elric de melnibone pdf
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MICHAEL MOORCOCK
ELRICDE MELNIBONE
Elric of Melnibone
Copyright 2010 Michael Moorcock
Publicado originalmente em 1972
Traduzido por Juvncio Fernandes
Verso para E-Book sem fins lucrativos
Cultura Digital / Sebo Digital
osebodigital.blogspot.com
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NDICE
Prlogo................................................................................................................... 4
LIVRO UM............................................................................................................ 5
1. Um rei melanclico.............................................................................................62. Um prncipe ambicioso.....................................................................................133. Um passeio matinal a cavalo ............................................................................. 194. Prisioneiros.......................................................................................................255. Uma batalha......................................................................................................326. Perseguio .......................................................................................................45LIVRO DOIS ......................................................................................................531. As cavernas do rei do mar................................................................................. 54
2. Um novo imperador e um imperador renovado................................................60
3. Uma justia tradicional......................................................................................684. A invocao do senhor do Caos........................................................................785. O Barco que navega sobre mar e terra .............................................................. 856. O que o deus da terra cobiava .........................................................................977. O rei Grome ................................................................................................... 1038. A cidade e o espelho .......................................................................................114LIVRO TRS .................................................................................................... 1321. Alm do Portal das Sombras...........................................................................133
2. Na cidade de Ameeron ...................................................................................1403. O tnel para a Caverna dos Lamentos ............................................................ 1484. Duas espadas negras .......................................................................................1575. A misericrdia do rei plido ............................................................................168Eplogo............................................................................................................... 174SOBRE O AUTOR............................................................................................ 176
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Prlogo
Esta a historia de Elric antes de ser chamado assassino de mulheres eantes do colapso final de Melnibon. Esta a historia da rivalidade com seu primo
Yyrkoon e de seu amor por sua prima Cymoril, antes que esta rivalidade e este
amor provocassem o incndio de Imrryr, a Cidade dos Sonhos, saqueada pe1as
hordas dos Novos Reinos. Esta a historia das espadas negras, Stormbringer e
Mournblade, de como foram descobertas e de seu papel no destino de Elric e de
Melnibon, um destino que iria influenciar outro ainda maior: o destino de seu
prprio mundo. Esta a historia de quando Elric era um imperador, o mestre
mximo dos drages, frotas e de todos outros componentes da raa semi-humana
que havia regido o mundo durante dez mil anos.
Esta a historia de Melnibon, a ilha do drago. uma historia de
tragdias, de emoes monstruosas e ambies elevadas. Uma historia de feitiarias,
traies e altos ideais, de grandes agonias e prazeres, de amargos amores e doces
dios. Esta a historia de Elric de Melnibon, e grande parte dela seria recordada
pelo prprio Elric em seus pesadelos.
Crnicas da Espada Negra.
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LIVRO UM
No reino de Melnibon, todos os antigos rituais ainda so observados, porm o poder
da nao se desvaneceu h quinhentos anos atrs, e agora, seu modo de vida se conserva somente
atravs do comercio com os Novos Reinos, e um fato que graas a isso a cidade de Imrryr se
converteu em um centro de encontro de mercadores. Mas ser que os antigos rituais no so mais
teis? Ser que eles podem ser esquecidos e o destino pode ser ludibriado? Aquele que deseja reinar
no lugar de Elric prefere pensar que no. Afirma que Elric trar a destruio a Melnibon por ter
deixado de respeitar todos os antigos rituais (apesar de que na verdade Elric respeita muitos deles).
E agora se inicia a tragdia que terminar dentro de muitos anos e precipitar a destruio deste
mundo.
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1. Um rei melanclico:
A corte se esfora para honr-lo
SUA PELE da cor de um crnio desbotado, e branco como leite o
longo cabelo que lhe escorre at abaixo dos ombros. Da bela cabea afunilada
espreita um par de olhos rasgados, vermelhos e taciturnos, enquanto das mangas
largas da toga amarela surgem duas mos delicadas, tambm da cor dos ossos,
repousando cada uma sobre o brao de um trono esculpido de um nico e enorme
rubi.
O olhar escarlate sobressalta-se e, de vez em quando, a mo ergue-se e
tateia o elmo que assenta levemente nas madeixas brancas: um elmo feito de uma
liga escura, esverdeada, e moldado com requinte imagem de um drago prestes a
levantar vo. Na mo que acaricia a coroa encontra-se um anel encravado com uma
pedra rara de Actorios, cujo mago se move e se transforma devagar como se fosse
uma fumaa inteligente, to agitado na preciosa masmorra quanto o jovem albino
no seu Trono Rubi.
Lana um olhar do topo da longa escadaria de quartzo em direo ao
lugar onde a corte se diverte, danando com tamanha fragilidade e graa
sussurrante que bem podia tratar-se de uma corte de fantasmas. Na sua mente
debate questes morais, e precisamente esta atividade que o separa da vasta
maioria dos seus sditos, pois tal multido no humana.
Este o povo de Melnibon, a Ilha dos Drages, que dominou o mundopor dez mil anos, apenas para ver o poder esvair-se ao longo dos ltimos sculos.
Um povo cruel e inteligente, para quem princpios morais significam pouco mais
que o devido respeito pelas tradies de uma centena de sculos.
Para o jovem, o quadringentsimo vigsimo oitavo descendente direto
do primeiro Feiticeiro Imperador de Melnibon, tais suposies soam to ridculas
quanto arrogantes; evidente que a Ilha dos Drages perdeu grande parte do poderque tinha e que em breve estar ameaada, talvez dentro de um ou dois sculos, por
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conflitos diretos com as naes humanas emergentes, as quais os melnibonianos
chamam, com alguma condescendncia, Novos Reinos. Na verdade, vrias armadas
piratas j lanaram investidas sem sucesso contra Imrryr a Bela, a Cidade dos
Sonhos, capital de Melnibon, a Ilha dos Drages.Ainda assim, mesmo os amigos mais ntimos do imperador recusam-se a
discutir a eventual queda de Melnibon. Desagrada-lhes qualquer meno esta
idia, encarando tais observaes no apenas como impensveis, como tambm de
uma extraordinria falta de bom gosto.
Por isso, sozinho em seu trono, o imperador medita. Lamenta que o pai,
Sadric LXXXVI, no tenha gerado mais filhos, pois assim talvez houvesse ummonarca mais apto a ocupar o Trono Rubi. Sadric morrera a um ano, acolhendo
com um murmrio de gratido o que quer que tenha vindo para lhe reclamar a
alma. Durante toda a sua vida, Sadric jamais teve outra mulher que no a sua
esposa, pois a Imperatriz morrera ao dar luz o seu nico e anmico rebento.
Sadric amara a esposa com as emoes tpicas de um habitante de Melnibon
(estranhamente diferentes das dos recm-chegados humanos), e viu-se incapaz de
encontrar prazer em qualquer outra companhia, mesmo a do filho que a matara e
que era tudo quanto restava dela. Atravs de poes mgicas, entoaes rnicas e
ervas raras, o rapaz foi crescendo, sua fora conservada artificialmente por toda a
arte conhecida dos Reis Feiticeiros de Melnibon. E sobreviveu e ainda
sobrevive to somente graas feitiaria, j que franzino por natureza e, sem
as suas drogas, mal conseguiria erguer os braos durante a maior parte de um dia
normal.
Se o jovem imperador encontrou alguma vantagem na sua fraqueza de
sempre, talvez seja devido a ter-se dedicado, por necessidade, leitura. Antes dos
quinze, j tinha devorado todos os livros na biblioteca do pai, alguns mais que uma
vez. Inicialmente transmitidos por Sadric, os poderes mgicos que detm agora so
maiores que os de qualquer dos seus antepassados desde h vrias geraes. O seu
conhecimento do mundo para alm das costas de Melnibon profundo, ainda que
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continue por adquirir a experincia direta.
Se assim o desejasse, ele seria capaz de ressuscitar o antigo poderio da
Ilha dos Drages e governar a nao e os Novos Reinos como um tirano
invencvel. No entanto, a leitura tambm lhe tinha ensinado a questionar os usos emotivos do poder, e se devia sequer exercer a sua autoridade, independentemente
da causa. A leitura conduziu-o a esta moral, que, apesar de tudo, ainda lhe era difcil
compreender. Assim, tornou-se um enigma para os sditos, e para alguns at uma
ameaa, j que no pensa nem age como um verdadeiro melniboniano (e muito
menos como imperador). Ouviu-se mais de uma vez, por exemplo, que seu primo
Yyrkoon disse duvidar do seu direito imperial de governar o povo de Melnibon. Esse frgil intelectual ser a nossa desgraa! confessou uma noite a
Dyvim Tvar, o Senhor das Cavernas dos Drages.
Dyvim Tvar, sendo um dos poucos amigos do imperador, logo o
informou da conversa, porm o jovem rejeitou os comentrios como sendo nada
mais do que uma traio insignificante, ao passo que qualquer um dos seus
antepassados teria premiado tais sentimentos com uma intensa e dolorosa execuo
pblica.
A atitude do imperador ainda mais complicada pelo fato de Yyrkoon,
que continua a fazer muito pouco segredo de suas opinies sobre quem devia
governar, irmo de Cymoril, uma das amigas mais chegadas do albino, e que vir
um dia a ser imperatriz. Ao fundo do salo, pode observar-se o prncipe Yyrkoon,
trajado nas melhores sedas, peles, jias e brocados, danar sobre o cho de mosaico
com uma centena de mulheres, que ao que consta j foram suas amantes numa
altura ou outra. O rosto escuro, simultaneamente elegante e saturnino, cercava-se
de longos cabelos negros, ondulados e ensebados, e a expresso , como sempre,
sardnica, enquanto o porte exala arrogncia.
O pesado manto de brocado oscila de um lado para o outro, atingindo os
demais danarinos com alguma fora. Yyrkoon enverga-o quase como se fosse uma
armadura, ou talvez uma arma. Muitos dos cortesos nutrem mais que um pouco
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de respeito pelo prncipe. A arrogncia ofende poucos, sendo de conhecimento de
todos que Yyrkoon , ele prprio, um feiticeiro notvel. Isto para alm de ser o
comportamento que a corte espera e admira em um nobre melniboniano; e o que
esperariam encontrar no imperador.Mas o imperador sabe disso. Anseia agradar a corte que se esfora por
honr-lo com dana e esprito, mas no se consegue se convencer a tomar parte no
que considera uma irritante e enfadonha srie de atitudes rituais. Neste aspecto,
talvez seja mais arrogante que Yyrkoon. Das galerias, a msica sobe em tom e
complexidade enquanto os escravos, cada um especialmente treinado e
cirurgicamente operado para cantar uma nica nota perfeita, so incitados a umdesempenho mais ardente. At o jovem imperador se comove com a sinistra
harmonia do canto, que vagamente se assemelha a alguma melodia entoada por
uma voz humana.
Como pode todo este sofrimento inspirar tamanha beleza? Interroga-se.
Ou ser que toda a beleza produto da dor? Ser esse o segredo da arte mxima,
seja humana ou melniboniana?
O imperador Elric fecha os olhos.
D-se um alvoroo no salo inferior. Os portes abrem-se e os cortesos
danantes interrompem os passos, afastando-se e fazendo vnias exageradas
quando entram os soldados. Estes envergam uniformes azuis-claros, elmos
cerimoniais fundidos em formas fantsticas, e lanas largas ornamentadas com jias
em fitas. Escoltam uma mulher jovem cujo vestido azul condiz com os uniformes.
Cinco ou seis pulseiras de diamante, safira e ouro cingem-lhe os braos
descobertos. No cabelo enrolam-se fiadas de diamantes e safiras. No traz qualquer
desenho pintado sobre as plpebras e malares, ao contrrio da maioria das mulheres
da corte. Elric sorri. Cymoril. Os soldados so a guarda particular cerimonial que,
por tradio, a acompanha corte. Sobem os degraus que levam ao Trono Rubi.
Elric levanta-se devagar e estende as mos.
Cymoril. Julguei que tinha resolvido no nos honrar com a sua
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presena esta noite. Ela devolve-lhe o sorriso.
Meu imperador, decidi que afinal estava com disposio para
conversar.
Elric est grato. Cymoril sabe o quanto o imperador se aborrece nestasocasies, e sabe tambm que uma das poucas pessoas em Melnibon cujas
conversas lhe interessam. Se o protocolo o permitisse, Elric oferecer-lhe-ia o trono,
mas sendo assim ela ter de se sentar no degrau mais alto a seus ps.
Sente-se, por favor, doce Cymoril.
Elric retorna ao trono e inclina-se para frente enquanto Cymoril se senta
e o fixa nos olhos com um misto de humor e ternura. Enquanto os soldados seretiram para os lados da escadaria e se misturam com a guarda de Elric, ela
sussurra-lhe:
Fugiria comigo para a regio selvagem da ilha, amanh, meu amo?
H assuntos para os quais devo dar ateno...
A idia atrai-lhe. Tinham decorrido semanas desde a ltima sada da
cidade na companhia de Cymoril, a escolta mantendo uma distncia prudente.
So urgentes? Elric encolhe os ombros.
Que assuntos so urgentes em Melnibon? Ao fim de dez mil anos, a
maior parte dos problemas resolve-se sempre da mesma maneira. Elric sorri
quase de esguelha, como o sorriso de um colegial que faz planos para faltar s aulas.
Pois bem, partiremos amanh cedo, antes de todos acordarem.
O ar longe de Imrryr vai estar fresco e limpo. O sol vai estar quente
para a poca. O cu, azul e sem nuvens.
Que grande feitio deves ter lanado! ri-se Elric. Cymoril baixa o
olhar e traa um padro no mrmore do estrado.
Bem, talvez um pouco de magia. Tenho alguns amigos entre os
elementais mais fracos...
Elric estica-se para lhe acariciar os cabelos claros e delicados.
Yyrkoon sabe? pergunta.
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existncia de Melnibon e tudo quanto a nao representa. E aqueles que falam
nestes termos so muitas vezes vistos mantendo boas relaes com o prncipe
Yyrkoon, que continua a danar, aparentemente desconhecedor da conversa no
topo da escadaria, ou mesmo que a irm fala tranquilamente com o primo sentadono Trono Rubi; o primo sentado na beira do trono, absorto de toda a dignidade, e
sem exibir nenhuma da ferocidade e altivez que, no passado, marcaram
praticamente todos os imperadores de Melnibon; o primo que, em amena
languidez, se esquece que toda a corte dana para alegr-lo.
ento que, de sbito, o prncipe Yyrkoon gela durante um movimento
e ergue o olhar negro na direo do imperador. A atitude dramtica e calculada deYyrkoon chama a ateno de Dyvim Tvar, num dos cantos do salo, e o Senhor das
Cavernas dos Drages franze a testa. A mo recai sobre onde a espada
normalmente estaria, contudo no h lugar para armas num baile da corte. Com
cautela, Dyvim Tvar observa o corpulento nobre enquanto este comea a escalar os
degraus que levam ao Trono de Rubi. Vrios olhares acompanham o primo do
imperador, e agora quase ningum mais danava, apesar da msica continuar a
crescer em intensidade enquanto os donos dos escravos musicais os incitam a
esforos cada vez maiores.
Elric levanta os olhos e depara-se com Yyrkoon no degrau logo abaixo
daquele onde Cymoril se senta. Yyrkoon faz uma vnia que tambm um insulto
velado.
Apresento-me ao meu imperador disse.
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2. Um prncipe ambicioso:
Enfrentando seu prprio primo
COMO esta o baile, primo? perguntou Elric, consciente de que a
apresentao melodramtica de Yyrkoon tinha como objetivo pega-lo desprevenido
e, se possvel, humilha-lo.
Esta msica do seu agrado? Yyrkoon baixou seus olhos e em
seus lbios se formou um breve sorriso.
Tudo est conforme meu gosto, meu senhor. Mas o que houve
contigo? No participas do baile... H alguma coisa que no o agrada?
Elric levou um plido dedo ao queixo e contemplou seu primo, que lhe
sustentava o olhar.
Quando estou no baile, primo, desfruto a festa. Suponho que
possvel me regozijar como o prazer dos demais, no verdade? Yyrkoon
pareceu realmente surpreendido. Levantou os olhos e encarou Elric. Este notou
uma ligeira sacudida e afastou o olhar, sinalizando para os msicos com um
lnguido gesto de sua mo.
Ou quem sabe a dor dos outros o que me d prazer. No se
preocupes comigo, primo. Estou vontade e apreciando muito. E agora que sabe
que seu imperador esta desfrutando do baile, pode continuar com suas danas.
Mas Yyrkoon ainda no havia desistido de alcanar seu objetivo.
No obstante, para que seus sditos no saiam daqui tristes epreocupados por no saberem ter agradado a seu monarca, o imperador deveria
demonstrar sua complacncia...
Devo lembr-lo, primo... replicou Elric em voz baixa Que o
imperador no tem nenhuma obrigao para com seus sditos, exceto governar-los.
So eles que tm deveres para comigo. Tal como manda a tradio de Melnibon.
Yyrkoon no havia previsto que Elric utilizaria tais argumentos contraele, e recorreu a seguinte observao:
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Com certeza, meu senhor. O dever do imperador governar seus
sditos. Talvez seja esta a razo porque muitos deles no desfrutem tanto deste
baile como deveriam.
No compreendo voc, primo.Cymoril havia ficado de p e permanecia com as mos juntas no degrau
superior ao de seu irmo. Estava tensa e nervosa, preocupada com o tom atrevido
de seu irmo e seu ar desdenhoso.
Yyrkoon... suplicou. O prncipe pareceu reconhecer a sua
presena.
Irm... Vejo que compartilhas do desagrado de nosso imperador poreste baile.
Yyrkoon... murmurou ela Est indo longe demais. O imperador
muito tolerante, mas...
Tolerante? Ou indiferente? Por acaso ele no ser indiferente s
tradies de nossa grande raa? No mostra desdm diante deste orgulho racial?
Dyvim Tvar aguardava o momento de intervir. Era evidente que ele
tambm compreendera que Yyrkoon havia escolhido aquele momento para
submeter prova o poder de Elric.
Cymoril estava estupefata e murmurou em tom alarmado:
Yyrkoon, se quer continuar vivo!
No me importa viver se o esprito de Melnibon perece. E a
preservao do esprito de nossa nao responsabilidade do imperador. Que
acontecer se tivermos um imperador que no cumpre com esta responsabilidade,
um imperador que seja fraco, um imperador que jamais se preocupe com a
grandeza da Ilha do Drago e seu povo?
Esta uma pergunta hipottica, primo. Elric havia recuperado sua
compostura e sua voz gelada arrastava as palavras. Pois nunca se sentou um
imperador assim no Trono Rubi, e nunca se assentar.
Dyvim Tvar juntou-se ao grupo e segurou o ombro de Yyrkoon.
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Prncipe, se aprecia sua dignidade e sua vida...
Elric levantou sua mo:
Isso no necessrio, Dyvim Tvar. O prncipe Yyrkoon s estava
tendo um debate intelectual comigo. Temeroso de que eu estivesse entediado coma msica e o baile e eu no estou pensou em proporcionar-me um tema para
uma discusso estimulante. E estou seguro de que agora todos nos sentimos muito
mais estimulados, prncipe Yyrkoon.
Elric deixou que uma expresso de condescendente calidez emanasse de
sua ltima frase. Yyrkoon enrijeceu de dio e mordeu seu lbio.
Mas, por favor continue, querido primo Yyrkoon... falou Elric. Estou muito interessado. Por que no continua com seus argumentos?
Yyrkoon olhou ao seu redor, como que buscando apoio. Mas todos seus
partidrios estavam no saguo do palcio. Prximos dele s estavam os amigos de
Elric: Dyvim Tvar e Cymoril. No entanto Yyrkoon sabia que seus partidrios
estavam ouvindo cada palavra sua, e que ele perderia o apoio deles se no
respondesse. Elric notou que Yyrkoon havia preferido retirar-se desta confrontao
e escolher outro dia e outro terreno para continuar a batalha, mas isso j no era
mais possvel. O prprio Elric no desejava mais prosseguir com esta estpida
peleja que, por mais que fosse disfarada, no era melhor que uma disputa de duas
meninas sobre quem brincaria primeiro com os escravos. Assim ele decidiu colocar
fim ao episodio.
Yyrkoon comeou a responder.
Ento, deixe-me sugerir que um imperador fisicamente fraco poderia
ser tambm fraco em sua vontade para governar como est estabelecido e... Elric
levantou sua mo.
Voc j disse o suficiente, querido primo. Mais do que suficiente.
Decidiu suscitar esta discusso quando, na verdade, preferirias estar danando.
Sinto-me comovido por sua solicitude, mas tambm me sinto alarmado por suas
preocupaes Elric fez um sinal para seu velho criado, Tanglebones, que
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permanecia no outro extremo do trono, entre os soldados.
Tanglebones, minha capa! Levantou-se e falou:
Te agradeo de novo por sua solicitude, primo. depois se dirigiu
para toda a corte em geral: Me diverti muito. Mas agora preciso ir embora.Tanglebones trouxe uma capa de arminho e a colocou sobre os ombros
de seu amo. Tanglebones era muito idoso e muito mais alto que Elric, embora
tivesse as costas arqueadas e todas suas extremidades pareciam nodosas e retorcidas
sobre si mesmas, como as ramas de uma velha e robusta arvore.
Elric atravessou o estrado e desapareceu atravessando a porta situada no
fundo deste, que conduzia a seus aposentos privados por um largo corredor.Yyrkoon ficou diante do trono, encolerizado. Deu uma brusca meia volta
no estrado e abriu a boca como se quisesse se dirigir aos cortesos que o
observavam. Alguns, que no o apoiavam, sorriam abertamente. Yyrkoon cerrou os
punhos e lanou olhares fulminantes. Olhou para Dyvim Tvar e abriu seus finos
lbios para dizer algo. Dyvim Tvar lhe devolveu o olhar com frieza, desafiando-o a
dizer algo mais.
Ento, o prncipe ergueu sua cabea at que seus cabelos enroscados e
ungidos encostaram-se em suas costas. E ento Yyrkoon gargalhou.
O spero som encheu o salo. A msica parou. A gargalhada continuou.
Yyrkoon deu mais alguns passos at alcanar o estrado e, puxando sua capa,
envolveu seu corpo com ela.
Cymoril se aproximou dele.
Yyrkoon, por favor, no...
O prncipe a deixou pra trs com um gesto de seu ombro. Yyrkoon
avanou com passos tensos at o Trono Rubi. Tornou-se evidente que ele queria
sentar-se nele, levando a cabo um dos atos de traio mais prfidos no cdigo de
honra de Melnibon. Cymoril correu os breves passos que a separavam de seu
irmo e o puxou pelo brao. A risada de Yyrkoon subiu de tom.
Yyrkoon que eles desejam ver no Trono Rubi. disse para sua
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irm. Esta engoliu em seco, e olhou horrorizada para Dyvim Tvar, cuja expresso
era de fria. Dyvim Tvar fez um sinal para um guarda e, imediatamente, duas filas
de homens armados se interpuseram entre Yyrkoon e o trono. Yyrkoon voltou-se
para o Senhor das Cavernas do Drago. Ter sorte se morrer junto com seu amo. sussurrou.
A guarda de honra te escoltar pra fora do salo. respondeu
Dyvim Tvar em tom sereno. Todos ns ficamos estimulados por sua discusso
desta noite, prncipe Yyrkoon. Yyrkoon parou, olhou friamente para ele, e ento
relaxou. Depois, murmurou:
Haver muito tempo. Se Elric no abdicar, ter que ser deposto. Oesbelto corpo de Cymoril ficou rgido. Seus olhos se encheram de lgrimas.
Voltouse para seu irmo e disse:
Se fizeres alguma coisa contra Elric, te matarei com minhas prprias
mos, Yyrkoon. Ele levantou suas finas sobrancelhas e sorriu. E neste momento
pareceu odiar mais sua irm do que a seu primo.
Sua lealdade a esta criatura assegurou a sua prpria condenao,
Cymoril. Eu prefiro te ver morta que gerando um filho para ele. No desejo que o
sangue de minha casa se dilua, manche, ou sequer seja tocado pelo dele. Cuida de
sua prpria vida, minha irm, antes de ameaar a minha.
E ele desceu a escadaria, abrindo caminho entre aqueles que vinham
congratul-lo. Ele sabia que havia sido derrotado e o murmrio de seus cmplices
s o estavam irritando ainda mais.
As grandes portas do salo foram abertas e fechadas. Yyrkoon j havia
ido embora.
Dyvim Tvar ergueu os dois braos.
Continuem com a dana, cortesos. Aproveitem tudo que o baile tm
a lhes oferecer. Isto o que mais alegrar o imperador. Mas era evidente que no
se danaria mais nesta noite. Os cortesos j estavam ocupados com profundas
conversaes, onde debatiam excitadamente os acontecimentos. Dyvim Tvar foi
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at Cymoril.
Elric se recusa a compreender o perigo, princesa Cymoril. A ambio
de Yyrkoon pode trazer tragdia para todos ns.
Incluindo o prprio Yyrkoon. suspirou Cymoril. Sim, incluindo Yyrkoon. Mas como podemos evitar isso, Cymoril, se
Elric no ordena a priso do seu irmo?
O imperador acredita que pessoas como Yyrkoon devem poder dizer
aquilo que pensam. parte de sua filosofia. Eu entendo isso muito vagamente, mas
parece um aspecto fundamental de sua maneira de pensar. Se ele destrusse
Yyrkoon, destruiria a base em que se sustenta sua lgica. Isso, pelo menos, o queele tentou explicar-me, Senhor dos Drages.
Dyvim Tvar suspirou franzindo o cenho. No conseguia compreender
Elric, e temia, em alguns momentos, compartilhar dos pontos de vista de Yyrkoon.
Ao menos, os motivos e argumentos do prncipe eram relativamente claros e
diretos. Porm conhecia demasiado bem o carter de Elric para crer que este agira
levado por debilidade ou lassitude. O paradoxo era que Elric tolerava a traio de
Yyrkoon porque era forte, na verdade ele tinha o poder para destru-lo quando
quisesse. E o carter de Yyrkoon era o que colocava a prova constantemente a
fora de Elric, pois ele sabia instintivamente que, se este se mostrasse fraco e
ordenasse mata-lo, Yyrkoon teria vencido. Era uma situao complicada e Dyvim
Tvar desejava ardentemente no ter se envolvido nela. Mas sua lealdade linhagem
real de Melnibon era poderosa, e sua fidelidade a Elric era forte. Pensou
insistentemente na idia de assassinar Yyrkoon secretamente, mas sabia que um
plano assim no levaria a nada. Yyrkoon era um feiticeiro de imenso poder e, sem
duvida, estaria preparado contra ameaas a sua vida.
Princesa Cymoril... disse Dyvim Tvar. A nica coisa que posso
fazer rezar para que seu irmo acabe envenenado por sua prpria clera.
Me juntarei a voc nestas oraes, Senhor das Cavernas dos Drages.
Juntos, os dois abandonaram o salo.
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3. Um passeio matinal a cavalo:
Um momento de tranquilidade
A LUZ DA manh banhou as altas torres de Imrryr e as fez cintilar.
Cada torre era de uma tonalidade diferente, e gerava mil cores suaves. Haviam
rosados intensos, amarelos cor de plen, prpuras e verdes plidos, malvas e
marrons e alaranjados, vagos azuis, brancos e dourados. Tudo parecia belo
primeira luz do dia. Dois cavaleiros deixaram para trs a Cidade dos Sonhos e
atravessaram suas muralhas em direo aos verdes prados at um bosque depinheiros onde, entre os troncos sombrios, parecia ter permanecido um pedao da
noite. Os esquilos se assustavam e as raposas se escondiam em suas tocas;
cantavam os pssaros e as flores silvestres abriam suas ptalas e enchiam o ar de
um delicado perfume. Alguns insetos vagavam a deriva. O contraste entre a vida
nos arredores da cidade e aquela buclica ociosidade era notvel e parecia um
espelho dos contrastes que estavam na mente de um dos cavaleiros, ele que agoradesmontava e puxava as rdeas de seu cavalo entre um macio de flores azuis que
lhe chegava at a cintura. O outro cavaleiro, uma mulher, deteve sua montaria, mas
no desmontou. Ao invs disso se apoiou distendidamente sobre sua sela de
montar melniboniana e sorriu para o homem, seu amante.
Elric? Vamos parar to perto de Imrryr? Ele olhou sobre o ombro e
lhe devolveu o sorriso.
Nossa cavalgada foi muito apressada. Quero colocar meus
pensamentos em ordem antes de continuar.
Como voc dormiu ontem noite?
Muito bem, Cymoril, Acho que sonhei sem saber, pois haviam
pequenos temores em minha mente ao despertar. Mas era de se esperar, pois o
encontro com Yyrkoon no foi nada agradvel...
Acha que ele conjurou algum feitio contra voc?
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Se ele tivesse empregado algum sortilgio poderoso contra mim, eu
saberia. disse Elric encolhendo os ombros. Ele conhece bem meu poder.
Duvido que se atreva a usar magia.
Ele tem razes para acreditar que voc no usaria seu poder. Ele seestuda sua personalidade h muito tempo... No ser perigoso duvidar de suas
capacidades? Ele no poderia testar sua feitiaria assim como testou sua pacincia?
Elric franziu o cenho.
Sim, suponho que existe esse perigo, mas por enquanto ele
inofensivo...
Ele no ficar feliz enquanto no destru-lo, Elric. Ou destruir a si mesmo, Cymoril. Elric se abaixou, pegou uma flor e
sorriu outra vez.
Seu irmo inclinado a extremos, no verdade? Como o fraco
odeia a fraqueza! Cymoril compreendeu a que ele se referia. Desmontou e se
aproximou dele. Sua tnica etrea combinava quase que perfeitamente com a cor
das flores entre quais caminhava. Ele lhe ofereceu a flor e ela a aceitou, roando as
ptalas com seus lbios perfeitos.
Assim como o forte odeia a fortaleza, meu amor. Yyrkoon
sangue do meu sangue e, por esta razo, te dou este conselho: utiliza sua fora
contra ele.
No posso mat-lo. No tenho o direito de fazer isso. O rosto de
Elric encheu-se de rugas de preocupao.
Voc pode exil-lo.
No o exlio igual morte para um melniboniano?
Voc mesmo tem falado em viajar para as terras dos Novos
Reinos...
Elric riu amargamente.
Mas talvez eu no seja um verdadeiro melniboniano. Yyrkoon j
disse isso vrias vezes, e muitos outros tambm compartilham dessa idia.
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Ele te odeia por que voc contemplativo. Seu pai tambm era
assim e ningum nega que ele foi um bom imperador.
Meu pai decidiu no aplicar as suas prprias aes os resultados de
sua contemplao. Ele governou como um imperador deveria governar. Yyrkoon,devo admitir, tambm seria um bom imperador. E ele teria a oportunidade de
devolver a grandeza de Melnibon. Se fosse imperador, ele embarcaria em uma
campanha de conquista para restaurar nosso comrcio aos nveis de outrora, para
estender nosso poder atravs da terra. Isso o que maioria de nosso povo deseja.
Ser que tenho o direito de negar-lhes esse desejo? Tem o direito de fazer o que
quiser, pois o imperador. Todos os que so leais a voc pensam dessa forma. Talvez a sua lealdade esteja sendo desperdiada. Talvez Yyrkoon
tenha razo e eu estou traindo esta fidelidade trazendo a runa sobre a Ilha do
Drago. Seus olhos rubros e taciturnos olharam diretamente para os dela.
Talvez eu devesse ter morrido ao sair do tero de minha me. Assim, Yyrkoon teria
sido imperador. No poderamos contrariar o destino?
O destino no pode ser contrariado. Tudo que j aconteceu, s
aconteceu porque o destino quis assim... Isso se realmente existe tal coisa, e se as
aes dos homens no so somente uma resposta aos atos de outros homens. Elric
respirou profundamente e olhou para ela com uma expresso de ironia.
Sua lgica se aproxima da heresia, Cymoril, se temos que acreditar
nas tradies de Melnibon. Talvez fosse melhor voc esquecer sua amizade
comigo.
Voc esta parecendo meu irmo! respondeu ela com um
sorriso. Est colocando a prova meu amor por voc, meu senhor?
Elric se disps a montar de novo.
No, Cymoril, mas te aconselho que voc mesmo o coloque a
prova, pois pressinto que em nosso amor esta implcita uma tragdia.
Ela sorriu de novo e virou a cabea em um gesto de negao enquanto
subia para a cela de seu cavalo.
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Voc enxerga tragdias em tudo. Por que no aceitas as ddivas que
esto a sua disposio? Elas no so muitas, meu senhor...
Ah, sim! Nisso estamos de acordo.
J em suas montarias, se viravam para trs ao escutar um barulho decascos se aproximando. Viram a certa distncia uma coluna de cavaleiros vestidos
de amarelo que galopava desordenadamente. Era sua guarda, a qual haviam deixado
para trs na cidade, para poderem cavalgar sozinhos.
Venha! gritou Elric Vamos atravessar o bosque e as colinas que
ficam a mais frente, l eles jamais nos encontraro.
Esporearam seus cavalos atravs do bosque iluminado pelos raios do sole subiram as ngremes encostas da colina, descendo a toda velocidade por uma
outra encosta at uma plancie cheia de arbustos retorcidos cujos frutos, opulentos
e venenosos, brilhavam com uma azul prpura, uma cor to noturna que nem a luz
do dia podia desvanecer. Havia muitas frutas e ervas peculiares em Melnibon, e
algumas delas Elric devia sua prpria vida. Outras eram usadas em certas poes
mgicas e haviam sido plantadas h muitas geraes atrs pelos ancestrais de Elric.
Agora, poucos melnibonianos se arriscavam a deixar Imrryr para colh-las.
Somente escravos visitavam a maior parte da ilha em busca das razes e arbustos
que faziam os melbonianos terem sonhos esplendidos e monstruosos, pois era nos
sonhos que a maior parte dos nobres de Melnibon encontravam mais prazer; eles
sempre haviam sido uma raa taciturna e introvertida, e foi este hbito que fez com
Imrryr ficasse conhecida como a Cidade dos Sonhos. Ali, at o menos valioso dos
escravos mascava ervas para esquecer seu estado, assim eles eram mais fceis de
dominar, pois ficavam totalmente dependentes de seus sonhos. Somente Elric se
recusava a usar estas drogas, talvez por j depender de tantas outras apenas para se
manter vivo.
A guarda vestida de amarelo se perdeu atrs deles logo que eles
atravessaram a plancie de arbustos venenosos, Elric e Cymoril diminuram a
marcha e finalmente chegaram ao mar.
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As guas resplandeciam e batiam languidamente nas brancas praias
abaixo dos rochedos. As aves marinhas traavam crculos no ar difano e seus
grasnidos soavam to distantes que acentuavam ainda mais a sensao de paz que
Elric e Cymoril agora sentiam. Em silencio, os dois amantes guiaram suasmontarias por uma trilha que se dirigia at a orla. Ali desmontaram e comearam a
caminhar pela areia com os cabelos brancos dele, e negros os dela ondulando
no vento que soprava do leste.
Encontraram uma caverna seca e grande, que recolhia o barulho do mar
e o repetia em um eco sussurrante. Despojaram-se de suas roupas de seda e fizeram
amor com ternura na penumbra da caverna. Depois permaneceram abraadosenquanto o dia esquentava e o vento diminua. Por fim, se banharam no mar e
encheram o vazio do cu com suas risadas.
J estavam secos quando, enquanto se vestiam, notaram que o horizonte
escurecia. Elric disse:
Vamos nos molhar de novo antes de chegar a Imrryr. Por mais rpido
que cavalgarmos, a tempestade ainda nos alcanar.
Talvez pudssemos ficar na caverna at que passe. sugeriu ela,
apertando seu corpo suave contra o dele.
No. respondeu Elric. Devo voltar depressa, preciso tomar
poes em Imrryr para que meu corpo mantenha seu vigor. Se no fizer isso dentro
de duas horas, meu comeara a enfraquecer. E voc j me viu neste estado antes,
Cymoril.
Ela acariciou seu rosto se seus olhos se mostraram compassivos.
Sim, j te vi enfraquecido, Elric. Vem, vamos pegar nossos cavalos.
Quando chegaram em suas montarias o cu j estava cinzento sobre suas
cabeas e cheio de densas nuvens negras. Escutaram o som de um trovo e viram o
claro de um relmpago. O mar se agitava como se estivesse contagiado pela
histeria do firmamento. Os cavalos estavam inquietos, ansiosos para regressar.
Ainda no haviam terminado de montar quando grandes gotas de chuva
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comearam a cair sobre suas cabeas e a resvalar sobre suas capas.
Ento, logo eles estavam galopando de volta para Imrryr o mais rpido
que podiam, enquanto os relmpagos estalavam e os troves rugiam como a voz de
um gigante furioso, como se algum antigo e poderoso Senhor do Caos tentasseinvadir o reino da Terra.
Cymoril contemplou as plidas feies de Elric iluminadas durante um
segundo por um claro de fogo celestial, e sentiu um calafrio. E seu calafrio no era
causado pelo vento e nem pela chuva, e sim porque durante este segundo de
resplendor, ela pareceu ver aquele tranquilo pensador que tanto amava,
transformado pelos elementos em um demnio surgido do inferno, em ummonstro que apenas guardava algum aspecto de humanidade. Seus olhos rubros
haviam brilhado na brancura de seu rosto como chamas surgidas do inferno mais
profundo; seu cabelo estava espalhado, como o penacho de um sinistro elmo de
guerra e, por um efeito da luz, seu rosto havia parecido torcer-se em uma expresso
de fria e agonia.
E ento, Cymoril compreendeu.
Ela compreendeu, profundamente em seu ser, que aquele passeio matinal
havia sido o ltimo momento de paz que ambos iriam experimentar. A tempestade
era um sinal dos prprios deuses, um aviso de outras tempestades que se
aproximavam.
Olhou para seu amado. Elric estava rindo. Havia voltado seu rosto aos
cus e a clida chuva caa sobre sua face, salpicando sua boca aberta. Sua risada
soava como a gargalhada fcil e espontnea de uma criana feliz.
Cymoril tentou rir junto com ele, mas teve que esconder seu rosto para
que Elric no o visse. Porque ela estava chorando.
E ainda estava chorando quando avistaram Imrryr, que ao longe era
como uma silhueta negra e grotesca recortada contra uma linha de fulgor e luz que
era o imaculado cu do oeste.
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4. Prisioneiros:
Seus segredos lhes so arrancados
OS HOMENS DE armaduras amarelas vieram a Elric e Cymoril quando
o casal se aproximava do menor dos portais que se abria para o leste.
Por fim nos encontraram. sorriu Elric embaixo da chuva Mas,
chegaram um pouco tarde, no Cymoril?
Cymoril, ainda abatida pela premonio que a havia assaltado, se limitou
a consentir e tentou retribuir o sorriso. Elric confundiu seu gesto com uma
expresso de desapontamento, nada mais, e chamou sua guarda:
Homens, logo estaremos todos secos outra vez!
Mas o capito da guarda galopou rapidamente at ele, gritando:
Solicitam a presena de meu senhor imperador na Torre de
Monshanjik, espies foram apanhados!
Espies?
Sim, meu senhor. O capito tinha o rosto branco como cera. A
chuva lhe caa de seu elmo e escurecia sua capa. Tinha dificuldades para dominar
sua montaria, que avanava de lado entre os charcos de gua do caminho, que
precisava ser reparado com urgncia. Eles foram capturados no labirinto esta
manha. So brbaros do sul, segundo se deduz por suas roupas. Esto presos na
torre at que o prprio imperador possa interrog-los. Elric fez um gesto com a
mo e respondeu: Ento vamos para l, capito. Vamos a ver estes valentes estpidos
que se atreveram a penetrar no labirinto marinho de Melnibon.
A Torre de Monshanjik levava o nome do mago-arquiteto que havia
projetado o labirinto marinho milnios antes. O labirinto era o nico meio de
chegar ao grande porto de Imrryr e seu segredo sempre havia sido guardado
cuidadosamente, pois era a melhor proteo contra um ataque imprevisto. Olabirinto era muito complicado e alguns navegadores foram treinados especialmente
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para guiar as naves por seus canais. Antes de se construir o labirinto, o porto havia
sido uma espcie de laguna interna, alimentada pelo mar que passava por um
sistema de cavernas naturais abertas entre os impressionantes rochedos que se
alavam entre a laguna e o oceano. Haviam cinco rotas distintas atravs do labirintoe cada navegador s conhecia uma delas. Na parte exterior dos rochedos havia
cinco entradas. Aqui os navios dos Novos Reinos aguardavam at que subisse a
bordo um navegador melniboniano. Ento se abria o porto de uma das cinco
rotas, depois de haver tomado a precauo de tapar os olhos de toda a tripulao
durante a passagem, que tambm deveria permanecer sob o convs. O timoneiro e
o chefe dos remadores ficavam no convs, mas deviam cobrir-se tambm compesados elmos de ao, e auxiliavam o navegador limitando-se a lhe obedecer as
complicadas manobras que ordenava, sem poder ver por onde passavam. E se
acontecia de um navio dos Novos Reinos desobedecer alguma destas instrues,
acabava se despedaando contra os muros de pedra... O povo de Melnibon no se
lamentava por isso e todos os tripulantes sobreviventes terminavam seus dias como
escravos na Ilha do Drago. Todos os interessados em comerciar com a Cidade dos
Sonhos compreendiam os riscos que isso significava, mas grande quantidade de
mercadores vinha mensalmente vencer os riscos do labirinto e trocar seus pobres
produtos pelas esplndidas riquezas de Melnibon.
A Torre de Monshanjik se levantava sobre o porto e sobre o imenso
monte que adentrava at o centro da laguna. Era uma torre verde mar, baixa e
robusta em comparao com a maioria das torres de Imrryr, mas ainda assim
resultava em uma edificao formosa e destacada, com amplas janelas de onde se
podia avistar-se todo o conjunto de instalaes porturias. Na Torre de Monshanjik
se levavam a cabo quase todos os tratos comerciais do porto e, em seus aposentos
inferiores, se guardavam os presos que haviam quebrado alguma das inumerveis
regras que governavam o funcionamento do comrcio. Deixando Cymoril para que
esta voltasse ao palcio escoltada por um guarda, Elric penetrou na torre e
atravessou a cavalo o grande arco de sua entrada principal, dispersando uma
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quantidade notvel de comerciantes que aguardavam a permisso necessria para
iniciar suas transaes, pois todo o andar inferior do edifcio estava cheio de
marinheiros, mercadores e funcionrios de Melnibon dedicados aos assuntos
comerciais, embora ali no fosse o lugar onde se comerciavam realmente asmercadorias. A grande balbrdia de milhares de vozes empenhadas em inmeras
discusses sobre contratos a serem fechados, foi lentamente baixando de
intensidade medida que Elric e sua guarda a cavalo arrogantemente atravessavam
o salo, rumo a um arco sombrio, no extremo oposto da sala. Este arco se abria
para uma rampa inclinada e curva que conduzia as entranhas da torre.
Os cavaleiros desceram pela rampa, passando por escravos, criados efuncionrios que rapidamente ficavam de p, prestando grandes reverencias, assim
que reconheciam o imperador. Enormes tochas iluminavam o corredor, enchendo
de sombras distorcidas as lisas paredes de obsidiana. O ar era glido e mido, pois a
gua do mar banhava os muros exteriores abaixo dos desembarcadouros de Imrryr.
O imperador continuou avanando pela rampa que seguia descendo entre a rocha
cristalizada. E ento, uma onda de calor chegou at eles logo que avistaram una luz
bruxuleante um pouco mais a frente. Penetraram em uma cmara cheia de fumaa e
do fedor do medo. Do teto baixo pendiam numerosas correntes, e presas em oito
delas, Elric viu quatro pessoas. As roupas lhes haviam sido arrancadas, seus corpos
estavam cobertos de sangue proveniente de pequenas, mas precisas e dolorosas
feridas realizadas por um artista que, de p e com um escalpelo na mo,
supervisionava sua obra prima.
O artista era um homem alto e muito magro, quase um esqueleto
coberto de roupas brancas manchadas de sangue. Tinha os lbios finos, os olhos
fundos, os dedos pequenos e seu cabelo era curto e fino. O escalpelo que levava em
sua mo era tambm muito fino, quase invisvel, exceto quando refletia a luz do
fogo que ardia no outro extremo da cmara.
O artista era chamado Doutor Alegria e sua especialidade era mais uma
habilidade que uma arte em si (embora ele defendesse o contrrio com grande
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convico), era a arte de extrair segredos daqueles que os guardavam. O Doutor
Alegria era o chefe dos interrogadores de Melnibon. Quando viu Elric entrar, se
voltou para ele com um gesto tortuoso, sustentando o escalpelo entre seu dedo
polegar e o indicador de sua mo direita; permaneceu assim erguido e expectantepor um instante, quase como um bailarino, e depois fez uma profunda reverencia.
Meu amado imperador!
Sua voz era fina e surgia de sua garganta como que suplicasse para sair
dela, fazendo com que as pessoas duvidassem de realmente ter escutado suas
palavras, pois soavam breves e rpidas.
Doutor, estes so os espies do sul que foram capturados estamanha?
Certamente so eles, meu senhor. respondeu o aludido com outra
tortuosa reverencia Para vosso prazer.
Elric inspecionou friamente os prisioneiros. No sentia a menor simpatia
por eles, pois eram espies e seus atos os haviam levado aquela situao. Eles
sabiam o que aconteceria a eles se fossem capturados. Mas, um deles era um
menino e o outro era uma mulher; pelo menos era o que pareciam, eles se agitavam
tanto, presos nos grilhes, que era difcil reconhece-los a primeira vista. Era uma
viso penosa. A mulher mostrou os poucos dentes que ainda lhe restavam e disse:
Demnio! Elric deu um passo para trs.
Eles j falaram o que faziam no labirinto, doutor?
No, seguem exasperando-me com divagaes. Tem um elevado
conhecimento de arte dramtica, coisa que aprecio. Em minha opinio, tentavam
traar uma rota para que uma frota invasora possa cruzar o labirinto. Todavia, eles
ainda no me revelaram os detalhes. Assim o jogo deles, e ns sabemos como
joga-lo.
Ento, quando acha que eles iro falar, Doutor Alegria?
Oh, logo, meu senhor.
Seria bom saber se devemos esperar um ataque. Quanto mais cedo
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soubermos, menos tempo perderemos nos livrando dos atacantes, no concorda
doutor?
Com certeza, meu senhor.
Muito bem.Elric estava irritado com aquele imprevisto. Ele havia esquecido o prazer
de seu passeio a cavalo e tinha voltado muito cedo para suas responsabilidades.
O Doutor Alegria voltou para seu trabalho, e estendendo o brao,
agarrou com a mo que estava livre o pnis de um dos prisioneiros, o escalpelo
brilhou por um momento e ouviu-se um gemido de dor. O Doutor Alegria lanou
alguma coisa ao fogo. Elric se sentou em uma cadeira preparada para ele. Osmtodos usados para obter informaes dos prisioneiros, no s o desgostavam
como o aborreciam; os gritos estridentes, o retinir das correntes, os leves sussurros
do Doutor Alegria, tudo contribua para destruir a sensao de bem estar que havia
conservado at a entrada na cmara. No entanto, assistir a estes rituais era um de
seus deveres reais, e tinha que suportar tudo at que lhe fosse apresentada
informao obtida; ento agradeceria ao chefe dos interrogadores e daria as ordens
oportunas para enfrentar o ataque; e quando todo estivesse pronto teria que
conferenciar com almirantes e generais, provavelmente durante o resto da noite,
escolhendo entre as opes disponveis e decidindo a disposio de homens e
navios. Com um bocejo mal disfarado, se reclinou na cadeira e observou o Doutor
Alegria enquanto este usava o escalpelo e aplicava ganchos e tenazes no corpo dos
espies. Elric ento se dedicou a meditar em outros assuntos, em problemas
filosficos que no conseguia resolver.
Isso no significava que Elric era inumano, mas sim que era antes de
tudo um melniboniano, e estava acostumado com estes espetculos desde que era
criana. Mesmo que desejasse, ele no poderia salvar os prisioneiros, pois isso
significaria passar por cima de todas as tradies da Ilha do Drago. E neste caso,
se tratava simplesmente de uma ameaa a qual teria que enfrentar da melhor
maneira possvel. Elric havia se acostumado a reprimir os sentimentos que
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entravam em conflito com seus deveres como imperador. Se houvesse algum
benefcio em libertar os quatro desgraados que agora danavam de dor no
escalpelo do Doutor Alegria, ele o teria feito com prazer. Porm tal atitude no o
ajudaria em nada, e inclusive os prisioneiros ficariam assombrados de receber umtratamento diferente deste que estavam recebendo agora. Quando se tratava de
dilemas morais, Elric era sobretudo prtico e resolvia as coisas em funo das
possveis aes que poderia tomar. Mas nesse caso concreto, no podia adotar
nenhuma ao. Esta atitude havia se transformado em sua segunda natureza. Seu
desejo no era reformar Melnibon, mas sim reformar-se a si mesmo; no desejava
tomar iniciativas, mas sim estudar o melhor modo de responder as aes dosoutros. Aqui era fcil tomar uma deciso. Um espio era um agressor, e o reino
devia defender-se dos agressores da melhor maneira possvel. E nesse caso, os
mtodos empregados pelo Doutor Alegria eram os melhores.
Meu senhor...
Elric olhou para ele com um ar ausente.
J temos a informao, meu senhor.
A fina voz do Doutor Alegria ressoou no extremo oposto da cmara.
Dois pares de correntes estavam agora vazios e alguns escravos recolhiam restos
humanos do cho e os lanavam nas chamas. Os dois corpos disformes que
restavam, pareciam para Elric como pedaos de carne meticulosamente preparados
por um cozinheiro. Um dos corpos ainda se agitava debilmente, mas o outro j
estava imvel.
O Doutor Alegria guardou seus instrumentos em uma caixa que levava
atada ao cinto. Sua branca indumentria estava quase toda coberta de sangue.
Parece que j houve outros espies antes destes. disse o Doutor
para seu mestre. Os que capturamos agora vieram apenas para confirmar a
primeira rota. Caso eles no regressassem, a frota inimiga iria atacar.
Mas ento, com certeza eles agora sabem que os estamos
aguardando? perguntou Elric.
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Provavelmente no, meu senhor. Espalhamos o rumor entre os
mercadores e marinheiros dos Novos Reinos, de que quatro espies foram vistos
no labirinto e foram mortos com lanas quando tentavam escapar.
Compreendo. Elric franziu o cenho e acrescentou Ento, omelhor plano ser fazer uma armadilha para estes invasores.
Com certeza, meu senhor.
Sabemos qual rota haviam escolhido?
Sim, meu senhor. Elric se voltou para um dos guardas e lhe ordenou:
Envie mensagens informando todos nossos generais e almirantes. So
quantas horas? Acaba de anoitecer, meu imperador.
Diga-lhes que se apresentem diante do Trono de Rubi duas horas
depois do crepsculo.
Elric ergueu-se rapidamente Como sempre, fez um bom trabalho,
Doutor Alegria.
O delgado artista fez uma profunda reverencia, dobrando-se quase
totalmente pela cintura, e respondeu ao elogio com um suspiro sutil e um tanto
untuoso.
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5. Uma batalha:
O rei mostra sua capacidade militar
YYRKOON FOI O primeiro a chegar, vestido da cabea aos ps com
um elegante uniforme de guerra e acompanhado por dois enormes guardas, cada
um dos quais segurando um dos ornamentados estandartes de guerra do prncipe.
Meu imperador! O grito de Yyrkoon soava orgulhoso e cheio de
desdm. Me permitiria comandar os guerreiros? Posso me encarregar deles j
que, sem duvida, meu senhor ter muitas outras questes que ocuparo seu tempo.
Tem muita considerao, prncipe Yyrkoon, mas no deves temer por
mim. replicou Elric impacientemente Eu irei frente dos exrcitos e
esquadras de Melnibon, pois este o dever do imperador.
Yyrkoon lhe dirigiu um olhar colrico e se recolheu a seu lugar quando
entrou no salo Dyvim Tvar, Senhor das Cavernas do Drago. O recm chegado
no estava acompanhado de nenhum guarda e parecia ter-se vestido
apressadamente. Porm levava seu elmo embaixo do brao.
Meu imperador, trago noticias dos drages.
Obrigado, Dyvim Tvar, mas peo-lhe que aguarde at que cheguem
todos os meus comandantes. Assim estaremos todos a par de suas noticias. Dyvim
Tvar fez uma reverencia e se dirigiu ao lado contrario do salo em que se
encontrava o prncipe Yyrkoon.
Pouco a pouco, foram chegando os guerreiros at que a todos osprincipais comandantes estavam reunidos ao p da escadaria que conduzia ao
Trono Rubi, onde estava sentado Elric. No entanto, este ainda usava as roupas que
havia utilizado no passeio matinal a cavalo. No havia tido tempo para se trocar,
pois at poucos momentos atrs estivera consultando os mapas do labirinto, eram
mapas aos quais somente ele tinha acesso e que, em circunstncias normais,
estavam ocultos atravs de magia para todo aquele que tentasse procura-los. Os povos do sul querem se apoderar das riquezas de Imrryr e matar
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todos ns. disse Elric Acreditam ter encontrado uma rota para atravessar
nosso labirinto marinho. Nesse momento, uma frota de cem navios de guerra
avana para Melnibon. Amanh aguardaro at que anoitea e, ento navegaro
atravs do labirinto e tentaro nos invadir. A frota inimiga quer alcanar o porto ameia noite e tomar a Cidade dos Sonhos antes do amanhecer. E eu lhes pergunto:
eles iro conseguir isso?
No! Muitas gargantas gritaro em unssono a breve resposta.
No! gritou Elric sorrindo Mas, ento como desfrutaremos
melhor desta pequena batalha que eles nos oferecem? Como sempre, Yyrkoon foi
o primeiro a responder, vociferante: Saiamos agora mesmo ao seu encontro com os drages e os navios de
guerra. Vamos perseguir o inimigo at sua prpria terra e levaremos a guerra para
l. Atacaremos suas naes e incendiaremos suas cidades! Os conquistaremos e
com isso, asseguraremos nosso prprio bem estar!
Ento Dyvim Tvar o interrompeu laconicamente:
No temos drages. disse ele.
O que? Yyrkoon perguntou Como?
No temos drages prncipe. Esto todos dormindo. Os drages
dormem em suas cavernas, esgotados pela ltima misso que cumpriram para voc.
Para mim?
Voc os utilizou no conflito com os piratas de Vilmir. Eu o havia
avisado que era prefervel poupa-los para ameaas de maior envergadura, mas voc
levou-os contra os piratas. Os usou para incendiar seus pequenos navios, e agora os
drages dormem.
Yyrkoon franziu a testa e olhou para Elric.
Eu no poderia prever... Elric levantou a mo.
No utilizaremos nossos drages at que seja realmente necessrio.
Este ataque da frota meridional no nada, mas mesmo assim conservaremos
nossas foras e aguardaremos o momento certo para atacar. Vamos deix-los
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pensar que nos pegaram desprevenidos. Deixemos que entrem no labirinto. Uma
vez que todos os cem navios estejam l dentro, ns os cercaremos, bloqueando
todas as rotas do labirinto, tanto as de entrada como de sada. Assim que a frota
estiver capturada, ns os destroaremos.Yyrkoon mantinha os olhos fixos nas pontas de seus ps, com um ar
irritado. Era evidente que tentava encontrar algum ponto fraco no plano. Magum
Colim, o enorme e idoso almirante da frota, se adiantou at a escadaria envergando
sua armadura verde mar e fez uma reverencia.
Os navios dourados de guerra de Imrryr esto preparados para
defender a cidade, meu senhor. Precisaremos de tempo para manobr-los at queestejam em posio. No seguro que todos entrem no labirinto ao mesmo tempo.
Ento envie imediatamente uma pequena frota para fora do labirinto
e a mantenha escondida atrs dele, perto da entrada. Ali elas aguardaro os
possveis sobreviventes que possam escapar a nosso ataque. ordenou Elric.
Um plano muito astuto, meu senhor. assentiu Magum Colim, ao
mesmo tempo em que fazia uma nova reverencia e retrocedia at o grupo de
comandantes. O debate sobre os planos de guerra se prolongou por mais algum
tempo. Quando tudo j estava preparado e se dispunham a sair, o prncipe Yyrkoon
elevou de novo sua voz para dizer:
Repito minha oferta ao imperador. Sua pessoa demasiado valiosa
para arriscar-se em uma batalha. Eu no tenho valor nenhum. Deixai-me comandar
seus guerreiros, tanto em terra como no mar. Enquanto isso, o imperador
permanecera no palcio sem preocupar-se com a batalha, na confiana de que o
inimigo ser derrotado. Talvez o imperador possa at ter tempo de terminar de ler
algum livro...
Elric respondeu com um sorriso:
Agradeo de novo sua preocupao, prncipe Yyrkoon, mas um
imperador deve exercitar tanto seu corpo como sua mente. Amanha irei frente
dos guerreiros.
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Quando o imperador voltou para seus aposentos, verificou que
Tanglebones j havia se encarregado de preparar seus artefatos de guerra, negros e
pesados. Ali estava a armadura que havia servido a mais de cem de imperadores deMelnibon; uma armadura forjada com magia para ter uma resistncia sem igual em
toda a Terra, capaz de resistir, segundo se dizia, at aos golpes das lendrias espadas
mgicas, Stormbringer e Mournblade, que haviam sido empunhadas pelos mais
valentes e bravos governantes de Melnibon at que caram nas mos dos Senhores
dos Mundos Superiores, que as ocultaram para sempre em um lugar, em que at
mesmo estes Senhores raramente se aventuravam.O rosto do criado se alegrava enquanto acariciava cada pea da armadura
e cada uma das armas, perfeitamente balanceadas, com seus dedos largos e
nodosos. Seu rosto sulcado de rugas estava voltado para Elric e seus olhos
estudavam as feies preocupadas do imperador.
Oh, meu senhor, meu rei! Agora conhecers a alegria do combate!
Com certeza, meu bom Tanglebones. E esperemos que eu realmente
desfrute da alegria do combate.
Eu te ensinei tudo que sei meu senhor. A arte da espada e do punhal,
a arte do arco da lana, tanto a p como a cavalo. Tu as aprendeste bem, mesmo
que alguns digam que s fraco. Em toda Melnibon, s existe um espadachim
melhor que o imperador.
E este que pode superar-me o prncipe Yyrkoon. disse Elric
pensativamente. No ?
Eu disse somente um, meu senhor.
E este um Yyrkoon. Bem, quem sabe um dia eu possa colocar
isso a prova. Antes de vestir a armadura, tomarei um banho.
Seria melhor apressar-se, meu amo. Pelo que ouvi falarem, haver
muito a fazer.
Depois do banho, irei dormir. anunciou Elric, para consternao
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de seu velho servidor. Ser o melhor a fazer, j que no poderei comandar
pessoalmente a colocao dos navios. Eu serei necessrio para dirigir o combate e,
para isso, melhor que tenha descansado adequadamente.
Se tu acreditas que o melhor, meu senhor rei, assim ser. Vejo que minha deciso te surpreendeu. Meu bom Tanglebones, voc
est demasiado impaciente em ver-me dentro desta armadura, pavoneando-me
como se fosse o prprio Arioch...
O criado levou sua mo boca como se tivesse sido ele, e no seu amo,
quem havia pronunciado aquelas palavras e quisesse reprimi-las. Tinha os olhos
arregalados.Elric soltou uma gargalhada.
Meu pobre amigo... Acredita que disse uma heresia, no ? Bem, j
disse coisas bem piores sem que me tenha sobrevindo nenhum mal. Em
Melnibon, meu querido servo, so os imperadores que controlam os demnios, e
no o contrario.
s tu quem o disse, meu senhor.
E a verdade. Elric saiu da sala e chamou seus escravos. A febre da
guerra queimava dentro de seu ser e ele se sentia jubiloso.
Por fim, Elric estava enfiado em sua negra armadura com um enorme
peitoral, cotas de malha, grandes cotoveleiras e manoplas articuladas. Presa ao cinto
levava sua grande espada que, segundo se conta, havia pertencido a um antigo heri
mortal chamado Aubec. Apoiado contra o convs dourado da primeira ponte do
navio, estava seu grande escudo de batalha, adornado com um emblema de um
drago atacando. E, cobrindo seu rosto, o imperador usava um elmo negro com
uma cabea de drago no alto, asas de drago estendidas at atrs e uma cauda de
drago caindo-lhe sobre os ombros. Todo o elmo era negro, mas em seu interior, se
notava uma sombra branca de onde sobressaia um par de olhos de uma intensa cor
vermelha. Dos dois lados do casco, algumas mechas de cabelo, brancas como a
neve se agitavam ao vento como colunas de fumaa que escapavam de um edifcio
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em chamas. E, quando a cabea coberta pelo elmo voltou-se para a escassa luz da
lanterna colocada na base do mastro principal, a viseira levantada converteu a
sombra branca de seu interior em um rosto de finas e elegantes feies: um nariz
reto, lbios curvos e olhos amendoados e oblquos. O rosto de Elric, imperador deMelnibon, perscrutava a escurido do labirinto a espera dos primeiros sons da
frota invasora.
Elric aguardava sobre a elevada ponte de comando da grande galera
dourada que, como todas as outras de sua classe, pareciam um zigurate flutuante
equipado com mastros, velas, times e catapultas. O navio tinha o nome de Filho
de Pyaray e era o principal da frota. Junto a Elric se encontrava o GrandeAlmirante. Magum Colim. Este, assim como Dyvim Tvar, era um dos ntimos
amigos do imperador. Conhecia Elric desde que este havia nascido e lhe havia
estimulado a estudar tudo que fora possvel sobre o comando dos barcos de
combate e a disposio das frotas de guerra. Porm, em seu ntimo, Magum Colim
temia que Elric fosse demasiado intelectual e introspectivo para governar
Melnibon, mas aceitava o direito de Elric reinar e se mostrava furioso e impaciente
com os comentrios dos seguidores de Yyrkoon. O prncipe Yyrkoon tambm
estava a bordo do nau capitania, e estava no convs inferior, inspecionando as
mquinas de guerra.
O Filho de Pyaray estava ancorado em uma enorme gruta, era um dos
cem navios que foram escondidos nos muros do labirinto, muros que foram
construdos quando este foi projetado, com o claro propsito de ocultar una galera
de combate. A gruta tinha a altura certa para que passassem os mastros, e largura
suficiente para que pudessem mover os remos sem impedimentos. Todos os navios
dourados da frota eram dotados de filas de remos, cada uma das quais levava de
vinte a trinta remos em cada costado. As filas de remos tinham quatro, cinco e at
seis nveis de altura e muitos navios, como o prprio Filho de Pyaray, contavam
com trs sistemas de controle para avanar ou recuar. As embarcaes, todas elas
banhadas em ouro, eram praticamente indestrutveis e, mesmo com seu imponente
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tamanho, podiam avanar em grande velocidade e manobrar com delicadeza
quando a ocasio o exigia. No era a primeira vez que aguardavam o inimigo
naquelas grutas, e tampouco seria a ltima (e a prxima vez em que fariam isso
seria em circunstancias muito diferentes). Nos ltimos tempos, as galeras decombate de Melnibon no saiam mais para navegar no mar aberto. Mas, em outras
pocas haviam percorrido os oceanos do mundo como temveis montanhas
flutuantes de ouro, semeando o terror onde eram avistadas. Ento nesses dias, a
frota era mais numerosa, contando com centenas de navios. Agora, dispunham de
apenas quarenta navios. Mas eles seriam o bastante.
Agora na mida escurido, eles aguardavam o inimigo. Escutavam omontono bater das guas contra os costados do navio, Elric desejou ter tido
tempo de pensar em um plano melhor que aquele. Embora estivesse seguro de que
sua estratgia daria resultado, ele se lamentava pela perda intil de vidas, tanto
melnibonianas como brbaras, que iria ocasionar. Talvez fosse melhor encontrar
um modo de atemorizar os brbaros, ao invs de massacr-los no labirinto
marinho. Talvez porque ningum mais se aventurara fora da Cidade dos Sonhos, a
frota dos homens do sul no fora a primeira que havia se convencido de que os
melnibonianos haviam entrado em decadncia e no eram mais capazes de
defender seus tesouros. Por isso, os invasores deviam ser destrudos para que a
lio ficasse bem clara: Melnibon ainda era muito poderosa. O suficiente, na
opinio de Yyrkoon, para recuperar seu domnio anterior do mundo. Sim,
Melnibon continuava poderosa, pelo menos no que se referia a feitiaria, mas no
no nmero de tropas.
Oua! O almirante Magum Colim se inclinou at a frente da ponte
No foi o rudo de um remo?
Acho que sim. disse Elric.
Chegaram at eles alguns sons de remadas em intervalos regulares, como
se fossem filas de remos entrando e saindo da gua. Por fim, escutaram o barulho
de madeira, os invasores do sul estavam chegando. O Filho de Pyaray era o navio
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mais prximo da entrada do labirinto e seria o primeiro a mover-se, mas s faria
isso quando tivesse passado o ltimo dos navios invasores. O almirante Magum
Colim se inclinou e apagou a lanterna, e ento rapidamente e em silencio, desceu o
convs para informar a tripulao da chegada do inimigo.Um pouco antes, Yyrkoon havia utilizado sua magia para invocar uma
peculiar neblina que ocultava as douradas galeras da vista dos inimigos, mas que
permitia aos melnibonianos ver atravs dela as naves que se aproximavam. Elric via
agora as tochas acendidas no canal situado frente deles. Os barcos invasores
avanavam cuidadosamente pelo labirinto. No transcurso de poucos minutos, dez
galeras haviam passado diante da gruta. O almirante Magum Colim regressou aponte para junto de Elric, com quem j estava o prncipe Yyrkoon. Este tambm
levava um drago em seu elmo, um pouco menos esplendido que o de Elric, pois o
imperador era o mais importante entre os poucos Prncipes do Drago que ainda
restavam em Melnibon. Yyrkoon sorria na escurido e seus olhos refulgiam de
expectativa ante a perspectiva de uma batalha sangrenta. Elric preferia que o
prncipe Yyrkoon estivesse em outro navio que no o seu, mas era um privilegio do
prncipe ir a bordo da nau capitania, e isso no podia ser negado.
Cerca de cinqenta embarcaes inimigas j haviam passado.
A armadura de Yyrkoon rangia enquanto o prncipe impaciente pela
espera, passeava pela ponte com sua mo segurando o punho de sua espada.
Logo... repetia para si mesmo Logo...
E instantes depois, quando havia passado diante deles o ltimo navio
inimigo, a corrente da ancora comeou ser puxada e os remos entraram na gua. O
Filho de Pyaray surgiu impetuoso da gruta, se lanou no canal e atingiu uma galera
inimiga bem no centro, partindo-a em duas.
Uma grande confuso se levantou na tripulao inimiga, cujos homens
fugiram desesperados em todas as direes. Nos restos do convs, tochas iam e
vinham desordenadamente nas mos dos homens que tentavam salvar-se de cair
nas guas escuras e geladas do canal. Alguns valentes lanceiros atacavam os lados
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da galera de Melnibon, que abria caminho entre os escombros do naufrgio que
ela mesma tinha criado. Mas ento os arqueiros de Imrryr retriburam o ataque, e os
poucos sobreviventes foram mortos.
O som deste conflito rpido era o sinal para os outros navios. Em ordemperfeita eles entraram por ambos os lados das paredes de pedra altas, e parecia aos
brbaros surpresos que os grandes navios dourados tinham emergido de dentro da
pedra slida, como navios fantasma cheios de demnios que descarregavam lanas,
flechas e fogo sobre eles. Agora todo tortuoso canal era uma confusa mescla de
gritos de guerra que ecoavam aumentados. O estrondo de ao contra ao era como
o sibilar selvagem de uma serpente monstruosa, e logo a prpria frota invasora seassemelhou a uma serpente feita em cem pedaos pelos imponentes e implacveis
navios dourados de Melnibon. Navios que pareciam quase serenos quando se
moviam contra os inimigos, enquanto os ganchos de abordagem brilhavam a luz
dos incndios, ao serem lanados sobre as coberturas de madeira e grades, para
depois puxa-los e dar passagem para guerreiros que terminariam a destruio das
galeras.
Mas os povos do sul eram valentes e mesmo depois da surpresa inicial
ainda mantinham a calma. Trs das suas galeras navegavam em direo ao Filho de
Pyaray, reconhecendo ele como a nau capitnia. Flechas incendirias foram
lanadas e caram na parte da cobertura de madeira que no estava protegida pela
armadura dourada, incendiando tudo ou ento trazendo uma morte ardente aos
homens atingidos por elas.
Elric elevou o escudo sobre sua cabea e duas flechas resvalaram no
metal, caindo, ainda chamejando em uma cobertura de madeira. Ele saltou em cima
da grade, seguindo a trajetria das flechas, e saltando at a cobertura mais larga e
exposta onde os guerreiros estavam se agrupando para enfrentar as galeras
agressoras. As catapultas estrondearam e bolas de fogo azul assobiaram na
escurido, falhando por pouco em atingir as trs galeras. Outra salva se seguiu e
uma massa de chamas atingiu o mastro da galera inimiga e estourou na cobertura,
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espalhando chama. Nesse momento, os ganchos de abordagem agarraram a
primeira galera, puxando a para perto da nau capitania e Elric estava entre os
primeiros a saltar sobre o convs inimigo. E ento abriu caminho para o local onde
ele viu o capito, coberto com uma armadura sem adornos e brandindo umaenorme espada com ambas as mos, ordenando aos seus homens para resistir aos
cachorros de Melnibon.
Quando Elric chegou ponte, trs brbaros armados com espadas
curvadas e pequenos escudos redondos vieram at ele. As faces deles estavam
cheias de medo, mas tambm de determinao, como se eles soubessem que iriam
morrer, mas que deviam causar tanta destruio quanto pudessem, antes das suasalmas serem levadas.
Apertando com fora as alas que prendiam o escudo sobre o brao,
Elric levantou a espada de gume duplo com as duas mos e se lanou contra os
marinheiros, usando a borda do escudo para jogar um deles ao cho enquanto
esmagava com a espada a clavcula do outro. O brbaro restante saltou para o lado
e brandiu sua espada curvada em direo face de Elric. Este conseguiu se esquivar
por pouco, e a extremidade afiada da espada arranhou seu rosto, tirando uma gota
ou duas de sangue. Elric levantou a espada longa como uma foice e a enterrou
profundamente na cintura do brbaro, quase o cortando em dois. Ele ainda lutou
por um momento, sem acreditar que estava morto at que Elric arrancou a espada e
ento ele fechou os olhos e caiu. O homem que tinha sido golpeado pelo escudo de
Elric estava cambaleando aos seus ps, Elric se virou e ao v-lo se arrastar
agonizante, golpeou com a espada o seu crnio. Agora o caminho para a ponte
estava livre. Elric comeou a escalar a escada de mo, notando que o capito o
tinha visto e estava esperando por ele no topo.
Elric levantou seu escudo para receber o primeiro golpe do capito.
Entre a gritaria, julgou que ouvia os gritos deste homem, que lhe dizia:
Morra, maldito demnio albino! Morra! Voc no tem mais nenhum
lugar nesta terra!
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Ao ouvir estas palavras, Elric quase esqueceu de se defender. Elas
tocaram fundo em sua alma. Talvez ele realmente no tivesse mais nenhum lugar na
terra, talvez fosse por isso que Melnibon estava desmoronando lentamente, e os
sinais eram claros... Por que cada vez menos crianas nasciam a cada ano? Por queeles j no estavam mais criando drages?
Ele sentiu o capito golpear seu escudo novamente, e ento tentou
golpear as pernas do homem. Mas o capito tinha se antecipado ao movimento e
saltou para trs. Porm, isto deu a Elric tempo suficiente para subir os poucos
degraus restantes, ficando de p na cobertura e em frente ao capito.
A face do homem quase estava to plida quanto a de Elric. Ele estavasuando e arquejando, e seus olhos revelavam uma angustia e um medo selvagem.
Voc deveria ter nos deixado em paz. Elric se ouviu dizendo.
Ns no lhe fizemos nenhum mal, brbaro. Quando foi a ltima vez que
Melnibon velejou contra os Novos Reinos?
Voc nos faz mal apenas com sua presena, demnio branco. Vocs
tm suas feitiarias, suas alfndegas e sua arrogncia.
por isso que voc veio aqui? Seu ataque foi motivado apenas pelo
dio contra ns? Ou ser que voc se interessou por nossa riqueza? Admita
capito, foi sua ganncia que o trouxe a Melnibone.
Pelo menos a ganncia uma qualidade humana e compreensvel.
Mas vocs so criaturas inumanas, ou ainda pior: vocs no so deuses, entretanto
se comportam como se fossem. Seus dias terminaram e vocs deveriam ser varridos
da face da terra, sua cidade destruda e suas feitiarias esquecidas.
Elric acenou com a cabea.
Talvez voc tenha razo, capito.
Eu sei que tenho razo. Nossos homens santos tambm dizem assim.
Nossos videntes predizem sua queda. Os prprios Deuses do Caos a quem vocs
servem provocaram esta queda.
Os Deuses do Caos j no tm qualquer interesse nos assuntos de
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Melnibone. Eles tomaram o poder de ns h quase mil anos. Elric estudava o
capito cuidadosamente, medindo a distncia entre eles. Talvez seja por isso que
nosso prprio poder diminuiu. Ou talvez ns somente tenhamos nos cansado do
poder. Seja qual for a razo... O capito disse, enquanto esfregava a sua
sobrancelha suada O seu tempo terminou. Vocs devem ser destrudos de uma
vez por todas. E ento ele gemeu, pois a espada de Elric tinha entrado debaixo
da sua armadura, atravessando seu estmago e pulmes. Um joelho dobrou, uma
perna estirou atrs dele, e Elric comeou a retirar a espada longa, enquanto
observava a face do brbaro que tinha assumido uma expresso de reconciliaoagora.
Isso no foi uma luta justa, demnio branco. Ns estvamos
conversando e voc se aproveitou de minha distrao. Voc muito hbil. Espero
que voc se retora de dor eternamente nas profundezas do inferno. Adeus.
E ento sem saber o porqu, depois que o capito caiu com a face na
cobertura, Elric golpeou duas vezes o pescoo at que a cabea dele rolou ao lado
da ponte e foi chutada ento pra fora do navio, afundando nas profundezas da gua
gelada.
E ento Yyrkoon subiu atrs de Elric, e estava sorrindo.
Voc lutou bem, meu imperador. Aquele homem morto tinha razo.
Razo? Elric se voltou para seu primo. Razo?
Sim, quando ele avaliou sua coragem. E, rindo, Yyrkoon foi
supervisionar os seus homens que ainda estavam lutando com os poucos guerreiros
sobreviventes.
Elric no conseguia entender por que tinha se recusado a odiar Yyrkoon
antes. Mas agora ele o odiava profundamente. Naquele momento ele o teria matado
com prazer. Era como se Yyrkoon tivesse olhado profundamente dentro da alma
de Elric e expressado desprezo pelo que viu l.
De repente Elric foi abatido por uma grande angustia e desejou com
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todo seu corao no ser mais um melniboniano, nem um imperador e que aquele
maldito Yyrkoon jamais tivesse nascido.
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6. Perseguio:
Uma traio premeditada
COMO IMPONENTES Leviats, os grandes navios de guerra dourados
navegaram pelos destroos da frota invasora. Alguns navios queimavam e outros
ainda estavam afundando, mas a maioria j tinha afundado nas profundezas
insondveis do canal. Os navios ardentes produziam sombras estranhas que
danavam contra as paredes midas das cavernas, como se os fantasmas dos
mortos oferecessem uma ltima saudao antes de partir para o fundo do mar,
onde se dizia que reinava um Deus do Caos, que incorporava s suas frotas aqueles
que morriam em batalha em qualquer um dos oceanos do mundo. Ou talvez eles
tivessem um destino melhor, indo servir Straasha, Deus dos Espritos da gua que
reinava no mar.
Mas alguns tinham escapado. De alguma maneira, os marinheiros do sul
conseguiram manobrar atravs do cerco dos grandes navios de guerra, velejaram de
volta atravs do canal e agora j deviam ter alcanado o mar aberto. Isto foi
informado nau capitnia onde Elric, Magum Colim e o Prncipe Yyrkoon estavam
novamente juntos na ponte, inspecionando a destruio que eles tinham causado.
Ento ns os perseguiremos e acabaremos com eles. disse
Yyrkoon. Estava suando e sua face morena brilhava, os seus olhos estavam febris.
Ns temos que persegui-los.
Elric encolheu os ombros. Ele estava fraco, e no tinha trazido nenhumadroga extra para renovar suas foras. Queria voltar para Imrryr e descansar. Ele
estava farto daquele banho de sangue, farto de Yyrkoon e principalmente, farto de
si mesmo. O dio que sentia pelo primo estava esgotando suas foras, e ele odiava
se sentir assim, isso era a pior parte.
No! ele disse. Deixe-os ir.
Deixa-los ir? Impunes? Vamos meu rei e senhor! Isso no nossocostume! o Prncipe Yyrkoon voltou-se para o velho almirante. Isso nosso
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costume, Almirante Magum Colim?
Magum Colim encolheu os ombros. Ele tambm estava cansado, mas em
seu ntimo concordava com o Prncipe Yyrkoon. Um inimigo de Melnibone deveria
ser castigado por at mesmo ousar pensar em atacar a Cidade dos Sonhos. Aindaassim, ele disse:
O imperador deve decidir.
Deixe-os ir. disse Elric novamente. Ele se apoiava pesadamente
contra a grade. Deixe-os levarem as notcias para a sua terra de brbaros.
Deixeos dizerem como os Prncipes do Drago os derrotaram. As notcias se
espalharo. Acredito que no seremos mais aborrecidos por invasores durantemuito tempo.
Os Novos Reinos esto cheio de estpidos... Yyrkoon respondeu.
Eles no acreditaro nestas notcias. Sempre haver invasores. O melhor modo de
adverti-los ser nos certificarmos de que nenhum invasor escapou vivo.
Elric tomou flego e tentou lutar contra a fraqueza que ameaava
subjuga-lo.
Prncipe Yyrkoon, voc est esgotando minha pacincia...
Mas, meu imperador, eu s penso no bem de Melnibone.
Seguramente voc no quer que o povo diga que voc fraco, que teme uma
batalha com cinco galeras do sul?
Desta vez, a raiva de Elric lhe deu fora.
E quem dir que Elric fraco? Ser voc, Yyrkoon?
Ele sabia que sua prxima declarao seria insensata, mas no conseguia
se conter.
Muito bem, vamos perseguir estes navios desgraados e afunda-los. E
faamos isso depressa. Pois estou cansado disso tudo. Havia um brilho misterioso
nos olhos de Yyrkoon, quando ele se virou para retransmitir as ordens.
O cu estava mudando de preto para cinza quando a frota de Melnibon
alcanou o mar aberto, virando suas proas para o sul, em direo ao Mar Fervente e
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ao continente sul. Os navios brbaros no velejariam pelo Mar Fervente, pois
diziam que nenhum navio mortal poderia fazer isto, ento eles o contornariam. Mas
os navios brbaros nunca alcanariam as extremidades do Mar Fervente, pois os
navios de guerra melnibonianos estavam velejando rapidamente. Os escravos quepuxavam os remos haviam ingerido grandes quantidades de uma droga que durante
algumas horas aumentava sua velocidade e a fora, antes de mat-los. Alm disso,
agora as velas estavam infladas com a brisa martima. Estes navios eram como
montanhas douradas que deslizavam rapidamente no mar, o mtodo de construo
deles era um segredo perdido at mesmo para prprios melnibonianos (que tinham
esquecido a maior parte do seu conhecimento). Era fcil imaginar porque oshomens dos Novos Reinos odiavam tanto Melnibone e suas invenes, pois
realmente parecia que os navios de guerra pertenciam a uma idade mais velha e
estranha, enquanto eles se lanavam atrs das galeras fugitivas, que agora j podiam
ser avistadas no horizonte.
O Filho do Pyaray estava na dianteira do resto da frota e antes mesmo
que o resto da frota tivesse visto o inimigo, j estava preparando suas catapultas. Os
escravos suados transportavam vagarosamente os materiais viscosos das bolas de
fogo, colocando-os nos recipientes de bronze das catapultas com longas pinas em
forma de colher. As chamas brilhavam na escurido antes do nascer do sol.
Agora um grupo de escravos subia para a ponte trazendo travessas de
platina com vinho e comida para os trs Prncipes dos Drages, que ali tinham
permanecido desde o incio da perseguio. Elric no teve animo para comer, mas
pegou uma taa grande de vinho amarelo e a engoliu. O vinho era forte e o
reanimou um pouco. Ele pegou outra taa e bebeu quase to rapidamente quanto a
primeira. Ento ele observou a frente do navio. Estava quase amanhecendo. Havia
uma linha de luz vermelha no horizonte.
Ao primeiro raio de sol... Elric disse, lancem as bolas de fogo.
Eu darei a ordem. disse Magum Colim, enquanto limpava seus
lbios e jogava fora o osso com carne que estava mastigando. Levantou-se e deixou
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a ponte. Elric ouviu os seus ps golpeando o cho pesadamente. Naquele
momento, o albino se sentiu cercado de inimigos. Tinha algo estranho nos modos
de Magum Colim durante a discusso com o Prncipe Yyrkoon. Elric tentou tirar
da cabea estes pensamentos. Mas o cansao, a dvida, o escrnio aberto do primodele, tudo contribua para aumentar o sentimento que ele estava s e sem amigos
no mundo. At mesmo Cymoril e Dyvim Tvar no eram, afinal de contas
melnibonianos, e assim no podiam entender as preocupaes estranhas que o
moviam e ditavam suas aes. Talvez fosse sbio renunciar a tudo que tinha em
Melnibon e vagar pelo mundo como um mercenrio annimo, servindo a quem
precisasse da sua ajuda?O semicrculo vermelho escuro do sol apareceu sobre a distante linha
negra das guas. Ento soaram uma srie de estrondos vindo dos conveses
dianteiros da nau capitnia quando as catapultas libertaram suas furiosas cargas,
havia um assobio que diminua lentamente, enquanto as bolas de fogo riscavam o
cu como uma dezena de meteoros caindo. As cinco galeras estavam agora uma
distncia de pouco mais de trinta vezes o comprimento do navio.
Elric viu duas galeras incendiarem, mas as trs remanescentes
comearam a velejar em um curso de zig-zag e conseguiram evitar bolas de fogo
que caram na gua, chiando caprichosamente antes de afundar e continuar
queimando nas profundidades.
Mais bolas de fogo estavam preparadas e Elric ouviu Yyrkoon gritar do
outro lado da ponte, ordenando que os escravos se esforassem mais. Ento os
navios fugitivos mudaram suas tticas, evidentemente compreendendo que no
poderiam se salvar por muito tempo, e se dispersando as trs velejaram em direo
ao Filho de Pyaray, da mesma maneira que os outros navios tinham feito no
labirinto. No foi somente a coragem deles que impressionou Elric, mas tambm a
sua habilidade de manobra e a rapidez com que tinham chegado a esta lgica, mas
desesperada, deciso.
O sol estava atrs dos navios do sul quando eles viraram. Trs valentes