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8/17/2019 Envelhecimento e Lazer Terezinha Campos
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Envelhecimento, representaçoes sociais, saúde e cidadania: perspectivas de gênero. ST 45
Terezinha Campos1
Faculdade de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas São Luís/ Universidade Federal do Maranhão
Palavras-chave:
Envelhecimento e Lazer: reflexões sob a perspectiva das relações de gênero
Envelhecimento e Lazer: reflexões sob a perspectiva das relações de gênero na velhice
Na busca do entendimento sobre a relação envelhecimento e lazer sob a idéia de gênero é
fundamental compreender que, para fins deste trabalho, envelhecimento é entendido como “o
processo de mudanças universais pautado geneticamente para a espécie e para cada indivíduo [...]
dependentes de eventos de natureza [...] biológica, sociohistórica e psicológica” e a velhice como
um “a última fase do ciclo vital e é delimitada por eventos de natureza múltipla, incluindo perdas
psicológicas, afastamento social, restrição em papéis sociais e especialização cognitiva” (Neri,
2005, p. 114/115). A concepção de gênero, por sua vez, envolve uma série de significados culturais
que permeiam a distinção biológica entre homem e mulher, traduzida por Rorin (2001, p.1) como:
Refere-se aos atributos, funções e relações que transcendem o biológico/reprodutivo e que,construídos social e culturalmente, são atribuídos aos sexos para justificar diferenças erelações de poder/opressão entre os mesmos. É importante assinalar que o gênero varia
espacialmente (de uma cultura a outra), temporalmente (em uma mesma cultura hádiferentes tempos históricos) e longitudinalmente (ao longo da vida de um indivíduo).
Esta compreensão articula o pensamento veiculado ao significado atribuído ao lazer frente a
tais referenciais, a partir de sua indicação como uma dimensão do construto qualidade de vida4,
sobretudo quando compreendido em sua função de desenvolvimento pessoal para homens e
mulheres, isto é, quanto ao que podem, como indivíduos, entregarem-se de “(...) livre e espontânea
vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se ou, ainda para
desenvolver sua informação ou formação desinteressada, sua participação social voluntária ou sua
livre capacidade criadora, após livrar-se ou desembaraçar-se das obrigações profissionais,
familiares e sociais” (DUMAZEDIER, 2001).
Viguera (2004) destaca que muitos estudos têm prestado especial atenção na influência
que as atividades de lazer e o tempo livre têm sobre a qualidade de vida, o estado de saúde físico e a
cotidianidade das pessoas idosas. Entretanto, existem dificuldades para se pensar parâmetros ou
definir o alcance desta influência em função da própria complexidade do significado de qualidade
de vida e, fundamentalmente, devido aos fatores subjetivos e objetivos que a determinam; uns são
próprios do indivíduo e outros do meio sócio-econômico e cultural no qual se desenvolve e nem
todos mensuráveis da mesma forma.
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De fato, para Neri (1993, p. 9) “a promoção da boa qualidade de vida na idade madura
excede os limites da responsabilidade pessoal e deve ser vista como um empreendimento de caráter
sócio-cultural”. Isto é resultante, portanto, não só do estado biológico, mas também das condições
do meio ambiente em amplo sentido: interação social, hábitos, cultura, condições econômicas, o
próprio uso do tempo livre, dentre outras.O tempo livre é a condição necessária para que o lazer tenha espaço. De fato, o conceito
de tempo livre faz referência à existência de uma determinada quantidade de tempo, geralmente
alheio às obrigações laborais, sociais ou de outro tipo e que constitui, em potencial, um tempo para
o exercício da expressão e liberdade pessoal. Neste contexto, quando se trata de idosos é comum a
sua associação com a posição de estar em situação de lazer, sobretudo quando vinculada ao tempo
livre advindo com a aposentadoria (Tedrick e McGuire, 2000). Diz Lápiz (2003) que esta abertura
dá lugar a uma situação na qual com freqüência se postula a idéia de que com a aposentadoria tem-se uma vida com escassa atividade, sem deveres ou obrigações; uma vida de tempo livre e lazer; ou
seja, a velhice emerge como uma fase privilegiada da vida para o aproveitamento da “estação”
lazer.
Estabelecendo-se, porém, um contraponto com a situação, é importante enfatizar que,
embora não desqualificando a relevância e o significado do lazer para os idosos, convém chamar
atenção para certos pontos interessantes desta relação, tais como a forma como os sujeitos
constroem seus próprios lazeres, como os definem conforme suas necessidades, condições e
significados, além da maneira como se processam as pesquisas sobre o tema.
O estudo de Calegari (1997, p. 142), por exemplo, que buscou compreender a relação
entre lazer e aposentadoria, revelou que o primeiro não é norteador da vida dos sujeitos em todas as
suas dimensões, posto que existem os compromissos familiares e domésticos e, muitas vezes, o
retorno ao trabalho. Isto é, embora o lazer sendo considerado como "diversão para grande parte
dos entrevistados, nem todas as atividades de suas vidas são consideradas como tal”.
Divergências à parte, o que se acredita ser ponto de comunhão para as discussões sobre a
temática em questão é que prioritariamente há que se considerar o envelhecimento como um
processo de crescimento, estruturado em torno do tempo e marcado por mudanças biológicas,
psicológicas e sociais, o que abre espaço para investigações sobre a experiência do lazer entre
pessoas idosas. Desta forma, tal relevância é amparada exatamente no panorama que qualifica a
velhice como heterogênea frente à diversidade de elementos que intervém em sua configuração (o
gênero, a saúde, a escolaridade, a renda, a ruralidade ou o urbanismo, o trabalho desempenhado....),
possibilitando reflexões amplas de significados, conseqüência da própria amplitude do termo lazer
e, por extensão, das diferentes maneiras de percebê-lo.
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A perspectiva de gênero oferece elementos para uma análise interessante acerca desta
situação e programas direcionados à chamada terceira idade podem constituir espaços privilegiados
para a sua observação. Neste sentido, uma ação concebida e executada no campo das políticas
públicas – esfera federal – foi o referencial da investigação2, na medida em que, conforme coloca
Debert (1999, p. 1), as representações de uma velhice gratificante, vibrante e produtiva ganhamexpressão quando estão em “[...] jogo os programas para a terceira idade, com suas universidades
e grupos de convivência e de lazer”.
Na caracterização mais geral dos sujeitos pesquisados, a questão de gênero se sobrepôs:
a superioridade quantitativa das mulheres em relação aos homens, um aspecto que Debert (1999, p.
139) também analisa quando registra que, no Brasil, “os programas para a terceira idade têm
mobilizado, sobretudo, um público feminino. A participação masculina raramente ultrapassa os
20% (...)”, fato realmente constatado. Do lado masculino, o machismo e a vergonha são a justificativa para a diminuta participação masculina nos programas para a terceira idade,
corroborando outro olhar da autora, segundo o qual “as mulheres têm dificuldade de explicar a
ausência de um público masculino nos programas. São os homens, em número reduzido nos
programas, que estão mais preocupados em ressaltar a participação feminina e dar razões para a
ausência masculina” (p. 158).
Entre os sujeitos da investigação o preenchimento do tempo livre com atividades de lazer
antes do engajamento no programa era quase nulo, posto que o papel profissional e a assistência
familiar sobrepunham-se à condição de ter lazer. Daquilo que os homens relacionaram como lazer
em seu tempo livre, ficou explícito o domínio das atividades em termos de lazer passivo, isto é,
aquelas ocupações que, “no nosso tempo livre, poderemos exercer tranqüilamente sentados, usando
apenas os sentidos da visão e da audição: ler, ouvir música, assistir à televisão...” (RODRIGUES,
2000, p. 46). Para as mulheres a relação foi diretamente estabelecida aos aspectos religiosos: as idas
à igreja e a participação em comemorações e atividades circunscritas a este ambiente. Tais
colocações expressaram as experiências de lazer vivenciadas pelos sujeitos no contexto de seu
tempo livre.
O tempo, teoricamente bastante amplo na terceira idade, pode ser revestido de muitas
significações no contexto da experiência humana na qual é identificado por uma variação de nomes
- tempo de trabalho, de lazer, de aprendizagem, etc. O “tempo humano é único e limitado, mas a
sociedade qualifica cada forma de vivenciá-lo de maneiras diferentes, construções sociais de uma
única dimensão” (Moragas, 1997). O lazer é uma dessas dimensões, juntamente com as suas
diversas possibilidades e formas. Neste sentido, para os homens e as mulheres a experiência de
lazer trouxe uma dimensão diferenciada para esse tempo disponível das obrigações profissionais e,
de certa forma, familiares também, combinando aspectos de tempo e atitude face às possibilidades
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não só de diversão verificadas nas atividades, festas, brincadeiras e comemorações do ambiente do
clube, mas também de desenvolvimento pessoal e social.
Moragas (1997) observa ainda que se para várias pessoas o lazer corresponde a qualquer
um desses significados, ele pode ser qualquer coisa "tornando-se numa definição subjetiva de sua
experiência dificilmente sujeito à homogeneidade ou à categorização" . O lazer aparece assim,como uma experiência universal da pessoa, que, como o trabalho, o amor ou a relação social,
responde a desejos diferentes em cada uma.
A motivação para o engajamento no programa e a participação em atividade de lazer
está, então, referenciada a uma experiência quase sempre contrária a esta nova situação. Os
depoimentos registrados quase sempre se ligaram à necessidade de enfrentar episódios difíceis
emocional e psicologicamente relacionados ao momento pós-aposentadoria, aos sentimentos
diversos advindos com esta condição (depressão, solidão) ou à distância da família, muito maisentre as mulheres, ou a necessidade de ocupação e desvio de preocupações com questões
financeiras, entre os homens.
Independentemente do gênero, o que se observou é que os sujeitos associaram seu
ingresso no programa a sentimentos de liberdade – liberdade que implica uma resignificação do
processo de envelhecer, como descreve Debert (1999) – e reconfiguração de um convívio social, na
medida em que o descrevem com enfático prazer. O quadro posto a partir dos depoimentos vai ao
encontro da abordagem de Ferrari (1996, p. 103) que assenta a contribuição de agremiações
voltadas às pessoas de terceira idade num conjunto de benefícios que as levam a se transformar,
instituir novos valores, novas formas de refletir, de sentir e de agir. “Facilitam as modificações e
transformações das relações sociais que continuamente vão se enriquecendo. Nesses centros as
pessoas conhecem outras pessoas, redescobrem-se, trocam, vivem, sonham, ajudam-se”.
O cenário retratado a partir da apreciação dos sujeitos mostrou ainda como esses homens
e essas mulheres se colocam face à fruição das atividades de lazer típicos do ser humano moderno.
O turismo, por exemplo, na condição de atividade de lazer, dá margem a esta análise, uma vez que o
valor atribuído pelos sujeitos entrevistados à experiência turística, que ora tende a ter semelhanças,
ora pequenas diferenças, especificamente no que se refere ao significado pessoal conferido à
realização do ato, vai corroborar aspectos assinalados na literatura pesquisada quanto à
heterogeneidade das motivações e benefícios almejados com o turismo entre as pessoas idosas.
Para os homens é mais a integração, o alargamento do círculo de amizades e o encontro
com novos destinos, lugares diferentes. Estes motivadores são chamados por Cooper et al (2001),
de culturais quando explicitam aqueles identificados pelo desejo de ver e conhecer mais sobre
outras culturas, aprender sobre os nativos de um país, seu estilo de vida, música, arte, folclore,
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dança, etc., ou motivadores interpessoais quando incluem o desejo de conhecer novas pessoas,
visitar parentes ou amigos e buscar experiências novas e diferentes.
Para as mulheres, alguns fatores semelhantes, porém realçados por componentes afetivos
e até de cuidado com a saúde física – para Goeldner, McIntosh e Ritchie (1995) este último refere-
se aos motivadores físicos, isto é, aqueles ligados ao relaxamento do corpo e da mente, a questõesde saúde, aos esportes a ao prazer – e a possibilidade de conhecer lugares novos formam aspectos
também mencionados pelos respondentes.
O lazer, qualquer que seja a sua modalidade, além de contribuir para mobilizar nos
sujeitos o interesse de desfrutar de novas interações sociais guarda relação com o sentimento de
bem-estar físico, na medida em que, conforme alguns depoimentos há uma percepção positiva
quanto à saúde pela inter-relação com os outros aspectos, convergentes em sua essência
motivacional, estimuladora de razões de viver. A visão global dos depoimentos mostra que o lazer évivenciado pelos sujeitos como oportunidade a mais de aprendizagem, conhecimento de novos
destinos e pessoas e também de entretenimento, com repercussões favoráveis na auto-estima e na
postura diante da vida e do envelhecimento. Marcellino (1995) destaca que uma das linhas, de
análise do termo lazer é a que se fundamenta na atitude segundo a qual a ênfase é a relação entre o
indivíduo e a experiência vivida, ou seja, a satisfação provocada pela atividade. Isto foi sentido
entre os idosos ouvidos por evidenciar que para estes, o lazer implica um universo complexo de
significados, representados por interpretações de caráter moral, religioso, filosófico que variaram
muito ao longo da história. Estes significados e conceitos sobre lazer podem justificar-se, por vários
motivos, como: as diferenças de utilização do tempo livre em diferentes países, regiões, culturas, e
até mesmo, por conceitos pessoais e ideológicos.
REFERÊNCIASCALEGARI, K. C. Lazer e aposentadoria: relações e significados. Campinas, SP, 1997. 145 p.Dissertação (Mestrado). Faculdade de Educação Física, UNICAMP.COOPER, C. et al . Turismo: princípios e práticas. 2 ed. Porto Alegre: Bookman, 2001. Tradução:
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[email protected] Qualidade de vida: a expressão passou a definir-se como conceito integrador que compreendetodas as áreas da vida (caráter multidimensional) e faz referência tanto a condições objetivas comoa componentes subjetivos (VUGUERA, 2004)3 Clube da melhor idade: ambiente no qual foi empreendida a pesquisa empírica, parte dadissertação de Mestrado. Agremiação parte do Programa Clube da Melhor Idade instituído peloentão Ministério do Esporte e Turismo, sob a coordenação da Embratur, como parte de articulaçõesinterministeriais direcionadas à Política Nacional do Idoso (criada pela Lei 8.842/94 eregulamentada pelo Decreto n° 1.948/96) (BRASIL, 1998). O Programa é operacionalizado pelaAssociação Brasileira dos Clubes da Melhor Idade (ABCMI) que "procura propiciar a melhoria daqualidade de vida - pelo lazer e turismo - dos brasileiros com mais de cinqüenta anos"(EMBRATUR, 1996). , considerando ter sido este o ambiente no qual foi empreendida a pesquisaempírica, parte da dissertação de mestrado.