Seminário: INequidades do Sistema Tributário Nacional
SONEGAÇÃO FISCAL: Crime social de elevado potencial ofensivo
Por Marcelo Eduardo Freitas Delegado de Polícia Federal
1- O crime;2- A função social do Direito Penal;3- A seletividade do sistema criminal;4- Os indicadores nacionais;5-A escolha dos “selecionados”;6- Os “intangíveis”;7- Sonegação fiscal: Breve conceito;8- No Brasil, a sonegação fiscal dá cadeia?9- O montante sonegado;10- Percepção da política fiscal brasileira.
SUMÁRIO
Conduta típica, antijuridíca e culpável, praticada por um ser humano <=> Jus Puniendi;
PROPÓSITO HISTÓRICO DA ESCOLHA DO QUE VEM A SER CRIME: Limitar e regular o modo de agir das pessoas diante de condutas consideradas como nocivas e/ou reprováveis, em um dado momento épico.
O CRIME
A função do direito penal é a proteção dos bens jurídicos considerados essenciais à coletividade, não tutelados por outros ramos do direito;
INDAGAÇÃO: Por que, então, as sanções do direito penal são aplicadas, em sua maioria, a um determinado grupo social e não a todos aqueles que cometem uma infração penal?
A FUNÇÃO DO DIREITO PENAL
A SELETIVIDADE
ZAFFARONI: O sistema penal tem a função de criminalizar, seletivamente, os marginalizados. Funciona de maneira desigual, elegendo aqueles que sofrerão maior incidência do poder punitivo estatal (Etiquetamento, rotulação ou labeling approach).
OS INDICADORES NACIONAIS O Brasil possui aproximadamente 190.732.694
habitantes; População carcerária: 514.582 presos;
Ocupa o 4.º lugar no ranking mundial de população carcerária, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, que têm 2.297.400 presos, China, com 1.620.000 encarcerados e Rússia, com população carcerária de 838.500.
(Fonte: MJ/DEPEN)
OS INDICADORES NACIONAIS
Apenas 2.062 presos possuem o ensino superior (0,4%);
Os demais presos possuem, no máximo, ensino médio completo;
A imensa maioria são analfabetos funcionais (301.721), com, no máximo, ensino fundamental incompleto.
(Fonte: MJ/DEPEN)
A ESCOLHA DOS SELECIONADOS
A legislação brasileira conta, hoje, com mais de 9.000 crimes;
Apenas 09 (nove) deles representam 94% de todos os presos do país;
Os selecionados são: 1) Tráfico de entorpecentes; 2) Roubo; 3) Furto; 4) Homicídio; 5) Porte de arma; 6) latrocínio; 7) Receptação; 8) Estupro; 9) Quadrilha ou bando.
(Fonte: MJ/DEPEN)
BREVES APONTAMENTOS:
a) O gráfico nos leva à equivocada suposição de que apenas os componentes das classes baixas delinquem;
b) Todas as classes sociais cometem crimes;
c) Somente alguns são selecionados;
d) Por mais que novas leis sejam criadas, apenas esse pequeno grupo de delitos implica no encarceramento coletivo.
O pior!
OS INTANGÍVEIS
Há uma parcela da população que não se vê tocada pela mão repressiva/punitiva do Estado.
Comete os piores e mais nocivos tipos de crime!
Representam o gênero:
“COLARINHO BRANCO”!!!
Peculato;
Concussão;
Corrupção ativa e passiva;
Tráfico de influência;
Fraudes às licitações;
Desvio e apropriação de verbas públicas;
SONEGAÇÃO FISCAL.
COLARINHO BRANCO: TIPOS PENAIS, ENTRE OUTROS
O QUE É SONEGAÇÃO FISCAL?
A fraude ou sonegação fiscal é um ato voluntário, consciente, em que o contribuinte busca omitir-se de imposto devido.
NO BRASIL, A SONEGAÇÃO FISCAL
DÁ CADEIA? A resposta deveria ser positiva, mas...
É manifestamente negativa!
(1) NEGATIVA porque a Lei 8.137/90, que define os crimes contra a ordem tributária, comina pena de reclusão de dois a cinco anos e, ainda que condenado, o sonegador terá direito ao regime aberto, e se em regime semi-aberto, terá direito ou a suspensão condicional da pena, ou a substituição da pena corporal por serviços à comunidade, salvo se a pena for superior a quatro anos o que é raríssimo/improvável;
(2) NEGATIVA porque, não obstante a reduzida pena cominada, a Lei 9.249/95 estabelece em seu art. 34, que o pagamento do tributo antes do recebimento da denúncia extingue a punibilidade.
(3) NEGATIVA porque a Lei 10.684/03 que instituiu o Programa de Parcelamento Incentivado (PPI), no artigo 9º e seu § 2º estabelece que o parcelamento do débito fiscal suspende a pretensão punitiva estatal;
(4) NEGATIVA porque o STF, seguido pelo STJ, TJ’s, TRF’s e pela maioria absoluta dos juízes criminais de primeira instância, firmou entendimento no sentido de que o crime contra a ordem tributária, por ser material, só resta tipificado e consumado com o exaurimento da via administrativa.
(5) NEGATIVA porque a Justiça, por seus juízes e tribunais, ao julgar Habeas Corpus impetrados por contribuintes, vem trancando inquéritos e ações penais e proibindo o Ministério Público e a Polícia de investigar, de colher, de produzir provas da autoria e do crime de sonegação, antes do término do processo administrativo;
(6) NEGATIVA porque os processos administrativos não têm prazo peremptório para serem concluídos e, quando encerrados, as provas materiais e testemunhais indispensáveis à instrução da ação penal poderão desaparecer.
(7) NEGATIVA porque nos crimes societários nem sempre é possível descrever a conduta de cada um dos sócios na medida em que no momento da prática do delito, cuja execução fica a cargo de contadores ou de funcionários (que agem por ordem ou anuência daqueles), eles sequer poderão estar presentes no estabelecimento.
ABSOLUTA INCOERÊNCIA LEGISLATIVA
Beneficia/protege o sonegador (ofensa social ao PATRIMÔNIO PÚBLICO), mas pune àqueles que ofendem o patrimônio comum (CP, arts. 155 a 180).
112059
184
82989
1230
20000
40000
60000
80000
100000
120000
2006 2009
Furto
Ordem Tributária
Fonte: PUC/RS
PROCESSOS (FURTO X ORDEM TRIBUTÁRIA)
5657
43613873
43 43 560
1000
2000
3000
4000
5000
6000
Furto OrdemTributária
condenatórias
absolutórias
remissão,suspensão,sursis, extinçãoda punibilidade
SENTENÇAS EM 2006
5252
4492
5776
75 970
1000
2000
3000
4000
5000
6000
Furto OrdemTributária
condenatórias
absolutórias
remissão,suspensão,sursis,extinção dapunibilidade
SENTENÇAS EM 2009
Pesquisa de Percepção daPolítica Fiscal Brasileira –
ESAF(2010) Cerca de 60% da sociedade não percebe
benefício das ações do governo em sua vida cotidiana;
De maneira geral, a população brasileira declara
que não há transparência por parte do Estado em relação à arrecadação e gastos públicos, bem como o controle é ineficiente.
72,7% da população declara nunca ter sido cobrada pela falta de pagamento de algum imposto;
Quanto à evasão fiscal (captada como sonegação
na pesquisa), praticamente 80% da população considera um problema de alta gravidade.
O MONTANTE SONEGADO
O painel Sonegômetro, criado pelo SINPROFAZ – Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional, escancarou em 2013 o rombo de R$ 415 bilhões nas contas da União, causado pela sonegação fiscal. O número representa mais de 10% do PIB nacional
Fonte: Sonegação no Brasil – Uma estimativa do desvio da arrecadação – PLUTARCO, Hugo Mendes (2013).
A REPRESSÃO AOS INFRATORES
São quatro as escolhas públicas normalmente tomadas quanto à repressão aos transgressores das leis.
a) A primeira escolha diz respeito ao tipo de pressuposto adotado pelo Estado para atribuir responsabilidade a determinado cidadão pelo descumprimento de regra de Direito, isto é, responsabilidade objetiva ou subjetiva;
b) O segundo ponto a ser considerado é se a sanção será monetária ou não monetária, ou se haverá a mescla dos dois tipos de sanção;
c) A terceira escolha a ser feita, diz respeito ao quantum da pena. No Brasil, “incentivadora”!
d) E a quarta e não menos importante escolha pública diz respeito à probabilidade de detectar e de efetivamente punir os transgressores. Esta última variável está diretamente relacionada ao montante de recursos que o Estado está disposto a empregar para encontrar e efetivamente punir aqueles que descumprirem as leis.
RARA OPERAÇÃO DE COMBATE À SONEGAÇÃO
ALGUMAS PROPOSIÇÕES Alteração da lei 8.137/90 para transformar os
crimes materiais em formais, cominando penas mais graves e diferenciadas para as sonegações de vulto;
Quando sobrevier o exaurimento do crime (supressão efetiva do tributo), limitar o pagamento do tributo ou o seu parcelamento a mera causa de redução de pena.
Reestruturação de órgãos destinados ao combate à sonegação e à corrupção, garantindo independência técnica aos seus membros e gestores, admitidos exclusivamente por concurso público;
Criação de um programa de educação fiscal, que deve ser incluído na grade curricular de todas as escolas de ensino fundamental e médio do país.
MUITO OBRIGADO!