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CENTRO DE ESTUDOS
FUNDAMENTOS DO NOVO CPC
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
26ª PALESTRA PROJETO HORIZONTES DO CONHECIMENTO:
FUNDAMENTOS DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
DES. NEY WIEDEMANN NETO – Bom-dia a todos. Quero
saudar a presença do Presidente do Tribunal de Justiça, que prestigia este
evento, o Des. José Aquino Flôres de Camargo. Saudando-o, quero saudar a
todos aqui presentes, magistrados, funcionários do Poder Judiciário e demais
convidados.
Quero agradecer a presença da Dra. Jaqueline Mielke, que
muito nos honra tendo aceitado esse convite para fazer uma palestra sobre os
Fundamentos do Novo Código de Processo Civil, assim dando retomada ao
Projeto Horizontes do Conhecimento com as palestras, os eventos culturais do
Centro de Estudos, que, nos próximos meses, dará ênfase à promoção de
eventos, de palestras a respeito do Novo Código de Processo Civil.
É importante esclarecer que esse tipo de evento não dispensa
a necessidade de um aprofundamento, de uma formação mais intensa
mediante curso de atualização. Inclusive, aproveito para divulgar o curso de
atualização sobre o Novo CPC, que está sendo promovido pela Escola
Superior da Magistratura, tendo como público-alvo os magistrados e os
funcionários do Poder Judiciário. Curso este que terá sua aula inaugural no dia
2 de julho, com o Min. Paulo Sanseverino, e, a partir dali, toda sexta-feira
seguinte haverá aulas, das 14h às 18h, sendo a própria Dra. Jaqueline Mielke
uma das professoras deste curso de atualização na Escola Superior da
Magistratura, que eu aproveito para fazer aqui a divulgação.
Também um aviso, um esclarecimento de que o Tribunal de
Justiça está também focado nas repercussões do Novo CPC, o impacto que
isso terá na tramitação de nossos processos no 2º Grau. Já há duas
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comissões formadas no âmbito do 1º Grau de Jurisdição, supervisionadas
pela Corregedoria da Justiça, e o nosso Presidente Aquino formou um grupo
de trabalho, que será instalado na semana que vem, focado no estudo do
impacto do Novo CPC nos processos de trabalho, na tramitação do processo
judicial no 2º Grau. Esse grupo será coordenado pelo Centro de Estudos, com
a colaboração do Des. Almir Porto da Rocha Filho, do Des. Voltaire e de
quatro Juízes-Assessores da Presidência – Juízes-Corregedores –, que são a
Dra. Maria Thereza Barbieri, o Dr. Leandro, o Dr. Luís Antonio Behrensdorf e o
Dr. Jerson Gubert. Esse grupo também contará com a contribuição de muitos
funcionários, que somarão esforços, especialmente do Departamento de
Informática, da Diretoria Processual e da Direção Judiciária.
Desde já, quero colocar à disposição o e-mail do Centro de
Estudos, que é de todos conhecido, para que os senhores possam enviar
sugestões, críticas, preocupações. Aqueles que trabalham aqui no Tribunal de
Justiça e que estão estudando o impacto do Novo CPC nos seus processos
de trabalho na Informática, na Processual, nas Secretarias de Câmara, enviem
para o e-mail do Centro de Estudos as suas sugestões e preocupações,
porque esse grupo de estudos que eu mencionei há pouco vai propor, entre
outras coisas, as alterações regimentais que serão necessárias para a
adequação desses processos de trabalho.
Então, com essas notícias iniciais, quero passar a palavra à
Profa. Dra. Jaqueline Mielke, que é doutora em Direito pela Unisinos,
advogada, professora em diversas instituições de ensino do Rio Grande do
Sul, na FMP, na Escola da Magistratura, inclusive tenho a honra e o privilégio
de ser seu colega de docência na Faculdade Inedi Cesuca, em Cachoeirinha,
onde ambos lecionamos na graduação.
Com essas informações, passo, desde logo, a palavra à Dra.
Jaqueline para a sua explanação, que está programada para durar em torno
de uma hora, para que os senhores tenham tempo e oportunidade de
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participar. A Profa. Jaqueline colocará a palavra à disposição depois de uma
hora, para que os senhores possam fazer perguntas e questionamentos.
Passo a palavra à Dra. Jaqueline.
DRA. JAQUELINE MIELKE – Bom-dia a todos. Eu gostaria
inicialmente de agradecer o convite do meu amigo Des. Ney para estar aqui
hoje pela manhã e rever tantos alunos, amigos na plateia, é sempre bom rever
vocês. Gostaria de cumprimentar o Des. Aquino, Presidente do Tribunal –
honra a sua presença na plateia –, a Dra. Maria Thereza, demais presentes,
magistrados, assessores.
Vamos conversar um pouco, então, nesta manhã, sobre o
Novo Código de Processo. Eu, quando conversava com o Des. Ney sobre qual
o tema, eu disse que, tendo em vista que falarei uma hora, parece-me que o
melhor caminho é falarmos dos fundamentos do Novo Código. Não
conseguiria, em uma hora, falar de execução – que é um mundo à parte –,
recursos, são muitas coisas. Então, parece-me que os fundamentos gerais do
Novo Código é o que temos de mais importante para vermos em uma hora.
Começo sempre a minha fala, quando trato do Novo Código,
dizendo que tenho uma visão bastante crítica desse novo sistema, até porque
a minha formação – para quem me conhece, eu estudei com o Professor
Ovídio Baptista da Silva praticamente 20 anos – é com base nele, que tem
uma sustentação bastante crítica do sistema jurídico, do funcionamento do
sistema. E o Professor Ovídio era um operador, era um advogado militante, e
eu sou uma advogada militante também.
O Novo Código veio com a promessa de resolver problemas
que temos no âmbito do Poder Judiciário; problemas que temos com relação à
morosidade, efetividade do processo, fundamentação de decisão judicial.
Então, ele veio com essa promessa. Quando ouvimos o Min. Fux, ele vem
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com essas promessas, como se fôssemos resolver os nossos problemas com
o Novo Código.
Eu sou bastante cética sobre essa questão da crise do Poder
Judiciário, problemas com morosidade do processo, efetividade da Justiça,
porque entendo que o Processo Civil não tem como resolver esses problemas.
Na verdade, são problemas estruturais, são problemas sociais, políticos e
econômicos, que o processo não tem como resolver. Mas ele tem como
minorar o problema, nós temos como amenizar o problema; resolver, não. O
Prof. Ovídio costumava dizer: “Jaque, nem em trezentos anos nós vamos
resolver isso”. Então, nós podemos minorar.
Na verdade, quando eu falo em problema – e aqui vou me
valer novamente do Prof. Ovídio – no Judiciário, vejo dois grandes problemas
que, se conseguíssemos resolver em parte, as coisas seriam bem melhores.
Primeiro, o grande volume do Judiciário envolve demandas que são ajuizadas
porque o Estado não cumpre o seu papel, o Estado não funciona, e aqui nós
temos uma Justiça Federal feita para o Estado, temos Varas da Fazenda
Pública sobrecarregadas, ou seja, se o Estado cumprisse o papel, nós
eliminaríamos inúmeras demandas.
O que ocorre atualmente? Temos o problema de judicialização
de políticas públicas, que geram inúmeras demandas, demandas repetidas,
muitas vezes, e que efetivamente acabam gerando uma sobrecarga dentro do
Judiciário, que é um problema que não é do Judiciário, mas do Estado. E
temos o problema das demandas repetitivas.
Se conseguíssemos resolver o problema do Estado e o
problema das repetitivas, a situação melhoraria bastante. Essa era uma visão
que o Prof. Ovídio tinha. Inclusive, em algumas de suas conferências, logo
antes de falecer, ele dizia: “O Estado não funciona, por isso que o Judiciário
não funciona”. Então, o problema não é do Judiciário. Não é. O problema é
maior. Qual é a minha preocupação? Ainda vem o Novo Código com essa
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promessa de resolver. Não vai. Muito pelo contrário. E aqui também, via de
regra, quando eu vou falar, as pessoas esperam que eu vá defender o Código,
esperam que eu vá elogiar o Código, porque sou advogada, advogada
militante. Por que esperam? Porque é um Código feito por advogados, mas,
sem dúvida alguma, advogados com medo de Juízes. É isso, o Código é isso.
Tentaram eliminar a criação judicial em vários dispositivos legais, mas não vão
eliminar nunca. Não vão eliminar nunca o que pretenderam, mas, quando
falam que o Código foi feito por advogados, concordo. Advogados que nunca
pisaram no Foro – esse é o problema –, advogados teóricos.
Tenho vários exemplos de mecanismos que foram colocados
e que refletem isso. Vou começar com um exemplo do Novo Código, que
alguns estão chamando de “embargos infringentes cover”, que são um
arremedo de embargos infringentes. Só um sonhador, um utópico, vai
imaginar que, no caso de um julgamento não unânime, por dois a um, que
haveria Desembargadores à disposição, naquele dia, para continuar um
julgamento e Desembargadores que vão se sentir confortáveis para votarem
em um processo que nem conhecimento têm. Então, só um sonhador para
imaginar que isso possa se realizar no dia a dia do Foro. Isso não existe.
Chamam de “embargos infringentes cover”, porque é um arremedo dos
infringentes. Conseguiram criar um negócio pior do que os infringentes,
porque os infringentes não atrapalham em nada hoje, e até que o número de
infringentes não é tão grande assim. Criaram infringentes para qualquer
decisão não unânime, e ficou pior. Hoje o art. 530 restringe: apenas quando
houver modificação da decisão de mérito do 1º Grau ou no caso de
procedência não unânime de rescisória. No Novo Código, é para qualquer
julgamento não unânime, e, pior, cabe, inclusive, de decisões não unânimes,
em determinados casos, de agravo de instrumento. Então, foi ampliado o
caso, por isso o arremedo de infringentes que temos hoje. Para criar isso, só
quem nunca pisou no Foro, quem nunca fez uma petição de embargos
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infringentes sabe que não atrapalha em nada efetivamente. O que ocorre?
Esses reflexos, esse tipo de positivação, nós vamos encontrar em diversos
dispositivos legais.
E aqui eu vou aos fundamentos gerais do Novo Código. O que
norteou o Novo Código? Basicamente, o que se observa, em termos gerais?
Observa-se uma ideia de preservação muito forte, uma ideia de eliminação,
primeiro, do protagonismo judicial – é essa a expressão que eles utilizam –;
segundo, uma valorização do contraditório; terceiro, uma positivação e
valorização do princípio da colaboração – a colaboração vem muito forte.
O que vem muito forte ainda no Novo Código? A ideia da
fundamentação das decisões judiciais, que me parece que é uma expressão
do princípio do contraditório, e aquela ideia de eliminação do protagonismo
judicial que é sustentada. Observa-se também – que me parece que é a
melhor parte do Código que nós vamos ter, apesar de ter exageros também –
a introdução do que parte da doutrina fala em formalismo valorativo e outros
falam em princípio da instrumentalidade das formas, que efetivamente o
Dinamarco fala há muito tempo, e depois introduziram com a ideia de
formalismo valorativo. Parece-me a melhor parte, mas me parece também que
há alguns exageros do Novo Código, porque qualquer vício é perdoado.
Qualquer vício é perdoado dentro do novo sistema.
Então, na verdade, são os princípios vetores, os princípios
fundamentais que observamos existentes no Novo Código que estão por trás
dos dispositivos legais. Partindo-se desses princípios, o que observamos?
Ainda dentro do geral, para depois partirmos para as especificidades maiores.
Observa-se que é um grande problema no Brasil, porque legislamos o novo
com a sombra do velho. Digo que legislamos o novo com a sombra do velho e
que costumamos importar soluções de modelos de sistemas estrangeiros e
jogamos para dentro do Código, o que é outro problema.
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Esse movimento que tivemos no Brasil, essas ideias, são
movimentos mundiais de alteração da legislação processual civil. Não é uma
invenção nossa, novamente nós copiamos outros sistemas mundiais. Na
verdade, é isso. O que fizemos no Novo Código? Nós copiamos o de 73, o
adaptamos. É muito fácil vocês verificarem isso. Comprem esses Códigos que
comparam os dois – eu tenho sugerido para os meus alunos – e vocês verão a
cópia de vários artigos. Eles mudaram o que quiseram, copiaram o velho e
copiaram modelos de sistemas alienígenas, sem a devida adaptação à nossa
cultura.
Parece-me que, se pretendemos construir um Código novo,
um sistema novo, ou nós construímos tudo novo ou ficamos com o velho. Não
dá para fazer um arremedo, não dá para fazer cópia ou uma não adaptação à
nossa realidade cultural, à realidade que temos no Poder Judiciário. É
complicado isso. Nota-se que 60 a 70% desse Novo Código é o de 73
adaptado. Alguns têm um trauma: “Ah, muda tudo!” E eu digo: “Tem muita
colagem”, que, na verdade, tem que adaptar. Então, essa é outra grande
crítica que eu faço, em termos gerais, a esse Novo Código, que é a forma
como isso foi feito. Parece-me que essa colagem de um sistema antigo e essa
importação de modelos de sistemas estrangeiros sem a devida adaptação,
que está por trás da forma como tivemos esse Código redigido, são
complicadas. Feitas essas breves considerações, vou propriamente a pontos
específicos dentro do geral.
Conforme mencionei inicialmente, um dos princípios que
nortearam essa reforma foi o princípio do contraditório, muito forte. A ideia de
um contraditório efetivo passa a imperar dentro do Novo Código, vinculada à
ideia de colaboração, e não dá para esquecer que quem difundiu essa ideia,
sem dúvida alguma, aqui no Rio Grande do Sul, foi o Dr. Carlos Alberto Alvaro
de Oliveira. Essa ideia de um contraditório efetivo vinculado, atrelado à ideia
de colaboração das partes na melhor construção de uma decisão judicial, que
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vem de uma forma muito clara nos artigos iniciais do Novo Código, como no
art. 9º, parte da doutrina que acadêmicos defendem hoje, que diz respeito a
uma das aplicações maiores do Novo Código – e que eu critico – de que o
Juiz continua podendo se pronunciar, evidentemente, sobre questões de
ordem pública – pressupostos processuais, condições da ação, prescrição –,
de ofício. Entretanto, antes de se pronunciar de ofício, ele precisará dar vista
às partes. Então, é possível se pronunciar, mas, antes de se pronunciar de
ofício, deve ouvir as partes, de modo que seja implementado o contraditório
efetivo.
O que ocorre aqui? Essa questão me parece complicada
dentro da realidade forense atual que temos. Quem está no Foro todos os dias
sabe que há processos em que temos um despacho por ano pelo volume de
demandas. E qual vai ser o despacho? “Vista às partes para concordar ou não
sobre o que eu estou pensando”. Na verdade, é isso. Quando se sabe,
quando se forma a convicção sobre determinada questão, é difícil modificar.
Quando é dada vista às partes, via de regra, o Juiz já sabe intimamente o que
ele está pensando sobre o caso, sem dúvida alguma. E dar vista às partes
para questão processual, é processo. Se for questão de ordem pública,
efetivamente me parece um exagero, isso aqui vai trancar o procedimento.
Quando eu comento isso para alunos que não sabem nada de Direito, eles me
indagam: “Mas isso é celeridade?” Não é celeridade. Essa questão desse
contraditório efetivo, da colaboração das partes, eles poderiam talvez ter
introduzido para a prescrição, porque é mérito a prescrição. Mas me parece
que há um exagero em estender-se para qualquer questão processual. Isso
não é só para o Juiz de 1º Grau, mas para o Tribunal também.
Por exemplo, surge uma questão de ordem pública no 2º
Grau. Se surge durante o julgamento, tem que parar o julgamento. Pára o
julgamento para dar vista às partes, vão colocar em pauta sabe-se lá quando
o processo, com relação ao tempo. Mas é essa a ideia. Eles só
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excepcionaram essa ideia do art. 9º naquelas liminares concedidas inaudita
altera parte, daí seria um absurdo ter que ouvir sempre. Então, aqui o Código
excepciona expressamente no art. 9º, mas me parece, sem dúvida alguma,
um exagero. Obviamente que se busca uma melhor decisão judicial, mas
também não adianta uma melhor decisão judicial que vá ser prolatada daqui a
10 anos, 15 anos. Não tem condições. Vocês imaginem, para cada questão de
ordem pública, tem que dar vista às partes com base nessa ideia de
colaboração.
Na época que o Prof. Ovídio era vivo ainda, ele dizia – e já
defendiam isso, defendem isso há muitos anos e conseguiram colocar no
Código – que isso é tese para biblioteca, para compor livros de biblioteca, são
teses acadêmicas. Daí eu digo novamente: teses acadêmicas de pessoas que
nunca entraram num Foro, porque, se tivessem entrado no Foro, não teriam
dito isso, que era o que o Dr. Ovídio dizia sobre essa questão efetiva da
colaboração. Ele dizia: “É uma visão romântica de processo”. É uma visão
romântica que talvez seja compatível com o Judiciário que tivemos na década
de 70, mas não com o Judiciário que temos em 2015.
E a ideia de contraditório é outro problema que temos. O
processo tem que evoluir de acordo com os avanços sociais. A sociedade hoje
é uma, nós vivemos em uma sociedade massificada, com um grande número
de demandas. Então, essa visão romântica talvez se adapte lá atrás, mas não
hoje, em 2015. Evidentemente que o contraditório deve ser preservado, sem
dúvida alguma, mas me parece um exagero essa questão de contraditório
para questão processual, e não tenho a menor dúvida de que isso vai acabar
trancando o processo, o processo vai emperrar.
Outro princípio que está no Código – e já o encontramos
aplicado no Judiciário, pela jurisprudência, e que decorre do art. 422 do
Código Civil – é o princípio da boa-fé processual, que me parece importante
no sentido de que a conduta das partes deve ser norteada pela boa-fé, sem
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dúvida alguma. Então, o princípio da boa-fé, que hoje sustentamos a partir do
art. 422 do Código Civil, que decorre do venire contra factum proprium, está
presente no Novo Código. Parece-me importante, mas não temos nada de
novo aqui também. Não temos nada de novo na exata medida em que a
jurisprudência já aplica, só temos ele positivado. Então, existe, no Novo
Código, na parte inicial, uma valorização bastante grande dos princípios, os
princípios foram elencados de uma forma bastante clara.
Outro princípio que norteia o Novo Código é o princípio da
instrumentalidade das formas, que alguns preferem chamar de formalismo
valorativo, que, na minha opinião, tem o mesmo significado. Eles ficam
indignados quando eu digo isso e dizem: “Não, é outra coisa”. Mas me parece
que estão falando da mesma coisa. Procurou-se desformalizar os
procedimentos, o que me parece importante. Por exemplo, aquela ideia
absurda que temos hoje de recurso prematuro, recurso intempestivo, porque
interposto antes do prazo, termina de vez. Tiveram que colocar de uma forma
expressa – o que é um absurdo, mas no fim eu acabo sendo a favor que
escrevam isso – que recurso interposto antes do prazo é tempestivo. E dizem
mais ainda: não precisa ratificar. Então, acabou o recurso intempestivo, o que
me parece importante.
Também verificamos uma ideia de desformalização no tocante
ao exame dos requisitos de admissibilidade que, na minha opinião, tem um
certo exagero. O que temos com relação aos requisitos de admissibilidade no
Novo Código? Temos o art. 932, parágrafo único, do Novo Código, que digo
que, se houver algum problema de forma, via de regra, exceto a
tempestividade, tem segunda chance para sanar. Qualquer problema de
forma. Não recolheu o preparo? Não tem problema, intima para recolher em
dobro. Não juntou nenhuma peça no agravo de instrumento? Intima para
juntar as peças. Isto é um exagero: não juntar nenhuma peça. Há exageros na
jurisprudência, como exigir assinatura em cima da página ou quando é
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evidente que o agravo é tempestivo. Por exemplo, indeferimento de liminares
inaudita altera parte, a distribuição foi hoje, amanhã é o agravo disso; dizer
que não comprovou a tempestividade, quando é evidente a tempestividade.
Então, têm exageros, mas não juntar nenhuma peça de agravo me parece um
exagero no sentido da desformalização, mas a ideia é desformalizar.
Em resumo: erro de forma tem perdão – qualquer erro de
forma –, só a tempestividade que não tem. Ainda acho que até a
tempestividade, conforme o caso, irá ser perdoada também, que é o caso dos
feriados locais. Contam-se prazos em dias úteis no Novo Código: só dias
úteis; finais de semana não contamos, férias não contamos, feriados não
contamos. Como advogada, eu vou continuar contando do jeito que eu conto,
porque acho que é pior ficar contando dia útil, só que vocês efetivamente têm
que contar em dia útil, porque a regra geral é essa. Há uma norma que diz
que, se há feriado local, tem que haver a comprovação. Aí, se a parte não
comprovou o feriado local, é intempestivo, e acho que darão prazo para que
sanem o problema também. Então, até a tempestividade, conforme o caso –
na ideia do Código, que é perdoar problemas de forma –, acho que darão
oportunidade também. Existe uma completa desformalização nesse sentido.
Há ainda uma completa desformalização quando eles retiram
o juízo de admissibilidade do 1º Grau na apelação. Parece-me que não tinha
problema nenhum isso, porque quando as apelações não são admitidas pelos
Juízes de 1º Grau é porque têm problema. Então, me parece que isso não
atrapalhava em nada, só que retiraram – e daí é uma loucura o que fizeram –
o juízo de admissibilidade no REsp e no RExt. Tem advogado vibrando com
isso, mas é muito pior deixar a porta aberta para o STJ e para o STF, porque –
falo como advogada – já temos que pedir pelo amor de Deus para que leiam
nossos recursos em Brasília com a porta fechada, imaginem com a porta
aberta. Quem deve estar adorando isso são os advogados de Brasília, porque
interpor recurso especial e recurso extraordinário, se hoje já é complicado sem
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um acompanhamento em Brasília, fica impossível com esse Novo Código.
Isso é impossível, é insustentável. Isso não é bom, ao contrário do que muitos
dizem, porque vai generalizar.
Quando reclamam efetivamente do filtro que é feito pelos
tribunais de 2º Grau, pelos TJs e pelo TRF, que a maioria não sobe, na
verdade, a maioria não tem que subir mesmo, porque são recursos muito
restritos. Qual é o problema que o Prof. Ovídio levantava também? As
pessoas têm a ilusão – e os advogados não gostam quando eu falo isso – de
que um dia vão chegar à decisão correta e que essa decisão correta vai ser a
do STJ e a do STF. Ledo engano, porque às vezes é pior a decisão que temos
lá, e as pessoas recorrem, recorrem e recorrem com essa ilusão. Então, os
filtros são uma coisa boa, e a opinião não é só minha, têm outras pessoas que
eu tenho conversado – depois eu vou tocar na questão da fundamentação e
do art. 489 –, como o Lenio Streck, que é o pai do art. 489, que diz: “Isso aqui
não está bom, isso tem que ter um filtro. Não existe uma coisas dessas”.
Então, o filtro é importante, sem dúvida alguma.
Com relação a essa questão da admissibilidade no Recurso
Especial e Extraordinário, eu não sei se não mudam a norma antes de o
Código entrar em vigor, porque vai ser um caos para Brasília isso aqui. Essa
eliminação é coisa de advogado que não está no Foro, eliminaram porque os
advogados reclamam: “Ah tem o filtro, os nossos recursos ficam trancados”.
Então, é fruto dessa desformalização o acesso amplo, que não é acesso na
exata medida, porque certamente os recursos não serão analisados, os
recursos não serão lidos. Na verdade, a comunidade jurídica deveria se
conscientizar de que são recursos restritos.
E aqui, novamente vou-me valer do que o que o Prof. Ovídio
defendia, que é a eliminação de recursos, valorização da jurisdição de 1º
Grau, um acesso restrito ao STF e ao STJ, porque é insustentável, com o
número de demandas que temos. É insustentável uma briga de vizinhos
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chegar ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça, mas
isso é fruto dessa desformalização que temos, desformalização que não existe
só nos recursos. Quando eu falo na desformalização, gosto de falar dos
recursos, em que a vejo mais forte. Esse remendo que pode ser feito nos
recursos, esse perdão à forma é fortíssimo em todos os dispositivos. Esses
dois: não pagar preparo, ter o perdão de ser possível depois, e de não juntar
peça nenhuma no agravo de instrumento são exemplos marcantes dessa
desformalização.
Essa desformalização encontramos também, de uma forma
forte, na tutela provisória, e aqui já estou usando a expressão do Novo
Código, porque eles falam em tutela provisória. Tenho alguns amigos que
dizem ter calafrios quando escutam o nome, pela critica que é feita, toda uma
crítica teórica. Eu até não tenho grandes calafrios, eu falo de acordo como
está no Código, mas tem problema a expressão. Dentro da tutela provisória, o
que foi feito? E aqui, em parte, eu concordo com o que foi feito. Houve a
revogação do Livro III do Código. Não temos mais um livro específico para a
tutela cautelar. Acabou o Livro III, e, terminando o Livro III, foram revogadas
todas as cautelares nominadas. Esta parte é a que eu gosto, a da revogação
das nominadas.
O que ocorre? Esse tema relativo à tutela de urgência – que
hoje chamamos de tutela de urgência – sempre foi um dos temas mais
controvertidos no âmbito do processo. Temos, no Direito brasileiro, duas
vertentes com relação à tutela de urgência. Uma segue o Calamandrei, o
Calamandrei e o Carnelutti, e aqui no Rio Grande do Sul eu diria que, talvez, o
que melhor entendeu a teoria dele foi o Des. Galeno Lacerda, que tem uma
obra que reflete o pensamento desse autor, que escreveu como ninguém. De
outro lado, temos o Prof. Ovídio Batista da Silva, que não concordava com
nada do Calamandrei, que não concordava com nada do Livro III. O Prof.
Ovídio dizia: “Nunca me entenderam.” Toda a fama o Prof. Ovídio começou a
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conquistar quando ele fez o anteprojeto do art. 273, da tutela antecipada.
Então, é um ponto que a doutrina discute, discute, discute, mas uma coisa
todo mundo concorda: que as cautelares nominadas só têm problema. Se
vocês pegarem qualquer livro de tutela, um livro que aprofunde a matéria com
relação à tutela de urgência, vocês verão só críticas. E existe uma proposta do
Carnelutti, de 1928, dizendo que tinha que revogar tudo. Em 1928. Nós
revogamos em 2015. Na verdade, parece-me importante a revogação, mas eu
escuto de alguns: “Mas e agora eu não vou ter mais o arresto?” Grande coisa
o arresto, têm mecanismos muito melhores no Código do que o arresto. Nós
vamos continuar tendo o arresto, o sequestro, o arrolamento. Inclusive, tem
um artigo lá na tutela provisória que diz que é possível se buscar o
cumprimento do provimento na forma de arresto, arrolamento.
Na verdade, o que ficou melhor é que não vamos ter mais
requisitos específicos, é geral. Só dois requisitos: probabilidade do direito e
risco de dano irreparável. Acabou. Então, acabaram aqueles requisitos
rigorosos lá dos artigos 813 e 814 do arresto, artigos 821 e 822 do sequestro.
Terminaram. Então, é geral, e isso me pareceu bom, houve uma facilitação,
nós não ficamos discutindo a forma dessas cautelares nominadas.
Mas qual é o problema que eu vejo, ao contrário do que
muitos? Então, revogamos o Livro III e não temos mais cautelares nominadas,
não temos mais um livro próprio para tutela cautelar. Aí o que o Novo Código
faz? Cria um livro no Livro I, é o livro V. O Livro V da parte geral, que nominam
de tutela provisória. E o que é que eles colocam? Em onze artigos, eles
dividem essa tutela provisória em tutela de urgência e tutela de evidência. E
dentro da tutela de urgência, eles colocam a tutela de urgência cautelar e a
antecipada. Em onze artigos, eles fazem isso. O que nós temos em vários
artigos são resumidos a onze artigos. É evidente aqui a tentativa de
desformalizar, só que eles acabam gerando problema de novo, porque falta
teoria de base. E quem conhece a teoria de base da tutela de urgência,
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enxerga problema nessa desformalização, que veio para facilitar, mas vai
gerar problemas processuais.
Eu disse no início que eles quiseram eliminar a criação do Juiz
positivando. Eles tentaram imaginar, mas eles tentaram imaginar o que já
existe de problema; os problemas futuros, eles não conseguiram imaginar. E
aqui tem um problema. Na tutela, essa que eles chamam de tutela provisória,
eles mantêm a tutela cautelar e mantêm a tutela antecipada. A tutela
antecipada, em linhas gerais, eles dividem em incidente e antecedente. A
incidente é a que temos hoje, apenas tiraram o requisito da prova inequívoca,
que era fortemente criticado. Ficamos com a tutela antecipada com três
requisitos: a probabilidade do direito, o risco de dano irreparável e a
reversibilidade dos efeitos, porque eles continuam falando em reversibilidade
dos efeitos, porque vamos continuar aplicando a tutela antecipada, ainda que
os efeitos sejam irreversíveis, naqueles casos de demanda envolvendo saúde,
por exemplo. Certamente nós vamos continuar aplicando, flexibilizando
requisitos. Isso continua igual e continua sendo possível pedir tutela
antecipada na petição inicial, no curso do processo.
Então, as ações continuarão a ser feitas, se quisermos, do
mesmo modo, mas eles criaram uma coisa diferente, que é a antecedente,
importada de sistemas alienígenas, com forte inspiração no Direito francês, a
chamada estabilização da tutela antecipada. Quando eu falo em estabilização,
por todas as confusões que a estabilização pode gerar, as pessoas me dizem:
“Eu não vou querer esse negócio nunca”. O que é estabilização? Quando a
parte – está nos artigos 303 e 304 – ajuíza uma ação – eu vou sem bem
simplista com relação a isso aqui –, por exemplo, ela pretende a exclusão do
seu nome do SERASA e do SPC. Como é que fazemos hoje? Ajuíza-se a
ação, pede-se a liminar de exclusão e a procedência da ação com a
confirmação da liminar. Como é que poderemos fazer a ação à luz do Novo
Código? Se a parte quiser se valer dessa técnica, ela tem que avisar na
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petição inicial – está no art. 303, §5º –, tem que dizer: “Eu quero isso”. Se não
disser, posso fazer do mesmo jeito que sempre fiz. A parte, quando ajuizar a
ação, ela poderá, simplesmente, pedir a tutela antecipada e só colocar os
requisitos da tutela antecipada. Ela não precisa mais fazer uma petição inicial
completa, exaurindo fundamentos. Ela só coloca os requisitos, probabilidade,
risco de dano irreparável e pede a concessão da liminar. Se a liminar for
deferida, ela terá a oportunidade de aditar essa petição complementando com
o que falta, complementando fundamentos, juntando documentos. Se for
deferida a liminar e se o réu não agravar, haverá a extinção do processo,
termina o processo, estabilizando-se o provimento, ou seja, pedi para sair do
SERASA, estou fora do SERASA. Aí vem a questão: se o réu quiser me
colocar de novo no SERASA, depois da extinção, terá que ajuizar uma ação
para rever essa sentença. Foi isso que, em linhas muito simples, inventaram.
Isso aqui gera problema que não acaba mais.
Só para elencar um dos problemas que se cogita, que surge
nessa ação do SERASA, que é uma ação bem simples. Alguns me
perguntam: “O.k. é extinto. Mas se eu quiser pedir o dano moral?” Geralmente
vem com dano moral junto. Eu quero sair do SERASA e quero dano moral. Eu
não quero que seja extinto, porque, se for extinto, como é que vai ficar meu
dano moral? Eu digo: “Se tu quiseres o dano moral, lamento, mas não peça a
técnica. Se tu quiseres o dano moral, continues fazendo a ação do jeito que tu
sempre fizeste”. Na verdade, isso pode só valer a pena naqueles casos em
que eu não tenho cumulação de pedidos. Nas ações de fornecimento de
medicamentos, isso pode valer a pena.
Estava dando um curso para o Ministério Público, outro dia,
daí uma Promotora disse: “Bah, agora vai ficar horrível. O Estado é obrigado a
agravar de tudo”. O Estado terá que agravar de tudo, quando pedirem a
técnica, e o Tribunal ficará sobrecarregado com esses agravos. Se na inicial o
autor disser que quer a técnica, tem que interpor agravo de instrumento,
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senão a situação fica pior do que está. Então, isso foi criado – está no art. 304
–, mas têm – na manhã de hoje não vamos falar só de estabilização –
inúmeros outros problemas que isso vai gerar, e este é apenas um deles.
Então, digo para vocês que a tutela antecipada continua com ela é hoje, só
muda se a parte quiser se valer da técnica. Qual é o problema? Tem gente
confundindo tudo. As pessoas não se deram conta, acham que estabiliza
sempre, misturam tudo. Não é. O que tem do art. 273, que a gente faz hoje,
está em outros artigos. Se vocês olharem, só está a colagem do art. 273, e a
técnica, se quisermos usar, usaremos. Mas não é nenhuma alteração que vá
mudar tudo, não é difícil de compreender isso aqui, mas o chato é verificar
todos os problemas que a estabilização possa gerar sempre que for requerida.
O resto é igual.
Na tutela provisória, eles fizeram ainda outra coisa – que
também não é nenhuma novidade – para desformalizar e não se deram conta
de um detalhe. Hoje, nós continuamos tendo ação cautelar, e a ação principal
deve ser ajuizada num prazo de 30 dias a contar da efetivação das medidas,
nos termos do art. 806. Então, temos uma ação cautelar e uma ação principal.
O que o Código faz? Ele elimina a ação principal e fala em um pedido principal
nos próprios autos, o pedido principal é feito junto, tudo no mesmo
procedimento. Isso o Galeno Lacerda sustentava há 30 anos, não é nenhuma
novidade, nos livros dele vocês já vão encontrar isso. E há 30 anos, o Prof.
Ovídio já dizia que isso era um problema no processo, o de cumular.
Vou dar um exemplo da cumulação, um exemplo que não tem
como cumular, e que eles não se deram conta. Eu ajuízo uma cautelar com a
finalidade de apreender bem para assegurar o pagamento de um crédito, que
é o nosso arresto. Eu ajuízo um arresto com um nome que vai ter um nome de
cautelar. Tendo em vista esse princípio da desformalização que impera no
Código, se eu der o nome de arresto, parece-me que não tem problema
nenhum também. Ajuízo uma ação cautelar, que, na essência, é um arresto,
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só que eu sou credor de um crédito corporificado em um título, eu sou credor
de uma nota, e o meu crédito está corporificado em uma nota promissória.
Então, ajuizei o arresto. Qual é a minha ação principal? É uma ação de
execução de título extrajudicial. Qual é o problema? Eu não tenho como fazer
esse pedido nos mesmo autos, porque é execução, e ela é a ação. Como é
que eu vou pedir nos mesmo autos que o réu seja citado para pagar em três
dias? Aí vai embargar, e os embargos vão ficar em apenso nisso aqui? Então,
parece-me que eles não lembraram que existe execução para dizer que o
pedido é sempre nos próprios autos. Têm casos que não vamos conseguir
fazer o pedido nos próprios autos, que é o caso da execução. Não dá para
cumprir o que tem no Código.
Por outro lado, quando eles falam em cumulação de pedido
principal na própria ação, eles misturam lide cautelar com lide principal, que é
um problema que temos no Brasil, e a maioria da doutrina não enxerga que
temos uma lide cautelar com requisitos diversos de uma lide principal, ou seja,
a lide cautelar não é uma parte da lide principal. Ela tem pressupostos
distintos, e não enxergaram isso, não viram isso. Então, temos duas lides
distintas no mesmo processo em que a instrução vai ser conjunta, o que causa
tumulto, sem dúvida alguma. Essa era uma das grandes objeções que o Prof.
Ovídio também fazia à ideia de cumulação, por estarmos diante de lides
distintas.
Ainda um detalhe com relação à cautelar. Se vocês lerem, é
“recorta e cola” do art. 796 até o art. 812. A diferença é essa cumulação,
porque o resto é praticamente igual ao que se tem, não tem grande diferença.
Na tutela provisória, o que é o diferente? É a estabilização, que vai ser
utilizada se a parte requerer. Ali é que tem uma série de discussões que
podem ser levantadas; o resto é “recorta e cola” do que temos, não muda.
Então, não é tão assustador assim como muitos colocam; com uma leitura
atenta, se observa isso de uma forma muito clara.
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Outro ponto do Novo Código que tem gerado grandes
discussões – é o artigo da discórdia do novo Código – é o art. 489, que trata
da questão da fundamentação das decisões judiciais. Os advogados amam, e
os magistrados odeiam o art. 489, e a idéia deste artigo foi novamente a
eliminação do protagonismo judicial – que eles gostam muito de falar, e eu
estou usando exatamente as palavras daqueles que defendem o Código –, a
eliminação de decisões-surpresa dentro dos processos. Então, a ideia é a
eliminação efetivamente de alguns problemas que temos hoje, estabelecendo-
se, no art. 489, requisitos para que uma decisão seja fundamentada com
detalhes. Temos o art. 489 e temos os artigos 926 e 927, que são os artigos
da vinculação da decisão judicial a precedentes.
Em relação ao art. 489, temos ouvido falar que não temos
mais livre convencimento judicial, que os magistrados não são mais livres para
decidir. Eu ouvi isso, eu escuto isso. Eu digo que livre convencimento judicial
motivado – eu acho que existe uma distorção de quando falam disso – não
vamos eliminar nunca. Evidentemente que o Juiz vai ser livre para decidir, só
que é obvio que o Juiz é livre, mas tem que decidir de acordo, primeiro, com a
prova dos autos. Eu canso de fazer REsp por violação ao art. 131 e consigo
provimento. Então, isso já existe. Segundo, é obvio que o Juiz é livre, só que o
seu limite é a Constituição Federal. Ele não tem como ir além da Constituição,
dizer diferente da Constituição. Isso nós não vamos eliminar.
E aqui há um detalhe. A própria Constituição Federal
possibilita, muitas vezes, duas respostas, a partir do próprio texto
constitucional, e muitos falam em resposta adequada à Constituição. Então,
uma resposta adequada à Constituição nós podemos ter. Têm princípios
constitucionais que muitas vezes, no caso concreto, entram em choque. Têm
direitos que entram em choque, que o Juiz vai para um lado, e aqui não é
eliminado esse livre convencimento, não tem como eliminar o livre
convencimento. Quando eu falo em livre convencimento, obviamente livre
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convencimento motivado, uma decisão judicial vinculada, eu falo em
Constituição Federal, porque muitas vezes a legislação infraconstitucional tem
problemas. Se ela tem problemas, vamos à Constituição, por isso que eu falo
dessa vinculação à Constituição, que é a nossa lei maior. Evidentemente essa
vinculação existe, sempre existiu. Na verdade, o problema que existe de que
acabou o livre convencimento, que eu vejo, é o livre convencimento sem
motivação, este sim.
Então, enxergamos abusos. Tenho exemplos na Justiça do
Trabalho, onde isso acontece muito. Tem Juiz do Trabalho que diz que não
existe prescrição, e a prescrição está na Constituição. Isso o Novo Código
elimina, mas não tem como ir contra o que está na Constituição Federal. Na
verdade, o que o Novo Código coloca – eu vejo dessa forma – é o motivo de
acordo com a prova dos autos e que tem um limite, e o limite é a Constituição.
Isso não tem como eliminar. A questão é o livre convencimento sem
motivação nenhuma, daí é um ativismo, é invenção. É invenção dizer que
prescrição não existe, e é isso que se procura eliminar, esse livre
convencimento sem razão nenhuma, um livre convencimento que viola até a
Constituição, mas o livre convencimento motivado, de acordo com as normas
constitucionais, não vai mudar, não tem como.
Quando se fala desse assunto, vem, geralmente, o nome do
Lenio Streck, que foi o pai desse bendito art. 489, que é contra o ativismo
judicial. O próprio Lenio, quando fala, fala dessa interpretação adequada à
Constituição Federal. Ele fala isso nos livros dele. Então, esse livre
convencimento sem fundamento nenhum, essa invenção, é que não pode. Eu
tenho vários amigos Juízes que dizem: “Eu já faço isso aqui que tem no art.
489”. Muitos fazem, é obvio. Eu tenho iniciais que eu contesto que eu fico
irritada com o que fazem, tem tanto pedido absurdo que eu fico indignada com
o advogado da outra parte. Se eu fosse Juíza, eu ia ficar furiosa de ter que
rebater aquele monte de itens do pedido.
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Dou um exemplo. Eu não trabalho com massa, mas teve uma
ocasião em que eu fui surpreendida com o ajuizamento de trezentas
revisionais de contrato de loteamento contra um cliente meu que era
proprietário de loteamentos, e o advogado fez, como matriz daquelas
trezentas revisionais, revisionais de contrato bancário, que não tinha nada a
ver. Eu me irritava de olhar aquilo, imagina um Juiz, ficaria irritadíssimo
também. Esse tipo de coisa não teria problema nenhum de fundamentar: “Os
pedidos a, b, c e d são todos improcedentes porque se referem à revisional de
contrato bancário”.
Então, parece-me que o Judiciário vai ter que balizar isso,
vamos ter que ter precedentes, orientações. Têm situações que me parece ser
possível uma fundamentação em bloco. Eu tenho um pedido x que tem o
mesmo fundamento e eu vou poder dizer: “Rejeito os pedidos, porque o
fundamento é esse”. Não há problema nenhum.
Esse caso que eu vi, que me irritou, dessas trezentas
revisionais, que foram todas julgadas improcedentes, o meu cliente teve um
prejuízo de quatro milhões por causa desses processos, todos com AJG.
Então, na verdade, é possível, parece-me, essa fundamentação de que temos
que fundamentar, mas fundamentação que seja relevante para a procedência
do pedido. O artigo diz isso. Então, o que é irrelevante, em tese, ficaria até
descartado, ficaria excluído. Não me parece tão assustador assim esse art.
489, e têm muitos Juízes que já o aplicam, e me parece que é possível,
principalmente nessas ações com esses pedidos absurdos, essa
fundamentação em bloco, fundamentação com a mesma argumentação.
Na verdade, a jurisprudência vai acabar indo nessa linha, e
vocês, que decidem, é que vão acabar formando isso aqui e vão ter que lutar
por isso, mas não me parece o horror que muitos estão pregando. Então, o
livre convencimento não acabou, muitos daqueles que examinam processo já
fazem isso, e essas fundamentações em bloco me parece que têm que ser
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possíveis. Se a fundamentação é a mesma para todos os itens do pedido, não
vejo problema nenhum com relação a essa questão também.
No tocante a súmulas, vinculação a súmulas, via de regra,
quando eu falo para advogados, eles não concordam com relação à aplicação
de súmulas, principalmente em casos repetitivos, ação de massa. O que eu
digo em relação a isso? Com relação a elas, parece-me que existe uma
vinculação muito forte a precedentes que temos nos artigos 926, 927 e lá no
489, ou seja, se o magistrado não quiser aplicar a súmula, o.k., mas ele tem
que dizer que os casos que ensejaram a súmula não se enquadram naquele
caso específico. Ou, se ele efetivamente quiser aplicar a súmula, ele tem que
dizer: “Olha, se aplica por essa razão aqui”. Então, ele tem que fazer o devido
distinguishing, que estão comentando, para ver o que aplica. Nos meus
processos, eu faço o distinguishing desde que eu advogo, então eu sempre fiz
isso: “Se aplica, tem aqui o caso, é o caso”.
Com relação à aplicação de súmula e julgamentos em casos
repetitivos, me parece que não adianta lutar contra uma súmula sozinho,
decidindo contra: “O STJ diz dessa forma, só que eu não concordo com o STJ,
a minha ideia é essa”. E o Ministro Carlos Veloso, que foi Presidente do
Supremo Tribunal Federal, deu uma entrevista e disse: “São decisões por pura
vaidade, que não vão a lugar nenhum”, porque, se tem súmula, se tem
decisão em caso repetitivo, vai prevalecer a decisão no caso repetitivo, vai
prevalecer a decisão da súmula. Na verdade, aquela decisão isolada não vai
mudar toda a posição de uma Corte Superior, essa decisão isolada só acaba
gerando mais recurso, esse é o problema. Então, parece-me razoável a
vinculação, mas a maioria dos advogados é contra e dizem: “O Judiciário tem
que respirar, precisamos de novas interpretações. Precisamos renovar, então
não podemos ter essa força toda”. Nenhum Judiciário respira com esse
número de ação, não vai ser em uma decisão judicial isolada. Se querem que
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haja uma renovação, que introduzam outros mecanismos, mas não é esse o
mecanismo, não é decidindo de forma diferente.
Então, no caso de precedentes e no caso de repetitivos –
repetitivos também têm a vinculação – existe a vinculação e me parece
razoável, porque não vai ser o Juiz de 1º Grau, não vai ser o Desembargador
que vai mudar a posição de uma Corte Superior. Na verdade, essas
modificações exigem outros mecanismos, a movimentação tem que ser em
outro sentido, porque só acaba gerando isoladamente mais recursos.
Lamento. A súmula pode me prejudicar? Pode, mas vou fazer o quê? Não vou
mudar, não tem como. Então, na verdade, eu acho interessante a vinculação,
contrariando o que a maioria dos advogados dizem também com relação a
isso, mas infelizmente é dessa forma, temos que nos adaptar aos novos
tempos com relação a essa questão.
Isso com relação ao art. 489, que eu não poderia deixar de
falar, porque eu escuto falar tanto deste artigo, acho que é distorcido o que
alguns dizem e desconfio que até o próprio Lenio Streck duvide que dentro da
Constituição tu não possas ter mais que uma interpretação. Tu podes ter, sem
dúvida alguma, dentro do texto constitucional. O que se busca aqui é que se
fundamente. Se o Juiz quer decidir de determinada forma, o Juiz criativo tem
muito mais trabalho, a criação dá trabalho, mas evidentemente continuaremos
tendo criação, porque, se não admitirmos a criação, vamos voltar para um
positivismo puro, que é justamente o que se critica. Fala-se que o modelo
positivista é inadequado na nossa realidade contemporânea, porque a
legislação não consegue acompanhar os avanços sociais. Então, obviamente
que a interpretação existe, só que a questão é qual é a melhor interpretação.
Na verdade é isso, e eu digo: melhor interpretação e também interpretação
adequada ao texto constitucional, a Constituição é o limite, eu vejo dessa
forma. Não temos como conviver dentro de um modelo puramente positivista –
isso é impossível –, precisamos de interpretação – e são os magistrados que
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interpretam a legislação –, precisamos dos magistrados e não temos como
amarrá-los dizendo: “Agora vocês viraram máquinas, agora vocês viraram
computadores”. Não temos como transformar a decisão judicial em um
programa de computador, isso não existe, e Novo Código não diz isso em
momento algum. Na verdade, ele só exige que o magistrado decline as razões
e acabe não decidindo da forma como eu mencionei para vocês, como esses
Juízes do Trabalho, que negam vigência à Constituição, porque aí acabam
dizendo qualquer coisa. E o Supremo Tribunal Federal também, porque temos
muitas decisões dizendo o que a Constituição não diz, temos exemplos no
STF nesse sentido, e isso acaba gerando um perigo e comprometendo o
estado social e democrático de direito. Então, por isso essa ideia, essa
vinculação ao texto constitucional.
Há ainda dois últimos tópicos – daí eu já encerro para as
perguntas – do Novo Código, que me parecem importantes.
Eliminamos do Novo Código o rito ordinário e o rito sumário e
criamos um procedimento único, um procedimento comum, que é um misto
das normas do rito ordinário com o sumário, é uma mistura se vocês olharem.
Quem conhece bem o rito sumário e o rito ordinário vai ver as normas ali, é
um misto. Tentam também desformalizar, mas esse procedimento comum
introduz, no início do procedimento, uma audiência de tentativa de conciliação
e mediação, que, na minha opinião, é bastante válida, porque eu acho
importante a conciliação. Falo novamente como advogada e digo sempre que
a conciliação é tanto boa para o autor, quanto para o réu, elimina anos de
processo, elimina o desgaste de uma ação judicial, só que o Judiciário tem
que ter estrutura para isso, evidentemente que os Juízes não têm com fazer
tudo que é conciliação.
Aqui no Rio Grande do Sul já estão formando mediadores,
conciliadores, para que façam isso, só que não adianta introduzir uma
audiência de conciliação e mediação se quem vai presidir essa audiência não
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sabe conduzir. Já fiz inúmeras audiências na minha vida, e têm Juízes
maravilhosos com conciliação, têm Juízes muito bons nisso, mas tem uns que
não são bons na conciliação, tem Juiz que tenta, que tem paciência, porque
perde tempo, e ainda não é só uma audiência, são várias que poderão
ocorrer, e uma prolongando a outra; se não deu hoje, vamos tentar, vamos
continuar discutindo, então serão várias, talvez, audiências de conciliação.
Têm que ter paciência o conciliador e o mediador, terão que ter, sem dúvida
alguma, uma formação, tem toda uma técnica nessas conciliações, nessas
mediações, precisamos de pessoas preparadas.
O nosso Judiciário tem desenvolvido essa formação de
conciliadores e mediadores, mas no Brasil muitos não estão desenvolvendo
isso. Em Minas Gerais, teve um magistrado que disse: “No nosso Estado essa
audiência não vai acontecer, porque isso é impossível”. Ou seja, já estão
negando vigência ao Código. Então, se tivermos pessoas preparadas,
capacitadas, isso pode ser interessante, mas tem que ter formação, não é
qualquer um que pode fazer isso. Vejo isso na Magistratura, que efetivamente
têm alguns que são ótimos conciliadores e têm alguns que não são, não estão
nem preocupados com a conciliação. Então, deve haver aqui toda uma
formação, uma mudança de cultura no início do procedimento, que pode
auxiliar, sem dúvida alguma.
Por fim, ainda, outra novidade – isso que eu disse aqui:
princípio do contraditório, colaboração, fundamentação de decisão, disso a
academia fala há anos –, outro tópico que foi introduzido no Novo Código que
me parece o novo, o diferente – que eu não sei se vão aplicar também, eu
duvido, pelo menos quando já tem litígio instaurado –, que é o negócio jurídico
processual, artigos 190 e 191 do Novo Código. Isso me parece o novo.
As partes, no Novo Código de Processo, podem mudar o
procedimento, pactuar normas de procedimento diversas das que temos
previstas, estabelecendo um calendário processual. Podem negociar prazos,
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por exemplo. E tem um artigo do Novo Código que diz que até os prazos
peremptórios podem ser negociados, o que é diferente do que temos hoje.
Então, as partes podem estabelecer, por exemplo, um calendário processual:
“No nosso caso, o prazo da réplica não vai ser de 15 dias, mas vai ser de 30.
O prazo de recurso também, o prazo de recurso não vai ser de 15 dias, mas
vai ser de 30”. Então, por causa desse artigo que possibilita a negociação de
prazos peremptórios, é possível a negociação.
Parece-me possível a negociação de prova, a questão da
prova me parece uma das mais interessantes até de negociar. Eu negocio
quem vai ser o perito, negocio o prazo para quesitos, negocio o prazo para a
entrega de laudos por assistentes técnicos. É possível a negociação, o Código
não dá o limite para essa negociação. Será que é possível eu negociar: “As
partes abrem mão de o Juiz ter que ouvir as partes na questão de ordem
pública”? Será que pode negociar isso? Eu não vi ninguém falando disso, eles
só dizem que pode negociar, e já têm livros sobre isso.
Essa negociação não está sujeita à homologação do Juiz, o
Juiz não precisa concordar. Na verdade, haverá o controle das cláusulas que
poderão ser aplicadas ou não posteriormente. Então, estabelece o calendário,
vai seguindo o calendário, e esse controle desse calendário, do que for
negociado efetivamente, vai se dar durante a marcha do processo. O que eu
digo com relação a isso? Os livros e os artigos que já têm sobre isso – e esse
tema vem da Alemanha, da França, dos Estados Unidos, trouxeram de outros
países – dizem que as partes podem estabelecer o calendário naquela
audiência de conciliação e mediação, no início. Mas quando há litígio, não se
consegue fazer um acordo, vai ser muito difícil estabelecer um calendário
nessa audiência, porque depois que já houver o desencadeamento do
processo judicial, depois que já foi desencadeada a jurisdição, é muito difícil
que partes negociem calendário no início, quando há o contencioso.
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Onde me parece que isso possa ser interessante, que isso
possa acontecer? No âmbito extrajudicial, nos contratos, ou seja, eu firmo um
contrato, eu firmo um acordo extrajudicial. Como contém nos contratos, nós
não estabelecemos clausula de arbitragem? Então, podemos estabelecer um
rito, a criação de um rito, de uma marcha processual, no extrajudicial.
Aí tem um detalhe: essa negociação processual é possível
desde que uma das partes não seja vulnerável, hipossuficiente,
evidentemente, porque, se for vulnerável, não tem como, no caso de
vulnerabilidade, não é possível. Nos demais casos, sim.
Parece-me que no extrajudicial talvez seja a maior aplicação
prática disso, que é uma espécie de privatização da Justiça, nesses artigos
190 e 191. O resto dos artigos são teses acadêmicas, “recorta e cola” do
Código de 73.
Com isso, então, eu encerro, agradecendo mais uma vez a
atenção de todos vocês. Estou disponível para sanar eventuais dúvidas que
vocês tenham a respeito do Novo Código. Obrigada.
DES. NEY WIEDEMANN NETO – Correspondeu e superou as
expectativas a manifestação da Professora Dra. Jaqueline, a quem agradeço
muito.
Essa visão panorâmica, abrangente, no espaço de cerca de
uma hora e dez minutos, brindou-nos com reflexões críticas importantíssimas,
que me permitiram tomar uma série de notas valiosas para o nosso grupo de
estudos que se debruçará sobre esse tema.
Antes de colocar a palavra à disposição, permito-me alguns
breves comentários. A Profa. Jaqueline mantém viva a memória e dá
continuidade à obra do Prof. Ovídio, o que é extremamente importante e
gratificante, tendo, inclusive, publicado um livro póstumo. Foi póstumo, não é?
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DRA. JAQUELINE MIELKE – Foi o “A Epistemologia das
Ciências Culturais”, que ele terminou de escrever quando estava muito
doente, mas não deu tempo de publicar, e ele pediu para que eu
providenciasse a publicação do livro, mas foi ele que terminou.
DES. NEY WIEDEMANN NETO – Foi uma publicação post
mortem, embora o Prof. Ovídio tivesse finalizado o livro.
Eu tive a felicidade, o privilégio, na graduação da UFRGS, em
todos os semestres de Processo Civil, de ter sido aluno do Prof. Ovídio.
Depois eu ainda fiz uma pós-graduação em Processo Civil na PUC, no ano de
1989, e o Prof. Ovídio, naquela época, com os Professores Fábio Gomes e
Sérgio Roberto Porto, lecionava na PUC. Naquela ocasião ainda tive também
esse privilégio.
Não obstante, também tive outro privilégio de ter trabalhado
com o Prof. Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, aqui no Tribunal, na 6ª Câmara
Cível, quando ele integrava a Câmara, embora sabíamos que o Prof. Carlos
Alberto e o Prof. Ovídio tinham posicionamentos opostos em muitas questões
importantes, que hoje estão se materializando no Código. Às vezes, os
Códigos tardiamente consagram algumas ideias, e ambos já faleceram. Talvez
o Prof. Ovídio, se vivo fosse, ficasse muito chocado com esse Novo Código,
que colide com muitos princípios e fundamentos que ele defendia.
Eu queria fazer aqui uma breve anotação. Eu recebi esses
números do Min. Paulo de Tarso Sanseverino – uma curiosidade para a Profa.
Jaqueline –, eu encontrei o Ministro em um congresso, e ele me deu esses
números redondos. O STJ recebe, em média, por ano, o número de recursos
especiais que sobem é de 300 mil, e ele disse que a média nacional de
negativa de seguimento de recursos dos Tribunais de Justiça e Tribunais
Regionais Federais é de 50%. Então, o Min. Paulo fez um comentário comigo
de que a lógica do Novo Código significa que, por ano, os recursos especiais
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subiriam de 300 mil para 600 mil, já que a média nacional de negativa é de
50%.
Ele ainda me deu mais um dado curioso – são números
redondos, a Dra. Maria Tereza Barbieri deve conhecer esses números no
detalhe –, de que o Rio Grande do Sul é diferente, que os filtros são mais
criteriosos e rigorosos. Ele disse que 20% dos recursos especiais sobem e
80% não sobem, que no Rio Grande do Sul, nós temos mais critério para essa
admissibilidade.
Também tenho a informação de que, como esses recursos
têm que ser digitalizados, segundo estou informado, a demora do nosso
Tribunal para a digitalização, para o envio ao STJ, tem sido em torno de um
ano, e se todos os recursos tiverem que subir, se não houver esse filtro, o
departamento do Tribunal que digitaliza vai ter que quintuplicar a sua carga de
trabalho, e demoraria no mínimo dois anos para que um recurso fosse enviado
ao STJ pela necessidade da digitalização. Se eu estou falando um dado
incorreto, eu pediria que a Dra. Maria Tereza Barbieri complementasse,
porque tenho números muito grosseiros.
Quero comentar também, Profa. Jaqueline, que é uma grande
preocupação nossa – a minha leitura é do 2º Grau, o grupo de estudos que eu
vou me envolver para as mudanças do Regimento Interno é todo focado no 2º
Grau de Jurisdição – essa questão de quando um julgamento em curso tem
dois a um, e nós teremos que chamar mais dois Desembargadores. Isso
realmente é muito preocupante. Nós não temos como chamar mais dois no
curso daquela sessão. Tudo indica que será suspenso o julgamento daquele
processo, prosseguirá na sessão seguinte, com mais dois Colegas.
E o próprio Código prevê a possibilidade da renovação da
sustentação oral para que aqueles outros dois que serão convocados para
prosseguir também sejam brindados e agraciados com a sustentação oral
daqueles advogados que já haviam sustentado anteriormente para aqueles
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três. Às vezes, em razão das sustentações orais, os nossos julgamentos se
arrastam por horas, têm sessões de julgamentos que terminam à noite por
causa das sustentações orais. Imagina elas sendo renovadas, isso realmente
é um problema. Ainda no caso do nosso Tribunal, Profa. Jaqueline, a
composição atual é de quatro Desembargadores por Câmara, não cinco, com
a exceção de três Câmaras: a 23ª, a 24ª e a 25ª, e sempre tem um
Desembargador em licença prêmio, um Desembargador em férias, um
Desembargador doente, ou cargos vagos por remoção, por aposentadoria.
Teremos que convocar Desembargadores até mesmo de outras Câmaras para
compor, até que, no futuro, o Tribunal possa prover e nomear o quinto
membro para cada Câmara, mas mesmo assim haverá inúmeras dificuldades
quanto a isso.
Também essa questão da conciliação e da mediação, quer me
parecer que o Tribunal terá que se aparelhar com recursos humanos, o
Tribunal terá que ter funcionários capacitados e remunerados para essa etapa
inicial do processo, o que vai ter consequências, inclusive, orçamentárias.
Em relação àquela questão da mudança de rito e de prazo,
que o processo pode dispor, que as partes podem dispor de uma maneira
diferente, que foi a sua última colocação, o nosso grupo de estudos também
se preocupa com o nosso processo eletrônico, que está em fase de
implantação. Os sistemas de informática estão sendo desenvolvidos para o
processo eletrônico, e muitas etapas são customizadas e automatizadas.
Imagina se nós temos que alterar o processo eletrônico porque em
determinado processo as partes compuseram totalmente diferente o rito e os
prazos. Isso vai demandar até uma janela de informática para que
programadores possam mudar procedimentos e prazos, porque as partes
transigiram, e isso vai interferir no processo eletrônico. Não sendo processo
eletrônico, isso tem mais facilidade de controle pelo Escrivão e pelo Juiz, mas
no processo eletrônico vai ser algo complicado.
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Por último, um aspecto que talvez a Profa. Jaqueline não
tenha comentado, mas é, para nós, importante, que é a questão da avocação,
avocatória. Não é bem esse o termo da avocatória, mas aquela questão de
quando começa a se formar uma matéria repetitiva no 1º Grau, e o Tribunal,
percebendo, pode avocar aquele assunto e julgar no Tribunal, criando uma
interpretação que vai impor ao 1º Grau uma solução padronizada para ações
de massa, sem que tenha havido ainda o devido processo crítico de reflexão
sobre alguma demanda repetitiva que começou a se formar no 1º Grau. Isso
também, pra nós, é algo estranho, algo inusitado, porque a lógica atual do
sistema é que o 1º Grau examina primeiro as ações repetitivas, faz o
julgamento, e o Tribunal acaba – às vezes até naquelas ações populares,
ações civil públicas, aquelas ações coletivas de consumo – dando uma
uniformização, mas tendo um tempo maior de reflexão, de maturação. Depois,
o próprio STJ, no art. 543-C dos recursos repetitivos, dá a padronização final.
Isso aqui, para nós, é algo muito estranho, porque poderíamos atropelar o 1º
Grau.
Estas são essas considerações iniciais que eu queria colocar
para a Profa. Jaqueline, se tiver algum comentário sobre isso. Depois,
colocaremos a palavra à disposição.
DRA. JAQUELINE MIELKE – Com relação aos repetitivos, os
números que o Ministro te deu, eu pensei que fossem até maiores do que isso,
eu pensei que o que chegaria lá, com a abertura da porta, seriam muito mais
do que 600 mil, porque não dá pra fazer um cálculo linear disso, porque São
Paulo manda mais, São Paulo tem um número muito grande. Então, eu acho
que não é possível só dobrar pelos 50%, porque só São Paulo já deve ser
bem maior do que esse número aqui. Se eu fosse os Ministros, eu estaria
bastante preocupada com essa disposição.
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A questão que tu colocaste do processo eletrônico, com
relação ao negócio jurídico processual, é algo preocupante mesmo. O
processo eletrônico é feito para esse procedimento. Então, se mudar todo o
sistema, cria outro problema. Na verdade, é estranho eles não terem se
preocupado com isso, porque vemos no Código a positivação de muitos
procedimentos da Justiça Federal, e já temos o processo eletrônico há muito
tempo, e funciona de forma diferente a Justiça Federal, ela é diferente das
Justiças Estaduais. Então, foi uma preocupação que eles não tiveram e que é
pertinente com relação ao processo eletrônico.
No processo em papel, em tese, não teria o mesmo problema,
mas as Justiças Estaduais um dia chegarão ao nível da Federal também, um
dia vai ficar tudo eletrônico. Aí, como é que fica a negociação? Vão fazer um
programa específico para aquele negócio? Uma coisa estranha. Eu vou
contratar um programador para fazer um programa específico de um processo
eletrônico diferente? Então, parece-me interessante a preocupação que
efetivamente tu tiveste com relação a isso, com relação a essa adequação ao
eletrônico.
DES. NEY WIEDEMANN NETO – Teria algum comentário
sobre a avocatória ou não?
DRA. JAQUELINE MIELKE – Eu concordo contigo com
relação à avocatória. Realmente é um problema, mas a ideia é tentar resolver
o problema dos repetitivos também, é essa a ideia.
Eu sou uma grande crítica dos repetitivos, eu acho um horror
aquilo, os repetitivos são um festival de “recorta e cola”, ninguém lê processo,
o advogado não lê as petições, porque um recorta e cola do outro, aí o réu
contesta, só recorta e cola, as sentenças são todas iguais. Então, parece-me
que tem que ter esse tipo de mecanismo. Tudo que é mecanismo para reprimir
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repetitivo, para tentar adequar, eu sou a favor, porque é um caos, é terrível.
Para o advogado que trabalha com isso, é horrível; para o Juiz que trabalha
com isso, é terrível também; para o assessor que fica lá tendo que recortar e
colar decisão, também é horrível. Então, esses mecanismos me parecem
razoáveis.
DES. NEY WIEDEMANN NETO – Vamos, então, colocar a
palavra à disposição. A Dra. Maria Tereza vai contribuir.
DRA. MARIA TEREZA BARBIERI – Inicialmente, gostaria de
parabenizar o Des. Ney pela iniciativa, convite, retomando o Projeto
Horizontes do Conhecimento, um tema tão fundamental, vital para todos nós
operadores do Direito. Gostaria também de saudá-la pela brilhante exposição,
pelas suas reflexões, estudo em tão pouco tempo, vamos dizer assim, a partir
do Novo Código de Processo Civil, reflexões, análise percuciente que
compartilha conosco e assim também nos motiva e incentiva a prosseguirmos
no estudo, sempre aperfeiçoando, porque é o nosso dia a dia, o nosso
trabalho, o nosso dever de buscar sempre esse aprofundamento. Contamos
com a sua presença e participação em muitas outras oportunidades, com
certeza prosseguindo nesse estudo e nessas reflexões.
A partir da colocação do Des. Ney com relação aos nossos
recursos especiais e extraordinários, peço que toda a equipe da Assessoria
aqui presente me auxilie se faltarem alguma observação. Efetivamente, no
ano passado, o nosso relatório apontou que foram analisados
aproximadamente 120 mil recursos especiais e extraordinários no Estado do
Rio Grande do Sul. Em torno de 80% ou mais são recursos que têm
seguimento negado, denegado o próprio recurso em virtude de estar
enquadrado em paradigma na repercussão geral ou dos recursos repetitivos.
Com isso, o número que ascende às Cortes superiores é bem inferior, uma
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vez que, sendo denegado o recurso, porque se enquadra nos recursos
repetitivos, nos paradigmas da repercussão geral ou dos recursos repetitivos,
rende agravo regimental, e a decisão é nossa, aqui do próprio Tribunal,
conforme assim estabelece o nosso Regimento Interno.
Os recursos que tem negado seguimento, enfim, possível
agravo, art. 544 do Código de Processo Civil, são esses que constituem a
grande maioria dos recursos que se encontram junto ao serviço de formação
do processo digital. E o prazo é em torno de seis meses – não de um ano –,
porque há carência – e aqui os colegas podem corroborar essa informação –,
tanto de pessoal quando de recursos. Atualmente acredito que são três ou
quatro servidores que têm a sua designação com fé pública para esses
processos.
Então, há grande massa de agravos, porque a parte
remanesce inconformada com a decisão de negativa de admissibilidade do
seu recurso. Eles são digitalizados, são indexados, validados e certificados, ou
seja, todas as peças são identificadas e indexadas, e o Senhor Ministro-
Relator, após distribuído esse recurso digitalizado, via eletrônica, tem todas as
peças indexadas, desde a inicial, contestação, sentença, recursos e acórdão.
Enfim, é esse o trabalho que se faz, sempre com grande
esforço, e posso assegurar, com orgulho, que aqui no Estado do Rio Grande
do Sul o índice de erro é inferior a 0,00, alguma coisa assim, comparando,
então, com todo o restante dos recursos que são digitalizados no País.
Também gostaria de ressaltar que, em auxílio à prestação
jurisdicional e à efetividade, nós temos inserido no nosso planejamento
estratégico do Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul a gestão
estratégica das ações de massa. Esse é um trabalho que se faz aliado ao
Núcleo de Repercussão Geral e Recursos Repetitivos, instituído no Estado do
Rio Grande do Sul, no Poder Judiciário, no ano de 2012, a partir da Resolução
nº 160 do CNJ. Com isso, todas as demandas de massa têm um tratamento
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diferenciado; os recursos, com adesão dos colegas da jurisdição, ficam
suspensos, aguardando, então, a decisão na ação coletiva ou na ação civil
pública ou também, simultaneamente, ao recurso especial paradigmático.
Esse é o trabalho que se faz, antes mesmo do que já agora institui o Novo
Código de Processo Civil, é a prática que vamos aperfeiçoando.
Então, são esses os esclarecimentos, a partir da colocação do
Des. Ney, que penso pertinentes, convidando a todos, a partir dessas
reflexões, junto com a Profa. Dra. Jaqueline, a prosseguir nesses estudos e
reflexões sobre esse tema tão vital para todos nós operadores do Direito.
DES. NEY WIEDEMANN NETO – Muito obrigado.
Vamos às contribuições dos colegas.
PLATEIA – Estou fazendo pós-graduação na PUC do Novo
Código de Processo Civil, e, ouvindo a senhora falar – quando foi instituído o
Código de 73, que foi em 1º de janeiro, já em outubro foi feita uma nova lei
que acrescentou 94 novos artigos no Código de 73 –, a impressão que dá –
não sei se eu interpretei direito – é que esse nosso Novo Código, na verdade,
em termos práticos, já vai, ano que vem, sofrer alterações. Não sei se é isso.
DRA. JAQUELINE MIELKE – O que ocorre? O Código de 73,
quando entrou em vigor, já entrou em vigor com diversos artigos alterados.
Têm vários problemas esse Código atual, e um dos problemas que eu vejo é
essa questão da admissibilidade no REsp e no RExt, essa de tirar a
admissibilidade dos tribunais de origem. O que me parece? Isso aqui é uma
questão que afeta diretamente as Cortes superiores, se torna insustentável.
Então, eu acredito que possa haver um movimento muito forte para alterar
esse ponto específico, para voltar a ser como temos hoje. Eu digo que não se
deram conta quando efetivamente aprovaram dessa forma, parece que não se
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deram conta disso aqui, estão se dando conta agora. Então, acho, sim,
provável que tenhamos alterações. Talvez essa aqui seja uma delas, sem
dúvida alguma, pelos reflexos que vai trazer.
Não acredito que mude nada com relação ao contraditório,
acho que isso eles vão deixar, essa questão que tem que ouvir as partes
antes de o Juiz se pronunciar, até por questão de ordem pública, mas essa
questão específica, porque afeta as Cortes superiores, acho, sim, que
possamos ter alteração, como houve em 73; têm artigos que não entraram em
vigor. Então, acho que teremos alterações no curso deste ano e essa acho
que pode ser uma delas.
DES. NEY WIEDEMANN NETO – Nesse sentido, o próprio
Min. Paulo Sanseverino, quando tratamos desse assunto, me passou a
informação de que haveria um movimento do STJ postulando, no Congresso,
a alteração da lei antes de ela entrar em vigor. Já deve ter sido até
protocolado o anteprojeto de reforma do CPC. Talvez não tenha sido
divulgado, mas será apreciado exatamente por esse motivo da inviabilidade
prática.
DRA. JAQUELINE MIELKE – E em 73 aconteceu. Então, é
bem provável que ocorra. E esse é um ponto complicado, então, nesse ponto
específico, acho que haverá um movimento, mas é um exercício de
previsibilidade, porque é problemático isso aqui que colocaram.
PLATEIA – Uma dúvida, voltando ao início da palestra, em
relação às condições da ação, que agora não poderiam ser mais conhecidas
de ofício.
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DRA. JAQUELINE MIELKE – Não é isso. Elas podem ser
conhecidas de ofício, mas, antes de o magistrado conhecê-las de ofício, ele
tem que ouvir as partes. O Juiz apensou: “Acho que falta legitimação para
agir”. O Juiz se deu conta, o que ele tem que dizer? “Digam as partes sobre a
legitimidade ativa”. Pode ser de ofício, ele tem a iniciativa, só que ele tem que
ouvir antes.
PLATEIA – Mas o que eu quero chegar é assim: se for um
caso de um indeferimento de inicial, uma ilegitimidade ativa latente, o que o
Juiz vai ter que fazer?
DRA. JAQUELINE MIELKE – O que ocorre? O Código
excepcionou a improcedência liminar. A improcedência continua lá no art. 332,
ou seja, é possível a improcedência liminar do pedido sem a ouvida da outra
parte. Aí tu perguntas o indeferimento de uma petição inicial. Ora, se pode
julgar improcedente liminarmente o pedido, consequentemente deve-se
estender também para o indeferimento da liminar, parece-me, no início do
processo. Até porque, o que ocorre? Por que é possível a improcedência
liminar sem a ouvida da outra parte? Porque beneficia o réu. Então, na
verdade, o réu não tem prejuízo, e o indeferimento também me parece que
não vai implicar em prejuízo, nesse caso específico. Então, eu estenderia o
mesmo raciocínio que é feito para a improcedência liminar o art. 332 aqui.
Mas, digamos, aí chega no Tribunal, e o Tribunal: “É parte ilegítima” ou “Má
formação de litisconsórcio”, como têm situações em que há problema na
formação do litisconsórcio, litisconsórcio ativo com problema. Não dá
simplesmente para se pronunciar sem ouvir a parte.
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PKATEIA – E agora uma pergunta com um enfoque diferente.
De uma forma objetiva, a senhora acha que esse Novo CPC era necessário
mesmo ou não? Vai trazer grandes alterações?
DRA. JAQUELINE MIELKE – Eu sou bem cética quanto a
isso. Na verdade, um dos principais problemas que temos no processo é a
efetividade do processo, e eu nem cheguei a falar de execução, porque
execução é um mundo à parte. Sobre efetividade, não tem nada de novo aqui
praticamente. Se é para recortar e colar um Código velho, que fique com o
velho. O que ocorre? Que a gente não fique – eu diria – com discussões
novas de processo, porque vamos ter discussão de processo. Então, ficamos
em torno do marasmo do processo quando o mais importante não é o
processo, o mais importante é a realização do direito material da parte. Então,
parece-me que, se é para introduzir esse tipo de situação, era melhor ficar
como está.
Na verdade, tem todo um mercado por trás do Novo Código
de Processo. As pessoas escrevem livros, tem livro que não acaba mais que
escrevem sobre isso, aí têm palestras, cursos, tem um mercado atrás disso,
dessa questão de termos um Novo Código de Processo. Em linhas gerais, têm
pessoas que ganham muito dinheiro com o Novo Código de Processo.
Parece-me que não precisaríamos ter um código nesse modelo aqui, e eu digo
até que fundamentação de decisão judicial tem no art. 93, inc. IX, da
Constituição, tem um artigo da Constituição Federal que trata disso. Então, na
verdade, vamos discutir processo. Só isso. Eu digo: como é que eu vou dar o
bem da vida da parte, realizar o bem da vida? Não tem praticamente dentro do
Novo Código. Então, me parece que, se é para fazer dessa forma, é melhor
não fazer, sem dúvida alguma.
DES. NEY WIEDEMANN NETO – Mas está feito.
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DRA. JAQUELINE MIELKE – Está feito. Daí tem que extrair o
que tem de bom e o que tem de ruim. Na verdade, está feito, e nós não temos
alternativa.
PLATEIA – Em relação a procedimento, o Novo Código trata
algo sobre a transição de autos físicos para autos eletrônicos e
responsabilidade por essa transição?
DRA. JAQUELINE MIELKE – Não, não fala. E é um
problemão isso aqui na Justiça Federal, porque lá eles transformam os autos
físicos em eletrônicos e não avisam ninguém. Aí as partes são surpreendidas
com julgamentos e não sabem que tu tens que abrir o processo eletrônico – é
outro problema – para ver as intimações. Como a parte não sabe que foi
transformado, quando vê, os processos são julgados pelo TRF. Esta transição
é um problemão que temos: do físico para o eletrônico.
Na verdade, com relação ao eletrônico, eles colocaram
disposições que a jurisprudência já considera. Por exemplo: “Não se aplica o
prazo...” – 191 hoje, 229 amanhã – “...dobrado para litisconsortes para
diferentes procuradores no processo eletrônico”. Colocaram o artigo, mas
colocaram o artigo que a jurisprudência já pacificou lá no Federal com relação
a isso. Então, eles colocaram que já tem jurisprudência, mas essas questões
não, e é um problema.
Daí eu digo – eu não coloquei antes – que o Código novo já
nasce velho, porque a realidade é o processo eletrônico, e sobre processo
eletrônico não tem quase nada. O pouco que tem são essas conclusões de
acórdãos. O eletrônico é um mundo à parte, que praticamente não está
tratado no Novo Código. E a pergunta que tu fizeste é um problema que
temos, essa transição é um problema, porque eles não fizeram um Código
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voltado para o eletrônico, fizeram um Código ainda voltado para o papel, com
poucas referências ao eletrônico. Eles não conseguem imaginar muita coisa,
porque não estão no Foro todos os dias. Por isso que eles não imaginam. Aí o
que ocorre? Aí vêm os problemas. Então, pegaram jurisprudência, colocaram
a jurisprudência e não viram efetivamente essa questão, que é problemática,
mas é porque o Código não tratou praticamente dele.
PLATEIA – Eu gostaria de saber, na parte em que é possível
as partes convencionarem sobre os prazos peremptórios, se vai ser possível
elas, por exemplo, postularem o aumento dos prazos para recursos, por
exemplo.
DRA. JAQUELINE MIELKE – O Código não diz nada, só diz
que pode negociar, não diz como negociar. Tem um artigo que fala da
negociação dos prazos peremptórios, tem um dispositivo, tem artigos escritos
sobre isso, tem até um livro que saiu, de uma coletânea, que foi umas das
melhores coisas que eu li sobre o Novo Código, porque tem muita coisa ruim.
Eu estava comentando antes que, na verdade, são livros feitos só para a
venda que têm saído agora, porque é impossível comentar um Código em
dois, três meses. Isso não existe. É uma coletânea do Antônio de Passos, que
é bem interessante, são vários artigos, inclusive vários vindos do exterior,
vários artigos de autores estrangeiros sobre o tema, mas o Código não disse
nada.
O que tu podes pactuar? A questão que pode pactuar é que o
Judiciário vai acabar controlando isso. O que me parece? Qual é o limite que
existe aqui? Os princípios constitucionais para isso. O aumentar me parece,
em si, que não afetaria. Tu ampliarias a possibilidade do contraditório, da
ampla defesa. Tu poderias dizer: “Ah, não, mas, se eu aumento o prazo, isso
afeta o tempo de duração do processo”. Aí, de um lado, tu amplias o
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contraditório; do outro lado, tu aumentas o tempo de duração. Eu digo: não vai
ser tu aumentando um prazo de 15 para 20 dias que vai mudar o tempo do
processo, eu não vejo dessa forma. Não é o aumento de um prazo, que seja
mínimo, que vai fazer com que o processo leve mais tempo, têm outras
coisas, o processo demora por outras razões.
Então, me parece que aumento de prazo não haveria
problema nenhum, porque está mais do que assegurado o princípio do
contraditório, mas te digo que o Código não diz nada. Ele diz que pode
negociar. Aí o problema é: qual é o limite da negociação? Porque é muito
diferente falarmos, à luz do art. 73, que eu posso negociar prazo peremptório.
Eu levei um susto quando vi o artigo no Novo Código; tem um artigo – não
lembro agora o número dele – que diz que é possível, desde que as partes
ajustem isso. Então, na verdade, parece-me, dentro da tua pergunta
específica, que é possível, porque está assegurado o contraditório.
PLATEIA – Eu tenho uma pergunta quanto aos recursos. Pelo
que eu vi, por cima, o Código trata de uma maneira bem simplista que
despacho seria atacado por agravo e sentença por apelação, só que a gente
trabalha com falência e insolvência basicamente. Então, são sentenças
terminativas, e têm várias diligências no processo para cumprir em cartório.
Como ficaria essa questão? Uma sentença seria atacada por apelação mesmo
assim?
DRA. JAQUELINE MIELKE – O Código tenta eliminar de vez
esse problema. Qual é o problema que a gente tem hoje, que foi gerado a
partir de 2005? A partir de 2005, com a introdução do cumprimento de
sentença, o que tivemos? A sentença não necessariamente termina o
processo, porque o processo pode continuar com a execução. A partir da não
vinculação necessária, da definição de sentença à idéia de extinção do
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processo, ressuscitou uma tese velha do Prof. Ovídio, de que haveria
sentenças durante o processo, no curso do processo.
DES. NEY WIEDEMANN NETO – Sentenças parciais.
DRA. JAQUELINE MIELKE – Isso, as sentenças parciais e as
liminares.
Veio a tese das sentenças parciais – o Teori fala da tese, têm
julgados do Teori falando das sentenças parciais, vocês encontram o Marinoni
falando das sentenças parciais, a Teresa Arruda Alvim Wambier fala nas
sentenças parciais –, que não é de nenhum deles, mas do Ovídio, de 20, 30
anos atrás. Aí vem toda a discussão de qual é o recurso cabível, se fica
girando em torno daquela apelação por instrumento que inventaram. Então,
vem toda uma discussão se tem coisa julgada progressiva, se não tem coisa
julgada progressiva. Hoje se discute isso tudo.
O Novo Código liquida com isso aqui tudo. O que o Código fez
questão de dizer? E eles fizeram isso de propósito, para que não inventassem
mais. O Código, no art. 203, § 1º: “Sentença é o ato que encerra uma fase ou
extingue a execução”. Então, a sentença encerra a fase ou extingue a
execução. Tudo o que não extinguir fase, o que não extinguir execução, é
interlocutória. O Código diz e reforça isso no art. 356, que é a história das
parciais. O que o Código faz no art. 356? Hoje nós temos a tutela antecipada
da parcela incontroversa, o § 6º do art. 263, que a doutrina discute o que é
tutela antecipada da parcela incontroversa. É tutela antecipada ou é sentença
parcial? O que o Código faz? Ele introduz um julgamento parcial da lide
antecipada, porque, na verdde, tutela antecipada da parcela incontroversa é
muito mais julgamento parcial da lide antecipada do que tutela antecipada. O
que o Código diz com relação a isso? Ele diz julgamento parcial da lide
antecipada, para que não dissessem que é sentença parcial, para que não
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criassem a sentença parcial. Tem o § 3º e o § 5º, se eu não me engano, desse
art. 356, que dizem: “A decisão que antecipar a lide parcialmente é atacada
através do agravo de instrumento”. Ora, disseram isso para que não falassem
mais da apelação por instrumento, que efetivamente é considerada erro
grosseiro essa apelação por instrumento no Foro, mas diz expressamente que
é o agravo de istrumento no sentido de que, se é agravo de instrumento, é
interlocutória.
Então, qual foi a ideia aqui? O parágrafo diz o seguinte:
“Decisão proferida com base neste atrigo é impugnável por agravo de
instrumento”. Se é agravo de instrumento, é interlocutória, não é sentença
parcial. Então, na verdade, eles eliminam, eles tentam organizar isso aqui, ou
seja, se extinguir o processo ou uma fase do processo, é sentença. Tudo mais
o que houver no interior do processo, é interlocutória.
Em relação à tua pergunta com relação à falência, como tem
lei especial, se a legislação refere e nomina o provimento de determinada
forma, eu continuaria aplicando a lei especial, que é o que acabamos
visualizando efetivamente dentro da jurisprudência, mas, saindo da legislação
especial, que nós temos no Novo Código de Processo Civil, não deixa dúvida.
Eu digo que a tese que seria de sentença parcial, sentença liminar, isso não
existe mais, na minha opinião. O art. 356, § 5º, combinado com o art. 203, § 1º
e 2º, na minha opinião, são muito claros no sentido de que essa tese – e é
uma tese que processualista gosta muito – acabou. Não temos mais isso.
E nós trouxemos – ligando à tua pergunta, porque esse é um
tema bem interessante – ao Novo Código algo que hoje o STJ rechaça – e na
minha opinião está positivado aqui –, que é a coisa julgada progressiva. Coisa
julgada de capítulo de decisão. O art. 966, acho que o § 1º, que trata do
cabimento da rescisória, admite rescisória contra capítulo de sentença, e esse
art. 356, no § 3º, diz que transita em julgado essa decisão que julga
antecipadamente a lide parcial. Então, eles admitem coisa julgada de
12/06/2015
CENTRO DE ESTUDOS
FUNDAMENTOS DO NOVO CPC
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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
interlocutória, admitem coisa julgada de capítulo de uma sentença antes do
que outros. Isso aqui muda completamente – parece-me – competência para
ajuizar a rescisória. Se uma parte transita em julgado aqui, se outra parte
transita em julgado lá no STJ, nós vamos ajuizar duas rescisórias? É o que
parece, lendo isso que temos aqui, porque, na verdade, hoje, pela
jurisprudência do STJ, eles dizem que não tem coisa julgada progressiva. Eles
dizem isso, mas no STF há acórdãos dizendo que tem, há um acórdão, de
março de 2014, do Min. Marco Aurélio, dizendo que tem.
Então, o Novo Código adota a tese da coisa julgada
progressiva ao reconhecer que capítulos de uma sentença transitem em
julgado e ao reconhecer que essas interlocutórias de mérito possam transitar
em julgado, e me parece que isso vai mudar a jurisprudência quanto à
competência para processar e julgar a rescisória. Isso aqui muda.
DES. NEY WIEDEMANN NETO – Realmente a perguta foi
muito oportuna, porque essa palestra é sobre os fundamentos, mas nessas
perguntas vêm questões interessantíssimas, como esse aspecto que está
dando uma mudança de eixo no Brasil, dos capítulos da sentença e dos
trânsitos em julgado parciais, que muda até a contagem do prazo para a
rescisória e assim por diante. Mais um aspecto importante que essa pergunta
oportunizou.
Então, com isso, dou por encerrada esta reunião do Centro de
Estudos, mais uma vez agradecendo à Profa. Jaqueline.
(DEGRAVADO PELO DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA E
ESTENOTIPIA DO TJ/RS.)