educação na floresta e sistemas agroflorestais
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PR-REITORIA DE PS-GRADUAO E PESQUISA
NCLEO DE PS-GRADUAO
EM
DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE
REA DE CONCENTRAO: DESENVOLVIMENTO REGIONAL
PROGRAMA REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE
EDUCAO NA FLORESTA: UMA CONSTRUO PARTICIPATIVA DE
SISTEMAS AGROFLORESTAIS SUCESSIONAIS EM JAPARATUBA, SERGIPE
Autor: Ana Paula Fraga Bolfe
Orientador: Dr. Edmar Ramos de Siqueira
Co-orientadora: Dra. Maria Augusta Mundim Vargas
AGOSTO - 2004
So Cristvo Sergipe
Brasil
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PR-REITORIA DE PS-GRADUAO E PESQUISA
NCLEO DE PS-GRADUAO
EM
DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE
REA DE CONCENTRAO: DESENVOLVIMENTO REGIONAL
PROGRAMA REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE
EDUCAO NA FLORESTA: UMA CONSTRUO PARTICIPATIVA DE
SISTEMAS AGROFLORESTAIS SUCESSIONAIS EM JAPARATUBA, SERGIPE
Dissertao de Mestrado apresentada ao Ncleo de Ps-Graduao
em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de
Sergipe, como parte dos requisitos exigidos para a obteno do
ttulo de Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente.
Autor: Ana Paula Fraga Bolfe
Orientador: Dr. Edmar Ramos de Siqueira
Co-orientadora: Dra. Maria Augusta Mundim Vargas
AGOSTO - 2004
So Cristvo Sergipe
Brasil
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FICHA CATALOGRFICA
ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
Bolfe, Ana Paula FragaB688e Educao na floresta: uma construo participativa de sistemasagroflorestais sucessionais em Japaratuba, Sergipe / Ana Paula FragaBolfe. -- So Cristvo, 2004.
160p.
Dissertao (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) Ncleo de Ps-Graduao em Desenvolvimento e Meio Ambiente,Programa Regional de Desenvolvimento e Meio Ambiente, Pr-Reitoriade Ps-Graduao e Pesquisa, Universidade Federal de Sergipe.
1. Educao. 2. Sistemas agroflorestais sucessionais Municpiode Japaratuba, SE. 3. Agricultura sustentvel. 4. Relaosociedade natureza. 5. Agricultura familiar. I. Ttulo.
CDU 37:633/635:630*234
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PR-REITORIA DE PS-GRADUAO E PESQUISA
NCLEO DE PS-GRADUAO
EM
DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE
REA DE CONCENTRAO: DESENVOLVIMENTO REGIONAL
PROGRAMA REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE
EDUCAO NA FLORESTA: UMA CONSTRUO PARTICIPATIVA DE
SISTEMAS AGROFLORESTAIS SUCESSIONAIS EM JAPARATUBA, SERGIPE
Dissertao de Mestrado defendida por Ana Paula Fraga Bolfe e aprovada em 18 de agosto
de 2004 pela banca examinadora constituda pelos doutores:
________________________________________________Dr. Edmar Ramos de Siqueira Orientador
Universidade Federal de Sergipe
________________________________________________
Dra. Maria Augusta Mundim Vargas
Universidade Federal de Sergipe
________________________________________________
Dr. Marcos Reigota
Universidade de Sorocaba
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v
Este exemplar corresponde verso final da Dissertao de Mestrado em Desenvolvimento
e Meio Ambiente.
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Dr. Edmar Ramos de Siqueira Orientador
Universidade Federal de Sergipe
________________________________________________
Dra. Maria Augusta Mundim Vargas
Universidade Federal de Sergipe
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concedida ao Ncleo responsvel pelo Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente
da Universidade Federal de Sergipe permisso para disponibilizar, reproduzir cpias desta
dissertao e emprestar ou vender tais cpias.
________________________________________________
Ana Paula Fraga Bolfe Autora
Universidade Federal de Sergipe
________________________________________________
Dr. Edmar Ramos de Siqueira Orientador
Universidade Federal de Sergipe
________________________________________________
Dra. Maria Augusta Mundim Vargas Co-orientadora
Universidade Federal de Sergipe
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DEDICATRIA
A todos que acreditam numa educao libertadora, e que
esta possibilita aos homens ferramentas para a construo de um mundo melhor.
Existir, humanamente, pronunciar o mundo,
modific-lo. O mundo pronunciado, por sua vez, se volta
problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles
novo pronunciar. No no silncio que os homens se fazem,
mas na palavra, no trabalho, na ao e reflexo.
(Paulo Freire)
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AGRADECIMENTOS
A Deus pela vida.
A meus pais Luiz (in memorian) e Ana: a ele que onde quer que esteja me ilumina
com sua luz e seu exemplo, a ela pela fora, coragem e amor.
A Victria, minha filha, fora e fonte de inspirao; a Edson, meu esposo,
companheiro e porto seguro. Agradeo pelo respeito, pelo amor, pela dedicao e
pacincia que tiveram comigo, at em minhas ausncias.
Aos meus irmos to fundamentais na minha histria de vida: importantes, amigos,
presentes, sempre, apesar da distncia geogrfica.
Universidade Federal de Sergipe, pela oportunidade de realizao da Ps-Graduao.
Ao Programa de Ps-Graduao em Desenvolvimento e Meio Ambiente, pela
acolhida e conhecimentos adquiridos.
CAPES, pelo auxlio financeiro concedido durante parte da realizao do curso.
Ao Pesquisador da Embrapa Tabuleiros Costeiros e Professor Dr. Edmar Ramos de
Siqueira, pela sabedoria transmitida, e pelo estmulo ao qual devo a orientao deste
trabalho. Mais que orientador tornou-se amigo, obrigada pelo respeito e pela pacincia,pois nosso trabalho comeou pela confiana e optamos pela interao de saberes (um
engenheiro florestal e uma pedagoga). Hoje temos muito em comum, mas, principalmente,
a certeza absoluta da possibilidade da to questionada e muitas vezes desprezada
interdisciplinariedade que deu alma e fora construo dessa dissertao.
professora Dra. Maria Augusta Mundim Vargas pela co-orientao deste
trabalho, suas leituras e sugestes, por apresentar-me a possibilidade de mestrado no
NESA, por fazer parte dessa caminhada, meu carinho, admirao, respeito e muitoobrigada.
Aos colaboradores: a Professora Dra. Rosemeri de Melo e Souza, ao Pesquisador da
Embrapa Tabuleiros Costeiros Edson Luis Bolfe, ao Mestre em Desenvolvimento e Meio
Ambiente Ismael Quirino Trindade Neto pela confiana, amizade e sabedoria com que
muitas vezes mergulharam neste tema da pesquisa, ajudando-me a construir este trabalho,
meu obrigada e gratido.
Aos parceiros do projeto de implantao, nas pessoas de Salete Rangel da Embrapa
Tabuleiros Costeiros, Andr Maciel da Prefeitura de Japaratuba, ao Professor Dr. Aro e
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aos estagirios da Escola Agrotcnica (EFASC), em especial a Silvnia pelos ensinamentos
prticos e a troca de idias, e s demais pessoas que estiveram envolvidas no projeto.
A Ernest Gtsch, criador do sistema, um ser apaixonado por todas as formas de
vida, pela sua sabedoria, simplicidade e competncia.
Aos agricultores, parte fundamental dessa pesquisa, por seus exemplos, carinho e
pacincia. Muito obrigada: Erivaldo, Jaime, Jos Augusto, Maria Luiza, Jos Carlos,
Erisvandro, Nelson, Maria Lcia, Jos Antnio, Maria Jos, Edmilson e Jos, as suas
famlias que muitas vezes estiveram presentes e j participam desse projeto.
Aos Professores das disciplinas cursadas no Programa de Ps-Graduao em
Desenvolvimento e Meio Ambiente: Edmilson, Antnio Carlos, Maria Augusta, Rivanda,
Roberto, Tnia, Edmar, e Francisco Sandro pelos encontros em sala de aula durante acaminhada.
A Petrobrs, pela logstica fornecida para a realizao deste trabalho, e pelas
amizades l na empresa conquistadas durante o perodo.
Aos Professores Drs., pela participao e sugestes como banca examinadora.
A todos colegas da turma de 2003, pela contribuio e amizade, especialmente a
Ivana, Ailton, Miriam e Antnio Ricardo.
Aos colegas da turma de 2002 e 2004 pelas conversas, trocas, estmulos e risadas.Aos funcionrios do NESA, Aline, Naj e tambm a Dona Rosa pela amizade e
colaborao fornecida.
A todos que, diretamente ou indiretamente, contriburam para a realizao deste
trabalho.
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RESUMO
A educao na floresta vem como uma forma de constituir uma nova relao do ser humano
com a natureza, esta que vem sofrendo transformaes ao longo dos tempos. Um dosmaiores exemplos disso a agricultura, que surgiu no momento em que o homem passou
daquilo que habitualmente colhia, ou que a natureza lhe oferecia, para plantar seu alimento,
modificando dessa forma radicalmente os ecossistemas em que vive. Assim, os sistemas
agroflorestais sucessionais, que significam conceitualmente, consrcios de espcies
herbceas, arbustivas e arbreas, em que se procura reproduzir uma dinmica sucessional
natural, uma vertente da agroecologia, caracterizados como um modelo regenerativo, que
se apresentam como uma alternativa para construir uma relao do ser humano com a
natureza, pautada no respeito, na complementariedade e na diversidade, sem pensar num
retorno physis, mas na coexistncia e no pertencimento de vidas. Encontra-se na educao
libertadora, que prima pela participao, cultura, conscientizao um instrumento
fundamental para a construo desse modo de fazer agricultura. Os sistemas agroflorestais
sucessionais tm como princpios bsicos a diversidade e a densidade de espcies; nesse
sentido, o conhecimento local essencial e o respeito ao saber do agricultor pertencente a
comunidade. A pesquisa desenvolveu-se com agricultores familiares, na Fazenda Oiteirinhos
no municpio de Japaratuba, em Sergipe, tendo como objetivo geral investigar a percepo
dos agricultores familiares em relao aos sistemas agroflorestais sucessionais e possibilitar
uma apropriao coletiva dos princpios que os regem na regio. Para tanto, verificou-secomo se d a relao dos agricultores com a natureza, o conhecimento dos atores sociais
envolvidos na proposta. Em seguida procedeu-se elaborao de um banco de dados
geogrficos de uso da terra. Acompanhou-se o processo de implantao dos sistemas
agroflorestais sucessionais, assim como a representao destes atravs de mapas mentais dos
agricultores e por fim a construo de categorias a partir das falas obtidas em entrevistas e
observaes dos agricultores. Por fim, neste trabalho afirma-se a importncia de se trabalhar
com os sistemas agroflorestais sucessionais inerentes a um processo educativo tangendo a
sustentabilidade ambiental e cultural, pois se est construindo territrios e territorialidades, e
o agricultor passa a ser um co-criador da realidade, parceiro e no dominador, quando aincluso, a participao, o pertencimento passam a ser conseqncia da nova atitude de estar
no mundo e com o mundo. Para concluir, a percepo destas pessoas passou por um
processo de modificao, ou de reconstruo. E a apropriao coletiva dos sistemas
agroflorestais sucessionais se deu alm da percepo, como uma mudana de valores
demonstrada em suas atitudes frente natureza, apresentando-se, ento, a proposta
metodolgica da educao para sistemas agroflorestais sucessionais construda ao longo do
processo de implantao destes.
Palavras-chaves: Educao libertadora, relao sociedade e natureza, agricultura sustentvel.
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ABSTRACT
The education in the forest comes from to constitute a new relation between the human
been with the nature, this one has been suffering transformation throughout the times. Oneof major examples about this, is the agriculture, which emerged in the moment that the
men passed from that what he usually harvested, or from what the nature offered to them,
to plant their aliment, modifying drastically the ecosystems. So the agroforestry systems
successionals, which means conceivable, groups of herbaceous, arbustives and arborous,
that try to reproduce a dynamic sucessional and natural, its a watershed of agroecology,
characterides as a regenerative among men an nature, ruled by the respect,
complementarity, diversity, without thinking about the return of Physis but in the
coexistence and possessions of life. Its found in the free education, wich ask for the
participation, culture, conscience is a fundamental instrument for this way of makingagriculture. The agroforestry systems successionals has principles the diversity and the
species density, in this order, the local knowledge is essential, and the respect pertaining to
the agriculturists and the community. The research develop with agriculturis from
Oiteirinhos Farm in the town Japaratuba, in Sergipe, wich the local agriculturists in
relation to the agroforestry systems sucessionais and to possibilities a collective
appropriating principles that rules in the region. Was verified that the relationship between
the agriculturist and nature, the knowledge of the social actors involved in the proposal.
After that an elaboration of a geographic data bank proceeded about the use of the land.
The implantation of the agroforestry systems successionals, was followed, in the
agriculturist and finally the construction of the categories obtained from the voices in
interviews and observations of the agriculturists. In the end, this work confirms the
importance in dealing with agroforestry systems successionals inherence to a educative
process tangent to a environmental sustainability and cultural, so, if its been constructing
territories and territorietalities, and the agriculturist turns info a co-creator for the reality,
partner and not dominator, when the inclusion, the participation, the possessions turns info
a consequence of a new attitude for been in the world and with the world. To conclude, the
perception of these people passed through a modification process, or reconstruction. Thecollective appropriation of the agroforestry systems successionals went beyond the
perception, as a nature, so, showing the methodological proposal of education for
agroforestry systems successionals built throughout this long process of implantation.
Key- words: free education, relation the society been with the nature, sustainability
agriculture.
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SUMRIO
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LISTA DE FIGURAS xivLISTA DE FOTOGRAFIAS xv
LISTA DE GRFICOS xvi
LISTA DE TABELAS xvii
LISTA DE QUADROS xviii
CAPTULO 1 INTRODUO 1
CAPTULO 2 A RELAO SOCIEDADE-NATUREZA 4
2.1 BREVE HISTRICO DE COMO SE INSTITURAM AS RELAES
SOCIEDADE-NATUREZA NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DA
CIVILIZAO 5
2.2 A RELAO SOCIEDADE-NATUREZA NO BRASIL COLONIZADO 15
2.3 RELAO SOCIEDADE NATUREZA NA AGRICULTURA 18
2.4 AGRICULTURA FAMILIAR 24
CAPTULO 3 AGRICULTURA SUSTENTVEL: O QUE SO OS SISTEMAS
AGROFLORESTAIS SUCESSIONAIS 27
3.1 AGRICULTURA SUSTENTVEL 28
3.2 AGROECOLOGIA 31
3.3 SISTEMAS AGROFLORESTAIS SUCESSIONAIS: UMA ALTERNATIVA DA
VIDA NO MUNDO E COM O MUNDO 34
3.3.1 Fundamentos tericos dos Sistemas Agroflorestais Sucessionais 363.3.2 Ecossistema e/ou Agroecossistema 40
3.3.3 Diversidade: sucesso natural de espcies 42
CAPTULO 4EDUCAO OU EXTENSO RURAL 49
CAPTULO 5 METODOLOGIA 59
5.1 QUESTES DE PESQUISA 605.2 CARACTERIZAO DO ESTUDO 61
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5.3 MTODOS 61
5.4 INSTRUMENTOS 62
5.5 CENRIO DA PESQUISA 62
5.6 TRABALHO DE CAMPO 65
5.7 ANLISE DE DADOS 66
CAPTULO 6 RESULTADOS E DISCUSSES 68
6.1 CONHECENDO OS ATORES SOCIAIS 69
6.2 BANCO DE DADOS GEOGRFICO DE USO TEMPORAL DA TERRA 81
6.3 REPRESENTANDO: PERCEPO DE SISTEMAS AGROFLORESTAIS AO
LONGO DO PROCESSO 876.3.1 Antes da implantao dos sistemas agroflorestais sucessionais 88
6.3.2 Comeo da implantao dos sistemas agroflorestais sucessionais 91
6.3.3 Depois de conhecerem um sistema agroflorestal sucessional j implantado 94
6.3.4 Aps a primeira colheita do sistema agroflorestal sucessional implantado
pelos prprios agricultores 97
6.4 CATEGORIAS: A EXPERINCIA DA EDUCAO NA CONSTRUO
PARTICIPATIVA DE SISTEMAS AGROFLORESTAIS SUCESSIONAIS 102
CAPTULO 7 - CONCLUSES E SUGESTES 127
7.1 CONCLUSES 128
7.2 SUGESTES 130
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 131
ANEXO AQUESTIONRIO 143
ANEXO B ENTREVISTA INICIAL 149
ANEXO C ROTEIRO DE OBSERVAESIN LOCO 151
ANEXO D ENTREVISTA FINAL 153
ANEXO E PROPOSTA DE EDUCAO PARA SISTEMAS AGROFLORESAIS
IMPLANTADA NO PROJETO PILOTO NA FAZENDA OITEIRINHOS,
JAPARATUBA, SE. 155
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LISTA DE FIGURAS
Figura 3.1 - Hierarquia dos diferentes planos de existncia................................................ 39
Figura 3.2 - Insero do ser humano no universo. .............................................................. 39Figura 5.1 - Representao da rea de estudo. .................................................................... 63
Figura 6.1- Imagem TM (1988) e Imagem TM (1998), Japaratuba-SE.............................. 82
Figura 6.2 - Classificao do uso da terra (1988) e Classificao do uso da terra (1998),
Japaratuba-SE..............................................................................................................84
Figura 6.3 - Sistema de cultivo com predomnio de plantio em linha.................................89
Figura 6.4 - Sistema de cultivo com plantio disperso (milho, feijo e mandioca). ............. 90
Figura 6.5 - Sistema de cultivo com espcies herbceas e arbreas com espacializaoparcial. ......................................................................................................................... 92
Figura 6.6 - Sistema de cultivo com espcies herbceas e arbreas com espacializao
total..........................................................................................................................93
Figura 6.7 - Sistema de cultivo diversificado com espacializao parcial. ......................... 95
Figura 6.8 - Sistema de cultivo diversificado com espacializao total.............................. 96
Figura 6.9 - Sistemas Agroflorestais. .................................................................................. 99
Figura 6.10 - Sistemas agroflorestais comparadas ao cultivo convencional. ....................100
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LISTA DE FOTOGRAFIAS
Foto 6.1 - Reunio Centro Comunitrio D. Joanoca. .......................................................... 70
Foto 6.2 - Aplicao do questionrio na BR 101. ............................................................... 71Foto 6.3 - Matria Orgnica. ............................................................................................... 74
Foto 6.4 - Construo dos mapas mentais pelos agricultores em Japaratuba, SE. .............. 88
Foto 6.5 - Mapas mentais construdos pelos agricultores em Pira do Norte, BA. ............. 94
Foto 6.6 - Diferena de terra com cobertura (escura) e sem cobertura (clara). ................... 97
Foto 6.7 - Coquetel de Sementes. ...................................................................................... 101
Foto 6.8 - Reunio Semanal................................... ........................................................... 103
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LISTA DE GRFICOS
Grfico 6.1 - Participantes por gnero................................................................................ 69
Grfico 6.2 - Faixa Etria dos agricultores.......................................................................... 71Grfico 6.3 - Escolha dos cultivos adotados. ......................................................................73
Grfico 6.4 - Tcnica utilizada na plantao agrcola pelos agricultores............................ 73
Grfico 6.5 - Como a tcnica utilizada afeta o solo. ........................................................... 74
Grfico 6.6 - Aspiraes de cultivo dos agricultores........................................................... 75
Grfico 6.7 - Recursos naturais apontados pelos agricultores.............................................76
Grfico 6.8 - Percepo dos recursos naturais..................................................................... 76
Grfico 6.9 - Percepo dos agricultores da mata. .............................................................. 78Grfico 6.10 - Relao da famlia com a natureza. ............................................................. 78
Grfico 6.11 - Tempo de escolaridade................................................................................. 79
Grfico 6.12 - Participao em organizaes, instituies, etc. .......................................... 80
Grfico 6.13 - Atividades coletivas j desenvolvidas pelos agricultores. ........................... 80
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LISTA DE TABELAS
Tabela 6.1 - Quantificao do uso da terra do municpio de Japaratuba, Sergipe (Km).... 85
Tabela 6.2 - Quantificao do uso da terra do municpio de Japaratuba, Sergipe (%)........ 85
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LISTA DE QUADROS
Quadro 5.1 - Modelo da matriz de categorias. ....................................................................67
Quadro 6.1 - Cultivos adotados pelos agricultores.............................................................. 72Quadro 6.2 - Percepo da mata. .........................................................................................77
Quadro 6.3 - Categoria Relao Ser Humano e Natureza. ................................................ 103
Quadro 6.4 - Categoria conceito de sistemas agroflorestais sucessionais......................... 108
Quadro 6.5 - Categoria participao.................................................................................. 113
Quadro 6.6 - Categoria aprendizagem............................................................................... 115
Quadro 6.7 - Categoria territrio e territorialidade............................................................ 120
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CAPTULO 1
INTRODUO
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Captulo 1 Introduo 2
1.0 - INTRODUO
No decorrer dos tempos as sociedades tm se comportado como se fossem as ltimas a
habitar a Terra, sem nenhuma preocupao com seus descendentes. visvel uma situao
scio-ambiental insustentvel, visto a degradao ambiental, o risco do colapso ecolgico e
o avano das desigualdades sociais e da pobreza.
Tem-se na agricultura a atividade produtiva em que a relao ser humano e natureza
aparece com toda a clareza e obstculos; nela, a crise ambiental fruto da chamada
revoluo verde, pois, ao contrrio das frmulas genricas dos pacotes tecnolgicos,
fundamental saber que solues sustentveis costumam ser exigentes quanto ao
conhecimento de ecologia e especificidades locais.
Assim, os sistemas agroflorestais se apresentam como uma alternativa de produo
agrcola transcendendo qualquer modelo pronto e sugerido sustentabilidade, pois partem
de conceitos bsicos fundamentais, aproveitando e resgatando os conhecimentos culturais
locais, adquiridos atravs da vivncia das geraes em seu ecossistema, dados de extremo
valor e importncia na elaborao de sistemas de produo sustentveis.
Para tanto, a educao adquire um sentido fundamental, pois funo dos educadores
favorecer processos que permitam que os indivduos e os grupos sociais ampliem a sua
percepo e internalizem, conscientemente, a necessidade de mudana. Um carter
libertador e emancipador da educao, ressignificada por princpios de sustentabilidade
ecolgica e diversidade cultural, procura dar ao ser humano a oportunidade de re-
descobrir-se atravs da retomada reflexiva do prprio processo, em que ele vai sedescobrindo, manifestando e construindo.
O objetivo geral desse trabalho foi investigar a percepo dos agricultores familiares em
relao aos sistemas agroflorestais sucessionais e possibilitar uma apropriao coletiva dos
princpios que os regem na regio.
Os objetivos especficos: a) diagnosticar a realidade histrico-social das famlias rurais daregio envolvidas no processo; b) elaborar um banco de dados geogrfico com informaes
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Captulo 1 Introduo 3
temporais de uso da terra do sistema agroflorestal; c) identificar com a devida importncia
o saber agroecolgico acumulado por indivduos e comunidades; d) permitir a associao
de saberes ecolgicos fragmentados da comunidade rural da regio para um projeto
agregador comum.
O trabalho parte de um entendimento de como se instituram as relaes sociedade e
natureza no mundo ocidental, procura resgatar como se deram essas relaes no Brasil
colonizado, a devastao das florestas e o surgimento da agricultura que modificou
drasticamente a relao do ser humano com a natureza, e que se tornou altamente
insustentvel no seu modelo atual, principalmente para os denominados agricultores
familiares.
O segundo captulo apresenta a agricultura sustentvel, seus modelos, divergncias e
dificuldades, situa a agroecologia como um campo de conhecimento agrcola capaz de
minimizar o alto impacto negativo causado no meio ambiente, evidencia as correntes, seus
modelos prticos. Dentre eles, os sistemas agroflorestais sucessionais caracterizados como
um modelo agrcola regenerativo, que significa a regerao do que tenha sido perdido ou
destrudo, e nesse ponto, inclusive as relaes do ser humano com a natureza. No que sequeira um retorno physis, mas um reencontro com o respeito a vida, coexistindo com
semelhantes.
No terceiro captulo se mostra como os sistemas agroflorestais podem tornar-se prtica,
para isso nega-se a extenso rural nos moldes da Revoluo Verde, ou seja, de persuaso e
invaso cultural; apresenta-se uma prtica educativa balisada em sujeitos histricos sociais
e na construo coletiva do conhecimento, numa educao como prtica de liberdade,problematizadora e no domesticadora.
um estudo de caso fruto de uma pesquisa qualitativa que demonstra como acontece a
receptividade dos agricultores, o caminho que esse processo percorre, e qual a metodologia
a ser utilizada nas comunidades para implantao de sistemas agroflorestais sucessionais
em Sergipe.
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CAPTULO 2
A RELAO SOCIEDADE-NATUREZA
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Captulo 2 A Relao Sociedade-Natureza 5
2.0 A RELAO SOCIEDADE-NATUREZA
2.1 BREVE HISTRICO DE COMO SE INSTITURAM AS RELAES
SOCIEDADE-NATUREZA NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DA
CIVILIZAO
Neste captulo busca-se a retomada do conceito de natureza instituda ao longo da trajetria
humana e procura-se situar o conflito que se instaurou entre cultura e natureza, mostrando
que a tradicional dicotomia homem-natureza que conformou o saber na sociedade
ocidental volta a ser questionada, pois a cultura humana no sai da natureza, ao contrrio,
uma de suas qualidades, visto que o homem, por natureza, produz cultura.
Produzir cultura uma especificidade natural dos seres humanos, pois os homens ao longo
da histria criam normas, regras e instituies, no para evitar cair no estado de natureza,
mas o fazem desenvolvendo sua prpria natureza, no somente em funo dos estmulos
advindos do meio ambiente, mas tambm das relaes que os homens estabelecem entre si.
Atualmente, a sobrevivncia humana est ameaada por vrias aes igualmente humanasadvindas de uma viso de mundo mecanicista e fragmentada. S reagiremos se formos
capazes de mudar radicalmente os mtodos e os valores subjacentes nossa cultura
individualista e materialista atual e nossa tecnologia de explorao do meio-ambiente.
Esta mudana dever, logicamente, refletir-se em atitudes mais orgnicas, holsticas e
fraternas entre os seres humanos e entre estes e a natureza, em todos os seus aspectos,
inclusive na agricultura que parte do tema deste trabalho; pois a sustentabilidade
prioridade em nosso tempo, como afirma Leff (2001), sendo o significado de uma falhafundamental na histria da humanidade, crise da civilizao que alcana seu momento
culminante na modernidade, mas cujas origens remetem concepo do mundo que serve
de base civilizao ocidental.
Quando apresentam-se para reflexo as atitudes necessrias nos dias atuais, necessrio
explicar-se que orgnicas, conforme Vargas (2003), tm o sentido de relaes valorizadas
pela herana de prticas culturais repassadas atravs de geraes. J o holstico, segundoMello e Souza (2003), significa a apreenso dos fenmenos da natureza entendidos como
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Captulo 2 A Relao Sociedade-Natureza 6
imersos na totalidade complexa e originria, haja vista a origem etimolgica desse
vocbulo remontar ao grego Holos, referente qualidade daquilo que inteiro, completo,
associado, de modo freqente, noo de complexidade, por sua vez derivada do latim
complexus, significando aquilo que tecido junto. E fraternas, fazer causa comum, ou
comungar de idias, aliar-se ou travar amizades, conforme Ferreira (1985).
Segundo Trindade Neto (2003) o desafio civilizacional parece residir mais em como se
reintegrar sem perder as aquisies cognitivas e culturais. Enfim, um retorno, mas no uma
regresso, ou, mais propriamente, um processo de reintegrao humana natureza, da qual
sempre foi uma das partes, levando consigo a conscincia conquistada. Trata-se de um
modo de estar que inclusivo, considerando o valor intrnseco de todos os seres, no-vivose vivos, o que inclui os humanos.
Para tanto, necessrio construir um outro conceito de natureza que envolve tambm um
outro conceito de homem e de uma outra sociedade que tome a tcnica como ela , apenas
um meio para se atingir um determinado fim. Fins que no so externos e imutveis. Assim
poderemos lutar contra a desigualdade social no como forma de igualdade para que todos
os seres humanos sejam iguais, pois o que os seres humanos tm de igual so as diferenas.
Constata-se que esse estado do mundo est intrinsecamente ligado ao desenvolvimento das
sociedades humanas, no momento em que se traam algumas fases da evoluo histrica,
distinguindo etapas em que o homem saiu de sua condio de ser imerso na natureza
indiferenciado, para uma posio de ser que transforma a natureza, como coloca Trindade
Neto (2003).
Mas, para se ter outra atitude, necessrio uma outra compreenso da realidade e da
posio do homem nesta, retomar vises que foram esquecidas, como salienta Capra
(1997); por exemplo, a de Goethe, filsofo alemo que admirava a ordem mvel da
natureza e concebia a forma como um padro de relaes, em que cada criatura apenas
uma gradao padronizada de um grande todo harmonioso. Ou ainda, as vises que falam
de uma integrao de partes e todos, a grande teia da vida em que o homem um dos fios.
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Segundo Trindade Neto (2003), a busca por uma epistemologia integrativa se obtm ao
optar por celebrar a realidade, pois o homem passa a ser um co-criador da mesma, um
parceiro e no mais um dominador; a escuta, o dilogo, o questionamento mais profundo
sobre o destino dessa realidade devem ser os meios com os quais a humanidade deve se
pautar para a construo desse momento em que a incluso passa a ser conseqncia da
nova atitude de estar no mundo e com o mundo.
Por isso, necessrio revisitarmos as relaes de natureza e sociedade institudas ao longo
da histria humana no ocidente, desde a Antigidade Clssica at nossos dias, a partir de
aspectos como o lugar do homem na ou com a natureza, a prxis humana em relao a ela.
Inicia-se por definir natureza como aquilo que se ope cultura como afirma Gonalves(1998), pois a cultura tomada como algo superior e que conseguiu controlar e dominar a
natureza, como evidenciado pela revoluo neoltica. Com a agricultura, o homem passou
da coleta daquilo que naturalmente a natureza oferecia para a coleta do que se planta, se
cultiva; comea-se a domesticar a natureza e formam-se os beros de civilizaes.
A oposio homem-natureza acontece na complexa histria do ocidente em luta com outras
formas de pensar e o agir de nossa sociedade, pois j houve poca, a pr-socrtica, em queo modo de pensar a natureza foi radicalmente diferente dessa viso dicotomizada,
fragmentada, oposta, entre homem e natureza. Nessa poca, segundo Bornheim (1989) os
deuses existem, como existem as plantas, as pedras, o amor, os homens, o riso, o choro, a
justia. Nos dias atuais, a natureza confunde-se com o objeto das cincias naturais,
podendo ser dominada e estando a servio do homem, canalizada em termos da tcnica, e
assim, transforma-se em expresso da vontade de poder; no entanto, o conceito pr-
socrtico da natureza vem daphysisem que se pensa numa compreenso da totalidade doreal.
Conceituando a natureza na fase pr-socrtica, continua Bornheim (1989), so trs os
aspectos fundamentais daphysis: primeiro, que esta indica aquilo que por si brota, se abre,
emerge, o desabrochar de si prprio, um conceito que se caracteriza por sua dinamicidade;
segundo, tudo est cheio de misteriosas foras vivas e a distino entre a natureza animada
e a inanimada no tem fundamento algum, tudo tem uma alma. E por fim, a physis
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compreende a totalidade de tudo o que , podendo ser apreendida em tudo o que acontece:
na aurora, no crescimento das plantas, no nascimento de animais e homens.
Conforme Kesselring (1992), para os gregos o conceito de natureza (physis) que significa
cosmos, universo e tudo o que existe, contrape-se ao conceito de arte e artesanato
(techne), palavra que designa a capacidade humana de construir coisas, casas, instrumentos
ou objetos artsticos.
No entanto, com Plato e Aristteles que se observa segundo Gonalves (1998) uma
mudana no conceito de physis, da natureza que se no aparece num primeiro momento,
pouco a pouco, atinge a concepo da natureza desumanizada, da natureza no-humana.
Segundo Kesselring (1992) para Aristteles aphysis o princpio do movimento e repouso
inerente a todas as coisas. Nos seres vivos o princpio do movimento a psyche, a alma;
visto que ela imaterial, os aristotlicos chamaram-na de forma corporis. Enquanto
princpio da vida, a alma , ao mesmo tempo, o princpio das capacidades e qualidades
especficas de cada ser vivo. As plantas possuem alma vegetativa, cujo movimento de
nascer e murchar. Os animais e homens podem movimentar-se, deslocar-se, ter impulsos einclinaes e necessidades por que tm a alma apetitiva e, alm disso, continua o mesmo
autor o homem tem a alma racional, ou seja, capaz de pensar e planejar suas aes. Entre
outras capacidades, tem tambm a competncia de compreender cientificamente a
natureza; a possibilidade da cincia e do conhecimento pertencem, ento, natureza
humana.
Sendo a natureza tudo o que no produzido pelo homem, pois ela tem leis prprias, ciclosdos quais os homens no fazem parte, surgem conceitos que paulatinamente assinalam o
distanciamento da natureza que precisa ser explicada para ser entendida, um certo desprezo
pelas pedras e plantas, e um privilgio do homem e da idia. Todavia, conforme Soffiati
(2002), nem mesmo Aristteles, o filsofo grego que mais estudou a natureza no humana,
props uma postura de dominao para ela. Nesse sentido, se afirma que:
Nessa transio inicial do mito ao logos ou da imagem
ao conceito, est o incio de um longo processo que
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caminha para a possibilidade de o homem se entender e
se assumir, aos poucos, como ser pensante autnomo em
contraposio Natureza com a qual ele antes conflua.
(Veiga 2001, p. 62 apud Trindade Neto 2003, p. 20).
Mesmo que luz da contemporaneidade e das perspectivas ps-modernas atuais esta
concepo clssica de natureza seja tomada como superada, ela no perde sua importncia por
configurar uma natureza plasmada medida dos homens, cujos resqucios esto presentes at o
Renascimento no pensamento filosfico (Merleau-Ponty, 2000 apud Mello e Souza, 2003).
Foi com a influncia judaicocrist, como diz Gonalves (1998), que a oposio homem enatureza, esprito-matria adquiriu maior dimenso; pois a assimilao aristotlico-
platnica que o cristianismo far em toda a Idade Mdia cristalizar a oposio atravs de
leitura prpria da igreja e pela censura negar a obra dos filsofos gregos; j que Deus
criador de todas as coisas e o dogma mostrar a verdade que era somente religiosa.
Segundo Kesselring (1992) principalmente atravs da tradio bblica que surgem novos
aspectos da concepo de natureza que, segundo a tradio crist, o mbito da criao.Da se segue, por um lado que o mundo tem um incio e um fim, e por outro que ele no
surgiu espontaneamente por si mesmo. Existe um criador, mas este no faz parte do
mundo, no reside dentro da natureza.
Conforme Soffiati (2002) a histria do povo hebreu, judeu e, posteriormente, a da
humanidade crist, divorciaram-se da histria do cosmos, e em seguida a histria humana
torna-se uma entidade com vida prpria num universo progressivamente reificado. NaIdade Mdia o conhecimento da natureza se amplia, e embora o modelo hegemnico
negasse o racionalismo aristotlico, a viso de natureza se torna cada vez mais utilitria
aprofundando-se no pensamento racional.
No perodo renascentista, as profundas alteraes da vida correspondentes ao
desmantelamento do Feudalismo, tiveram amplas repercusses no campo das idias, a
exemplo da revalorizao do empirismo e do racionalismo e da contestao religiosa
responsvel pela ecloso do Protestantismo a partir das idias de Lutero; a partir da, o
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poder da Igreja Catlica de Roma deixa de ser incontestvel, sobretudo em domnios
filosficos, conforme Mello e Souza (2003).
No entanto, com Descartes e seu pensamento cartesiano que a oposio homem-natureza,
esprito-matria, sujeito-objeto se tornar mais completa, se constituindo no centro do
pensamento moderno e contemporneo, pois conforme Kesselring (1992) a natureza torna-
se objeto da cincia.
Sintomtica pela ciso entre homem e natureza a diviso cartesiana do mundo em duas
partes: a res extensa (mundo dos corpos materiais) e a res cogitans (mundo do
pensamento); neste esquema a natureza restringe-se res extensa e o pensamento, poroutro lado, no pertence natureza.
Ainda dois aspectos marcam a modernidade, conforme Gonalves (1998): primeiro, o
carter pragmtico do conhecimento, que v a natureza como um recurso, um meio para se
atingir um fim. E segundo, o antropocentrismo, em que o homem torna-se o centro do
mundo, um sujeito em oposio ao objeto que a natureza, visto que o homem,
instrumentalizado pelo mtodo cientfico, pode penetrar nos mistrios da natureza e assimse tornar senhor e possuidor da natureza.
Assim, a natureza perde o carter de finalidade e espontaneidade com a qual os Antigos a
haviam impregnado, e passou a ser interpretada como mquina, podendo ser esmiuada de
maneira que tudo seja conhecido, que nada cause espanto ou admirao, pois segundo
Donatelli (2003) no h mais sentido estudar fenmenos com o objetivo de descobrir as
intenes da natureza, pois segundo a teoria mecanicista, o homem deve ser ummanipulador da natureza. Dessa forma, a natureza foi dessacralizada, explica Acot (1990),
e um terrvel conceito utilitrio tomou conta de ns; s nos interessamos pelo que serve,
pelo que tem um rendimento, de preferncia imediato. Ampliando-se assim, o carter de
finalidade e aprofundando-se a concepo de matria a ser explorada e dominada pela
tcnica.
Conforme Filho (2003), este homem de pensamento cartesiano em contraposio ao
pensamento medieval afirma que o ser humano deve ser conhecedor da natureza para que
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nela encontre e dela extraia os recursos, o que inclui, alm da satisfao do esprito o bem
estar do corpo. Mas o antropocentrismo e o sentido pragmtico-utilitarista no podem ser
vistos desvinculados do mercantilismo que se afirmava e j se tornava como colonialismo,
o senhor e possuidor de todo o mundo, pois o antropocentrismo consagrar a capacidade
humana de dominar a natureza.
No entanto, a concepo romntica de natureza esboada por Schelling faz uma retomada
da viso dos filsofos pr-socrticos, ao afirmar que o ser da natureza antecede s
contingncias, ou seja, est atrs de ns. Ao retomar essa concepo de natureza, os
romnticos abrem espao, do ponto de vista filosfico, a uma filosofia da natureza e, do
ponto de vista ideolgico, a uma formulao que confere sustentao aos defensores dapostura do ambientalismo denominada holstica no campo das ideologias ambientalistas,
conjugada ampliao das dicotomias entre abordagens racionalistas e idealistas, no
campo cientfico, verificadas ao longo do sculo XIX, segundo Mello e Souza (2003).
No campo racionalista, destaca-se o Positivismo, com o acirramento das proposies de
controle e de experimentao dos fenmenos naturais e sociais e representando o auge da
viso de progresso da humanidade, ainda que obtido custa da degradao da natureza.Enquanto reao ao Positivismo no campo das filosofias racionalistas, afirma-se o
Marxismo, cuja influncia estende-se ao longo do sculo XX, coloca Mello e Souza
(2003).
No Marxismo, conforme Bernardes e Ferreira (2003) a relao do homem com a natureza
sempre dialtica: o homem enforma a natureza, ao mesmo tempo, que est o enforma, com
o conceito de intercmbio orgnico. Segundo Engels (1979) tem-se considerado a naturezade um lado e o pensamento do outro, mas precisamente a modificao da natureza pelos
homens e no unicamente a natureza como tal o que constitui a base mais essencial e
imediata do pensamento humano; e na medida em que o homem aprendeu a transformar
a natureza que a sua inteligncia foi crescendo, pois o homem tambm reage sobre a
natureza, transformando-a e criando para si novas condies de existncia.
Marx introduz uma concepo nova da relao do homem com a natureza, o homem
socialmente ativo, que pe em movimento as foras naturais pertencentes sua
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corporeidade, braos e pernas, cabea e mos, para apropriar-se da substncia natural em
uma forma utilizvel para sua prpria vida. Na medida em que o homem, mediante esse
movimento, atua sobre a natureza exterior a ele e a transforma, modifica ao mesmo tempo
sua prpria natureza.
Por fim, para no incorrer no vis do reducionismo, convm articular complexamente o
paradigma mecanicista s transformaes econmicas, sociais e polticas que ocorreram na
Europa entre os sculos XVI e XVIII, assim como, houve a instituio do valor de uso e de
troca ampliando-se o valor da natureza, o que pode ser oferecido para acumulao do
capital, pois ao se acumular o capital se detm o poder.
Com a produo para troca, a produo da natureza ocorre em escala ampliada, pois agora
os seres humanos no produzem somente a natureza imediata da sua existncia, mas toda a
sua textura social. Sendo uma produo numa escala maior, a relao com a natureza passa
a ser, antes de mais nada, uma relao de valor de troca, pois a partir do preo que se
coloca na mercadoria que se determina o destino da natureza, passando a relao com a
natureza a ser determinada pela lgica do valor de troca, conforme Bernardes e Ferreira
(2003).
Segundo Soffiati (2002), tanto o capitalismo comercial no bojo do pensamento positivista e
o mecanicismo aplainaram o terreno para a ecloso da Revoluo Industrial, em fins do
sculo XVIII, que fez nutrir a atitude instrumentalizadora ocidental ante a natureza, ao
mesmo tempo que se nutrir dela. Caminhamos, assim, para a crise ambiental da
atualidade.
A idia da natureza objetiva e exterior ao homem se cristaliza com a civilizao industrial
inaugurada pelo capitalismo. A Revoluo Industrial evidencia a fora dessas idias, sendo
considerada por alguns como base destas, pois no sculo XIX que acontece o triunfo do
mundo pragmtico, com a cincia e a tcnica adquirindo significado central na vida dos
homens, e a natureza cada vez mais um objeto a ser possudo e dominado, alm de tambm
subdividida pela cincia, para melhor conhecimento e maior dominao, em fsica, qumica
e biologia. E as cincias do homem, as humanidades subdivididas em economia,
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sociologia, antropologia, histria e psicologia; espelhando a fragmentao do pensamento
nas relaes sociais e na diviso social do trabalho.
Paradoxalmente, o prprio Marx afirma que todas as relaes sociais esto mediadas por
coisas naturais e vice-versa, so sempre relaes de homens entre si e com a natureza,
significando que a natureza uma categoria social e a sociedade uma categoria natural,
conforme Bernardes e Ferreira (2003).
Toda categoria social forma-se a partir de uma representao coletiva, e a natureza assim
se apresenta, j que um conceito que comunica aos indivduos o modo pelo qual uma
sociedade particular classifica e organiza o mundo natural, dita as formas e limites denossa ao sobre o mundo natural, informa sobre a diferena entre o mundo social e o
mundo natural, segundo Lima (1998).
Entretanto, a natureza em nossa sociedade um objeto a ser dominado por um sujeito, o
homem. No mundo ocidental vivemos, de fato, duas concepes: ou a natureza como algo
hostil, lugar da luta de todos contra todos, a chamada lei da selva, ou vemos a natureza
como harmonia e bondade, mantendo a dicotomia sociedade-natureza, homem-natureza, aprimeira denominada antropocentrismo e a segunda o biocentrismo. Mas, do mesmo modo,
homem e natureza excluem-se em amas concepes, pois essa idia de uma natureza
objetiva e exterior ao homem pressupe a idia de um homem no natural e fora da
natureza.
Alm dessas idias, preciso ressaltar a abordagem holstica, que norteada pela
concepo ecocntrica. Unger (1991) explica que no se trata de uma impossvel voltaatrs, nem de querer retornar ao mundo dos pr-socrticos ou ao mundo do homem mito-
poitico, mas significa que a projeo da utopia no passado ou sua projeo no futuro pode
ter seu valor como paradigma, pois, se reconciliando com os outros homens atravs de uma
ordem social justa, o homem se reconciliaria simultaneamente consigo mesmo e com o
Todo.
O modo de vida preconizado para servir de reconciliao com a natureza concebido
como um retorno esfera de relaes comunitrias de vida, orientadas por uma postura
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ideolgica ecocntrica, ou seja, o centro no ocupado nem por homens nem por outros
seres naturais (vivos e no-vivos), mas o que buscado justamente um convvio
harmnico, em equilbrio dinmico, no sentido etimolgico de harmonia como co-
pertinncia de diferenas, conforme Mello e Souza (2003).
Segundo Gonalves (1998) no existem palavras naturais para falar de natureza, visto que
as palavras so criadas e institudas em contextos sociais especficos, de modo que o
conceito de natureza no natural; portanto, necessrio compreender o conceito de
natureza que nossa sociedade instituiu.
Na relao sociedade e natureza os homens so condicionados por um determinado nvelde desenvolvimento das suas foras produtivas e do modo de relaes que lhes
correspondem; assim, sugere-se uma unidade geral da natureza com a sociedade, na qual as
relaes limitadas dos homens com a natureza expressam as relaes limitadas entre os
homens, e estas s dos homens frente a natureza; entretanto, as contradies permeiam as
relaes entre os homens, assim, segundo Smith (1998:85) apud Bernardes e Ferreira
(2003:20), a relao com a natureza acompanha o desenvolvimento das relaes sociais e,
na medida em que estas so contraditrias, tambm o a relao com a natureza.
Analogamente, Herculano (1992) coloca que os inventos, a nova ordem social e a
urbanizao da era industrial deram formas a uma civilizao que se caracterizou por
ultrapassar os limites da dimenso humana, por criar o tempo abstrato e aglutinar uma
massa de miserveis urbanos em substituio pobreza rural. A modernidade, que eclodiu
a partir do sculo XVI, com as expanses ultramarinas e as revolues cientfica e
industrial, transformou a cultura em um processo civilizatrio e assim passou a estabeleceruma relao de oposio entre cultura/civilizao, de um lado, e natureza de outro,
lembrando que civilizar passa a ser a expresso usada para designar as conquistas
mercantis-colonialistas da Europa sobre os povos primitivos dos demais continentes.
No Sculo das Luzes inmeras expedies percorreram o globo terrestre, os homens e a
cincia descobriram lugares, povos, plantas e animais em enormes distncias na busca do
conhecimento e controle sobre os processos naturais. E a colonizao portuguesa no Brasil
realizou-se sob a perspectiva da natureza como fonte inesgotvel de lucros, conforme
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Raminelli (2001), pois a descoberta desse pas realizou-se sob o signo da expanso
comercial portuguesa.
2.2 A RELAO SOCIEDADE-NATUREZA NO BRASIL COLONIZADO
A conquista da natureza aconteceu apenas em nome da busca de lucros e acmulo de
dividendos, sem avaliar-se que a destruio da natureza implica em subtrair as possibilidades
de sobrevivncia na terra, pois visvel que os recursos naturais esto se extingindo e isso no
Brasil vem ocorrendo desde a colonizao. Nessa poca alm da doutrina crist que animou
os homens a destruir a natureza, tambm proliferava o sistema capitalista, desse modo:
A conquista desse territrio somente se faria caso o
empreendimento resultasse em rendimentos. Ouro, canela
e cravo no havia nessas paragens, mas as florestas eram
densas e serviam, provisoriamente, como estmulo para
ocupao do territrio. (Raminelli, 2001, p. 48-49).
Nesse territrio, o portugus nada mais fez que reproduzir os ciclos econmicossucessivos, o modelo hierrquico e autoritrio em vigor no seu pas, pois vir para o Brasil
era uma forma de tentar melhorar e garantir a identidade social de seu pas de origem.
Segundo Da Matta (1993) assim que o Brasil nasce, com o selo de uma viso relacional,
ao mesmo tempo ingnua e retorcida da sociedade humana e da natureza, uma viso
hierrquica e holstica em que os superiores dispensariam a f crist civilizadora em troca
do direito inato de explorar a sua vontade as gentese os recursos naturais.
Os colonizadores eram impulsionados pela cobia, pela possibilidade de enriquecimento e
glria, se no Novo Mundo encontrassem ouro, prata e especiarias se tornariam homens
ricos, comprariam terras e castelos e viveriam, talvez, como nobres no seu rinco de
origem, Raminelli (2001).
Na poca do descobrimento, a Mata Atlntica deixava impassveis ou atnitos os
colonizadores, que diversas vezes penetraram-na e trouxeram apenas relatos. No entanto,
rapidamente, produziram tamanha devastao, o que constitui o comeo, a fundao do
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povoamento, da colonizao e do imprio, de uma civilizao transferida e imposta,
conforme Dean (1996).
A denominao Mata Atlntica segundo Souza e Siqueira (2001) abrange todas as
formaes florestais que ocorrem ao longo da costa brasileira, ou seja, do Rio Grande do
Norte ao Rio Grande do Sul. Nesta regio h uma grande variao de relevo, tipos de solo
e clima, com uma cobertura vegetal caracterstica que reflete as diferenas do ambiente.
Pode ter maior ou menor proximidade do oceano ou situar-se em reas de transio da
floresta costeira mida e caatinga seca do interior como na rea de estudo.
O enriquecimento rpido como valor alimentado pela idia de den orientou a economiabrasileira para uma atividade extrativista, imediatista e predadora, como coloca Da Matta
(1993), uma histria marcada por ciclos, cada um deles correspondendo descoberta de
uma fonte natural, sua explorao, ao seu declnio e, por fim, ao seu esgotamento. Foi
assim que sucessivamente, se verificaram os ciclos da madeira (pau-brasil), do acar, do
ouro, do caf e da borracha.
Apesar de poucos estudos terem se debruado sobre a prtica do comrcio de pau-brasil evidente que sua extrao, assim como de todas as demais com que os portugueses
lidaram, teve origem no conhecimento que os nativos tinham da floresta. Estes
consideravam as florestas como pertencentes aos espritos e animais que as habitavam, ou
pelo menos, como pertencentes tantos queles seres, como a eles mesmos, para uso dos
recursos naturais. Por isso, enfatizado que somente a partir de 1600 que o
relacionamento humano com a Mata Atlntica foi transformado em valor de troca,
principalmente porque a maioria de seus habitantes humanos originais havia desaparecidoe porque o nmero de colonizadores e /ou invasores era suficiente para substitu-los, como
nos apresenta Dean (1996).
Atualmente, afirmam Souza e Siqueira (2001) a Mata Atlntica um dos ecossistemas
brasileiros com maior perturbao antrpica e com maiores taxas de ocupao de sua rea.
Da rea coberta quando da chegada dos portugueses ao Brasil, resta muito pouco; em
algumas partes, ela foi completamente eliminada e em outras restam pequenos trechos de
mata muito alterados pela ao humana.
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Desse processo resulta uma lgica relacional ambgua que oscila entre a concepo de
natureza habitada pelo maravilhoso, intocada e com poderes mgicos, e outra concepo
de mundo natural merc do homem. Ainda Da Matta (1993) coloca da imbricao da
natureza na cultura e da cultura na natureza, sendo que estes sistemas escapam frmula
moderna de uma natureza que exclui a cultura.
Todavia, historicamente, a sociedade humana elabora seus conceitos, inclusive o de
natureza, ao mesmo tempo em que institui suas relaes sociais, visto que a cultura no
exclui a natureza, mas se desenvolve no interior dela, realizando novas snteses de matria
e energia socialmente institudas e, portanto, passveis de novos caminhos, novas agri-
culturas, novas formas de medio entre o homem e o seu outro orgnico-inorgnico,sendo preciso romper com o cartesianismo do res cogitans, o sujeito que pensa, e a res
extensa, o mundo que se apresenta diante de ns, conforme Gonalves (1998).
Para Bourg (1993) as representaes do mundo natural e da sociedade refletem um mesmo
conjunto de valores, em que se organizam por meio de relaes complementares que vo
desde o outro mundo at os animais e s plantas, passando pelos homens organizados
hierarquicamente, sendo possvel compreender o sistema de monocultura patriarcalcaracterstica do estado em formao no Brasil a referir-se a uma sociedade que se
assentava numa pesada hierarquia. [...] entre os homens e a natureza estabeleceu-se uma
lgica idntica quela que governava os homens entre si: a lgica da desigualdade
(p.135).
Conforme Dean (1996), as relaes dos seres humanos com a floresta transformaram-se
radicalmente com a adoo da agricultura, visto que ela era muito mais vivel nos solos dafloresta, exigindo seu sacrifcio. Isso ocorreu desde o comeo, com uma tcnica
extremamente simples que assim acontecia: perto do fim da estao seca, a macega de uma
faixa da floresta era cortada e deixada secar. Por meio de machados e pedras, retirava-se o
anel da casca dos troncos das rvores maiores; ento um pouco antes da chegada das
chuvas, a rea era queimada fazendo com que a enorme quantidade de nutrientes na
biomassa da floresta casse sobre a terra em forma de cinzas. As chuvas drenavam os
nutrientes para o interior do solo neutralizando-o e ao mesmo tempo fertilizando-o, e assim
plantava-se sem qualquer utenslio, alm de um basto para cavoucar.
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No entanto, continua Dean (1996), foi a rpida expanso da rea ocupada por neo-
europeus que sugere uma dilapidao impiedosa dos recursos florestais. O regime de
derrubada e queimada, tal como praticado pelas populaes nativas com densidade
inferior a 0,5 pessoas por quilmetro quadrado, fora vivel indefinidamente, mas a
colonizao portuguesa, todavia, implicava numa explorao mais intensiva dos solos da
floresta, porque a preocupao tanto do governo quanto da igreja era fixar
permanentemente a populao rural, havendo ainda residentes urbanos para alimentar, e
ainda fornecer um excedente para a metrpole. Houve ainda, a introduo de implementos
de ferro (machados, enxadas) que possibilitou outro tipo de intensificao do regime de
derrubada e queimada.
Em suma, a histria da colonizao desse territrio brasileiro mostra que os primeiros
colonizadores costumavam ver a mata como um empecilho a ser eliminado para que o
progresso e a civilizao chegassem, segundo Souza e Siqueira (2001).
2. 3 RELAO SOCIEDADE NATUREZA NA AGRICULTURA
A adoo da agricultura modificou as relaes dos seres humanos com a floresta desde quese estabeleceu h cerca de 10.000 anos, pois foi uma mudana para um sistema
radicalmente novo, baseado na alterao de ecossistemas naturais com o objetivo da
produo de gros e pastos para os animais, marcando a transio mais importante da
histria humana, conforme Poting (1995) apud Trindade Neto (2003).
Ao longo da histria da humanidade, a agricultura tem sido uma ao de interferncia
consciente sobre o meio ambiente. A concepo de agricultura o resultado depensamentos diversos submetidos a valores de tica, de ideologias e da religiosidade,
adequados aos interesses das sociedades ou grupos. possvel consider-la, a mais intensa
e ntima ligao entre a sociedade e a natureza.
Mesmo com o surgimento da agricultura, as florestas continuam tendo, ecolgica e
intrinsecamente, diversas funes. No Brasil, assim como no resto do mundo, tem ocorrido
a ocupao de reas florestadas para uso dos recursos florestais ou para sua transformao
em reas de produo de alimentos, ou seja, para agricultura ou pastagens. Estes seriam
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efeitos da colonizao de ecossistemas como o Brasil, por exemplo, colonizado por
populaes estranhas ao ambiente e cultura autctone, que deixou seqelas irreversveis
para todo o sistema vivo original, como coloca Vivan (1998).
Os regimes agrcolas representam transtorno a um ecossistema natural, explica Dean
(1996), porque procuram congelar a sucesso natural em seu estgio mais primitivo,
introduzindo plantas cultivadas que, em seu estado selvagem, tinham sido espcies
precursoras.
Assim, conforme Raminelli (2001), depois do ciclo do pau-brasil, a primeira catstrofe
ecolgica brasileira foi a cana-de-acar, uma espcie eleita para substituir os espaosantes cobertos pelas matas nativas, que veio do Oriente e se adaptou muito bem ao solo
antes coberto pela Mata Atlntica. A partir desse cultivo intensificou-se a ocupao do
territrio dito descoberto, pois a produo de acar provocava a derrubada de rvores,
destrua a fauna e a flora, polua os rios. Era a cobertura da mata que retinha no solo os
microorganismos e minerais indispensveis para a fertilidade da terra, e quando a floresta
desaparecia, eles lentamente escorriam pelos rios, deixando a terra sem capacidade de
reproduzir espcies.
Inicialmente, apesar dos problemas ocasionados pelo desmatamento, como a proliferao
de doenas, o solo limpo obtido pela queima da floresta proporcionava rendimento alto
durante dois ou trs anos, ao final dos quais se deixava em pousio a rea recm-queimada
por perodos de 10 ou mais anos. Cresciam, sobre essas terras em pousio, as capoeiras que
iriam, no futuro, ser queimadas para implantao da agricultura por mais dois ou trs anos;
todavia, esse sistema de rotao de terras foi rompido pelo aumento da pressopopulacional e da demanda de mercado, no permitindo a regenerao das capoeiras,
conforme Brasil (2000) apud Trindade Neto (2003).
Embora a agricultura seja uma experincia milenar, o domnio sobre as tcnicas de
produo, geralmente, era muito precrio e a produo de alimentos sempre foi um dos
maiores desafios da humanidade. Conforme Ehlers (1999) durante toda a Antiguidade, a
Idade Mdia e o Renascimento, a fome dizimou centenas de milhares de pessoas em todo o
mundo, e foi apenas nos sculos XVIII e XIX, com o incio da agricultura moderna, que
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alguns povos comearam a produzir em maior escala, pondo fim a um longo perodo de
escassez de alimentos. Essas transformaes ocorreram a partir da crescente aproximao
das atividades agrcolas e pecurias, perodo conhecido como Primeira Revoluo
Agrcola. J em meados do sculo XIX, uma srie de descobertas cientficas e de avanos
tecnolgicos, como os fertilizantes qumicos e o melhoramento gentico, entre outros
fatores, marcou o incio de uma nova e ainda mais produtiva fase da histria da agricultura:
a segunda Revoluo Agrcola, que consolidou uma prtica ainda utilizada nas ltimas seis
dcadas de padro produtivo.
A agricultura moderna como hoje conhecida, teve sua origem nos sculos XVIII e XIX,
em diversas regies da Europa, na chamada Primeira Revoluo Agrcola Contempornea.Neste perodo, ocorreram intensas mudanas, tanto econmica, quanto social e tecnolgica.
Estas mudanas desempenharam um papel central no processo de decomposio do
feudalismo e no surgimento do capitalismo, segundo Veiga (1991).
Conforme Marcatto (2004), a Primeira Revoluo Agrcola, do ponto de vista tecnolgico,
caracterizou-se pelo abandono paulatino do pousio e pela introduo de sistemas
rotacionais com leguminosas e/ou tubrculos. Estas plantas podiam ser utilizadas tanto naadubao do solo, quanto na alimentao humana e animal.
Na Primeira Revoluo Agrcola, em meados do sculo XIX, os arados utilizados passaram a
ser fabricados de ferro fundido e no mais de madeira pelos arteses locais, com a introduo
tambm de arados com chapas de ao que mais resistente. Tambm a colheita de pequenos
gros que se baseava no trabalho manual com uso de foice e gadanha passou a ser realizada
por colhedeiras mecnicas puxadas por cavalos. Apesar dessas mudanas, a base energticada produo agrcola permaneceu inalterada durante a segunda metade do sculo XIX.
Ehlers (1999) afirma que enquanto o setor manufatureiro utilizava mquinas a vapor como
matriz energtica, a agricultura continuava a empregar a fora de cavalos e mulas.
A Segunda Revoluo Agrcola trouxe significativas mudanas, tais como a reduo da
importncia relativa da rotao de culturas, o progressivo abandono do uso da adubao
verde e do esterco na fertilizao, a separao da produo animal da vegetal e,
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principalmente, a absoro de algumas etapas do processo de produo agrcola pelas
indstrias.
No entanto, aps a primeira guerra mundial deu-se a introduo do motor a combusto
interna, que originou a motomecanizao, dando incio a um novo padro de
desenvolvimento para a agricultura num sistema mais intensivo de produo; foi uma
revoluo que transformou profundamente a agricultura mundial, que recebendo a
denominao de Revoluo Verde, na qual as indstrias qumicas e mecnicas emergentes
intensificaram a produo de insumos agrcolas, passando a agricultura a depender cada
vez menos dos recursos locais, e cada vez mais dos tratores, colheitadeiras, arados,
agrotxicos e rao animal produzidos pela indstria, segundo Marcatto (2004).
Uma srie de descobertas cientficas aliadas ao grande desenvolvimento tecnolgico, alm
da motomecanizao, aconteceu, por exemplo, com os fertilizantes qumicos e
melhoramento gentico de plantas. Muito significativas foram as mudanas deste perodo
que Ehlers (1999) denomina Revoluo Verde, como um processo pelo qual o padro
agrcola, qumico, motomecnico e gentico advindo dos EUA e Europa perpetua-se em
vrias partes do planeta. Ele possibilita a produo de variedades altamente produtivasdesde que utilizem tambm um conjunto de prticas e de insumos que ficou conhecido
como pacote tecnolgico; o que leva, na maioria das vezes, degradao e ameaa aos
recursos naturais, sua contaminao e do ser humano.
O modelo da Revoluo Verde tem como eixos a monocultura e a produo estvel de
alimentos, principalmente arroz, trigo e milho. O pacote tecnolgico da Revoluo
Verde envolve tecnologias como motomecanizao, uso de variedades vegetaisgeneticamente melhoradas (para obteno de alto rendimento), fertilizantes de alta
solubilidade, pesticidas, herbicidas e irrigao.
Vrios foram os motivos que contriburam para a rpida disseminao deste modelo de
produo pelo mundo. A Revoluo Verde surgiu no contexto da Guerra Fria, em um
mundo polarizado entre dois blocos super poderosos. Naquela poca, entendia-se que o
rpido crescimento populacional, aliado a uma distribuio inadequada de alimentos, eram
as principais causas da fome e da instabilidade poltica no Terceiro Mundo. A estratgia
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central da Revoluo Verde foi a de lutar contra a deficincia de alimentos, via aplicao
massiva de inovaes tecnolgicas no campo, seu objetivo era o de maximizar a
produtividade agrcola. E, por razes polticas, as tecnologias da Revoluo Verde foram
vistas como uma ferramenta para produzir os alimentos necessrios, e assim lutar contra o
crescimento das doutrinas de esquerda no campo, como coloca Marcatto (2004).
No que se refere ao aumento da produo total da agricultura conforme Ehlers (1999) a
Revoluo Verde foi, sem duvida, um sucesso. Entre 1950 e 1985, a produo mundial de
cereais passou de 700 milhes para 1,8 bilhes de toneladas, a produo alimentar dobrou,
a disponibilidade de alimento por habitante aumentou em 40%. Rapidamente houve
investimento neste modelo tecnolgico assim como a expanso da pesquisa pblica, ambosfinanciados pelos governos dos pases desenvolvidos e por agncias internacionais
controladas por estes governos, como o Banco Mundial, Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID), a United States Agency for International Development (USAID),
a Organizao das Naes Unidas para a Agricultura e a Alimentao (FAO), dentre
outras.
As contribuies ao processo de expanso do modelo da Revoluo Verde tambm vieramdos pases em desenvolvimento. No Brasil, por exemplo, foram criados os sistemas de
assistncia tcnica e extenso rural e o sistema de pesquisa agrcola, com seus mais de
trinta Centros Nacionais de Pesquisa; nas universidades de agronomia os currculos foram
completamente reformulados, e os professores universitrios foram enviados para
treinamento em universidades dos EUA (principalmente). Tambm, o governo brasileiro
criou linhas especiais de crdito rural para permitir a compra de mquinas, equipamentos e
insumos modernos; estabeleceu subsdios especiais para a instalao do emergente setoragro-industrial, assim como, uma parte de recursos financeiros, materiais e equipamentos
necessrios foram fornecidos por agncias doadoras do primeiro mundo e por organismos
internacionais, conforme Ehlers (1999).
A Revoluo Verde foi introduzida no Brasil no perodo da ditadura militar, como parte da
estratgia de modernizao do pas. O processo de modernizao incluiu ainda a rpida
industrializao, principalmente do Sudeste do pas, a construo da infra-estrutura
necessria (estradas, centrais eltricas, portos, sistemas de comunicao, etc.), e a liberao
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de parte da mo-de-obra rural para mover as indstrias da rea urbana. O regime militar foi
capaz de modernizar o campo brasileiro, sem alterar o elevado grau de concentrao de
terras que caracterizava (e caracteriza) a estrutura agrria nacional. Para difuso e
consolidao do novo modelo foram implantadas ainda, uma srie de leis, regulamentos e
programas especiais; um arsenal de leis e instituies desempenharam um papel
fundamental no processo regulador das relaes sociais, administrando os conflitos
resultantes das mudanas da organizao tcnica e social que o modelo causou (Silva,
1992).
A agricultura moderna est baseada no industrialismo da sociedade capitalista em que os
meios de produo podem ser simplificados: a terra (que nada mais que suporte),insumos e mecanizao; ou seja, com sementes melhoradas por um lado do sistema, retira-
se pelo outro lado o produto agrcola desejado a partir de receitas totalmente ajustadas.
Conforme Ehlers (1999) o problema que este sistema apresenta situaes inesperadas
como doenas, pragas resistentes aos agrotxicos, compactao e eroso do solo,
salinizao, contaminao da gua por agrotxicos, perda de biodiversidade, destruio de
habitats naturais, eroso gentica e aumento da instabilidade econmica e social nas
comunidades de agricultores familiares, conflitos sociais, etc., alm de um balanoenergtico desfavorvel que se define no custo de produo.
claro que atualmente o modelo de produo agrcola denominada agricultura
convencional, que segundo Knorr & Watkins (1984) apud Ehlers (1999) significa
agricultura de fertilizantes artificiais, herbicidas, pesticidas, alm de intensiva produo
animal, vive um perodo de crise por mostrar-se uma atividade altamente insustentvel.
Insustentvel porque degradante do meio e depende de altos inputs energticos, deinsumos externos, com custos elevados e srios reflexos sociais ocasionados pelo xodo
rural, conforme Peneireiro (1999).
Para desenvolver uma agricultura que seja sustentvel ambientalmente preciso assumir
que o industrialismo que direciona o fazer agricultura nos moldes modernos, pressupondo
monocultura em grandes reas, mecanizao, uso de espcies melhoradas geneticamente,
de insumos externos em larga escala, deve ser superado, pois incompatvel com as leis
que regem os sistemas vivos, com seus ritmos e comportamentos prprios. Solues
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sustentveis costumam ser exigentes quanto ao conhecimento de ecologia local, estando
sempre relacionadas a especificidades locais e no a frmulas genricas que poderiam ser
difundidas em pacotes tecnolgicos do tipo Revoluo Verde.
preciso enfatizar que, alm da insustentabilidade ambiental da agricultura fruto da
Revoluo Verde, a questo scio-cultural importantssima, pois muitas das propriedades
rurais no Brasil tm menos de 100 ha de terras. Parte importante destas reas ocupada
pela agricultura familiar, em que os sistemas de produo destes agricultores apresentam
caractersticas bastante diferentes (quase opostas) daquelas exigidas pelas tecnologias da
Revoluo Verde (tambm chamadas convencionais). Em geral, estes agricultores utilizam
mo-de-obra familiar, no dispem de recursos financeiros, alem de terem dificuldade deacesso a terra, mquinas e equipamentos. Estes agricultores esto claramente excludos do
processo de desenvolvimento (modernizao) da agricultura em curso no pas.
2.4 AGRICULTURA FAMILIAR
O processo de desenvolvimento rural brasileiro, principalmente no perodo de 1950 a 1980
ocorreu por intermdio de um processo genrico de crescente integrao da agricultura aosistema capitalista industrial, especialmente atravs de mudanas tecnolgicas que
ocorreram em funo de crditos subsidiados e grandes investimentos. No entanto, a
agricultura familiar foi excluda em massa deste processo, conforme Pedroso (2002).
A Agricultura familiar segundo Lamarche (1993) foi profundamente marcada pelas origens
coloniais da economia e das sociedades brasileiras com suas trs grandes caractersticas: a
grande propriedade, as monoculturas de exportao e a escravatura. Seguindo asmonoculturas situam-se os ciclos econmicos sucessivos correspondentes evoluo do
mercado internacional, e a fragilidade e dependncia dos produtores do campo so
reforadas em toda parte por mentalidades enraizadas pelas antigas relaes do tipo
senhor/escravo.
importante enfatizar-se o conceito de agricultura familiar que segundo Wanderley
(1997) entendida como aquela em que a famlia, ao mesmo tempo em que proprietria
dos meios de produo, assume o trabalho no estabelecimento produtivo, sendo importante
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insistir que o familiar no detalhe superficial ou descritivo, pois a associao famlia-
produo-trabalho tem consequncias fundamentais para a forma como age econmica e
socialmente.
Lamarche (1993) afirma que a agricultura familiar no um elemento da diversidade mas
contm nela mesma toda a diversidade. E pode tambm ser definida com base em trs
caractersticas centrais:
a) a gesto da unidade produtiva e os investimentos
nela realizados feita por indivduos que mantm entre
si laos de sangue ou de casamento; b) a maior partedo trabalho igualmente fornecida pelos membros da
famlia; c) a propriedade dos meios de produo
(embora nem sempre a terra) pertence famlia e em
seu interior que se realiza a sua transmisso em caso
de falecimento ou de aposentadoria dos responsveis
pela unidade produtiva. (Guanziroli, 1996, p. 4)
Embora muitos outros autores se dedicam a caracterizar ou estabelecer caractersticas para
a agricultura praticada em regime familiar, Guedes e Tavares (2001) afirmam que em todas
elas verifica-se haver elevado grau de consenso quanto a algumas condies que, de modo
bsico, marcam este segmento social e econmico, dentre as quais as trs citadas acima
esto, em regra, presentes.
Tradicionalmente, a produo familiar se encontra inserida numa realidade localcomunitria; segundo PRONAF (2002), essas comunidades transmitem de gerao para
gerao conhecimentos tcnicos e produtivos, utilizando um conhecimento acumulado
sobre os ecossistemas locais e a proximidade das relaes entre as pessoas (parentes e
vizinhos) permite a existncia de formas diversas de solidariedade, pela troca de bens e
servios.
Segundo Lages (2001) a agricultura familiar nasceu e sobrevive no Brasil sob o signo da
precariedade jurdica, social e econmica do controle dos meios de produo. Sobreviveu
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no perodo colonial, quase que exclusivamente nos interstcios das grandes plantaes.
Esta situao bem mais acentuada no Nordeste Brasileiro, bero do latifndio, onde a
agricultura familiar pode-se desenvolver para produzir alimentos para autoconsumo e
subsistncia dos trabalhadores e escravos, articulando-se ao mercado apenas para assegurar
a compra de outros bens que desoneravam os proprietrios das grandes plantaes.
Pode-se situar a agricultura familiar em trs linhas distintas: a) a nvel tecnolgico, em que
se atribui a ela menor eficincia, pois est apoiada no tradicionalismo e no uso restrito de
tecnologias ditas modernas; b) o tamanho das propriedades, que geralmente so
consideradas pequenas e inadequadas para uma economia de escala, ou incapazes de
enfrentar a concorrncia em mercados tecnologicamente e organizacionalmentecompetitivos; c) a contraposio de uma racionalidade econmica atribuda agricultura
capitalista ou patronal, a uma racionalidade social consagrada na unidade familiar de
produo, citadas por Lages (2001).
Partindo da explicao dessas trs linhas da agricultura familiar, Neves (1993) apud Lages
(2001) afirma como Lamarche que existe uma grande diversidade no universo familiar da
produo agrcola, e talvez por esta razo, e por incluir irrestritamente os agricultoresfamiliares no conjunto da chamada agricultura tradicional, historicamente, foi considerado
um entrave para o desenvolvimento agrcola, j que a modernizao implantada no Brasil
tambm teve por objetivo a sua superao, no a incorporando suposta modernidade que
a Revoluo Verde trouxe.
Embora a estratgia modernizadora adotada no Brasil e em outros pases em
desenvolvimento considerasse as propriedades patronais mais adequadas para implantaodo padro convencional, relegando a agricultura familiar a um segundo plano, Ehlers
(1999) explica que atualmente na transio para uma agricultura sustentvel a produo
familiar que apresenta uma srie de vantagens, seja pela sua escala menor, pela maior
capacidade gerencial, pela mo de obra mais qualificada, por sua flexibilidade e, sobretudo
por sua maior aptido diversificao de culturas e preservao dos recursos naturais.
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CAPTULO 3
AGRICULTURA SUSTENTVEL: O QUE SO OSSISTEMAS AGROFLORESTAIS SUCESSIONAIS?
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Captulo 3 Agricultura Sustentvel: O que so os Sistemas Agroflorestais Sucessionais 28
3.0 AGRICULTURA SUSTENTVEL: O QUE SO OS SISTEMAS
AGROFLORESTAIS SUCESSIONAIS
3.1 AGRICULTURA SUSTENTVEL
A busca de sustentabilidade nas aes da humanidade tem-se configurado como um grande
desafio neste sculo, pois emergente a necessidade de novos rumos na agricultura, visto
que esta uma atividade imprescindvel para a espcie humana. Neste captulo
apresentam-se conceitos de agricultura sustentvel, e situam-se os sistemas agroflorestais
sucessionais, tema deste trabalho.
Conforme Peneireiro (2004a), h diferentes formas de se fazer agricultura no mundo todo.
Todas elas tm por trs um paradigma, um conjunto de valores, e uma srie de
condicionantes, ecolgicas, sociais, econmicas e culturais, que levam a se fazer um
determinado tipo de agricultura em um determinado lugar. Essas formas de fazer
agricultura, umas consideradas arcaicas, outras modernas, podem passar por um
julgamento que possibilita elenc-las em uma escala de gradiente de sustentabilidade.
Para Ferraz (2003), o conceito de agricultura sustentvel abrange um amplo leque de
vises refletindo o conflito de interesses existentes na sociedade; congrega desde uma
maioria que v a possibilidade de uma simples adequao ao atual sistema de produo, at
aqueles que vem a possibilidade de promover mudanas estruturais.
Ehlers (1999) define a palavra sustentvel como originria do latim sus-tenere, usada em
ingls desde 1290, embora e as referncias ao termo sustentvel em relao ao uso da terra,dos recursos biticos, florestais e dos recursos pesqueiros sejam anteriores dcada de
1980, pois a partir da que a expresso agricultura sustentvel passa a ser empregada com
maior frequncia, assumindo tambm dimenses econmicas e scio-ambientais.
Muitas vezes as interpretaes convencionais do termo se confundem com a
perdurabilidade da produo e do mximo de rendimento; entretanto, qualquer que seja sua
definio deve levar em conta necessariamente as dimenses cultural e estrutural, segundoFerraz (2003).
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Captulo 3 Agricultura Sustentvel: O que so os Sistemas Agroflorestais Sucessionais 29
A partir desse momento, multiplicaram-se definies e explicaes sobre a agricultura
sustentvel. No entanto, todas incorporam os itens abaixo:
Manuteno a longo prazo dos recursos naturais e da
produtividade agrcola; o mnimo de impactos
adversos ao ambiente; retornos adequados aos
produtores; otimizao da produo das culturas com
o mnimo de insumos qumicos; satisfao das
necessidades humanas de alimentos e de renda; e
atendimento das necessidades sociais das famlias e
das comunidades rurais. (Ehlers, 1999, p. 103).
A agricultura, explica Lages (2001) significou a transformao de ecossistemas naturais
como as florestas em ecossistemas agrcolas, ou agroecossistemas; ao privilegiar uma ou
apenas algumas espcies no processo de obteno de biomassa til, estava o homem
iniciando um processo de biosimplificao, ou seja, a reduo da diversidade biolgica, que
se acelerou com o desenvolvimento do processo civilizatrio; pois a interveno na sucesso
ecolgica, reduzindo o nmero de espcies numa dada rea cultivada, quer atravs da enxadaou dos agroqumicos, um dos primeiros impactos ambientais da agricultura.
Impacto ambiental este que pode ser conceituado como qualquer alterao das
propriedades fsicas, qumicas e biolgicas do meio ambiente, causada por qualquer forma
de matria ou energia resultante das atividades humanas que direta ou indiretamente
afetam a sade, a segurana e o bem-estar da populao; as atividades sociais e
econmicas; a biota; as condies estticas e sanitrias do meio ambiente; a qualidadeambiental, conforme Verdum (1995).
Entretanto, aps a agricultura ter passado pelo extenso perodo caracterizado dos pousios
sucedidos pelos sistemas rotacionais e mistos da Primeira Revoluo Agrcola e finalmente
pelo padro produtivo disseminado pela Revoluo Verde, afirma Ehlers (1999),
provvel que a agricultura sustentvel venha a ser considerada uma nova fase na histria da
dinmica do uso da terra; nela, o uso abusivo de insumos industriais e de energia fssil
dever ser substitudo pelo emprego elevado do conhecimento ecolgico.
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Captulo 3 Agricultura Sustentvel: O que so os Sistemas Agroflorestais Sucessionais 30
Agricultura Sustentvel pode ser definida como uma agricultura ecologicamente
equilibrada, economicamente vivel, socialmente justa, humana e adaptativa, segundo
Reijntjes et al., (1992). Algumas definies de Agricultura Sustentvel incluem ainda:
segurana alimentar, produtividade e qualidade de vida, mas uma srie de outras
possibilidades existem. Por exemplo, Lehman et al. (1993) apud Marcatto (2004), optaram
pela nfase ao meio ambiente em sua definio de agricultura sustentvel. Para eles,
viabilidade econmica pode ser um objetivo social importante, mas esse um objetivo que
deveria ser encarado como independente dos objetivos da agricultura sustentvel.
Agricultura Sustentvel consiste em processos agrcolas, isso , processos que envolvam
atividades biolgicas de crescimento e reproduo com a inteno de produzir culturas,que no comprometam nossa capacidade futura de praticar agricultura com sucesso. Assim
pode-se dizer que Agricultura Sustentvel consiste em processos agrcolas que no
exaurem nenhum recurso que seja essencial para a agricultura.
Para o CGIAR-FAO (1988) citado por Reijntjes et al. (1992), a Agricultura Sustentvel o
manejo bem sucedido dos recursos agrcolas, satisfazendo s necessidades humanas,
mantendo ou melhorando a qualidade ambiental e conservando os recursos naturais.
Altieri (1999) define sustentabilidade como sendo a habilidade de um agroecossistema em
manter a produo atravs do tempo, face a distrbios ecolgicos e presses scio -
econmicas de longo prazo. Conforme Conway et al. (1990), a Agricultura Sustentvel a
habilidade de manter a produtividade, seja em um campo de cultivo, em uma fazenda ou
uma nao, face a stress ou choque.
Segundo Gtsch (1995) deve-se partir do princpio de que mais gratificante enriquecer o
lugar do que explor-lo, pois quando o local fica rico em vida, h excedentes, que geraro
recursos para os agricultores, sendo que uma agricultura sustentvel pressupe uma nova
relao ser humano-natureza, em que se