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VALDJANE SALDANHA
PROBLEMAS RELACIONADOS A MEDICAMENTO
EM PACIENTES ADMITIDOS EM HOSPITAL GERAL DE ENSINO: INCIDÊNCIA,
CARACTERIZAÇÃO E FATORES DE RISCO
NATAL
2020
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS
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VALDJANE SALDANHA
PROBLEMAS RELACIONADOS A MEDICAMENTO
EM PACIENTES ADMITIDOS EM HOSPITAL GERAL DE ENSINO: INCIDÊNCIA,
CARACTERIZAÇÃO E FATORES DE RISCO
Orientador: Prof. Dr. Antônio Manuel Gouveia de Oliveira
Co-orientador: Prof. Dr. Rand Randall Martins
Colaboradora: Profª Drª Ivonete Batista de Araújo
NATAL
2020
Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Ciências Farmacêuticas.
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Saldanha, Valdjane. Problemas relacionados a medicamento em pacientes admitidosem Hospital Geral de Ensino: incidência, caracterização efatores de risco / Valdjane Saldanha. - 2020. 81f.: il.
Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Rio Grande doNorte, Centro de Ciências da Saúde, Programa de Pós-graduação emCiências Farmacêuticas. Natal, RN, 2020. Orientador: Antônio Manuel Gouveia de Oliveira. Coorientador: Rand Randall Martins. Coorientadora: Ivonete Batista de Araújo.
1. Medicamentos - Teses. 2. Prescrições - Tese. 3. Hospitalgeral - Tese. 4. Fatores de risco - Tese. 5. Intervençãofarmacêutica - Tese. I. Oliveira, Antônio Manuel Gouveia de. II.Martins, Rand Randall. III. Araújo, Ivonete Batista de. IV.Título.
RN/UF/BS-CCS CDU 615.012
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRNSistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências da Saúde - CCS
Elaborado por ANA CRISTINA DA SILVA LOPES - CRB-15/263
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A meu esposo Pedro e a meu filho Arthur, por
serem inspiração para todos os meus projetos de
vida.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço imensamente,
A Deus, por iluminar meus passos e me fazer forte nos momentos em que o cansaço e
o desanimo prevaleciam;
Ao meu esposo Pedro dos Santos Ferreira e ao meu filho Arthur Saldanha Ferreira, a
razão de tudo em minha vida, por todo o amor, carinho, incentivo, paciência e compreensão nos
momentos em que estive ausente.
A minha mãe Joana Olímpia de Aquino Saldanha e ao meu pai Valter Vilar Saldanha
(in memorian), por me ensinarem que sempre podemos ser melhores e que missão dada é missão
cumprida. Exemplos de força, fé e determinação!
Ao meu orientador professor Dr. Antônio Manuel Gouveia de Oliveira, coorientador
Dr. Rand Randall Martins e a colaboradora Dra. Ivonete Batista de Araújo, que acreditaram
neste projeto e sempre estiveram disponíveis e solícitos, contribuindo para meu crescimento
profissional e intelectual;
Aos pacientes que participaram da pesquisa voluntariamente, meu muito obrigada!
A Dr. Aldair Paiva, gerente de Atenção à Saúde do HUOL, pelo apoio, incentivo e
confiança;
Às minhas amigas e colegas de doutorado, Tatiana Xavier e Sara Lima, pelo
companheirismo e apoio de sempre;
Às amigas e companheiras de trabalho Luciana Dantas Barreto, Cynthia Hatuse,
Isaura Olívia e Patrícia de Kássia, pelo apoio e suporte na coordenação do Setor de Farmácia
do HUOL e por compreenderem minhas ausências. Sem vocês teria sido muito mais difícil!
Aos farmacêuticos do Setor de Farmácia do HUOL, pela contribuição no registro e
disponibilização de informações necessárias à execução desta pesquisa;
A Adriana Lago, pelo suporte técnico na obtenção dos dados dos prontuários
informatizados;
Á Gerência de Ensino e Pesquisa do HUOL, por viabilizar o acesso a dados
institucionais e incentivar o ensino e a pesquisa no HUOL;
Aos alunos de iniciação científica que participaram do projeto (Kaline, Mariane,
Luma, Marinaldo, Tiago Bernardo, Thaise, Gislayne, Maria Luiza e Bruna) e estiveram ao meu
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lado em sua execução. A coleta dos dados não seria possível sem a dedicação, compromisso e
responsabilidade de vocês. Vocês foram muito importantes!!!
A todos que direta e/ou indiretamente contribuíram para a execução desta pesquisa,
deixo registrado o meu “muito obrigada”. Vocês tornaram possível a realização de um sonho.
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Desistir... eu já pensei seriamente nisso, mas nunca me levei
realmente a sério, é que tem muito mais chão nos meus olhos
do que o cansaço nas minhas pernas, mais esperança nos
meus passos, do que tristeza nos meus ombros, mais estradas
no meu coração do que medo na minha cabeça.
Cora Coralina.
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RESUMO
Introdução: Problemas Relacionados a Medicamentos (PRMs) interferem nos resultados
terapêuticos ideais do paciente e podem estar associados a maior morbidade, mortalidade e
gastos com saúde. Objetivo: Descrever a incidência de PRM, caracterizar quanto ao tipo e
causa, avaliar a aceitabilidade das intervenções farmacêuticas, identificar fatores de risco nas
primeiras 48 horas de admissão, desenvolver e validar um modelo preditivo de risco para PRM.
Método: Estudo coorte prospectivo realizado em hospital geral de ensino, durante 2 anos,
usando o sistema de classificação de PRM PCNE 6.2 para detecção por revisão de 100% das
prescrições médicas. Para a identificação de fatores, a regressão logística reversa foi usada para
determinar o conjunto de preditores independentes nas primeiras 48 horas após a admissão na
amostra de treinamento composto por 2/3 da população do estudo. O modelo foi validado na
amostra restante. Resultados: A coorte de pacientes foi constituída por 9.303 pacientes, em
um total de 12.286 episódios de hospitalização, com idade média de 52,6 ± 17,7 anos e 50,9%
do sexo feminino. Foram identificados 3.373 DRP em 1.903 episódios hospitalares, uma
incidência cumulativa de 15,5%. "Ineficácia do tratamento" (11,5%) e "Custo do tratamento"
(5,90%) foram os PRM mais comuns e "Processo de uso de drogas" (18,4%) e "Duração do
tratamento" (31,0%) as principais causas de PRM. Os medicamentos mais frequentemente
envolvidos nos PRMs foram anti-infecciosos (36,0%), principalmente cefalosporinas (20,2%),
anti-úlcera (38,6%), analgésicos/antipiréticos (61,2%), propulsivos (51,2%), opióides (38,5%)
e antieméticos (57,4%). Das 1.939 intervenções farmacêuticas por comunicado escrito, 21,4%
não foram aprovadas pela equipe médica. A população do estudo para determinação dos fatores
de risco foi composta por 1686 pacientes com idade entre 52,0 e 18,3 anos, 51,4% do sexo
feminino, tempo médio de permanência de 3,24 dias e 4,5% de mortalidade hospitalar com
incidência cumulativa de PRM potencial de 14,5%. A internação para cirurgia eletiva e o
principal diagnóstico de doença do sistema circulatório estiveram associados à redução do risco
PRM (OR 0,41 e 0,57, respectivamente, p
-
ABSTRACT
Introduction: Drug-related Problem (DRP) interferes with the patient's ideal therapeutic
results and may be associated with greater morbidity, mortality and health costs. Objective:
The aim of study is describe incidence of DRP, their types and causes; in addition assess the
acceptability of pharmaceutical interventions, identify risk factors in the first 48 hours of
admission, develop and validate a predictive model for DRP risk. Method: Prospective cohort
study carried out in a general university hospital for 2 years, using PCNE 6.2 for classification
of DRP detected by review of 100% of medical orders. For the identification of risk factors,
logistic regression model was used to determine set of independent predictors in the first 48
hours after admission to the training set comprising 2/3 of the study population. The model was
validated in the remaining sample. Results: The patient cohort consisted of 9,303 patients
corresponding to 12,286 hospitalization episodes, with a mean age of 52.6 ± 17.7 years and
50.9% of female sex. 3,373 DRP were identified in 1,903 hospital episodes, a cumulative
incidence of 15.5%. "Treatment ineffectiveness" (11.5%) and "Treatment cost" (5.90%) were
the most common DRP, in addition "Drug use process" (18.4%) and "Treatment duration" (31.
0%) were the main causes of DRPs. The drugs most frequently involved in DRPs were anti-
infectious (36.0%) like cephalosporins (20.2%), anti-ulcer (38.6%), analgesics / antipyretics
(61.2%), propulsive (51.2%), opioids (38.5%) and antiemetics (57.4%). Of the 1,939
pharmaceutical interventions, at least 21.4% were not approved by the medical team. The study
population for determining risk factors was composed of 1686 patients aged between 52.0 and
18.3 years, 51.4% female, mean length of stay of 3.24 days and 4.5% of hospital mortality with
a cumulative incidence of potential DRP of 14.5%. Hospitalization for elective surgery and
diagnosis of circulatory system disease were associated with reduced risk of DRP (OR 0.41 and
0.57, respectively, p
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Quadro 1- Tipos de sistemas de classificação de PRM e seus respectivos níveis de
utilização na assistência à saúde...................................................................
20
Figura 1- Análise univariada de fatores de risco para PRM em pacientes
hospitalizados em um hospital geral de ensino............................................
47
Figura 2 - Gráficos de calibração nas amostras de treinamento e validação............... 51
Figura 3 - Banda de calibração nos conjuntos de treinamento e validação. A área
cinza claro representa as faixas de confiança de 80% e as áreas cinza escuro
as faixas de confiança de 95% .........................................................
51
Figura 4 - Curvas ROC do modelo preditivo obtido nos conjuntos de treinamento e
validação ......................................................................................................
52
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Características demográficas e clínicas da população de estudada.............. 28
Tabela 2 -
Incidência cumulativa de PRM, de acordo com a versão 6.2 da
classificação PCNE.......................................................................................
29
Tabela 3 - Perfil dos PRMs e causas de acordo com a versão 6.2 da classificação PCNE.............................................................................................................
31
Tabela 4 - Distribuição das causas de PRM nas dez classes ATC mais envolvidas em
PRM .............................................................................................................
33
Tabela 5 - Aceitabilidade das intervenções farmacêuticas relacionadas aos PRMs
detectados ....................................................................................................
34
Tabela 6 - Características da população estudada (n=1.686) ........................................ 44
Tabela 7 - Classificação de PRM potencial de acordo com o PCNE versão 6.2...........
45
Tabela 8 - Medicamentos mais prescritos relacionados aos fatores de risco para
PRM............................................................................................................
48
Tabela 9 - Fatores de risco independente para PRM em pacientes admitidos em um
hospital geral de ensino................................................................................
50
Tabela 10 - Modelo de desempenho nas amostras de treinamento e validação ........... 52
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LISTA DE SIGLAS
ATC Anatomical Therapeutic Chemical Code
AGHU Aplicativo de Gestão para Hospitais Universitários
CEP Comitê de Ética em Pesquisa
EAM Evento Adverso a Medicamento
EM Erro de Medicação
EUA United States of America
GAMA- GT Gamaglutamiltranspeptidase
HUOL Hospital Universitário Onofre Lopes
OR Odds Ratio
PCNE Pharmaceutical Care Network Europe
PM Prescrições Médicas
PRM Problema Relacionado a Medicamento
RAM Reação Adversa a Medicamento
RN Rio Grande do Norte
ROC Receiver Operating Characteristic
RSP Revisão Simplificada da Prescrição
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TX Texas
UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte
USA United States of America
UTI Unidade de Terapia Intensiva
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 13
2 OBJETIVOS ........................................................................................................................ 16
2.1 Objetivo Geral .................................................................................................................. 16
2.2 Objetivos Específicos ........................................................................................................ 16
3 REVISÃO DA LITERATURA .......................................................................................... 17
3.1 Problema Relacionado a Medicamento .......................................................................... 17
3.2 Sistemas de classificação de PRM ................................................................................... 19
3.3 Serviços farmacêuticos e revisão da prescrição ............................................................. 21
4 METODOLOGIA ................................................................................................................ 24
4.1 Local do estudo ................................................................................................................. 24
4.1.2 Estudo I - Caracterização de problemas relacionados a medicamentos e a aceitabilidade das intervenções farmacêuticas pela equipe médica................................................................. 24
4.1.2.1 Procedimentos metodológicos ...................................................................................... 25
4.2.1.2 Variáveis ....................................................................................................................... 27
4.2.1.3 Análises estatísticas ...................................................................................................... 27
4.2.1.4 Aspectos éticos .............................................................................................................. 28
4.2.1.5 Resultados ..................................................................................................................... 28
4.2.1.6 Discussão ...................................................................................................................... 34
4.2.1.7 Conclusão ..................................................................................................................... 40
4.1.3 Estudo II - Fatores de risco para problemas relacionados a medicamentos .................... 40
4.1.3.1 Procedimentos metodológicos ...................................................................................... 40
4.1.3.2 Variáveis ....................................................................................................................... 42
4.2.2.3 Análise Estatística......................................................................................................... 42
4.2.2.4 Aspectos éticos ............................................................................................................. 44
4.2.2.5 Resultados ..................................................................................................................... 44
4.2.2.6 Discussão ...................................................................................................................... 53
4.2.2.7 Conclusão ..................................................................................................................... 57
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 58
ANEXO A – PHARMACEUTICAL CARE NETWORK EUROPE - PCNE ....................... 67
ANEXO B – ÍNDICE DE CHARLSON ............................................................................... 76
APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ........... 77
APÊNDICE B – FORMULÁRIO DE COLETA DE DADOS ........................................... 80
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13
1 INTRODUÇÃO
Problema Relacionado a Medicamento (PRM) é definido como “um evento ou
circunstância envolvendo terapia medicamentosa que, de fato ou potencialmente, interfere
nos resultados de saúde desejados”, de acordo com a Pharmaceutical Care Network – PCNE
(PCNE, 2009). Logo, inclusos nesta definição estão os erros de medicação, reações adversas
a medicamentos e eventos adversos a medicamentos.
A maioria das admissões envolvendo PRM são evitáveis e isso representa um sério
e dispendioso problema para profissionais e sistemas de saúde. De acordo com um estudo
saudita, dos 557 pacientes admitidos pelo do serviço de emergência, 14,7% internações
foram devido a PRMs (AL-OLAH e AL THIAB, 2008). De acordo com os mesmos autores,
os tipos mais comuns foram falhas no processo de uso do medicamento em sua grande
maioria, além de reações adversas e intoxicações medicamentosas em menor proporção,
destacando-se que mais de 80% dos casos foram considerados evitáveis.
Isso mostra que muitos PRMs podem ser prevenidos através da detecção de
inadequações como dose inadequada, frequência, modo de administração ou duração da
terapia, interações medicamentosas potenciais, ausência de boa evidência para indicação
clínica ou omissão de um tratamento (VERDOORN et al., 2018). Logo, uma revisão de
prescrição pelo farmacêutico clínico é uma ferramenta de identificação de PRM de grande
valor para garantir uma farmacoterapia efetiva, segura e econômica, tornando o cuidado
farmacêutico parte de um processo de tomada de decisão compartilhada entre médicos e
farmacêuticos (TASAKA et al., 2018).
Para auxiliar no processo de revisão de prescrições, sistemas informatizados de
elaboração de prescrição com emissão de alertas foram disponibilizados e sua aplicação no
monitoramento diário da terapia medicamentosa associados a participação do farmacêutico
nas reuniões clínicas do hospital têm ajudado a detectar PRM e suas possíveis causas
(HAMMAR et al., 2015).
Muitos estudos têm analisado e categorizado os vários tipos de PRMs em pacientes
hospitalizados tendo em vista seu impacto sobre morbidade e mortalidade, o que exige
estratégias urgentes e efetivas para aumentar a segurança do processo de utilização de
medicamentos (WONG et al., 2011). A literatura dispõe de vários sistemas de classificação
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14
e isso tem dificultado o conhecimento de dados epidemiológicos reais (BASGER et al.,
2014).
No âmbito hospitalar, a incidência de problemas relacionados a medicamentos
(PRMs) é elevada em diferentes populações de pacientes, sendo relatadas elevadas taxas de
incidência em crianças (BIRARRA et al., 2017) e idosos (AL HAMID et al., 2014), assim
como em condições clínicas específicas como cardiopatias (URBINA et al., 2015),
problemas neurológicos (RODRIGUES et al., 2019) e cirurgias (QU et al., 2019).
Essa elevada ocorrência de PRM está associada a falhas nos planos terapêuticos
instituídos, nos processos de cuidado, nas metas assistenciais e impacta negativamente na
qualidade de vida do paciente, e causa prejuízos econômicos e sociais (TASAKA et al.,
2018).
A identificação de PRMs por serviços de farmácia é o primeiro passo para prevenir
danos ao paciente relacionados a seu plano terapêutico (BENSON et al., 2018),
possibilitando a redução de erros de medicação, reações adversas e tempo de internação
(CHOI et al., 2016). Estratégias para sua detecção têm sido desenvolvidas (TAEGTMEYER
et al., 2012; TORA et al., 2014; HAMMAR et al., 2015) para possibilitar ao farmacêutico
clínico atuar de forma preventiva e demonstrar sua importância na participação ativa na
equipe multiprofissional de saúde (ABUNAHLAH et al., 2018; TASAKA et al., 2018;
LEOPOLDINO et al., 2019; MA et al., 2019; RODRIGUES et al., 2019).
Muitos dos agravos registrados em admissões de serviços de urgência, em
permanências hospitalares prolongadas, em readmissões e até em óbitos foram decorrentes
de algum PRM. Em um departamento de emergência de um hospital universitário da Arábia
Saudita, das 5574 admissões, 253 (4,5%) tiveram os PRMs como responsáveis e suas causas
foram categorizadas em: Toxicidade por overdose e efeitos colaterais de medicamentos 50
(19,8%), interações medicamentosas 29 (11,5%), ingestão acidental e suicida de
medicamentos 26 (10,3%), abuso de drogas 18 (7,1%), alergia a drogas 10 (4%), e não
adesão ao tratamento 112 (44,3%). Cerca de 70% dos PRMs eram evitáveis; 67 (26,5%)
necessitaram de internação por 7 a 102 dias e 10 (4%) morreram (ALGHAMDY et al., 2015).
Certos aspectos clínicos e/ou características demográficas, que podem ser
considerados como fatores de risco, estão associados ao aumento da chance de alguns
pacientes hospitalizados desenvolverem um PRM, por isso, a identificação desses fatores,
-
15
além da monitorização mais rigorosa da terapia farmacológica, se faz necessária
(JOURDAN et al., 2018).
Embora a identificação dos pacientes em risco de eventos envolvendo terapia
medicamentosa entre pacientes adultos internados em hospitais gerais seja de importância
clínica inquestionável, até onde sabemos, apenas um estudo observacional foi publicado com
esse objetivo. Urbina e colaboradores coletaram dados de pacientes na admissão e revisaram
prescrições de uma coorte prospectiva de 8713 pacientes internados em um hospital
universitário de atendimento terciário durante um período de seis meses que identificou erro
de prescrição causados por uso incorreto de sistemas computacionais com emissão de alerta
em 25% dos casos de PRM. Nesse estudo, apesar de identificar fatores de risco para PRM,
não foi possível validar um instrumento de estratificação de risco com aplicação na prática
clínica (URBINA et al., 2014).
Detectar problemas relacionados a medicamento em prescrições médicas por meio da
revisão de prescrição associada aos dados clínicos do paciente, possibilita elencar e
quantificar os principais PRMs, bem como seus fatores de risco, mesmo na ausência de
sistemas de alertas eletrônicos. A identificação de pacientes em risco para PRM viabiliza a
otimização de recursos e prioriza a assistência à saúde de forma individualizada, além de
fornecer dados epidemiológicos acerca do tema, contribuindo assim, para a redução da
escassez de informações disponíveis.
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16
2 OBJETIVOS
2.1 Objetivo Geral
Desenvolver e validar um modelo preditivo do risco de PRM em pacientes internados
em hospital geral de ensino
2.2 Objetivos Específicos
1. Determinar a frequência, tipo e causa dos PRMs detectados por meio da revisão
das prescrições de pacientes internados nas clínicas médica e cirúrgica;
2. Avaliar a aceitabilidade das intervenções farmacêuticas pela equipe médica;
3. Identificar fatores de risco para a ocorrência de PRM em pacientes internados nas
clínicas médica e cirúrgica;
4. Analisar a validade de um modelo preditivo da ocorrência de PRM durante o
internamento.
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17
3 REVISÃO DA LITERATURA
3.1 Problema Relacionado a Medicamento
Problema relacionado a medicamento (PRM) é definido como um evento ou
circunstância envolvendo a farmacoterapia que interfere, de fato ou potencialmente, com os
resultados de saúde desejados (PCNE, 2009). São considerados eventos adversos e ocorrem
em pacientes em todos os níveis de atenção à saúde, seja domiciliar (MEYER-MASSETTI
et al., 2018), longa permanência (SILVA et al., 2015), farmácia comunitária (SZILVAY et
al., 2019) ou hospitalar (TASAKA et al., 2018).
No âmbito hospitalar, a incidência de PRM é elevada em diferentes populações de
pacientes, tendo sido relatadas elevadas taxas de incidência em crianças (BIRARRA et al.,
2017) e idosos (AL HAMID et al., 2014), assim como em condições clínicas específicas
como cardiopatias (URBINA et al., 2015), problemas neurológicos (RODRIGUES et al.,
2019), reumatológicos (MA et al., 2019) e cirúrgicos (QU et al., 2019).
A ocorrência de PRM impacta negativamente na qualidade de vida do paciente e causa
prejuízos econômicos e sociais (TASAKA et al., 2018). Muitos dos agravos registrados em
admissões de serviços de urgência (AL HAMID et al., 2014; ALGHAMDY et al., 2015),
em permanências hospitalares prolongadas (JOURDAN et al., 2018), em readmissões
(OLSON et al., 2014) e até em óbitos (FERNANDEZ-LLIMOS et al., 2004) foram
decorrentes de algum PRM.
Muitas das admissões hospitalares não planejadas estão associadas a medicamentos
como a causa principal e um número considerável poderia ser evitado (AL-OLAH e AL
THIAB, 2008; LEENDERTSE et al., 2008). Processos de medicação complexos e mal
planejados frequentemente predispõe ao desenvolvimento de PRMs dentro e fora do
ambiente hospitalar (FERRANDEZ, CASAN, et al., 2018).
“Problemas relacionados a medicamento” é uma definição bastante comum em
países onde o inglês não é a língua nativa, enquanto os farmacêuticos nos EUA usam o termo
"problemas relacionados a medicamento" ou "problemas de terapia medicamentosa"
(FOPPE VAN MIL et al., 2016). Somado às dificuldades de definição temos o aparecimento
de novas descrições de PRMs, tais como: “PRMs definidos”, “questões de assistência
farmacêutica”, “PRMs burocráticos”, “PRMs diretos”, “PRMs indiretos”, “PRMs de
medicamentos”, “PRMs reais” e “resultados negativos relacionados a medicamentos”
-
18
(RNMs) (BASGER et al., 2014) que tornam o processo de padronização do conceito ainda
mais difícil.
Essa variedade de definições para o termo tem afetado os resultados epidemiológicos
sobre tema, uma vez que o termo “PRM” em si é usado de forma intercambiável ou com
sobreposição entre outros termos relativos a segurança do medicamento.
A dificuldade em estabelecer o perfil epidemiológico desses eventos também
predispõe a variabilidade dos fatores de risco associados a sua ocorrência. A literatura dispõe
de alguns estudos que correlacionam caraterísticas clínicas e uso de medicamentos com essa
ocorrência para determinar fatores de risco ao desenvolvimento de PRM, tais como
polifarmácia, comprometimento renal ou hepático e uso de antiinflamatórios não esteroidais
(KAUFMANN et al., 2015).
Baseando-se nesses fatores alguns autores desenvolvem instrumentos de avaliação
de risco de um paciente vir a experimentar um PRM (URBINA et al., 2014; KAUFMANN
et al., 2018). Eles podem ser criados para um grupo específico de pacientes, por exemplo,
aqueles com comprometimento renal (SHARIF-ASKARI et al., 2014), geriátricos
(STAMPFLI et al., 2018) ou para um ambiente especial (ex. serviços de emergência)
(KRAHENBUHL-MELCHER et al., 2007).
Há relatos de que esses desfechos negativos são proporcionais à complexidade do
processo de uso do medicamento (FERRANDEZ, CASAN, et al., 2018), sendo alguns dos
fatores mencionados a ocorrência de polifarmácia, hepatopatias, nefropatias e uso de
medicamentos potencialmente perigosos (KAUFMANN et al., 2018).
Mesmo com a disponibilidade de sistemas eletrônicos e emissão de alertas, a revisão
de prescrição permanece como pré-requisito básico para identificação de PRM; embora
desvantajosa por ser tempo e pessoal dependente, entretanto, quando associada a recursos
eletrônicos torna-se bastante efetiva para a rotina hospitalar (HAMMAR et al., 2015). PRMs
podem ocorrer por várias razões como erros de prescrição, monitoramento inadequado ou
fatores relacionados a maneira como o paciente usa um medicamento (EICHENBERGER et
al., 2010).
A identificação, prevenção e resolução de PRMs foram considerados fundamentais
para o processo de cuidado farmacêutico, onde um farmacêutico, em conjunto com o
paciente, médico e outros profissionais de saúde, trabalham para alcançar melhores
resultados terapêuticos e qualidade de vida (FOPPE VAN MIL et al., 2016).
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19
Visando avaliar sistematicamente as prescrições alguns instrumentos buscam identificar
e classificar PRMs, a fim de documentar as descobertas e demonstrar aos farmacêuticos em
atividade o seu valor agregado. Um desses métodos propostos é a análise da prescrição para
identificação de PRMs é a “Avaliação do Processo de Uso de Drogas ” proposto pelo Grupo
de Investigação em Cuidados Farmacêuticos (GICUF) de Portugal. Este método permite ao
farmacêutico avaliar cada medicamento prescrito com base em quatro parâmetros
farmacoterapêuticos: (1) necessidade do medicamento, (2) indicação adequada do
medicamento, (3) dosagem adequada do medicamento, (4) condições adequadas
paciente/sistema (MODESTO et al., 2019).
3.2 Sistemas de classificação de PRM
Problema relacionado a medicamento (PRM), que foi definido como resultado
negativo manifesto ou potencial resultante da maneira como o medicamentos é usado, pode
ocorrer por várias causas, como seleção inadequada de medicamento, forma farmacêutica
inadequada, seleção de dose inadequada, erros de prescrição, erros de dispensação, erros de
administração, duração de tratamento inadequado, processo de administração e
monitoramento inadequado do medicamento, indisponibilidade do medicamento e causas
relacionadas à personalidade do paciente. Essas causas estão relacionadas a custos elevados
com o tratamento, falha terapêutica e/ou danos ao paciente (Pharmaceutical Care Network
Europe, 2009).
Embora a classificação de PRMs seja um processo importante na prática assistencial
e na pesquisas para levantamento de dados epidemiológicos (VAN MIL et al., 2004;
FERNANDEZ-LLAMAZARES et al., 2012), um sistema de classificação usado
universalmente ainda não foi adotado; isso tem resultado em um grande número de sistemas
de classificação com variabilidade na definição, tipos, causas e prevalência de PRMs, na
escolha do sistema e no nível de cuidado a ser aplicado (BASGER et al., 2014). Essa lacuna
de padronização dá margem a modificação de sistemas já existentes e desenvolvimento de
sistemas de classificação de PRMs próprios de cada serviço de saúde (Quadro 1).
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Quadro 1 – Tipos de sistemas de classificação de PRM e seus respectivos níveis de
utilização na assistência à saúde.
Sistemas de Classificação Serviços de saúde
APS-Doc Hospital, emergência
Cipolle at al. 1998 e 2004 Farmácia comunitária, hospital, emergência,
alta hospitalar, domiciliar, ambulatório,
atendimento a idosos
DOCUMENT Farmácia comunitária, domiciliar,
ambulatório, atendimento a idosos
Consenso de Granada Farmácia comunitária, emergência,
domiciliar, ambulatório, idosos
Krska et al Farmácia comunitária, domiciliar,
Noruegues Atendimento a idosos
Pharmaceutical Care Network Europe -
PCNE
Hospital, idosos, farmácia comunitária, alta
hospitalar, emergência, ambulatório
Societe Francaise de pharmacie Clinique
- SFPC
Hospital, Unidade de terapia intensiva,
ambulatório
Spanish Forum of Pharmaceutical Care Farmácia comunitária
Strand et al 1990 ou Hepler and Strand
1990
Idoso, farmácia comunitária, alta hospitalar,
emergência, Hospital, domiciliar, Unidade
de terapia intensiva, ambulatório
Westerlund Farmácia comunitária, alta hospitalar Fonte: (BASGER et al., 2014).
Além disso, diferenças nas metodologias de estudo (HAMMAR et al., 2015; DE
BOCK et al., 2018) e populações estudadas (RASHED et al., 2012; KASBEKAR et al.,
2014; RASHED et al., 2014; LEOPOLDINO et al., 2019) resultaram em dificuldades na
interpretação dos relatórios de prevalência de PRM e em comparar os números, tipos e
causas de PRMs relatados entre estudos usando sistemas de classificação diferente.
Contribuindo para essas dificuldades temos as diferenças ideologias assistenciais
influenciando na construção do sistema de classificação, falhas no processo de classificação
de certos problemas e inadequação de suas instruções (BJORKMAN, BERNSTEN, et al.,
2008).
A ideologia é expressa em como as metas da terapia são definidas e as necessidades
dos pacientes definidas. O sistema de classificação de PRM de Strand (Quadro 1) é baseado
em uma ideologia centrada no paciente cujos objetivos e necessidades da terapia do paciente
são definidos pelo paciente juntamente com os profissionais. Granada-II, PCNE e Apoteket
-
21
são baseadas em uma abordagem de medicina baseada em evidências cujos objetivos e as
necessidades da terapia do paciente são definidos pelos profissionais, com base no
conhecimento científico disponível (BJORKMAN, SANNER, et al., 2008).
Foi demonstrado que a aplicação de quatro sistemas de classificação diferentes ao
mesmo banco de dados de pacientes resultou em diferentes números de PRMs, diferenças
nos resultados das categorias, questões que não foram possíveis de classificar e questões
classificadas de forma diferente em vários sistemas (BJORKMAN, SANNER, et al., 2008).
A falta de validação para muitos sistemas de classificação, sua aplicabilidade limitada (VAN
MIL et al., 2004; CRISP et al., 2011) e a confusão entre o conceito de causa e resultados
(FERNANDEZ-LLIMOS et al., 2004; EICHENBERGER et al., 2010) também foram
identificados. Isso tem levado à criação ou revisão contínua dos sistemas de classificação
previamente validados (CRISP et al., 2011; KOUBAITY et al., 2019).
3.3 Serviços farmacêuticos e revisão da prescrição
Nas últimas décadas, os farmacêuticos tentaram ampliar o seu âmbito de atividade para
além da distribuição tradicional e demais funções de dispensação (HEPLER, 2004; ROTTA
et al., 2015). Trabalhos têm demonstrado o papel clínico desempenhado pelos farmacêuticos
nas áreas de segurança e controle clínico de medicamentos, bem como, o valor da
colaboração farmacêutico-médico em atendimento ao paciente (BALLING et al., 2015;
ROTTA et al., 2015).
A interdisciplinaridade e colaboração entre o farmacêutico clínico e médico do hospital,
tem demonstrado que a qualidade e precisão na revisão das prescrições, participação em
visitas clínicas e reconciliação medicamentosa na transição do cuidado em serviços
hospitalares têm reduzido os erros de prescrição, as readmissões e os danos ao paciente
(ARNOLD et al., 2015; BALLING et al., 2015; HOLLAND, 2015).
A revisão da prescrição médica constitui-se num processo importante de análise do plano
terapêutico, visando metas assistenciais factíveis e otimização de recursos (DE BOCK et al.,
2018). Tal revisão leva em consideração aspectos legais, farmacológicos, patológicos,
técnicos, financeiros e individuais (RODRIGUES et al., 2019). Desta forma, cada prescrição
é personalizada e exige o emprego de tempo e recursos humanos especializados (DE BOCK
et al., 2018).
-
22
Diante disso, é real a necessidade de adequar a oferta de serviços a demanda e por isso,
há um empenho por parte dos gestores de serviços de saúde em oferecer cada vez mais
serviços de qualidade, gastando menos recursos e garantindo segurança aos seus principais
clientes, os pacientes (JOURDAN et al., 2018).
Sistemas informatizados de emissão de prescrições dotados de alertas sobre PRMs tem
se mostrado efetivo na identificação e otimização do tempo dos farmacêuticos clínicos, mas
não substituem a perspicácia de suas intervenções quando realizadas durante as reuniões
clínicas, possibilitando melhora na qualidade, no processo de uso de medicamentos, no
controle das doenças e o engajamento entre a equipe de saúde e o paciente (MAES et al.,
2015; QU et al., 2019; RODRIGUES et al., 2019).
A literatura publicada avaliou o impacto de serviços de farmácia clínica em diferentes
grupos de pacientes. Ensaios clínicos randomizados demonstraram que farmacêuticos têm
um impacto positivo nos resultados de saúde do paciente tanto na comunidade (SZILVAY
et al., 2019), como nos hospitais (LEOPOLDINO et al., 2019; RODRIGUES et al., 2019;
SEMCHAROEN et al., 2019) e que revisões sistemáticas mostraram que o cuidado
farmacêutico foi associado a melhorias nos desfechos de saúde e qualidade de vida de
pacientes de diversas patologias e redução de custos.
Entretanto, a falta de rigor nas metodologias e a utilização de termos diferentes para
definir as atividades clínicas dos farmacêuticos têm prejudicado as análises dos resultados e
sugerem novas pesquisa para avaliar o real impacto das intervenções farmacêuticas no
contexto geral ou específico (ROTTA et al., 2015).
Além disso, foi observado que serviços de farmácia Clinica e cuidado farmacêutico
foram os dois termos mais comumente usados; essa pluralidade tem influenciado nos
resultados de estudos que visam identificar a efetividade de suas ações no contexto
individual, coletivo e social (ALLEMANN et al., 2014).
Os serviços de farmácia clínica em hospitais evidenciam uma melhora significativa
na segurança do paciente, reduzindo os erros de medicação e eventos adversos a
medicamentos; bem como reações adversas (HOHL et al., 2001). Eles aumentam a
adequação da medicação, melhoram o conhecimento dos pacientes sobre terapia
medicamentosa e a adesão (ARNOLD et al., 2015), e, finalmente, reduzem o tempo de
internação hospitalar (MEIER et al., 2015). Entretanto, recursos humanos e financeiros
limitados obrigam os farmacêuticos clínicos a direcionarem suas atividades clínicas para os
-
23
pacientes que estão em maior risco de sofrer um evento adverso envolvendo medicamento
(STAMPFLI et al., 2018).
Dente as atividades do farmacêutico clínico destacamos seu papel na educação
continuada de todos os profissionais envolvidos no processo de medicação sendo a educação
de enfermeiros as de impacto direto na assistência ao paciente por ser o profissional
responsável pela última etapa no processo de medicação (MOSTAFA et al., 2019).
Um estudo prospectivo pré-pós-intervenção foi conduzido em um hospital de
emergência usando observação direta para a detecção de erros de medicação. A taxa de erros
de medicação foi determinada antes e depois da implementação de instrumentos
educacionais. Das 1025 intervenções realizadas no momento pré-intervenção 34,2%
resultavam de erros de medicação, e das 1024 intervenções realizadas no pós-intervenção,
15,3% correspondiam a erros de medicação, ou seja, foi observada uma redução na taxa de
erros de medicação após a implementação de instrumentos educacionais (MOSTAFA et al.,
2019).
Diante disso, temos que as intervenções dos farmacêuticos clínicos centradas na
melhoria do conhecimento dos enfermeiros sobre os fármacos e na conscientização dos erros
mostraram-se efetivos na redução da taxa e gravidade dos erros de administração de
medicamentos entre enfermeiros em um ambiente hospitalar de emergência (MOSTAFA et
al., 2019).
-
24
4 METODOLOGIA
4.1 Local do estudo
Esta pesquisa foi conduzida durante dois anos ininterruptos (maio 2016 – abril 2018)
em um hospital geral de ensino - Hospital Universitário Onofre Lopes - localizado em Natal,
Rio Grande do Norte, Brasil, o qual faz parte do complexo hospitalar da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), administrado pela Empresa Brasileira de Serviços
Hospitalares (EBSERH). A instituição é referência em atendimento de várias especialidades
médicas do estado do Rio Grande do Norte (RN). É um hospital público, terciário e de médio
porte com capacidade para 247 leitos e aproximadamente 8.000 internações por ano,
distribuídos pelas diferentes especialidades médicas: cardiologia, urologia, nefrologia,
gastroenterologia, proctologia, cirurgia geral, cirurgia vascular, transplante renal,
endocrinologia, reumatologia, neurologia, oncologia, intensivíssimo adulto, psiquiatria e
pediatria; com exceção de ginecologia, obstetrícia e neonatologia.
4.1.1 Desenho do estudo
A presente tese foi dividida em dois estudos. O estudo I, que se caracteriza como uma
coorte observacional, prospectiva, longitudinal e descritiva, e o estudo II, como uma coorte
observacional, longitudinal e analítica.
4.1.2 Estudo I - Caracterização de problemas relacionados a medicamentos e a
aceitabilidade das intervenções farmacêuticas pela equipe médica.
O estudo I teve como objetivo avaliar a frequência, tipo e causa dos PRM detectados
por revisão das prescrições de pacientes internados nas clínicas médica e cirúrgica, e a
aceitabilidade das intervenções farmacêuticas pela equipe médica. Tal estudo deu origem ao
artigo intitulado Incidence, types and acceptability of pharmaceutical interventions about
drug related problems in a general hospital: an open prospective cohort, aceito para
publicação no periódico BMJ Open, com fator de impacto 2.42, Qualis A1.
-
25
4.1.2.1 Procedimentos metodológicos
Para compor a amostra do estudo I, a coleta de dados se deu a partir dos registros em
livro específico destinado a catalogar todas as intervenções farmacêuticas decorrentes do
processo simplificado de revisão das prescrições médicas de todos os pacientes que foram
hospitalizados até a sua alta hospitalar ou óbito. No entanto, apenas foram incluídos aqueles
com mais de 18 anos e que permaneceram por mais de 24 horas no hospital para fins de
tratamento, durante o período do estudo, e para os quais pelo menos 01(um) medicamento
foi prescrito.
Foram excluídos pacientes internados apenas para fins de diagnóstico e aqueles
internados em unidade de terapia intensiva. Pacientes em uso exclusivo de prescrição
exclusiva de soluções de eletrólitos, soluções de nutrição parenteral, sangue total e produtos
sanguíneos, não foram considerados na revisão das prescrições médicas, pois não possuíam
uma dose usual preestabelecida. Por não serem incluídas no mesmo sistema, as prescrições
contendo medicamentos anticâncer não foram revisadas pelo mesmo grupo de farmacêuticos
e, portanto, não fizeram parte da amostra.
As prescrições de cada especialidade médica foram inseridas em um sistema
informatizado, o qual disponibiliza dados clínicos e os formulários hospitalares adotados na
instituição para seleção no momento da elaboração da prescrição, mas não possui um sistema
com emissão de alertas eletrônicos para identificar PRMs.
As prescrições eram enviadas eletronicamente ao serviço de farmácia hospitalar do
HUOL foram submetidas ao processo de revisão pelo farmacêutico. Essa etapa, que antecede
a dispensação dos medicamentos, tem o objetivo de interceptar PRM potenciais.
A revisão da prescrição foi realizada por uma equipe composta por 21 farmacêuticos
divididos em grupos de 3 deles, que se revezaram na revisão de 100% das prescrições
individuais enviados ao serviço de farmácia do hospital 24 horas por dia, sete dias por
semana.
Para este estudo, PRM foi definido, de acordo com a Pharmaceutical Care Network
Europe Foundation, versão 6.2 (PCNE, 2009), como qualquer evento ou circunstância
envolvendo terapia medicamentosa que, real ou potencialmente, interferisse nos resultados
de saúde desejados. A revisão da prescrição foi realizada a fim de detectar um PRM
potencial, avaliando um conjunto predefinido e padronizado de itens identificáveis apenas
-
26
na prescrição, tendo em vista que o prontuário não foi revisado. Esses incluíram nome do
medicamento, disponibilidade, dose, via de administração, forma farmacêutica, frequência
de uso, diluição, tempo de infusão, duração do tratamento, duplicidade terapêutica, custo-
efetividade, aspectos legais da prescrição, uso de abreviações não padronizadas no hospital
e ausência de informações relevantes para o uso seguro do medicamento. Esse tipo de revisão
chamamos Revisão Simplificada da Prescrição (RSP).
Os PRMs foram classificados de acordo com o PCNE versão 6.2. Tal sistema atribui
a cada PRM quatro domínios possíveis com as respectivas subclassificações: 1. Problema
(inefetividade do tratamento, reações adversas, custos do tratamento, outros); 2. Causa do
problema (seleção do medicamento, forma do medicamento, seleção da dose, duração do
tratamento, processo de uso do medicamento, logística, paciente, outros); 3. Intervenção
necessária para resolver ou evitar o problema (nenhuma intervenção, intervenção no nível
do prescritor, no nível do paciente/cuidador, no nível do medicamento, outros); 4. Desfecho
das intervenções (desconhecido, resolvido, parcialmente resolvido, não resolvido).
Com base na identificação do PRM, os farmacêuticos do hospital emitiram proposta
de intervenções para cada caso baseando-se no Micromedex® (Truven Health Analytics,
Michigan, EUA), Uptodate® (WoltersKluwer, AlphenaandenRijn Databases, NL) e
recomendações do fabricante de cada medicamento ao identificar a possibilidade de
ocorrência de PRM devido às características de estabilidade físico-química e/ou
microbiológica.
As informações sobre o PRM foram revisadas por um farmacêutico clínico com 9 anos
ou mais de experiência e, em casos de dúvida na classificação, um segundo farmacêutico
clínico mais experiente foi consultado a fim de dirimi-la.
Ao detectar um PRM em potencial durante a revisão das prescrições, que durava em
média 3 minutos, o farmacêutico elaborava um documento escrito, denominado
“Comunicado Farmacêutico à equipe assistencial”, padronizado na instituição, na cor
amarela, relatando o possível problema e uma proposta de intervenção no plano terapêutico
do paciente. Esse documento era protocolado em um livro de registros específico e enviado
à respectiva enfermaria por um mensageiro para que fosse anexado à prescrição médica no
prontuário físico, facilmente visualizado antes elaboração da próxima prescrição.
Nosso estudo não avaliou o resultado do PRM, considerando que o problema detectado
pelo RSP é um problema potencial, não um PRM manifesto. No entanto, avaliamos a
-
27
aceitabilidade pela equipe médica das intervenções farmacêuticas emitidas durante o RSP.
As alterações na prescrição médica, após 72 horas de observação, foram classificadas quanto
à sua aceitabilidade (aceitas, não aceitas e desconhecidas). Foram consideradas como
“aceitas pelo prescritor” aquelas alterações na prescrição de acordo com a proposta de
intervenção realizada pelo farmacêutico. As alterações que não foram evidenciadas na
prescrição foram consideradas “ não aceitas”; já as que não puderam ser evidenciadas foram
consideradas “desconhecidas”. Todos os pacientes foram observados em todo o hospital até
sua alta hospitalar ou óbito.
Após obtido o resultado da intervenção, todo os dados foram armazenados em uma
planilha Excel e, ao final da pesquisa, foram tratados estatisticamente.
Os medicamentos prescritos para cada paciente foram registrados e classificados de
acordo com o Anatomical Therapeutic Chemical Code (ATC).
4.2.1.2 Variáveis
As variáveis do estudo 1 foram: idade, sexo, tempo de internamento, especialidade
médica, número de óbitos no período, número de prescrições avaliadas pelo farmacêutico,
frequência com que ocorrem, tipo e causa dos PRMs identificados e medicamentos
envolvidos, além da aceitabilidade das intervenções farmacêuticas pela equipe médica.
4.2.1.3 Análises estatísticas
Levando em consideração os dois anos de coleta de dados, estimou-se que haveria
cerca de 16.000 episódios de hospitalização, correspondendo a aproximadamente 100.000
prescrições médicas e 1.600.000 itens prescritos e avaliados. Esse tamanho de amostra
garantiu um erro máximo de estimativas de 0,8 pontos percentuais com 95% de confiança.
As variáveis de intervalo foram descritas por mediana, média ± desvio padrão e as
variáveis binárias por frequência absoluta e relativa, incidência acumulada e densidade de
incidência. A análise estatística foi realizada utilizando Stata 15 (Stata Corporation, College
Station, TX, EUA).
-
28
4.2.1.4 Aspectos éticos
A aprovação do estudo foi obtida no Comitê de Ética em Pesquisa Hospitalar com o
número 1.439.845, que dispensou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
dos pacientes, pois nesta fase da pesquisa, foi utilizado, exclusivamente, os registros em livro
específico do serviço de farmácia hospitalar, ou seja, dados secundários.
Nenhum paciente esteve envolvido na definição da questão de pesquisa, medidas,
interpretação ou redação dos resultados.
4.2.1.5 Resultados
O estudo foi realizado entre maio de 2016 e abril de 2018 para evitar os efeitos da
sazonalidade. Nesse período, houve 15.005 internações hospitalares e foram prescritos cerca
de 1.600.000 itens de medicamentos. Nossa amostra foi composta por 12.286 episódios de
internação em 9.303 pacientes únicos com idade média na primeira internação de 52,6 ± 17,7
anos, dos quais 6.250 eram mulheres (50,9%). A farmácia do hospital revisou 117.022
prescrições médicas emitidas para nesses pacientes. O hospital oferece internação clínica e
cirúrgica em diferentes especialidades médicas, sendo a cardiologia (12,6%) e a cirurgia
geral (8,01%) as mais frequentes. O tempo médio de permanência foi de 2,93 dias (intervalo
de 1 a 474 dias) (Tabela 1).
Tabela 1 - Características demográficas e clínicas da população estudada.
Características Estatística Descritiva
Idade (anos) (m, dp) 52.60 17.7
Sexo Feminino (n,%) 6,250 50.9
Permanência hospitalar em dias (md, intervalo) 2.93 1 - 474
Mortalidade hospitalar (n, %) 666 5.42
Elaborada pelo autor (2019)
m: média; md: mediana; n: número absoluto; dp: desvio padrão.
-
29
Em 1.903 episódios de admissões hospitalares, um ou mais PRM foram detectados,
correspondendo a uma incidência cumulativa de PRM de 15,5%. Foram identificados 3.373
PRMs, correspondendo a uma densidade de incidência de 1,71% paciente-dia e
representando uma média de 0,27 ± 0,81 PRM por paciente. De acordo com o PCNE 6.2, o
PRM classificado como "P1 – Inefetividade terapêutica", que inclui o PRM para "nenhum
efeito de tratamento medicamentoso/falha terapêutica", "efeito de tratamento
medicamentoso não ideal", "efeito inadequado do tratamento medicamentoso" e "indicação
não tratada" foram observados em 1.413 (11,5%) pacientes, sendo o mais frequente " efeito
do tratamento medicamentoso não ideal "(9,21% dos pacientes) (Tabela 2).
Tabela 2 - Incidência cumulativa de PRM, de acordo com PCNE versão 6.2.
Tipos de PRM Incidência cumulativa
n %
P1 – Inefetividade do Tratamento
257 2.09 P1.1 - Nenhum efeito do tratamento medicamentoso/ falha
terapêutica
P1.2 - Efeito do tratamento medicamentoso não ideal 1,132 9.21
P1.3 - Efeito errado do tratamento medicamentoso 24 0.19
P3 – Custo do Tratamento
725 5.90 P3.1 - Tratamento medicamentoso mais caro do que o
necessário
P4 – Outros
P.4.2 - Problema/reclamação pouco clara 301 2.45
Elaborada pelo autor (2019)
O PRM classificado como "Custos do tratamento - P3", aquelas relacionadas ao uso
de medicamentos mais caros que o necessário para o tratamento de determinada doença,
foram identificados em 725 (5,90%) pacientes. O PRM classificado como “Outros - P4 ”
ocorreu em 301 pacientes (2,45%) e refere-se àqueles em que o paciente não está satisfeito
com o resultado terapêutico e/ou econômico, ou àqueles cujos sistemas de classificação não
foi capaz de contemplar, como o não cumprimento do tratamento, uso de nome comercial,
prescrição incompleta, uso de abreviações não padronizadas, dificuldade na interpretação da
prescrição médica e tipo de formulação farmacêutica. O processo RSP não pôde identificar
-
30
o PRM do tipo "Reação adversa - P2", que abrange eventos adversos a medicamentos
(alérgicos/não alérgicos) e eventos adversos tóxicos a medicamentos.
No que diz respeito às causas de PRM (Tabela 3), o tipo P1 foi causado principalmente
por inadequações no "processo de uso de medicamentos - C5", que incluem tempo de
administração inadequado, local ou via de administração inadequada ou insegura, volume
de diluição insuficiente e diluente inapropriado. Essas causas representaram 18,4% das
causas de PRM, com uma densidade de incidência de 0,16% paciente-dia.
Os PRMs causados por processos "Logísticos - C6", que incluem indisponibilidade de
medicamentos, erro de prescrição e erro de dispensação, representaram 17,9% dos PRMs,
com uma densidade de incidência de 0,31% de pacientes-dia.
A “Seleção de dose - C3” representou 16,1% dos PRMs, com densidade de incidência
de 0,28% paciente-dia. "Duração do tratamento - C4" foi a causa mais frequente de PRM
(31,0% da PRM e densidade de incidência de 0,53% paciente-dia), associada apenas à
ocorrência de PRMs classificados como "Custo de tratamento - P3".
A única causa do PRM classificado como “Outros - P4” foi processos “ Logísticos -
C6” (10,9% e 0,19% paciente-dia), que incluiu o modo como o medicamento seria utilizado
pelo paciente (tempo de infusão, frequência do medicamento prescrito), ou erro de
prescrição. A incidência cumulativa de cada causa de PRM também é mostrada na Tabela 3.
-
31
Tabela 3 - Perfil dos PRMs e suas causas de acordo com a versão 6.2 da classificação PCNE.
Elaborada pelo autor (2019)
Tipo de PRM Causa de PRM
Distribuição de
frequência
Incidência
cumulativa
n % n %
P1 – Inefetividade do
tratamento
C1.1 Medicamento inapropriado (inclusive Contra-
indicado) 28 0.83 24 0.20
C1.2 Nenhuma indicação de medicamento 12 0.36 12 0.10
C1.3 Combinação inadequada de medicamentos ou
medicamentos e alimentos 67 1.99 47 0.38
C1.4 Duplicação inadequada do grupo terapêutico ou
ingrediente ativo 23 0.68 21 0.17
C2.1 Forma farmacêutica inadequada (para este paciente) 7 0.21 6 0.05
C3.2 Dose de medicamento muito alta 363 10.8 332 2.70
C3.3 Regime posológico pouco frequente 180 5.34 167 1.36
C5.1 Momento inadequado de administração e/ou
intervalos de dosagem 619 18.4 530 4.31
C6.1 Medicamento prescrito não disponível 269 7.98 246 2.00
C6.2 Erro de prescrição (falta de informações necessárias) 335 9.93 234 1.90
C8.1 Outra causa; especificas 34 1.01 32 0.26
P3 – Custo do
tratamento
C1.7 Medicamento mais econômico disponível 23 0.68 22 0.18
C4.2 Duração do tratamento muito longa 1044 31.0 712 5.80
P4 - Outros C5.7 Paciente incapaz de usar medicamento/conforme
indicado 1 0.03 1 0.01
C6.2 Erro de prescrição (falta de informações necessárias) 368 10.9 301 2.45
Total 3373 100.0 - -
-
32
Antimicrobianos foram implicados em aproximadamente 36% dos PRMs,
principalmente cefalosporinas (J01D, 20,2%) e penicilinas (J01C, 6,08%). As classes
terapêuticas do sistema de classificação ATC envolvidas com mais frequência nos PRMs e
a distribuição de frequência das respectivas causas são mostradas na Tabela 4.
-
33
Tabela 4 - Distribuição das causas de PRM nas dez classes ATC mais envolvidas em PRM.
Elaborada pelo autor (2019)
Classes ATC Causa de PRM
Causas de PRM - n (%)
C1
Seleção de
Droga
C3
Seleção de
dose
C4
Duração
tratamento
C5
Uso de droga
C6
Logística
C8
Outros
J01D - Outros antibacterianos beta-lactâmicos 682 (20.2%) 11 (1.61%) 42 (6.16%) 416 (61.0%) 64 (9.38%) 138 (20.2%) 11 (1.61%)
A02B - Medicamentos para úlcera péptica e
doença do refluxo gastroesofágico
210 (6.23%) 14 (6.67%) 37 (17.6%) 0 (0.00%) 75 (35.7%) 81 (38.6%) 3 (1.43%)
J01C - Beta-lactâmicos, penicillinas 205 (6.08%) 3 (1.46%) 10 (4.89%) 135 (65.9%) 12 (5.85%) 39 (19.0%) 6 (2.93%)
N02A - Opióides 180 (5.34%) 7 (3.89%) 66 (36.7%) 0 (0.00%) 69 (38.3%) 38 (21.1%) 0 (0.00%)
J01M - Quinolonas 172 (5.10%) 1 (0.58%) 5 (2.91%) 111 (64.5%) 1 (0.58%) 53 (30.8%) 1 (0.58%)
J01X - Outros antibacterianos 158 (4.69%) 1 (0.63%) 18 (11.4%) 100 (63.3%) 11 (6.96%) 27 (17.1%) 1 (0.63%)
P01A - Agentes contra amebíase e outras
doenças protozoárias 153 (4.54%) 3 (1.96%) 2 (1.31%) 104 (68.0%) 2 (1.31%) 42 (27. 5%) 0 (0.00%)
N02B - Outros analgésicos e antipiréticos 139 (4.12%) 0 (0.00%) 35 (25.2%) 0 (0.00%) 19 (13.7%) 85 (61.2%) 0 (0.00%)
A03F - Propulsivos 123 (3.65%) 14 (11.4%) 25 (20.3%) 0 (0.00%) 21 (17.1%) 63 (51.2%) 0 (0.00%)
A04A - Antieméticos e antinauseantes 101 (3.00%) 7 (6.93%) 11 (10.9%) 1 (0.99%) 58 (57.4%) 24 (23.7%) 0 (0.00%)
-
34
Entre os anti-infecciosos de uso sistêmico, "Duração do tratamento - C4" foi a
principal causa da PRM, representando de 61% a 68% de todas as causas de PRM entre as
diferentes classes terapêuticas dos anti-infecciosos. Processos "Logísticos - C6" foi outra
causa comum de PRM em algumas classes terapêuticas do ATC, como antidispéticos (A02B,
38,6% de todas as causas), analgésicos/antipiréticos (N02B, 61,2% de todas as causas) e
propulsores (A03F, 51,2 % de todas as causas). O PRM observado com opioides (N02A) e
antieméticos (A04A) foi causado principalmente pelo "processo inadequado de uso de
medicamentos - C5" (38,3% e 57,4% de todas as causas, respectivamente) (Tabela 4).
Das 3.373 intervenções farmacêuticas realizadas, 1.939 foram acompanhadas para
avaliação de sua aceitabilidade pelo prescritor e das respostas que foram possíveis de serem
observas, 62,8% foram aceitas. Das 1.939 intervenções, 1.217 (36,10%) foram considerados
"aceitas", porque houve uma mudança na prescrição, ou seja, alterações compatíveis com a
intervenção farmacêutica proposta. Em 722 (21,4%) casos, as intervenções foram
classificadas como "não aceitas" pelo prescritor, pois não geraram alteração na prescrição.
Algumas intervenções não puderam ser avaliadas quanto à aceitabilidade pela equipe de
saúde, pois não seria possível identificar alteração na prescrição. Isso inclui casos em que o
paciente recebeu alta ou foi a óbito antes que a prescrição pudesse ser alterada, quando se
propôs uma mudança na técnica de preparação do medicamento, possível problema
relacionado à estabilidade físico-química do medicamento ou forneceu instruções sobre a
administração correta do medicamento. Essas situações representaram 1.433 (42,5%) dos
casos e foram classificados como “desconhecidas” (Tabela 5). Das 1.939
Tabela 5 - Aceitabilidade de intervenções farmacêuticas relacionadas aos PRM detectados.
Aceitabilidade n %
Intervenção proposta, aprovada pelo prescritor 1,217 36.1
Intervenção proposta, não aprovada pelo prescritor 722 21.4
Intervenção proposta, resultado desconhecido 1,433 42.5
Elaborada pelo autor (2019)
4.2.1.6 Discussão
Nosso estudo avaliou a incidência de PRM entre pacientes adultos internados em
enfermarias médicas e cirúrgicas de um hospital geral de ensino, utilizando uma coorte
prospectiva aberta por um período de 2 anos. A detecção do PRM foi realizada pela revisão,
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pelos farmacêuticos hospitalares, de todas as prescrições médicas emitidas por um sistema
informatizado sem alertas, de acordo com uma lista de verificação para revisão das
prescrições médicas, sendo o PRM classificado de acordo com a versão 6.2 do PCNE.
Neste estudo, estimamos que, com esse método simplificado e centralizado de revisão
de prescrições, o PRM seja detectado em cerca de um sexto de todos os episódios de
admissões hospitalares. Os PRMs mais comuns estão relacionados à efetividade do
tratamento, devido principalmente a inadequações no processo de uso de medicamentos, e
aos custos de tratamento causados principalmente por tratamentos prolongados, envolvendo
principalmente os grupos terapêuticos de analgésicos/antipiréticos e cefalosporinas,
respectivamente. Constatou-se também que intervenções farmacêuticas, propostas
indiretamente por meio de comunicados escritos, apresentavam uma taxa de aceitabilidade
da equipe médica que pode ser considerada relativamente baixa, quando comparadas com as
intervenções realizadas de forma direta durante as visitas clínicas beira leito.
A incidência de PRM observada neste estudo foi diferente da incidência relatada em
outros estudos realizados em hospitais de diferentes tipos (BLIX et al., 2006; BEDOUCH et
al., 2009; ROTEN et al., 2010), o que pode ser devido, pelo menos parcialmente, à
diversidade das metodologias utilizadas para identificar a PRM, a classificação de PRM, a
comunicação com a equipe médica e a avaliação da aceitabilidade de intervenções
farmacêuticas. Além disso, muitos estudos publicados sobre a incidência de PRM foram
realizados em pacientes idosos hospitalizados que, devido à polifarmácia frequente nessa
população, apresentam maior risco de PRM. (GUIGNARD et al., 2015; URBINA et al.,
2015; MA et al., 2019; SEMCHAROEN et al., 2019).
O número de leitos designados para pacientes de cardiologia e a maior complexidade
da patologia e comorbidades associadas, especialmente insuficiência cardíaca e infarto
agudo do miocárdio, poderiam explicar em parte essas discrepâncias (WONG et al., 2011).
Os problemas relacionados a medicamentos predominam nos serviços clínicos,
principalmente em cardiologia, quando comparados aos serviços cirúrgicos de cirurgia geral
(URBINA et al., 2014).
Poucos estudos foram publicados nos quais foi realizada a análise de todas as
prescrições médicas de todos os pacientes internados em um hospital geral. A grande maioria
dos estudos publicados descreveu a frequência e o tipo de PRM em pacientes de diferentes
especialidades médicas.
Entre os estudos realizados em hospital universitário inteiro, um estudo prospectivo
que durou 18 meses, entre 2001 e 2003, 7 farmacêuticos clínicos integrados à equipe médica,
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durante as rondas na enfermaria, examinaram 29.016 prescrições médicas computadorizadas
de 8.152 pacientes (BEDOUCH et al., 2009). Os PRMs identificados nesse estudo foram
classificados por dois farmacêuticos independentes, usando uma lista de verificação da
Sociedade Francesa de Farmácia Clínica. Neste estudo, o percentual de pacientes com um
ou mais PRMs foi significativamente maior (33,0%), com descumprimento das diretrizes ou
contraindicação (29,5%), administração inadequada (19,6%), interação medicamentosa
(16,7%) e superdosagem (12,8 %) sendo as causas de PRMs mais frequentes. Os
medicamentos cardiovasculares foram os mais envolvidos (22,2%), seguidos pelos
antimicrobianos (13,3%) e analgésicos/anti-inflamatórios (11,3%) (BEDOUCH et al.,
2009).
Outro estudo prospectivo, realizado em seis departamentos de medicina interna e dois
departamentos de reumatologia em cinco hospitais da Noruega, entre maio e dezembro de
2002, farmacêuticos clínicos avaliaram as prescrições de 827 pacientes hospitalizados para
a detecção de PRM utilizando o método da revisão de prontuários e participação em reuniões
multidisciplinares e relatou que 81% dos pacientes tinham PRM, com uma média de 2,1
PRMs clinicamente relevante por paciente (BLIX et al., 2004).
Os PRMs relatados com mais frequência foram problemas relacionados à dose (35,1%
dos pacientes), seguidos por exames laboratoriais alterados (21,6%), medicamentos não
ideais (21,4%) e necessidade de medicamentos adicionais (19,7%), medicamentos
desnecessários (16,7 %) e erros nos prontuários (16,3%). As classes de medicamentos que
mais causaram PRM foram agentes antitrombóticos, anti-inflamatórios não-esteróides,
opióides e inibidores da enzima de conversão da angiotensina (BLIX et al., 2004).
Por outro lado, outro estudo analisou todos os PRM identificados em 44.870 pacientes
durante 2014-2015, analisando as prescrições médicas emitidas por um sistema
informatizado com emissão de alertas, por uma equipe de 14 farmacêuticos integrados nas
rondas da enfermaria. O percentual de episódios de admissões hospitalares em que foi
observado PRM foi de apenas 5,6%, valor muito inferior ao observado em nosso estudo. As
principais causas de problemas relacionados a medicamento foram erros de prescrição por
uso incorreto do sistema informatizado de prescrição (18,1%), interação medicamentosa
(13,3%) e ajuste da dose pela função renal e/ou hepática (11,5%) (FERRANDEZ, CASAN,
et al., 2018).
A implementação de sistemas de prescrição informatizada tem sido responsável por
um aumento considerável na segurança relacionada ao uso de medicamentos (HAMMAR et
al., 2015; FRISSE et al., 2016). No entanto, esses sistemas também têm sido associados ao
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aparecimento de PRM como consequência da falta de capacidade de usar ferramentas
computacionais (HELLOT-GUERSING et al., 2016; SLIGHT et al., 2016). De fato,
prescrição inadequada, erros de prescrição devido à confusão com casas decimais, falta de
informações sobre a via de administração e tempo de infusão, uso de abreviações não
padronizadas na instituição e o uso de fórmulas moleculares contribuíram para a segunda
maior causa de PRM detectada no presente estudo, a de inefetividade terapêutica devido ao
processo inadequado de uso de medicamentos.
Por outro lado, uma das causas da redução da taxa de incidência de PRM observada
em nosso estudo pode estar relacionada à ausência, em nossa instituição, de um sistema
informatizado de prescrição que, juntamente com ferramentas computacional, fornecesse
alertas e relatórios de informações clínicas do paciente (diagnóstico, comorbidades,
resultados laboratoriais, concentração sérica de medicamentos) com as informações
farmacológicas dos medicamentos (dose solicitada e função renal/hepática do paciente, peso,
creatinina, tipo e volume adequados do diluente, tempo de perfusão, frequência e via de
administração). Sem esse sistema de informação, é difícil identificar várias causas de PRMs,
como interações medicamentosas, ajustes de dose, overdoses, subdoses, incompatibilidade,
indicação e contra-indicação.
Em nosso estudo, os antimicrobianos, em especial as cefalosporinas e penicilinas,
foram os medicamentos mais envolvidos em PRM, principalmente devido ao uso
prolongado. A alta detecção desse tipo de PRM deveu-se provavelmente ao envolvimento
direto dos farmacêuticos no controle de inventário dessa classe de medicamentos, facilitando
a identificação de divergências entre o tratamento esperado e o que realmente estava sendo
administrado.
Outros grupos também envolveram os antidispépticos, analgésicos e antipiréticos que
frequentemente apresentavam o potencial problema de inefetividade terapêutica causada por
problemas logísticos do processo de prescrição e dispensação, principalmente erros de
prescrição devido à falta de informações relevantes como volume e tipo de diluente, dose,
tempo de infusão, frequência e via de administração e indisponibilidade do medicamento.
Outro grupo relevante foram opióides e antieméticos, mais frequentemente devido a falhas
no processo de uso, como tempo de infusão e volume de diluição insuficientes.
A revisão simplificada de 100% das prescrições médicas pelos farmacêuticos clínicos,
antes da administração do medicamento, é uma das principais estratégias para a prevenção
de PRM em pacientes acompanhados em vários níveis de assistência à saúde
(WESTERLUND et al., 2013; DE BOCK et al., 2018; RHALIMI et al., 2018),
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especialmente em um ambiente hospitalar, onde o risco de PRM é alto, relacionados a vários
fatores como polifarmácia, comorbidades, uso de medicamentos de alto risco, insuficiência
renal/hepática, condição clínica e hospitalização prolongada (MAES et al., 2015;
ABUNAHLAH et al., 2018). Essa é uma realidade muito comum na maioria dos serviços de
saúde.
A implementação de serviços clínicos farmacêuticos, seja na atenção básica ou na alta
complexidade, não apenas reduz os custos hospitalares (DRYDEN e DEWHURST, 2019),
mas também minimiza a ocorrência de danos ao paciente, de internações e readmissões
hospitalares e melhora sua qualidade de vida (CHOI et al., 2016; FOROUGHINIA et al.,
2016; RHALIMI et al., 2018; TASAKA et al., 2018; MA et al., 2019; RODRIGUES et al.,
2019; SZILVAY et al., 2019).
Após a revisão da prescrição médica, todos os PRMs identificados foram submetidos
a uma intervenção farmacêutica por meio de um documento escrito endereçado à equipe de
saúde, independentemente da gravidade do PRM. Porém, somente os resultados das
intervenções voltadas aos prescritores puderam ser analisados, devido à facilidade de
identificação de alterações na prescrição médica, refletindo a efetiva aprovação da
intervenção no plano terapêutico do paciente. Observou-se uma taxa relativamente baixa de
aceitabilidade das intervenções quando comparadas àquelas realizadas por farmacêutico
clínico durante as rondas nas enfermarias, possivelmente relacionada ao fato de que os
farmacêuticos que revisaram a prescrição médica não estavam integrados à equipe de saúde,
não tiveram envolvimento direto com o atendimento ao paciente e não participaram das
rondas nas enfermarias. Muitos resultados das intervenções farmacêuticas não
contabilizadas por não haver evidencias na prescrição de alterações durante o processo de
preparo e administração do medicamento.
Outros estudos relataram taxas de aceitabilidade significativamente mais altas e
acreditamos que a revisão da prescrição médica durante as reuniões clínicas, com a
participação do farmacêutico clínico na equipe de saúde, predispõe a isso e produz melhores
resultados em saúde (SILVA et al., 2015; LENSSEN et al., 2016). Isso enfatiza a
importância da detecção do PRM antes de distribuir o medicamento ao paciente,
promovendo a minimização dos danos resultantes do processo de medicação (RODRIGUES
et al., 2019; SEMCHAROEN et al., 2019), pois os alertas do sistema de computador
emitidos sem a revisão da prescrição médica não parecem suficientes para garantir a eficácia
das intervenções farmacêuticas (VERDOORN et al., 2018).
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Um ponto forte do presente estudo é o período de observação que permite a exclusão
do viés de sazonalidade devido às alterações das características das doenças durante o ano.
Uma das principais características do estudo foi a revisão de 100% das prescrições de
pacientes internados em todos as unidades de internamento, proporcionando assim uma
melhor compreensão do tamanho e extensão dos PRMs em uma unidade de saúde como um
todo, ao invés do que é fornecido por um estudo em populações específicas ou em
especialidades médicas.
Outro ponto forte da metodologia foi a adoção de padrões reconhecidos
internacionalmente para permitir uma comparação mais fácil dos resultados entre os estudos.
Nesse sentido, o sistema de classificação PCNE foi escolhido por sua aplicação frequente
em estudos que envolvem a identificação e categorização de PRM (FOROUGHINIA et al.,
2016; VIPREY et al., 2017; KIM et al., 2018; LEOPOLDINO et al., 2019) e por ser uma
ferramenta frequentemente utilizada na prática hospitalar (LAMPERT et al., 2008), embora
muitos outros sistemas de classificação de PRM tenham sido propostos (BASGER et al.,
2014). Encontramos poucos estudos na literatura em que intervenções farmacêuticas foram
realizadas por meio de comunicação escrita aos profissionais de saúde, atuando como um
sistema de alerta; outros estudos tratam apenas de intervenções feitas verbalmente durante
as rondas nas enfermarias.
A principal limitação deste estudo foi não poder incluir reações adversas, consideradas
como PRM, e erros de dispensação e erros de administração de medicamentos, que são
considerados causas de PRM. Outras limitações quanto à extrapolação dos resultados são a
condução do estudo em um único hospital, embora em muitos aspectos compartilhe uma
série de características comuns aos hospitais em todo o mundo. Estas características incluem
ser um hospital geral de ensino de médio porte de atendimento terciário no sistema público
de saúde, de grande importância para a região onde está localizado, com escassez de recursos
nos níveis de infraestrutura, humano e financeiro, que correspondem à realidade da grande
maioria dos hospitais públicos do mundo.
Pesquisas futuras neste tópico devem procurar avaliar a frequência de PRM manifesto,
seus resultados, seu impacto nos custos hospitalares, bem como a identificação de fatores de
risco para PRM em potencial e o desenvolvimento de instrumentos de estratificação de risco
para PRM em potencial e/ou que tenha requerido intervenção farmacêutica.
De acordo com os resultados deste estudo, uma parte significativa de PRMs pode ser
evitada. É possível que a inefetividade terapêutica relacionada à inadequação no processo de
uso seja minimizada por meio de treinamento constante das equipes de saúde, principalmente
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em relação ao uso racional de antimicrobianos, resultando em menor custo e menor
ocorrência de resistência bacteriana. O acesso à literatura atualizada e de qualidade sobre
medicamentos, além de sistemas informatizados de apoio a decisão clínica e emissão de
alertas durante a elaboração das prescrições provavelmente diminuiriam a incidência de
PRMs relacionados à efetividade terapêutica, o mais frequentemente observado. Também é
provável que a inclusão de farmacêuticos clínicos como membros da equipe de saúde
contribua para uma diminuição significativa da incidência de PRM em potencial.
4.2.1.7 Conclusão
Problemas relacionados a medicamentos detectados pelos farmacêuticos hospitalares
durante a revisão de 100% das prescrições médicas ocorre em uma proporção significativa
dos episódios de admissões hospitalares, sendo os mais frequentes relacionados à efetividade
e custos com o tratamento, sendo as causas mais comuns a inadequações no processo de uso
e a duração do tratamento. Os medicamentos mais envolvidos foram cefalosporinas,
penicilina, anti-dispépticos, analgésicos, antipiréticos, opióides e antieméticos. A taxa de
aceitação de intervenções farmacêuticas por meio de comunicação escrita à equipe médica
foi relativamente baixa quando comparado a intervenção durante as rondas médicas nas
enfermarias.
4.1.3 Estudo II - Fatores de risco para problemas relacionados a medicamentos
Os objetivos do estudo II foram identificar fatores de risco para a ocorrência de PRM
em pacientes internados nas clínicas médica e cirúrgica, desenvolver e validar um modelo
preditivo de estratificação de risco para ocorrência de PRM durante o internamento. Esse
estudo deu origem ao artigo Risk factors for drug-related problems in a general hospital: a
large prospective cohort, aceito para publicação no periódico PLoS ONE, cujo fator de
impacto é 2.78, Qualis A1.
4.1.3.1 Procedimentos metodológicos
Estudo de coorte observacional prospectiva realizado no Hospital Universitário
Onofre Lopes, um hospital público de Natal, Rio Grande do Norte, Brasil, que foi aprovado
pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição com o número de aprovação 1.439.845.
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Todos os pacientes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido e não foram
oferecidos incentivos aos participantes.
Para evitar viés devido à sazonalidade, a inscrição dos pacientes prosseguiu sem
interrupção por 2 anos, de maio de 2016 a maio de 2018. Os critérios de inclusão foram:
pacientes com 18 anos ou mais de idade, de ambos os sexos, que foram hospitalizados por
mais de 24 horas nos departamentos de nefrologia, urologia, cardiologia, cirurgia (geral,
neurológica, cardiovascular e oncológica), endocrinologia, reumatologia, neurologia,
gastroenterologia e psiquiatria e que receberam pelo menos um medicamento. Foram
excluídos os pacientes admitidos apenas para fins de diagnóstico, em tratamento
quimioterápico, transplantados, gestantes e internados em unidade de terapia intensiva.
Para obter o tamanho da amostra distribuído uniformemente durante o período de
acumulação definido para dois anos, foi obtida uma amostra aleatória de pacientes,
inscrevendo-se no estudo todos os pacientes elegíveis admitidos em dois dias diferentes
(consecutivos ou não) de cada semana de estudo. A lista de randomização dos dois dias em
cada semana do estudo em que ocorreria a inscrição do paciente foi preparada antes do início
do estudo, usando um gerador de números aleatórios.
Todos os pacientes incluídos na coorte do estudo foram acompanhados durante toda
a internação, desde a admissão até a alta ou óbito. Os potenciais PRM foram detectados pela
revisão diária de 100% das prescrições de medicamentos distribuídas igualmente por grupos
de 3 farmacêuticos/dia, de um total de 21 farmacêuticos hospitalares. Embora o hospital
possua um prontuário eletrônico e um sistema informatizado de prescrição de medicamentos
(sem um sistema de alerta integrado), apenas este último foi inspecionado para a detecção
de PRM. Cada PRM potencial identificado pelos farmacêuticos foi então classificado por
um farmacêutico clínico com 9 anos de experiência utilizando o sistema de classificação da
Pharmaceutical Care Network Europe (PCNE versão 6.2), de acordo com o tipo de
problema e suas causas.
Em caso de dúvida na classificação precisa, outro farmacêutico com mais de 10 anos
de experiência foi consultado e uma decisão consensual foi tomada. Nenhuma avaliação de
reações adversas e erros de dispensação foi feita porque o método de detecção de PRM
potencial baseado exclusivamente na revisão da prescrição de medicamentos não forneceu
dados para verificar tais problemas. Todos os PRM potenciais identificados foram
subsequentemente relatados à equipe de saúde através de formulário padrão em uso no
hospital para esse fim, denominado “Comunicado Farmacêutico à equipe de saúde”.
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Os dados demográficos e clínicos dos pacientes foram coletados de todos os
pacientes admitidos nas clínicas médicas e cirúrgicas, bem como os dados de prescrição no
primeiro e no segundo dia de internação. A identificação do PRM potencial foi realizada por
farmacêuticos do serviço de farmácia do hospital e os dados dos pacientes coletados por
estudantes de farmácia.
4.1.3.2 Variáveis
Variáveis do paciente:
Idade, sexo, raça, peso, altura, sinais vitais, índice de massa corporal (IMC);
Tipo de admissão (médica, cirurgia eletiva ou cirurgia de emergência);
Hospitalização nos últimos 12 meses;
Comorbidades (índice de comorbidade de Charlson) (ANEXO B);
Classificação Internacional de Doenças versão 10 (OMS - CID 10) capítulo
de diagnóstico principal;
Dados laboratoriais disponíveis no prontuário no memento da coleta dos
dados (hemoglobina, leucócitos, creatinina sérica, albumina sérica, alanina
aminotransferase e gama-glutamil-transpeptidase).
Variáveis do medicamento:
Número de medicamentos prescritos (classificado pelo grupo terapêutico do
Anatomical Therapeutic Chemical Code - ATC);
Tipo de medicamento;
Via de administração;
Interação medicamento/medicamento;
Interação medicamento/alimento;
Incompatibilidade medicamentosa.
4.2.2.3 Análise Estatística
O tamanho da amostra foi definido em 1800 pacientes, o que proporcionaria um
poder de 70% no nível de significância bicaudal de 5% para identificar fatores de risco para
PRM com uma razão de chances maior que 1,3 em variáveis com uma prevalência de 5%, e
com odds ratio maior que 1,15 nas variáveis com prevalência de 20%.
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O Stata 15 (Stata Corporation, College Station, TX, EUA) foi utilizado em todas as
análises. Todas as variáveis preditivas contínuas foram dicotomizadas através da construção
de curvas ROC (características operacionais do receptor) para cada uma e, em seguida,
selecionando como ponto de corte o valor correspondente a uma sensibilidade e
especificidade aproximadamente iguais para a ocorrência de um ou mais PRM.
Para a identificação dos fatores de risco para PRM, usamos regressão logística
univariada para testar a associação entre uma variável binária dependente, codificada como
0 (zero), se nenhum PRM foi observado em um paciente, e 1 (um), caso contrário, com cada
variável demográfica e clínica coletada na admissão e os dados do medicamento coletados
no primeiro e segundo dias de internação.
Apenas variáveis que ocorreram em mais de 5% dos pacientes foram analisadas. As
variáveis nas quais o teste do coeficiente de regressão produziu um valor p maior que 0,20
foram consideradas não associadas. Na tentativa de derivar um modelo preditivo que pudesse
ser usado como uma ferramenta de estratificação de risco para PRM em pacientes
hospitalizados em um hospital geral de assistência terciária, a população do estudo foi
dividida aleatoriamente na proporção de 2: 1 em uma amostra de treinamento e uma amostra
de validação.
Utilizando a amostra de treinamento, as variáveis identificadas na análise univariada
anterior foram inseridas em um modelo de regressão logística multivariada, usando um
método de seleção de variável para trás, mantendo apenas as variáveis preditoras associadas