entre o espetáculo, a festa e a argumentação: mídia, comunicação estratégica e mobilização

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Entre o espetáculo, a festa e a argumentação : mídia, comunicação estratégica e mobilização social COMUNICAÇÃO E MOBILIZAÇÃO SOCIAL 4 Rennan Mafra

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www.autenticaeditora.com.brTelevendas: 0800 2831322 9 788575 262061

ISBN 978 85 7526 206 1

Uma organização democrática davida coletiva pressupõe a participaçãodos sujeitos nas questões públicas.Esse engajamento pode tomar formana medida em que as pessoas têm seusinteresses despertados, identificam-secom os valores e as práticas emquestão e se enxergam como partesde um todo, capazes de, com seu posi-cionamento, possibilitar arranjos cole-tivos e, muitas vezes, mudar o cursode uma situação. Em meio a essecenário, esforços para a convocaçãodos sujeitos são cada vez maisempreendidos, questões essas queencontram respaldo na discussão pro-posta pelo livro, que tem como fiocondutor a relação entre comunicaçãoestratégica, mídia e mobilização social.

Como é possível mobilizar ossujeitos à participação coletiva? Éplausível que meios, instrumentos eestratégias de comunicação tenhamparticipação nos processos mobi-lizadores? São algumas das questõesque o autor suscita em sua obra. Emais: por um olhar comunicacional, aconvocação dos sujeitos nos proces-sos mobilizadores é analisada sob aótica do espetáculo, da festa e da argu-mentação, três dimensões possíveisdiscutidas pelo autor. A proposta dolivro, que faz parte da Coleção Co-municação e Mobilização Social, é per-ceber quais características tais dimen-sões – constituídas por mecanismosmidiáticos e estratégicos – empregamao processo mobilizador e como, pormeio delas, os sujeitos são envolvidoscomunicacionalmente. Enfim, comoestratégias de comunicação, ao consti-tuírem momentos espetaculares, fes-tivos e argumentativos, podem serinseridas em processos de mobilização

Entre o espetáculo, a festa e a argumentação :mídia, comunicação estratégica e mobilização social

Visibilidade, convocação, participação, comunicação –

questões que instigam e permeiam os processos de mobiliza-

ção social. Em que medida ações espetaculares se inserem

nesses momentos? Quais as possibilidades tem a festa com vis-

tas ao engajamento coletivo? Como os sujeitos são envolvidos

nos processos mobilizadores em momentos argumentativos?

Não por acaso tais questões representam o tema central deste

livro, discutidas aqui particularmente a partir da relação entre

mídia, comunicação estratégica e mobilização social. O autor

propõe pensar como dimensões de espetáculo, festa e argu-

mentação, conquanto processos comunicativos, instauram

relações e modalidades de participação e interação com os

sujeitos, em processos mobilizadores. Debruçando-se sobre a

relação entre essas dimensões e a convocação política dos

sujeitos para a deliberação pública das questões que afetam a

todos, o autor enriquece a reflexão sobre a relação entre a

comunicação e a mobilização social no cenário democrático

contemporâneo.

Leia também:

• Comunicação e Estratégias

de Mobilização Social

Márcio Simeone Henriques (org.)

• Mobilização Social: um modo

de construir a democracia e

a participação

Jose Bernardo Toro e Nisia Maria Duarte Werneck

• Visões de futuro: responsabili-

dade compartilhada e mobi-

lização social

Márcio Simeone Henriques eNisia Maria Duarte Werneck (orgs.)

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bilização

social

O AUTOR

Rennan Mafra é Relações Públicas,

Mestre em Comunicação Social pela

UFMG, consultor e professor universitário.

social, tendo em vista o engajamentocoletivo dos sujeitos para as questõesque afetam a todos?

As discussões aqui propostas en-contraram no Projeto Manuelzão, queobjetiva a revitalização da Bacia Hi-drográfica do Rio das Velhas, um dosprincipais afluentes do rio São Fran-cisco, campo fértil para serem levan-tadas e analisadas. O foco analíticodessa proposta conceitual recaiu sobrea Expedição Manuelzão desce o Rio dasVelhas, realizada em 2003, que ganhouconsiderável repercussão nos princi-pais veículos de massa de Minas Ge-rais, vitrines para milhares de pessoas,e que foi estruturada, ainda, valendo-se de um planejamento específico decomunicação estratégica.

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Entre o espetáculo, a festae a argumentação

mídia, comunicação estratégicae mobilização social

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Entre o espetáculo, a festa

e a argumentação

mídia, comunicação estratégicae mobilização social

Rennan Mafra

1ª edição

1ª reimpressão

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Copyright © 2006 by Rennan Mafra

CAPA(Sobre foto do Arquivo Projeto Manuelzão)

REVISÃODila Bragança

EDITORAÇÃO ELETRÔNICACarolina Rocha

CONSELHO EDITORIALCicilia Maria Krohling PeruzzoDesirée Cipriano RabeloMárcio Simeone HenriquesNisia Maria Duarte WerneckRennan Lanna Martins Mafra

2008

Todos os direitos reservados pela Autêntica Editora. Nenhuma partedesta publicação poderá ser reproduzida, seja por meios mecânicos,eletrônicos, seja via cópia xerográfica, sem a autorização prévia da editora.

Autêntica Editora

Belo HorizonteRua Aimorés, 981, 8º andar – Funcionários30140-071 – Belo Horizonte – MGTel: (55 31) 3222 68 19TELEVENDAS: 0800 283 13 22www.autenticaeditora.com.bre-mail: [email protected]

São PauloTel.: 0800 283 13 22e-mail: [email protected]

Mafra, RennanEntre o espetáculo, a festa e a argumentação - mídia, co-

municação estratégica e mobilização social / Rennan Mafra .– 1. reimp. – Belo Horizonte : Autêntica , 2008.192 p.

ISBN 978-85-7526-206-1

1.Comunicação. 2.Movimento social. I.Título.

CDU 316.444

M187e

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PREFÁCIO.............................................................................................

INTRODUÇÃO.......................................................................................

CAPÍTULO IEm busca do debate público e da mobilização social..............

O processo de debate na esfera pública..................................

O processo de mobilização social.............................................

CAPÍTULO IIMídia, comunicação estratégicae espaços de visibilidade pública.................................................

Mídia e mobilização social: uma demanda por visibilidade.....

Comunicação estratégica: construindo“conversações” com públicos...................................................

Mídia e comunicação estratégica:em busca de espaços de visibilidade pública...........................

CAPÍTULO IIIEntre o espetáculo, a festa e a argumentação.............................

O entendimento de possíveis dimensõesde estratégias de comunicação para mobilização social........

A dimensão espetacular.............................................................

A dimensão festiva.....................................................................

A dimensão argumentativa......................................................

Quadro analítico comparativo das dimensõesdas estratégias de comunicação para Mobilização Social.....

CAPÍTULO IVUma concepção mais ou menos racional: as dimensõesda Expedição Manuelzão Desce o Rio das Velhas....................

O projeto Manuelzão.................................................................

A Expedição Manuelzão Desce o Rio das Velhas: acionandoa mídia e a comunicação estratégica para a mobilização social..

SUMÁRIO

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O detalhamento da Expedição:nuances de sua concepção e planejamento.............................

O entendimento das dimensões da expedição:as categorias de análise..............................................................

Elementos da dimensão espetacular na Expedição...............

Elementos da dimensão festiva na Expedição........................

Elementos da dimensão argumentativa na Expedição.........

CAPÍTULO VUm acontecimento mais ou menos amplo: a visibilidadepública da Expedição Manuelzão desce o Rio das Velhas............

Um evento cuidadosamente planejado para gerar visibilidade..

Os espaços de visibilidade presencial,midiático massivo local e telemático........................................

O espaço de visibilidade midiático massivo............................

Mídia e Mobilização Social – um olhar a partir da Expedição.....

CONCLUSÃO

Em busca de indagações: a mobilização sociale a convocação da vontade políticaem processos deliberativos democráticos..................................

REFERÊNCIAS........................................................................................

ANEXO

Características Gerais da CoberturaTelevisiva da Expedição nas emissoras de sinal aberto...........

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Para Mazarelo Lanna e Miguel Mafra(quando tudo começou....)

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PREFÁCIO

Com este livro, Rennan Mafra explora diferentes nuan-ces da relação existente entre os processos de mobilização so-cial e os meios de comunicação na sociedade contemporânea.Ele busca compreender por que agentes sociais, que visam àmobilização social em torno de uma determinada causa, preci-sam desenvolver um planejamento com estratégias de comuni-cação diversas, a fim de estabelecer práticas comunicativascom comunidades e grupos sociais específicos, com suas pró-prias formas de vida, sua cultura e seus interesses e, ainda,com a sociedade em geral. O autor escapa de trajetórias analí-ticas convencionais para mostrar o profundo entrelaçamentodessas práticas comunicativas com a vida coletiva e os jogossociais, em diferentes âmbitos da sociedade.

Rennan Mafra mostra que a polêmica questão ambientaldeve ser entendida, atualmente, como uma questão de interes-se comum e que, portanto, o público deve ser chamado a dis-cutir. A tentativa de representantes políticos e especialistasformular políticas de preservação ambiental de modo plausí-vel, eficaz e justo, não pode valer-se somente de um saber

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técnico-competente. De maneira prática, a preservação ambi-ental depende de como as pessoas lidam com o próprio ambientee fazem uso de recursos naturais no dia-a-dia. Assim, as pes-soas comuns devem, de alguma forma, participar da definiçãodo problema da degradação ambiental, compartilhando en-tendimentos sobre os riscos e os prejuízos dos desastres ecoló-gicos e devem, ainda, sentir-se co-responsáveis pela busca desoluções. Não por acaso, o Projeto Manuelzão – destinado àrevitalização da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas e objetode análise do presente livro – apresenta como lemas saúde, am-biente e cidadania. Com esses lemas, o Projeto Manuelzão, partedas atividades de extensão da Faculdade de Medicina daUFMG, em Belo Horizonte, baseia-se na compreensão de que obem viver individual apresenta uma intrínseca relação com avida coletiva e o entorno social.

Se a questão ambiental deve ser entendida como uma ques-tão de interesse comum, qual a melhor forma de levá-la à aten-ção do público? Como despertar o interesse de grupos concer-nidos e da população em geral e fazer deslanchar um debatepúblico sobre a questão ambiental? Como promover o engaja-mento cívico, já que são as próprias pessoas que definem o queelas querem e precisam tanto individualmente quanto coleti-vamente? Como lidar com mentalidades e práticas arraiga-das, com vistas a uma possível mudança? Para desenvolveresses questionamentos, Rennan Mafra utiliza o aparato dasteorias deliberacionistas de democracia e o conceito de esferapública e investiga a proposta mobilizadora da “ExpediçãoManuelzão desce o Rio das Velhas”, implementada pelo Pro-jeto Manuelzão em 2003. Através de uma análise minuciosa,ele mostra como o planejamento geral da Expedição envolveudiferentes modalidades de mobilização por meio do espetácu-lo, da festa e da argumentação. Essas categorias de mobiliza-ção possuem propriedades distintas, seja para criar um even-to extraordinário e capturar a atenção do público, seja parainstaurar um envolvimento sociável e afetivo entre as pessoas,seja, ainda, para estabelecer uma relação dialógica entre os

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participantes do debate sobre a questão em tela. De diferentesmodos, o público é chamado, então, a se envolver com a causada preservação da bacia hidrográfica do Rio das Velhas.

A Expedição Manuelzão Desce o Rio das Velhas constituiu-senum evento multifacetado, cuidadosamente planejado parachamar a atenção das populações que vivem nas margens doRio das Velhas e dos meios de comunicação em geral. Como aspráticas comunicativas constituem diferentes esferas de visi-bilidade pública, com maior ou menor grau de abrangência eimpacto? Qual o papel que os meios de comunicação desem-penham nesses processos? Reside aí o interesse central dapesquisa desenvolvida por Rennan Mafra. Este livro apresentaao leitor uma análise estratificada do modo como as diferentesfacetas da Expedição – o espetáculo, a festa e os textos argumen-tativos – ganham expressão no ambiente midiático. Com essaanálise, Rennan Mafra mostra que quaisquer julgamentos quefaçamos sobre o sistema dos media – emissoras de televisão erádio, jornais do próprio projeto e de grandes empresas comercias,revistas e sites – têm que se basear em um claro entendimento dasorganizações de mídia com atores e propósitos distintos, que têmsuportes técnicos, modos de operação e cultura profissional pe-culiares. Esses são ambientes complexos, com finos relevos, queexigem um tratamento rigoroso.

Rennan Mafra apresenta um olhar cuidadoso e, ao mes-mo tempo, despojado, atento às particularidades concretas dosfenômenos. Através de laboriosa agregação de detalhes, eleconstrói uma trajetória analítica circunstanciada e convincen-te. É com grande prazer que apresento ao leitor este livro, frutoda dissertação de mestrado desenvolvida por Rennan, sobminha orientação, no Programa de Pós-graduação em Comu-nicação da UFMG.

Rousiley C. M. Maia

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Os processos de mobilização social têm sido objeto dasmais variadas discussões na contemporaneidade – seja numterreno propriamente acadêmico de investigação, seja numâmbito das práticas interativas dos sujeitos na sociedade. Talquadro não é mesmo de se estranhar: afinal de contas, o inte-resse pela mobilização social não representa iniciativa isola-da e, não obstante, se elabora em meio a um fluir mais amplode sentidos, utopias e representações, cuja ontologia localiza-se nas próprias tentativas contemporâneas de viabilização demodelos democráticos possíveis, nas complexas sociedades,calcadas sob a égide da modernidade.

Nesse sentido, a mobilização social – a convocação dossujeitos, o envolvimento coletivo nas mais variadas causas, aluta por possibilidades de convivência mais justas e igualitá-rias – apresenta, portanto, uma relação intrínseca com as de-mocracias contemporâneas, e, frente aos inúmeros desafiosimpostos a cada sociedade / localidade / comunidade, constituiuma questão instigante a ser investigada – uma vez que se inserenum movimento mais amplo, dilema da própria democracia.

INTRODUÇÃO

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Dito de outra maneira, as demandas democráticas contempo-râneas clamam, cada vez mais, pela necessidade de participa-ção dos sujeitos nas questões públicas, processo esse que nãobrota espontaneamente, mas prescinde aprendizado, interes-ses despertados, identificação, um “se-sentir-pertencido” e um“se-sentir-mobilizado” às questões (valores / práticas) quenecessitam de (re)definições coletivas.

Como é possível que tal processo aconteça? Como é possí-vel mobilizar os sujeitos à participação coletiva? É possíveltomar alguns procedimentos e elaborar estratégias para queos sujeitos se sintam mobilizados e tenham interesses desper-tados para as questões públicas? Quais seriam os limites e aspossibilidades dessas estratégias de mobilização social? Es-sas – e mais outras – foram as principais questões que nosinspiraram a tomar esse curioso e desafiador percurso de es-tudos. E, junto a isso – e de maneira peculiar –, acrescentamosprovocações fundamentais, a partir das quais se estabelece-ram o interesse e o foco de nossa investigação: qual o papel dacomunicação para a mobilização social? É possível que meios,instrumentos e estratégias de comunicação tenham participa-ção nos processos mobilizadores? A mídia de massa – repre-sentando uma presença peculiar e contraditória nas sociedadescontemporâneas – e a comunicação estratégica, em algumamedida, desencadeiam possibilidades nesse processo?

Dessa maneira, a relação entre comunicação estratégica,mídia e mobilização social representa o tema inspirador destelivro. Mais especificamente, buscamos entender como projetosde mobilização social tentam estabelecer processos comunica-tivos com sujeitos na sociedade e endereçar tematizações à esfe-ra pública, utilizando, para isso, recursos espetaculares, festivos eargumentativos e empregando, entre outros esforços, estratégiaspara geração de visibilidade pública.

Sendo assim, guiados por um olhar comunicacional àmobilização social (olhar aqui investigado especialmente pelamídia e pela comunicação estratégica), nosso objetivo primor-dial é propor o entendimento de três possíveis dimensões da

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comunicação para mobilização social, a saber: (i) a dimensãode espetáculo; (ii) a dimensão de festa; e (iii) a dimensão deargumentação. De forma mais específica, nosso intuito é per-ceber quais as características que cada dimensão emprega aoprocesso mobilizador, a partir de que tipos de relações os su-jeitos participam da mobilização, em cada dimensão propos-ta, e quais as possíveis implicações de cada dimensão – ou deambas juntas – para os processos políticos e democráticos maisamplos. É válido aqui exemplificar: como a festa, enquantodimensão mobilizadora, possibilita a participação dos sujei-tos em processos de engajamento coletivo? Como ações espe-taculares, também como uma possível dimensão da mobiliza-ção social, podem se inserir no processo mobilizador e noenvolvimento dos sujeitos nas causas propostas? E qual a re-lação entre essas dimensões e a convocação política dos sujei-tos para a deliberação pública das questões que afetam a to-dos? De antemão, já é possível adiantar que, para o estímulo aum processo de debate na esfera pública, é fundamental queargumentos formulados racionalmente possam ser encami-nhados aos sujeitos. Entretanto, algumas vezes, o debate racio-nal é insuficiente para despertar o interesse dos indivíduospor determinadas políticas ou, mesmo, para promover engaja-mento em prol de certas causas.

As discussões aqui encetadas foram desenvolvidas numapesquisa de Mestrado, desenvolvida no âmbito do Programade Pós-Graduação em Comunicação Social da UniversidadeFederal de Minas Gerais (UFMG), e, portanto, o conteúdo destelivro representa uma adaptação da dissertação defendida emjunho de 2005, intitulada:Visibilidade Midiática e MobilizaçãoSocial: entre o espetáculo, a festa e a argumentação – A ExpediçãoManuelzão Desce o Rio das Velhas, contando com orientação pre-ciosa da Professora Rousiley Celi Moreira Maia. Dessa manei-ra, este livro filia-se às discussões do Grupo de Estudos em Mídiae Espaço Público (EME), do Programa de Pós-Graduação emComunicação, daquela universidade, juntando-se a uma am-pla linha de estudos já desenvolvidos com relação a este tema

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e que, ao longo dos últimos anos, conformaram um certo “lu-gar” de análise – fruto de disciplinas, dissertações e discus-sões coletivas.

Acreditamos que estudar o processo de mobilização sociala partir da comunicação representa uma empreitada instigan-te e desafiadora. Entendemos o quanto é fundamental paraprojetos de mobilização estabelecer processos comunicativoscom os sujeitos de forma a despertar interesse para suas cau-sas e ganhar legitimidade pública. E seria limitador desconsi-derar, no cenário contemporâneo, o desenvolvimento altamenteespecializado de meios, técnicas e instrumentos de comunica-ção, bem como a forte presença da mídia de massa – o queacaba determinando, de forma decisiva, os processos comuni-cativos e as tematizações.

Sendo assim, para ganhar existência pública, projetos demobilização social passam a programar estratégias comuni-cativas, tanto para “chamar” a atenção da mídia de massa,quanto para convocar públicos específicos à participação e aodebate, no intuito de conseguir, por meio de uma determinadavisibilidade, o reconhecimento público de suas propostas.Dessa forma, acreditamos que investigar as dimensões dasações de comunicação para mobilização social, bem como oslimites e as possibilidades das estratégias e da visibilidademidiática, contribui para elucidar a dinâmica comunicativacontemporânea e as características de um cenário em que pro-jetos de mobilização tentam se posicionar.

O projeto de mobilização que tornou possível o desenvol-vimento deste estudo é o Projeto Manuelzão, que tem por prin-cipal objetivo a revitalização da Bacia Hidrográfica do Riodas Velhas1. Localizada no Estado de Minas Gerais, essa ba-cia representa uma área que abrange 51 municípios, inclusivea capital mineira, Belo Horizonte, numa área de mais de 30 milquilômetros quadrados, onde habitam quase 4 milhões de pes-soas. Na visão do Projeto, um vasto histórico de degradação

1 O Rio das Velhas é um dos principais afluentes do Rio São Francisco.

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ambiental trouxe sérios impactos para o Rio das Velhas e seusafluentes e subafluentes, a partir de um uso social desenfrea-do e predatório. Como uma tentativa de mobilizar a sociedadepara a necessidade de revitalização de toda a área afetada,surge assim, em 1997, o Projeto Manuelzão, proposto na Fa-culdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Ge-rais, e depois levado para a região da Bacia. Sua estruturaconta com uma Coordenação Central, com sede na Faculdadede Medicina da UFMG, em Belo Horizonte, e com núcleos,constituídos ao longo das microbacias ligadas à grande Baciado Velhas. Os núcleos, apoiados por essa Coordenação, ten-tam realizar ações localmente e mobilizar os sujeitos para acausa defendida.

Em linhas gerais, o projeto propõe a revitalização da Ba-cia do Rio das Velhas não somente como um problema desolução técnica, mas como uma questão de interesse público,acima de tudo político e cultural, que necessita do envolvi-mento coletivo de todos os habitantes. Nesse sentido, desdesua implementação, ele tenta expandir sua causa de modo aatingir toda a área afetada e emprega esforços para mobilizaros sujeitos, propondo novos significados acerca da existênciado próprio rio e, de maneira mais ampla, acerca do própriomeio ambiente. Entendemos que esse processo de mobilizaçãoé, acima de tudo, um processo comunicativo: a partir do esta-belecimento de uma “conversação” com a sociedade, sujeitossão convocados a se interessar pela causa e a debater publica-mente as proposições oferecidas.

Para o desenvolvimento das discussões, presentes nestelivro, foi objeto de nosso foco analítico uma ação específica demobilização social realizada pelo Manuelzão em 2003: a “Ex-pedição Manuelzão Desce o Rio das Velhas”. No período depouco mais de um mês (de 12/09/03 a 13/10/03), três integran-tes do projeto percorreram de caiaque o trecho navegável do Riodas Velhas, da nascente até a foz, numa área de aproximada-mente 770 quilômetros, acompanhados por uma equipe que se-guiu o percurso por terra. Foram feitas paradas programadas em

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algumas cidades próximas à calha do rio, e eventos foramorganizados no sentido de tentar difundir a causa da revitali-zação. Dessa forma, o objetivo foi realizar uma grande mobili-zação em toda a Bacia, numa ação conjunta que pudesse envol-ver todos os núcleos do projeto e a Coordenação Central.

O curioso foi que, para que fosse possível sua execução, aExpedição contou com um amplo período de preparação. Oobjetivo era que não somente a Coordenação Central planejas-se o evento, mas que cada núcleo, ao receber os expedicionáriosem sua cidade, tivesse autonomia suficiente para planejarações, acionando os cidadãos para se envolver com a Expedi-ção. Mas, de forma a organizar as iniciativas, o projeto elabo-rou um planejamento geral do evento e um planejamento es-pecífico de comunicação estratégica. Também foramdesenvolvidos produtos e instrumentos específicos de comu-nicação (como o Guia da Expedição, o site específico para o evento,marca específica, ações e eventos locais) para estabelecer umprocesso comunicativo e convocar os sujeitos a se mobilizarpara a causa. E, ainda, estratégias específicas foram direcio-nadas à mídia de massa, quanto a meios de comunicação lo-cais, para que estimulassem a cobertura do evento, na tentati-va de gerar uma visibilidade ampliada em toda a região – fatoque pôde ser verificado, uma vez que a Expedição ganhouconsiderável repercussão nos principais veículos massivosde comunicação do Estado de Minas Gerais.

Dessa maneira, é possível entender a “Expedição ManuelzãoDesce o Rio das Velhas” como uma grande ação de mobiliza-ção social cujo principal objetivo, ao lançar mão de recursos dacomunicação estratégica e da mídia, foi tematizar publicamen-te as propostas do projeto e estimular, numa determinada esfe-ra pública, um processo de debate público entre os sujeitos, acer-ca da causa da revitalização da Bacia do Rio das Velhas.

Como veremos adiante, para que qualquer debate possaocorrer, é fundamental que os interlocutores forneçam argu-mentos formulados de maneira racional e expliquem seuspontos de vista, levando em consideração as perspectivas

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interpretativas dos demais participantes. Entretanto, causou-nos estranheza o fato de o Projeto Manuelzão organizar umaExpedição pelo Rio das Velhas para tematizar, publicamente,a causa de revitalização da Bacia e mobilizar os habitantes, apartir da utilização de vários recursos que lhe conferiram ou-tras dimensões, além de uma dimensão exclusivamente racio-nal. Será que tal fato impediu um possível engajamento coleti-vo ou, mesmo, a possibilidade de um debate público? Asdimensões da Expedição, com atributos não somente racio-nais, mas afetivos, chamativos ou sentimentais, foram capa-zes de minar a participação política dos sujeitos em processosmais amplos de debate e deliberação públicos, referentes àcausa proposta de revitalização da Bacia do Rio das Velhas?

Nesse sentido, inspirados por esses questionamentos re-lativos à Expedição e fundamentados por uma discussão con-ceitual relativa à temática implicada, pretendemos com Entre oespetáculo, a festa e a argumentação – mídia, comunicação estratégi-ca e mobilização social levantar discussões e apresentar refle-xões sobre a comunicação e a mobilização social, vinculadasa processos democráticos e deliberativos contemporâneos, nabusca pelo envolvimento coletivo e pela convocação de vonta-des políticas dos sujeitos. De tal sorte, este livro se organizaem cinco capítulos.

No primeiro capítulo, Em busca do debate público e da mobi-lização social, situamos as principais questões que norteiamesse estudo, dentro de um determinado campo problemáticode conhecimentos. Ao levantarmos uma discussão conceitualque fundamenta os outros capítulos do livro, buscamos com-preender que os esforços empreendidos por projetos de mobi-lização social, para a tematização pública de suas questões,representam “esforços comunicativos” no sentido de tentarestabelecer, basicamente, dois processos: o processo de debatena esfera pública e o processo de mobilização social.

No segundo capítulo, Mídia, comunicação estratégica e es-paços de visibilidade pública, discutimos a presença da mídiae da comunicação estratégica como duas participações

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Coleção “Comunicação e Mobilização Social”

fundamentais na tematização pública de causas, frente aodebate público e à mobilização social. Em outras palavras, háuma tentativa de entender como mecanismos midiáticos e dacomunicação estratégica são acionados para que projetos demobilização social estabeleçam processos comunicativos comsujeitos na sociedade. Além disso, são apresentados algunspossíveis espaços de visibilidade pública, constituídos pelamídia e pela comunicação estratégica, em que tais projetosesforçam-se por tematizar suas causas, e esses espaços sãoessenciais para a convocação dos sujeitos e para a coletiviza-ção das causas.

No terceiro capítulo, Entre o espetáculo, a festa e a argumen-tação, que dá título ao livro, entendemos que, ao tentar obtervisibilidade pública e engajamento coletivo, estratégias de co-municação para mobilização social podem ser compreendi-das e constituídas, entre outras formas, a partir de três dimen-sões: uma dimensão espetacular, uma dimensão festiva e umadimensão argumentativa. Nosso objetivo é analisar detalhada-mente as características de cada dimensão e entender seus limi-tes e suas possibilidades em processos de mobilização social.

No quarto capítulo, Uma concepção mais ou menos racional:as dimensões da Expedição Manuelzão Desce o Rio das Velhas, des-crevemos, em detalhes, toda a proposta da Expedição, comfoco em seu planejamento. A partir do modelo de análise de-senvolvido no capítulo 3, buscamos analisar a Expedição apartir de três dimensões: a espetacular, a festiva e a argumentati-va. Apresentamos e desenvolvemos essas dimensões, procu-rando evidenciar o modo como elementos de espetáculo, defesta e de expressão argumentativa se articulam em momentosdistintos da Expedição. Em termos mais específicos, procura-mos observar como tais dimensões são planejadas e coloca-das em prática através de estratégias empregadas pelos orga-nizadores e como elas se fazem presentes nos produtoscomunicativos produzidos pelo Manuelzão.

No quinto capítulo, Um acontecimento mais ou menos amplo:a visibilidade pública da Expedição Manuelzão Desce o Rio das

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Entre o espetáculo, a festa e a argumentação

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Velhas, apresentamos os possíveis espaços de visibilidade pú-blica alcançados pela Expedição Manuelzão Desce o Rio dasVelhas, com destaque para os espaços de visibilidade midiá-ticos. Nosso objetivo primordial é entender e analisar, maisdetalhadamente, a cobertura da Expedição no espaço de visi-bilidade midiático massivo. Procuramos entender como a mí-dia – particularmente a mídia televisiva – se apropria da Ex-pedição e como aquelas dimensões de espetáculo, de festa e deexpressão argumentativa se articulam nesse espaço. A nossapretensão é detectar os modos operatórios da mídia para fazera cobertura do evento.

Nas considerações finais, Em busca de indagações: a mobili-zação social e a convocação da vontade política em processos delibe-rativos democráticos, trazemos algumas reflexões no sentido deampliar a temática escolhida e sistematizar questões relevan-tes, apresentadas ao longo dos outros capítulos. Em relação àExpedição, procuramos entender se a visibilidade midiáticagerada pôde ampliar as questões colocadas e se essa amplitu-de indica a possibilidade da geração de um debate públicosobre a revitalização da Bacia do Rio das Velhas, em últimaanálise. Em relação à proposta mais ampla deste livro, bus-camos apontar algumas indagações acerca do entendimentoda mobilização social como um processo comunicativo, vis-lumbrado e construído, entre outras possibilidades, pelas di-mensões analíticas elencadas, inscrito em processos maisamplos de debate e deliberação públicos, nas democracias con-temporâneas.

Da mesma forma que a mobilização social, as discussõesaqui propostas não representam, de maneira alguma, umainiciativa isolada. Fazem parte também de um fluir mais am-plo, de sentidos, utopias, conversações e significados. E, emmeio a esse fluir, estão as inúmeras conversas, estimuladas porautores e livros, vivenciadas e desenhadas pelas experiências,ou, simples e gostosamente mediadas pela oralidade, em mo-mentos fulgazes e eternos do cotidiano. Conversas preciosas,que transmitiram o saber, o sabor e o querer de se aventurar

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Coleção “Comunicação e Mobilização Social”

pela busca por um olhar analítico e sistematizado, de algunsínfimos pedaços de realidade. Nesse fluir, muitos inclusivenos são anônimos (mas não menos marcantes): ensinaram pormeio de gestos, atitudes, olhares, exemplos. E muitos, os quaisaqui com imenso afeto agradecemos, nos são conhecidos: fa-mília querida, pela presença, sempre doce e única, em todos osmomentos; Márcio, por tantos – e tantos – lampejos; Clara, porse aventurar conosco a dar os primeiros passos prazerososnos caminhos da pesquisa; Rousiley, pela extrema dedicação,entusiasmo e energia (sem você, isso não seria possível); Lena,Ceres e Milena, pela contribuição essencial e afetuosa; amigos,quantos amigos!, pelos momentos raros e poéticos; Lili, peloslindos pedaços do cotidiano que dividimos juntos; e o ProjetoManuelzão, pela abertura e pela confiança, que foram determi-nantes para a elaboração das discussões aqui propostas.

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