em defesa dos_indios

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_____________________________________________________SERMÃO DE SANTO ANTÓNIO AOS PEIXES EM DEFESA DOS ÍNDIOS O que dizer do padre António Vieira? Figura maior da cultura portuguesa, jesuíta, missionário, político, orador brilhante, Vieira foi continuamente elogiado por grandes vultos ao longo dos tempos; estudiosos de todas as áreas debruçaram-se sobre vários aspetos da sua obra, mas a sua vida nunca caberia nestas páginas. Já tudo foi dito e, no entanto, voltamos sempre ao padre António Vieira, porque quando falamos de injustiça e opressão - principalmente daqueles a que hoje chamamos as "minorias étnicas" - de então para cá pouco mudou. Nasceu em Lisboa em 1608, e viajou muito novo com a família para São Salvador da Bahia. Ingressou no Colégio dos Jesuítas, onde se distinguiu pela sua inteligência. Com 15 anos, iniciou o noviciado na Companhia de Jesus e, aos 27, foi ordenado sacerdote. Na hora de fazer os votos, Vieira terá acrescentado um quarto voto especial: o de dedicar a sua vida aos escravos, negros e índios do Brasil. Com a Restauração, viajou para Lisboa e permaneceu na Europa durante os 11 anos seguintes. Tornou-se Pregador de Sua Majestade, confidente e amigo pessoal de D. João IV, e os seus sermões cedo causaram sensação na capital. Em Novembro de 1652, o padre Antônio Vieira trocou a vida cortesã da Europa pelas paragens remotas da selva amazónica, onde viu a oportunidade de realizar a sua verdadeira vocação. Para um missionário, o Brasil era um campo fértil onde semear o Evangelho, um mundo novo, povoado de almas por converter. Acreditando que só pela sua ação poderia ajudar a construir um mundo melhor, desembarcou em São Luís do Maranhão para dirigir as missões junto dos índios, assumindo a defesa acérrima dos indígenas escravizados pelos colonos portugueses. Os escravos, índios e negros constituíam a principal riqueza da colónia e o seu grande motor económico. Sem escravos, a colónia não 1

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  1. 1. _____________________________________________________SERMO DE SANTO ANTNIO AOS PEIXES 1 EM DEFESA DOS NDIOS O que dizer do padre Antnio Vieira? Figura maior da cultura portuguesa, jesuta, missionrio, poltico,oradorbrilhante,Vieirafoi continuamente elogiado por grandes vultos ao longo dos tempos; estudiosos de todas as reas debruaram-se sobre vrios aspetos da sua obra, mas a sua vida nunca caberia nestas pginas. J tudo foi dito e, no entanto, voltamos sempre ao padre Antnio Vieira, porque quando falamos de injustia e opresso - principalmente daqueles a que hoje chamamos as "minorias tnicas" - de ento para c pouco mudou. Nasceu em Lisboa em 1608, e viajou muito novo com a famlia para So Salvador da Bahia. IngressounoColgiodosJesutas,onde se distinguiu pelasuainteligncia.Com 15 anos, iniciou o noviciado na Companhia de Jesus e, aos 27, foi ordenado sacerdote. Na hora de fazer os votos, Vieira ter acrescentado um quarto voto especial: o de dedicar a sua vida aos escravos, negros e ndios do Brasil. Com a Restaurao, viajou para Lisboa e permaneceu na Europa durante os 11 anos seguintes. Tornou-se Pregador de Sua Majestade, confidente e amigo pessoal de D. Joo IV, e os seus sermes cedo causaram sensao na capital. Em Novembro de 1652, o padre Antnio Vieira trocou a vida cortes da Europa pelas paragens remotas da selva amaznica, onde viu a oportunidade de realizar a sua verdadeira vocao. Para um missionrio, o Brasil era um campo frtil onde semear o Evangelho, um mundo novo, povoado de almas por converter. Acreditando que s pela sua ao poderia ajudar a construir um mundo melhor,desembarcouemSoLus do Maranho para dirigiras missesjuntodos ndios,assumindoadefesa acrrima dos indgenas escravizados pelos colonos portugueses. Os escravos, ndios e negros constituam a principal riqueza da colnia e o seu grande motor econmico. Sem escravos, a colnia no produzia, o padre Antnio Vieira sabia-o. Como homem do seu tempo, tolerava a escravido como parte da economia, mas no deixou de se insurgir contra o prprio o fundamentodosistema: "Nasoutrasterras do que aram os homens, e do que fiam e tecem as mulheres, se fazemoscommercios;naquella o quegeramos paese o quecriam a seuspeitosas mes, o que se vende,e se compra. Oh trato desumano, em que a mercancia1 so homens! Oh mercancia diablica, em que os interesses se tiram das almas alheias, e os riscos das prprias!" (...) O caso dos ndioseramaispreocupante.Consideradossbditosdorei e homenslivres,nodeveriam serescravizados,masa realidade eradiferente.Apesarda importao de escravos de Africa, a escassez de mo-de-obralevava os colonos a fazerem "entradas" no serto, dizimando, por vezes, aldeias inteiras de ndios. A esta prtica opunham-se os jesutas, empenhados na salvao das almas, e na libertao dos
  2. 2. Pe.ANTNIO VIEIRA________________________________________________________________________ corpos. "Querem que tragamos os gentios f, e que os entreguemos cobia: querem que tragamos as ovelhas ao rebanho, e que as entreguemos ao cutellol", bradava o padre a viva voz. Porm, enquanto os negros eram robustos e aguentavam os trabalhos, na roa, os ndios morriam "como tordos" vtimas dos maus tratos e das doenas trazidas pelos europeus. O padre Antnio Vieira testemunhava, de ano para ano, a extino de diferentes raas indgenas e insistia com Lisboa para encontrar uma soluo. Perante a impossibilidade de eliminar a escravatura, o jesuta propunha que fossemtornadosescravosapenas osndiostomados em "guerra justa", devendo os outros ser confiados guarda dospadresda Companhiade Jesus,levadosparaaldeias longe das ms influncias dos europeus e educados como cristos. Em 1654, Vieira partiu para Lisboa para negociar uma nova lei, mais favorvel aos jesutas. Argumentava que os padres das vrias ordens pregavam segundo mtodos diferentes, o que impedia os ndios de compreender a doutrina crist, e obteve do rei o monoplio da evangelizao da colnia para a Companhia de Jesus -"0 sermo h de ser d' huma s cor", defendia Vieira. Os padresda Companhiatornaram-se intermediriosentre os ndios e os colonos europeus; s eles podiamfazeras "entradas" para "reduzire descergentios" -asmisses -, e s eles decidiriam da justia do cativeiro ou da liberdade dos indgenas. (...) Mas em 1661 o conflito com os colonos atingiu um ponto insustentvel. Vieira expulso com os jesutas do Maranho e embarcado fora para Lisboa. Os ndios perdiam um dos seus mais fervorosos defensores. Nosdiasde hoje,arelaoentre os ndiosdo Brasil e o homembranco est longe de sanada. Apesar de teremos seus direitos protegidos por lei, os seus territrios e a sua identidade continuam ameaados pela ganncia de garimpeiros e madeireiros. (...) Mais de trs sculos depois, ainda no aprendemos a viver em harmonia com outros povos, independentemente da raa ou credo; apesar da cincia e tecnologia que possumos, a misria continua a encher as ruas das cidades, a fome continua a matar aos milhares, e a escravido assumiu facetas mais dissimuladas. Se o padre Antnio Vieira fosse vivo, talvez no mudasse uma vrgula aos seus sermes. RosrioS Coutinho,in NationalGeographic, Marode 2002 (textoadaptadoe comsupresses)
  3. 3. _____________________________________________________SERMO DE SANTO ANTNIO AOS PEIXES 3 1. A partir do texto, assinala os acontecimentos relativos s seguintes datas. DATAS ACONTECIMENTOS 1608 1652 1654 1661 2. O texto pode dividir-se em trs grandes partes lgicas. 2.1. Delimita-as: _________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ 2.1. Prope um subttulo para cada uma delas. _______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ 3. Concentra agora a tua ateno nos tempos verbais utilizados. 3.1. Justifica a alternncia do uso de tempos do passado e do presente na introduo. _______________________________________________________________________________ 3.2. Identifica os tempos verbais predominantes no desenvolvimento. _______________________________________________________________________________ 3.3. Explica, na concluso, o recurso: - ao presente do indicativo: ________________________________________________________ - s formas perifrsticas: ___________________________________________________________
  4. 4. Pe.ANTNIO VIEIRA________________________________________________________________________ 4. Os escravos, ndios e negros constituem a principal riqueza da colnia e o seu grande motor econmico. 4.1. Rel as linhas ___ a ___ e evidencia as razes que levam o Pe. Antnio Vieira a preocupar-se mais com os ndios do que com os escravos. _______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ O TEXTO ARGUMENTATIVO Os textosargumentativosapresentamadefesade umraciocnio,de umaopinio.Destinam-se a um recetor bem definido eleitores, leitores de um jornal, os jurados e o auditrio de um julgamento ou de defesa de uma tese, o destinatrio de uma carta, etc. A sua finalidade prtica convencer um destinatrio, persuadi-lo, influenci-lo determina um trabalho cuidado da mensagem, tanto no que diz respeito organizao do discurso como seleo do vocabulrio. Aristteles na Grcia antiga e Ccero e Quintiliano em Roma foram teorizadores da arte de falar a retrica e definiram os princpios da oratria, a arte de falar em pblico. Se nos nossos dias o discurso argumentativo assume com frequncia a forma escrita em editoriais e artigos de opinio,ensaios, teses, manifestos, textos publicitrios durante sculos a exposio oral foi uma forma privilegiada de divulgar ideias religiosas, argumentos polticos ou judiciais. Os sermes, os discursosinflamadosemtribunase no parlamento, a defesa de uma causa em tribunal constituram uma formade espetculoaque noera alheiaumadasfasesdo discursoargumentativodefinidopor Ccero a actio ou ao, isto , o recurso aos gestos e entoao como uma componente significativa do discurso, a par da apresentao de argumentos pertinentes, da articulao dos mesmos, da linguagem e do estilo do orador. In Guia de Aprendizagem do ESRUC, Portugus, DES-ME, 1998 5. Partindo do texto e com a ajuda do dicionrio, esclarece o significado dos seguintes vocbulos: 5.1. retrica: ____________________________________________________________________ 5.2. oratria: ____________________________________________________________________ 5.3. discurso: ____________________________________________________________________
  5. 5. _____________________________________________________SERMO DE SANTO ANTNIO AOS PEIXES 5 5.4. sermo: ____________________________________________________________________ 6. Analisa no texto acima: 6.1. uma definio de texto argumentativo: ___________________________________________ _______________________________________________________________________________ 6.2. o principal objetivo de qualquer texto argumentativo: _______________________________ _______________________________________________________________________________ 6.3. os diferentes tipos de textos argumentativos da atualidade: __________________________ _______________________________________________________________________________ 6.4. as vrias componentes de um bom discurso oral: ______________________________________ _______________________________________________________________________________