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Entrevista de Carlos Eduardo Amaral a João Roque Dias. Revista CONTINENTE (Pernambuco, Brasil) de 3 de Janeiro de 2013

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Page 1: E NÃO PRECISAMOS

Especial

Por Carlos Eduardo Amaral

Qui, 03 de Janeiro de 2013 19:06

Não pedimos, não queremos e não precisamos O  engenheiro mecânico  lisboeta  João  Roque  Dias  atua  em  tradução  técnica  há  25  anos, vertendo textos do francês, do espanhol e especialmente do inglês para o português europeu. Certificado  pela  Associação  Americana  de  Tradutores,  João  Roque  especializou‐se  na literatura  técnica  de  vários  campos  da  Engenharia:  maquinários,  instalações,  sistemas, construção naval e civil, petróleo e gás, logística, defesa militar, agricultura e outros. Em seu site pessoal, um espaço significativo é destinado à militância contra o Acordo Ortográfico de 1990, a exemplo da Biblioteca do desacordo, em que reúne artigos contra o AO 1990. Por essa razão, conversamos via e‐mail com o  tradutor, para que ele apresentasse aos brasileiros os argumentos que defende.   CONTINENTE:  O  senhor  vê  o  Acordo  Ortográfico  de  1990  como  uma  iniciativa  política elaborada pelo Brasil para exercer sua  influência no nível  internacional? A discussão sobre a formatação do AO não teria sido estritamente um problema normativo a ser resolvido pelas academias de letras dos países lusófonos, dado que se arrasta há 100 anos e, portanto, é bem anterior ao protagonismo que o Brasil assumiria no cenário mundial? JOÃO  ROQUE DIAS: Não!  Como  escreve  o  prof.  Fernando  Venâncio  no  seu  artigo  Acordo Ortográfico  –  visita  guiada  ao  reino  da  falácia,  tudo  começou  em  Coimbra,  Portugal,  em 1967, quando um grupo de académicos  se  lembrou de que a escrita da  Língua Portuguesa devia ser unificada. Não apresentaram argumentos e, muito menos, estudos que suportassem tal  necessidade  e,  acima  de  tudo,  sobre  as  vantagens,  os  benefícios  e  os  custos  de  tal “unificação”.  Sobre  o  facto  de  o  Brasil  ter  adoptado,  em  1915,  a  Reforma  Ortográfica portuguesa de 1911 e, depois, a  ter  rejeitado em 1919, nem uma palavra dos académicos. Sobre o facto de o Brasil ter decidido, desde há mais de um século, e com total razão, tomar, nas suas mãos, a definição e uso de uma ortografia própria, cada vez mais distante da matriz original do Português, também nem uma palavra dos académicos. Sobre o  facto de o Brasil ter assinado com Portugal a Convenção Ortográfica Luso‐Brasileira de 1945  (COLB45), a  ter adoptado em 5 de dezembro de 1945, três dias antes da sua adopção em Portugal, e de a ter rejeitado 10 anos depois, em 21 de Outubro de 1955, os académicos de Coimbra também não tiveram nenhuma palavra, e não  souberam  ler os  claros  sinais da História. Mais  tarde, em 1986, quando uma primeira versão de um acordo ortográfico viu a luz do dia, o seu destino só podia ser o que foi: o caixote do lixo. 

Page 2: E NÃO PRECISAMOS

CONTINENTE: Há algum ponto do AO que o senhor julgue pertinente ou plausível? JOÃO ROQUE DIAS: Pertinente, como um todo, não! Porque, como disse o professor António Emiliano:  “Não,  obrigado. Não  pedimos,  não  queremos,  e,  sobretudo,  não  precisamos”.  A primeira  das  21  bases  do  acordo,  sobre  as  letras  do  alfabeto  e  os  nomes  próprios estrangeiros, podia ser útil, mas com correcções. É que, a letra W tem (no AO 1990) o nome de ‘dábliu’, designação brasileira desconhecida em Portugal onde se usa ‘duplo vê’ e ‘dâblio’, designações agora suprimidas”. A base II, sobre o H inicial, também pode ser utilizada, mas é completamente inútil como texto normativo, face ao uso da língua escrita em Portugal.  CONTINENTE: A despeito da resposta anterior, o senhor acha que a unificação ortográfica é um problema insanável, mesmo com os resultados satisfatórios obtidos no universo de língua hispânica, por exemplo, que abrange um universo de 22 academias (contra duas da CPLP)? JOÃO  ROQUE  DIAS:  A  desunião  ortográfica  é  um  factor  de  riqueza  cultural  e  satisfaz portugueses e brasileiros. A unificação ortográfica é um problema que o AO 1990 introduziu e se propôs resolver, oficializando o desacordo ortográfico. Em 1945, a ortografia portuguesa ficou unificada a 100% pela COLB45. O Brasil  rejeitou esse acordo, 10 anos depois de o  ter aceitado. Face a essa rejeição, não há unificação possível, o que aliás faz todo o sentido face à enorme divergência linguística (fonético‐fonológica) entre as línguas de Portugal e do Brasil.  CONTINENTE: De toda forma, os países hispânicos chegaram a uma solução satisfatória... JOÃO  ROQUE  DIAS:  Sobre  o  universo  hispânico,  devem  pronunciar‐se  os  falantes  do espanhol.  A  desunidade  das  ortografias  brasileira  e  euro‐afro‐asiático‐oceânica  não  é  um problema ou facto negativo. É a realidade. As coisas são como são. Deve reconhecer‐se que a língua  franca mais  utilizada  em  todo  o mundo,  o  inglês,  nunca  teve  acordos  ortográficos, porque nunca precisou deles. E que, nas Nações Unidas, a ortografia adoptada é a variante britânica com a ortografia de Oxford.   CONTINENTE:  A  suposta  tendenciosidade  pró‐brasileira  do  AO  1990,  alegada  por  alguns portugueses, não é um equívoco interpretativo? JOÃO ROQUE DIAS: O AO 1990  resulta num  insuportável e  inaceitável abrasileiramento da ortografia  portuguesa,  por  causa,  entre  outras  medidas,  da  supressão  das  chamadas consoantes mudas:  se  uma  quantidade  enorme  de  palavras  de  uso  frequente  se  passa  a grafar como no Brasil, é óbvio que tal facto é interpretado pela população portuguesa como um abrasileiramento da sua escrita. 

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Fonte original http://www.revistacontinente.com.br/index.php/component/content/article/7838.html Publicado na Biblioteca do (Des)Acordo Ortográfico a 8 de Janeiro de 2013 http://www.jrdias.com/acordo-ortografico-biblioteca.htm Subscreva a Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico http://ilcao.cedilha.net/docs/ilcassinaturaindividual.pdf