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8/7/2019 Entrevista con Nelson Pereira Dos Santos- Manifesto Por um Cinema Popular (en Portugus) Cinema Novo
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1955-1962
Manifesto por um cinema popular*
Entrevista con Nelson Pereira dos SantosMarcelo Beraba
Nelson, qual suaformao em cinema?
Minha formao foi de cineclubista, mesmo. Na poca logo depois da segunda
guerra eu terminava meu curso de direito e comecei o estudo do cinema clssico.
Depois da universidade, fundei cineclubes e participeide uma srie de movimentos em
cinema o que naquila poca era muito mais complicado e difcil. Em So Paulo havia
dois grandes cineclubes: o Museu de Arte e o Cineclube So Paulo, se no me engano.
Quando digo que minha formao foi mesmo de cineclubista quero dizer que, em
relao cultura brasileira, eu primeiro conheci o cinema, o mito do cinema e no sabia
nada de cinema brasileiro.
Nessa poca o pas entrou numa fase de melhores condies, na chamada fase da
arrancada para o desenvolviniento. Havia na mimha gera uma posio no esttica
a partir do conhecimento do cinema imediatamente passamos a incluir nos nossos
desejos, nos nossos sonhos, a possibilidades de fazercinema aqui no Brasil.
Nos cineclubes ns no tnhamos qualquer contato com o cinema brasileiro devido
principalmente s dificultades de se obter cpiase a atitude dos cineclubistas era a de
conhecer a histria do cinema cosmopolita, quer dizer, o grande cinema americano, o
clssico francs. Desconhecamos o que se fazia por aqui.
Inclusive Humberto Mauro?
Inclusive Humberto Mauro. No conhecamos nem mesmo os pioneiros paulistas, o
Medina, o Rossi. Talvez tivssemos alguma informao de leitura, mas nenhum
conheciniento de fato.
E evidente que j existia nessa poca no Rio de Janeiro uma produo constante, j
existia a Atlntida, por exemplo. Mas em So Paulo a produo ainda era uma
possibilidade muito remota. Comeou a pintar alguma coisa com a chegada de AlbertoCavalcanti no Brasil. Alberto Cavalcanti um brasileiro que tinha participado do
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movimento cinematogrfico internacional, contibuindo em dois grandes momentos da
historia do cinema: a avant-garde francesa e o cinema documentiro ingls. Realmente
era um autor de maior importncia que chegava a So Paulo para fundar uma grande
empresa de cinema, a Vera Cruz, Isso foi por volta de 1947-1948.
Mas voltando, minha gerao estava profundamente ligada aos problemas do pas,
preocupada em estudar o Brasil, ler os autores brasileiros, os socilogos, e buscando
uma participao poltica muito acentuada, participao esta no sentido de transformar
essa realidade.
Esta sintase (entre fazer cinema e discutir nossa realidade) foi encontrada no modelo
italiano de neo-realismo. Um modelo que inspirou na poca outros pases em
desenvolvimento como a India, vrios pases da frica, da Amrica Latina, e o Canadinclusive. Isto significava no contar coma intermediao do capital para se fazer um ci-
nema nacional: o autor e a realidade, o seu poyo como artista..., e todos aqueles
princpios bsicos do neo-realismo.
Minha formao, em linhas gerais, essa.
Voc fala vrias vezes em sua gerao. Qual a sua gerao?
Dentro de cinema, o Galilei Garcia, o Brulio Pedroso, que depois deixou o
cinema, o Carlos Alberto de Souza Barros, Agostinho Pereira, o Roberto Santos, que
um dos nomes mais importantes. Eu devo estar omitindo alguns nomes. Era um grupo
enorme, de formao universitaria, em Sao Paulo, dentro daquele pragmatismo paulista,
querendo fazer cinema mas que no fosse a frmula da Vera Cruz, que propunha o
modelo hollywoodiano de produo de viso da realidade. (A grande exceo foi o
filme do Lima Barreto, O cangaceiro, mas a j era o final da Vera Cruz.) A grande
produo da Vera Cruz era baseada no conceito de que cinema era um produto
industrial que podia ser feito, em qualquer clima, coma mesma frmula, tanto fazendo
o dirctor ser brasileiro ou italiano: o que importa a tcnica.
Ns tnhamos uma posio definida e aberta contra essa forma de se fazer cinema.
Em So Paulo, meu rimeiro trabalho profissional foi de assitente de Rodolfo Nani num
filme baseado em Monteiro Lobato, O Saci en 1951. Depois vim para a Rio, para
terminar um filme do Rui Santos Aglaia un filme inacabado, mas no houve
condio de produo e coincidiu com o inicio de Agulha no palheiro, do Mex Viany.
Eu j conhecia o Alex de So Paulo e ele me convidou para seu assitente. A partir desse
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momento fiquei pelo Rio, trabalhei em outro filme como assitente, Balana mas no
cai, do Paulo Vanderlei. Na produo desse filme, que foi muito dolorosa, eu tive mais
contato com o Rio, com a favela, e escrevi o roteiro de Rio, 40 graus.
Em 1953 houve uma grande crise no cinema brasileiro: a Vera Cruz j tinha fechado,a Maristela tambin, a Atlntida parou com aquela produo constante. Fizemos ento
um grupo para realizar Ro, 40 graus porque nao havia um productor para financi-lo
no havia ainda a Embrafilme. Acabamos fazendo o filme em regime de cooperativa:
cada um entrava com o trabalho e com o capital, levantamos o resto do capital com
amigos, com familiares, fizemos uma grande cooperativa, em regime de cotas de
participao. Rio, 40 graus teve um sucesso policial muito grande, foi proibido,
inclusive um sucesso razovel de crtica e foi mais ou menos bem de bilbetera. Pelo
menos nos deu condio de continuar e ns fizemos mais dois filmes, com a mesmo
grupo: Rio zona norte, aqui, e O grande momento, que o Roberto Santos faz em So
Paulo. Mas nenhum dos dois deu resultado. A competio era grande, nao havia essa
obrgatoriedade de exibio e nao tivemos uma cobertura boa que nos garantisse a volta
do capital.
O resultado foi para tudo, trabalhar em jornal, fazer documentrio. Era uma boa
compensao fazer noticias quando no se podia fazer filmes.Qual foi a importancia de Rio, 40 graus e Rio zona norte na poca, entre os que
faziam cinema e as geraes que comeavam?
A pretenso, o objetivo de Rio, 40 graus era exatamente romper com as barreiras e
preconceitos que existian no comportamento cultural cinematogrfico. Para voc ter
uma idia, ainda hoje h documentaristas que vo fazer filmes em obras pblicas, por
exemplo, que no gostam de enquadrar negros e que levam capacetes azuis e vermelhos
e camisas especiais para botar nos operrios brasileiros porque eles no esto bemvestidos; ou ento, muitas vezes, como eu j vi, eles colocam e engenheiro no lugar do
operrio porque o operrio feio, subnutrido, mal vestido, e o engenheiro fica mais
bonitinho.
Nesse perodo que vai da primeira triologia at Vidas secas, qual era a vivncia
poltica e cultural de vocs?
Quando saiu Rio, 40 graus e antes, a poltica brasileira estava muito excitada. O
episdio de Rio, 40 graus ficou ligado aos acontecimentos que envolveram o Caf
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Filho, o general Lott, a eleio de Juscelino. O filme tinha sido proibido pelo chefe de
polica do Caf Filho e a questo do filme ficou sendo uma questo poltica, que no era
para ser. Afinal, o filme uma coisa to mnima diante dos destinos do pas.
No perodo do governo Juscelino, houve uma certa tranquilidade com a mudana dacapital para Brasilia. Nessa poca participvamos de todas as discusses, principalmente
as da questo agrria, o que nos levou a fazer Vidas secas.
Era uma poca de muitos debates, com vrias propostas para a soluo do problema
agrrio. Nessa poca eu fiz vrios domentrios para o Isaac Rosemberg, conheci o
serto, o nordeste. Antes eu s conhecia as capitais e o litoral. En 1958, houve uma
grande seca e ns subimos o nordeste (a Bahia e Pernambuco), fazendo documentrios.
Eu e o Hlio Silva filmando e fotografando. Escrevi, ento, uma histria sobre oproblema da seca, mas no tinha condies pessoais para fazer isso, era sempre um
relato jornalstico. Eu me lembrei de Graciliano Ramos: Vidas secas um depomento
sobre a questo agrria da maior importncia e duradouro porque coloca o problema da
migrao (do movimento migratrio procurado pelas vtimas) e o problema da terra; e
no d nfase questo da seca. O nordeste no um problema do clima mas d relao
de trabalho e do regime de propriedade, que cria aqucle problema agrrio. Mas
enquanto persistir o movimiento migratrio nenhuma soluo prpria ser apresentada.O que coincidia com a opinio de economistas e socilogos que estudavam o assunto.
Rodar Vidas secas foi uma maneira de participar. Mas quando o filme saiu, em fins de
1963, as coisas tinham mudado completamente.
A inteno, quando comecei a filmar Vidas secas, era muito a de participar, atravs
de linhas culturais, da poltica. A gente nunca deixa de participar politicamente quando
participa culturalmente. A inteno no abandonar a viso poltica, mas ter essa viso
politica na prctica cultural.
NOTAS
* Entrevista del Cineclub Macunama para el programa de la Retrospectiva Nelson Pereira dos
Santos, organizada en febrero de 1975.