educaÇÃo para as relaÇÕes Étnico-raciais: aprendências para o ensino de geografia
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TCC GeografiaTRANSCRIPT
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO, POLÍTICA E SOCIEDADE
EDUARDO VALPASSOS MOTTA
HELENA AMANDA FALLER TAGARRO
JULIANA ALMEIDA SUBTIL
EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS:
Aprendências para o Ensino de Geografia
VITÓRIA/ES
2015
EDUARDO VALPASSOS MOTTA
HELENA AMANDA FALLER TAGARRO
JULIANA ALMEIDA SUBTIL
EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS:
Aprendências para o Ensino de Geografia
Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado
ao Departamento de Educação, Política e
Sociedade, do Centro de Educação, da
Universidade Federal do Espírito Santo, como
requisito para obtenção do grau de Licenciado
em Geografia.
Orientadora: Prof.ª Dra. Patrícia Gomes Rufino
Andrade
VITÓRIA/ES
2015
EDUARDO VALPASSOS MOTTA
HELENA AMANDA FALLER TAGARRO
JULIANA ALMEIDA SUBTIL
EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS:
Aprendências para o Ensino de Geografia
Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao Departamento de Educação, Política e
Sociedade, do Centro de Educação, da Universidade Federal do Espírito Santo, como
requisito para obtenção do grau de licenciado em Geografia.
Aprovado em _______________________
COMISSÃO EXAMINADORA
Prof.ª Dra. Patrícia Gomes Rufino Andrade
Universidade Federal do Espírito Santo
(Orientadora)
Prof.º Ms. Adriano dos Santos Batista
Universidade Federal do Espírito Santo
Prof.ª Ms. Vanessa Oliveira de Azevedo Rocha
Universidade Federal do Espírito Santo
AGRADECIMENTOS
Agradecemos a todos àqueles que, de certa forma, contribuiram para que este trabalho fosse
concluído.
Agradecemos aos nossos familiares – mãe, pai, irmãos, e tantos outros – que sempre
estiveram ao nosso lado, acreditando mesmo quando nós mesmos não acreditávamos mais e
nos dando apoio nos momentos em que mais precisamos.
Agradecemos aos nossos amigos, pelo carinho da amizade, pelo companheirismo e,
principalmente, por entenderem nossas ausências em certos momentos importantes para que
pudéssemos chegar até aqui.
Aos colegas de turma, agradecemos por momentos inesquecíveis juntos, brincadeiras,
distrações, intrigas, dentre outras coisas que ficarão em nossas memórias.
Agradecemos à professora Patrícia Gomes Rufino Andrade, por dispor do seu tempo e de seus
conhecimentos, por aceitar o desafio de nos orientar na realização deste trabalho.
Agradecemos aos demais professores que passaram por nossas vidas ao longo do curso, que
deixaram um pouco de seus conhecimentos e que acreditaram em nosso potencial.
Enfim, agradecemos a Deus por mais uma etapa conquistada, pois sabemos que não foi fácil,
mas que Ele sempre esteve aqui para nos ajudar. Agradecemos pela força e saúde que nos
concedeu para superar todas as dificuldades surgidas durante nosso caminho.
Se Zumbi, guerreiro-guardião
da senzala Brasil, pedisse a coroação.
Que por direito o cetro do quilombo
que deixou por aqui, nossa bandeira era
ordem, progresso e perdão
(Música 300 Anos do grupo Bom Gosto)
RESUMO
África, o berço da humanidade. A mesma África que é por vezes retratada como símbolo de
pobreza, sofrimento, escravidão. Um continente, onde habitam e habitaram as mais diversas
etnias, com suas culturas por vezes inferiorizadas ou até extintas pelos que se disseram
desenvolvidos há séculos atrás, processo que, infelizmente, permanece ainda hoje. Quais as
possibilidades, contudo, de se desmistificar tudo isso nas salas de aula? O presente trabalho
tem como base, a abordagem da Educação para as Relações Étnico-Raciais, a aplicação da Lei
10.639/03 no ensino de Geografia e sua obrigatoriedade no currículo escolar, propondo
práticas em sala de aula, visando potencializar nos alunos a curiosidade sobre o tema. Com
revisões bibliográficas de autores de campos para além da Geografia, um breve diagnóstico e
diálogo com professores e outros componentes do corpo escolar, este trabalho foi pensado
num viés transdisciplinar entre a Geografia e a Sociologia, numa abordagem dialogada com
os alunos em sala, utilizando mídias e provocando discussões acerca da temática em uma
escola do município de Vitória/ES. Como resultado, emergiram reflexões críticas a respeito
das próprias relações étnico-raciais, na escola e na vida dos alunos, que trouxeram para a
discussão suas vivências. E o que seria a Geografia senão essa reflexão sobre o espaço em que
se vive, bem como as relações nele contidas? Ficam aqui registradas nossas contribuições
acerca desse tema que é tão primordial, ao passo que às vezes, infelizmente, postergado no
cenário real de nossa educação. Verificamos, por outro lado, as possibilidades do trabalho em
sala de aula de promover uma formação crítico-reflexiva do aluno, nossa e do professor.
Palavras-chave: Relações Étnico-Raciais. População Negra. Ensino de Geografia.
ABSTRACT
Africa, the cradle of humanity. The same Africa that is sometimes shown as a symbol of
poverty, suffering, slavery. A continent where they inhabit and dwelt the most diverse ethnic
groups with their cultures sometimes subordinate or even extinguished by those who said they
were developed centuries ago, a process that unfortunately remains today. What are the
possibilities, however, to demystify all this in the classroom? This work is based on the
Education approach for Racial-Ethnic Relations, the application of Law 10.639/03 in the
teaching of Geography and its requirement in the school curriculum, proposing practices in
the classroom, oriented to enhance the students' curiosity about the theme. With the support of
literature review of authors not necessarily related to geography, a brief diagnosis and
dialogue with teachers and other components of the school body, this work was thought a
transdisciplinary bias between Geography and Sociology, a dialogue-based approach with
students in the classroom, using media and provoking discussions on the subject at a school in
the municipality of Vitória/ES. As a result, critical reflections emerged about the very ethnic-
racial relations in schools and in the lives of students who brought their experiences to the
discussion. And what would be geography but this reflection on the space in which we live as
well as the relationships therein? Are registered here our contributions on this subject that is
so crucial, whereas sometimes, unfortunately, delayed the real scenario of our education. We
note, however, possibilities to work in classroom in order to promote critical and reflective
training for students, for us and for teacher.
Keywords: Racial-Ethnic Relations. Black Population. Geography Teaching.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Mapa de localização da EEEM "Professor Fernando Duarte Rabelo" .................... 19
Figura 2: Espaço interno da EEEM "Professor Fernando Duarte Rabelo" - corredor com
acesso às salas de aula, banheiros e bebedouros, Vitória, 2015.. ............................................. 20
Figura 3: Espaço externo da EEFM “Professor Fernando Duarte Rabelo” – área de recreação
e práticas de aulas de Educação Física, Vitória, 2015.. ............................................................ 21
Figura 4: Mapa mental simples exposto nos slides para apresentação sobre o processo de
Divisão da África. ..................................................................................................................... 44
Figura 5: Primeiro momento da oficina, onde foi realizada uma breve contextualização
histórica. ................................................................................................................................... 45
Figura 6: Imagem capturada do seriado Cidade dos Homens, 2002 ....................................... 48
Figura 7: Produto final do grupo que abordou o tema sobre a população brasileira ser de
maioria negra, segundo dados do IBGE (2010). ...................................................................... 54
Figura 8: Produto final do grupo que abordou o tema Racismo ............................................. 54
Figura 9: Produto final do grupo que abordou o tema Favela e Racismo ............................... 55
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Gráfico de porcentagem de quanto tempo os professores da EEEM “Professor
Fernando Duarte Rabelo” tem de profissão.. ............................................................................ 36
Gráfico 2: Gráfico de porcentagem do tempo em que os professores lecionam na EEEM
“Professor Fernando Duarte Rabelo”. ...................................................................................... 37
Gráfico 3: Gráfico de porcentagem da formação acadêmica do corpo docente da EEEM
“Professor Fernando Duarte Rabelo”. ...................................................................................... 37
Gráfico 4: Gráfico de porcentagem referente à raça/cor que os professores se definem, com
base nos critérios do IBGE. ...................................................................................................... 38
Gráfico 5: Gráfico de porcentagem de professores que já presenciou cena de racismo em
alguma escola. .......................................................................................................................... 39
Gráfico 6: Gráfico de porcentagem de convivência com colegas racistas. ............................. 39
Gráfico 7: Gráfico de porcentagem de professores que trabalharam com a temática das
relações étnicas-raciais. ............................................................................................................ 40
LISTA DE SIGLAS
DCN Diretrizes Curriculares Nacionais
EEEM
EJA
Escola Estadual de Ensino Médio
Educação de Jovens e Adultos
ERER
IBGE
INEP
LDB
PCN
UFES
Educação para as Relações Étnico-Raciais
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
Parâmetros Curriculares Nacionais
Universidade Federal do Espírito Santo
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................... 12
1. A EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS – ERER ...................................... 17
1.1. CONHECENDO A EEEM “PROFESSOR FERNANDO DUARTE RABELO” ............................. 18
1.2. GEOGRAFANDO: POPULAÇÃO, TERRITÓRIOS, ABORDAGENS POSSÍVEIS PARA EDUCAÇÃO
DAS RELAÇÕES RACIAIS. CONCEITOS DE POPULAÇÃO E TERRITÓRIO .................................... 22
1.3. CONCEITO DE RAÇA E RACISMO...................................................................................... 23
1.4. A LEI 10.639/03 E A EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS - ERER ............. 24
1.5. A PRÁTICA DA EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS ................................... 26
1.5.1. Abordagens sobre currículo, ERER e o ensino de Geografia ........................... 26
2. CAMINHOS CONSTRUÍDOS ................................................................................................. 31
3. A PRÁTICA VIVENCIADA NO CAMPO DE PESQUISA ......................................................... 43
3.1. PRIMEIRO MOMENTO: CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DOS AFRICANOS E DA
POPULAÇÃO BRASILEIRA ....................................................................................................... 43
3.2. SEGUNDO MOMENTO: TERRITÓRIO E IDENTIDADE .......................................................... 46
3.3. TERCEIRO MOMENTO: PRATICANDO COM TEXTOS E DISCUSSÕES .................................. 49
3.4. RESULTADOS ALCANÇADOS - ANÁLISES ........................................................................ 50
3.5. AVALIAÇÃO DAS OFICINAS: DANDO VOZ AOS ALUNOS ................................................. 55
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................... 58
5. REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 61
5.1. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................... 61
5.2. BIBLIOGRAFIAS CONSULTADAS ....................................................................................... 63
ANEXOS .................................................................................................................................... 64
11
INTRODUÇÃO
12
INTRODUÇÃO
Há pouco mais de 120 anos, uma grande parte da população negra trazida para o Brasil e
escravizada, passou pelo processo final de Abolição da Escravatura, com a assinatura da Lei
Áurea, pela princesa Isabel, no ano de 1888. Lei esta que tornava “livres” todos os
escravizados, e dizemos “livre” no sentido de uma libertação dissimulada, já que a maioria da
população negra constituía-se de sujeitos de uma sociedade desigual e preconceituosa.
Infelizmente, o lado que ainda se apresenta nos livros didáticos, àquele que ensinamos aos
nossos alunos, permanece em partes o vivido na realidade no início da República. Ainda no
período escravista, a população negra vivia e convivia com seus senhores; ao fim da
escravidão e com o surgimento da República, essa mesma população, agora sem trabalho, foi
expulsa para as periferias (Maricato, 1997, p.30) onde se inicia uma nova história de lutas por
direitos sociais mais igualitários.
Tradicionalmente o ensino da História do Brasil nas escolas não tem levado em consideração
de maneira apropriada o papel dos africanos que para cá vieram. As lutas das populações
negras sempre se mostraram escondidas, exemplo das irmandades, significando que bem antes
de 1970 o Movimento Negro lutava pela inclusão de conteúdos sobre a cultura afro-brasileira
e a história da África nos currículos escolares, dominados por uma visão folclorizada do povo
negro em que se destacavam apenas questões pejorativas relativas àquele processo de
escravização e alguns aspectos culturais, geralmente visões preconceituosas em relação às
religiões de matriz africana. Os livros didáticos ainda reforçam essa visão intolerante e
discriminatória. Desta maneira, a Lei Nº 10.639/03, que altera a LDB 9394/96, traz a
obrigatoriedade do ensino da História e Cultura africana e afro-brasileira nas escolas de
Ensino Fundamental e Médio, representa uma grande conquista.
Embora somente em 2003 tenha se efetivado a criação de uma lei direcionada à Educação
para as Relações Étnico-Raciais, sua construção já havia iniciado há muitos anos. Como
abordado anteriormente, o Movimento Negro vinha desde antes da década de 1970
reivindicando seus direitos em diversos âmbitos sociais, inclusive na educação. Porém, no ano
de 2001, na cidade de Durban, África do Sul, foi realizada a III Conferência Mundial Contra o
Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, o qual foi elaborado,
em comum acordo entre os Estados participantes, um documento que serviria como base para
que os mesmos pudessem tomar suas medidas em relação ao tema do encontro. Trata-se de
uma Declaração que posteriormente deu início a um Plano de Ação que viabilizaria o
13
compromisso firmado entre os Estados Mundiais para o fim do racismo e qualquer outra
forma de discriminação racial.
A seguir, temos um ponto de recomendação da Declaração e Programa de Ação adotados na
III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e
Intolerância Correlata (2001, p. 49):
118. Insta as Nações Unidas, outras organizações internacionais e regionais e os
Estados a compensarem a minimização da contribuição da África para a história do
mundo e da civilização através do desenvolvimento e implementação de programas
de pesquisa, educação e comunicação de massa abrangentes e específicos para
disseminarem de forma ampla uma visão equilibrada e objetiva da importante e
valiosa contribuição da África para a humanidade;
Conforme observamos no art. 118, o Brasil passa a participar de um acordo multilateral em
que se compromete em elaborar projetos e programas educacionais e comunicativos,
valorizando os povos africanos, de modo a compensá-los pelas diversas contribuições
forçadas dadas à humanidade.
Considerando a educação como um fator fundamental para a vivência plena da cidadania,
afirmamos a importância de novas leis que incluam parte da população que outrora foi
mantida exclusa, a exemplo dos afro-brasileiros1. Tal população, vale dizer, fora responsável
por boa parte da construção deste país, e hoje seus descendentes lutam para esse
reconhecimento (ADOLFO, 2012, p.17).
Acerca da produção e reprodução dessa discriminação, Jaccoud (2012, p.133) nos mostra que,
O processo de produção e reprodução da desigualdade racial não corresponde a um
fenômeno simples, seja em termos de causalidades ou de consequências. Se suas
origens remontam ao processo histórico de afirmação da supremacia racial branca
durante os quase quatro séculos em que o país conviveu com a escravidão, esse
processo foi reafirmado em novas bases após a abolição.
Pela análise de Jaccoud, vivemos em uma sociedade desigual e individualista, por isso
compreende-se que devem haver lutas buscando soluções para essa desigualdade. Assim
como afirma Bobbio (apud. Boto, 2005, p. 787): “[...] os direitos não nascem todos de uma
vez. Nascem quando devem ou podem nascer”. O autor considera ainda que as diferenças
nascem do clamor pela igualdade dos povos, ou seja, a igualdade aí descrita está atrelada à
igualdade de direitos, e quando se busca essa equidade, evidenciam-se as diferenças.
1 Os afro-brasileiros no qual estamos nos referindo neste trabalho são os descendentes dos africanos trazidos e
escravizados aqui no Brasil e, por conta de suas condições sociais, sofreram – e ainda sofrem – com
discriminação e racismos.
14
É fato já identificado em pesquisas que a maior parte da população negra africana fora do
continente de origem está no Brasil e, consequentemente, a diversidade cultural trazida por
esses povos, na diáspora é muito forte especialmente na região nordeste. A cultura brasileira
se baseia, principalmente, nesta miscigenação de raças2 trabalhada por Munanga (2008), que
vai inicialmente dos indígenas, passando pelos europeus e africanos. Contudo, pensar a
cultura africana no Brasil só foi possível academicamente a partir de meados do século XIX,
pois anteriormente eram proibidas todas as formas de manifestações, rituais e costumes dessa
população que aqui residiam. No entanto somente no século XX ampliam-se quantitativo de
publicações desvelando registros antigos e mesmo assim de maneira ainda não satisfatória, a
contar pelos poucos registros históricos dos negros açoitados, das senzalas desumanas. Ainda
que a educação brasileira aborde de maneira muito resumida e superficial essa parcela
fundamental da história e formação é necessário, para enfrentamento ao racismo que se
apresenta de maneira estrutural em nossa sociedade, que nos aprofundemos.
A ausência, ou a pouca importância de conhecimento de uma História Africana, retira a
oportunidade dos afro-brasileiros em constituírem uma identidade positiva sobre suas origens.
Essa ausência, infelizmente, abre espaço para atos de violência, desinformadas ou racistas,
criando assim um terreno fértil para a produção e difusão de ideias errôneas sobre a própria
origem dos negros brasileiros, e ainda, não podemos esquecer que a discussão raça e ações
reparadoras no Brasil, é uma discussão de poder. A carência do estudo da História Africana
coloca as apresentações dos continentes e das diversas culturas de nível mundial em
desigualdade de informação, pois os conteúdos apresentados pela educação e encontrados nos
currículos induzem a ideia de que a essa história não existe ou que ela não faz parte do
conhecimento a ser transmitido. Por conta dessas carências, é necessário, e importante, que o
ensino de Geografia faça a sua parte, ajudando a mudar esse cenário desigual na educação
brasileira.
Percebendo toda essa dificuldade para abordarmos a temática, resolvemos propor através
deste estudo, algumas possibilidades para trabalho com a população afrodescendente na
construção do território brasileiro, destacando a grande importância e a valorização das
culturas negras, no âmbito escolar, criando espaços para futuras manifestações artísticas a
partir de nossa prática escolar. Por tratar-se de um Trabalho de Conclusão de Curso de
2 Quando nos referimos às diferentes raças, tomamos como base o princípio dos problemas sociais enfrentados
no Brasil, entre eles o racismo. Claro que temos apenas uma raça, a humana, no entanto as diferenças sociais
abalam os pilares da sociedade brasileira, entre essas bases as diferenças raciais.
15
Licenciatura em Geografia, promoveremos uma discussão em torno da população negra e sua
contribuição para a formação do povo brasileiro, bem como abrimos um leque de reflexões
em torno da diversidade cultural (territórios culturais, práticas educativas) existentes em nosso
país, a fim de que essa mesma diversidade seja respeitada e valorizada.
O objetivo, portanto, deste trabalho, é de propor uma prática de ensino que possibilite aos
alunos uma visão mais ampla e justa acerca da população negra e das diversidades culturais
existentes no Brasil. Além disso, no campo das teorias, temos como proposta contribuir para o
aumento do debate sobre os estudos da Educação para as Relações Étnico-Raciais no ensino
de Geografia, pois ainda entendemos como uma área de estudo em crescimento no país. Este
presente trabalho, vale ressaltar, configura-se como uma parte de um processo em constante
construção. Durante revisões, entrevistas, questionários e vivências na escola, encontramo-nos
em um processo de aprendência profissional e pessoal, entendendo que nossa formação tanto
como cidadãos, quanto como componentes de uma sociedade, nunca está totalmente fechada,
pronta.
Dessa forma, este trabalho foi dividido em três capítulos seguindo uma ordem de importância
e cronologia. No primeiro capítulo trouxemos uma abordagem teórica, debatendo a
importância da Educação para as Relações Étnico-Raciais, da Lei Nº 10.639/03 e sua prática
através das demandas curriculares. Além disso, apresentamos alguns conceitos fundamentais
para nos auxiliar na construção de nossa oficina de ensino: os conceitos de raça, racismo,
população e território.
No segundo capítulo apontamos nossas metodologias, os caminhos que seguimos para
construir este trabalho. O terceiro e último capítulo, por sua vez, tem uma abordagem
diferenciada, pois trata-se da parte prática de nosso trabalho. É nele que apresentamos a nossa
proposta de prática de ensino, o passo a passo de nossa oficina pedagógica, bem como uma
breve explicação do que seria essa oficina. Após esse capítulo apresentamos as considerações
finais em que trataremos das visões trazidas pelos alunos, bem como algumas questões que
nos foram frequentes durante a execução das atividades.
16
CAPÍTULO 1
A EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES
ÉTNICO-RACIAIS – ERER
17
CAPÍTULO 1
1. A EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS - ERER
“Não entendia como a vida funcionava, discriminação por causa da sua classe, sua cor”, já
entoava Renato Russo em música intitulada Faroeste Caboclo, que retrata a história de um
rapaz negro em sua jornada de vida, composta em 1979. Incrível é perceber como o verso de
uma canção da década de 1970 nos parece tão atual. Essa discriminação perpassa, até os dias
de hoje, não apenas por classe, cor e religião, mas também por gênero, sexualidade. Ora, mas
então o que seria de fato discriminação? E por que é tão importante a discussão ou o
conhecimento de outros termos tais como raça e racismo? Pensando nisso, neste capítulo
inicial faremos uma abordagem mais conceitual, com algumas definições dos termos
abordados neste trabalho.
O objetivo do trabalho a ser desenvolvido, perpassa evidentemente pelo respeito e
atendimento a Lei Nº 10.639/03, que determina a obrigatoriedade do Ensino da História da
África e dos Africanos no Currículo Escolar das modalidades do Ensino Fundamental e
Médio. Dessa forma apresentamos possibilidades para o ensino de Geografia na abordagem
desse tema em sala de aula, passando por todo o contexto histórico, discussões acerca de
população e território, afim de contribuir para o enriquecimento do pensamento crítico dos
alunos acerca dessas questões nas relações étnico-raciais. Há de se ressaltar que, infelizmente,
muitas vezes a lei é mal interpretada quanto à sua obrigatoriedade em todo o currículo.
Aplicada à temática da história, arte e cultura, não significa de forma alguma que tal
obrigatoriedade se insira somente nas disciplinas de História e Artes. A temática deve sim ser
estendida a todas as áreas do conhecimento. Da mesma forma como a Geografia trabalha o
espaço multifacetado e nele as relações sociais, em algumas proposições focando aspectos
culturais e populacionais como foram dados aqui como exemplo, outras áreas como
Sociologia, Biologia e Matemática podem (e devem) empenhar-se em cumprir a
determinação, agora legal, utilizando também um de seus conceitos chaves. Colocaremos em
prática a Lei Nº 10.639/03 na intenção da construção de uma sociedade mais justa, que
respeita as diversidades e direitos sociais, uma sociedade que busca conhecer as origens
culturais da formação e criatividade desse povo na qual ela faz parte, o povo brasileiro.
As abordagens sobre o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e africana previstos no
livro Orientações e Ações para a Educação para as Relações Étnico-Raciais, apontam a
18
necessidade em valorizar as múltiplas linguagens presentes no mundo jovem. Entre elas
podemos citar, textos e narrativas das comunidades, letras de música, cartuns, quadrinhos,
entre outros. Essas linguagens, prenhas de informações sobre a questão racial, pode ampliar o
interesse dos jovens em conhecer uma outra proposta de História, ainda pouco conhecida por
eles. Para reconhecer-se, identificar-se negro, é necessário valorizar essa história. Todas as
crianças e jovens querem assemelhar-se aos bons frutos da história, ou seja, a seus heróis, não
a imagens que minimizem ou desacreditem quem realmente são. Dessa forma,
[...] reconhecer exige que se questionem relações étnico-raciais baseadas em
preconceitos que desqualificam negros e salientam estereótipos depreciativos,
palavras e atitudes que, velada ou explicitamente violentas, expressam sentimentos
de superioridade em relação aos negros, próprios de uma sociedade hierárquica e
desigual [...] (BRASIL, 2010, p.233)
Os conceitos pensados aqui visam esclarecer que caminhos tomamos quando nos colocamos a
refletir sobre essas abordagens no Ensino Médio, suas considerações e prescrições
curriculares. Apresentamos a seguir os conceitos teóricos trabalhados durante a organização
deste projeto, iniciando pela apresentação da EEEM “Professor Fernando Duarte Rabelo”.
1.1. CONHECENDO A EEEM “PROFESSOR FERNANDO DUARTE RABELO”
A escola escolhida é a EEEM “Professor Fernando Duarte Rabelo”, situada numa área nobre
do município de Vitória (Figura 1). Embora sua localização esteja num bairro de classe mais
alta, por se tratar de uma escola pública, ela atende alunos tanto de classe mais baixa até os de
classe média. Porém, vale também dizer que, como tantas outras escolas, há uma presença
marcante de diversidades culturais, e isso nos ajudará a construir nossa prática, bem como
aumentará a possibilidade de ter uma boa discussão sobre o tema proposto.
Essa é uma escola de Ensino Médio Regular e de Ensino Médio Integrado ao Técnico, ou
seja, oferece oportunidade aos alunos de cursar juntamente ao ensino médio um curso técnico
nesse caso de Rede de Computadores, promovendo dessa maneira a articulação entre
formação geral e educação profissional.
19
Figura 1: Mapa de localização da EEEM "Professor Fernando Duarte Rabelo"
20
De acordo com o Data Escola Brasil de 2015 (uma espécie de censo escolar promovido pelo
INEP), a EEEM “Professor Fernando Duarte Rabelo” iniciou o ano de 2014 com 1113 alunos
regularmente matriculados, sendo 748 no ensino médio regular e 365 no ensino médio
integrado. Esses alunos são de todas as partes da Região Metropolitana da Grande Vitória,
com muitos se deslocando para a escola através do sistema Transcol (transporte coletivo).
Possui salas de aula mistas, tanto em relação ao gênero, quanto em relação às condições
sociais; por tais características essa escola foi escolhida, além de ser de fácil acesso e de
localização privilegiada (Figuras 2 e 3). Desta forma, faremos uma proposta de como aplicar a
Lei Nº 10.639/03 para esse tipo de público, utilizando um conceito de Geografia.
Figura 2: Espaço interno da EEEM "Professor Fernando Duarte Rabelo" - corredor com acesso às salas
de aula, banheiros e bebedouros, Vitória, 2015. Foto: Autores.
21
Figura 3: Espaço externo da EEFM “Professor Fernando Duarte Rabelo” – área de recreação e práticas
de aulas de Educação Física, Vitória, 2015. Foto: Autores.
Considerando as diferentes formas de organização das escolas públicas no Espírito Santo,
consideramos que na EEEM “Professor Fernando Duarte Rabelo”, os alunos dispõem de um
espaço educativo atraente por apresentar em sua infraestrutura um ambiente verde bem
acolhedor, com muitas árvores, bancos e mesas para rodas de conversas informais, além de
espaço para práticas esportivas, como voleibol e futebol.
O professor colaborador que nos deu suporte para ministrar as aulas e que, ao mesmo tempo,
abriu mão de algumas delas para nos ajudar a construir este trabalho, também leciona a
disciplina de Sociologia para a mesma turma. Isso para nós é muito importante, pois vimos aí
uma oportunidade de não somente elaborar uma prática para ensinar Geografia, mas de
transformar essa prática em aulas interdisciplinares. Em meio a essa transdisciplinaridade,
trabalhando o conceito geográfico de População, abordaremos questões sobre a formação do
povo brasileiro, como dito anteriormente, tendo como base o antropólogo brasileiro Darcy
Ribeiro; assim, as aulas terão caráter tanto de Geografia quanto de Sociologia e Historia.
22
1.2. GEOGRAFANDO: POPULAÇÃO, TERRITÓRIOS, ABORDAGENS POSSÍVEIS PARA EDUCAÇÃO
DAS RELAÇÕES RACIAIS. CONCEITOS DE POPULAÇÃO E TERRITÓRIO
Realizamos buscas entre alguns autores que nos ajudaram a compor alguns conceitos,
como Haesbaert (2010) que discute território, Santos (2005) que discute racismo, e
outros que se encontram presentes neste texto. Porém, no âmbito prático do trabalho,
além das pesquisas qualitativas – como entrevista com o professor colaborador,
questionários aplicados aos profissionais da educação da escola objeto e os depoimentos
coletados dos alunos – compreende também como metodologia as observações de campo
e a própria aplicação da oficina pedagógica em uma turma do Ensino Médio.
O conceito geográfico escolhido foi de “População”, por considerarmos entre o grupo o que
melhor condizeria com a temática das relações étnicas, uma vez que a mesma nos deu
abertura para o trabalho da formação da população brasileira, suas matrizes e origens das mais
diversas etnias. Trabalharemos com a turma de 2º Ano do Ensino Médio, turma indicada pelo
próprio professor colaborador.
Os dois conceitos aqui apresentados nesse momento são fundamentais para a base teórica
geográfica deste trabalho, visando nos apropriarmos deles para o desenvolvimento da
temática proposta. A população e seu território, muito embora apresentados em diferentes
dimensões, configuram-se geralmente em uma mesma região geográfica. Daí, entendemos
que esses conceitos são quase que indissociáveis, por isso apresentaremos os dois em um
mesmo tópico.
Considerada como um grupo de pessoas que vive em uma porção de determinado território, o
conceito de população já traz em si a implicação quanto ao território e, subjetivamente, à
territorialidade. Beaujeu-Garnier (1980) discute em sua obra Geografia da População, em que
aspectos como demografia e movimentos populacionais são abordados segundo uma
perspectiva tanto quantitativa quanto qualitativa da população em geral. Quando pensamos
em população, também nos vem à cabeça aspectos sociais entre eles culturais e religiosos, que
imprimem certa característica a esta população e, consequentemente, ao território que
ocupam.
Esse território, segundo Ratzel (1990) e Raffestin (1993), é fruto de uma relação do homem
no espaço e o poder exercido sobre o mesmo, definido assim por Raffestin como
23
O território [...] é um espaço onde se projetou um trabalho, seja energia e
informação, e que, por conseqüência, revela relações marcadas pelo poder. O espaço
é a “prisão original”, o território é a prisão que os homens constroem para si
(RAFFESTIN, 1993, p. 50)
O território, não deve ser, porém, visto unicamente como esse espaço físico de poder.
Segundo Santos,
É o uso do território, e não o território em si mesmo, que faz dele objeto da análise
social. Trata-se de uma forma impura, um híbrido, uma noção que, por isso mesmo,
carece de constante revisão histórica. (SANTOS, 2005, p.255)
Dessa forma, o estudo do território perpassa não somente por seu espaço físico e sua
ocupação, mas primordialmente em como é feita tal ocupação, como estes sujeitos estão
dispostos nele, que relações estabelecem e que história contam a partir de suas intervenções
na própria paisagem. É o que Haesbaert (2011) coloca como as perspectivas do território, em
que suas concepções podem ser naturalistas, econômica, políticas e culturais. A maneira como
esses agentes afirmam sua territorialidade, ou seja, afirmam-se naquele espaço, quando o
autor coloca que
Territorializar-se, desta forma, significa criar mediações espaciais que nos
proporcionem efetivo poder sobre nossa reprodução enquanto grupos sociais (para
alguns também enquanto indivíduos), poder este que é sempre multiescalar e
multidimensional, material e imaterial, de dominação e apropriação ao mesmo
tempo. (HAESBAERT, 2011, p. 97)
Esses conceitos serão pensados no sentido de trazer algumas partes “historicizando” a
ocupação territorial dos negros africanos, e em parte justificando algumas relações de espaço,
pobreza e organização social e em outras. A utilização desses conceitos é fundamental tanto
para o aporte teórico quanto para a efetivação da prática em sala de aula proposta nesse
trabalho, uma vez que o contexto histórico que influencia até hoje as relações étnico-raciais
perpassa por essa perspectiva de população, território e poder sobre o mesmo.
1.3. CONCEITOS DE RAÇA E RACISMO
Partimos aqui do princípio que para a compreensão de “homem” em suas várias interpretações
sociais e filosóficas faz parte de uma única espécie, a humana, e nesse sentido,
biologicamente fazemos parte da raça humana. Como divulgado em próprio documento da
Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do governo
24
O termo raça, sob o prisma biológico, é inapropriado para aplicação em seres
humanos. As variações biofisiológicas na espécie humana limitam-se ao plano da
aparência física – os fenótipos – e decorrem de necessidades orgânicas (condições
ambientais ou climáticas, proteção dos raios solares), inscritas na cadeia genética de
grupos da espécie espalhados por todas as regiões e respectivos tipos de clima do
planeta. (SILVA JR E SILVA, 2010, p. 49).
O termo raça é utilizado, muitas vezes, como um fundamento e construção social,
representando essa diferença de fenótipos. E essa manutenção, esse racismo, está fortemente
presente em nossa sociedade. Como já dizia Santos (2005, p. 9),
O racismo, entretanto, não é só uma atitude [...]. O racismo é, também, uma teoria,
defendida em livros e salas de aulas com argumentos e teses ‘científicas’. Para
brigar contra ele será preciso, antes, desmontar esses argumentos e teses.
Uma defesa de teorias, que é muitas vezes utilizadas para a dominação de outras, que por
vezes são consideradas como ‘inferiores’, como uma tentativa de justificar certas atitudes,
como o exemplo claro do período colonial, onde a cultura europeia ‘superior’ foi disseminada
pelo mundo, dominando e dizimando as demais.
E quando há um julgamento prévio uma opinião emitida sem o conhecimento do assunto, o
preconceito é instaurado. Muito ligado ao racismo, quem nunca ouviu afirmações sobre
terreiros e casas de umbanda, sem que a pessoa formadora da opinião nunca tivesse sequer
visitado o local ou lido sobre o mesmo, e taxando-o negativamente? Discriminação,
preconceito, racismo... doenças de uma sociedade, que a todo momento tenta impor a todos
um padrão a ser seguido, a ser vivido, condenando quem ali não se encaixa.
1.4. A LEI Nº 10.639/03 E A EDUCAÇÃO PARA RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS - ERER
A elaboração da Lei Nº 10.639/03 foi um grande marco na história da educação brasileira,
pois esta, segundo Santos (2010, p. 2) “busca inserir novos conteúdos, visando à correção
histórica de um currículo oficial que manteve silêncio sobre a cultura e as raízes ancestrais de
parte considerável da população brasileira”. A proposta desta lei, ainda segundo Santos, era de
integrar essa população excluída durante anos, de modo que ela pudesse se sentir pertencente
a essa nação, além de terem orgulho de seu passado histórico e não somente piedade. Com o
pensamento de integralização, buscamos em autores do campo da pedagogia, geografia e
antropologia fundamentos de como a educação pode ser transformadora e libertadora, e de
como integrar sujeitos que historicamente foram excluídos.
25
Buscando em Paulo Freire a noção dessa pedagogia libertadora, observamos a importância
dessa lei no âmbito não somente escolar, mas principalmente como algo que contribuirá na
formação social do aluno, para além-sala de aula, por assim dizer. A partir do momento em
que essa temática das relações étnico-raciais não for somente abordada, mas discutida com os
alunos, os mesmos passam a não mais observar a realidade, mas ao mesmo tempo em que
observam, interagem e desenvolvem capacidade crítica sobre a mesma. Pensando dessa
maneira, um dos questionamentos propostos neste trabalho seria despertar nos alunos
exatamente essa crítica, de como uma parte de nossa própria história, da formação do povo e
cultura brasileira puderam ser por tanto tempo praticamente omitidas das/nas salas de aula,
inclusive porque ainda há tanto incômodo para propor e trabalharem os currículos incluindo
essas reflexões.
Nas múltiplas formações do povo brasileiro, como discute o antropólogo Darcy Ribeiro em
sua obra homônima, se faz necessário trabalhar nas escolas, sob um olhar mais igualitário,
mais democrático as raízes de nossa população. As matrizes negras foram de importância
fundamental para a construção dessa cultura brasileira, e essa temática deve sim estar presente
nos conteúdos abordados, seja em História, Artes, Geografia ou outras disciplinas. No mesmo
viés que Darcy Ribeiro, o geógrafo Paul Claval faz uma discussão acerca da cultura brasileira
abordando, inclusive, questões como identidade e relações sociais.
Ainda pensando sobre a pedagogia e a democratização da educação como um verdadeiro
instrumento social, José Carlos Libâneo muito esclarece sobre o papel da escola na formação
cidadã do aluno a partir das práticas pedagógicas escolares, quando observa que não há um
fazer por fazer pedagógico, mas um fazer crítico, buscando um questionamento contínuo
acerca dessa própria prática. A promulgação da Lei Nº 10.639/03, fruto de luta contínua dos
movimentos, ultrapassa essa questão do fazer pedagógico e, ao mesmo tempo, a pedagogia
libertadora de Paulo Freire quando, em sala de aula, desperta-se o pensar de forma crítica nos
alunos.
A práxis, porém, é reflexão e ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo.
Sem ela, é impossível a superação da contradição opressor-oprimido. Desta forma,
esta superação exige a inserção crítica dos oprimidos na realidade opressora, com
que, objetivando-a, simultaneamente atuam, sobre ela. (FREIRE, 1982, p. 40)
26
1.5. A PRÁTICA DA EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS
Já se passaram mais de 10 anos desde a promulgação da Lei Nº 10.639, tornando obrigatório
o ensino da cultura e história africana e dos afro-brasileiros nas escolas, e mesmo assim, a sua
aplicação continua sendo um desafio. O mais interessante é que esta lei já foi reformulada em
2008, passando para Lei Nº 11.645 inserindo também a história e cultura dos indígenas mas,
infelizmente, as alterações em torno de suas práticas foram mínimas, permanecendo
desafiantes. Nem mesmo os livros didáticos, que são material básico de alunos e professores,
trazem consigo discussões mais adequadas acerca do tema. O foco deste trabalho, porém,
atrela-se somente à Lei 10.639/03, visto que o objetivo central da discussão é o racismo de
negritude. Para tanto, trabalha-se apenas a lei que trata da inserção da história e cultura
africana nos currículos escolares.
Embora tenham sido poucas as mudanças no cenário da educação que dizem respeito à prática
de ensino das relações étnico-raciais, não podemos menosprezar o que já foi e o que está
sendo feito ao longo dos anos. Professores estão se mobilizando e buscando alternativas
diversas para por em prática a lei, para se trabalhar a educação das relações étnicas com seus
alunos. Estudos nessa área crescem cada vez mais, mostrando diferentes possibilidades e
resultados, apresentando as dificuldades, mas também as conquistas alcançadas até aqui,
dentre elas podemos citar, as Diretrizes Curriculares, o Plano Nacional, Programa UNIAFRO,
Pesquisas, Publicações, Materiais Paradidáticos entre outros.
Quando falamos em por em prática a lei, ou trabalhar a educação das relações étnico-raciais,
não estamos nos referindo apenas a questões de cunho racial ou discriminatório; é evidente
que a discussão de tais assuntos é fundamental. Porém, há vários conteúdos de diferentes
áreas de conhecimento que são passíveis dessa prática de ensino. Como exemplo, elaboramos
uma proposta interdisciplinar de trabalho, que busca abordar o assunto das relações étnicas
dentro do conteúdo de População muito importante na área de Geografia. Tal conteúdo vale
lembrar, é apresentado aos alunos de maneira muito corriqueira, mostrando que importam
mais os índices e taxas populacionais que a própria estrutura e formação dessa mesma
população. Desta forma, propomos uma prática de ensino das relações étnico-raciais baseado
no conteúdo de População contido na área de conhecimento de Geografia, mas entendendo
que esta abordagem pode ser usada em todas outras disciplinas, principalmente se
considerarmos a formação do povo brasileiro.
27
1.5.1. Abordagens sobre currículo, ERER e o ensino de Geografia
Anterior à apresentação de nossa proposta de prática escolar, faremos uma pequena
abordagem a respeito de currículo, já que esta construção é necessária por orientar as
diferentes modalidades de ensino, a organização escolar e de certa forma é intencionalmente
implementado no cotidiano escolar, pois “o currículo é sempre o resultado de uma seleção: de
um universo mais amplo de conhecimentos e saberes seleciona-se aquela parte que vai
constituir, precisamente, o currículo” (SILVA, 1999, p.15). Além disso, o currículo está
presente nas políticas educacionais, o qual delibera o que deve ser ensinado e como deve ser
ensinado. O exemplo disso é a própria lei objeto de estudo deste trabalho, que impõe a prática
de ensino da história e cultura africana e afro-brasileira.
De acordo com Silva (1999), o currículo vai além de uma simples forma de organização da
educação, ele compreende também como uma relação de interesses, pois como é ele quem
orienta as práticas de ensino, bem como as formas de organização escolar, ele pode ser
alterado de acordo com os interesses do Estado e de quem o elabora. Por isso a importância
das lutas sociais em busca de uma educação mais igualitária e por isso a promulgação da Lei
Nº 10.639/03 como uma conquista para toda a sociedade.
No cenário nacional, encontramos a Lei Nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação),
que regulamenta toda a educação brasileira, seja pública ou privada. A partir dela foi
elaborado um documento curricular, que estabelece “a base nacional comum, responsável por
orientar a organização, articulação, o desenvolvimento e a avaliação das propostas
pedagógicas de todas as redes de ensino brasileiras.” (BRASIL, 2013, p. 4). Trata-se das
Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN). Neste documento podemos encontrar as diretrizes
para as Educações Técnicas, do Campo, Ambientais, em Direitos Humanos, das Relações
Étnico-Raciais, Quilombolas e Indígenas, bem como para Educação Infantil, o Ensino
Fundamental e Médio, Educação Especial e Educação de Jovens e Adultos (EJA).
A partir das DCN's, o Ministério da Educação produziu um novo documento de orientação
curricular, porém mais específico, trazendo uma abordagem mais direcionada ao professor e
permitindo a ele uma maior liberdade. Estamos nos referindo aos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN), que segundo INEP (2011) “foram elaborados para difundir os princípios da
reforma curricular e orientar os professores na busca de novas abordagens e metodologias”.
Ainda de acordo com INEP, os PCN’s apresentam uma visão de currículo mais dinâmico, um
28
currículo que está sempre em transformação e “deve ser compreendido como um processo
contínuo que influencia positivamente a prática do professor” (INEP, 2011).
Os PCN's trazem para a área de conhecimento de Geografia alguns conceitos-chaves “como
instrumentos capazes de realizar uma análise científica do espaço” (BRASIL, 1997, p.32).
Tendo o espaço geográfico como o principal objeto de estudo da Geografia, busca-se nos
conceitos uma forma de compreender melhor este mesmo espaço. Os conceitos-chaves da
Geografia, por sua vez, organizados nos PCN's (1997), são: paisagem, lugar, território e
territorialidade, globalização, técnica e redes. Dentre os conceitos apresentados, os de
território e territorialidade serão trabalhados em nossa prática de ensino junto com o conteúdo
de população, nos baseando nas competências e habilidades propostas nos PCN's para
Geografia de Contextualização Sócio-Cultural.
Como apresentado anteriormente, os DCN's servem apenas como uma orientação para as
demais redes de ensino, desta forma, cabe aos estados e municípios criarem sua versão de
currículo que atenda mais à realidade de seus alunos. Assim, o estado do Espírito Santo
elaborou em 2009, através de sua Secretaria de Estado da Educação o Currículo Básico da
Escola Estadual.
Nele, assim como os PCN's, encontramos orientações curriculares para cada etapa de
escolarização (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio), assim como há também
orientação para as modalidades de ensino, como a Educação de Jovens e Adultos, Educação
Especial, Educação do Campo, Educação Ambiental, Educação Indígena e, por fim, Educação
para as Relações Étnico-Raciais.
No subcapítulo sobre a Educação para as Relações Étnico-Raciais, o Currículo Básico da
Escola Estadual inicia fazendo uma breve contextualização com a população brasileira- que é
majoritariamente negra, e continua explanando a relevância de abordar essa temática em sala,
uma vez que “o Brasil é um país pluriétnico e multicultural” (ESPÍRITO SANTO, 2009, p.
42). O currículo ainda aborda sobre a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-
brasileira, por meio da Lei 10.639/03, e busca explicar o sentido de se trabalhar essa temática
que mexe muito com a identidade e sentimento das pessoas, assim ele descreve:
Ensinar a história e cultura afro-brasileira é considerar as políticas de ações
afirmativas como resposta às demandas da população afrodescendente, por meio de
políticas públicas de reparação, reconhecimento e valorização dos aspectos
histórico-cultural-identitários desse segmento populacional. É promover o debate
29
sobre as diferentes etnias que compõem o povo brasileiro, procurando superar a
lógica pautada no pensamento eurocêntrico e americano do não-reconhecimento de
outras culturas étnicas: indígenas, africanas e asiáticas. (ESPÍRITO SANTO, 2009,
p. 43)
As DCN’s apontam a necessidade de ensinar essa história para que se possa valorizar o
que foi desprezado e esquecido por muitos anos. Podemos entender que desconstruir
preconceitos é valorizar a identidade de uma parcela da população que sofre com o
racismo; enfim, trabalhar com Educação Étnico-Racial afro-brasileira é reescrever a
nossa história e entender que a diversidade está presente dia a dia de nossas vidas.
30
CAPÍTULO 2
CAMINHOS CONSTRUÍDOS
31
CAPÍTULO 2
2. CAMINHOS CONSTRUÍDOS
Pensamos em alguns caminhos a serem percorridos, e nos colocamos a percorrê-los. Tais
caminhos, constituídos metodologicamente levam em consideração a forma em que a temática
das relações étnicas estão sendo apresentadas nas escolas de Ensino Médio; mais
especificamente na EEEM “Professor Fernando Duarte Rabelo”, nossa escola objeto. A
realização de um diagnóstico realizado através de entrevista e questionários nos permitiu
pensar na proposta de prática em sala de aula como um processo elaborativo e colaborativo a
partir das próprias histórias narradas pelos sujeitos da pesquisa.
A partir da entrevista elaborada com professor Roberto Marcio da Silveira, considera
[...]eu acho que primeiro a gente precisa pensar a educação no passado. A gente
precisa compreender que a escola sempre teve um papel elitista na sociedade e nas
escolas, por exemplo, mais tradicionais, quem tinha acesso à educação eram pessoas
de classe alta, classe média alta que conseguiam chegar.... e também pessoas de pele
clara. (Informação verbal, Roberto Marcio da Silveira)3
Pelo que narra o professor colaborador, e pelo que foi notado na aplicação dos questionários,
o nosso grande desafio são as reflexões acerca da importância da Geografia como uma ciência
social (BRASIL, 1997), sendo uma disciplina fundamental na formação da cidadania de
nossos alunos, que apresenta uma heterogeneidade singular na sua composição étnica,
socioeconômica e na distribuição espacial.
Nosso trabalho inicia-se com um diagnóstico acerca das necessidades de se trabalhar com
Educação Étnico-Racial. Essa abordagem foi pensada com o professor da disciplina, para
sabermos como era o seu “pensar” acerca da atividade que propusemos. Foi a partir desse
diagnóstico que nossa proposta foi construída. Inicialmente com revisão bibliográfica,
que a todo o momento foi retomada durante as etapas do trabalho e os caminhos que iam
sendo traçados, com abordagem de conceitos e metodologias como a Oficina Pedagógica;
a construção de nossa proposta pedagógica baseia-se em um diagnóstico prévio realizado
através de entrevista e aplicação de questionários, utilizando-se uma abordagem
qualitativa.
3 Entrevista concedida por Silveira, Roberto Marcio da. Entrevista I. [maio/2015]. Entrevistador: Eduardo
Valpassos Motta. Vitória, 2015. 1 arquivo .mp3. A entrevista na íntegra encontra-se transcrita no Anexo G deste
Trabalho de Conclusão de Curso.
32
É importante neste momento, tecermos algumas considerações acerca da metodologia de
pesquisa qualitativa que de maneira conceitual não se preocupa com relação aos números,
mas sim com relação ao aprofundamento e de como ela será compreendida pelas pessoas.
Godoy (1995), em seu trabalho sobre estudos qualitativos, ressalta que
[...]um fenômeno pode ser melhor compreendido no contexto em que ocorre e do
qual é parte, devendo ser analisado numa perspectiva integrada. Para tanto, o
pesquisador vai a campo buscando ‘captar’ o fenômeno em estudo a partir da
perspectiva das pessoas nele envolvidas, considerando todos os pontos de vista
relevantes. (GODOY, 1995, p. 21)
Dessa forma, a pesquisa qualitativa também pode ser entendida como “um espectro de
métodos e técnicas de coleta de dados, adaptados ao caso específico, ao invés de um método
padronizado único, repetível” (FREGUGLIA E TRAZZI, 2011, p.17). Inseridos no ambiente
escolar durante boa parte de nosso estudo, pudemos ter uma visão interna dos acontecimentos
e relatos descritos tanto nos questionários quanto nas entrevistas cedidas pelo professor
colaborador e pelos alunos. A importância desse cotidiano na pesquisa também é ressaltada
por Freguglia e Trazzi (2011, p.18), quando o mesmo enfatiza que
Os acontecimentos e conhecimentos cotidianos consistem nos elementos da
interpretação de dados. Os acontecimentos no âmbito do processo de pesquisa
qualitativa não são desvinculados da vida fora do mesmo. Isto leva, ainda, a
contextualidade como fio condutor de qualquer análise.
A observação foi outro ponto chave em nossa metodologia de pesquisa. Podemos afirmar que
essa interpretação dos dados não seria a mesma, caso o estudo consistisse apenas em modo
gabinete. A ida a escola, tanto para a aplicação de questionários e entrevistas, a prática
pedagógica e os depoimentos dos alunos muito contribuíram para a análise dos dados obtidos
como um todo. Como ressaltam Lucke e André (apud Freguglia e Trazzi, 2011, p. 25),
utilizamos em nosso trabalho os procedimentos comumente adotados na pesquisa qualitativa,
“observação, a entrevista e a análise de documentos”. O diagnóstico foi fundamental, dessa
forma, para o pensar da prática em nossas oficinas pedagógicas.
Os pontos positivos sobre os estagiários? Foram que eles souberam discutir com os
alunos sobre o assunto, souberam entender as opiniões opostas, souberam explicar o
que era correto e o que não era correto também. (Informação verbal, Aluno 1)4
4 Depoimento concedido por 1, Aluno. Entrevista II. [maio/2015]. Entrevistador: Roberto Marcio da Silveira.
Vitória, 2015. 1 arquivo .mp3. O depoimento na íntegra encontra-se transcrita no Anexo H deste Trabalho de
Conclusão de Curso.
33
A aula foi boa, o domínio de conteúdo foi ótimo, a turma participou bastante, e nos
passou muito conhecimento e, se quiser dar mais aula, pode dar mais aula pra gente.
(Informação verbal, Aluno 2)5
Esses trechos retirados dos depoimentos dos alunos ao final das oficinas, fizeram-nos refletir
sobre nossa própria prática, tanto em sala quanto na pesquisa, que foi considerada por eles
como ‘interessante’, ao passo que muito do que lhes foi passado era novo e lhes despertou
curiosidade sobre o tema.
Observando os depoimentos e falas dos alunos durante nossas análises, concordamos com
Zanten (2004), quando a autora nos diz que: “não podemos analisar o discurso dos a lunos
em primeiro grau sem levar em conta tudo o que eles têm assimilado da investigação e da
leitura que a sociedade produz sobre ele.” (ZANTEN, 2004, p.32).
O percurso deste trabalho foi cuidadosamente pensado junto ao professor colaborador,
que dialogou conosco acerca do que pensava sobre a Lei 10.639/03 e sua abordagem nas
diferentes disciplinas. Ele nos aponta:
[...]Mas com uma série de mudanças na democracia do Brasil, mais necessariamente
na constituição de 88, na Lei de Diretrizes Básicas da Educação, que é um
fragmento da constituição, foi instituída a educação das relações étnico raciais, ou
seja, a inclusão da população negra, quilombola, estendo também a ideia da questão
indígena que foi instituída dentro das escolas. Então a partir daí, que o estado teve
que atuar como um cumpridor da lei maior, que é a Constituição Federal, estar
inserindo. A partir daí a gente consegue perceber uma miscigenação dentro da escola
inicialmente, que não foi muito fácil, porque houve um impacto muito grande até
então, a escola tinha um papel hierárquico e logo no início quando foi instituído a
Lei das Diretrizes sobre as questões étnico raciais, teve uma grande parte da
população que se sentiu ofendida. Então, a partir daí os alunos passaram a ter acesso
a escola publica que não tinham acesso no passado, isso trouxe uma série de
problemas dentro da escola. (Informação verbal, Roberto Marcio da Silveira)
E completa, afirmando que
Precisamos compreender que o preconceito é cultural, ensinado dentro de casa,
a educação de muitos alunos foi baseada em uma ideia preconceituosa em casa.
A nossa sociedade como sendo uma sociedade elitista, então ela educa de forma
preconceituosa, mas isso vem mudando nos últimos tempos, tivemos grandes
avanços, grandes perspectivas dentro da escola. Se fizermos uma comparação
entre a escola de hoje com a escola de 20 anos atrás, com relação ao
preconceito, já se veem novos valores, maior presença de estudantes negros,
cotas raciais, que é um projeto social que julgo importante para a inserção do
negro na universidade, que até então não tinha acesso que se estenda a todas as
escolas públicas do Brasil. (Informação verbal, Roberto Marcio da Silveira)
5 Depoimento concedido por 2, Aluno. Entrevista II. [maio/2015]. Entrevistador: Roberto Marcio da Silveira.
Vitória, 2015. 1 arquivo .mp3. O depoimento na íntegra encontra-se transcrita no Anexo H deste Trabalho de
Conclusão de Curso.
34
O pensar junto ao professor foi primordial em nosso trabalho, por isso trazemos aqui suas
falas e impressões, compartilhando a importância da educação para as relações étnico-
raciais. Outra questão trabalhada nesse percurso foi o planejamento das oficinas, bem
como a sequenciação da temática no currículo escolar. Essa abordagem foi fundamental,
para não representar uma ruptura, como se nosso trabalho fosse uma descontinuidade
curricular.
O terceiro momento foi tratarmos efetivamente do assunto em sala de aula, utilizando a
metodologia da Oficina Pedagógica, como já dito anteriormente, fazendo o elo entre
vários fatores, análises e possibilidades, construindo a cada nova interpretação dos alunos
novos dados que serviram entre outras coisas para que aprendêssemos juntos. Assim
trataremos a seguir do passo a passo da oficina pedagógica realizada na EEEM
“Professor Fernando Duarte Rabelo”. As oficinas pedagógicas são metodologias
utilizadas com a proposta de trabalhar a prática educativa fundamentada teoricamente
voltada para ação.
Para que o professor seja capaz de promover ação e colaborar com essas transformações, é
importante que ele também passe pelo processo de formação. Quando dizemos formação não
nos referimos apenas a formação acadêmica inicial, mas a formação pensada como algo
constante. Algumas dessas reflexões são fundamentais para pensarmos a prática da Educação
para as Relações Étnico-Raciais. O professor necessita se renovar e renovar suas
possibilidades de práticas e de aprendizagens. Se por um lado, concordando com nosso
professor colaborador que “há necessidade de conhecermos a história.”. Até porque é
necessário desmistificar a real necessidade de formação para Educação para as Relações
Raciais Afro-brasileiras, pois nenhuma outra proposição educativa tem como proposição o
contexto social de enfrentamento ao racismo.
Paulo Freire, educador e teórico brasileiro conhecido por suas obras de cunho social,
apresentou um novo formato de pedagogia que priorizava a luta pela igualdade e buscava
quebrar as barreiras existentes na educação, barreiras muitas das vezes causadas pela própria
discriminação e desigualdade de direitos. Em seus escritos, o autor traz uma perspectiva de
educação capaz de mudar uma sociedade inteira, elevando culturalmente a parcela da
população que por muito tempo se manteve excluída.
Freire destacou a capacidade de todos os sujeitos de não apenas aprender a ler e escrever, mas
35
também de compreender a realidade política e social em que vivem; porém ele ainda
destacava que ao aprender e compreender, o sujeito está apto a transformar sua própria
realidade. A pedagogia de Freire é uma pedagogia que visa a transformação. A Educação para
as Relações Étnico-Raciais é uma das diversas maneiras de se transformar a sociedade. Freire
também trouxe uma abordagem acerca da formação do professor:
A responsabilidade ética, política e profissional do ensinante lhe coloca o dever de
se preparar, de se capacitar, de se formar antes mesmo de iniciar sua atividade
docente. Esta atividade exige que sua preparação, sua capacitação, sua formação se
tornem processos permanentes. Sua experiência docente, se bem percebida e bem
vivida, vai deixando claro que ela requer uma formação permanente do ensinante.
Formação que se funda na análise crítica de sua prática. (1994, p. 259)
Ao manter-se em formação permanente, o professor se abre para um leque de possibilidades
de práticas de ensino que envolvem a criticidade. Assim, ainda de acordo com Freire “A
prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético,
entre o fazer e o pensar sobre o fazer” (2002, p. 42-43).
O pensar sobre o fazer é tão importante quanto o fazer. O “fazer” por si muitas das vezes não
“altera” o aprendizado do aluno, por isso nossa crítica caminha por pensarmos a necessidade
de formação do professor. Pois quando pensamos no que fazemos observamos nossas atitudes
e metodologias, nos damos oportunidades de acertar o que for necessário. Esse pensar
relaciona-se a estudos que permitam conhecermos o racismo, suas múltiplas facetas e as
necessidades e possibilidades de cada disciplina neste enfrentamento e ainda mais, que a
partir desses múltiplos pertencimentos conhecimentos façamos abordagens substanciais nas
práticas educativas. E, como nossa intenção é possibilitar aos alunos uma visão crítica de sua
realidade, é necessário pensar sobre a nossa prática. Desta forma, acreditamos que a prática
baseada numa oficina pedagógica seja o mais viável para nós, uma vez que a oficina
pedagógica consiste em “uma oportunidade de vivenciar situações concretas e significativas,
baseada no tripé: sentir-pensar-agir, com objetivos pedagógicos” (PAVIANI E FONTANA,
2009, p.78).
De acordo com Vieira e Volquind (2002), uma oficina pedagógica é produzida de forma
coletiva e necessita de ação. Para tanto, como citado anteriormente, não se baseia apenas em
agir, deve manter um conteúdo teórico para abrir espaço para reflexão. “Toda oficina necessita
promover a investigação, a ação, a reflexão; combinar o trabalho individual e a tarefa
socializada; garantir a unidade entre a teoria e a prática” (VIEIRA E VOLQUIND, 2002, p.
11).
36
Propomos como prática uma oficina pedagógica que objetiva proporcionar aos alunos uma
capacidade crítica de opinião, através de conhecimentos adquiridos por eles ao longo da
própria oficina, de modo que possam valorizar mais a história e a cultura não somente dos
afro-brasileiros, mas de todas as etnias encontradas no Brasil, valorizando, assim, a
diversidade cultural.
Como nosso propósito é de fazer o aluno pensar e agir sobre esse assunto, refletir sobre
parte dessa história e a partir dela, identificar questões que afetam necessariamente a
população afro-brasileira, elaboramos a oficina a partir dessa base.
Trabalhamos parcialmente duas matrizes étnicas da população brasileira, as indígenas e
africanas. Dividimos a oficina em três etapas, para qual foram destinadas atividades
diferentes. No total foram utilizadas 06 aulas de Geografia em três semanas, numa turma
de 2º ano do Ensino Médio; cada semana utilizamos duas aulas seguidas, o que nos
permitiu elaborar uma oficina mais reflexiva.
Voltando um pouco no tempo, nossa primeira ação junto à escola foi de caráter de observação
e diagnóstico. Além de uma conversa prévia com nosso professor colaborar (apresentando a
proposta a ser trabalhada), foram aplicados questionários tanto a professores quanto demais
componentes do corpo escolar, em busca de uma diversidade de opiniões sobre a temática.
Perguntas referentes ao tempo de profissão, trabalho com a temática e testemunho de
situações de cunho racistas, com os resultados apresentados nos gráficos à seguir.
Gráfico 1: Porcentagem de quanto tempo os professores da EEEM “Professor
Fernando Duarte Rabelo” tem de profissão. Fonte: Questionários aplicados.
37
Gráfico 2: Porcentagem do tempo em que os professores lecionam na EEEM
“Professor Fernando Duarte Rabelo”. Fonte: Questionários aplicados.
Gráfico 3: Porcentagem de formação acadêmica do corpo docente da EEEM
“Professor Fernando Duarte Rabelo”. Fonte: Questionários aplicados.
No que se refere ao tempo de profissão (Gráfico 1) e tempo na escola de estudo (Gráfico 2),
observa-se que a maioria dos entrevistados não ultrapassa a marca dos cinco anos,
considerando as duas variáveis juntas. Profissionais novos, novas ideias e experiências... Mas
será? Outras perguntas foram propostas nos questionários, das quais algumas tiveram
respostas um tanto quanto confusas ou até mesmo totalmente fora do proposto, da temática.
Alguns professores possuem apenas complementação pedagógica ou mestrado, tendo sua
graduação básica no bacharelado (Gráfico 3). O curso de licenciatura, como sabemos, é
baseado em todo um currículo pedagógico, de trabalho psicológico e preparatório para a
38
própria sala de aula. Mesmo com mestrado ou complementação, pela análise dos
questionários pudemos perceber que essa diferença pesa, sim, na formação do professor.
Contudo, esse é um assunto a ser abordado com mais afinco futuramente, não sendo
contemplado nesse primeiro momento.
Entretanto, algumas questões respondidas despertaram nossa atenção. Infelizmente, alguns
profissionais, mesmo no ambiente escolar, pareciam não conhecer a temática. Quando
perguntado acerca de racismo, um professor respondeu baseado na deficiência auditiva dos
alunos, referindo-se assim aos alunos surdos. O mesmo ocorreu na reposta do mesmo à
pergunta relacionada ao trabalho com questões étnicas, quando afirmou ter trabalhado com
surdez na adolescência e com trabalho com alunos que possuem deficiência múltipla. Essa
situação vai além da Lei 10.639/03, que já tem mais de doze anos: como trabalhar uma lei,
sem ter a noção básica do que ela regulamenta?
Gráfico 4: Porcentagem referente à raça/cor que os professores se definem, com base nos
critérios do IBGE. Fonte: Questionários aplicados.
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Gráfico 5: Porcentagem de professores que já presenciou cena de racismo em alguma escola.
Fonte: Questionários aplicados.
Para a pergunta acerca da raça/cor que se define (Gráfico 4), foi utilizado o critério adotado
pelo IBGE (branca, preta, parda, amarela ou indígena). Já na questão que se referia ao
testemunho de alguma cena de racismo (Gráfico 5), e se já havia convivido com algum colega
racista (Gráfico 6), resolvemos ampliar para qualquer escola incluindo a EEEM “Professor
Fernando Duarte Rabelo”. Como alguns já tinham passado por outras instituições, o grupo
achou pertinente que essa questão abrangesse para além da escola trabalhada.
Gráfico 6: Porcentagem de convivência com colegas racistas.
Fonte: Questionários aplicados.
40
Gráfico 7: Porcentagem de professores que trabalharam com a temática das relações
étnico-raciais. Fonte: Questionários aplicados.
Quando perguntados se haviam trabalhado com essa temática (Gráfico 7), o resultado foi
igual, sendo 50% para sim e para não. Em relação à relevância do trabalho sobre a Educação
para as Relações Étnico-Raciais na escola, as respostas foram bem heterogêneas. Enquanto
alguns afirmavam a importância desse trabalho para a formação social dos alunos, há os que
responderam afirmando que essa temática deve ser trabalhada de acordo com a região onde a
escola está instalada, ou ainda que o trabalho com os alunos deve ser apenas intervencionista,
no caso do profissional presenciar alguma situação de preconceito racial. Trazemos aqui as
falas de dois professores, completamente distintas:
Não há dúvidas quanto à relevância de uma educação voltada a essa questão. A
abordagem, entretanto, costuma ser pontual, o que, muitas vezes, cria sobre as
influências culturais de raiz negra, um olhar de exotização. (Informação escrita,
Professor X)6.
Esse assunto deve ser tratado do dia-a-dia no contexto em que se apresenta. Se, por
um acaso, houver qualquer problema em sala de aula, pátios, auditórios, etc. os
responsáveis, educadores, devem analisa-los didaticamente na hora. (Informação
escrita, Professor Y)7.
Fazendo uma rápida comparação entre as falas dos dois professores, de uma mesma
instituição, percebe-se a contradição quanto à importância da temática. Enquanto o primeiro
enfatiza a importância de um trabalho que possua uma abordagem completa, o segundo
defende a pontualidade das ações. Através da análise tanto desses questionários, e também da
fala do nosso professor colaborador, a importância de se trabalhar a Educação para as
6 Resposta concedida por X, Professor. Questionários. [maio/2015]. Vitória, 2015. 1 arquivo .doc. 7 Resposta concedida por Y, Professor. Questionários. [maio/2015]. Vitória, 2015. 1 arquivo .doc.
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Relações Étnico-Raciais ficou ainda mais clara para nós, visto às disparidades de opiniões
acerca do tema na própria escola, entre os próprios professores. E isso influencia diretamente
no cidadão que a escola está formando, no aluno que pode sair repetindo discursos, ou
posicionando-se criticamente sobre os mesmos quanto o assunto refere-se às relações étnicas,
seja na escola ou na vida dos mesmos.
Nesse sentido, a Geografia assume grande importância dentro da temática da pluralidade
cultural nos processos de ensino, planejamento e gestão, principalmente no que diz respeito às
características dos territórios dos diferentes grupos étnicos e culturais que convivem no
espaço nacional, assim como, possibilita apontar as espacialidades das desigualdades
socioeconômicas e excludentes que permeiam a sociedade brasileira, ou seja, um contato com
um Brasil de uma geografia complexa, multifacetada e cuja população não está devidamente
conhecida.
42
CAPÍTULO 3
A PRÁTICA VIVENCIADA NO
CAMPO DE PESQUISA
43
CAPÍTULO 3
3. A PRÁTICA VIVENCIADA NO CAMPO DE PESQUISA
Neste capítulo destacaremos os momentos de nossa prática de ensino, isto é, nossa
oficina pedagógica. Serão apresentados todos os momentos realizados, que foram
divididos em três partes: I – Contextualização Histórica dos Africanos e da População
Brasileira; II - Território e Identidade; e III - Praticando com Textos e Discussões.
3.1. PRIMEIRO MOMENTO: CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DOS AFRICANOS E DA
POPULAÇÃO BRASILEIRA
A História da África, assim como as demais histórias dos diferentes povos do mundo, reserva
muitas curiosidades, grandes momentos, lutas e vitórias. Porém, há de se concordar que este é
um assunto pouco aprofundado nas escolas brasileiras. Os professores, para por em prática a
Lei Nº 10.639/03, costumam priorizar em suas aulas, ou mesmo elaborar projetos
pedagógicos que abordem a cultura afro-brasileira, como a música, a culinária, a língua em
formas de projetos pedagógicos ou mesmo com outras metodologias. Isso tudo é muito bom,
mas tão importante quanto trabalhar esses assuntos é discutir e criar conceitos sobre eles.
Assim tão importante quanto falar de população é falar da formação desta população. Ou seja,
o que antecede a realidade muitas vezes é capaz de explicá-la.
Sabendo da importância em apresentar aos alunos ao menos uma mínima parte da História da
África, assim como da formação do povo brasileiro, reservamos para o momento inicial da
oficina aulas com caráter mais teórico, fornecendo aos alunos subsídios para futuro debate.
“Nas oficinas a primazia sempre é da ação, mas não se desmerece a teoria” (VIEIRA E
VOLQUIND, 2008, p.12).
Como recursos didáticos, utilizamos um notebook e data show para apresentação de slides
através do Microsoft Power Point. Optamos por esses recursos, como tentativa de dinamizar a
aula, inserindo figuras e mapas permitindo aos alunos uma visualização do assunto abordado.
Essa é uma ótima opção para aulas que tenham abordagem mais teórica, como foi essa nossa
introdução.
Os slides foram estruturados seguindo uma lógica de importância cronológica. Lembramos
44
que cada etapa da oficina corresponde a duas aulas de Geografia seguidas, assim, iniciamos a
primeira aula com uma tentativa de desmistificar a África, apresentando o outro lado do
continente, pouco visto nas grandes mídias e, até mesmo, nas escolas. Em seguida
trabalhamos a história da Partilha da África, momento em que os europeus dividiram o
continente entre si sem respeitar as etnias existentes e os Estados já formados lá. É importante
dizer que a abordagem a respeito da Partilha da África se deu a partir de leituras previamente
feitas de alguns livros didáticos, bem como de alguns autores, como o próprio Darcy Ribeiro
que apresenta algumas etnias africanas, além de Eduardo Galeano que, mesmo dando um
enfoque à América Latina, também deu suas contribuições no que diz respeito ao continente
africano.
Dando sequencia, apresentamos a Conferência de Berlim, realizada entre 1884 e 1885, que
estabeleceu regras entre os Estados europeus para a divisão da África. Finalizamos esse
contexto histórico africano com a descolonização do continente, iniciado no período pós-
guerra (Figura 4).
Figura 4: Mapa mental simples exposto nos slides para apresentação sobre o processo de Divisão da
África. Elaboração: Helena Faller.
45
Já apresentado um breve contexto histórico da África, iniciamos a segunda aula trabalhando a
formação do povo brasileiro (Figura 5). Apresentamos o tripé Índio x Branco x Negro, que é a
base de nossa população. Mostramos fotos de algumas etnias indígenas brasileiras, como os
Guaranis, os Tupiniquins e os Yanomamis, pois estes foram os primeiros povos a residirem no
Brasil. Falamos muito superficialmente sobre os brancos, pois a disciplina de Geografia
reserva assuntos dedicados exclusivamente a estes povos. E concluímos com os povos
africanos que foram trazidos e escravizados no Brasil, como os Yorubás, os Bantos e os
Malês. Apresentamos fotos, algumas diferenças entre eles e algumas de suas contribuições
para a nossa cultura, por exemplo, a contribuição dos Yorubás e dos Malês na formação de
religiões afro-brasileiras.
Figura 5: Primeiro momento da oficina, onde foi realizada uma breve contextualização histórica.
Foto: Autores.
Sobre os Malês destacamos que trata-se de um povo islâmico, bilíngue (além dos dialetos,
falavam também em árabe) e estudados, sendo dentre todas as etnias que foram escravizadas
as que mais se indignaram com a situação, levando a uma revolta ocorrida na Bahia,
conhecida como a “Revolta dos Malês”. Finalizamos nossa primeira parte da oficina com a
leitura de um texto do antropólogo Darcy Ribeiro, que aborda sobre os afro-brasileiros.
46
Utilizamos este texto para fundamentar nossa abordagem anterior, uma vez que o texto
apresenta as tais etnias africanas já citadas, suas diferenças enquanto povos, seus territórios de
origem e a forma como foram trazidas ao Brasil. O texto também faz uma abordagem de que
somos todos herança, tanto dos que sofreram com a história, quanto dos que causaram o
sofrimento. Porém, vale refletir que ainda que sejamos fruto das mesmas matrizes étnicas, há
aqueles que se identificam mais com uma que com a outra e vice-versa, portanto, nós
brasileiros fazemos parte de uma mesma população, com suas diferenças culturais e
representada por diferentes povos.
Houve ao longo das aulas uma forte interação entre os alunos, com exposição de dúvidas,
falas de curiosidades e até mesmo exposição de suas opiniões acerca do tema. Muitos alunos
se mostraram interessados com a temática apresentada, pois, assim como eles mesmos
disseram, não sabiam que havia entre os africanos trazidos e escravizados diferentes etnias,
para eles eram todos de um mesmo lugar. Ficaram surpresos quando falamos da estratégia
portuguesa de trazer povos que não falavam a mesma língua – e que muitas vezes eram
inimigas – pois assim evitavam revolução em busca da libertação. Os alunos também se
mostraram bastante indignados com a Partilha da África feita pelos europeus, essa indignação
veio a partir do momento que eles compreenderam a organização política e cultural da África,
como as tribos existentes e alguns Estados já formados.
A leitura do texto foi realizada pelos alunos e discutida entre todos. A aula de modo geral foi
considerada produtiva por nosso professor colaborador que a elogiou dizendo ter sido válida.
3.2. SEGUNDO MOMENTO: TERRITÓRIO E IDENTIDADE
Nossa segunda etapa teve início com alguns contratempos bem comuns em escolas, o data-
show que havia sido reservado não estava funcionando. Isso de fato não foi uma situação
muito desejável, pois havíamos um planejamento a seguir, porém, não poderíamos descartar
como um aprendizado. Numa hora dessas o professor deve sempre ter um “plano B”, ou
alguma ideia de como solucionar o problema. E o nosso professor colaborador teve essa ideia.
Há uma sala de aula com um data-show já instalado e que funciona devidamente bem; o
professor conversou com sua colega se ela poderia gentilmente trocar de sala conosco para
que pudéssemos dar continuidade à nossa oficina.
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Já instalados em outra sala de aula com os alunos, iniciamos nossa segunda parte fazendo uma
breve revisão da aula anterior. Discutimos bem rapidamente sobre a divisão da África, sua
descolonização, o processo de escravização no Brasil e a abolição, até chegarmos no
momento que queríamos: para onde os negros foram após a libertação? Antes de nos
aprofundarmos nessas questões acerca de para onde os negros foram, se fez necessário
apresentarmos aos alunos uma breve definição de território, para que os mesmos
compreendessem a realidade vivida hoje por boa parte da população negra.
Para discutir território levamos para os alunos a definição do geógrafo Haesbaert (2010), que,
assim como vários outros autores entende que não há uma definição única sobre o assunto.
Para ele, o território é formado a partir de quatro dimensões, dentre as quais três tem enfoque
materialista, que são a política, a econômica e a naturalista; e uma com enfoque idealista, que
é de dimensão cultural. Discutimos com os alunos essas quatro dimensões de território
apresentadas por Haesbaert, e em seguida exibimos um audiovisual da série “A Cidade dos
Homens”, do diretor Fernando Meirelles, de 2002. O episódio escolhido foi “A coroa do
imperador”, nele é possível compreender diferentes tipos de territórios e a identidade de cada
sujeito nesses territórios. Tal episódio pode ser considerado um excelente recurso didático, já
que, além de retratar a realidade vivida em uma favela da cidade do Rio de Janeiro, também
faz uma abordagem sobre as fronteiras territoriais ali existentes, como a fronteira entre a
favela e o restante da cidade, a fronteira entre a favela dominada por um traficante e a outra
parte dominada por outro (Figura 6).
O estudo da população levou-nos a pensarmos nas populações de periferia urbana, em que a
concentração de negros é muito superior à de brancos. Essa análise foi necessária a partir da
contextualização do processo de abolição. Prosseguindo com a oficina, passamos duas
músicas ainda sobre favela; a primeira chama-se “Meu nome é favela”, autoria de Arlindo
Cruz e interpretada por Leandro Sapucahy. A segunda é de Mv Bill e chama-se “Contraste
Social”. Pedimos aos alunos que fizessem uma comparação entre uma música e outra, e eles
destacaram que a primeira mostra a favela como um lugar tranquilo e bom de viver, enquanto
que a outra tenta retratar a favela de uma forma diferente, com problemas, perigos e
injustiças.
48
Figura 6: Imagem capturada do seriado Cidade dos Homens, 20028
Pedimos que fossem mais específicos, que apontassem nas músicas o que eles estavam
querendo dizer, e sobre a favela de Arlindo Cruz, eles destacaram a estrofe que dizia:
[...] É o meu jeito de ser
Falar com geral e ir a qualquer lugar
E é tão normal de me ver
Tomando cerveja calçando chinelo no bar [...]
Para os alunos esta parte se remete ao cotidiano de uma pessoa que mora na favela, demonstra
que lá é um lugar agradável e que não são essas coisas exageradas que a mídia costuma
mostrar ao resto da população que vive fora das favelas. Para os alunos, a música apresentou
um território de amizades e companheirismo, e lembraram-se da definição de Haesbaert de
dimensão cultural.
Já sobre a outra música, “Contraste Social”, os alunos foram mais críticos, assim como a
própria música é. Para eles, o cantor queria mostrar a favela não como um lugar ruim, mas um
lugar que todos veem como ruim. A favela na música é demonstrada através da discriminação
social. Também pedimos que os alunos fossem mais específicos e eles se lembraram da
estrofe, que segundo os próprios alunos não apresenta só a discriminação por causa da classe
8 Nesta imagem é mostrada as fronteiras do morro entre um território pertencente a uma traficante e um território
pertencente à outro, além do carro de luxo representando a fronteira do terceiro território que seria o território da
classe alta.
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social, mostra também o racismo. O refrão da música é a seguinte:
[...]Contraste social, o povo pobre é que vive mal
Eles querem negão dentro da prisão[...]
Entramos então numa discussão calorosa sobre os problemas que existem entre a população
de classe mais baixa, incluindo negros e brancos; assim como os problemas encarados pela
população negra devido ao racismo. Neste momento retornamos àquela questão lançada no
início da aula: para onde foram os negros após a libertação? Bom, a partir das discussões, os
alunos perceberam que muitos foram excluídos dos centros urbanos dominados pelos brancos,
e começaram a construir suas residências em locais mais afastados, locais em que as elites não
tinham a intenção de ir inicialmente tais como os morros.
A população negra pobre se reuniu nas periferias dos grandes centros. Essas periferias
cresceram em torno das regiões industriais, comerciais eram lugares inicialmente sem
planejamento urbano e infra-estrutura, desassistidas de abastecimento de água, esgoto,
iluminação, pavimentação, além de concentrarem em alguns lugares posteriormente origem às
favelas, agregando aos poucos outras pessoas (também pobres). Porém, os alunos também
destacaram os quilombos, outro tipo de território dos afro-brasileiros. A perspectiva dessa
discussão, para nós e os alunos, foi retomar a marca indelével da escravização, da abolição e
ainda das relações contemporâneas das periferias (minorias) que sofrem com os preconceitos
e racismos.
Construímos um ótimo debate para início de conversa, expuseram suas ideias sobre o assunto,
trouxeram exemplos do cotidiano, abraçaram a ideia de que somos diferentes enquanto
sujeitos, mas iguais em nossos direitos. Acreditamos que a aula tenha sido válida, afinal já
havia batido o sinal para o fim e os alunos ainda permaneceram ávidos na discussão.
3.3. TERCEIRO MOMENTO: PRATICANDO COM TEXTOS E DISCUSSÕES
Enfim chegamos ao momento final da nossa prática de ensino. Nossa proposta nessa etapa da
oficina é ver a ação dos alunos a partir dos seus entendimentos e conhecimentos adquiridos ao
longo das aulas. Podemos dizer que para nós este é o momento crucial de nossa prática, pois é
aqui que os alunos terão maior espaço e liberdade de expressarem suas opiniões.
50
Para a realização deste momento, levamos seis propostas de temas diferenciados, com
fragmentos de reportagens e textos. Dividimos a turma em seis grupos e para cada grupo
entregamos uma proposta; todas as propostas estavam relacionadas ao tema trabalhado em
sala nas duas aulas anteriores, como população, partilha da África e diversidade cultural. A
atividade consistia em ler os fragmentos do texto apresentado e associá-los ao que foi
discutido em sala, transformando em forma de redação.
Lembramos que cada etapa da oficina foi equivalente a duas aulas seguidas de Geografia,
sendo assim, dedicamos a primeira aula e pouco mais da segunda para que os grupos de
alunos pudessem elaborar suas redações. A culminância, porém, da nossa oficina pedagógica
foi a produção de textos escritos e cartazes feitos pelos grupos que através da expressão
visual, o que eles pretendiam dizer em suas redações. Desta forma, ao final de nossa pesquisa
obtivemos dois produtos culminantes de cada grupo: uma redação e um cartaz; baseado tanto
nos fragmentos entregues como subsídio quanto nas aulas anteriores.
Foram entregues aos alunos fragmentos de reportagens que subsidiaram suas redações. Esses
fragmentos estavam divididos da seguinte forma: dois traziam a questão do negro na favela,
outro abordava o problema da intolerância religiosa, outro trouxe dados do IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística) que classifica a maioria da população brasileira como
negra, e os outros dois com temas semelhantes que traziam em discussão o problema do
racismo.
Para a confecção dos cartazes levamos cartolinas brancas, tesouras, colas e revistas variadas.
Embora tenhamos levado alguns materiais, deixamos livre para cada grupo utilizar o material
de seu interesse, com exceção da cartolina que era de uso obrigatório para manter um padrão
de tamanho e cor.
3.4. RESULTADOS ALCANÇADOS – ANÁLISES
Ao fazer uma retrospectiva das atividades ministradas, nossa oficina pedagógica teve seu
momento teórico, que pode ser observado em sua primeira parte, em que dialogamos com os
alunos o contexto histórico do continente africano como a Partilha da África e a
descolonização, e o processo histórico da escravização e libertação no Brasil. Nossa oficina
também teve seu momento de reflexão observado em sua segunda etapa, onde os alunos
51
conseguiram debater sobre as diferenças sociais, sobre o racismo e as injustiças sociais. E, por
último, nossa oficina também contou com seu momento prático em que os alunos escreveram
em forma de grupos redações e produziram cartazes que expressassem seus conhecimentos
sobre o tema. Entretanto, vale lembrar que nossa oficina pedagógica foi construída com base
nas definições de Paviani e Fontana (2009), sendo elaborada a partir do tripé sentir-pensar-
agir, ou seja, compreendemos que o sentir seja o entender a história, a teoria dos
conhecimentos; o pensar seria as reflexões sobre este sentir, sobre a teoria; e o agir seria a
prática, a ação que envolve a teoria e a reflexão.
Acreditamos que conseguimos elaborar e desenvolver uma oficina pedagógica para o trabalho
com Educação Etnico-racial no ensino de Geografia e que esta mesma oficina propiciou aos
alunos um sentir, um pensar e um agir reflexivo sobre o passado da população africana e os
contextos atuais da população afro-brasileira. Na verdade, essas poucas aulas foram pensadas
no sentido de promover uma profunda sensibilização para o assunto.
Confiantes na avaliação positiva dos alunos, tanto no que se refere ao aprendizado deles e
também do nosso enquanto estudantes de Geografia, decidimos fazer duas avaliações
separadas e opostas; a nossa avaliação sobre os alunos, o processo e uma outra avaliação
sobre o trabalho desenvolvido, pois consideramos importante esse retorno.
A nossa avaliação sobre os alunos teve início já no primeiro momento da oficina, pois de
acordo com Vieira e Volquind “[...] pode-se afirmar que a oficina avança do mero falar
recapitulativo/repetitivo, para um fazer produtivo, no qual se aprende fazendo” (2002, p. 20),
ou seja, procuramos desde o início estimular a participação dos alunos permitindo-os o
aprender fazendo, e assim possibilitando a nossa avaliação sobre eles. Contudo, a avaliação
não foi baseada só nos diálogos durante as aulas. Como apresentado anteriormente, nosso
último momento da oficina foi dedicado à ação dos alunos, onde eles expressaram na escrita e
no visual o que aprenderam no decorrer da oficina.
Notamos que os alunos sentem muita dificuldade de desenvolver a escrita, mesmo estando em
grupo. Alguns iniciaram a escrita quase no fim da primeira aula, outros entregaram o texto já
na hora do intervalo. A confecção dos cartazes foi outra atividade que percebemos dificuldade
entre os alunos. Parece que faltam estímulos para aguçar a criatividade deles, pois também
levaram muito tempo para iniciar a produção da atividade.
Estabelecemos como critério de avaliação para as redações a coerência e a criticidade acerca
52
do tema abordado; embora entendemos a importância de também avaliar a escrita, a gramática
e a concordância, vimos que diante do tempo e do objetivo do trabalho não fosse viável focar
nisso. Deste modo, seguindo os critérios estabelecidos, julgamos que os textos atingiram o
objetivo esperado, certamente há alguns mais bem construídos que outros, mas de modo geral,
todos conseguiram expor suas opiniões e suas críticas diante da temática. Muitos trouxeram
questões históricas para introduzir o assunto, como:
“A África foi um palco de exploração, racismo e muita morte.”
“O Brasil recebeu vários africanos, de várias etnias, trazendo suas variáveis culturas para
nós brasileiros.”
“A vinda dos negros pelo tráfico negreiro foi com o intuito de usá-los para trabalharem nas
fazendas, nas casas dos senhores e pouco tempo depois, nos comércios.”
Essas introduções nos mostraram que os alunos conseguiram absorver bem o que tentamos
passar a eles, no que diz respeito à contextualização histórica da África e da escravização no
Brasil. O processo histórico é, sem dúvida, um passo importante para compreender fatos,
acontecimentos e, até mesmo, a organização política e social do país. E vendo esses inícios,
denota a capacidade dos alunos de delimitarem uma ordem de importância na construção de
seus textos.
Como cada grupo tinha uma temática diferente, as críticas também foram diferenciadas,
seguindo seus fragmentos. Percebemos que eles conseguiram realizar críticas construtivas
embasadas nos conhecimentos adquiridos tanto em sala quanto no cotidiano deles. Segue
alguns fragmentos das redações:
“E hoje em dia não é diferente, embora muitos anos foram se passando desde a escravidão, a
desigualdade ainda é predominante onde negros ainda são discriminados, em sua grande
maioria ainda vivem em situações precárias e condições sub-humanas.”
“Todos os cidadãos tem o direito de seguir a religião que querem, pois todos nós temos nossa
liberdade. A sociedade precisa acabar com a intolerância religiosa, para que possamos ter
uma boa convivência, sem confrontos. Mas enquanto vivermos com as pessoas sem
conhecimento de diferentes religiões, viveremos em um mundo com preconceito.”
53
“Portanto vale ressaltar que nós, povo brasileiro, somos um diferente do outro, mas também
temos um pouco de cada um, então temos que respeitar as diferenças, e nos relacionar de
igual para igual.”
Devemos lembrar que não nos atemos a avaliar a gramática e sim o senso crítico dos alunos,
portanto, os fragmentos estão descritos conforme os mesmos escreveram, sem revisão da
língua portuguesa. Contudo, ainda que existam algumas dificuldades de escrever bem de
acordo com a Língua Portuguesa, observamos em alguns textos não apenas críticas
construtivas, como também tons de sarcasmo e de ironia, como o trecho a seguir:
“Ainda nos dias de hoje, existem esses tipos de preconceito. Os morros que foram tomados
por negros, hoje é olhado por brancos como favela e lugar de bandido. Mas o interessante é
que brancos, hoje curte os ritmos musicais e danças (dos negros)”.
Este pequeno fragmento de uma das redações nos mostra a visão e o sentimento que o grupo
tem diante da sociedade. Podemos dizer que para estes alunos a sociedade é hipócrita, pois ao
mesmo tempo em que despreza certos grupos étnicos, se apropria de partes de suas
manifestações culturais, como bem descreveram os alunos ao dar o exemplo de desprezo pela
favela, ao passo que valorizam as músicas encontradas lá. Certamente não podemos
generalizar a sociedade como toda racista, preconceituoso ou mesmo hipócrita, mas podemos
sim dizer que esses alunos já passaram por alguma situação que os fizeram pensar assim.
A respeito dos cartazes, percebemos que os alunos mantiveram o mesmo senso crítico
encontrado em suas redações, além de uma criatividade bacana, como é o caso do grupo que
abordou sobre a maioria da população brasileira ser negra de acordo com o último censo do
IBGE. O cartaz realmente ficou muito simples, porém o grupo escreveu uma frase que faz
qualquer um refletir: “Negros, porque julgá-los?” (Figura 7).
O grupo que abordou sobre racismo buscou uma frase na internet que expressasse melhor sua
opinião e escreveu no centro do seu cartaz; outro grupo que trabalhou com o tema de favela e
racismo, também pensou em escrever uma frase para expressar a opinião além do fragmento
de uma música que trabalhamos com eles na segunda etapa da oficina (Figuras 8 e 9).
54
Figura 7: Produto final do grupo que abordou o tema sobre a população brasileira ser de maioria negra,
segundo dados do IBGE (2010). Elaboração dos alunos. Foto: Autores.
Figura 8: Produto final do grupo que abordou o tema Racismo. Elaboração dos alunos.
Foto: Autores.
55
Figura 9: Produto final do grupo que abordou o tema Favela e Racismo. Elaboração dos alunos.
Foto: Autores
3.5. AVALIAÇÃO DAS OFICINAS: DANDO VOZ AOS ALUNOS
Tendo feito nossa avaliação acerca dos alunos, agora é o momento que descrevermos a
avaliação dos alunos sobre nós. Essa avaliação foi realizada através de depoimentos dos
alunos recolhidos e gravados pelo nosso professor colaborador, para evitar certos
constrangimentos por parte dos alunos em relação a nós. Para que fosse possível a gravação
de depoimentos, foram entregues aos que tinham interesse de colaborar um Termo de Livre
Consentimento, que continha as informações necessárias sobre a pesquisa para que eles
entregassem aos pais ou responsáveis para nos autorizar a gravar, esse procedimento é
indispensável, principalmente por estarmos lidando com alunos menores de idade.
Com os termos em mãos e autorizados, o professor colaborador fez a gravação com alguns
dos alunos. De modo geral, recebemos uma avaliação tão positiva quanto a nossa acerca
deles. O professor fez algumas perguntas chaves para facilitar a resposta dos alunos. Quando
perguntados sobre o que acharam da oficina todos responderam que gostaram e acham o tema
legal. Ao serem questionados sobre a produtividade das aulas, os alunos responderam que foi
bem produtiva. Conforme o Aluno 1 (informação verbal), as aulas foram produtivas, porque
56
“[...] eu aprendi diversas coisas que eu não tinha aprendido ainda, como que o continente
africano tinha sido dividido, quando que eles voltaram ao normal e outras coisas também.”
Outro aluno também concordou com a boa produtividade das aulas, para ele:
[...] foi produtiva, porque eles passaram conhecimento pra gente. Muita coisa ali,
tipo, como aquilo dos quilombos, eu não sabia. O pessoal mora em quilombo e até
hoje não deve nem ter ideia que tinha quilombo aqui no Espírito Santo.
[...]Principalmente em Vitória. [...] (Informação verbal, Aluno 2)
O nosso professor colaborador que nos ajudou coletando os depoimentos dos alunos para
evitar desconforto por parte dos alunos, perguntou aos mesmos os pontos positivos e
negativos de nossa prática. Para o Aluno 1, o ponto positivo foi: “[...] que eles (se refere a
nós) souberam discutir com os alunos sobre o assunto, souberam entender as opiniões
opostas, souberam explicar o que era correto e o que não era correto também” (Informação
verbal). E, sobre o ponto negativo ele afirmou não ter nenhum.
O Aluno 2, porém, não apresentou exatamente um ponto negativo, mas para ele não houve um
bom entrosamento no grupo ao aplicar o conteúdo, pois conforme ele disse: “Ponto negativo
eu não tive não, mas a observação que eu tive foi da Estudante UFES 1, que ela abordava
muito o assunto sem deixar a outra falar, esqueci o nome da outra. A Estudante UFES 2”
(Informação verbal).
Essa avaliação que o Aluno 2 fez à nossa prática contribuiu para analisarmos pessoalmente
nossas ações em sala, e na possibilidade de melhorá-las. Certamente temos conhecimento que
tivemos algumas falhas durante a aplicação da oficina, afinal ainda não possuímos o domínio
de sala como um professor experiente possui. Sabemos que outros alunos nos avaliaram de
forma negativa, assim como outros também nos avaliaram de forma positiva. O que queremos
a partir desse entendimento é aprender a ser melhores professores, ou ao menos tentar.
57
CONSIDERAÇÕES FINAIS
58
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por meio deste trabalho buscamos enfatizar a importância da Geografia, como disciplina, na
formação crítico-reflexiva dos alunos, promovendo discussões a respeito das questões étnicas
existentes no Brasil, além do pensar sobre o território, assim como as relações nele contidas.
Despertar nos alunos a curiosidade acerca da temática foi um de nossos grandes desafios, que
acreditamos ter superado.
Como prática de ensino optamos pela metodologia de oficina pedagógica, que nos
possibilitou, tanto a nós quanto aos alunos, o sentir, o pensar e o agir sobre o tema que foi
trabalhado. Pensamos ter efetivado o tripé proposto pela metodologia, uma vez que, ao
abordarmos conceitos como População, Território e Identidade, instigamos a todos o sentir
com base em situações e experiências do cotidiano. A partir de então, questões como a
valorização da cultura e a exploração da população negra no ontem e hoje, bem como a
formação de favelas, emergiram durante vários momentos fomentando o nosso pensar sobre.
Essas discussões derivadas do sentir e do pensar proporcionaram na culminância de nossa
oficina um agir crítico, observado a partir dos textos e dos cartazes produzidos pelos alunos.
Contudo, vale dizer, que a oficina pedagógica não foi uma metodologia pensada apenas para
os alunos. Esta também foi pensada para nós, como futuros licenciados, de modo que
possamos aprender mais com a prática; e, de fato nós aprendemos e acreditamos que esta
metodologia é viável em diversos momentos da carreira docente, seja ela iniciando (como
nosso caso), ou seja, ela já em anos de experiência.
Outra metodologia que utilizamos e que também acreditamos ser viável é a de pesquisa
qualitativa, porém esta forma de metodologia está mais relacionada ao campo da própria
pesquisa, o que não significa que não possa ser utilizada também para a elaboração da prática
de ensino, pois foi isso que nós fizemos. Utilizamos os resultados obtidos pela pesquisa
qualitativa como embasamento para a construção de nossa oficina pedagógica, uma vez que
se faz pertinente conhecer a área de estudo antes de agir sobre ele.
Desta forma, durante o nosso percurso, pudemos constatar por meio de questionários
aplicados aos profissionais da educação da EEEM “Professor Fernando Duarte Rabelo”, que a
Educação para as Relações Étnico-Raciais vem conquistando seu espaço na escola, embora
ainda haja professores que sequer já ouviram falar sobre a Lei Nº 10.639/03.
59
Entretanto, dentre os professores que já ouviram falar a respeito do tema, destacamos o nosso
professor colaborador, que em entrevista concedida destacou a importância da Educação para
as Relações Étnico-Raciais através de uma breve contextualização histórica da educação
brasileira. Ele também nos relatou algumas de suas experiências relacionadas à temática, o
que acabou contribuindo para o nosso pensar pedagógico e social.
Finalizamos nossa pesquisa qualitativa recolhendo depoimentos de dois alunos da turma que
se mostraram favoráveis à nossa prática de ensino. Embora apenas eles se propuseram a dar
depoimentos, outros alunos também expressaram a mesma opinião durante as aulas.
Possibilitar aos alunos esse direito de falar e de opinar sobre a prática do professor é tão
importante quanto a nossa avaliação sobre eles; percebemos que dando voz aos alunos, o
nosso objetivo de promover uma formação crítico-reflexiva para eles fez mais sentido.
Por fim, estamos confiantes de que este trabalho nos trouxe um aprendizado, construído e
reformulado constantemente, não apenas como futuros professores, mas como membros de
uma sociedade que busca, além da igualdade de direitos, o respeito pelas diferenças.
60
REFERÊNCIAS
61
5. REFERÊNCIAS
5.1. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ADOLFO, Sérgio P., Branco em terra de negro. In: BRRETO et al (orgs). Africanidade(s) e
afrodescendencia(s): perspectivas para a formação de professores. – Vitória, ES: EDUFES,
2012.
BEAUJEU-GUARNIER, Jacqueline. Geografia da População. Tradução de Leônidas
Gontijo de Carvalho. 2ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1980.
BRASIL, Lei Nº 10.639/03, de 09 de janeiro de 2003. Altera a Lei Nº 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no
currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-
Brasileira", e dá outras providências. Brasília, DF, jan/2003. Disponível em: <
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Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Secretaria de Educação Profissional e
Tecnológica. Conselho Nacional da Educação. Câmara Nacional de Educação Básica.
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Acesso em: abril/2015.
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Étnico-Raciais. Brasília: SECAD, 2010.
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Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em março/2015
COSTA, Rogério H. da. O mito da desterritorialização: do ‘fim dos territórios’ à
multiterritorialidade. 5. ed.. rev. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010. 395 p.
ESPÍRITO SANTO. (Estado). Secretaria da Educação. Currículo Básico Escola Estadual.
Ensino médio: área de Ciências Humanas. Vitória: SEDU, 2009. 120 p.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25 ed.
São Paulo: Paz e Terra, 2002.
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Olho d’Água, 1994.
FREGUGLIA, Junia; TRAZZI, Patrícia. Pesquisa e prática pedagógica no ensino.
Universidade Federal do Espírito Santo – Departamento de Física. Vitória, 2011.
GODOY, Arilda Schmidt. Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades. In: RAE –
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Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 35, n.2, p. 57-63, 1995.
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de promoção da igualdade racial. In: THEODORO, Mário (org.), JACCOUD, Luciana,
OSÓRIO, Rafael, SOARES, Sergel. As políticas públicas e a desigualdade racial no Brasil:
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MARICATO, Ermínia. Habitação e Cidade. São Paulo: Atual, 1997.
MUNANGA, Kabengele. Superando o racismo na escola: Ministério da Educação,
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3o%20Racial,%20Xenofobia%20e%20Formas%20Conexas%20de%20Intoler%C3%A2ncia.
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RATZEL, F. Geografia do homem. In: Ratzel. MORAES, A. C. R. (Org.). São Paulo: Ed.
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Londrina, v. 16, n. 1, p. 41-59, 2010.
SANTOS, Joel Rufino dos, O que é racismo? São Paulo: Brasiliense, 2005.
SANTOS, Milton. O retorno do território. In: OSAL : Observatório Social de América
Latina. Año 6 no. 16 p. 251-261. Buenos Aires: CLACSO, 2005. Disponível em<
http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar/ar/libros/osal/osal16/D16Santos.pdf> Acesso em
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métodos e exemplos. In: Políticas Públicas de Promoção da Igualdade Racial, vários
autores, p. 47-69 . São Paulo: CEERT, 2010
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do
currículo. 2. ed. – Belo Horizonte: Autêntica, 1999. 154p.
PAVIANI, Neires Maria Soldatelli; FONTANA, Niura Maria. Oficinas pedagógicas: relato
de uma experiência. Conjectura, Caxias do Sul, v. 14, n. 2, p. 77-88, maio/ago. 2009
63
VIEIRA, Elaine; VOLQUIND, Léa. Oficina de ensino? O quê? Por quê? Como?. 4. ed.
Porto Alegre: EDIPUCRS, 2002.
ZANTEN, Agnés Van. Pesquisa qualitativa em educação: pertinência, validez e generalização.
In: Revista Perspectiva, Florianópolis, v.22, n.01, p. 25-45, jan/jun. 2004. Disponível em <
http://josenorberto.com.br/03_artigo_zanten.pdf> Acesso em: junho/ 2015.
5.2. BIBLIOGRAFIAS CONSULTADAS
ANJOS, Rafael Sanzio. Territórios das comunidades quilombolas no Brasil. Brasília:
Mapas editora & consultoria, 2005
AGUIAR, Maciel. Arte Tribal Africana. Acervo do ÁfricaBrasil Museu
Intercontinental. Brasília: Câmara dos deputados, 2012.
AFROEDUCAÇÃO. Lei Federal 10.639/03. São Paulo/SP. Disponível em:
<http://www.afroeducacao.com.br/lei-10-639-03> Acesso em: Maio/2015
BRASIL. Lei nº 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional. Brasília, DF, dez/1996. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf>. Acesso em: abril/2015
BILL, Mv. Contraste Social. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=SEyY53Xbv7o>
CLAVAL, Paul. A geografia cultural. Tradução de Luiz Fugazzola Pimenta e Margareth de
Castro Afeche Pimenta. 3. Ed. Florianópolis: Ed. Da UFSC, 2007.
CIDADE dos Homens – A Coroa do Imperador (1º episódio, 1ª temporada). Direção:
Fernando Meirelles. Rio de Janeiro: Globo, 2002. 35'20”. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=-CcY4t4yUWY>
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987..
LIBÂNEO, JC. Democratização da escola pública: a pedagogia crítico-social dos conteúdo.
São Paulo, SP: Loyola, 2009. (Coleção educar: 1).
PONTUAL, Pedro de Carvalho. Contribuições de Paulo Freire e da educação popular à
Construção do sistema educacional brasileiro. Revista e-curriculum, São Paulo, v.7, n. 3, p.
1-11, dezembro 2011
SAPUCAHY, Leandro. Meu nome é favela. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=fLT3NDCKYNg>
SILVA, Edilson Adão Cândido da. Geografia em rede, 2º ano / Edilson Adão Cândido da
Silva, Laercio Furquim Júnior. – 1. ed. – São Paulo : FTD, 2013.
64
ANEXOS
65
ANEXO A
QUESTIONÁRIO DIAGNÓSTICO AOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO
DA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO PROFESSOR FERNANDO DUARTE RABELO
1. Qual a sua formação acadêmica? Licenciatura ou Pedagogia?
________________________________________________________________________
2. Quanto tempo tem de profissão?
________________________________________________________________________
3. Há quanto tempo trabalha na EEEM Fernando Duarte Rabelo?
________________________________________________________________________
4. Qual a raça/cor que você se define?
( ) Branca
( ) Preta
( ) Parda
( ) Amarela
( ) Indígena
Critérios adotados pelo IBGE.
5. Já presenciou uma cena de racismo em alguma escola?
( ) Sim ( ) Não Se sim, poderia nos contar um pouco como foi?
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
6. Já conviveu com algum colega de profissão que fosse preconceituoso ou racista?
( ) Sim ( ) Não
7. Já trabalhou com os alunos assuntos ligados às questões étnicas?
( ) Sim ( ) Não Se sim, poderia nos dizer alguns exemplos?
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
8. Poderia nos dar sua opinião a respeito da Educação das Relações Étnico-Raciais nas
escolas? Acredita que seja relevante?
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
Agradecemos por sua colaboração.
66
ANEXO B
ROTEIRO DE ENTREVISTA AO PROFESSOR COLABORADOR
ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO PROFESSOR FERNANDO DUARTE RABELO
Data:__/__/____ Local:_______________________________________
Professor Entrevistado:_______________________________________
1- Iniciar uma conversa informal com o professor buscando dados simples:
a) Qual sua formação acadêmica?
b) Há quanto tempo leciona?
c) Há quanto tempo leciona na EEEM Fernando Duarte Rabelo?
2- Manter o bate-papo, agora com perguntas mais diretas ao assunto:
a) Qual a sua opinião sobre a Educação das Relações Étnico-Raciais?
b) Você já trabalhou esse tema com seus alunos? Se sim, cite alguns exemplos.
c) Você percebe se ocorre discussões entre os professores sobre o tema? Você participa dessas
discussões?
Obs.: Esse roteiro é apenas uma base para que ocorra a entrevista, não significa que serão realizadas
apenas essas perguntas. Trata-se de uma entrevista semi-estruturada.
67
ANEXO C
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO POLÍTICA E SOCIEDADE
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
TERMO DE LIVRE CONSENTIMENTO
Título do Projeto: Educação Geográfica para as Relações Étnico-Raciais
Pesquisadores responsáveis: Eduardo Valpassos Motta, Helena Amanda Faller Tagarro
e Juliana Almeida Subtil
Contatos:[email protected];[email protected];[email protected]
1- Informações sobre o estudo:
a) A pesquisa tem por objetivo compreender como funciona, e se funciona a prática de
ensino da Educação para as Relações Étnico-Raciais em uma escola de Ensino Médio da
Rede Estadual.
b) A participação na pesquisa será através de aulas de Geografia, em seu horário normal,
e durante essas aulas serão feitas fotografias para registros acadêmicos.
c) Outra forma de participação será através de depoimentos gravados, com o objetivo de
avaliar a execução da prática de ensino.
d) Os registros e as transcrições ficarão guardados, sob-responsabilidade dos pesquisadores,
para fins restritos aos objetivos do estudo.
e) Em caso de dúvidas, você pode entrar em contato com os pesquisadores responsáveis
através dos endereços eletrônicos fornecidos nesse termo.
2- Sobre os direitos dos participantes da pesquisa:
a) Qualquer pergunta acerca da pesquisa e seus procedimentos podem ser feita aos
pesquisadores responsáveis em qualquer estágio da pesquisa e tais questões serão
respondidas.
b) A participação é confidencial. Apenas os pesquisadores responsáveis terão acesso à
identidade dos participantes. No caso de haver publicações ou apresentações relacionadas à
pesquisa, nenhuma informação que permita a identificação será revelada.
c) A participação é voluntária. Tanto o professor quanto os alunos são livres para deixar de
participar da pesquisa a qualquer momento, bem como para se recusar a responder qualquer
questão específica sem qualquer punição.
d) Este estudo poderá envolver a gravação de áudio. Apenas os pesquisadores terão acesso a
estes registros. Todos os registros de áudio serão destruídos após o período de cinco anos,
conforme prevê a norma de pesquisas acadêmicas.
e) Este estudo não envolve nenhum risco para a saúde mental ou física dos envolvidos.
68
3- Consentimento livre e esclarecido do participante:
Eu, __________________________________________, depois de conhecer e entender
os objetivos, procedimentos metodológicos, riscos e benefícios da pesquisa, bem como
de estar ciente da necessidade do uso da minha imagem e/ou depoimento, AUTORIZO,
através do presente termo, os pesquisadores Eduardo Valpassos Motta, Helena Amanda
Faller Tagarro e Juliana Almeida Subtil, do projeto de pesquisa entitulado “Educação
Geográfica para as Relações Étnico-Raciais”, a realizar as fotos que se façam necessárias
e/ou a colher meu depoimento sem quaisquer ônus financeiros a nenhuma das partes.
Ao mesmo tempo libero a utilização destas fotos e/ou depoimentos para fins científicos e
de estudos (livros, artigos e slides), em favor dos pesquisadores da pesquisa, acima
especificados, obedecendo ao que está previsto nas Leis que resguardam os direitos das
crianças e adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei Nº
8.069/1990), dos idosos (Estatuto do Idoso, Lei Nº 10.741/2003) e das pessoas com
deficiência (Decreto Nº 3.298/1999, alterado pelo Decreto Nº 5.296/2004).
Vitória, ____ de ______________de _______.
Pesquisadores Responsáveis pela Pesquisa
__________________________________
__________________________________
__________________________________
Sujeito da Pesquisa
__________________________________
Responsável Legal (Caso Menor de Idade)
__________________________________
69
ANEXO D
PLANO DE OFICINA PEDAGÓGICA
A APLICAÇÃO PRÁTICA DO ENSINO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS
1 OBJETIVOS
1.1 Objetivo Geral
Proporcionar aos alunos um desenvolvimento de sua capacidade crítica de opinião através de
conhecimentos adquiridos por eles ao longo da oficina, de modo que possam valorizar mais a
história e a cultura não somente dos afro-brasileiros, mas de todas as etnias encontradas no
Brasil, valorizando, assim, a diversidade cultural.
1.2 Objetivos Específicos
1. Apresentar aos alunos um pequeno contexto histórico do povo africano e o processo
de escravização brasileira;
2. Estimular um maior conhecimento acerca da formação do povo brasileiro;
3. Identificar junto aos alunos o espaço atribuído aos negros escravizados após a
abolição;
4. Propor uma atividade crítica sobre a atual configuração da população brasileira.
2 PROBLEMATIZAÇÃO PRÁTICA DO OBJETO DE ESTUDO
Todos os conteúdos de Geografia presentes no currículo escolar tem a sua importância
para a vida social do aluno. Contudo, ao trabalhar as questões étnico-raciais em sala de
aula, é bom priorizarmos assuntos que abordem em conjunto a cultura e a identidade
desses povos. Vimos, então, dentro do conteúdo geográfico de população, formas de se
discutir o conceito de território, proposto pelos PCN’s (1997) como conceito-chave da
área de conhecimento de Geografia, e discutir também assuntos como cultura e
identidade.
Trabalhar o conteúdo de população dentro da Geografia deve ultrapassar a ideia de
transmitir apenas conhecimentos quantitativos, ou seja, deve ir além de dados
demográficos, IDH e taxas populacionais. Deve ser apresentada, inicialmente, a formação
dessa mesma população em que se estuda.
Muito se lê em estudos educacionais na área de Geografia que o professor deve buscar
métodos de trazer os conteúdos para a realidade do aluno, inclusive o Currículo Básico
da Escola Estadual (2009) também traz essa perspectiva de uma Geografia mais presente
70
no dia a dia do discente, pensando assim, é importante situá-lo no espaço e no tempo,
principalmente quando falamos de população. Não estamos aqui desmerecendo, de forma
alguma, o ensino tradicional da Geografia da População, até mesmo porque também tem
sua relevância o estudo de dados populacionais e seus índices. Porém, há de convir que a
população não se resume somente a isso; principalmente a população brasileira.
3 DIAGNÓSTICOS DE CONHECIMENTOS PRÉVIOS: LEITURA E/OU DISCUSSÃO
COLETIVA
Antes de se transmitir qualquer tipo de conhecimento, o professor deve ter no mínimo um
entendimento sobre ele. Desta forma, buscamos compreender os conceitos de população,
território e identidade (como apresentamos no corpo do trabalho), para em seguida
podermos planejar a oficina pedagógica.
Esta oficina foi planejada para ser desenvolvida em três momentos: contextualização
histórica, estudo de população e território e atividade prática. O primeiro e segundo
momento é diretamente ligada à teoria, o qual apresentaremos os conceitos e o histórico
da população. Vale ressaltar que utilizaremos diferentes recursos didáticos para ministrar
a oficina, ou seja, apresentação em slides, vídeos e músicas farão parte de nossas
práticas.
No primeiro momento, sobre a contextualização histórica, usaremos um pedaço de O
Povo Brasileiro, de Darcy Ribeiro que fala a respeito dos afro-brasileiros. O texto será
bem resumido, mas mantendo a coerência necessária para o entendimento do conteúdo.
Para explicar um pouco da História da África, usaremos um organograma sobre o
Colonialismo Africano. Os demais temas serão abordados com o auxílio de músicas e
vídeo.
4 AÇÃO PRÁTICA
Como citado anteriormente, a oficina será dividida em três momentos distintos,
trabalhando com recursos e assuntos diferentes. Cada momento, porém, se refere a duas
aulas de Geografia, resultando no total de seis aulas ministradas. Assim, a duração total
de nossa oficina será de três semanas, levando em consideração que a disciplina
geográfica possui duas aulas semanais na Rede de Ensino Estadual.
A oficina será direcionada à turma de 2º Ano Regular do Ensino Médio da EEEM
Professor Fernando Duarte Rabelo. O professor colaborador conta com um horário de
aulas que contribui muito para um planejamento mais dinâmico, pois suas aulas de
71
Geografia são seguidas, estando no primeiro e no segundo horário da quarta-feira. Ter
duas aulas de cinquenta e cinco minutos juntas facilita na aplicação de certas
metodologias, como o uso de audiovisual, por exemplo. Mas, também é importante ser
cauteloso para não tornar essas duas aulas em uma grande perca de tempo,
transformando-as em aulas massivas e cansativas.
A estruturação e organização se dará da seguinte forma:
1º Momento: Contextualização Histórica dos Africanos e do Povo Brasileiro
Duração: Duas aulas de cinquenta e cinco minutos
Recursos e Materiais: Data show e cópias de texto de Darcy Ribeiro para os alunos.
Desenvolvimento: Na primeira aula faremos uma pequena apresentação da História da
África a partir do período do Colonialismo. Discutiremos as causas, os motivos e os
grandes beneficiários desse período.
Na segunda aula buscaremos fazer uma ligação com os africanos escravizados no Brasil,
iniciando uma conversa sobre a formação da população brasileira a partir do tripé índio x
branco x negro. Entregaremos os textos aos alunos para ampliar ainda mais o debate
sobre o assunto. Nesse momento faremos uma abordagem multidisciplinar com os alunos,
utlizando Darcy Ribeiro para trabalhar a disciplina de Sociologia.
2º Momento: Território e Identidade
Duração: Duas aulas de cinquenta e cinco minutos
Recursos e Materiais: Data show; audiovisual e mapas da África e do Brasil ou mapa
mundi.
Desenvolvimento: Na primeira aula apresentaremos o conceito de Território e suas
relações de poder. Falaremos principalmente das favelas, que é considerado o território
da maior parte da população afro-brasileira. Para este assunto exibiremos um episódio da
série Cidade dos Homens, com o título de “A coroa do Imperador”. Este vídeo nos dará
suporte para a segunda aula que falaremos sobre Identidade e Territorialidade. Para estes
assuntos usaremos músicas para nos auxiliar. As músicas utilizadas serão de Arlindo
Cruz – Meu nome é favela, que aborda uma visão mais romântica do território,
transmitindo coisas boas; e a outra de Mv Bill – Contraste Social, que já aborda uma
visão mais chocante, menos encantadora das favelas. Os mapas serão utilizados como
base para explicar sobre delimitação de territórios políticos.
3º Momento: Elaborando Textos
Duração: Duas aulas de cinquenta e cinco minutos
72
Recursos e Materiais: Cópias de atividades de redação com fragmentos de textos,
revistas, cola, tesoura e cartolinas branca.
Desenvolvimento: A turma será divida em cinco ou seis grupos (depende da quantidade
de alunos) e, para cada grupo, será entregue uma atividade com um fragmento de texto
diferente sobre a população afro-brasileira, seus territórios e culturas. Os grupos deverão
elaborar um texto dissertativo acerca do assunto, explicando suas ideias e compreensões.
Após a realização da redação, os grupos deverão expor suas ideias em formato visual,
criando um cartaz com a cartolina, recortes de revistas e outros materiais que eles
tiverem em mãos. O objetivo é entender a opinião dos alunos sobre o tema não apenas
através de suas escritas, mas também com o visual, através de seus cartazes.
Observações: A duração do audiovisual é de aproximadamente 35 minutos, e das duas
músicas é de aproximadamente 13 minutos.
5 AVALIAÇÃO
A avaliação se dará de três maneiras, a primeira tradicional, onde nós avaliaremos os
alunos. Este será a partir dos textos que os mesmos irão elaborar, em grupos,
apresentando suas opiniões sobre o assunto discutido. Essa forma de avaliação é
indispensável e, de acordo com o Currículo Básico da Escola Estadual (2009)
A avaliação processual deverá envolver as diferentes fontes e linguagens exploradas
pelo professor no trabalho pedagógico, explorando, sempre que possível, a
associação entre o cotidiano e o espaço geográfico. É importante que considere o
potencial individual dos alunos, mesmo quando em atividades coletivas, negando
comparação entre suas capacidades, habilidades e atitudes.
A segunda forma de avaliação será inversa, os alunos irão nos avaliar através de
depoimentos. Eles poderão dizer o que acharam da oficina, se foi importante, se
conseguiram compreender o que foi transmitido. Alguns de seus depoimentos estarão
disponibilizados no corpo do trabalho.
A última forma de avaliação será a autoavaliação. Essa forma é tão importante quanto as
demais, pois é neste momento que o professor percebe se os objetivos propostos pela
oficina foi devidamente alcançados.
Bibliografias do Plano de Oficina
BILL, Mv. Contraste Social. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=SEyY53Xbv7o>
73
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais :
introdução aos parâmetros curriculares nacionais / Secretaria de Educação Fundamental. –
Brasília : MEC/SEF, 1997. 126p.
CIDADE dos Homens – A Coroa do Imperador (1º episódio, 1ª temporada). Direção:
Fernando Meirelles. Rio de Janeiro: Globo, 2002. 35'20”. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=-CcY4t4yUWY>
ESPÍRITO SANTO. (Estado). Secretaria da Educação. Currículo Básico Escola Estadual.
Ensino médio : área de Ciências Humanas. Vitória : SEDU, 2009. 120 p
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: A formação e o sentido do Brasil.São Paulo:
Companhia das Letras, 1995. 470p
SAPUCAHY, Leandro. Meu nome é favela. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=fLT3NDCKYNg>
SILVA, Edilson Adão Cândido da. Geografia em rede, 2º ano / Edilson Adão Cândido da
Silva, Laercio Furquim Júnior. – 1. ed. – São Paulo : FTD, 2013.
74
ANEXO E
MODELO DO TEXTO UTILIZADO NO PRIMEIRO MOMENTO DA OFICINA
EEEM PROFESSOR FERNANDO DUARTE RABELO
DISCIPLINA DE GEOGRAFIA
Turma: 2V1 Professor: Roberto Silveira
Alunos Geografia UFES: Eduardo Valpassos, Helena Faller e Juliana Subtil
OS AFRO-BRASILEIROS
Darcy Ribeiro, O Povo Brasileiro, 1995
“Os negros do Brasil foram trazidos principalmente da costa ocidental africana. Arthur
Ramos (1940, 1942, 1946), prosseguindo os estudos de Nina Rodrigues (1939, 1945),
distingue, quanto aos tipos culturais, três grandes grupos. O primeiro, das culturas
sudanesas, é representado, principalmente, pelos grupos Yoruba – chamados nagô -,
pelos Dahomey – designados geralmente como gegê – e pelos Fanti-Ashanti –
conhecidos como mircas -, além de muitos representantes de grupos menores de Gâmbia,
Serra Leoa, Costa da Malagueta e Costa do Marfim. O segundo grupo trouxe ao Brasil
culturas africanas islamizadas, principalmente os Peuhl, os Mandigae e os Haussa, do
norte da Nigéria, identificados na Bahia como negros malé e no Rio de Janeiro como
negros alufá. O terceiro grupo cultural africano era integrado por tribos Bantu, do grupo
congo-angolês, proveniente da área hoje compreendida pela Angola e a 'Contra Costa',
que corresponde ao atual território de Moçambique.”
“[...] Os negros do Brasil, trazidos principalmente da costa ocidental da África, foram
capturados meio ao acaso nas centenas de povos tribais que falavam dialetos e línguas não
inteligíveis uns aos outros. A África, então, como ainda hoje o é, em larga medida, uma
imensa 'Babel' de línguas. Embora mais homogêneos no plano da cultura, os africanos
variavam também largamente nessa esfera. Tudo isso fazia com que a uniformidade racial não
correspondesse uma unidade linguístico-cultural, que ensejasse uma unificação, quando os
negros se encontrarão submetidos todos à escravidão. A própria religião, que hoje, após ser
trabalhada por gerações e gerações, constitui-se uma expressão da consciência negra, em
lugar de unificá-los, então, os desunia. Foi até utilizada como fator de discórdia, segundo
confessa o conde Arcos.”
75
“[...] Nenhum povo que passasse por isso como sua rotina de vida, através de séculos, sairia
dela sem ficar marcado indelevelmente. Todos nós, brasileiros, somos, carne da carne
daqueles pretos e índios supliciados. Todos nós brasileiros somos, por igual, a mão possessa
que o supliciou. A doçura mais terna e a crueldade mais atroz aqui se julgaram para fazer de
nós a gente sentida e sofrida que somos e a gente insensível e brutal, que também somos.
Descendentes de escravos e de senhores de escravos seremos sempre servos da malignidade
destilada e instalada em nós, tanto pelo sentimento da dor intencionalmente produzida para
doer mais, quanto pelo exercício da brutalidade sobre homens, sobre mulheres, sobre crianças
convertidas em pasto de nossa fúria.”
Referência
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: A formação e o sentido do Brasil.São Paulo:
Companhia das Letras, 1995. 470p.
76
ANEXO F
MODELO DE ATIVIDADE PARA ELABORAÇÃO DE TEXTOS
EEEM PROFESSOR FERNANDO DUARTE RABELO
DISCIPLINA DE GEOGRAFIA
Turma: 2V1 Professor: Roberto Silveira Data: ___/___/____
Alunos Geografia UFES: Eduardo Valpassos, Helena Faller e Juliana Subtil
Alunos: _________________________________________________________________
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NEGROS SÃO MAIORIA NAS FAVELAS, APONTA ESTUDO DO IPEA
“Apesar de reconhecer que nos últimos 15 anos houve uma melhoria nas condições de
habitação no Brasil, a pesquisa Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça, divulgada
nesta terça-feira pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), aponta que ainda
é perceptível a diferença entre negros e brancos, especialmente no que diz respeito aos
domicílios localizados em assentamentos subnormais, ou seja, favelas e assemelhados.”
Fonte: Diário do Grande ABC. 2008. Disponível em:
http://www.dgabc.com.br/Noticia/103984/negros-sao-maioria-nas-favelas-aponta-estudo-do-ipea
Com base no fragmento acima e nos assuntos estudados por vocês sobre a História da
África, a formação do povo brasileiro e as desigualdades sociais e raciais no Brasil,
elabore um texto dissertativo, expondo suas opiniões sobre o assunto.
Observações: O texto deve seguir os seguintes critérios:
1- Introdução
2- Desenvolvimento
3- Conclusões
4- Ter entre 8 e 25 linhas
5- Seguir uma coerência com o assunto abordado
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ANEXO G
ENTREVISTA COM O PROFESSOR COLABORADOR
Entrevistador: Primeiro, seu nome por favor?
Professor: Roberto Marcio da Silveira.
Entrevistador: Qual sua formação acadêmica?
Professor: Eu sou licenciado em Geografia, pela FAFIC que hoje é a atual FUNCAB e tenho
também formação em Pedagogia, também pela FAFIC, que é em Colatina, Espírito Santo.
Entrevistador: Há quanto tempo você leciona?
Professor: Aproximadamente 20 anos.
Entrevistador: Há quanto tempo leciona na EMEF Fernando Duarte Rabelo?
Professor: Na Fernando Duarte Rabelo estou aproximadamente há oito anos.
Entrevistador: Uma outra pergunta por favor, você atua em outras escolas em outro horário?
Professor: Sim, eu trabalho no turno matutino na escola estadual de ensino fundamental e
médio Rômulo Castelo, ela fica localizada na Serra, Carapina, ES. Onde é a minha atual
cadeira de geografia. E no Fernando Duarte Rabelo tenho extensão de carga horária.
Entrevistador: Professor, qual a sua opinião sobre Educação das Relações Étnico Raciais?
Professor: Olha bem, eu acho que primeiro a gente precisa pensar a educação no passado. A
gente precisa compreender que a escola sempre teve um papel elitista na sociedade e nas
escolas, por exemplo, mais tradicionais, quem tinha acesso à educação eram pessoas de classe
alta, classe média alta que conseguiam chegar.... e também pessoas de pele clara. Mas com
uma série de mudanças na democracia do Brasil, mais necessariamente na constituição de 88,
na Lei de Diretrizes Básicas da Educação, que é um fragmento da constituição, foi instituída a
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educação das relações étnico raciais, ou seja, a inclusão da população negra, quilombola,
estendo também a ideia da questão indígena que foi instituída dentro das escolas.
Então a partir daí, que o estado teve que atuar como um cumpridor da lei maior, que é a
Constituição Federal, estar inserindo. A partir daí a gente consegue perceber uma
miscigenação dentro da escola inicialmente, que não foi muito fácil, porque houve um
impacto muito grande até então, a escola tinha um papel hierárquico e logo no início quando
foi instituído a Lei das Diretrizes sobre as questões étnico raciais, teve uma grande parte da
população que se sentiu ofendida. Então, a partir daí os alunos passaram a ter acesso a escola
publica que não tinham acesso no passado, isso trouxe uma série de problemas dentro da
escola. Primeiro, a questão da não aceitação, preconceito, porque a sociedade brasileira é uma
sociedade elitista, que embora miscigenada, ainda vê o negro como mão de obra escrava,
então a escola passou inicialmente por essa dificuldade com a questão do preconceito e que de
certa forma, mesmo no século XXI ainda passa. A questão é debatida dentro da sala de aula,
“como pode existir preconceito no século XXI?” Precisamos compreender que o preconceito
é cultural, ensinado dentro de casa, a educação de muitos alunos foi baseada em uma ideia
preconceituosa em casa. A nossa sociedade como sendo uma sociedade elitista, então ela
educa de forma preconceituosa, mas isso vem mudando nos últimos tempos, tivemos grandes
avanços, grandes perspectivas dentro da escola. Se fizermos uma comparação entre a escola
de hoje com a escola de 20 anos atrás, com relação ao preconceito, já se veem novos valores,
maior presença de estudantes negros, cotas raciais, que é um projeto social que julgo
importante para a inserção do negro na universidade, que até então não tinha acesso que se
estenda a todas as escolas públicas do Brasil.
Entrevistador: Já trabalhou este tema com seus alunos? Se sim, cite alguns exemplos.
Professor: Eu sempre trabalho o tema na sala de aula, independente da matéria, conteúdo,
série ou grade curricular que eu esteja trabalhando, não falo todos dias sobre a consciência
negra. Acontecem fatos e episódios sobre isso em jornais, revistas, documentários que saem
na mídia e aí a gente acaba discutindo mais sobre a inclusão desses alunos negros na sala de
aula.
Uma forma que gosto muito de trabalhar, é o debate. Gosto de saber a opinião do aluno
porque quando citamos o negro e o preconceito, ele se aplica exclusivamente à população
negra, o que não é verdade, nós estamos tratando aqui do preconceito racial, da ética racial,
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sempre procuro tirar dos alunos informações e opiniões diferentes para chegarmos a um
consenso, a um ideal comum. Aqui, temos alunos que são de comunidades muito carentes,
esses alunos tem o senso comum muito aflorado, eles apresentam certas ideias, como por
exemplo, sobre qualquer tipo de preconceito, até mesmo sobre seu local de moradia que são
completamente distorcidas da verdade, por isso gosto de ouvi-los e a partir do que eles dizem,
faço acertos e adequações para chegarmos ao consenso, respeitando suas ideias. No que se
refere a percepção de alguma discussão entre os professores sobre o tema, eu confesso que
não.
Entrevistador: Você percebe se ocorre discussão entre os professores sobre o tema? Você
participa dessas discussões?
Professor: Essas discussões não acontecem dentro da sala dos professores, não só dentro das
duas escolas na qual eu ministro aula, mas em todas as escolas que eu trabalhei, quando há
uma discussão sobre o tema, é quando se aproxima o dia 20 de novembro, que é o dia da
consciência negra, geralmente os professores de história, sociologia, procuram fazer alguma
coisa, abordam a temática por causa da data, embora seja uma temática que na minha opinião
não necessariamente deveria ser abordada no dia 20 de novembro, mas nos 200 dias letivos
corridos, porque faz parte do dia a dia, é uma questão polêmica, que ainda leva a muitas
discussões, e que existe uma infinidade de opiniões muito divergentes. Penso que quando
estamos discutindo relações étnico-raciais, o mais interessante é pensarmos no ano, não
deixarmos para o dia 20.
A SEDU e a SUPERINTENDENCIA nos impõem que se faça no dia 20, solicitam que a
escola trabalhe o dia da consciência negra, que produzam materiais, para serem apresentados
em um evento na superintendência, então os professores questionam porque que só acontece
nesta data e não em outros momentos, sinto que a data marca muito, deixa muito claro, “é o
dia do negro”, há outros questionamentos como, “porque não existe o dia do branco?”,
“porque não existe o dia do mestiço?”, entra então a seguinte discussão, será que estamos
combatendo o preconceito, ou contribuindo para que haja maiores incidências de preconceito?
Penso que quando concentramos muito em um problema, a tendência dele é aumentar. Isso é o
que geralmente acontece com relação aos professores.
Entrevistador: Você se identifica como ser de que cor?
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Professor: Este é um assunto que cito muito em sala de aula, quando nascemos, se somos
morenos os pais são morenos, ou brancos, a tendência é a criança nascer branca. O registro é
feito logo no dia que nasceu ou dois dias após, porém existe um problema que permanece até
os dias atuais. Uma pessoa que é registrada branca por exemplo na época que nasceu, hoje
não se identifica como branca, se identifica como parda, porque a criança nasce com uma
certa melanina na pele, porém após 7 dias começa a se fixar mais na pele, com o contato com
o sol e luminosidade e começa a alterar a cor da criança, então nota-se que a criança não é a
mesma cor como quando foi registrada, o que se torna um problema hoje nos cartórios,
mudança de cor nos registros de nascimento em virtude disso.
No interior isso não acontecia, porque o individuo nascia e só era registrado muito tempo
depois, hoje isso não acontece, então um dos grandes problemas que temos é em relação a
isso.
Eu me identifico como uma pessoa parda, embora meu registro seja como de uma pessoa
branca, não tenho características do caucasiano, da pele branca, mas não me causa problema
algum, não faz diferença pra mim.
A ideia da cor parda vem da miscigenação, vivemos em um pais miscigenado, mistura de
índios, italianos, alemães, japoneses, ucranianos, uma infinidade de nacionalidades que
contribuíram para a miscigenação do povo brasileiro, embora na atualidade, vemos que o
numero de brancos está diminuindo, mesmo sendo predominante ainda, a população parda
está aumentando. Ao longo dos anos o processo de miscigenação continua, a tendência é ter
no futuro na demografia brasileira a predominância da população parda.
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ANEXO H
DEPOIMENTOS DOS ALUNOS
DEPOIMENTO ALUNO 1
Entrevistador: Aluno 1, para você a aplicação da aula foi produtiva?
Aluno 1: Sim, bastante, porque eu aprendi diversas coisas que eu não tinha aprendido ainda,
como que o continente africano tinha sido dividido, quando que eles voltaram ao normal e
outras coisas também.
Entrevistador: As seis aulas que foram usadas para aplicação do conteúdo sobre a África,
foram suficientes para você aprender?
Aluno 1: Sim, foi suficiente e teve bastante tempo absorver as informações e colocar em
prática.
Entrevistador: Aluno 1, eu gostaria de saber se teve alguma parte da aula ou momento nela
que alguns assuntos foram significantes para você.
Aluno 1: Sim, teve sim. Um dos assuntos são como dividir um território, o que o território
precisa, o que precisa para ser caracterizado como um território, o porque que o morro é
composto por mais gente negras e dividir correto o território, o que é preciso.
Entrevistador: E eu gostaria de saber os pontos positivos que a aula teve.
Aluno 1: Os pontos positivos sobre os estagiários? Foram que eles souberam discutir com os
alunos sobre o assunto, souberam entender as opiniões opostas, souberam explicar o que era
correto e o que não era correto também.
Entrevistador: Você acha então que os estagiários, eles respeitaram, por exemplo, as ideias
de vocês?
Aluno 1: Sim, respeitaram. Tanto que nem todas foram iguais à deles, mas mesmo assim eles
não criticaram, souberam respeitar a opinião de cada um.
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Entrevistador: Perfeito! Então você acha que, por exemplo, diferentes ideias dentro da sala
de aula contribuíram pra vocês chegaram a um consenso comum?
Aluno 1: Sim, contribuiu sim. Porque você aprende com a ideia da pessoa e também utiliza a
sua pra ver se sua ideia está correta ou se pode melhorar em algum ponto.
Entrevistador: Perfeito. Aluno 1, você teria a dizer algum ponto negativo sobre a aula?
Aluno 1: Sobre a aula não, não tenho nenhum ponto negativo, porque os estagiários souberam
compreender todo mundo. E eu creio que do mesmo jeito que aprendemos com eles, eles
aprenderam com a gente. Eles souberam dividir cada coisa.
Entrevistador: Perfeito. Faz umas considerações finais pra gente.
Aluno 1: Essa aula é muito produtiva, os estagiários deram bem a aula, deu pra aprender
bastante e por eles serem novos, souberam interagir com a turma toda.
Entrevistador: Então vocês acham que eles trabalharam dentro de uma dinâmica correta?
Aluno 1: Sim, eles trabalharam a dinâmica, com quem eles estavam trabalhando pela idade,
pensamento. Eles souberam utilizar tudo isso.
Entrevistador: Perfeito.
DEPOIMENTO ALUNO 2
Entrevistador: Agora a entrevista é com o Aluno 2. Eu gostaria de saber se a aula que os
estagiários aplicaram foi produtiva?
Aluno 2: Sim, foi produtiva, porque eles passaram conhecimento pra gente. Muita coisa ali,
tipo, como aquilo dos quilombos, eu não sabia. O pessoal mora em quilombo e até hoje não
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deve nem ter ideia que tinha quilombo aqui no Espírito Santo. Mas, aqui em Vitória.
Principalmente em Vitória. Passaram bastante conhecimento.
Entrevistador: Aluno 2, eu gostaria de saber se a quantidade de aulas, as 6 aulas, foram
suficientes para os estagiários passarem o assunto pra vocês?
Aluno 2: Sim, mas poderiam utilizar mais porque elas foram bem interativas, produtivas e
eles passam bastante conhecimento.
Entrevistador: Eu gostaria que você enumerasse alguns pontos positivos da aula.
Aluno 2: Domínio do conteúdo. Eles explicaram bastante, explicaram bem, dominaram
bastante. A produtividade da turma também aumentou, fez com que a turma participasse mais
das aulas.
Entrevistador: E o material que eles trouxeram, como aquele texto, os textos que eles estão
trabalhando com vocês. Vocês acham que esse material, ele vale a pena? Ele é informativo?
Aluno 2: Sim, vale sim, porque tem muito conteúdo que a gente não sabia e com essas aulas
nós podemos ver o conhecimento da gente.
Entrevistador: Aluno 2, você conseguiu observar algum ponto negativo? Fazer alguma
observação em relação à aula?
Aluno 2: Ponto negativo eu não tive não, mas a observação que eu tive foi da Estudante
UFES 1, que ela abordava muito o assunto sem deixar a outra falar, esqueci o nome da outra.
A Estudante UFES 2.
Entrevistador: Mas isso aí, você acha que contribuiu para que não houvesse conhecimento,
que não fosse passado o conteúdo?
Aluno 2: Não, foi passado direitinho o conteúdo, só essa observação.
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Entrevistador: A Estudante UFES 1 tem domínio maior, ela tem espírito de equipe, de
comando, talvez seja por isso.
Aluno 2: Sim, pode ser...
Entrevistador: Mas não deixa, não chega a ser um ponto negativo não é? Agora assim,
algumas considerações finais que você tenha pra falar pra gente.
Aluno 2: A aula foi boa, o domínio de conteúdo foi ótimo, a turma participou bastante, e nos
passou muito conhecimento e, se quiser dar mais aula, pode dar mais aula pra gente.
Obs.: Usamos também pseudônimos para se referir a nós, como Estudante UFES 1 e
Estudante UFES 2, também com o intuito de evitar constrangimento.
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ANEXO I
REDAÇÕES DOS ALUNOS FEITAS NO ÚLTIMO DIA DE OFICINA
Texto 1
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Texto 2
87
Texto 3
88
Texto 4
89
Texto 5
90
Texto 6