ebook arq.futuro 2012

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24 + 25 de setembro são paulo 2012

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O Arq.Futuro São Paulo 2012 aconteceu entre os dias 24 e 25 de setembro daquele ano. O programa teve a presença de dez participantes, entre palestrantes e mediadores, e focou na discussão sobre o crescimento da metrópole. Os temas foram variados, abordando desde a questão da habitação social e de como construí-la até a criação e manutenção de novos espaços públicos para cultura e lazer, além do papel desempenhado pela tecnologia nas cidades. A presente publicação abordará todos esses eventos, detalhando, as biografias e os principais projetos dos palestrantes, e destacando trechos de suas falas especialmente interessantes para entrar em contato com seus pensamentos.

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24 + 25 de setembrosão paulo 2012

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Além disso, o Arq.Futuro promoveu uma sessão especial apenas para convidados, realizada no Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper). Às vésperas das eleições municipais, dois dos principais candidatos à prefeitura da maior cidade brasileira, José Serra e Fernando Haddad (eleito em outubro), apresentaram suas propostas de mobilidade urbana, tema principal da noite. Ao fim, um debate com as participações de Thaddeus Pawlowski, Alejandro Aravena, Marcos Lisboa, Claudio Haddad, Philip Yang e Sérgio Magalhães, mediado por André Corrêa do Lago, relacionou problemas e soluções ligados à densidade urbana e ao sistema de transportes (veja seção final) – esse debate deu origem ao livro São Paulo na encruzilhada: uma discussão sobre mobilidade e adensamento.

A presente publicação abordará todos esses eventos, detalhando, as biografias e os principais projetos dos palestrantes, e destacando trechos de suas falas especialmente interessantes para entrar em contato com seus pensamentos.

O Arq.Futuro São Paulo 2012 aconteceu entre os dias 24 e 25 de setembro daquele ano. O programa teve a presença de dez participantes, entre palestrantes e mediadores, e focou na discussão sobre o crescimento da metrópole.

Os temas foram variados, abordando desde a questão da habitação social e de como construí-la até a criação e manutenção de novos espaços públicos para cultura e lazer, além do papel desempenhado pela tecnologia nas cidades.

Carlo Ratti e Thaddeus Pawlowski abriram o evento, em uma sessão chamada “Tecnologia e o futuro das cidades”. Depois de suas palestras participaram juntos de um debate mediado por Karen Stein e Philip Yang. O segundo dia foi aberto pela dupla de arquitetos Tod William e Billie Tsien, seguida por Angelo Bucci – o tema geral foi “Espaços públicos e centros de cultura e lazer”. O debate que uniu os três foi mediado novamente por Karen Stein, desta vez acompanhada por André Corrêa do Lago. Por fim, houve as palestras de Alejandro Aravena e Isay Weinfeld, seguidas do debate “Habitação social e projetos imobiliários”, que também incluiu Otávio Zarvos e Fernando de Mello Franco.

APRESENTAÇÃO

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a cidade em relação ao corpo humano, tentando entender qual é o espaço físico da cidade e como ele se relaciona com nossa experiência humana.”

“São Paulo e Nova York me pareceram muito similares, na energia e na personalidade das ruas. Ambas são cidades grandes e ambas atraem as pessoas mais brilhantes, ambiciosas e incrivelmente diversificadas. Temos que trabalhar para garantir que a cidade acomode todas elas.”

“Toda viagem começa e termina com alguém caminhando, então, fazer a cidade funcionar para pedestres é o desafio mais importante para os transportes.”

“Este é nosso slogan: ‘Pessoas em primeiro lugar, bicicletas em segundo’.”

“Em Nova York dizemos às vezes que os habitantes amam seus bairros tanto quanto amam suas famílias, ou mais. Nos identificamos mesmo com nossos bairros.”

“Acho que há algumas leis e práticas em São Paulo que vão contra a criação de calçadas melhores para andar. Elas muitas vezes margeiam uma parede em branco virada para a rua. É importante que quem

Um dos urbanistas mais experientes da atualidade, Thaddeus Pawlowski trabalha no Departamento de Planejamento da Cidade de Nova York, onde foi responsável por projetos de recuperação e reurbanização. Sua experiência também passa pelas áreas de prevenção contra catástrofes climáticas – mesmo antes da chegada do furacão Sandy, que atingiu a costa norte-americana em outubro de 2012, já se dedicava a planejar novas formas de design que possam proteger os habitantes e os locais mais vulneráveis. Tanto em projetos de infraestrutura de larga escala quanto nas adaptações arquitetônicas contra as mudanças climáticas, Thaddeus, formado em arquitetura e design urbano pela Universidade da Pensilvânia, trabalha em colaboração com artistas e ecologistas. Em 2011, participou de um projeto de intercâmbio de experiências entre Nova York e São Paulo, colaborando com a SP Urbanismo e a Cohab.

“A tecnologia tem grande relação com design, mas temos de ter cuidado para não sermos escravizados por ela e questionar sempre o que ela fará por nossas cidades e como podemos direcioná-la.”

“Antes de mais nada, ouvimos, encontramos pessoas e aprendemos o que é importante para elas: isso é a coleta de dados. Coletamos dados e medimos

THADDEUS PAWLOWSKI

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uma tempestade na costa poderia causar em Nova York, e um furacão de categoria 3, como o que atingiu Nova Orleans, poderia causar muito prejuízo. Trabalhamos com o Escritório de Gerenciamento de Emergências para desenvolver planos de como a cidade se recuperaria de algo assim. Então convidamos a comunidade de design para pensar em ideias de habitação pós-desastre, para se tivéssemos um dia que substituir uma porção significativa das habitações depois de um furacão.”

“Estamos trabalhando com Eric Sanders, um grande ecologista que quer usar um modelo algorítmico de Manhattan para simular o que pode acontecer nos próximos 500 anos. Ele está convidando todos que sabem usar a internet para entrar no site e manipular suas quadras de forma a maximizar a produtividade ecológica. Isso envolve um entendimento tanto do que está aqui hoje quanto do que estava no passado, e da capacidade de sucesso em termos de ecologia para criar um lugar melhor para se viver e uma cidade mais produtiva.”

“E a última observação que quero fazer é sobre transparência. Temos de ter o cuidado de constantemente olhar para trás para garantir que o que estamos fazendo faz sentido, e para nos avaliar.”

está andando tenha uma experiência de pedestre contínua e variada, o que quer dizer que a calçada leva a algum lugar e você pode seguir esse caminho, e conforme você anda nele algo diferente acontece, de modo a manter seu interesse. Isso é algo que acontece naturalmente em densidades médias e altas, mas às vezes, em São Paulo, mesmo nessas densidades, vemos paredes em branco e espaços mortos no nível do chão.”

“O modernismo brasileiro produziu alguns dos melhores prédios do mundo, mas não algumas das melhores cidades. E talvez seja o momento agora de repensar quão importante é a mão dos arquitetos no processo de construção das cidades. Como tratar alguns desses grandes prédios de forma que eles pareçam integrados à cidade? [...] Para fazer projetos muito complexos, como a Nova Luz ou alguns dos nossos projetos em Nova York e em outros lugares do mundo, é preciso passar por um processo de realmente escutar os envolvidos, escutar o que a comunidade imagina para o futuro, e integrar isso no processo de design.”

“Outra forma de pensar no planejamento dos bairros é olhar para cenários extremos e ver o que na cidade é mais importante em tempos de grandes adversidades. Estudei durante muitos anos o que

THADDEUS PAWLOWSKI

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itens de lixo, de 500 pessoas em Seattle. E aí co-meçamos a segui-los. Houve uma grande surpresa: quão longe as coisas viajam. É algo que mesmo um dos nossos parceiros no projeto, uma das maiores empresas de administração de lixo no mundo, não esperava. Todo mundo conhece uma pequena parte da cadeia, mas foi a primeira vez que toda a rede foi rastreada. Vejam algum dos caminhos loucos, indo até Chicago, depois para a Califórnia, ainda viajan-do depois de dois meses.”

“Como engenheiro, você pode pegar essa infor-mação e projetar um sistema melhor. Você pode usar isso para redesenhar o sistema de administra-ção do lixo e fazê-lo ser mais eficiente.”

“Essa quantidade enorme de dados pode promo-ver mudanças de comportamento e se tornar uma forma incrível de modificar o planejamento e a for-ma como reagimos à escala urbana.”

“Tudo isso está basicamente mudando a intera-ção entre nós e o ambiente externo, e esse sempre foi o objetivo da arquitetura. Em um dos projetos que fizemos no escritório, na Itália, pensamos em como projetar um espaço que normalmente é puro, simples, uma casa. Mas estávamos interessados em usar um projetor que, quando colocado em um pon-

O trabalho do arquiteto italiano Carlo Ratti no MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets), onde dirige o SENSEable City Laboratory, é um exemplo notável de como a tecnologia pode estar a serviço da vida urbana. O centro estuda o ambiente das cidades por meio de sensores que monitoram des-de os sistemas de descarte de lixo até os planos de rua. A vida profissional de Ratti, porém, não se restringe a essa pesquisa – ele é também membro do World Economic Forum Global Agenda for Ur-ban Management e diretor do Strelka Institute for Media, Architecture and Design, em Moscou, além de ter seu escritório, o Carlo Ratti Associatti. Sua palestra foi uma amostra de como a tecnologia pode criar coisas novas em arquitetura e em de-sign urbano, e como a coleta de dados é essencial para planejar melhores prédios e cidades.

“Sensoriamento e atuação são na verdade a base de todo sistema dinâmico.”

“Toda essa informação que coletamos está fa-zendo nosso meio falar com a gente, responder de forma mais dinâmica.”

“Bem, e se pudéssemos colocar um pequeno chip no lixo e começar a ver o que acontece quando o jo-gamos fora? Este foi nosso primeiro projeto: 3.000

CARLO RATTI

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“Há um lado da tecnologia que nos permite ser muito mais livres na forma como trabalhamos. Pense em como era há cinco ou dez anos, quando estávamos presos a uma mesa. E em como hoje podemos ser muito mais flexíveis, muito mais móveis. Isso nos permitiu reutilizar pátios que são Patrimônio Mundial da Unesco, como o Hospicio Cabañas, e reinterpretá-los de forma moderna, transformando-os em uma forma de trabalhar do lado de fora e de dentro simultaneamente [no projeto Ciudad Creativa Digital, desenvolvido em Guadalajara, México].”

to, permite que se transforme todas as superfícies em volta em superfícies de projeção.”

“O prefeito de Zaragoza nos procurou antes da World Expo, cujo tema era água. A água tem sido um belo componente da arquitetura, em todo o mundo e especialmente no sul da Europa. Podemos usá-la de outra forma hoje? Uma das ideias que surgiu foi: imagine que você tem um cano e várias válvulas, várias torneiras, abrindo e fechando con-troladas pelo computador. Você pode criar uma parede, você pode escrever, criar buracos, padrões... Você também pode fazê-la ser interativa, de modo que quando você se aproxime da parede, ela se abra para deixar você passar. Essa foi nossa ideia inicial. [...] Conseguimos autorização para projetar o pavi-lhão de entrada da World Expo, todo feito de água. Quando você se aproxima, não há portas ou janelas, mas ele se abre para você entrar. E quanto está den-tro, todas as paredes se expandem ou encolhem de acordo com as pessoas. O telhado é coberto tam-bém por uma fina camada de água.”

CARLO RATTI

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“Acreditamos que nossos prédios têm uma relação muito forte com a natureza que os cerca. Outra coisa em que pensamos quando criamos nossa arquitetura é tentar fazer um prédio que se revele lentamente. Muitas vezes queremos que as pessoas entrem e passeiem pelo espaço, e voltem várias vezes para conhecer lentamente o prédio, em vez de fazer algo que se entenda imediatamente.” – Billie Tsien

“Acho que uma lição importante para os prédios públicos é que eles precisam ser quentes. Queremos em nossas vidas uma sensação de calor, e não há motivo para a arquitetura não fornecer esse senso de calor e de detalhamento. Não é algo que precisa ficar a cargo só dos decoradores ou dos usuários. Ao mesmo tempo, há o desejo de fazer algo sólido, que dure.” – Tod Williams

“Um homem ligou da Índia com uma proposta de projetarmos um campus em Bombaim. Achamos ridículo, porque nunca tínhamos projetado um campus antes, nunca tínhamos ido à Índia antes. Eu disse: por que nós? O que podemos trazer ao seu mundo? E finalmente fomos levados ao presidente da empresa, um homem incrível que estudou arquitetura e acredita que é uma das grandes disciplinas por meio das quais podemos entender

Em sua palestra, os arquitetos nova-iorquinos Tod Williams e Billie Tsien revelaram o que os inspira e como desenvolvem um projeto, trabalhando de perto com uma ampla gama de participantes: de clientes e construtoras a artistas e paisagistas. Descrevendo a arquitetura como um esforço colaborativo, eles chamam de “família” os seus cerca de 25 colegas de escritório. Ao longo de toda a palestra, eles alternaram as falas, auxiliando e enriquecendo as observações um do outro, enquanto forneciam informações a respeito de suas quatro décadas de parceria na arquitetura

– vozes individuais com uma visão coletiva. Além de discutir os temas que mais lhes interessam, eles se concentraram em apresentar uma seleção de projetos-chave em suas carreiras: o Folk Art Museum e o David Rubenstein Atrium no Lincoln Center, em Nova York; um edifício que abriga a piscina da Cranbrook Academy of Art, em Michigan; o Center for Advancement of Public Action na Bennignton College, em Vermont; um novo campus para a Tata Consultancy Services, nos arredores de Mumbai; e a recentemente concluída, e muito celebrada, nova Barnes Collection, na Filadélfia.

“A arquitetura tem sempre de estar conectada à terra e a um senso de lugar na terra.” – Tod Williams

TOD WILLIAMS E BILLIE TSIEN

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haver uma forma de usar o padrão de um tecido Kente, fazendo um tecido de pedra que envolvesse o prédio. Só precisávamos achar a pedra certa. Vimos pedras americanas, mas acabamos achando uma em Israel que era perfeita, barata e durável o suficiente. Precisamos ver como as pedras eram cortadas, como seriam manuseadas, qual seria o melhor uso, e acabamos fazendo várias viagens ao deserto de Neguev onde estava essa pedreira, para entender tudo isso.” – Tod Williams e Billie Tsien.

“Finalmente voltamos às mãos. Precisamos honrar as pessoas que fazem nossas obras, e perceber que são as mãos que guardam a vida e são instrumentos para os prédios. É com o interior que nos preocupamos mais. No fim, acreditamos que a arquitetura tem a ver com as coisas em que tocamos e as pessoas que amamos.” – Tod William e Billie Tsien.

e apreciar o mundo. E ele nos disse que havia três coisas de que ele gostava em nossa obra: a primeira era que respeitamos a natureza – e é verdade; e a segunda era que gostávamos da cultura de materiais, e na Índia, ele disse, há uma grande e rica cultura de materiais – e gostamos mesmo, fiquei feliz em ouvir isso. E finalmente ele disse: vocês não têm uma assinatura que os precede; em outras palavras, não vêm com um objeto pré-desenhado, em vez de estar interessados em descobrir o que podem fazer em nosso país.” – Billie Tsien e Tod Williams.

“Quando pensamos no que o prédio [a Barnes Collection] deveria ser, pensamos sobre a coleção. Barnes foi um dos primeiros colecionadores de arte africana, e achava que essa era uma parte muito importante do acervo. Então começamos a procurar tecidos africanos, e pensamos que podia

TOD WILLIAMS E BILLIE TSIEN

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faça uma exposição dentro do túnel trancado que nunca pôde ser aberto.”

“Se olharmos as condições de quando a cidade foi fundada em 1554, se via uma necessidade de implantar a cidade num sítio protegido. Naturalmente, a parede de 20 metros de altura que separava o vale do Tamanduateí e a garganta de 20 metros de profundidade do Anhangabaú fazia desse um sítio muito protegido, e uma cidade que se fundava ali era como que murada naturalmente.”

“Quando a gente começa a olhar para a geografia e a história da cidade vai se consolidando uma certa cultura construtiva que ganha sentidos muito particulares.”

“Gostamos muito de comparar São Paulo com o Rio de Janeiro, e estamos descobrindo que somos iguais. Mas no sentido dessa apropriação da geografia, tudo o que em São Paulo foi expulso ladeira abaixo, no Rio foi expulso morro acima. Então, do ponto de vista da distribuição ou da segregação social, São Paulo é o Rio de Janeiro de ponta-cabeça.”

“Prestes Maia tinha um modelo de cidade que ele queria aplicar sobre São Paulo. Ele via nosso futuro

A arquitetura sustentável e verde é uma das premissas do trabalho do arquiteto Angelo Bucci, que se formou em Arquitetura e Urbanismo na Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo (FAU-USP), onde hoje leciona, e é diretor do escritório SBPR Arquitetos, que realiza projetos no Brasil e no exterior. Entre os prêmios que recebeu estão o Prêmio Holcim de Arquitetura Sustentável, pelo projeto da midiateca da PUC-RJ, e o Prêmio Jovem Geração da Bienal de Arquitetura de Buenos Aires. Além de falar sobre seus projetos para concursos de clientes privados, Angelo abordou durante sua palestra questões urbanísticas como a formação de São Paulo em relação às suas condições geográficas e as construções quase desconhecidas, a exemplo de túneis não abertos existentes no subsolo paulistano – o que o arquiteto chama de “reminiscências”. As combinações de tudo o que existe em São Paulo, para ele, formam a metrópole hoje, e é o que podemos usar para construir nossos espaços urbanos atuais.

“Dizem que nós somos o que somos. Mas nós também somos o que não fomos, e no caso dos edifícios acho que isso é muito verdadeiro. [...] Um dia talvez venha um artista aqui, para uma Bienal, e

ANGELO BUCCI

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dia colocava muita luz na parte mais escura deste edifício. Era uma estrutura em treliça de aço, com dois apoios. E o edifício tem uma relação com o piloti do prédio principal da PUC, por onde se faz a entrada. Se caminhamos pra cá, esse prédio tem 100 metros de comprimento, e encontra o chão outra vez. O prédio tem um embasamento para a coleção de livros, que não é de livre acesso. É como se fosse um aquário fechado. Amortizamos muito a temperatura interna, tornando mais fácil o controle de temperatura e umidade que tinha de ser mantido 24 horas por dia.”

“Fizemos uma igreja numa cidade do México, Culiacán, que tinha como assunto a natividade. Nós a construímos com três elementos geradores, como se fosse uma representação dessa trindade. E a forma parece livre, mas as paredes são idênticas, e cada uma delas se apoia em dois pontos, e cada ponto está distanciado em 20 metros. Então a igreja fica protegida.”

como uma Paris de cem anos antes da década de 1940. Mas se a gente olha para o que são as plantas dos rios, isso se aproxima muito mais de Viena, Berlim, das cidades muradas.”

“Havia uma força nesse lugar, que era conter ao mesmo tempo duas escalas: a escala de um recinto, que se chama Anhangabaú e se reconhece como uma localização geográfica, e que depois se destaca ainda mais com a construção dos edifícios; e uma escala metropolitana, que era dada principalmente por ser passagem obrigatória de quase todo o sistema viário.”

“A midiateca da PUC-Rio é um edifício aberto para as fachadas Norte e Sul, com a decisão de fechar as fachadas mais castigadas pelo sol, Leste e Oeste, para controle de temperatura. Para iluminar o prédio, fizemos como que uma lanterna de luz natural, uma varanda colocada lá dentro, com vidro, piso branco e teto branco, que durante o

ANGELO BUCCI

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estratégicos podem melhorar a qualidade de vida sem ter de depender inteiramente da redistribuição de renda. Nós tratamos dessa dupla condição de cidades capazes de atrair ganhos, mas evitar conflitos ao mesmo tempo.”

“O que fizemos foi um edifício em altura, eficiente não apenas em termos de terreno, mas que também tem andares que não podem crescer. Os andares que podem crescer são o térreo e o último andar , que crescem horizontalmente ou em direção ao ar. Fizemos um edifício que tinha só o térreo e o último andar. Deixamos vãos no meio para que as famílias pudessem crescer.”

“Isto é importante: o papel do design. É preciso saber de política, economia e relações sociais, mas no fim um design é mais eficiente que outro.”

“Design não é fazer mais bonita a casa dos pobres. Na verdade, nosso projeto de casa é como uma caixa, mas posicionado de tal jeito que o uso estratégico da forma permita uma densidade suficientemente alta para pagar por localização, com possibilidades para cada família crescer, mas garantindo a valorização no futuro. Nós tentamos usar o conhecimento em arquitetura para resolver um problema relevante.”

O arquiteto chileno Alejandro Aravena é um dos fundadores da Elemental – uma companhia que trabalha para melhorar a qualidade de vida da população urbana de baixa renda por meio de eficientes modelos de construção de moradias de baixo custo, além de infraestrutura e projetos para espaços públicos. Durante a palestra, ele expôs os projetos sociais atualmente em desenvolvimento pela empresa. Após o tsunami no Chile, em 2010, Aravena envolveu--se nos esforços para reconstrução das áreas afetadas, particularmente em Constitución, uma cidade de 50.000 habitantes que foi quase inteiramente destruída e em Calama, de 150.000 habitantes. Em ambos os projetos, Aravena e seus colegas têm trabalhado lado a lado com grupos comunitários locais, discutindo opções e metas e defendendo um planejamento de longo prazo que trate de questões como qualidade de vida e sustentabilidade ambiental.

“As cidades têm uma dupla condição. Por um lado, são uma força capaz de atrair pessoas, conhecimento, riqueza, desenvolvimento. Ao mesmo tempo concentram o descontentamento social, em forma de pressão, como uma bomba-relógio. Mas elas têm uma capacidade de ser um atalho para a igualdade. Projetos urbanos

ALEJANDRO ARAVENA

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da natureza é inútil. Nossa proposta era ter uma floresta para proteger a cidade de futuros tsunamis. A ideia era que, contra forças geográficas, precisamos oferecer respostas geográficas. Achamos que em vez de resistir à energia do mar, tínhamos que dissipá-la introduzindo atrito.”

“O que se provou mais importante na segunda reunião [com a comunidade de Calama] foi discutir o que as pessoas achavam ser uma dívida histórica com a cidade. Ao georreferenciar tanto os projetos que haviam sido executados como os que nunca foram, o ceticismo e a raiva começaram a se dissolver. Ao reconhecermos pela primeira vez o que se considerava serem promessas quebradas, as pessoas sentiram que a discussão era honesta.”

“Em ambos os casos [Constitución e Calama] usamos o desenho urbano como uma força capaz de atrair pessoas, conhecimento e desenvolvimento. E em ambos os casos usamos o desenho urbano como forma de desarmar uma bomba-relógio social, tirando vantagem do potencial das cidades como atalhos em direção à igualdade.”

“Para pagar por terreno ou por estrutura, é preciso não dar, por exemplo, acabamentos, pintura, azulejos... Mas se as famílias mantêm o trabalho, elas mesmas vão finalizar. Há famílias com filhos, famílias maiores, famílias que querem trabalhar em casa, famílias que querem sublocar. O que se precisa atingir na ideia final é isto: densidade suficientemente alta para boa localização, mas em baixa altura para não ter que pagar por espaços coletivos que não tenham manutenção no futuro. Sem superlotação, mas com a possibilidade de crescimento.”

“Discutimos três alternativas para proteger a cidade [constitución] de tsunamis, algo inédito até então no urbanismo chileno. A primeira alternativa era proibir construções urbanas nas áreas afetadas. Essa alternativa era irreal e irresponsável. As pessoas, especialmente os pescadores, teriam se instalado no marco zero de qualquer jeito, mas informalmente, transformando a área em um desastre urbano. A segunda alternativa era construir uma enorme parede próxima ao rio para receber o impacto das ondas. O problema dessa alternativa era que tentar resistir às forças

ALEJANDRO ARAVENA

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arquitetura é um instrumento de construção de visões de mundo e de operação e de transformação desse mundo, a questão que se coloca é: diante dessas transformações, para onde a gente está levando a arquitetura?” – Fernando de Mello Franco

“Fui educado dentro de um sistema que começou com uma bifurcação de caminhos nos anos 1960 e 1970. Havia os arquitetos que pediram para a sociedade o espaço de liberdade criativa, a sociedade concedeu e eles desenvolveram um sistema de regras para produzir arquitetura, segundo as quais a arquitetura é avaliada. em pouco tempo, começou-se a ver que o risco dessa liberdade era o da irrelevância: fazer projetos com temas e problemas que só interessam a outros arquitetos. Outro caminho foi o daqueles que disseram: a nós interessam os problemas do mundo, os problemas duros, a pobreza, o desenvolvimento... E o preço que pagaram não foi, como os outros, o da irrelevância, porque os temas eram relevantes. Mas abandonaram o design, o projeto, a forma. Eu acho que o desafio hoje é tentar partir de fora da arquitetura, de problemas inespecíficos, que interessam a todo mundo e sobre os quais todo mundo pode opinar como cidadão: pobreza, segregação, violência, qualidade de vida...”

– Alejandro Aravena

O segundo dia do Arq.Futuro São Paulo 2012 culminou em um debate do qual participaram os palestrantes Alejandro Aravena (veja trechos da palestra na página XX) e Isay Weinfeld, arquiteto paulistano conhecido tanto por seus projetos de casas particulares quanto por empreendimentos comerciais. A eles se uniu o empreendedor imobiliário Otávio Zarvos, da Idea!Zarvos, além do arquiteto Fernando de Mello Franco e do diplomata e embaixador André Corrêa do Lago. A conversa girou em torno de temas que unem, de certa forma, todos os participantes: enquanto Aravena pôde discorrer mais sobre suas experiências em habitação social no Chile, os arquitetos e o administrador brasileiros pontuaram questões específicas, como a participação histórica do Estado como patrocinador da arquitetura brasileira e as atuais responsabilidades de governo e de investidores privados na promoção da qualidade urbana.

“Acredito que a arquitetura não resolve propriamente problemas, mas que ela fundamentalmente é uma forma muito específica de visão de mundo, e enquanto tal ela propõe formas de mundo. [...] Acredito que a arquitetura também está numa encruzilhada, porque o mundo está mudando. E a partir do momento em que a

debate: HABITAÇÃO SOCIAL E PROJETOS IMOBILIÁRIOS

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“Tem a responsabilidade pelo projeto do edifício, mas também pelo redesenho do espaço público. Por isso que quando começamos a trabalhar com habitação social, pensando só na parte residencial, era evidente que aos poucos íamos ter de também fazer alguma coisa com espaço público, infraestrutura, transporte... A cidade é essa concentração transversal, e não setorial, e tem de ser tratada com coordenação.” – Alejandro Aravena

“A gente não deve perder essa poesia que a arquitetura deve ter. Eu ainda continuo tendo isso, ainda entro em obras, em espaços que me fazem chorar. O nosso trabalho, na minha opinião, tem que fazer chegar essa poesia às pessoas. Tem que tocar as pessoas.” – Isay Weinfeld

“O papel do arquiteto no mercado imobiliário é absolutamente fragmentado. Ele toma conta hoje de uma parte tão pequena, que foi a que restou pra ele, que passa a ser sempre relegado nem para segundo, mas para quinto ou sexto plano. O arquiteto tem de se preparar hoje para entender de custos, de como se constrói um edifício, saber os materiais que vão dar problema, conhecer a legislação.” – Otávio Zarvos

“O poder público também é responsável; não apenas ele desincentiva qualquer qualidade melhor em projetos de arquitetura, que demoram muito mais para ser aprovados e são muito mais complexos, como também deveria passar a não mais apenas aprovar projetos lote a lote – ele tem de começar a pensar no mínimo quarteirão a quarteirão ou bairro a bairro.” – Otávio Zarvos

debate: HABITAÇÃO SOCIAL E PROJETOS IMOBILIÁRIOS

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na, e quando a população mundial chegar a entre 9 e 10 bilhões de pessoas, todo o crescimento vai ser no mundo em desenvolvimento. Então São Paulo, na realidade, tem muito mais importância do que parece, porque o Brasil é uma referência sob vários pontos de vista hoje, e no futuro São Paulo vai espelhar essa capacidade do Brasil ser contemporâneo.” – André Corrêa do Lago

“O que é específico das nossas cidades e do mundo em desenvolvimento é a desigualdade. Não dá para trazer qualquer modelo de outras realidades. Saber da desigualdade e da segregação da nossa população tem consequências enormes. Por exemplo o debate sobre se a cidade tem que solucionar o problema de mobilidade com metrô ou com ônibus. Países como os nossos não deveriam ter metrô. Países com menos de 30 milhões per capita não deveriam ter metrô porque não é socialmente rentável.” – Alejandro Aravena

“A discussão de modelo de cidade tende a ser muito ideológica [...] porque há exemplos de cidades boas grandes e cidades ruins grandes, cidades densas que são boas e cidades densas que não são. O que é especifico das nossas cidades e do mundo em desenvolvimento é a desigualdade.

” – Alejandro Aravena

O debate realizado no Insper (Instituto de Pesquisa e Ensino) abordou problemas e soluções específicos para a cidade de São Paulo, tendo questões centrais o adensamento e a mobilidade urbana. Com mediação de André Corrêa do Lago, Philip Yang, Claudio Haddad (vice-presidente do Insper), Sérgio Magalhães, Alejandro Aravena e Thaddeus Pawlowski não apenas emitiram suas opiniões, mas trouxeram exemplos práticos – como os de Nova York e de Santiago do Chile – para servir como inspiração à maior metrópole brasileira. Ainda que houvesse debates acirrados entre quem acredita no investimento sobre ônibus e quem defenda o metrô; ou entre os defensores da bicicleta como meio de locomoção e quem ache que ela não funcionaria em São Paulo, a conclusão foi uma só: a cidade precisa, urgentemente, rever suas práticas se quiser melhorar a qualidade de vida de seus habitantes. Dessa conversa surgiu o livro São Paulo na encruzilhada: uma discussão sobre mobilidade e adensamento (BE I Editora, 2013), que aprofunda tais questões ao desenvolver a visão de cada participante em entrevistas e em textos assinados por diversos especialistas.

“A América do Sul vai ser a região mais urbana do mundo em 2050, com 95% da população urba-

debate: MOBILIDADE E ADENSAMENTO

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“A pergunta que que se traduz de forma muito clara para São Paulo é: quais são as novas vocações que devemos encontrar para uma cidade que passa por uma transição tão radical como a nossa, que eu entendo como o momento de desconcentração industrial? “ – Philip Yang

“As questões de sustentabilidade e mudança climática têm sido duas prioridades para a administração de Nova York nos últimos dez anos. E concordamos que ela é um dos lugares mais sustentáveis do mundo por causa da densidade orientada para o transporte.” – Thaddeus Pawlowski

“As cidades hoje têm evidentemente grandes vantagens, agregam bastante valor, porque trazem uma coisa que chama densidade, o que leva à escala e faz com que você tenha diversidade de oportunidades, interação entre pessoas que leva à inovação e assim por diante. [...] E são os talentos que fazem as cidades se desenvolverem, são os talentos que levam ao crescimento econômico.” – Claudio Haddad

“O que há de comum nesse conjunto de grandes cidades brasileiras é um passivo socioambiental enorme, que precisa ser enfrentado de um modo muito incisivo, porque corresponde a um tempo democrático que estamos vivendo no qual já não se admitem mais s iniquidades e desigualdades que esse passivo apresenta. Entre outros elementos que compõem esse passivo está a carência de serviços públicos; e sobretudo são escassos na imensa maioria do território urbano que foi produzido pelas famílias mais pobres.” – Sérgio Magalhães

debate: MOBILIDADE E ADENSAMENTO

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