sozinhos, aprendendo seu ofício na prática e constatando, na maioria das vezes, que esses conhecimentos proposicionais não se aplicam bem na ação cotidiana (p.270).
O modelo de formação apontado pelo autor é idealizado segundo uma lógica
disciplinar e não a uma lógica profissional, em que o conhecer e o fazer são
dissociados e tratados separadamente. O que pressupõe que [...] é preciso quebrar a
lógica disciplinar universitária nos cursos de formação profissional (TARDIF, 2014, p.
275).
Deste ponto de vista, esse modelo dominante do conhecimento baseia-se na
relação sujeito/objeto e o resultado dessa relação reflete-se na sala de aula. Isto
porque o professor está saindo do curso de formação dotado de um repertório de
conhecimentos distanciados - que nem sempre são aplicáveis na sala de aula da
Educação Básica (PAULO) - contribuindo dessa forma, para a formação de lacunas
que comprometem e/ou interferem no ato de ensinar.
Em síntese, as abordagens feitas nesta unidade de análise estão relacionadas
à formação inicial como um processo que deve preparar o profissional para a entrada
na profissão. Assim considerando que essa formação ainda transcorre pelo processo
133
de habilitar o profissional para desempenhar suas funções no ambiente de prática, em
que se faz a produção do saber e das competências adquiridas em processos
formativos.
No que se refere à formação do professor de Matemática, esta deve
especialmente ser capaz de fazer a articulação entre conhecimentos específicos do
conteúdo e conhecimentos pedagógicos, necessários ao desenvolvimento da prática
em sala de aula, considerando que para ser professor não basta apenas ter
conhecimento do conteúdo, é preciso muito mais do que apenas conhecer a matéria
a ser ensinada, mas, principalmente deve ter o domínio do conhecimento pedagógico
do conteúdo e do conhecimento curricular necessários para ensinar. Ter o domínio
desses conhecimentos, somados aos conhecimentos de uma prática efetiva, seria o
ideário para uma formação de professores para a Educação Básica. Porém, os
professores ainda estão saindo desse processo formativo, com lacunas que
certamente contribuem para com as dificuldades encontradas no dia a dia da sala de
aula. Isto leva-me à segunda unidade de análise que se refere às lacunas da formação
e sua relação com o desempenho da prática na sala de aula, identificadas nos relatos
dos colaboradores.
LACUNAS DA FORMAÇÃO: comprometimento da prática na sala de aula
Em todo processo de formação, seja inicial ou permanente, sempre haverá por
parte de quem aprende, a ausência de determinados conhecimentos que ficam
apenas na intencionalidade. Ao ingressar em um curso de formação, cria-se
expectativas de que essa formação dará conta da maioria dos instrumentos
conceituais, procedimentais e atitudinais necessários à formação profissional do
professor. No entanto, [...] sempre haverá algo a ser acrescentado para que o
professor possa desempenhar sua função e saber enfrentar as dificuldades que vão
surgir no dia-a-dia da escola (BRUNO).
A assertiva de Bruno faz parte de um amadurecimento que se desenvolve à
medida que esse professor faz sua entrada no campo de trabalho e percebe que sua
carreira é um processo temporal. Marcado, desse modo, pela construção do saber
profissional, que ocorre por via das transformações e das rupturas que certamente
irão demarcar sua trajetória pessoal e profissional.
134
Nesse sentido, é sabido que o processo de formação inicial seja em Matemática
ou outra área do conhecimento, não se faz de receitas prontas, em que a formação
seja vista como um receituário a ser seguido. É preciso compreender que habilitar
pessoas não é construir máquinas, em que cada peça da engrenagem deve ficar no
seu devido lugar.
O que se tem visto, no entanto, são cursos de formação cada vez mais céleres,
fazendo com que o profissional saia com lacunas de formação que certamente vão se
fazer presentes no desempenho da sala de aula, fazendo toda a diferença em
contextos de prática.
Carlos, Julia, Fernando, Jorge e João, fazem referências as lacunas deixadas
pela formação e que foram sentidas no momento em que se deu a prática docente de
forma efetiva, quando esses colaboradores buscaram apoiar-se em saberes práticos
que deveriam ser parte integrante do processo de formação inicial, é que se observa
nos relatos a seguir.
Considero como a grande lacuna da minha formação de professor foi a falta de uma verdadeira prática escolar, em que eu pudesse conhecer a realidade da escola e aprender a lidar com ela e isso poderia ser evitado se fizesse a aproximação do conhecimento científico ao que é aprendido no nosso dia-a-dia, dessa forma cada profissional teria uma formação mais perto da realidade onde ele vai desenvolver sua profissão (CARLOS).
O relato de Carlos reforça as discussões feitas anteriormente, quando da
abordagem acerca da importância das disciplinas de Estágio Supervisionado e Prática
de Ensino, serem vistas como disciplinas que possibilitam ao professor em formação
...conhecer a realidade da escola e aprender a lidar com ela... (CARLOS), evitando
dessa maneira, situações problemas que o professor não está preparado para
solucionar. Não diferente de Carlos, Julia afirma que:
Meu curso foi muito teórico, havia uma preocupação em encher a gente de teoria, teoria. A prática eu tive que correr atrás...considero essa, uma das maiores lacunas deixadas pelo curso (JULIA).
Evidencia-se neste relato que os aspectos teóricos são sempre priorizados em
detrimento dos aspectos práticos, levando o professor a ...correr atrás... de uma
135
prática que lhe permita saber lidar com as questões surgidas diariamente na sala de
aula, sejam elas de que ordem for, como aponta Fernando.
As lacunas deixadas na minha formação são aquelas relacionadas com a prática de sala de aula, principalmente, no que concerne às questões pedagógicas. (FERNANDO).
Não diferente de Fernando, Jorge também tem uma conotação de
descontentamento com a formação recebida, ao afirmar que ...minha formação não
me preparou para dar aula... A afirmativa de Jorge me leva a refletir sobre os erros
que cometemos como professores formadores, quando submetemos o professor em
formação mais aos aspectos teóricos do que aos práticos. Isto conduz a uma formação
com lacunas, que certamente, vai levar esse professor a buscar aprender para
ensinar. Esse aprender decorreu dos erros e dos acertos como afirma Jorge.
Minha formação não me preparou para dar aula. Esta foi a grande lacuna deixada pela minha formação inicial, pois lembro que no início da minha carreira, sempre faltava algo para me auxiliar nas aulas e desempenhar melhor minha profissão. Na verdade, eu aprendi dar aula na marra, errando, acertando. (JORGE).
Assim, como Carlos, Julia, Fernando e Jorge, João também faz referências a
lacunas deixadas pela formação, especialmente, no que se refere aos aspectos
didáticos, pois considera que o professor de Matemática ... não tem uma base sólida
para lidar com uma sala de aula...fato este que depõem contra a ação docente desse
profissional, como se observa no excerto a seguir.
As lacunas deixadas na mina formação foram na parte didática, o
aluno do curso de Licenciatura em Matemática não tem uma base
sólida para lidar com uma sala de aula (JOÃO).
Os relatos são pontuais quando os colaboradores se referem às lacunas
deixadas pela formação. Observa-se que a ausência da prática escolar é apontada
como o grande obstáculo no desempenho do professor na sala de aula, pois entre o
saber ser e o saber fazer (TARDIF, 2002), haverá sempre a ausência de uma prática
que responda a uma ação que não foi devidamente executada. A ausência de uma
136
prática mais efetiva na formação inicial, certamente compromete a ação de fazer na
sala de aula, pois a prática de ensino não se restringe ao fazer, ela se constitui em
uma atividade de reflexão que enriquece a teoria que lhe deu suporte (LÜDKE, 1994).
Essa ...falta de uma verdadeira prática escolar, em que eu pudesse conhecer
a realidade da escola e aprender a lidar com ela... (CARLOS) é percebida exatamente
quando ela se faz mais necessária, ou seja, no momento em que o professor vai fazer
uso de saberes práticos que deveriam ser adquiridos durante a formação inicial. Sob
essa ótica, as lacunas parecem constituir-se no fator delimitador da prática desses
profissionais, pois a prática escolar é, para o professor, a condição necessária para a
aquisição e produção de seus próprios saberes profissionais.
Algumas medidas, contudo, vêm sendo tomadas para que mudanças ocorram
no formato dos cursos de formação inicial, por meio de leis, resoluções, decretos,
portarias e de outros dispositivos legais. A exemplo, a Resolução CNE/PC nº 02, de
1º julho de 2015, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação
inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para
graduados e cursos de segunda licenciatura) e para a formação continuada. A
resolução estabelece ainda, o prazo de dois anos para a reformulação dos projetos
Pedagógicos dos Cursos de Graduação, a partir de sua publicação.
No Artigo 13, incisos 1º e 2º da referida Resolução, fica estabelecido as
reformulações necessárias no que se refere às disciplinas de Prática de Ensino e
Estágio Supervisionado. Estas passam a ter carga horária mínima de 400 horas, além
da inserção de outros conteúdos relacionados aos fundamentos da educação,
formação na área de políticas públicas e gestão da educação, seus fundamentos e
metodologias, direitos humanos, diversidades étnico-racial, de gênero, sexual,
religiosa, de faixa geracional, Língua Brasileira de Sinais (Libras), educação especial
e direitos educacionais de adolescentes e jovens. Para cumprimento de medidas
socioeducativas, visando um melhor preparo do professor para desenvolver sua
prática na Educação Básica.
Além dos aspectos legais, outras medidas podem ser adotadas para minimizar
essas lacunas se houver por parte das instituições formadoras, o cuidado na
construção de [...] um currículo baseado na realidade da sala de aula e oferecer um
curso que tivesse como objetivo formar professor para atuar na educação básica
(FERNANDO), que essa formação [...] fosse de forma integral, ou seja, que a teoria e
137
a prática caminhassem juntas (BRUNO). Pois não há ensino de qualidade, nem
reforma educativa, nem inovação pedagógica, sem uma adequada formação de
professores (NÓVOA, 1995).
Compreende-se que essas mudanças não se resumem apenas aos aspectos
legais, pois só mudar a matriz curricular de um curso não significa que mudanças vão
ocorrer de forma efetiva. Outros elementos estão inseridos nesse processo que
perpassa pelas condições de trabalho, questões salariais, formação permanente do
professor formador. Entre outros mais pontuais que ocorrem na sala de aula dos
cursos de formação de professores. Refiro-me aos procedimentos adotados pelo
professor formador acerca das metodologias, da didática, da avaliação e das
mediações entre o conhecimento prévio e o novo conhecimento a ser aprendido, pois
a ideia de reforma:
[...] expressa a vontade de encontrar, nos cursos de formação de professores, uma nova articulação e um novo equilíbrio entre os conhecimentos produzidos pelas universidades a respeito do ensino e os saberes desenvolvidos pelos professores em suas práticas cotidianas (TARDIF, 2014, p. 23).
O novo equilíbrio proposto pelo autor, portanto, pressupõe que os cursos de
formação profissional devem levar em conta não só os saberes dos professores e as
realidades específicas de seu trabalho cotidiano. Mas, especialmente, devem articular
a integração dos conhecimentos específicos e dos conhecimentos pedagógicos
necessários à formação inicial de professores, na perspectiva de habilitar esse
profissional para responder as necessidades postas nas salas de aula. Ainda assim,
haverá em um tempo futuro a necessidade de [...] uma outra reforma do ensino, para
finalmente vermos os representantes pelas faculdades de educação e os formadores
universitários dirigirem-se à escola dos professores de profissão, para aprenderem
como ensinar e o que é ensino (TARDIF, 2014, p. 55).
Nesse sentido, é preciso que as instituições formadoras se aproximem da
escola para que haja uma relação mais próxima da realidade, em que os futuros
professores irão desempenhar suas práticas docentes. Permitindo assim, a
compreensão da importância de integrar conhecimentos pedagógicos e
conhecimentos específicos nos processos formativos. Aspecto este a ser discutido na
138
terceira unidade de análise, que se refere aos sentidos e aos significados produzidos
pelos colaboradores em relação ao saber do conhecimento específico.
Em síntese, nesta unidade de análise as discussões foram centradas nas
lacunas da formação inicial de professores. Considerando que na formação
profissional haverá sempre por parte de quem aprende, a ausência de determinados
conhecimentos, que ficaram apenas na intencionalidade. O que faz dessa formação
um processo ainda deficitário, pois esse profissional está recebendo uma formação
com lacunas, que certamente vão se fazer presentes no desempenho da prática
docente.
Os relatos dos colaboradores são fortemente demarcados pela ausência de
uma prática docente mais efetiva na formação inicial, o que certamente comprometeu
seu desempenho na sala de aula. Essas questões têm levantado discussões da
necessidade de mudanças no formato dos cursos de formação inicial. Por isso
algumas medidas já vêm sendo tomadas, a exemplo, a Resolução CNE/PC nº 02, de
1º julho de 2015, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação
inicial em nível superior.
É importante, no entanto, considerar que só fazer reformas na matriz curricular
de um curso não significa que mudanças vão ocorrer de forma efetiva. Necessário se
faz que outros elementos estejam inseridos nesse processo, no que se refere às
condições de trabalho, as questões salariais, a formação permanente do professor
formador etc. Ainda nessa perspectiva de mudanças, é preciso levar em conta os
saberes dos professores e as realidades específicas de seu trabalho cotidiano,
fazendo a articulação dos conhecimentos específicos e dos conhecimentos
pedagógicos necessários à formação inicial de professores.
SABERES DO CONHECIMENTO ESPECÍFICO: sentidos e significados
Em se tomando os sentidos e os significados como principal referência para a
construção desta unidade de análise, cabe ter a compreensão do que seja sentido e
do que seja significado. Compreende-se o significado na concepção de Luria (1986),
ao afirmar que significado é o sistema de relações que se formou objetivamente no
processo histórico, está encerrado na palavra. É considerado como um princípio
139
estável, generalizante e assinala um objeto determinado, avalia e se insere em um
sistema de enlaces e relações objetivas.
Visto de outra maneira, o significado pode ser entendido como a forma de
racionalizar objetivamente. Outra concepção de significado pode ser vista em
Vygotsky (1991), ao defender a ideia de que a palavra sem significado é apenas um
som vazio. O significado da palavra é uma generalização, um conceito, um fenômeno
tanto da fala quanto do pensamento.
Da mesma forma compreende-se sentido ainda em Luria (1986), como sendo
o significado particular da palavra, separado do princípio objetivo dos vínculos. Está
composto pelas ligações relacionadas com o momento e a situação apresentada. Em
Vygotsky (1991) compreende-se que o sentido pode indicar alguma coisa ou algo
totalmente diferente de uma pessoa para a outra, pois depende conjuntamente da
interpretação do mundo de cada qual e da estrutura interna da personalidade. Em
outras palavras, o sentido pode ser entendido nas atitudes e comportamentos em que
os aspectos emocionais e as subjetividades estão presentes.
Nesta pesquisa, compreende-se o significado como aquilo que é atribuído pelo
sujeito ao que ele fala, ou seja, são expressões próprias que se originam do
reconhecimento de uma dada situação. Compreende-se ainda que as manifestações
desse sujeito são resultantes de apropriações de um determinado conhecimento
adquirido das relações que se estabelecem com os objetos. Quando o professor
consegue expressar suas limitações, suas dificuldades, subentende-se que existe
certo amadurecimento desse sujeito que vive e atua em um determinado contexto
social.
O professor ao vivenciar uma situação real percebe suas limitações, seja ela
ocorrida em processos formativos ou no momento da ação docente em que ele se vê
diante da realidade da sala de aula. No entanto, ao reconhecer que não tem o domínio
sobre determinado conhecimento ou procedimento, seu sentido reflexivo alerta para
a busca de um saber que ainda não tem. Pois [...] o papel do professor, em especial,
na construção dos saberes docentes, leva a refletir sobre a responsabilidade no que
se refere à aprendizagem dos discentes (CORRÊA & BEHRENS, 2014, p. 50).
140
Fazer reflexões acerca da importância dos conhecimentos específicos e da
necessidade de ter domínio sobre estes, no momento de desempenhar a prática na
sala de aula, é uma questão que faz parte do dia-a-dia de Fernando e Clara.
[...] sei que não posso ensinar o que não sei e que em consequência disso meu aluno também não vai aprender. Então, busco sempre estudar os conhecimentos específicos da matemática. Tenho que saber matemática e como tratar esse conhecimento para ensinar aos meus alunos. Nesse sentido, os conhecimentos específicos da matemática também são importantes para minha prática. (FERNANDO).
Em relação aos conhecimentos matemáticos, Fernando se manifesta afirmando
que [...] tenho que saber matemática.... No entanto, saber o conteúdo não é suficiente,
é preciso [...] tratar esse conhecimento para ensinar.... Essa preocupação é relevante.
Para ensinar matemática é necessário ter domínio do conhecimento específico a ser
ensinado, que são compreendidos por Tardif (2002), como os saberes disciplinares.
Contudo, estes conteúdos devem ser transformados em conhecimentos ensináveis
para [...] tentar aproximar daquilo que vai ser ensinado para os alunos da Educação
Básica..., como afirma Clara.
[...] os saberes do conhecimento específico da matemática são importantes. Porém esses conhecimentos têm mais aplicação em nível superior. Temos que pegar esses conhecimentos e tentar aproximar daquilo que vai ser ensinado para os alunos da Educação Básica e isso é sempre muito complicado, porque não temos tempo para estudar e organizar esses conhecimentos (CLARA).
Para Clara, os conhecimentos específicos têm sim sua importância. No entanto,
reconhece que os conhecimentos aprendidos na formação inicial ainda estão
distantes da realidade em que o professor vai desenvolver seu exercício docente.
Havendo, portanto, a necessidade de o professor empreender esforços para fazer a
aproximação desses conhecimentos à realidade em que ele desenvolve sua prática
docente. O que se evidencia no relato de Clara é que a formação inicial recebida por
ela, não a preparou para desempenhar sua profissão em contextos que estão
distantes da realidade da sala de aula em que ela recebeu essa formação.
141
Fernando também manifesta, um desejo de aprender, de buscar
conhecimentos que ainda lhe fogem ao domínio, e esse [...] desejo surge dessa
incompletude que experimentamos (CHARLOT, 2013, p. 171) em determinado
momento, em que o saber ausente se faz presente em ambiente de prática docente.
Portanto, é necessário não só ter o domínio dos saberes curriculares (TARDIF, 2002),
mas especialmente ter a apropriação e saber tratar os conhecimentos que serão
objetos de ensino.
Fernando reconhece que a aquisição do conhecimento do conteúdo não é
suficiente para desenvolver sua prática de forma segura e eficiente. É preciso saber
mais para fazer melhor, pois a noção de saber é “ser capaz de”, “compreender”,
“dominar uma técnica”, “poder manusear”, “poder compreender”. Remetendo-a ao
mundo prático que além de ser condição de possibilidade de qualquer noção é,
também, o lugar efetivo onde a noção pode ser produzida (BOMBASSARO, 1992).
Fernando e Clara reconhecem que os conhecimentos específicos da
matemática são importantes para a prática. Assim como o saber do conteúdo
matemático tem a devida importância para seu desempenho profissional, que também
é influenciado pelas relações sociais que se manifestam no desempenho de sua
profissão.
Os sentidos e os significados atribuídos pelos colaboradores da pesquisa aos
saberes do conhecimento específico da Matemática são relevantes do ponto de vista
do entendimento de que esses [...] conhecimentos são indispensáveis para o
desenvolvimento do exercício docente, porém, para fazer sentido devem ser somados
a outros, caso contrário não haverá a integração necessária e obter bons resultados
(CARLOS).
O que se observa no relato de Carlos é a consciência da importância do
conhecimento específico. Porém, compreende que para a obtenção de bons
resultados, além da apropriação desses conhecimentos, estes devem ser somados a
outros, pois [...] os saberes da área do conhecimento só fazem sentido se nos
apropriarmos desse saber, fazermos uso para ensinar conteúdos matemáticos e
torná-los significativos (BRUNO).
A assertiva de Bruno remete à necessidade de levar em conta a subjetividade
dos próprios professores:
142
[...] um professor de profissão não é somente alguém que aplica conhecimentos produzidos por outros, não é um agente determinado por mecanismos sociais: é um ator no sentido forte do termo, isto é, um sujeito que assume sua prática a partir dos significados que ele mesmo lhe dá, um sujeito que possui conhecimentos e um saber-fazer provenientes de sua própria atividade e a partir dos quais ele a estrutura e a orienta (TARDIF, 2014, p. 230).
Quando o professor consegue apropriar-se do conhecimento específico e
torna-o ensinável, ele transforma esse conhecimento no que Shulman (1986),
denomina de conhecimento pedagógico do conteúdo, referindo-se à maneira pela qual
o objeto é transformado para o ensino. Isto ocorre quando o professor interpreta o
conteúdo e encontra maneiras diferenciadas para representá-lo e torná-lo acessível
aos alunos, que decorre de um longo processo de maturação que vai se constituindo
na prática docente pela habilidade de [...] pegar esses conhecimentos e tentar
aproximar daquilo que vai ser ensinado para os alunos da Educação Básica (CLARA).
Ao fazer essa aproximação, os conhecimentos específicos da Matemática
ensinados nos cursos de formação inicial ganham significado, pois sofrem
transformações decorrentes das relações que são formadas objetivamente em
contextos de ensino. Da mesma forma, estes conhecimentos ganham sentido quando
são modificados pelas ligações constituídas no momento em que a situação de ensino
ocorre efetivamente.
Neste movimento, o professor vai se apropriando de saberes, vai ganhando
habilidade e se construindo ao longo do processo. Afinal, ser professor é uma escolha
individual, subjetiva, que deve ter como premissa o modo de ser do ser humano e do
sentimento de pertencimento ao ato de ensinar. Um ensinar que tem seu maior sentido
no desenvolvimento da prática docente, aspecto este que a quarta unidade de análise
faz abordagens, considerando a prática docente, como um elemento indispensável
para o exercício docente na sala de aula.
Em síntese, as abordagens feitas nesta unidade de análise estão relacionadas
aos conhecimentos específicos, traduzidos em conteúdos disciplinares que
demarcam a formação inicial de professores de Matemática. Assim como os sentidos
e os significados atribuídos pelos colaboradores a esses conhecimentos específicos
durante a formação inicial recebida. As discussões referentes a estes dois aspectos,
143
foram apoiadas em Luria (1986) e Vygotsky (1991), que fazem conceituação sobre
sentido e significado.
Faz-se, dessa maneira, reflexões acerca da importância dos conhecimentos
específicos e da necessidade de ter domínio sobre estes no momento de
desempenhar a prática na sala de aula. Os colaboradores desta pesquisa, têm
consciência de que para ensinar é necessário ter domínio do conhecimento
específico, apropriar-se deste e torná-lo ensinável. Em relação a esses aspectos, as
discussões foram apoiadas em Tardif (2014) e Schön (1983).
PRÁTICA DOCENTE: ensinando e aprendendo a ser professor de Matemática na sala de aula
Ao longo do tempo estudos vêm sendo realizados na perspectiva de superar a
relação linear e mecânica entre o conhecimento técnico-científico e a prática efetiva
na sala de aula. Levando estudiosos da área, a compreenderem o processo
dicotômico que ocorre entre a teoria e a prática.
Dessa forma, teoria e prática são dois campos da formação que estão no centro
das discussões acerca dos processos formativos, considerando que uma não (ou não
deveria) se dissociar da outra. Porém, esta é uma discussão que ainda prende a
atenção, pois:
[...] não é possível conceber a teoria separada da prática. É a relação com a prática que inaugura a existência de uma teoria; não pode existir uma teoria solta. Ela existe como teoria de uma prática. A prática existe, logicamente, como prática de uma dada teoria. É a própria relação entre elas que possibilita sua existência (SANCHEZ-GAMBOA, 2003, p. 125).
Nas considerações do autor, é notório que sem uma, a outra não existe, ou
seja, elas se integram, pois [...] não basta conhecer e interpretar o mundo (teórico), é
preciso transformá-lo (prática), (PIMENTA, 2012, p. 86).
No entanto, na formação inicial de professores de Matemática, essa integração
caminha a passos lentos, ainda não há de forma efetiva, uma relação integral da teoria
e da prática quando se trata de formar professores. Defendo uma formação em que
rupturas contínuas na formação sejam extintas, pois um professor em formação
precisa aprender a fazer uso dos conhecimentos teóricos em situações de práticas
144
reais, em que esses conhecimentos sejam transformados em conhecimentos
ensináveis. Ao fazer esse movimento, o professor, de certa forma está construindo
saberes que serão mobilizados no futuro desempenho do exercício docente.
Em se tratando de saberes mobilizados pelos professores, Tardif (2002)
desenvolveu pesquisas empíricas junto aos professores de escolas primárias e
secundárias e de questões teóricas sobre a natureza dos saberes mobilizados pelos
professores na prática educativa. Nesses estudos [...] a noção de “saber” remete a um
sentido amplo, que engloba os conhecimentos, as habilidades (ou aptidões) e as
atitudes dos docentes, ou seja, aquilo que foi muitas vezes chamado de saber, saber
fazer e saber ser (p. 60).
Nessa ótica, Schön (1983) investe na ideia de que os professores desenvolvem
e mobilizam um “saber prático”, diante da imprevisibilidade e ambiguidade da prática.
O que exige do docente uma capacidade artística de invenção, de adaptação à
realidade do ensino que, por sua vez, é dinâmica e se encontra em constante
transformação.
Esses saberes são construídos na efetivação da prática, a partir de uma
necessidade de saber-fazer para desempenhar o exercício docente como se posta
nos relatos a seguir:
Vou começar usando uma frase que ouvi bastante: “é na prática que se aprende”. Então, foi atuando que aprendi várias coisas que não são ensinadas na graduação: preencher o diário de classe, fazer um planejamento anual (pelo menos no curso de matemática isso não é ensinado), como lidar com uma turma de 50 alunos, indisciplina, utilizar jogos e materiais manipuláveis nas aulas de matemática e, principalmente, fazer a transposição da matemática que aprendemos na faculdade para a matemática que precisamos ensinar na escola básica. (FERNANDO).
No relato de Fernando fica evidente que durante a formação inicial, os
conhecimentos práticos ficaram distantes da realidade da sala de aula. As
necessidades práticas foram surgindo no dia a dia do fazer docente, não só no que se
refere aos aspectos práticos como [...] preencher o diário de classe, fazer um
planejamento anual..., mas especialmente em aprender a [...] fazer a transposição da
matemática que aprendemos na faculdade para a matemática que precisamos ensinar
na escola básica.... Fazer essa transposição é um procedimento que exige do
professor, conhecimentos que vai além de um saber dos conteúdos curriculares.
145
Outros saberes devem ser incluídos nesse processo, especialmente no que se refere
a um saber próprio do contexto em que esse professor desenvolve sua prática
docente.
Não diferente de Fernando, João também se manifesta como um aprendiz da
própria prática, ao afirmar que [...] minha prática foi aprendida todo dia um pouco à
medida que as dificuldades surgiam.... Essas limitações manifestadas pelos
colaboradores vêm reforçar que os cursos de formação de professores ainda mantêm
um formato 3+1, como já sinalizado anteriormente.
A minha prática foi aprendida todo dia um pouco à medida que as dificuldades surgiam, eu ia buscando aprender mais aquilo que era de relevância para os meus alunos, saberes que envolviam a matemática financeira no uso social da disciplina, a aritmética por meio de medidas e problematização, eu buscava na Etnomatemática o embasamento teórico que precisava para desenvolver minha prática. (JOÃO).
Aprender a prática na prática é um desafio posto aos professores egressos dos
cursos de licenciaturas, que demanda tempo e determinação, pois [...] para
desenvolver essa prática, um dos aspectos mais importantes é o gostar de fazer, é
saber fazer (BRUNO). Em determinadas situações, este processo é construído por
meio da observação, do erro e do acerto, em situações problemas surgidos no dia a
dia da sala de aula. Outro aspecto relevante na ausência de uma prática mais efetiva,
são as dificuldades para ensinar determinado conteúdo, como sinaliza Bruno.
Durante a minha prática como professor de matemática, venho tentando desenvolver saberes que vão se construindo à medida que há a necessidade de fazer algo para reduzir as dificuldades apresentadas no momento de ensinar determinado conteúdo. Para desenvolver essa prática, um dos aspectos mais importantes é o gostar de fazer, é saber fazer e valorizar o saber que os educandos já têm, respeitando as diferenças individuais de cada um que esteja inserido no processo (BRUNO).
Aproprio-me das vozes de Fernando, João e Bruno, para defender que os
saberes práticos ou experienciais, têm sua origem no exercício efetivo da profissão e
na prática cotidiana da sala de aula. Portanto, somente por ela esses saberes podem
ser validados, pois ...é na prática que se aprende..., como afirma Fernando.
146
Ao tentar desenvolver saberes a partir de um contexto real, os colaboradores
desta pesquisa foram, de certa forma, construindo habilidades para dominar os
conteúdos a serem ensinados, pois [...] muita coisa da profissão se aprende com a
prática, pela experiência, tateando e descobrindo, em suma, no próprio trabalho
(TARDIF, 2014, p. 86).
Os relatos de Fernando, João e Bruno apontam para um desafio a ser
enfrentado pelos cursos de formação inicial de professores de Matemática, que é
superar o discurso sobre como deve ser a prática. Deve-se, assim, propiciar aos
professores em formação a vivência de uma prática que os coloque como sujeitos do
processo, capazes de compreender a razão de ser dos problemas que enfrentam na
prática, para nela intervir e transformar. Em outras palavras, deve-se valorizar as
iniciativas desses colaboradores, tendo em vista, o avanço no equacionamento dos
problemas que se vivencia na prática da sala de aula. Sob este aspecto, Charlot
(2013) afirma que é a prática que mobiliza os saberes. Isto é, que os coloca em
processo de movimento em relação a si mesmos e aos outros que dele participam.
O que se observa nos relatos de Fernando, João e Bruno é um distanciamento
entre teoria e prática. As práticas desses colaboradores foram construídas no dia a
dia da sala de aula, no fazer e no ensinar conteúdos matemáticos.
Apesar de uma aparente fragilidade, o professor é um ser capaz de
desenvolver-se enquanto desenvolve saberes que se constroem ao longo do exercício
das práticas docentes diárias da sala de aula. Saberes esses que Tardif (2002)
denomina de saberes da formação profissional, que estão diretamente relacionados
às ciências da educação e da ideologia pedagógica. Desse ponto de vista, a formação
recebida por esses colaboradores consistiu em dotar de competências e habilidades
instrumentais, apoiados em modelos tecnocráticos, que preparam professores, para
executar com eficácia o saber-fazer.
A esse respeito Schön (1983) afirma que o processo de formação profissional,
especialmente de professores, sofre grande influência do “modelo da racionalidade
técnica”, em que a atividade do profissional é, sobretudo instrumental, dirigida para a
solução de problemas mediante a aplicação de teorias e técnicas científicas.
Ainda nesse contexto de prática, existem outros saberes que vão sendo
mobilizados e se intermediando em um ir e vir da ação de fazer docência. Estão
147
diretamente relacionados aos saberes disciplinares, que se referem ao domínio do
conhecimento específico a ser ensinado. Aos saberes curriculares que se referem à
apropriação de uma forma de tratar os conhecimentos que serão objeto de ensino.
Aos saberes experienciais, que são aqueles que resultam da própria vivência diária
da tarefa de ensinar, apontados por Tardif (2002), que são saberes mobilizados pelos
professores dada sua importância, para viabilizar o ensino e a aprendizagem que
estão intrinsecamente relacionados ao ato de ensinar.
Neste sentido, é importante considerar que a [...] a prática docente não é
apenas um objeto de saber das ciências da educação, ela é também uma atividade
que mobiliza diversos saberes que podem ser chamados de pedagógicos (TARDIF,
2014, p. 37). Ao mobilizar esses saberes, seja de forma individual ou coletiva, o
professor está exercendo sua capacidade de dominar e integrar tais saberes enquanto
condição para a sua prática docente.
Portanto, é preciso fazer o movimento de tomar a prática dos professores
egressos do curso de Licenciatura em Matemática, que nesta pesquisa são
considerados como colaboradores, como ponto de partida na reinvenção dos saberes
pedagógicos. Pois esta decorre da ação social de ensinar sem a fragmentação do
saber docente. Dessa forma, as instituições formadoras devem direcionar seus
processos de formação na perspectiva de fazer a integração entre os dois campos
(teoria e prática) que ainda permanecem de forma distanciados. Esse afastamento
traz consequências ao ato de ensinar, pois compromete a construção de saberes
docentes, que são necessários na mediação da formação de professores. Aspectos
estes que servem de elementos para as discussões feitas na quinta unidade de
análise.
Em síntese, nesta unidade de análise as discussões foram relacionadas à
prática docente dos colaboradores, que trazem em seus relatos as dificuldades
enfrentadas no dia a dia da sala de aula pela ausência de uma prática efetiva na
formação inicial. Considerando que a teoria e prática são dois campos que estão no
centro das discussões acerca da formação de professores, autores como Sanchez-
Gamboa (2003) defendem que não é possível conceber a teoria separada da prática.
Na formação inicial de professores de Matemática, no entanto, essa integração
caminha a passos lentos, ainda não há de forma efetiva, uma relação integral da teoria
e da prática quando se trata de formar professores. No que se refere aos saberes
148
mobilizados pelos colaboradores da pesquisa para desenvolver a prática docente,
foram apoiados em Tardif (2014) e Schön (1983). Estes sustentam estudos em que,
muita coisa da profissão se aprende com a prática, no momento em que os
professores desenvolvem e mobilizam um “saber prático”, diante da imprevisibilidade
e ambiguidade da prática.
Os relatos dos colaboradores apontam os desafios a serem enfrentados pelos
cursos de formação inicial de professores de Matemática. Entre outros está o de
propiciar aos professores em formação, a vivência de uma prática que os coloque
como sujeitos do processo, capazes de compreender a razão de ser dos problemas
que enfrentam na prática, para nela intervir e transformar. A prática docente não é
apenas um objeto de saber das ciências da educação, é também uma atividade que
mobiliza diversos saberes, que intrinsecamente estão relacionados à formação de
professores.
SABERES DOCENTES: mediadores da/na formação inicial
Não poderia abster-me de trazer para esta discussão, conceitos de teóricos que
discutem os saberes docentes, na perspectiva de dar maior sustentação à análise
desta unidade de significado, considerando que o objeto de estudo desta pesquisa
está centrado no Saber Docente,
Os estudos realizados por pesquisadores internacionais como Shulman (1986),
Tardif (2014), Tardif, Lessard e Lahaye (1991), Gauthier et al. (1998), influenciaram
fortemente os pesquisadores brasileiros. Shulman (1986) foi um dos primeiros
pesquisadores a fazer discussões acerca de saberes docentes, ao criar o programa
Knowledge base. Esses estudos influenciaram não somente o meio acadêmico
científico, mas o educacional, pois esses estudos foram concentrados nos saberes
docentes. A partir de então tem início um considerável crescimento no que se refere
às reformas educativas e as discussões que se travaram em relação à necessidade
de o professor ter uma epistemologia própria, constituída a partir do domínio de
diferentes conhecimentos.
Outro teórico que concentra seus estudos nos saberes docentes é Maurice
Tardif, que conceitua saber como um conjunto de saberes que, baseados nas ciências
e na erudição, são transmitidos aos professores durante o processo de formação. A
149
partir desses estudos Tardif (2004) classificou os saberes docentes em quatro tipos:
Saberes da Formação; Saberes Disciplinares; Saberes Curriculares e Saberes e
Experienciais.
Além dessa classificação, Tardif (2014) considera o saber docente como um
[...] saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes
oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e
experienciais (p. 36).
Os saberes referidos pelo autor são produzidos pelo professor, a partir das
articulações e das mediações no ambiente de prática docente, em que:
[...] essa prática ocorre concretamente numa rede de interações com outras pessoas, num contexto onde o elemento humano é determinante e dominante e onde estão presentes símbolos, valores, sentimentos, atitudes, que são passíveis de interpretação e decisão, interpretação e decisão que possuem, geralmente, um caráter de urgência (TARDIF, 2014, p. 50).
A assertiva do autor remete-nos a ocorrências de sala de aula. Quando no
desempenho da profissão docente somos mobilizados por outros elementos, que em
determinado momento, são subjacentes à docência, pois ultrapassam esse limite.
Despertando, assim, no professor formador, sentimentos que se misturam e são
traduzidos de forma espontânea nas ações que demandam interações mais
aproximativas com os professores em formação, transformando essa relação em
formas mais pessoais de ensinar. É dessa relação com os alunos que se [...]
constituem o espaço onde são validados, em última instancia, sua competência e seus
saberes (TARDIF, 2014, p. 51).
Esses saberes são adquiridos pela experiência docente, pois é das relações
exteriores e interiores da própria prática docente, de todos os outros saberes e das
certezas construídas na prática e no vivido que o saber docente se constrói (TARDIF
et al 1991).
No contexto brasileiro, pesquisadores como Pimenta (2002), Fiorentini e
Nacarato (1999/2002), entre outros, vêm realizando estudos acerca dos saberes
docentes. Os resultados desses estudos têm contribuído consideravelmente para com
as discussões que se travam acerca da formação de professores.
150
Nos estudos realizados por Pimenta (2002), o saber docente pode ser
compreendido a partir dos saberes da experiência, em que o aluno constrói sua
identidade de professor. Ela é produzida no cotidiano docente em processo
permanente de reflexão sobre sua prática intermediada por outros professores. Isto,
a partir dos saberes do conhecimento, que decorre de um processo contínuo de
classificar, contextualizar e analisar as informações que foram acessadas pelo
professor, de forma a produzir novas formas de conhecimento. O saber docente
decorre ainda, dos saberes pedagógicos que estão situados no ato de ensinar em
contextos de prática social, que se refletem em um saber fazer a partir do seu próprio
fazer.
Nos estudos realizados por Fiorentini, Nacarato e Pinto (1999), compreende-se
saber docente como um saber:
[...] reflexivo, plural e complexo, porque histórico, provisório, contextual, afetivo, cultural, formado pela teia, mais ou menos coerente e imbricada de saberes científicos – oriundos das ciências da educação, dos saberes das disciplinas, dos currículos – e de saberes da experiência e da tradição pedagógica (p. 55).
Para os autores, além dos saberes docentes serem reflexivos, plural e
complexos, também se formam da soma dos saberes construídos ao longo da prática
docente. Esses saberes ao se construírem nesse processo prático, experiencial e
plural, também são promovedores da mediação dessa ação.
Nesta pesquisa define-se o termo Mediação na perspectiva da Teoria Histórico-
Cultural de Lev Semenovich Vygotsky (1896-1934), que conceitua mediação como [...]
o processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação. A relação
deixa então, de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento (In: OLIVEIRA,
1993, p. 26).
Do latim mediatione que originalmente designa intervenção humana entre duas
partes, ação de dividir em dois ou estar no meio. O conceito mediação foi tomado por
diferentes perspectivas, indicando ideias de interveniência, relação, conjugação,
religação, ponte ou elo estabelecido nas relações humanas, por meio de um elemento
mediador (RUSS, 1994, p.180).
De uma outra forma de visão, a mediação pode ser compreendida a partir dos
contextos em que se origina e dos elementos que se consolidam nesse processo. Tais
151
como: a cultura, a política, a economia, a educação, a instituição, a classe social, os
professores, os alunos, dentre outros, que fazem parte desse construto, pois a
mediação [...] se origina na mente do sujeito em suas emoções e experiências, sendo
que cada uma dessas instâncias é fonte de mediações e pode também mediar outras
fontes (SIGNATES, 2006, p. 67).
Neste sentido, os saberes dos professores egressos do curso de Licenciatura
em Matemática poderiam ser entendidos como o elemento mediador no/do processo
de formação, pois:
[...] todo o processo de formação mental ocorre num meio social definido, que dá forma à linguagem, fornecendo-lhe o solo de sentido: as falas dos atores têm sentido quando se consideram os personagens na sua aparência e presença, na cena em que a ação e a fala ocorrem. Se não for levado em devida conta o entorno social, a fala dos professores não tem significado e não alcança seu propósito (MARTINS; MOSER, 2012, p. 21).
A premissa dos autores leva-me a compreender que os saberes docentes
situados nos relatos dos colaboradores desta pesquisa devem ser levados em conta
e vistos como instrumentos mediacionais em ações futuras, considerando que [...] os
saberes que são desenvolvidos na prática docente podem ser grandes incentivadores
para o desempenho de uma formação mais apropriada para a realidade atual, onde
os objetivos a serem atingidos é o grande desafio da escola (BRUNO).
Bruno assume um posicionamento a partir do lugar que ocupa, na defesa
daquilo que acredita, fazendo dos saberes aprendidos na prática, instrumentos
promovedores de mudanças de determinadas posturas e comportamentos sociais.
Especialmente em se tratando de contextos de formação, em que o conhecimento se
produz ao longo do tempo, por meio das relações que se estabelecem entre o
indivíduo e o meio, considerando que:
[...] a aprendizagem humana é decorrente de uma relação indivíduo-meio, mediatizada por outro indivíduo mais experiente, cujas práticas e crenças culturais são transmitidas, promovendo zonas mais amplas de desenvolvimento crítico e criativo, rumo à autonomia cognitiva, consequente de uma aprendizagem mediada (FEUERSTEIN, 1980 apud VARELA; BARBOSA, 2009).
152
Nesta perspectiva tem-se a mediação como um elemento importante e
indispensável para o desenvolvimento de ações humanas em qualquer circunstância
da vida social. Em se tratando de educação como uma ação social, a mediação é
usada como elemento facilitador do ato de ensinar ou de aprender. No entanto, [...]
não se pode entender a mediação social na aprendizagem como algo isolado. Todos
os instrumentos usados para a mediação estão interagindo dialeticamente com o
conteúdo que se pretende ensinar (MARTINS; MOSER, 2012, p. 13).
Ainda na perspectiva de contribuir com as discussões acerca da mediação,
Fonseca (1998 apud MEIER e GARCIA, 2007), traz a conceituação de mediação na
concepção de Feuerstein. Este a vê como uma estratégia de intervenção que
subentende uma interferência humana, uma transformação, uma adaptação, uma
filtragem dos estímulos do mundo exterior para o organismo do indivíduo mediado.
Dessa forma, esse aprendiz ao interagir com o novo recebe estímulos em relação às
suas experiências, a fim de produzir aprendizagem apropriada intensificando as
mudanças nesse sujeito aprendiz. No entanto, a função do mediador não é apenas de
levar o aprendiz a perceber e registrar estímulos, mas determinar certas mudanças
na maneira de processar e utilizar a informação.
Neste sentido, os saberes de professores como mediadores didáticos (ensino,
aprendizagem, metodologia, mediação, avaliação, instrumentos) e conceituais
(teorias, conhecimentos, conteúdos, pensamentos, ideias, dentre outros), devem ser
compreendidos como instrumentos mediacionais de ações desenvolvidas pelo
indivíduo no desempenho de suas funções. Considerando que [...] o saber comum
que é aprendido no contexto social e no desempenho da prática, pode ser o grande
facilitador para aprender o saber científico que é ensinado na formação, e não o
processo contrário (CARLOS).
Desta forma, a mediação deve ser compreendida como a relação estabelecida
entre o sujeito e o objeto do conhecimento. Visto de outra forma, os saberes dos
professores podem ser entendidos como instrumentos de mediação no processo de
formação inicial de professores. Considerando, assim, que o saber do professor
egresso não se inicia no momento que ele ingressa num curso de licenciatura e faz
os primeiros contatos com os conteúdos curriculares dos cursos de formação, mas
sim, das relações que se estabelecem na vivencia diária, das atividades
153
desenvolvidas e das características da própria cultura, que são igualmente elementos
responsáveis pela construção dos saberes.
É relevante fazer reflexões acerca das contribuições que cada aspecto mediado
traz para o processo de formação inicial de professores, considerando a natureza
dupla da mediação (didático e conceitual) nesta investigação. Dessa forma, a
mediação didática na formação inicial de professores pode ser compreendida a partir
do entendimento de que:
[...] os conteúdos não possuem significados em si mesmos; de que aprender, construir conhecimento, é uma atividade cognitiva do aluno; de que existe uma relação entre a didática e a epistemologia das disciplinas; de que ensinar conteúdo não é o bastante, é preciso ensinar a pensar, a construir conhecimento, é preciso considerar a epistemologia da ciência, seus métodos de investigação e o seu desenvolvimento histórico (BENTO, 2013, p. 71).
Apoiando-me em aportes da Teoria Histórico-cultural e nos elementos
apontados por Bento (2013), compreende-se que a mediação didática se configura no
estabelecimento de relações entre o sujeito do ensino e o objeto a ser ensinado,
sempre em uma relação de troca e de entrega nos processos formativos. Com base
neste entendimento, a mediação didática é muito mais do que dizer o como ou o que
ensinar, é tornar a mediação um processo promovedor de ações mediáveis na
formação inicial de professores, em especial de professores de Matemática.
Da mesma forma, compreende-se mediação conceitual a partir das teorias, dos
conhecimentos, dos conteúdos, dos pensamentos, das ideias e de outros elementos,
que se configuram de forma complexa nas matrizes curriculares dos cursos de
formação de professores desenvolvidos nas instituições formadoras. Esses elementos
não são perceptíveis de forma imediata, mas a partir de uma dimensão mediata, ou
seja, quando essa descoberta ocorre aos poucos num processo de construção e
reconstrução, como bem coloca Konder (1987).
Os elementos constitutivos desse processo, que são os meios ou as
ferramentas para a mediação conceitual, não promovem o significado nem a
aprendizagem por si só. Esta é uma ação própria de cada indivíduo, que decorre da
154
forma como, onde e em que cultura essas ferramentas são usadas, pois os meios
culturais de um determinado contexto social são elementos que direcionam a ação do
indivíduo.
Visto de outra forma, os conhecimentos conceituais mediados nos processos
formativos são instrumentos que os indivíduos em formação obtêm a partir do
entendimento, da percepção, da interação, dos significados e da consistência dessa
relação com o objeto ensinado, que são atividades cognitivas próprias de cada
indivíduo. Apoiada em Bento (2013, p. 71), concordo que [...] é pela atividade
individual de aprendizagem que os indivíduos se apropriam ativamente da experiência
social, cultural e histórica da humanidade. Sem, contudo, deixar de considerar que
nenhuma forma de ensinar pode ser feita distanciada de um contexto histórico-cultural
em que os aspectos sociais são mobilizados também sob forte influência coletiva.
A partir do entendimento sobre mediação didática e conceitual aqui definidos
na perspectiva da Teoria Histórico-cultural de Vygotsky, compreende-se que a
formação de professores pode ser um processo mediado por elementos constitutivos,
que são construídos a partir das interações entre o ensinar e o aprender em ambiente
de formação. Sob esta ótica aproprio-me das vozes dos colaboradores para defender
a ideia de que:
[...] se os cursos de licenciatura fossem pensados baseados nas práticas de sala de aula, ou seja, na realidade das escolas básicas, teríamos professores de matemática bem melhor formados (sem querer fazer juízo de valor). Melhor formados no sentido de que eles poderiam, quando assumissem suas turmas, fazer um trabalho melhor e mais próximo do que aprendeu na teoria (FERNANDO).
No relato de Fernando, fica evidente um desejo de mudança para a formação
de futuros professores de Matemática, em que os cursos fossem [...] pensados
baseados nas práticas de sala de aula, ou seja, na realidade das escolas básicas..., o
que demanda uma responsabilidade maior por parte das instituições formadoras, pois
teriam que desenvolver um processo em que a formação do professor fosse com base
em [...] conhecimentos que estivessem mais próximos da realidade.... É o que se
evidencia nos excertos de Paulo e Clara.
155
[...] os cursos de licenciaturas deveriam sim, fazer a formação do professor com conhecimentos que estivessem mais próximos da realidade, não quero dizer que todo curso deve fazer isso, mas pelo menos aproximar o que se aprende nos cursos, com o que vamos trabalhar em nossas salas de aula. Isto seria o ideal, mas não é o real (PAULO).
[...] sim, devido às disparidades encontradas no conhecimento adquirido no ensino superior e a realidade do conteúdo programático na educação básica de Matemática (CLARA).
Neste mesmo sentido, João e Julia defendem uma formação de professores
tendo como base os saberes docentes por acreditarem que [...] é pela prática
adquirida com as experiências que os saberes docentes se desenvolvem e contribuem
para o aprimoramento didático que é fundamental para o desenvolvimento profissional
do professor (JULIA). Esta afirmativa sinaliza a importância dos saberes docentes
como mediadores didáticos na formação inicial [...] por estes deterem a capacidade
técnica para tal feito (JOÃO).
[...] sim, os saberes docentes devem ser vistos como mediadores didáticos no processo de formação inicial por estes deterem a capacidade técnica para tal feito (JOÃO). [...] com certeza, os saberes docentes devem ser os mediadores da formação porque é pela prática adquirida com as experiências que os saberes docentes se desenvolvem e contribuem para o aprimoramento didático que é fundamental para o desenvolvimento profissional do professor (JULIA).
Os relatos acima diferem nas palavras, mas todas as ideias convergem para
um único sentido, ou seja, que os saberes docentes de professores egressos do curso
de Licenciatura em Matemática, devem/podem ser vistos como mediadores didático e
conceituais na formação inicial de professores de Matemática. Neste sentido,
considero como aprendizagem mediada, o processo de integração entre alguém que
ensina (o mediador) e alguém que aprende (o mediado). Isto, de certa forma, explica
o papel das experiências interativas desenvolvidas por esses colaboradores em seus
contextos de prática, onde a cultura, os valores, as atitudes, os procedimentos, as
intenções etc., interferem diretamente nos resultados do ensino e da aprendizagem
de conteúdos matemáticos.
156
A maioria dos colaboradores denota a importância de uma formação
profissional fundamentada em uma prática que tem sua base construída numa
vivência real. Ela ocorre na escola, na sala de aula, lugar onde os saberes incorporam,
produzem, utilizam, aplicam e transformam-se em função das limitações inerentes às
atividades do trabalho docente, ocasionadas pela ausência de recursos de toda
ordem. É nesse campo de limitações que ocorre a integração entre os saberes
produzidos pelo professor de Matemática, que vai ser sempre um saber próprio
resultado de reflexões, sejam estas feitas em cursos de formação inicial, de formação
permanente, sejam da exposição em contextos de prática em que desempenha sua
rotina de trabalho.
Portanto, essas vozes não tomam o lugar de uma análise lógica das
proposições, mas de uma análise que vê nas frases ditas, todos os melindres de um
aspecto psicológico e contextual nas suas formulações. Essas vozes também podem
apontar uma complexidade nos posicionamentos, em que a plenitude da expressão é
profunda e corresponde a uma descrição do vivido.
Assim, uma análise de sentidos e de significados de saberes de professores de
Matemática torna-se eficiente, quando é capaz de descrever as noções que tentei
definir nas unidades de significados. Contudo, sem ignorar que o saber não é o
canteiro epistemológico que desapareceria na ciência que o realiza, mas que podem
ser demarcados pela tese por mim proposta de que as experiências práticas
vivenciadas por professores egressos do Curso de Licenciatura em Matemática são
capazes de promover o desenvolvimento de saberes docentes e servir de base para
propiciar a mediação didático e conceitual em processos formativos, na perspectiva
de minimizar as lacunas de formação e formar professores diferenciados para atuarem
na Educação Básica.
Tomando a Teoria da Docência como profissão de interações humanas
defendida por Tardif, sustento a proposição de que é possível formar futuros
professores de Matemática para a Educação Básica, por meio de um conjunto de
procedimentos a partir das lacunas de formação, vivenciadas de forma efetiva nas
práticas de sala de aula pelos professores egressos. Esses processos somados a
outros elementos estruturais podem propiciar um ambiente favorável a uma formação
que corresponda às necessidades que são demandadas pela sociedade
contemporânea e que podem ser mediados por via da integração entre: ensino,
157
pesquisa e extensão; teoria e prática; universidade e escola; conhecimento científico
e conhecimento do senso comum.
Podem ser, esses procedimentos, provocadores de mudanças em processos
formativos a partir do movimento de aproximação entre o professor em formação e a
realidade por meio de interações humanas, em que esse profissional irá exercer a
profissão docente. Nesse sentido, as interações cotidianas entre os professores e os
alunos constituem bem o fundamento das relações sociais na escola, essas relações
são, antes de tudo, relações de trabalho, que quer dizer, relações entre trabalhadores
e seu objeto de trabalho (TARDIF; LESSARD, 2014, p. 23). Esse movimento deve ser
visto como a mediação necessária para que haja a integração entre o conhecimento
aprendido e o conhecimento a ser ensinado.
Ainda na perspectiva de defender a tese por mim proposta nesta investigação,
é possível identificar nos processos formativos, a presença de elementos que são
desenvolvidos ao longo da formação. Componentes estes, que apontam para a
elaboração de propostas diferenciadas de formação, no sentido de quebrar
paradigmas existentes de ter a teoria como a essencialidade desse processo.
Portanto, esses elementos configuram-se de: um ensino mediado pela pesquisa; de
metodologias de ensino diferenciadas; da residência pedagógica ao longo da
formação e de constantes processos de revisão e reformulação no PPC do curso.
A presença dessas propostas nos processos formativos pode ser vista como
elemento facilitador para o desenvolvimento de aprendizagens significativas. E,
consequentemente, de uma formação em que os conteúdos curriculares possam ser
vistos não mais como obrigatórios, mas como necessários para a construção de
competências e habilidades essenciais na formação de professores para a Educação
Básica.
Desta feita, a partir da análise das vozes dos colaboradores, a pesquisa revela
notas que incidem sobre a formação inicial de professores de Matemática. Estas se
configuram em processos que demandam atitudes procedimentais, em que sejam
privilegiados aspectos que possam responder às expectativas daqueles que estão
sendo formados, considerando a necessidade de:
158
Promover no âmbito da formação inicial, procedimentos em que as ações de aula sejam aproximativas da realidade educacional, como um exercício necessário ao professor em formação;
Promover a integração entre os conhecimentos específicos e os conhecimentos pedagógicos, com vistas a construir a base de entendimento necessária para proporcionar ao professor em formação, o sentimento de pertencimento de sua profissão;
Promover a integração entre o ensino, a pesquisa e a extensão como elementos articuladores e promovedores de uma aprendizagem significativa na formação inicial de professores de Matemática.
Neste sentido, manifesto a compreensão de que os resultados da pesquisa
realizada acerca dos saberes de professores egressos do curso de Licenciatura em
Matemática da Microrregião do Salgado, poderão contribuir para que mudanças
ocorram no cenário de formação ora oferecido pela Faculdade de Matemática do
Campus Universitário de Castanhal. Sobretudo, colaborar para que a formação inicial
de professores de Matemática seja feita a partir da abertura ao diálogo, aos desafios
às inovações e às mudanças necessárias à formação de professores capazes de
compreender a importância de seu papel social e de sua relação com o mundo,
considerando que:
O ser humano torna-se aquilo que ele faz. O agir, quer dizer, a práxis, deixa então de ser uma simples categoria que exprime as possibilidades do sujeito humano de intervir no mundo, e tornar-se a categoria central através da qual o sujeito realiza sua verdadeira humanidade (TARDIF; LESSARD, 2014, p. 29).
Epilogo desta seção
Ao longo desta seção forneci elementos, ideias, perspectivas que permitissem
conhecer os saberes dos professores, em relação às questões de base discutidas
nesta pesquisa.
Pelas questões evidenciadas ao longo desta seção, compreende-se que o
professor e sua formação profissional estão ligados por uma visão da prática e que os
saberes são construídos das inter-relações desses colaboradores com o objeto da
prática, ou seja, o ensino.
O que ficou evidente, é que o saber não é um atributo que serve para denominar
a eficácia ou a eficiência do profissional professor. Ao contrário, o saber é um
159
construto social, produzido pelos sujeitos a partir da racionalidade, da motivação que
se constituem como fontes para seus julgamentos, suas escolhas e suas decisões,
além de outras questões que se movimentam e se articulam a partir das evidências,
dos sentidos e dos significados que são próprios de cada sujeito envolvido nesse
processo.
Nessa perspectiva, as competências para ensinar estão diretamente ligadas à
capacidade de racionalizar sobre a própria prática, buscando fundamentar-se na
razão e no agir. Nesse sentido, associei o saber docente dos colaboradores às
práticas cotidianas, tomando como base as vivências, as experiências e a própria vida
desses professores.
A pesquisa também evidenciou que esses colaboradores desenvolvem seus
saberes docentes dos erros e dos acertos no desenvolvimento de suas práticas diárias
no exercício docente. Estes saberes desempenham papel fundamental no exercício
da sala de aula, em que na ausência de uma formação mais próxima da realidade,
eles conseguem fazer o movimento de ensinar e aprender para atingir o grande
desafio da escola: ensinar cidadãos para o futuro.
Ao encerrar esta seção, anuncio a quinta e última seção que denominei de
Últimas Palavras que se fez das descobertas e das contribuições que foram
decorrentes desta investigação. Para dar corpo e forma a esta seção, além dos sinais
surgidos na investigação, faço uso de outras vozes que ecoaram e foram tomadas a
termo para uma breve análise, como registro da relevância dessa interlocução na
finalização das ideias construídas, considerando estas últimas palavras como a
maneira de expressar, compartilhar e socializar, aquilo que resultou desta
investigação que me trouxe algumas certezas. Mas, também trouxe inquietações que
irão servir de estímulo para fazer outras buscas, sempre que necessário for para que
mudanças ocorram na minha formação de professora formadora de professores de
Matemática.
160
5. Conhecimentos como modificadores de Práticas
Sim, sou eu, eu mesmo, tal qual resultei de tudo...
Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou eu...
Quanto quis, quanto não quis, tudo isso me forma...
(Fernando Pessoa)
E aqui estou para um último olhar. Olhar e me ver tal qual resultei de tudo o
que foi vivido nas idas e vindas pelas veredas das paragens que serviram de cenário
nessa caminhada. Fatos e acontecimentos foram sendo acrescentados no meu
construto pessoal e profissional, pois nunca saímos do campo de investigação da
mesma forma que entramos. Nesse processo haverá sempre, elementos que são
promovedores de intensa transformação.
Neste sentido, esta seção foi especialmente pensada/produzida para vos dizer
que em todos os lugares em que estive, de tudo aquilo que meus olhos conseguiram
observar, do que os meus ouvidos conseguiram escutar e de minha memória registrar,
das pessoas que cruzaram o meu caminho, independente de fazerem ou não parte
da pesquisa, proporcionaram-me crescimento pessoal, profissional e intensa
transformação na minha prática docente. Especialmente por me fazerem
compreender que os saberes que se constroem e são construídos nos processos de
formação de professores, é um todo que está em cada uma das partes dos sujeitos
envolvidos nesse processo.
Esse olhar, essa escuta e esses registros, certamente foram influenciados
naquilo que Malinowski (1986) identifica como sendo o “ponto de vista do nativo”. Isto
é, diz respeito às ideias, aos sentimentos, aos impulsos, à maneira de examinar as
formas típicas de pensar e sentir os acontecimentos, registrar as expressões
linguísticas, as frases e seus contextos habituais de uso. O “ponto de vista”, apontado
pelo autor ficou evidenciado nas conversas investigativas junto à comunidade local,
em especial nas escutas do barqueiro e do curraleiro, que fazem parte das discussões
feitas nesta conversa final.
Desta forma, esta conversa final se faz na perspectiva de fazer um breve
anúncio do que foi produzido dos encontros, desencontros e achados no percurso da
161
pesquisa e os conhecimentos produzidos, que serviram como modificadores de minha
prática docente. Nesse sentido, organizei esta seção em subseções, como forma de
expor de maneira ordenada, os construtos que foram sendo concebidos ao longo
desta caminhada.
Na primeira subseção, que denominei de Escritas do Contexto... a influência
das águas, fiz o registro de fatos, paisagens, saberes e tudo o que foi possível
enxergar por lentes, não só da pesquisadora, mas da professora formadora de
professores de Matemática que se inquieta: Quem estou formando? Que se
questiona: Para que sociedade estou formando? Como forma de compartilhar aquilo
que fui construindo ao longo da minha vivência pelas paragens por onde andei.
A segunda subseção denominada de Escritas de Si... a maioridade intelectual,
realizo o compartilhamento das provocações resultantes da pesquisa em minha ação
formadora, na minha capacidade de fazer reflexões, nas mudanças ocorridas a partir
das experiências vivenciadas neste processo formativo.
Na terceira subseção que denominei de Escritas do Outro... as histórias que se
quer contar, faço um anúncio do que os meus ouvidos guardaram das falas, das frases
entrecortadas, de silêncios e dos olhares dos atores sociais envolvidos nesta
investigação. Isto, como forma de dizer o que ocorre nos lugares de prática de
professores egressos do curso de Licenciatura em Matemática.
Na quarta e última subseção denominada de Escritas da Escrita... entre
teorias, relatos e reflexões, faço a retomada pelas trajetórias da produção. Momento
em que alguns questionamentos já se fazem provocadores de reflexões. Para tentar
respondê-los, retomo as teorias que foram aprendidas ao longo da formação, tendo o
cuidado de fazer a aproximação dessas teorias a uma concepção prática. Contudo,
sem me distanciar da essência do que cada teoria acrescentou, na perspectiva de
fazer dessas reflexões novas aprendizagens, pois aqui os conhecimentos
apreendidos e os achados da pesquisa já fazem o seu papel de modificadores de
práticas docentes.
162
Escritas do Contexto... a influência das águas
O contexto em que realizei a pesquisa acerca dos saberes docentes de
professores de Matemática revelou-se um lugar de extrema beleza e uma simplicidade
envolvente. Nesse lugar convivi com pessoas que sobrevivem das riquezas naturais
que esse cenário oferece. Em especial, o ecossistema com a maior diversidade de
substâncias vivas, o mangue, ambiente composto por matéria orgânica que serve de
alimento para uma extrema cadeia alimentar. É nesse cenário que fui ao encontro de
saberes de professores de Matemática.
Os saberes encontrados na Microrregião do Salgado são saberes singulares,
pois conseguem diferenciar-se em um ir e vir da maré. Visto de outra forma, a
enchente ou vazante da maré determina a existência ou não de determinados
saberes, pois aqui uma criança é capaz de saber o movimento da maré e o que isso
representa no dia a dia dessas crianças.
Alguns municípios da microrregião sofrem influência das águas, que pode
interferir no andamento das práticas diárias de todos os que moram neste lugar.
Inclusive, interfere diretamente na rotina da sala de aula e na forma que o professor
de Matemática conduz suas aulas.
A maré cheia pode, por exemplo, determinar se as crianças que moram às
margens dos rios vão conseguir ou não chegar às escolas para mais um dia letivo. A
vazante da maré pode significar dificuldades para chegar à escola, pois os rios com
baixo volume de água podem impedir que os “cascos” (pequenas embarcações)
cheguem até os seus destinos. Ou seja, as escolas que ficam à margem dos rios.
Em outras situações, essas dificuldades não são causadas pelas estradas de
rios que cortam a microrregião, mas pela distância entre a escola e a casa do
estudante, sendo necessário caminhar horas para chegar à sala de aula. Essa
caminhada exige do estudante maior esforço para chegar à escola diariamente. É
exaustiva, levando esse estudante ao cansaço e pouco disposto a aprender, situação
comum nas escolas da zona rural. Em outras, a falta de transporte escolar é o grande
problema encontrado na microrregião. Isto porque, dada sua extensão territorial, sua
diversidade de solo entrecortado de rios, com pontes quebradas, vicinais
malconservadas, são razões para limitar e dificultar o acesso à escola. O desempenho
do aluno fica comprometido, por conta das constantes ausências na sala de aula.
163
A Microrregião do Salgado é conhecida por situar-se às margens dos rios que
cortam a Mesorregião Nordeste Paraense. Esses rios sofrem a influência da maré,
levando suas águas a subirem e a descerem de nível. Podem ainda, sofrer influências
das chuvaradas, que são mais intensas em determinada época do ano. Portanto, as
águas influenciam a rotina diária dos habitantes da microrregião. Rotina essa que
promove a aprendizagem de saberes, que a própria natureza se encarrega de ensinar.
Durante minha permanência neste lugar, também fui capaz de aprender
conhecimentos que não estavam no percurso da pesquisa, mas que somaram para
meu crescimento intelectual.
Escritas de Si... a maioridade intelectual
Começo esta caminhada bem antes do processo de formação doutoral, pois
que perpassa pelas questões afetivas, emocional e profissional para chegar até aqui.
Contudo, quero me ater à formação que está em processo. Posso afirmar que a
formação doutoral foi e está sendo feita sob grandes expectativas no sentido de
construir minha maioridade intelectual. Aqui me encontro com outros interlocutores
que fizeram-me compreender que as teorias são necessárias, porém não suficientes
para dar conta de mediar a ação de ensinar, outros elementos devem ser inseridos
nesse processo.
Desta forma, ao longo do processo de formação doutoral, fui provocada,
instigada, desafiada a fazer reflexões, a compreender, a saber fazer uso dos saberes
e conhecimentos que foram aprendidos e provocadores de mudanças na minha
construção pessoal e profissional.
Primeiro, por ter a oportunidade de conhecer pessoas de outras paragens e
rincões deste país. Pessoas essas que estiveram fortemente presentes neste
processo e deixo de nomeá-las para não criar uma escala de importância. Contudo,
posso afirmar que cada uma delas teve seu lugar especial, neste caminhar. Cada um
desses seres contribuiu de forma incisiva para meu crescimento intelectual, seja por
me mostrar caminhos a serem seguidos ou por ensinar aquilo que eu deveria
aprender. Seja pelas posturas, comportamentos e posicionamentos em determinadas
situações em que a sabedoria, o bom senso, a lucidez, a espontaneidade e a
164
sensibilidade foram elementos essenciais para me mostrarem que ter uma postura
doutoral também deve fazer parte deste construto.
Segundo, de estar em meio às teorias que discutem as bases epistemológicas
das ciências, a identidade de ser professor, a construção de saberes outros que
serviram e servem de embasamento teórico para as mudanças na minha formação,
na melhoria de minha ação como professora formadora, de minha capacidade de fazer
reflexões, de repensar minha prática e de fazer mudanças a partir das experiências
vivenciadas neste processo formativo.
Durante esse processo, precisava encontrar meios de fazer do saber aprendido
uma base de sustentação para alcançar a minha maioridade intelectual. Nessa busca
encontrei uma forma bem prazerosa para o alargamento dos conhecimentos gerados:
os encontros com gosto e cheiro de café.
Um café com gosto de reflexão epistemológica...
Ao longo da formação doutoral, adotamos (eu e alguns colegas de curso) ao
final de cada aula, nos encontrar em um café para fazermos reflexões acerca das
questões que foram discutidas durante a aula, com a intenção de partilhar dúvidas,
ansiedades, inquietações. Dessas conversas, surgiam outras ideias e outras dúvidas
que giravam em torno das teorias aprendidas e de nossas intenções de pesquisa.
Nos primeiros encontros reflexivos entre um café e outro era comum ouvir
nossas primeiras indagações: Será que eu tenho uma tese? O meu objetivo dá conta
de sustentar minha tese? Que metodologia é a mais adequada? Que teorias
sustentam minha tese? Esses e outros questionamentos eram trocados entre nós, na
intenção de compartilhar nossas inquietações para que estas fossem atenuadas ou
incitadas.
Os registros dessas reflexões eram feitos em “guardanapos de papel” e depois
de algum tempo, fazendo a leitura de um livro, descobrir que grandes ideias
empresariais como as de Steve Jobs, tiveram seu primeiro registro em guardanapo
de papel. Essas ideias também surgiam em momentos em que Jobs sentava-se em
cafés para vaguear em seus pensamentos e acreditava que nunca se deve subestimar
o poder de uma visão tão simples, a ponto de ser esboçada em um guardanapo de
papel.
165
Durante esses encontros, vários foram os guardanapos de papel usados, para
registrar nossos escritos, desenhos, riscos e rabiscos, que cada um fez uso para
registrar, melhorar ou mudar ideias já concebidas. Além de partilhar nossas dúvidas,
durante essas conversas, passamos a trocar as leituras feitas, resumindo em linhas
gerais os livros que foram lidos por cada um. Assim como, indicar a leitura de obras
que iriam contribuir com as discussões de cada questão de investigação.
Esses encontros além de serem produtivos academicamente, tinham grande
significância de ordem afetiva-emocional, pois aqui éramos apenas pessoas com
limitações, dificuldades e com uma mistura de sentimentos que vale destacar.
Companheirismo – é o que nos fazia sentir que não estávamos sozinhos,
mesmo que alguns de nós estivéssemos longe de nossos familiares, pois estes
moravam em outros estados, outros municípios. Esse estar juntos também servia para
que a ausência da família fosse amenizada e uma nova família fosse construída;
Compartilhamento - que resultaram em crescimento pessoal e profissional.
Cada um de nós tem vivências, experiências e conhecimentos próprios, que ao longo
desses encontros eram partilhados, socializados, que serviram de exemplos a serem
seguidos. Esse compartilhamento de saberes foi a marca dos encontros, pois cada
um acrescentava algo novo ao conhecimento do outro. Uma troca que ocorria sem
demarcação para acontecer, apenas cada um crescia um pouco na sua maioridade
intelectual;
Sensibilidade – um aspecto muito importante, pois poder contar com alguém
para nos ouvir e conseguir entender as dificuldades da não compreensão de teorias
mais complexas. Afinal todos nós estávamos passando pelo mesmo dilema. A
sensibilidade de saber escutar o outro, sem dúvida é muito importante para quem está
vivendo a escrita de uma tese ou de problemas de ordem pessoal, emocional, entre
outras questões presentes nessa travessia de formação.
Conforme o tempo foi passando, esses encontros fortaleciam-se e se tornaram
rotina. Agora as conversas eram outras, mais profundas, mais elaboradas, já com
algumas certezas. Porém, algumas dúvidas ainda permaneciam, provocavam e
estimulavam outras discussões. Mas, as conversas reflexivas agora tinham um outro
sabor, apontavam uma direção, pois giravam em torno de uma teoria, da constituição
de capítulos, das análises e das certezas das escolhas feitas neste caminhar.
166
Saíamos desses encontros fortalecidos, pois sempre acabávamos contando
outras histórias e casos que provocavam risos. Isto, de certa forma ajudava a
descontrair e tinha um efeito renovador, pois nessas contações aprendíamos um
pouco mais, um sobre o outro e os laços afetivos se fortaleciam. Cada um contava um
pouco de si, de sua história, de sua vida pessoal e profissional, além de fazer
projeções futuras como professores pesquisadores de nossas práticas.
As aprendizagens suscitadas desses encontros só vieram confirmar que
estudos colaborativos devem ser estimulados em qualquer nível do ensino. Porque é
nessa troca que as dúvidas do que não ficou entendido, podem ser dissipadas. É
também, o lugar em que surgem grandes ideias (mesmo que sejam registradas em
guardanapos de papel), que podem ser alimentadas em ambientes de prática docente,
seja como professores, seja como pesquisadores.
Nesses encontros também foi possível ter a compreensão de que os
conhecimentos construídos na formação doutoral decorrem de um processo dialético
entre as teorias, as inter-relações, as trocas com os pares e das intervenções que são
mediadas pelas interlocuções entre os doutores formadores e doutores em formação.
Esses momentos, portanto, foram ímpares. Hoje pego os meus “guardanapos
de papel” com meus riscos e rabiscos e observo o quanto essas poucas linhas foram
importantes. O quanto contribuíram para a feitura desta tese, seja do ponto de vista
de um simples insight, seja de uma ideia iniciada e amadurecida a posteriori. Esses
encontros tiveram essa importância porque queríamos estar juntos, naquele lugar,
fazendo o que fazíamos e da forma como fazíamos. Após esses encontros, eu
retornava à minha casa e durante esse caminho, havia momentos de intensas
reflexões, pois aqui me encontrava sozinha com meus pensamentos.
No meio do caminho tinha... um caderno de campo.
Durante a feitura da tese adotei como prática a escrita dos pensamentos que
se desenhavam no caminho de volta (para ir e vir à universidade faço um percurso de
160km) para casa. Ao voltar a minha casa, tomava um ônibus e ao longo do caminho,
o pensamento ia registrando coisas, fatos, passagens que de certa forma eram meus
companheiros de viagem e isto me permitia fazer os registros no meu caderno de
campo, julgando ser relevante para a escrita.
167
Nesse processo de escrita, me via só com meus pensamentos. As inquietações
iam desenhando-se e precisavam ser registradas para depois serem refletidas e
absorvidas em um processo de imersão do pensado. Nesse exercício aprendi que na
dificuldade devemos substituir o “não consigo’” por “vou tentar outra vez”. Foram
muitas as tentativas para encontrar o caminho a ser percorrido.
Assim, esses escritos serviram para delinear os caminhos a serem percorridos
na composição do corpus da tese, pois aqui era possível escrever, reescrever para
acertar na condução da pesquisa. Foi também neste percurso que conseguia ordenar
meus pensamentos, fazer anotações e refletir sobre o lugar institucional ocupado pelo
colaborador desta pesquisa. Momento que ele se relaciona com o objeto, obtém seu
discurso, encontra o ponto de aplicação de seus objetivos, seus instrumentos sejam
de ensino, sejam de verificação da aprendizagem. Aqui começava a delinear uma
escrita em que eu conseguisse me colocar no lugar do outro.
Escritas do Outro... as histórias que se quer contar
Coloco-me, aqui, no lugar dos colaboradores desta pesquisa, pois assim como
eles também sou natural da Microrregião do Salgado. Nos primeiros anos de minha
vida escolar igualmente fui vítima da negação do saber da cultura. Estive sempre
refém dos saberes que estão nos livros didáticos e dos parcos conhecimentos da
professora18, aprendidos também com professores sem formação adequada. Nesse
momento, ensinar era visto apenas como um trabalho qualquer, não havendo
necessidade de grandes conhecimentos.
No entanto, o exercício docente não deve ser visto como um trabalho que
desgasta, que cansa, que traz insatisfação, pois este exercício acontece em um lugar
que se chama escola, ou seja, o lugar do lazer. A palavra escola deriva
do grego σχολή (scholē), originalmente significa "lazer". Portanto, a escola não deve
ser vista como o lugar da obrigatoriedade, do castigo, da disciplina, da repressão.
Mas, como o lugar do lazer, porque é na escola que a criança tem (ou deveria ter)
tempo para estudar, refletir, brincar de fazer ensaios de aprendizagem, sem precisar
pensar que aprender não pode ser uma atividade prazerosa.
18 Naquela época décadas de 1960/1970, para ser professor em uma escola pública de municípios mais
distantes dos grandes centros, bastava ter a 5ª série do ensino fundamental.
168
Neste pensar, minha memória revisita a escola em que estudei, que deveria ser
o lugar do aprender e não o lugar do castigo por não conseguir aprender. Faço esse
retorno para compreender que as dificuldades encontradas para ensinar e para
aprender não são problemas atuais, remontam a um tempo longínquo, que sempre
existiram, independente da formação do professor. Essas dificuldades foram
expressadas pelos colaboradores e analisadas na quarta seção, em que aspectos
como: teoria, prática docente, conteúdos específicos, lacunas de formação, saberes
docentes, ganharam lugar nessas vozes.
Essas vozes evidenciaram que parte das dificuldades para ensinar são
resultantes da formação deficitária, recebida em cursos que têm formatos
bacharelescos, em que a preparação nas licenciaturas distancia-se da realidade do
professor em formação. Contudo, não percebi por parte desses colaboradores,
desânimo, pelo contrário, nas escolas que visitei no cenário de investigação, havia
sempre uma história de superação das dificuldades encontradas por esses
colaboradores no desenvolvimento de suas práticas docentes.
Isto comprova que a escola pode ser um lugar de superação, pois é um local
de observação constante, codificada, sistemática, que pode se constituir um campo
fértil de observação de práticas de professores. Principalmente dos que estão sendo
formados por instituições que devem oferecer conhecimentos que compreenda não
somente os conteúdos que estão nos livros para serem ensinados e tradicionalmente
reconhecidos como válidos, mas devem oferecer especialmente um conjunto de
informações. Para que possam ser absorvidas e materializadas em um movimento do
ensinar e do aprender nas salas de aula e, portanto, podem por ela ser validadas.
A partir das vozes dos colaboradores, compreende-se que os conhecimentos
aprendidos na formação inicial estão distanciados da realidade da sala de aula.
Levando o professor a fazer reflexões [...] penso também nas aulas de matemática
que tive e que não ministraria para meus alunos (JULIA), e não adotar os mesmos
procedimentos com as quais foram ensinados.
Observa-se no relato de Julia que em determinado momento de sua formação
houve aulas que não serviram como suporte para formá-la professora. Ao contrário,
não lhe acrescentaram conhecimentos que pudessem ser usados na sala de aula de
forma efetiva. Esses são os riscos inerentes à profissão de professor, que vão ser
169
evidenciados em sala de aula no momento em que o movimento de ensinar e aprender
vão estar também, sobre forte carga emocional.
Desta forma, a sala de aula deve ser também o lugar de reflexões da prática
[...] quando estou na sala de aula com meus alunos, penso que o futuro deles depende
também de mim e, por isso, tenho a obrigação de fazer bem feito (CLARA) e do
repensar a ação de ensinar.
A partir das reflexões feitas por Julia e Clara, compreende-se que há por parte
do professor, certa preocupação em estar em constante processo de aprender para
fazer melhor. Nem sempre o que se aprende nos processos formativos é passível de
ser ensinado nas salas de aula, especialmente da Educação Básica.
Neste pressuposto devemos olhar a sala de aula não como lugar comum, das
evidências da escola sucateada, professores mal remunerados, salas de aula
superlotadas e de todas as mazelas dos sistemas de ensino. Mas, devemos nos ater
naquilo que não está evidente, do que está presente nas práticas, nos
comportamentos, nas atitudes que são movidas pelos sentidos, pelos significados e
pelo sentimento de pertencimento de ser e não de estar professor. Do movimento que
leva às escolhas, que embora sabendo dos riscos, dos dilemas, das angústias e do
lugar de impotência que os informantes deixaram entrecortados de silêncio e da
resiliência ao fazer seus relatos.
Ainda assim, tem uma certeza: querer ser professor, pois acredita na
possibilidade de ser um possível modificador de vidas. Acredita ainda, que a educação
é o meio seguro e provocador de mudanças sociais e de concepções de homem, de
sociedade, de valores e de conceitos que circundam nos saberes e fazeres de ser
professor.
Essa postura do professor de Matemática da Microrregião do Salgado perpassa
pela construção da identidade de ser professor, que é gerada pela relação
estabelecida com o objeto da ação pedagógica. Essa relação pode ocorrer em
diversos espaços, de diversas e variadas formas. Desde o envolvimento com a própria
instituição, com as interações realizadas com os profissionais da escola, por meio do
contato com os instrumentos e ferramentas de trabalho, das práticas, de contatos de
casualidade com os sujeitos presentes no seu convívio social ou não.
170
Todas essas formas de se relacionar com o objeto podem ser elementos
constitutivos da identidade de ser professor. Portanto, pensar a educação como o fio
condutor de mudanças é pensar nos processos de formação que se desenvolvem e
são desenvolvidos nos sistemas de ensino perpassando em todos os seus níveis.
Desta forma, uma de minhas preocupações como professora formadora de
professores de Matemática reside em perguntar-me: Como estou formando? E para
que estou formando professores de Matemática? Que após receberem essa formação
vão estar nas salas de aula desenvolvendo suas práticas docentes na Educação
Básica. Professores esses que vão estar nas escolas, lugar onde ocorre o encontro
com as revelações que vão se desenhando, tomando forma e criando vida, para
compor as histórias que se quer contar, ou que se pretendeu contar. Pois é nesse
lugar que o comum se torna inusitado, causa espanto e desperta o interesse de quem
nesse lugar chegar para escrever outras histórias que se desenham das vivências,
das teorias e das reflexões de cada um.
Escritas da escrita... entre teorias, relatos e reflexões
Esta escrita reserva-se às trajetórias da formação doutoral, especialmente da
feitura desta tese, pois aqui os primeiros questionamentos já se faziam provocadores
de reflexões: Consegui atender o objetivo da pesquisa que me propus a investigar?
Que conhecimentos foram gerados pela pesquisa? Como esses conhecimentos
podem ser modificadores de práticas no contexto acadêmico e social? Os resultados
trouxeram contribuições para a melhoria da formação de professores de Matemática
no contexto investigado? Até onde a pesquisa foi capaz de me levar além das teorias
estabelecidas? Entre outros, que certamente podem surgir ao longo desta conversa
final.
Esses questionamentos começam a fazer-me companhia e fico inquieta para
tentar responder à medida que vou caminhando entre as teorias, os relatos e as
escritas que vão criando corpo, tomando forma. Apesar das resiliências que a própria
construção de uma formação doutoral coloca-me, tentei conviver e lidar com as
minhas limitações, sem, contudo, deixar-me levar pelo cansaço ou desanimar diante
das dificuldades. Pelo contrário, fiz de cada novo dia um desafio a ser vencido, na
ultrapassagem de cada obstáculo que se fez presente.
171
Desta forma, consigo pensar que quando somos lançados no campo da
investigação, somos conduzidos a buscar respostas às nossas perguntas. Nesse
percurso estamos atreladas às teorias que irão fundamentar a questão de
investigação. No entanto, ao longo desse processo percebemos que o campo de
pesquisa aponta direções que nem sempre estão presas a teorias ou as teorias postas
dão conta de sustentar o investigado.
Nesse sentido, o material subjetivo conceitual constituído em campo pode levar
a buscar outras maneiras de interpretar o que está sendo descoberto. Foi assim que
me senti, quando me vi diante do material social constituído pelos colaboradores. Os
relatos pareciam fugir do que havia sido pensado a priori, como teoria de sustentação
para as análises. Fato que me levou a buscar outras formas para responder as minhas
indagações. Nessa procura encontrei outras fontes e nelas alimentei-me para poder
responder ao objetivo proposto nesta investigação.
Na intenção de responder ao objetivo desta pesquisa, que se propôs a analisar
os saberes docentes de professores de Matemática da Microrregião do Salgado para
compreender de que forma estes podem ser entendidos como mediadores didáticos
e conceituais na formação inicial de professores de Matemática, fui a campo. Das
escutas consegui encontrar sentidos e significados nos relatos dos colaboradores que
correspondem ao propósito de sustentar a tese por mim proposta, de que as
experiências práticas vivenciadas por professores egressos do Curso de Licenciatura
em Matemática devem desenvolver saberes docentes, que podem servir de base para
promover a mediação didático e conceitual em processos formativos, na perspectiva
de minimizar as lacunas de formação e propiciar a formação de professores
diferenciados para atuarem na Educação Básica, a partir do diálogo entre os saberes
próprios do contexto e os saberes específicos da área do conhecimento. Como visto
na quarta seção a partir da análise dos relatos dos colaboradores.
Desta forma, durante a investigação as expectativas foram atendidas,
considerando que no desenvolvimento de uma pesquisa sempre são criadas
expectativas em relação aos seus resultados. Contudo, não deveríamos fazer
pesquisa visando resultados imediatos, pois uma pesquisa é movida pelas perguntas
e não pelas respostas. Isto me levou a primeira reflexão: Consegui atender o
objetivo da pesquisa que me propus a investigar?
172
Os resultados de uma pesquisa podem ser surpreendentes do ponto de vista
de não trazer as respostas que se queria ter para determinada pergunta. Razão essa
que uma boa pergunta de pesquisa é sempre aquela em que sua resposta pode
surpreender ou fugir de um todo organizado. Portanto, considero que o objetivo
proposto foi atendido, à medida que as análises dos relatos dos colaboradores iam
tomando forma e respondendo as minhas indagações. Assim fazendo-me ver que a
formação de professores ainda está atrelada a modelos que não atendem às
necessidades formativas desses profissionais, que desenvolvem suas atividades
docentes nas salas de aula das escolas públicas em que a pesquisa foi desenvolvida.
Os resultados da investigação tornaram evidentes que mesmo que a formação
inicial recebida tenha deixado lacunas, que os conhecimentos aprendidos sejam
distanciados da realidade em que desenvolvem suas práticas, ainda assim, os
colaboradores que participaram desta pesquisa, desempenham a profissão docente
buscando alternativas de ensino e de aprendizagem que corresponda às expectativas
da sala de aula. Independente dos conhecimentos que foram gerados na formação, o
que me levou a um outro questionamento: Que conhecimentos foram gerados pela
pesquisa?
Em se tratando de investigar os saberes docentes para compreender como
estes podem ser vistos como mediadores didáticos e conceituais na formação inicial
de professores de Matemática, obtém-se como resposta imediata, que estes devem
sim, ser vistos como mediadores deste processo, pois [...] os saberes que são
desenvolvidos na prática docente podem ser grandes incentivadores para o
desempenho de uma formação mais apropriada para a realidade atual (BRUNO).
A realidade apontada por Bruno é o que faz desse professor, um criador de
estratégias de ensino para desempenhar seu exercício docente, pois [...] é pela prática
adquirida com as experiências que os saberes docentes se desenvolvem e contribuem
para o aprimoramento didático que é fundamental para o desenvolvimento profissional
do professor (JULIA).
Os saberes apontados por Julia, são aqueles desenvolvidos no dia a dia da
sala de aula, a partir das situações surgidas, que exigem do professor uma [...]
capacidade técnica para tal feito (JOÃO). Contudo, dos conhecimentos gerados pela
pesquisa foi possível compreender que os saberes docentes advindos de professores
173
de Matemática da Microrregião do Salgado é somente uma parte do todo necessário
para formar professores.
Pensar a formação de professores é pensar na complexidade que envolve
outros elementos que devem estar inseridos nesse processo. Elementos que
demandam esforços conjuntos de uma série de outros fatores, que perpassa pela
reformulação do PPC do curso de Licenciatura em Matemática e pela formação
permanente dos professores formadores. Isto, com vistas à promoção de práticas
mais humanizadas. Afinal, formar professores é uma prática feita por humanos para
humanos, que vem ao encontro da Teoria da Docência como uma profissão de
interações humanas, defendida por Tardif.
A pesquisa trouxe revelações que não eram previstas, como por exemplo,
mostrar que os saberes dos professores de Matemática não são apenas “saber que”,
que corresponde ao conhecimento proposicional da não crença, do fazer por fazer.
Visto de outra forma, trabalhar um conteúdo pelo conteúdo, apenas porque este
conteúdo faz parte da matriz curricular da série/ano de escolaridade, sem se importar
com os resultados desse ensinar. Mas, um “saber como” que corresponde ao
conhecimento processual do fazer prático. Um “saber como” que foi construindo-se
ao longo do exercício docente e do enfrentamento dos problemas surgidos em suas
salas de aula, onde nem sempre o que está para ser ensinado é o que deve ser
ensinado.
Dessa forma, o conhecimento processual visto como crenças e verdades pode
ser modificador de práticas, tanto no contexto acadêmico quanto no social. Os sujeitos
envolvidos nesse processo também são modificados por suas verdades, a partir da
crença de que o saber docente vai além de ter domínio sobre os conteúdos. Outros
elementos didático-pedagógicos (ensino, aprendizagem, metodologia, mediação,
avaliação, instrumentos) e conceituais (teorias, conhecimentos, pensamentos, ideias)
fazem parte desse todo organizado, uma vez que a escola e a sala de aula são
contextos sociais. Sendo, portanto, componentes essenciais para mudanças pessoal
e profissional, além de contribuírem para a superação de uma formação linear e
mecânica, que pouco tem contribuído para a transformação da realidade da sala de
aula, da escola e da sociedade.
Neste pensar e considerando minha formação doutoral como sendo
modificadora de minha prática, fui em busca de compreender mais um
174
questionamento que se fez, que considero como a questão essencial destas últimas
palavras: como esses conhecimentos podem ser modificadores de práticas no
contexto acadêmico e social?
Responder a esta indagação leva-me a uma confrontação com as teorias que
foram discutidas ao longo da formação doutoral, momento em que ocorria a
construção da pesquisadora, sempre na tentativa de compreender as teorias
oferecidas por teóricos como Pierre Bourdieu com seu Senso Prático, em que nos
brinda com uma discussão complexa sobre o habitus, o que provocou indagações e
me levou a buscar outras fontes que ajudassem a esclarecer pontos obscuros dessa
discussão.
Apesar das várias tentativas de compreender o que Bourdieu queria dizer-me
com as discussões relativas ao habitus, a compreensão só foi possível quando
consegui levar esse entendimento para além da teoria estabelecida. Dessa forma, fiz
a transposição da teoria a uma situação prática, real, em que eu conseguisse
conceber o habitus como um instrumento conceptual. Fator que me auxilia a organizar
os pensamentos, promove a relação e a mediação entre os condicionamentos sociais
e a minha própria subjetividade. Assim, sou levada a pensar as características de uma
identidade social que necessito para compreender como faço minhas escolhas e que
me habilita a pensar o processo de constituição da minha identidade como professora
formadora de professores de Matemática no mundo contemporâneo.
Ainda em relação aos conhecimentos que foram gerados e compreendidos a
partir de uma proximidade prática, tomo como referência a Teoria Antropológica do
Didático de Yves Chevallard. Aprendi com esta teoria que todo produto intencional da
atividade humana é um objeto. Em outras palavras, nossa identidade é construída de
nossas relações e interações pessoais, institucionais, que são objetos frutos de
nossas histórias de submissões passadas e presentes que formam nosso universo
cognitivo. É dessa forma, portanto, que nos tornamos a pessoa que somos.
Essa relação com objeto levou-me a fazer associação com a teoria do
Paradigma da Complexidade, de Edgar Morin. A partir dessa teoria, que fui capaz de
compreender que o objeto depende do sujeito. Este, por sua vez, deve interagir com
o objeto, em um movimento que exige, não só que o observador se observe a si
mesmo ao observar os sistemas, mas também, que se esforce por conhecer o seu
conhecimento. Pois o mundo está em contínuo movimento por um processo que
175
envolve a contradição e a luta dos contrários, ou seja, tese, antítese e a síntese, como
bem define o movimento dinâmico da dialética.
Dessa forma, os conhecimentos aprendidos na formação doutoral fazem um
movimento em direção às minhas práticas, o qual nas inter-relações com as teorias
foi possível compreender a existência de um tempo da ciência que não é o tempo da
prática. Em outros termos, os saberes teóricos aprendidos necessitam de maturação
para darem conta cientificamente da prática, considerando que as propriedades da
prática se desenvolvem no tempo e com o tempo, depende ainda, da interação de
cada sujeito com o contexto de prática.
Desse modo, os conhecimentos produzidos ao longo da formação doutoral
proporcionaram o avanço necessário para fazer desses conhecimentos elementos
modificadores de minha prática docente, tanto no contexto acadêmico quanto no
social e fazer das teorias aprendidas a base para que essas mudanças ocorram.
Mudanças que foram consolidando-se quando me vi no campo investigando,
inquirindo, quando da realização desta pesquisa, pois nessa busca encontrei-me com
sujeitos que assim como eu, estão nas salas de aula mediando o ensino, modificando
vidas. Neste pensar questionei-me: Os resultados da pesquisa trouxeram
contribuições para a melhoria da formação de professores de Matemática no
contexto investigado?
A este questionamento posiciono-me no lugar de observador e tenho como
resposta que trouxe sim, resultados que me permitiram compreender que melhorar a
formação de professores no contexto investigado deve incidir a partir de um processo
que favoreça a legitimidade de ser professor. Dessa forma, poder quebrar paradigmas
de que a docência é um fazer vocacionado.
Essa melhoria deve estar embasada nos diferentes aspectos da história
individual e profissional do docente. No entanto, essas melhorias só devem ocorrer da
utilização de uma abordagem teórico-metodológica que vai dá voz ao professor, sendo
compreendido como um profissional que adquire e desenvolve conhecimentos, a partir
da prática, da mobilização de saberes e do confronto com as condições da profissão.
Especialmente, de um contexto onde a melhoria do processo formativo envolve outros
elementos que estão presentes nesse contexto. Portanto, é preciso quebrar práticas
de formação que estejam atreladas ao ensino de disciplinas isoladas, que apesar de
serem ofertadas durante a formação, não conversam entre si e que pouco contribuem
176
para auxiliar o professor no exercício prático. Fato que tem levado os colaboradores
desta investigação a buscarem alternativas para desenvolverem práticas mais
eficientes no dia a dia da sala de aula.
Há ainda, certa resistência para fazer dos cursos de formação, ambientes em
que as teorias possam ser vistas como instrumentos para dotar o professor de
conhecimentos que sejam válidos sem serem amarras que limitam a capacidade
intelectual do profissional. Mesmo considerando que as teorias são necessárias, no
entanto, não são suficientes para mediar a ação de ensinar.
Nessa perspectiva é preciso confrontar a lógica disciplinar universitária nos
cursos de formação profissional (TARDIF, 2014), pois a formação do professor deve
ser constituída da integração de vários elementos que estão presentes nesse
processo. Entre esses elementos encontram-se os saberes pessoal do professor em
formação, as características dos conteúdos específicos e dos conteúdos pedagógicos
da matriz curricular dos cursos de formação, além das questões de ordem social do
contexto onde essa formação se efetiva. Desta feita, fiz-me um último
questionamento: Até onde a pesquisa foi capaz de levar-me para além das teorias
estabelecidas?
A este questionamento faço ensaios acerca dos achados da pesquisa que
foram sendo construídos ao longo de minha permanência no campo de investigação,
onde tive a oportunidade de conhecer outros saberes que não estavam nas
dimensões dos saberes docentes, mas que trouxeram grandes ensinamentos a partir
de minha interação com um cenário que congrega em um mesmo espaço, beleza,
curiosidades e características singulares, que fizeram-me acreditar que ainda existe
vida para além do iPad, iPhone, Smartphone, WhatsApp. Que as raízes, costumes,
cultura, saberes e fazeres de um povo, ainda são seu maior patrimônio. Que a
existência ou não da tecnologia, não interfere nos traços geométricos, das retas, dos
retângulos, dos triângulos na construção de barco e de currais de pesca. O que
determina essa feitura são os fins a que se destina, ou seja, navegar de forma segura
nas águas mansas dos rios da microrregião ou em águas mais profundas de outros
mares ou o tamanho do peixe que se quer capturar.
Vale destacar que no momento em que ocorreu o exame de qualificação, fiz
referências a outras práticas encontradas no campo de investigação que não estavam
na rota de investigação, mas que tinham um saber próprio, em que o uso de
177
conhecimentos matemáticos era evidente. Desta forma, por sugestão da banca de
qualificação, retornei ao campo de pesquisa e fui ao encontro de pessoas que me
encantaram com suas práticas e seus ofícios. Essas pessoas aqui são identificadas
pelos nomes fictícios Benedito e Manoel.
Seu Benedito tem 68 anos, dos quais 55 anos foram dedicados a construção
naval. Tem pouca escolaridade (4ª série do ensino fundamental). Outra figura que me
prendeu a atenção foi seu Manoel. Tem 65 anos, e não diferente de seu Benedito,
desde muito cedo, iniciou no ofício, observando seu pai a construir currais de pesca.
Seu Manoel também tem pouca escolaridade, não avançou nos estudos, porque tinha
outras prioridades.
No tempo em que estive no campo de pesquisa, fiquei por algum tempo à beira
da maré, observando o movimento tanto das águas quanto das pessoas que
circundavam naquele lugar. Durante essas observações, tive a oportunidade de
conhecer seu Benedito e seu Manoel, duas pessoas que fazem artesanalmente,
barcos e currais de pesca. A partir das observações dessas práticas artesanais
percebi que tanto na construção do barco, quanto na construção do curral, esses
senhores faziam uso de um conhecimento próprio para fazer os traços dessas
construções. Esses traços eram cheios de conhecimentos matemáticos, que poderiam
servir de instrumentos para o ensino da Matemática na Educação Básica.
O primeiro passo foi me aproximar e ganhar a confiança deles, demonstrando
meu interesse pelo que faziam. A partir dessa aproximação, comecei uma conversa
investigativa, na intenção de descobrir que saberes eles faziam uso para construir
seus barcos e seus currais.
Durante essas conversas, perguntei ao seu Benedito como ele conseguia fazer
traços de forma segura e cortes tão precisos na madeira para construir um barco. Ele
respondeu-me:
[...] muito tempo fazendo a mesma coisa, a gente acaba pegando o jeito e quando a gente vai fazer um barco a única coisa que importa é o tamanho, se é grande, se é pequeno, de acordo com o gosto do freguês, aí a gente vai medindo os palmos e depois a gente vai cortando as peças de madeira e montando as partes do barco. (BENEDITO, ent. Abr./2016).
178
Seu Benedito faz uso de uma linguagem própria para explicar o passo a passo
dessa construção. Nesse relato observa-se que ele faz referências a tamanho,
pequeno, grande e palmos, que numa linguagem Matemática, são conteúdos da
geometria, funções e aritmética. Apesar da pouca escolaridade, seu Benedito utiliza
os conhecimentos matemáticos associados aos saberes que foram construídos ao
longo da prática na construção de barcos. Essa integração de saberes científicos e
saberes da prática não gera conflito. Ao contrário, é a soma desses saberes que
facilita o trabalho de seu Benedito.
Essa percepção levou-me a fazer uma outra pergunta. O senhor faz uso de
conhecimentos matemáticos para fazer o barco?
[...] faço tudo de cabeça, nunca aprendi matemática é muito difícil e quando eu faço o barco, eu não faço conta, só vou medindo e talhando a madeira, depois a gente vai ajeitando, cortando aqui e ali, até ficar tudo certinho para ficar bem feito e seguro. (BENEDITO, ent. Abr./2016).
Ao fazer os traços do barco na madeira, seu Benedito faz uso de um saber
próprio que foi desenvolvido ao longo da vida e aperfeiçoado pela prática exercida na
construção de uma infinidade de barcos. Mesmo não tendo o domínio dos
conhecimentos matemáticos sistematizados ensinados na escola, ele faz uso desse
conhecimento por métodos próprios, por meio de um saber aprendido a partir da
observação, da experiência e da prática no exercício da profissão. Esse saber pode
ser compreendido na perspectiva do saber prático e experiencial, [...] que de um modo
geral, é o fato de se originarem da prática cotidiana da profissão e serem por ela
validada (TARDIF, 2014, p. 48).
Os saberes adquiridos por seu Benedito configuram-se naquilo que ele foi
capaz de aprender, somar outros elementos e colocar a serviço da comunidade por
meio da capacidade de construir barcos, que são ferramentas necessárias para o
desempenho de atividades diárias da comunidade pesqueira e, que sem esse saber,
essas práticas, certamente, ficariam comprometidas.
Apesar do avanço das ciências e da tecnologia, na Microrregião do Salgado,
ainda existem estaleiros, que geralmente são construídos/adaptados no fundo do
quintal desses barqueiros ou a beira da maré não só para a construção artesanal de
179
barcos de tamanhos diferenciados, mas também para realizar pequenos reparos nas
embarcações que sofrem avarias causadas pelo tempo ou por embate das águas
durante a pesca.
Outro grande achado nessas andanças foram os saberes praticados pelo seu
Manoel, que é construtor de curral de pesca há mais de 40 anos, oficio aprendido com
seu pai que também aprendeu com o pai dele. O curral de pesca que é construído por
seu Manoel, não precisa de nenhum instrumento tecnológico avançado para fazer a
marcação das linhas. Essa marcação ocorre a partir da direção da correnteza que
determina uma angulação simétrica por meio de uma linha imaginária. Aqui se
evidencia a geometria como elemento essencial nessa feitura.
Apesar do conhecimento matemático fortemente existente nesse processo, seu
Manoel lança mão de outros saberes que são construídos a partir de uma cultura de
convivência, da observação e do respeito pela natureza que determina a condução da
construção do curral.
Observei por algum tempo o trabalho do seu Manoel e fiquei curiosa para saber
como ele conseguia fazer o curral sem usar nenhum instrumento especial para esse
fim. Curiosamente perguntei: O que é preciso para fazer um curral?
Para fazer um curral é preciso ter certa ciência. A gente precisa saber
a fase da lua que vai influenciar no movimento da maré. Tem que
saber a direção da correnteza, é a correnteza que vai me dizer o tanto
que eu tenho que abrir ou fechar a entrada do curral. A gente olha,
traça uma linha na cabeça e finca uma estaca que dá início a
construção do curral e dependendo do modelo. As outras estacas vão
sendo fincadas e fazendo a cerca até fechar no tamanho que a gente
quer, que é medido em palmos, braças. Depende do tamanho que a
gente vai fazer, mas tudo depende do tempo. Quando chove muito, as
águas ficam mais agitadas e aí as medidas podem sair erradas e não
dá certo (MANOEL, ent. abr./2016).
O que se observa no relato do seu Manoel é que ele, assim como o seu
Benedito, também faz uso de unidades de medidas (palmos, braças) para construir os
currais. Apesar da pouca escolaridade, seu Manoel tem uma capacidade incrível de
detalhar o passo a passo do trabalho desenvolvido. Esse domínio é resultado dos
180
vários anos no exercício da profissão. Então arrisquei perguntar: Ao fazer um curral o
senhor usa a matemática?
Eu penso que sim, que a matemática entra quando a gente faz o curral,
e precisa medir o tamanho. Mas aqui a gente mede em palmos, braças
ou pega um barbante e mede tantos palmos, tantas braças para fazer
a medição. E a prática que a gente já tem ajuda muito, então a gente
não se preocupa com a matemática. Na verdade, porque a gente já
sabe como fazer e não precisa ficar fazendo conta (MANOEL, ent.
abr./2016).
Seu Manoel tem percepção que a Matemática está presente na atividade que
desenvolve e sabe precisar em que momento ele usa a matemática, arrisca dizer que
é quando [...] faz a medida em palmos, braças ou pega um barbante e mede tantos
palmos, tantas braças para fazer a medição...
O entendimento que seu Manoel tem sobre o conhecimento matemático é
interessante do ponto de vista de saber que, apesar dos poucos conhecimentos
matemáticos aprendidos no tempo que frequentou a escola, mesmo assim, consegue
identificar esses conhecimentos a partir de um saber próprio, construído ao longo da
vida e das relações com o próprio objeto. Desta feita, os poucos conhecimentos
matemáticos sistematizados ensinados nos bancos da escola, aqui ausentes, dão
lugar a um saber matemático, que é aprendido na prática, pois a feitura do curral
prende-se a dois fatores de ordem natural.
O primeiro fator é o movimento da maré, que ocorre de acordo com a fase da
lua. O segundo, pela estação das chuvas, que determina o fluxo dos cardumes,
influenciando nos períodos de safra, que por sua vez, demandam o aumento da
construção de currais.
Existem ainda, os fatores de ordem prática, ou seja, o modelo (coração,
caçoeira, cachimbo)19, o tamanho (que pode ser medido em palmos ou braças)20, do
19 Ver mais sobre o assunto em: FURTADO, Lourdes Gonçalves. Curralistas e Redeiros de Marudá:
pescadores do litoral do Pará. Belém: Museu Goeldi, 1987. 20 Palmo é uma medida de comprimento que se obtém com a mão toda aberta, medindo do dedo polegar ao mínimo, cuja distância gira em torno de 22 centímetros e Braça é uma antiga medida de comprimento equivalente a 2,2 metros. Apesar de antigas, atualmente ainda é usada e compreendida por muitos trabalhadores rurais e outras pessoas envolvidas com o meio rural. https://pt.wikipedia.org/wiki/Palmobraça.
181
curral que se quer construir. Esse saber não foi aprendido nos livros didáticos usados
nas salas de aula pelo professor de Matemática, mas nos livros onde suas linhas são
escritas pela própria vida desses fazedores de encanto.
Os saberes do seu Benedito e do seu Manoel podem ser compreendidos como
saberes temporais, pois foram construídos durante suas histórias de vida, por meio
de um repertório de ensinamentos que foram somando-se e armazenando-se ao longo
do tempo.
Esses saberes não estão postos nos livros didáticos ou nos conteúdos
matemáticos ensinados na sala de aula pelo professor de Matemática. Porém,
poderiam servir de instrumentos vivos para serem usados por professores para
ensinar Matemática de forma significativa para quem aprende. Considerando que é a
integração do saber das ciências a um saber da prática que pode ser visto como
ferramentas motivacionais para aprendizagem de conteúdos matemáticos.
Desta forma, a Matemática deixa de ser vista como algo tedioso e passa a ser
uma disciplina agradável e que tem vida (GONÇALVES, 2006, p. 50). Portanto, fazer
uso de um saber próprio para a construção de barcos e currais pode ser uma
ferramenta auxiliar interessante para mediar o ensino de conteúdos matemáticos nas
escolas da Microrregião do Salgado.
Assim, das minhas experiências na prática docente como professora formadora
de professores de Matemática, dos relatos dos colaboradores desta pesquisa, das
conversas investigativas com os construtores de barco e de curral, surgiram
elementos que contribuíram na elaboração de uma proposta de inter-relações desses
saberes.
Essa inter-relação ocorre da integração dos saberes de professores
formadores, de professores em formação, dos professores egressos que estão na sala
de aula da Educação Básica e dos demais informantes, que estão relacionados em
um movimento de integração, entre os saberes pessoal do professor, aos saberes da
formação inicial/permanente e aos saberes da prática docente, que compõem as três
dimensões do saber vistos na Arquitetura Conceitual (Figura 09, p. 121). Todos esses
elementos devem ser vistos como diversas e variadas fontes em que os saberes
podem e devem ser construídos, como se observa na próxima figura.
182
FIGURA 10 – Movimento de Integração de saberes FONTE: Elaborado pela autora
A integração desses saberes configura-se no que Cherval (1990) define de
entidades culturais próprias, criações didáticas originais, que podem sugerir
alternativas para a implantação de práticas mais efetivas na formação de professores
de Matemática, baseada no que Tardif (1991) denomina de epistemologia da prática,
que se refere ao estudo do conjunto de saberes utilizados realmente pelos professores
em seu espaço de trabalho cotidiano.
Assim como se discute alternativas para um novo formato para os cursos de
formação de professores de Matemática, necessário se faz pensar em alternativas
para ensinar. Nessa perspectiva, saberes como os usados por seu Benedito e por seu
Manoel podem ser ferramentas de grande importância para o ensino de conteúdos
matemáticos. Isto, se esses saberes forem usados de forma integradora entre o saber
sistematizado e o saber da cultura, considerando que ensinar conteúdos matemáticos
a partir de uma situação real, a aprendizagem pode tornar-se mais significativa para
quem aprende, considerando que:
O saber local é a salvaguarda das peculiaridades regionais, dos usos e costumes do contexto em que se insere a escola, do (des)selenciamento das minorias sociais que contribui para a
Saberes do Professor da
Educação Básica
Saberes da relação com o
objeto
Saberes de outros
informantes: comunidade/instituições/
cultura
Saberes do Professor Formador
Saberes do Professor em
Formação
183
construção do sentido de pertencimento da comunidade em relação à escola e vice-versa (TORRES SANTOMÉ, 1998, p.130-131).
Neste sentido, o saber da cultura deve ser compreendido como um elemento
de integração entre conhecimento científico e conhecimento comum, [...] essa
integração ajuda a pensar outros formatos possíveis para a concepção e organização
de currículos da formação de professores (VEIGA, 2012, p. 37).
Dessa integração, outras propostas podem surgir como elementos
contributivos para o esboço de uma matriz curricular para a formação de professores
de Matemática em que houvesse disciplinas mais aproximativas da realidade que os
futuros professores de Matemática irão desempenhar sua prática docente.
Conscientizando esse professor da importância da função da escola na transformação
da realidade social dos seus alunos e ter a clareza da necessidade de a prática
educativa estar associada a uma prática social mais global (PEREIRA-DINIZ, 2007, p.
27).
Esses achados no cenário da investigação fizeram-me compreender o quanto
preciso fazer melhor para formar o professor de Matemática que vai desenvolver sua
prática em um contexto onde os saberes da cultura misturam-se aos saberes
sistematizados dos espaços escolares. O quanto preciso estar atenta às minhas falas,
aos posicionamentos assumidos, ao meu modo de conduzir a minha sala de aula, em
que como professora formadora, tenho a responsabilidade de saber quem estou
formando e para que estou formando.
É essencial ter consciência que o meu papel de professora formadora de
professores de Matemática é de mediadora no processo de ensino e aprendizagem.
Que mediar esse processo pode ser uma experiência bem mais significativa se ela
ocorrer a partir de práticas docentes diferenciadas, em que as concepções, os valores,
as manifestações sejam respeitadas e reinterpretadas pelos sujeitos envolvidos nesse
processo. O papel do professor formador deixa de ser o de “transmissor de
conhecimentos” para tornar-se não só um mediador, mas um acompanhador dos
professores, alguém que os ajuda e os apoia em seus processos de formação ou de
auto formação (TARDIF, 2014).
De tudo que foi vivenciado no campo de investigação, posso afirmar que passei
por momentos de intenso conflito comigo mesma, parte de mim vivia angustiada por
184
não encontrar de forma clara e direta aquilo que fui buscar. Outra insistia em dizer-me
que quando vamos ao campo de pesquisa devemos deixar a intencionalidade de lado
e pensar que o grande mérito de uma pesquisa está na descoberta que se faz sem
aviso prévio.
As descobertas feitas durante esta investigação apontam não só para um saber
que está nos livros, nas salas de aula, na matriz curricular dos cursos de formação,
mas também para um saber que está na cultura, na história, na memória e no dia a
dia de pessoas. Estas, que fazem uso de saberes matemáticos sem que estes tenham
sido ensinados de forma sistematizada, mas que decorrem na/da vivência com seus
pares.
Portanto, posso afirmar que a pesquisa realizada ao longo deste processo, seja
das leituras das teorias que fazem parte do corpus desta tese, seja de meus rabiscos
nos guardanapos de papel, seja das escutas dos colaboradores desta investigação,
seja da observação no trabalho do seu Benedito e do seu Manoel, cada um desses
segmentos acrescentou-me conhecimentos que foram/são modificadores de
posturas, de comportamentos, de atitudes. Certamente também vão/são
modificadores de minhas práticas docentes.
E ao pergunta-me sobre até onde a pesquisa foi capaz de levar-me para além
das teorias estabelecidas? Tenho como resposta que a partir das minhas reflexões
como pesquisadora, das teorias estudadas, das análises dos relatos dos
colaboradores, certamente trouxeram-me outras interpretações, outros
entendimentos. No entanto, a pesquisa trouxe-me algo que vai além dos
conhecimentos defendidos por qualquer teoria. Refiro-me ao aspecto humano da
profissão professor. Aspecto este que só se aprende quando convivemos o dia a dia
da sala de aula, das interações com nossos estudantes, com nossos pares, com os
conteúdos de ensino, com nossas limitações e com todos os elementos que estão
presentes no contexto em que se desenvolve a profissão professor.
Portanto, se a pergunta é: O que a pesquisa trouxe para além da teoria. Eu
respondo com toda a segurança - o aspecto humano necessário à profissão que nem
a teoria nem a formação são capazes de nos ensinar. Aspecto este que é próprio de
cada profissional e descoberto pouco a pouco, ao longo da experiência vivida na
profissão docente.
185
Assim, terminar uma investigação é ter a certeza que estamos sempre
começando e acreditar que os achados da pesquisa são somente uma parte de um
todo que precisamos para continuar nossa busca. Não para encontrar verdades
absolutas, mas aquelas que servem de guia para começar um novo caminho que vai
levar-nos ao encontro de outras verdades. As verdades que até aqui encontrei,
partilho com meus pares, na perspectiva de fazer destas descobertas, caminhos a
serem trilhados, pois de tudo que foi vivido ficaram três coisas:
A certeza de que estamos sempre começando...
A certeza de que precisamos continuar...
A certeza de que seremos interrompidos antes de terminar...
Portanto, devemos:
Fazer da interrupção um caminho novo ...
Da queda um passo de dança...
Do medo, uma escada...
Do sonho, uma ponte...
Da procura, um encontro...
(Fernando Pessoa)
186
REFERENCIAS
ALVES, Rubem. Gestação do futuro. Campinas: Papirus, 1996. BENTO, H. C. B. Em busca de um sentido antropológico na relação desporto/saúde. Tese de Doutorado em Ciência do Desporto. Faculdade de Desporto da Universidade do Porto. Portugal, 2013. BLIN, J. F. Représentations, pratiques et identités professionnelles. Paris. L'Harmattan, 1997. BOMBASSARO, Luiz Carlos. As fronteiras da epistemologia: como se produz o conhecimento. 2. Ed. Petrópolis: Vozes, 1992. BORGES, Jorge Luís. Ensaio autobiográfico. São Paulo. Companhia das Letras, 2009. BOURDIEU, P. O Senso Crítico. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013. BOURDIEU, Razões práticas: sobre a teoria da ação. São Paulo: Papirus, 1996. BRASIL. Lei n. 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Legislativo, Brasília, 23 dez. 1996. p. 27833. Disponível em: . Acesso em: 23 jul. 2009 CALVINO, Ítalo. Palomar. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. p.7-11. CERTEAU, Michel. A invenção do Cotidiano. 3ª Ed. Tradução de Ephrain Ferreira Alves. Petrópolis: Vozes, 1998. CHARLOT, Bernard. Da Relação com o Saber às práticas educativas. São Paulo: Cortez, 2013. CHERVEL, André. História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria & Educação, Porto Alegre, 1990. CHEVALLARD, Yves. La transpostion didatique: du savoir savant enseigné. La Pensée Sauvage Éditions: Grenoble – France, 1985 CHIZZOTTI, A. Pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais. Petrópolis: Vozes; 2006. CLANDININ, D. Jean. & CONNELLY F. Michael. Pesquisa Narrativa: Experiência e História em Pesquisa Qualitativa. Tradução Grupo de Pesquisa Narrativa e Educação de Professores ILEEL/UFU. Uberlândia: EDUFU, 2011. Disponível em: https://pedagogiasemtransito.files.wordpress.com. Acesso em: 10 de Abril de 2014. CORRAZA, Sandra Mara. O que quer um Currículo? Pesquisas pós-críticas em educação. Petrópolis: Vozes, 2001.
187
CORRÊA, Bárbara R. do Pardo Gimenez & BEHRENS, Marilda A. Ser Professor: teoria e prática numa nova visão paradigmática. In: FERREIRA, Jaques de Lima. Formação de Professores: Teoria e Prática Pedagógica: Petrópolis, RJ, Vozes, 2014 D’AMBROSIO, Ubiratan. Educação Matemática: da teoria à prática. Campinas, SP. Papirus, 1998. DELEUZE, G. e GUATTARI, F. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia, Vol. 1. Rio de Janeiro: editora 34, 1995. DEWEY, J. Experiência e educação. 2ªed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1976. DUBAR, Claude. A crise das identidades – a interpretação de uma maturação. Santa Maria da Feira: Afrontamento, 2000 (Trad. Catarina Matos). FIORENTINO, D.; NACARATO, M. A., PINTO, A.R. Os saberes da experiência docente em matemática e a formação continuada de Professores. Portugal: Revista teórica de investigação, 1999 FIORENTINI, Dario; LORENZATO, Sérgio. Investigação em educação matemática: percursos teóricos e metodológicos. 1ª Ed. Campinas: Autores. 2009
FLORES, M. A. Dilemas e desafios na formação de professores. In Maria Célia MORAES, José Augusto PACHECO e Maria Olinda EVANGELISTA (orgs.), Formação de Professores: perspectivas educacionais e curriculares (pp. 127-160). Porto: Porto Editora, 2003 FRAIHA-MARTINS, France, 1976- Significação do ensino de ciências e matemática em processos de letramento científico-digital. Tese de Doutorado - Universidade Federal do Pará, Instituto de Educação Matemática e Científica, Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemáticas, Belém, 2014. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1992. FOUCAULT, Michel. 1916-1984. Arqueologia do Saber. A arqueologia do Saber. Tradução de Luiz Felipe Baeta Neves, 7ed. - Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008. (Campo Teórico) Tradução de: L'archéologie du Savoir FOUCAULT, Michael. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 1987. GARCIA, Carlos Marcelo. Formação de professores para uma mudança educativa. Portugal. Porto Editora, 2006. GHAUTIER, C.; MARTINEU, S.; DESBIENS, J.F.; MALO, A.; SMARD, D. et al (1998). Por uma teoria da pedagogia: pesquisas contemporâneas sobre o saber docente. Ijuí: Inijuí.
188
GAUTHIER, C. et al. Por uma teoria da pedagogia: pesquisa contemporânea sobre saber docente. Trad. Francisco Pereira. Ijui: Ed. UNIJUÍ, 1998 GONÇALVES, Tadeu Oliver. A Formação e o desenvolvimento profissional de formadores de professores: o caso dos professores de Matemática. Tese de Doutorado, Campinas: SP, 2000. ---------------------------------------. A CONSTRUÇÃO DO FORMADOR DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA: a prática formadora. Belém: CEJUP ED. 2006 GONÇALVES, T. V. e GONÇALVES, T. O. Reflexões sobre uma prática docente situada: buscando novas perspectivas para a formação de professores. In: Cartografia do trabalho docente. (Org.) Corinta M. G. Geraldi; Dario Fiorentini e Elisabeth Pereira – Mercado das Letras: Campinas, SP, 1998. IMBERNÓN, Francisco. La Formacion Del Professorado. Barcelona, Buenos Aires – México. Edições Piados, 1994. JOSSO, Marie-Christine. Experiências de vida e formação. São Paulo: Cortez, 2004. KAUFMANN, Jean-Claude. A Entrevista Compreensiva: um guia para a pesquisa de campo. Petrópolis – RJ. Vozes, 2013. KONDER, Leandro. O que é dialética. 14. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987. KRASILCHIK, Francisco. O Professor e o Currículo das Ciências. São Paulo. EPU/EDUSP, 1986. LARROSA, Jorge. La experiencia de lalectura: estudios sobre literatura y formación. Barcelona: Laertes, 1998. LÜDKE, Menga. Avaliação Institucional: formação de docentes para o ensino fundamental e médio (as licenciaturas). Série: Cadernos CRUB, v. 1, n. 4, Brasília, 1994. LURIA, Alexander Romanovich. Pensamento e Linguagem: ultimas conferencias de Luria. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986 MALINOWSKI, Bronislaw. Antropologia. Org. Eunice Ribeiro Durham. São Paulo: Ática, 1986. MARTINS, Ana Amélia Lage. Mediação: reflexões no campo da Ciência da Informação. 2010. 255f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) – Escola de Ciência da Informação, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. 2010. MARTINS, Onilza Borges; MOSER, Alvino. Conceito de mediação em Vygotsky, Leontiev
e Wertsch. Revista Intersaberes. vol. 7 n.13, p. 8 - 28 | jan. – jun. de 2012 - ISSN 1809-7286.
189
MAZZOTTI, Alda Judith. Representações sociais: aspectos teóricos e aplicações à educação. Em aberto. Brasiília, 1994. MEIER, Marcos, GARCIA, Sandra. Mediação da Aprendizagem: contribuições de Fuerstein e de Vygotsky. Curitiba: Edição do autor, 2007 MENEZES, Luis Carlos de. Formar professores: tarefa da universidade. In: CATANI, Denice Bárbara et al (Orgs.) Universidade, escola e formação de professores. São Paulo: Brasiliense, 1986, p.115-125. MINAYIO, Maria Cecília de Souza (Org.). Avaliação por Triangulação de Métodos: abordagens de programas sociais. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2005. MORAES, A. A. de A. Histórias de leitura em narrativas de professoras: uma alternativa de formação. Manaus: Ed. Da Universidade do Amazonas, 2000. MORAES, Roque e GALIAZZI, Maria do Carmo. Análise Textual Discursiva. 2ª Ed. Ijuí – RS: UNIJUÍ, 2011. NACARATO, Adair Mendes; PAIVA, Maria Auxiliadora Vilela. A formação do professor que ensina Matemática: perspectivas e desafios. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. NÓVOA, Antônio. Formação de Professores e profissão docente. In NÓVOA. (Org.). Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote Ltda. 1998. _____________. Vida de Professores. Editora Porto, 2000. _____________. Professores – imagens do futuro presente. Lisboa: Educa, 2009. OLIVEIRA, Inês Barbosa de. Criação Curricular, autoformação e formação continuada no cotidiano escolar. In: MENDES SOBRINHO, José Augusto de Carvalho & CARVALHO, Marlene de Araújo (Org.). Formação de Professores e Práticas Docentes: olhares contemporâneos. Belo Horizonte: Autentica 2006. OLIVEIRA, Marta Khol de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1993 ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 1999 PARÁ (Estado) Secretária de Estado de Planejamento, Orçamento e Finanças. Informações gerais < http://www.sepof.pa.gov.br/disponível em Portal Amazônia– KR> acessado em 08 de fev. 2014. PEREIRA-DINIZ, Júlio Emílio. Formação de professores – pesquisa, representações e poder. 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. PERRENOUD. P. Formar professores em contextos sociais em mudança: Prática reflexiva e participação crítica. Tradução: Denice Barbosa Catani. Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação. Universidade de Genebra. 1999.
190
PIAGET, J.A. A Formação do símbolo na criança. Rio de Janeiro. Zahar, 1998. PIMENTA, Selma Garrido. Saberes Pedagógicos e atividade docente. (Org.) 8ª Ed. São Paulo: Cortez, 2012. PIMENTA, Selma Garrido. Professor reflexivo: construindo uma crítica. In : P imenta , Se lma Garrido; Ghedin, Evandro (orgs.), “Professor Reflexivo no Brasil – Gênese e Crítica de um Conceito”. São Paulo: Cortez, 2002. PONTE, João Pedro da. O conhecimento profissional dos professores de matemática. Relatório final do Projeto “O saber dos professores: concepções e práticas”. Lisboa: DEFECULT, 1995 PRATES, Soraia C. & ROMANOWSKI, Joana P. A Prática docente dos formadores e a formação de futuros professores de Matemática. In: FERREIRA, Jaques de Lima. Formação de Professores: Teoria e Prática Pedagógica. Petrópolis, RJ Vozes, 2014. RUSS, Jacqueline. Dicionário de filosofia. São Paulo: Scipione, 1994, p.180. SANCHEZ- GAMBOA, S.S. A contribuição da pesquisa na formação docente. In: REALY, A.M.M.R. & MIZUKAMI, M.G.N. Formação de professores: tendências atuais. São Carlos: Edufscar, 2003, p. 116 a 130. SANTOS, Carlos Afonso Marques dos. Memória, história, nação: propondo questões. Revista Tempo Brasileiro, n. 87, out/dez., 1996. SCHÖN, D. A. Educando o Profissional Reflexivo. Porto Alegre, Artes Médicas Sul, 2000. SCHÖN, D. A. La formación de profissionales reflexivos. Hacia um nuevo diseño de la enseñanza y el aprendizaje em las profisiones. Barcelona: Paidós, 1983. SCHÖN, D. A. Educando o Profissional Reflexivo. Porto Alegre, Artes Médicas Sul, 2000. SCHWARTZ, Olivier. (1993). L’empirisme irréductble. O Empirismo Irredutível. Posfácio de ANDERSON, N. Le Habo. PNathan [Coll. Essais et Recherches]. In: SHULMAN, L. S. Those who understand: knowledge growth in teaching. EUA: Educational Researcher, 1986. SIGNATES, Luiz. Um estudo sobre o conceito de mediação e sua validade como categoria de análise para os estudos de comunicação. In: SOUSA, Mauro Wilton de. (Org.) Recepção mediática e espaço público. São Paulo: Paulinas e Sepac, 2006. SILVA, Neivaldo Oliveira. Educação Matemática no Pará: genealogia, institucionalização e traços marcantes. São Paulo: Livraria da Física, 2015 (Coleção História da Matemática para professor).
191
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de Identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999 SCOZ, Beatriz Judith Lima. Identidade e Subjetividade de Professores: sentidos do aprender e do ensinar. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2011. SOARES, Magda. Metamemória-memórias: travessia de uma educadora. São Paulo: Cortez, 2001. STRAUSS, A. & CORBIN, J. Basics of Qualitative research: techniques and procedures for developing grounded theory. Second Edition, 1990. TARDIF, M. e LESSARD. C. O Trabalho Docente: elementos para uma teoria da docência como profissão de interações humanas. 9ª Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014. TARDIF, M.; LESSARD, C. e LAHAYE, L. Os professores face ao saber: Esboço de uma problemática do saber docente. In: "Dossiê: Interpretando o trabalho docente". Teoria & Educação nº 4, Porto Alegre: Pannônica, 1991. TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação de Professores. 16ª Ed. Petrópolis: Vozes, 2014. ______________. A ambiguidade do saber docente nas reformas relativas à formação universitária para o magistério. Vertentes, n. 15, p. 7-21, 2000. ______________. Los saberes del docente y su desarrollo profesional. Madrid: Narcea, 2004.
TORRE SANTOMÉ, J. Globalização e interdisciplinaridade: o currículo integrado. Porto Alegre: Artemed, 1998. VARELA, Aida, BARBOSA, Marilene Abreu. A multirreferencialidade de saberes nos atos de mediação do conhecimento: o aporte das ciências cognitivas a ação pedagógica das bibliotecas. Perspectivas em Ciência da Informação, Belo Horizonte, v. 14, n. 2, p. 187-203, 2009. VEIGA, Ilma Passos Alencastro. As Dimensões do processo didático na ação docente. In: Conhecimento local e conhecimento universal: pesquisa, didática e ação docente. Curitiba: Champagnat, 2004. VEIGA-NETO, Alfredo. Olhares. In: Caminhos Investigativos: Novos Olhares na pesquisa em educação. COSTA, Mariza Vorraber. (Org.), 2ª ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. VENTURA, Magda Maria. O Estudo de Caso como Modalidade de Pesquisa. Pedagogia Médica. Revista SOCERJ. 2007;20(5):383-386 setembro/outubro. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
192
YIN, Robert K. Estudo de Caso: Planejamento e Métodos. 5ª Ed. Porto Alegre: Bookman, 2015. WARSCHAUER, Cecília. As diferentes correntes de autoformação. Revista Educação on-line, Editora Segmento, 15/04/2005. Disponível em: http://www.academia.edu. Acesso em 05/05/2014. WITTGENSTEIN, L. Investigações Filosóficas. 3ª ed. São Paulo: Abril Cultural. 1984.
193
APÊNDICE A
UNIVERSIDADE FEDRAL DE MATO GROSSO UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA DOUTORADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA - REAMEC PESQUISA EM FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM MATEMÁTICA
Caríssimo (a) Professor (a).
Estamos realizando estudos acerca dos Saberes Docentes de Professores de
Matemática da Microrregião do Salgado. Para tanto, solicitamos sua colaboração
no sentido de responder às questões descritas neste instrumento, que objetiva
levantar dados preliminares de Professores Licenciados em Matemática, lotados nas
escolas públicas dos municípios da Microrregião do Salgado.
1. Dados pessoais quanto a idade e sexo:
( ) de 20 a 25 anos ( ) de 25 a 30 anos ( ) mais de 30 anos
( ) Feminino ( ) Masculino
2. Dados acerca do tempo de atuação docente em sala de aula:
( ) de 01 a 04 anos ( ) de 05 a 10 anos ( ) mais de dez anos
3. Dados acerca da Formação Acadêmica:
( ) Graduação ( ) Especialização ( ) Mestrado ( ) Doutorado
Graduação em: _____________________________________________________
Pós-Graduação em: __________________________________________________
Instituição em que cursou a Graduação: __________________________________
Ano de Ingresso no Curso de Graduação: ____________
Ano de Conclusão do Curso de Graduação: __________
4. Dados acerca da Prática Docente:
a) Nível de escolarização em que desenvolve sua prática docente:
( ) Educação Infantil ( ) Ensino Fundamental ( ) Ensino Médio ( ) Ensino Superior
b) Rede de Ensino em que desenvolve sua prática docente:
( ) Municipal ( ) Estadual ( ) Federal ( ) Privada
194
5. Dados acerca da origem e domicilio:
a). Você é natural do Município de: _____________________________________
b). Você trabalha no seu Município de origem?
( ) Sim ( ) Não
c). Você reside no município em que trabalha?
( ) Sim ( ) Não ( ) Resido em outro município. Qual: _____________________
d). Se a resposta for positiva, há quanto tempo reside no município em que trabalha?
( ) De um a quatro anos ( ) De cinco a dez anos ( ) Mais de dez anos
6. Dados acerca do interesse em participar da pesquisa:
a). Você professor que trabalha na Microrregião do Salgado, gostaria de ser um
professor colaborador para o desenvolvimento desta pesquisa?
( ) Sim ( ) Não ( )
b). Se você manifestou interesse em ser um professor colaborador para o
desenvolvimento da próxima etapa desta pesquisa, deixe seu endereço eletrônico
para que possamos fazer um novo contato.
E-mail:_____________________________________________________________
Obrigada por sua participação e colaboração,
Atenciosamente, a pesquisadora.
APÊNDICE B
195
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA DOUTORADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA - REAMEC PESQUISA EM FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM MATEMÁTICA
Caríssimo (a) Professor (a).
Convidamos V. Sa. a participar voluntariamente da pesquisa de tese intitulada
“Saberes Docentes como Mediadores Didáticos e Conceituais na Formação de
Professores de Matemática”, a qual está sendo desenvolvida no Programa de Pós-
Graduação em Educação em Ciências e Matemática, do Instituto de Educação
Matemática e Científica da Universidade Federal do Pará, sob a orientação do Prof.
Dr. Tadeu Oliver Gonçalves, com o objetivo de ‘analisar os saberes docentes de
professores da Microrregião do Salgado para compreender de que forma estes podem
ser entendidos como mediadores didáticos e conceituais na formação inicial de
professores de Matemática’. Para tanto, solicitamos sua gentileza para responder as
questões descritas neste roteiro de entrevista.
1. Todo processo de formação inicial deve proporcionar a construção de alguns saberes que na maioria das vezes, são levados pelo professor para seu exercício docente. Na sua concepção que saberes são esses? Você poderia me falar sobre eles?
2. Apesar dos saberes construídos na formação inicial, outros são necessários para o desempenho na sala de aula. Estes são construídos na própria prática docente. Você concorda com esta afirmativa? O que você tem a dizer sobre isso?
3. Durante a vivência nos processos formativos, vamos dando sentidos e significados sobre
aquilo que aprendemos. Que sentidos e que significados você atribui aos saberes da área do conhecimento aprendidos durante sua formação inicial?
4. Na maioria dos cursos de formação de professores, existe por parte do professor em formação, inquietações acerca de conteúdos que são ensinados de forma aligeirada e/ou deixam de ser ensinados. Isto de certa forma, contribui para deixar lacunas nesse processo formativo. Você concorda com isso? Que lacunas foram deixadas na sua formação inicial e o que poderia ser feito para serem evitadas?
5. Os professores egressos dos cursos de formação inicial trazem para suas práticas, saberes
que são construídos ao longo desse processo. Porém, é no exercício da profissão, que outros saberes vão sendo construindo à medida em que as necessidades vão surgindo no dia a dia da sala de aula. Você concorda que esses saberes podem/devem ser vistos como mediadores didáticos e conceituais na formação inicial de futuros professore? Porque?
Belém, 30 de abril de 2015