estudo eco cult brasil
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Ministrio da Cultura / Fecamp
Projeto: Perspectivas da Economia da Cultura: um modelo de anlise
do caso brasileiro
rea: Indicadores para Poltica Cultural no Campo da Arte
Contempornea
Nota Tcnica
Coordenao: Mrcia Ferran
Colaboradores: Ana Letcia Fialho, Ilana Goldstein e Raquel Garbelotti
Campinas
Janeiro de 2012
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Sumrio
1. Introduo 4
2. Recortes sobre indicadores e polticas culturais 42.1 Poltica Cultural 5
3. Sistema, seus componentes e singularidades da recepo da Arte Contempornea 9
3.1 O Sistema da Arte Contempornea 9
3.2 O sistema de arte contempornea e o cenrio internacional 11
3.3 Especificidades do sistema de arte no Brasil 14
3.4 Fragilidade institucional e insero internacional 15
3.5 Valor da arte e economia da cultura 16
3.6 Arte Contempornea e seus Usos: Fatores exgenos ao campo especfico da arte:
polticas urbanas. Interrelaes entre: territrios e eventos nacionais e internacionais de arte
contempornea. 17
3.6.1 Os espaos discursivos da Arte e suas relaes com as cidades e suas economias 20
4. Economia(s) da cultura: pluralidade de economias decorrente dos diversos circuitos de
valorao e legitimao da Arte Contempornea 22
4.1 Recortes possveis 26
4.2 Espaos independentes e residncias artsticas 28
4.3 As produtoras 28
4.4 Mecanismos de financiamento para arte contempornea (editais, prmios-
residncia, prmios para produo, prmios para aquisio, etc.) 29
4.5 O mercado 29
4.6 Editoras que tm foco na arte contempornea 30
4.7 Curadores independentes 30
5. O Sistema da Arte Contempornea e sua Insero Internacional 30
6. Concluso 36
6.1 O Sistema da Arte Contempornea e seus Principais Agentes 39
6.1.1 Os artistas: base da cadeia produtiva 39
6.1.2 As instituies e espaos expositivos voltados arte contempornea 39
6.1.3 O terceiro agente, cerne das polticas pblicas de cultura: a sociedade,
comunidades, pblico-alvo 43
7. Bibliografia 447.1 Artigos de referncia sobre o tema, de autoria de Ana Letcia Fialho 44
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7.2 Bibliografia geral 45
7.3 Dissertaes e Teses - Lei Rouanet 49
7.4 Sites consultados 50
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1. Introduo
O presente documento tem a finalidade de apresentar algumas direes possveis para
a construo de metas e indicadores para Poltica Cultural em arte contempornea. Contm
notas terico-metodolgicas relativas ao campo da arte contempornea no Brasil, baseadas
em uma reviso bibliogrfica, bem como apontamentos de obstculos provveis e questes
em aberto que precisam ser exploradas em etapas subsequentes a este trabalho.
O foco, aqui, deslindar as instncias, os atores e as dimenses que devem ser
analisados a fim de estabelecer, futuramente, um modelo econmico que permita descrever o
funcionamento geral do setor de Arte Contempornea no Brasil, assim como o encadeamento
de suas sub-reas especficas (campo institucional, da formao, da produo, da crtica, do
mercado e mais recentemente os espaos de experincia/convivncia, como residncias e
ateliers) para reflexo e desenvolvimento de projetos e relaes). Ele se baseia tambm na
necessidade especfica de se compreender o campo subjetivo da Arte Contempornea e suas
conseqncias para a criao e ampliao de pblico como meta intrnseca ao papel do poder
pblico no setor cultural. Este estudo preliminar deve ser compreendido como um
instrumental que possa contribuir para a formulao de indicadores e subsequentemente para
o desenvolvimento de polticas pblicas para o setor.
2. Recortes sobre indicadores e polticas culturais
Schuster (2002) alerta que deve-se considerar que os indicadores e as estatsticas no
so neutros, dependem do contexto no qual so construdos e dos objetivos aos quais servem.
Alm disso, o simples fato de medir pode influenciar o que est sendo medido.
Transcrevemos parte do artigo de Rosimeri Carvalho da Silva na Revista Observatrio1
para nos balizar criticamente sobre pertinncia e obstculos para Indicadores.
Pfenniger (2004) afirma que indicador uma ferramenta desenhada baseada em
dados que do sentido e facilitam a compreenso da informao. Portanto, uma
primeira considerao importante deve chamar ateno para o fato de que indicadores
no so dados puros, estatsticas puras, mas dados processados a fim de dar sentido s
informaes obtidas nos levantamentos estatsticos ()
1 Indicadores culturais: reflexes para construo de um modelo brasileiro. In: Revista Observatrio Ita Cultural /
OIC - n. 4, (jan./mar. 2008). So Paulo, SP: Ita Cultural, 2008. p. 44-58.
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Van Bellen (2005, p. 41), discutindo indicadores de sustentabilidade, afirma que as
definies mais comuns e a terminologia associada a essa rea so particularmente
confusas. O autor aborda a perspectiva de diversos autores para a definio de
indicador tal como a de Chevalier, para quem um indicador pode ser compreendido
como uma varivel que est relacionada hipoteticamente com outra varivel estudada,
que no pode ser diretamente observada. Assim, importante entendermos varivel,
que para o autor uma representao operacional de um atributo (qualidade,
caracterstica, propriedade) de um sistema. Ou seja, ela no o prprio atributo ou
atributo real mas uma representao (Van Bellen, 2005, p. 42) Ou seja, para Van
Bellen um indicador uma varivel que agrega informaes diversas dando sentido a
elas. Nesse sentido, pode-se observar na maioria das bases que tm sido chamadas de
bases de indicadores culturais no mundo que o que encontramos so dados a respeito
de algumas atividades culturais. Dados so medidas, ou observaes no caso de
dados qualitativos, dos valores da varivel em diferentes tempos, locais, populao ou
a sua combinao. Os dados so necessrios para a construo de indicadores, mas
um dado no em si um indicador.
2.1 Poltica Cultural
Num livro sobre a gnese da gesto pblica no mbito da cultura, Vincent Dubois
apressa-se em sublinhar os obstculos mais frequentes com que se deparam os candidatos aqualquer emprego da expresso "poltica cultural", pois
a anlise desta gnese revela, com efeito, que ao preo de uma "grande
transformao2"tomando de emprstimo a expresso de Karl Polanyique a cultura
se constituiu enquanto uma categoria de interveno pblica, e precisamente destas
condies particulares de sua emergncia que se originam as definies desta
categoria.3
O trao de objeto heterclito que se impe aos investigadores enfatizado por
Dubois, quando ele se dedica nesta obra a traar uma conjuntura histrica que emana, ao
mesmo tempo, da poltica central e dos interesses de agentes sociais extremamente
comprometidos que so os artistas. Vejamos a seguir de que maneira ele coloca esta "marca
de nascena":
2Optamos por traduzir o termo rvolution como transformao, pois deste modo que empregada na traduo
brasileira do livro aludido de Karl Polanyi A Grande Transformao as origens de nossa poca. Rio de Janeiro:Editora Campus, 1980.3
DUBOIS, Vincent. La politique culturelle: gense dune catgorie dintervention publique . Paris, Belin, 1999; p.10.
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O fato de a poltica cultural se estabilizar de uma forma fluida, sempre em busca de
definio, encontra assim uma primeira explicao: os problemas culturais foram
construdos, historicamente, por artistas e intelectuais contra o Estado sobre um modo
globalizante, e a instituio da cultura como categoria de Estado operou-se
reproduzindo o carter abundante e flutuante destas construes pr-existentes.4
Uma segunda explicao para a difcil definio de poltica cultural pblica seria a de
que as condies da tal transformao presidindo a constituio da cultura como categoria,
levam a:
eufemismos e esquivas que esmaecem as fronteiras desta categoria: dar forma a uma
tal poltica supe dar corpo, neste caso pr as formas, inscrever nas suas formas
mesmas a ausncia de uma definio vinculativa do campo cultural, e as garantias de
flexibilidade e adaptao inovao nas relaes com este espao social que se d
como lugar de um movimento perptuo.5
Philippe Urfalino6, retraando o que considera "a inveno da poltica cultural" no livro
de ttulo homnimo na Frana, alerta primeiro que uma emergente anlise das polticas
pblicas em cincia poltica fala antes das "polticas culturais" colocando a tnica sobre
programas setoriais. Ponto de vista semelhante no Brasil j era sustentado por Machado 7 que
considerava inadequado pressupor uma poltica cultural nica tal como o caso para uma
poltica econmica de comando centralizado; ao invs disto ele sustentava a existncia devrias polticas culturais.
Afirmando que foi com Malraux em 1959 e a sua poltica das Casas de Cultura que
nasceu uma poltica cultural, tal como conhecida e historiografada hoje, Urfalino explica que:
Neste livro, a noo de poltica cultural tem por referente um momento de
convergncia e de coerncia entre, por um lado, representaes do papel que o Estado
pode fazer desempenhar arte e a cultura em relao sociedade e, por outro lado, a
organizao de uma ao pblica.8
Admitindo que esta coerncia depende de uma outra coerncia sempre temporal
entre ao e idias na ao pblica, Urfalino situa o movimento de apreenso e rearranjo
intelectual e prtico deste equilbrio como a prpria problematizao de cada perodo de
"poltica cultural". Nestes termos a poltica cultural seria, por conseguinte, "objeto compsito
4Idem, p.13.5Ibid, p.15.
6URFALINO, P. Linvention de la Politique Culturelle. Paris: La Documentation Franaise, 1996. p.13.
7
Mario Brockmann MACHADO. Notas sobre a poltica cultural no Brasil. In: MICELI, Srgio (Org). Estado e culturano Brasil. So Paulo: Difel, 1984. p.55.8
URFALINO, P. Op. Cit, p.13.
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oriundo tanto da histria das idias e das representaes sociais quanto de uma histria do
Estado".9
De acordo com a mesma lgica, Urfalino situa tambm o esgotamento desta coerncia
na Frana, ou seja, o fim da possibilidade desta compreenso de poltica cultural no incio dosanos 1990. Este final seria conseqncia do esgotamento de um dos pilares fundadores desta
poltica, aquele relativo idia central de oposio entre, por um lado, a poltica cultural como
um projeto social, esttico e reformador e, por outro lado, a idia de instituio.
Num texto mais recente, Dubois e Urfalino10 sublinham, alm disso, que uma diferena
importante que sucede ao fim da poltica cultural na Frana tem a ver com um cert o vazio,
que substituiu os desafios que anteriormente a sociedade exigia da ao do Estado frente a
arte.
No Brasil a formatao institucional federal da rea cultural teve seus grandes
momentos vinculados a governos totalitrios e, no seu contedo, esteve muito atrelada
viso do Brasil enquanto pas em fase de desenvolvimento, de frgil identidade nacional e,
conseqentemente, num estado de coisas onde a poltica cultural encontrava sua maior
legitimao enquanto asseguradora do patrimnio legitimamente brasileiro em detrimento da
produo mais especificamente artstica, temida pelo seu potencial contestador.
No Brasil da dcada de 1950, dcada que viu a criao do Ministrio dos AssuntosCulturais na Frana, alguns direcionamentos influiriam no perfil especfico da poltica cultural
brasileira. Assim Botelho cita que:
No Iseb Instituto de Estudos Brasileiros (1955) formulou-se a ideologia do nacional-
desenvolvimentismo, proposta nacionalista que v como sada para os impasses do
desenvolvimento nacional a participao do Estado na economia. A industrializao
seria a possibilidade de superao do subdesenvolvimento. Nesses casos, geralmente,
a poltica para o setor cultural definida a partir de um conceito antropolgico de
cultura, diretamente ligada noo de desenvolvimento global do pas, diferente de
uma poltica para as artes, tal como se v nos Estados Unidos ou na Gr -Bretanha,
por exemplo.11
Em 1982, Mrio Machado, ento dirigente cultural do MEC Ministrio da Educao e
da Cultura , expe os limites do emprego da expresso poltica cultural segundo os
9URFALINO, P. Op.Cit, p.14.
10Vincent DUBOIS et Philippe URFALINO. LEpope culturelle en sdiments. In: Culture Publique. Opus1.
limagination au pouvoir. Paris: Skite-Sens&Tonka, 2004. p. 67-84.11BOTELHO, Isaura. Romance de formao: FUNARTE e Poltica cultural, 1976-1990. Rio de Janeiro: Edies Casa de
Rui Barbosa, 2000. nota 15, p.55.
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parmetros de toda poltica pblica: comando centralizado, metas definidas e aferio de
resultados. A respeito das dificuldades brasileiras inerentes ao campo da poltica cultural,
temos uma explicao por ocasio do seminrio Estado e Cultura em 1982:
o fato de inexistirem diretrizes claras sobre os limites da interveno do Estado na rea
cultural, o fato de inexistir uma ideologia, democraticamente aceitvel, que possa
legitimar e orientar essas aes, o que provoca, em muitos casos, ou um confronto
aberto de posies radicalmente antagnicas levando paralisia decisria, ou a uma
certa tendncia a evitar projetos mais ousados e a privilegiar um grande nmero de
pequenas aes, que se no ajudam muito o desenvolvimento cultural, tambm no
prejudicam demais...12
Cientes de todas as precaues das quais aqueles autores alertam-nos e cujos assuntos
(polissemia e carter compsito da palavra "cultura", as sutilezas das ideologias) merecem
consagrar estudos inteiros, decidimos empregar aqui uma definio antes operacional de
poltica cultural, convencidos que desta maneira que invocada pelos atores com quem
entramos em contacto.
Esclareamos esta noo antes operacional de "poltica cultural" que empregaremos:
A poltica cultural pode definir-se como uma viso estratgica do papel do Estado no
campo do cultural de uma sociedade inserida no mundo globalizado, traduzida em
planos de aes gerais e especficas para os diversos segmentos culturais, das
populaes, geogrficos.
Isto dito, uma discusso sobre esta temtica stricto sensu deveria levar em conta o
fenmeno especfico pelo qual a poltica apropria-se do "cultural" simultaneamente
abrangendo-o de novos sentidos. Este fenmeno est ligado aos aspectos ideolgicos
intensificados no caso da cultura, mas tambm presentes em outras polticas pblicas. Com
efeito, a noo de cultura, por demasiado flexvel, torna-se facilmente instrumentalizvel
conforme Hannah Arendt
13
j sublinhou, a propsito da aproximao entre o poltico e oartista, no ensaio "A crise da cultura".
12
Citado por DURAND, Jos Carlos. Poltica e gesto cultural: Brasil, USA e Europa. So Paulo: EAESP-FGV, 2000.Relatrio de pesquisa n. 13/2000. p.15.13
ARENDT, Hannah. La crise de la culture. Paris: Gallimard, 1972.
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3. Sistema, seus componentes e singularidades da recepo da Arte
Contempornea
3.1 O Sistema da Arte Contempornea
Segundo Anne Cauquelin (2005), a arte moderna, que emergiu no final do sculo XIX e
incio do XX, era marcada pelo desejo de novidades formais e pela recusa aos cnones e regras
do passado. Por isso mesmo, a arte moderna levou crise das rgidas Academias de Belas-
Artes. Ao longo do sculo XX, a arte, liberta da Academia, passou a ser vista como um produto
a ser consumido e o status dos artistas passou a depender do reconhecimento dos
consumidores, da visibilidade adquirida nos museus e galerias e do julgamento proferido pela
crtica especializada. Instaurou-se, assim, o que Cauquelin chama de Sistema da Arte,composto por uma diversidade de atores: galeristas, marchands, crticos, curadores,
colecionadores, conservadores, espaos expositivos e instituies museolgicas, alm dos
prprios artistas. A todos esses, vieram somar-se mais recentemente, na era das novas
tecnologias, os profissionais da comunicao e da informao, e, no caso especfico do Brasil,
as produtoras, agentes fundamentais do sistema.
Raymonde Moulin (1992), que formou com Pierre Bourdieu o eminente grupo de
pesquisa que tornou a sociologia da arte um dos principais instrumentos para as polticaspblicas de cultura na Frana, se dedicou ao estudo do sistema das artes, e de seus trs pilares
fundamentais: o artista, a instituio e o mercado. Moulin aponta para a forte
interdependncia existente entre as diferentes instncias, apesar de uma suposta autonomia
ser frequentemente reivindicada pelos seus agentes.
Hoje, quando falamos em arte contempornea, estamos nos referindo a uma
produo cronologicamente situada da segunda metade do sculo XX at hoje, pautada por
rupturas muitas vezes mais radicais do que aquelas propostas pela arte moderna
questionamentos ticos, polticos e at a imploso do prprio conceito de arte ou artista -,
mas acima de tudo, estamos mirando obras que tm grande circulao, ultrapassando
fronteiras territoriais e disciplinares.
Em sntese, arte contempornea essencialmente algo que se d num territrio
global e que se entende como linguagem internacional14.
14A exemplo da curadoria de Adriano Pedrosa no MAM de So Paulo no Panorama de Arte Brasileiro, que tinha
como pressuposto expor artistas nacionais que transitam e dialogam com outros contextos (internacionais),
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A curadora Kiki Mazuchelli em texto para a Revista Tatu descreve sua prpria
experincia, de ser uma brasileira baseada h dez anos em Londres e trabalhando em diversos
contextos. Em sua hiptese est neste trnsito o valor atual ou a economia das artes nesta
dcada.
Parto do pressuposto de que, justamente nesta dcada, houve uma expanso dos
fluxos, trocas e intercmbios no contexto da arte contempornea para regies alm do
eixo Europa-Estados Unidos, bem como sua intensificao nos pases onde j ocorriam,
o que ocasionou uma maior insero da arte brasileira no circuito internacional.
Internamente, no Brasil este foi tambm um perodo de acelerao de um processo
interno de expanso do campo da arte contempornea, em que se observou no
apenas o surgimento de novas galerias comerciais representando principalmente
artistas jovens , como tambm a ampliao regional do circuito, que passa a incluir
outros importantes centros urbanos alm de Rio de Janeiro e So Paulo. Embora sejam
o produto de diferentes conjunturas cuja anlise demandaria um ensaio mais extenso,
observamos nesses dois movimentos de intensificao de fluxos um processo de
descentralizao tanto no mbito externo, quanto interno.15
Conforme analisa tambm Roberto de Magalhes Veiga:
A arte contempornea parece ter se convertido numa linguagem universal, cujo
domnio revela-se um trunfo inestimvel num mundo extremamente competitivo.
Objetos e desempenhos sendo polissmicos, seu virtuosismo semitico (Canclini,
1999) permite-lhes ser tambm a materializao de todo um potencial altamente
positivo creditado atualidade e ao futuro. Enquanto discurso privilegiado sobre o
real, o controle/posse da produo artstica contempornea torna-se indispensvel na
construo de imagens no processo de elaborao/reinveno de identidades
valorizadas ao extremo. Marcar as alteridades, as fronteiras, as hierarquias das
identidades relacionais torna-se uma funo cada dia mais notria sem prejuzo das
demais para a produo esttica contempornea.16
Levando a srio essa questo do fluxo e da circulao e, ao mesmo tempo, a noo de
Sistema de Arte, acima mencionadas, iremos trabalhar com os diversos atores que constituem
o campo dialgico de uma arte contempornea internacional, ainda que produzida em
provocando o alargamento do pensamento sobre territrio, nacionalidades e identidades, sem com isto tratardestes temas como pressupostos a priori, mas pelo dilogo esttico das obras.15 MAZUCHELLI, Kiki. LADO B| NO SEJA MARGINAL, NO SEJA HERI: a arte brasileira no exterior em tempos demobilidade acelerada. Revista Tatu. Disponvel em:http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBqc_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-
marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-demobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br. Acesso em 15/10/20011.16
Roberto de Magalhes Veiga
http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBqc_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-demobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=brhttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBqc_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-demobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=brhttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBqc_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-demobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=brhttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBqc_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-demobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=brhttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBqc_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-demobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=brhttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBqc_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-demobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=brhttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBqc_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-demobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br -
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territrio brasileiro. Nesse contexto, dimenses como visibilidade, circulao, comercializao,
parcerias e itinerncias revelam-se fundamentais na anlise da produo artstica
contempornea e de seu impacto econmico. Num contexto onde as instituies no so o
pilar mais forte e estvel do sistema, como o caso brasileiro, a instncia que vem assumindo
um papel cada vez mais importante como propulsora desses processos o mercado. Em
contraponto, a atuao de espaos independentes e residncias artsticas se multiplicam e
contribuem para a construo de redes dinmicas que escapam da lgica comercial e da
morosidade institucional. Importante, portanto, estabelecer indicadores para cada uma das
instncias, pois embora interdependentes, cada qual possui dinmicas prprias e interferem
diferentemente no funcionamento do sistema.
3.2 O sistema de arte contempornea e o cenrio internacional
Para melhor compreender a insero da arte contempornea brasileira no cenrio
internacional, e assim melhor direcionar as polticas pblicas nessa rea, necessrio
considerar as determinantes de uma mudana do mapa mundial das artes, observada a partir
dos anos 80.
Segundo Ana Letcia Fialho,
podemos identificar pelo menos duas fases bastante distintas no processo de expansodo mapa da arte contempornea em escala global: a primeira se situa entre o final dos
anos 1980 e o comeo dos anos 1990, quando ocorre uma renovao controlada da
oferta (MOULIN, 2000), com a expanso de fronteiras do mapa das artes a partir do
centro e com um foco na produo artstica; a segunda comea no final da dcada
de 1990 e ainda se encontra em curso, na qual observamos o incio de uma
descentralizao e da multiplicao dos circuitos de legitimao17.
A pesquisadora observa que, no final dos anos 1980, agentes da cena artstica
internacional, centralizada no eixo Europa Ocidental-Estados Unidos, comeam a integrar cada
vez mais artistas de regies perifricas em seus discursos e prticas.
Fora do eixo central, Bienais e outros eventos, assim como instituies de arte
contempornea comeam a se multiplicar, e agentes que atuavam em escala regional
passam a buscar visibilidade e insero internacional, pressionando as fronteiras at
ento bem delimitadas do mainstream internacional. Num contexto histrico mais
17
FIALHO, Ana Letcia. O Brasil est no mapa? Reflexes sobre a insero e a visibilidade do Brasil no mapainternacional das artes. Texto publicado em: FUNDAJ (org.), Depois do Muro, Fundao Joaquim Nabuco/EditoraMassagana, 2010.
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amplo, vive-se o fim da Guerra Fria, a globalizao econmica e a expanso da
internet, fenmenos que mudam de forma radical as noes de tempo, de distncia e
de fronteira. A intensidade e a velocidade com que pessoas, bens e informaes
passam a circular trazem oportunidades e desafios para regies que, at ento, no
tinham voz no debate internacional18.
Tal mudana no cenrio mundial est intrinsecamente relacionada s transformaes
de ordem geopoltica e a ascenso econmica de determinados pases como Brasil e China.
Para alguns autores, como Veiga19, a emergncia econmica da China remodelou a
engrenagem no cenrio mundial da arte contempornea, no entanto, embora esteja
movimentando um volume de negcios significativo, assumindo a 4a ou 6a posio mundial em
volume de negcios (dependendo do autor), o pas permanece pouco permevel produo
internacional e considerado um mercado eminentemente nacional e nacionalista, alm de
no diferir claramente o mercado de bens de luxo do mercado de arte, e ainda menos o
mercado de arte contempornea. Nesse sentido, diferencia-se significativamente do modelo
brasileiro.
O mercado de artes em economias emergentes tem chamado a ateno de
pesquisadores em diversos pases. Vale a pena ressaltar o projeto coordenado pelo
pesquisador holands Olav Velthuis, The Globalization of High Culture: How Markets for
Contemporary Art Develop in Brazil, Russia, India and China, da Universidade de Amsterd.
Velthuis justifica o interesse em analisar os quatro pases da seguinte maneira:
eles so as 4 maiores economias emergentes e que apresentam crescimento mais
rpido, neles, o nmero de galerias e marchands esto entre os maiores do mercado
no-ocidental, o campo das artes nesses pases est em expanso desde os anos 90,
os artistas originrios desses pases esto atraindo a ateno das instituies
ocidentais.20
Velthuis, autor de importante livro a respeito da formao do valor da arte
contempornea21, esteve pela primeira vez no Brasil em 2010, e nada conhecia do sistema das
artes brasileiro, mas dever coordenar o grupo de pesquisa que ter o Brasil como objeto de
anlise.
18Idem.
19
20
Ver:http://www.aissr.uva.nl/dynamics/projects.cfm/58799F11-37CA-4630-BED1C40DA676AB0B, ltima consultaem 10/12/2011.21
Velthuis, Olav. Talking prices
http://www.aissr.uva.nl/dynamics/projects.cfm/58799F11-37CA-4630-BED1C40DA676AB0Bhttp://www.aissr.uva.nl/dynamics/projects.cfm/58799F11-37CA-4630-BED1C40DA676AB0Bhttp://www.aissr.uva.nl/dynamics/projects.cfm/58799F11-37CA-4630-BED1C40DA676AB0Bhttp://www.aissr.uva.nl/dynamics/projects.cfm/58799F11-37CA-4630-BED1C40DA676AB0B -
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Mas o Brasil s lograr participar como player importante no cenrio internacional, no
mbito da arte contempornea, se houver o fortalecimento do sistema das artes como um
todo, o que passa necessariamente por um mapeamento e diagnstico do setor, realizao de
estudos aprofundados de toda a cadeia produtiva, a implementao de polticas pblicas
coerentes e de longo prazo. Pouco eficientes so as iniciativas isoladas, fragmentadas, por
vezes redundantes e quase que na totalidade dos casos, sem continuidade, como observadas
recentemente na esfera pblica.
Sem uma estratgia de insero internacional, o Brasil corre o risco de manter-se
numa posio de desvantagem no plano internacional. Mazuchelli, referindo-se Inglaterra,
um dos centros da arte contempornea no cenrio internacional, aponta que se por um lado
artistas brasileiros tm circulado cada vez mais, por outro lado, as linhas curatoriais ainda
resvalam em clichs e a preferncia dada a nomes j consagrados:
a partir de meados dos anos 2000, quando o Brasil se torna o foco da mdia
internacional, com uma economia estvel e em expanso (tendo quitado a dvida com
o FMI um ano antes do previsto, em 2005), que a arte contempornea brasileira
adquire uma representatividade sem precedentes em algumas das mais importantes
instituies mainstream britnicas, definitivamente ocupando um lugar de destaque
em relao a outros pases com produes artsticas igualmente fecundas. Em 2006, o
Barbican recebe a mostra itinerante Tropiclia, com curadoria de Carlos Basualdo; a
Tate Modern, por sua vez, apresenta individuais de Hlio Oiticica (2007) e Cildo
Meireles (2008-09); em 2010 a vez de Ernesto Neto na Hayward. Foi ainda neste
mesmo perodo (2006-10) que o Arts Council (espcie de Ministrio da Cultura),
juntamente com o British Council, lanou a segunda edio do programa Artist Links,
que promoveu residncias artsticas entre o Brasil e o Reino Unido (o projeto piloto foi
com a China, de 2002-06), com um investimento de 450.000 libras (aproximadamente
1.200.000 reais). Alm disso, seria possvel citar inmeras participaes de artistas
brasileiros em projetos de exposio de menor escala, tanto em instituies pblicas,
quanto em galerias comerciais geralmente com uma abordagem mais sofisticada do
que os shows das grandes instituies , bem como sua participao em residncias
artsticas independentes do Artist Links. Hoje, essa diversidade de manifestaes
comea a criar espaos para alm da mera reproduo de clichs e da formatao de
projetos mais palatveis para o pblico estrangeiro, que reiteram um discurso que
promove uma nica matriz neoconcreta para tudo o que arte contempornea
brasileira. Ainda assim, o clich prevalece: vide o Festival Brazil (2010) promovido
pelo South Bank Centre (que incluiu a exposio de Neto na Hayward) ou o festival
Brazil Contemporary, promovido pelo Museum Boijmans Van Beuningen, em
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Amsterd (2009). Em ambos os casos, as curadorias optaram, mais uma vez, por trilhar
o caminho neoconcretista para discutir arte brasileira, seja selecionando um artista j
reconhecido e que bebe diretamente nessa fonte (Neto na Hayward) ou explicitamente
tomando Oiticica como a maior influncia contempornea (e mostrando, alm dele, os
trabalhos de Ricardo Basbaum, Cao Guimares, Rivane Neuenschwander e, claro,
Ernesto Neto)22.
Tal perigo foi tambm observado por Ana Letcia Fialho, em anlise feita em 2005 a
respeito de exposies internacionais dedicadas produo contempornea brasileira:
A fim de participar da cena internacional, os agentes brasileiros esto, em geral,
sempre prontos para fazer concesses excessivas: aceitar e/ou participar na promoo
de esteretipos da cultura brasileira; pagar caro, muitas vezes com dinheiro pblico, o
aluguel de espaos de legitimao; aprender a sua prpria histria com os agentesinternacionais mal informados; abrir a cena nacional para agentes internacionais
oportunistas, etc. necessrio ter conscincia para, eventualmente, reverter essa
tendncia. necessrio ultrapassar o sentimento de orgulho nacionalista que nos d
uma imagem da cultura brasileira que no corresponde imagem dada pela maior
parte dos eventos realizados no exterior.
E isso passa sobretudo pela definio de uma poltica cultural visando participao
mais efetiva de nossos pesquisadores, professores, crticos, curadores nos projetos
internacionais. Do contrrio, sempre haver um especialista internacional, em geral
europeu ou americano a nos explicar o que a arte brasileira.
necessrio se construir um banco de dados em que possam ser acessadas as
informaes sobre esses eventos, passados e futuros, para que se evite a repetio dos
mesmo erros. Nesse sentido, pesquisas de campo so tambm fundamentais para se
evitar as anlises intuitivas ou de cunho nacionalista. A construo e atualizao de
indicadores consubstancia-se assim ferramenta fundamental para a construo de
polticas pblicas coerentes e eficazes23.
3.3 Especificidades do sistema de arte no Brasil
Existe um desequilbrio significativo entre as diferentes instncias do sistema das artes.
No Brasil o campo institucional, que em outros pases um pilar fundamental do sistema, local
de fomento, visibilidade e validao da produo contempornea, frgil e sofre com uma
22Id.;. Ibid.http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBq-c_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-
11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-de-mobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>Acesso em 15/10/20011.23
Fialho, Ana Leticia.As exposies internacionais de arte brasileira....
http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBq-c_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-de-mobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&ghttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBq-c_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-de-mobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&ghttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBq-c_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-de-mobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&ghttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBq-c_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-de-mobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&ghttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBq-c_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-de-mobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&ghttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBq-c_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-de-mobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&ghttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBq-c_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-de-mobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&ghttp://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:FBq-c_CRdpUJ:revistatatui.com/revista/tatui-11/nao-seja-marginal-nao-seja-heroi-a-arte-brasileira-no-exterior-em-tempos-de-mobilidade-acelerada/+kiki+mazuchelli+revista+tatu%C3%AD&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&g -
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srie de deficincias, e no logra acompanhar, e muito menos colecionar a produo
contempornea, conforme aponta a pesquisa Economia das exposies de arte
contempornea.
Nessa conjuntura, no causa espanto que a produo brasileira contemporneaencontre-se representada em importantes museus do Hemisfrio Norte e tambm da sia e
do Oriente Mdio, enquanto os acervos institucionais brasileiros no conseguem acompanhar
tal internacionalizao.
Percebe-se uma defasagem entre o circuito institucional, o plo da produo e o
mercado de arte. Esse fenmeno apenas se anunciou na pesquisa supra-referida e est sendo
explorado em mais detalhe pela pesquisa sobre o mercado de arte contempornea ABACT-
APEX. Embora os resultados desse segundo estudo ainda estejam em fase de consolidao,
no poderamos deixar de mencionar que o mercado parece assumir, cada vez mais, papel
estruturante no sistema brasileiro de arte contempornea (FIALHO, 2010). Galerias comerciais
e colecionadores particulares fomentam ativamente a produo e a circulao das obras,
participam de sua validao, realizam sua catalogao, organizam debates e publicaes sobre
elas e capitaneiam sua insero internacional. Incorporam, portanto, algumas das funes que,
tradicionalmente, estavam concentradas nas instituies do circuito expositivo institucional.
3.4 Fragilidade institucional e insero internacional
As diversas instncias do mundo das artes no Brasil ambicionam uma insero
internacional, mas que o grau e a capacidade de internacionalizao de cada uma delas difere
significativamente. De um lado, o campo da produo artstica e do mercado, com uma
crescente internacionalizao, e, no outro extremo, as instituies pblicas que atuam, em sua
maioria, num contexto local/regional e tm baixa insero internacional.
Um exemplo: a nica instituio que coleciona e exibe, de forma permanente, um
panorama da arte brasileira atual em dilogo com a produo internacional o Instituto de
Arte Contempornea de Inhotim, fundao privada que recebe recursos pblicos por meio das
leis de incentivo fiscal e que abriga a coleo do industrial Bernardo Paz24.
J os museus pblicos enfrentam uma grande dificuldade na formao de colees que
contemplem a produo contempornea internacional. Na verdade, nem mesmo a produo
24 O instituto tem trs curadores: o brasileiro Rodrigo Moura, Allan Schwartzman, um dos fundadores do New
Museum e consultor de colees privadas nos Estados Unidos, e Jochen Voltz, que trabalhou quatro anos na galeriaNeugerriemschneider, uma das mais importantes de Berlim. Essa galeria, alis, representa alguns dos artistas quehoje fazem parte da coleo da instituio.
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nacional est bem representada nas colees pblicas. Grande parte das instituies no
consegue estabelecer uma poltica clara de aquisies, nem possui recursos suficientes para
atuar no mercado internacional. por meio de exposies temporrias que tais instituies
apresentam a produo internacional, muitas vezes com projetos curatoriais importados e de
custos elevados. Tanto no que se refere a suas colees e programao quanto a sua
visibilidade e reconhecimento em escala internacional.
A venda da coleo de Adolfo Leirner para o Museu de Belas Artes de Houston, em
2007, uma triste evidncia da fragilidade das instituies brasileiras: nenhuma delas foi capaz
de oferecer ao colecionador uma proposta melhor do que a feita pela instituio norte-
americana, e aqui a referncia no somente ao preo, mas tambm s condies de exibio,
conservao e pesquisa que envolvem a coleo.
3.5 Valor da arte e economia da cultura
Para precisar a especificidade do valor das obras de arte contemporneas, voltemos a
Roberto Magalhaes Veiga:
Se a arte um juzo de valor e o preo a expresso/sintoma de uma poca, as obras
que j passaram pelos crivos sucessivos de filtros/juzos de valor diacrnicos gozam de
uma legitimidade reiterada pela comunidade de compradores e de vendedores
profissionais que compem o centro do mercado de arte e pautam critrios, ordenam e
do sentido s desigualdades e estabelecem os consensos coletivos (...). As
desigualdades de preo, que para alguns beiram o despropsito, e a inconsistncia do
juzo de valor emitido e de sua confirmao futura a curto termo, o que conta no o
que as coisas sero, mas o que os atores econmicos pensam que elas sero (Moulin,
1997), somadas ao papel dos especuladores e s prticas abusivas, levantam as
questes de praxe sobre embuste e manipulaes acintosos. O resultado a dvida no
lugar da confiana. A margem de tempo para produo, circulao e apropriao das
peas muito curta, no h um recuo para existir uma avaliao consolidada,
sobretudo de uma arte que no necessariamente feita para durar.(...)
Concomitantemente, assiste-se a uma preocupao com a contemporaneidade que
comea a fazer sombra procura e coleo das formas tradicionais do patrimnio
artstico e histrico, que, se ao contrrio de perderem seu valor e seu preo observam a
mar montante de ambos para as peas de destaque, veem as novas estrelas do
ultracontemporneo despontarem num mercado prprio cada dia mais estimulante,
atraente e midiatizado. Artistas com as caractersticas de Damien Hirst e Jeff Koons
encarnam perfeio essa vertente.
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medida que as obras de arte se tornam mercadorias e eventualmente alternativas de
investimento visando lucro a curto e mdio prazo, ganham uma dimenso econmica que vem
se somar e mesclar a seu valor simblico.
Por outro lado, no se pode esquecer que a arte sempre ter duas dimenses distintasde valor: uma simblica e outra financeira. E que o funcionamento do sistema de arte depende
de uma srie de escolhas e mecanismos que vo alm das questes oramentrias. por isso
que propomos, no mbito de nosso estudo, falar em economias da cultura e da arte no plural.
3.6 Arte Contempornea e seus Usos: Fatores exgenos ao campo especfico da arte:
polticas urbanas. Interrelaes entre: territrios e eventos nacionais e internacionais de arte
contempornea25
.
O termo arte contempornea conforma uma pluralidade de sentidos. O que pde ser
mapeado como questo comum aberta por esta pesquisa para estes tantos sentidos o que
denomina-se arte na atualidade por trans-territorialidade.26
Segundo Raquel Garbelotti e Jorge Menna Barreto,
A partir da dcada de 90 do sculo passado, as prticas orientadas para um lugar
especfico comearam a operar a partir de perspectivas de impermanncia,
descontinuidade, ambigidade e desterritorializaes. O lugar e a obra transcendem asua noo identitria, fixa e sedentria e adquirem um modelo nmade e itinerante
cujas fronteiras so de difcil visibilidade. O exerccio de pertencimento da obra em
relao a esse lugar ganha novos contornos num territrio que agora fludo e
disperso. O lugar da obra deixa de ser somente um local literal e torna-se um
informational site como caracteriza o autor James Meyer, que inclui desde o lugar
fsico (sem prioriz-lo), at fotografias, textos, vdeos e objetos que no se encontram
25A palestra de Micael Herschmann apontou um processo que dever tambm ser analisado no nosso grupo de
pesquisa: os efeitos tursticos e de gentrificao acarretados pelas vocaes artsticas num territrio. SeHerschman apontou em sua fala, a pesquisa sobre a evoluo e consolidao do fenmeno musical da seresta nacidade de Conservatria, julgamos que no estamos muito distantes da experincia de Porto Alegre com a Bienal doMercosul como paradigma de potencial de cidade criativa onde o elemento motor a Arte Contempornea.Assim, outras camadas de elementos j comearam a ser acrescentadas, como mais elementos explicativos para adinmica dos atores decisrios numa poltica pblica para arte contempornea tais como: Fatores exgenos aocampo especfico da arte: polticas urbanas e Interrelaes entre: territrios e eventos nacionais e internacionais dearte contempornea.26
Termo cunhado por Raquel Garbelotti a partir dos trs paradigmas site-specific de Miwon Kwon. Ver: KWON,
Miwon. One place after another: notes on site specificity. October 80, spring 1997. October Magazine, Ltd. andMassachusetts Institute of Technology. Traduo de Jorge Menna Barreto. Arte & Ensaios: Revista do Programa dePs-Graduao em Artes Visuais EBA - UFRJ, nmero 17, dezembro de 2008, Rio de Janeiro.
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confinados a uma localidade especfica e nem literal e que remetem a outros lugares e
situaes num exerccio infinito de associaes e encadeamentos27.
Para a terica em arte Miwon Kwon, a arte contempornea que se coloca sob a lgica
do territrio est estreitamente identificada com a categoria site-specific e o contexto Norte
Americano. Kwon determina trs modelos paradigmticos para a compreenso da arte sob
esta lgica do Lugar, sendo o primeiro o paradigma fenomenolgico, das prticas artsticas
calcadas historicamente na ambincia em que se colocavam caso dos Minimalistas. E nesse
contexto em que ocorre a estreita relao entre espao especializado (museu e galeria)
consolidado no Modernismo, mas aqui potencializado em sua maturidade na Ps-
Modernidade dos anos de 1960/70.
Como descreve Kwon:
O trabalho site-specific em sua primeira formao, ento, focava no estabelecimento
de uma relao inextricvel, indivisvel entre o trabalho e sua localizao, e
demandava a presena fsica do espectador para completar o trabalho. A (nova-
vanguardista) aspirao de exceder as limitaes das linguagens tradicionais, como
pintura e escultura, tal como seu cenrio institucional; o desafio epistemolgico de
realocar o significado interno do objeto artstico para as contingncias de seu contexto;
a reestruturao radical do sujeito do antigo modelo cartesiano para um modelo
fenomenolgico da experincia corporal vivenciada; e o desejo autoconsciente deresistir s foras da economia capitalista de mercado, que faz circularem os trabalhos
de arte como mercadorias transportveis e negociveis todos esses imperativos
juntaram-se no novo apego da arte realidade do site28.
O segundo paradigma apontado por Kwon seria aquele de crtica institucional, caso de
projetos realizados nos anos de 1980/90, em que aspectos institucionais dos espaos (caso de
Bienais, galerias etc.) eram, todavia, trazidos para a visualidade e produo de sentido da
exposio. Neste segundo paradigma, o espectador, carregaria consigo suas percepes sobre
27Ver: GARBELOTTI, Raquel e MENNA BARRETO, Jorge. Especificidade e (in) traduzibilidade. In: XIII Encontro
Nacional da Associao Nacional dos Artistas Plsticos (ANPAP), Arte em pesquisa: especificidades, Universidade deBraslia, de 10 a 13/11/04, 2004, Braslia DF. Arte em Pesquisa: especificidades. Braslia DF: Editora da Ps-Graduao da Universidade de Braslia, 2004. v. 1. p. 111-115. Na leitura de Menna Barreto e Garbelotti: O termosite-specific tem sido usado maciamente por instituies de arte e discursos do meio artstico, no s na sua lnguade origem como em outras lnguas. O uso indiscriminado do termo, assim como o desconhecimento do contextohistrico em que emergiu, parece amortecer a sua inteno crtica inicial e diluir o seu conceito como se fosseapenas mais uma categoria da arte contempornea. Uma traduo literal do termo site-specific provavelmenteoriginaria algo como stio especfico no portugus. Tal literalidade corre srios riscos, como, por exemplo, aconfuso em relao obra e ao lugar. No ingls, a expresso usada como um adjetivo para caracterizar a
especificidade da obra de arte. A expresso stio especfico em portugus qualificaria o lugar como sendo especfico,e no necessariamente a obra, pois funciona como um substantivo.28
Op. Cit. pg. 167.
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classe e gnero na produo de sentido das obras. Neste momento a arte estaria interessada
em problematizar o lugar em que se instalava, conforme a lgica do lugar que apresenta, no
apenas pelos possveis deslocamentos sobre o espao em direo de uma fenomenologia
como experincia da obra, mas no sentido de leitura crtica por parte do espectador; sob as
condies em que a arte estava aportada - seus interesses polticos e suas estratgias invisveis
nos projetos calcados no mais em relaes puramente estticas.
Segundo Kwon:
Informadas pelo pensamento contextual do Minimalismo, vrias formas de crtica
institucional e arte conceitual desenvolveram um modelo diferente de site-specificity
que implicitamente desafiou a inocncia do espao e a concomitante pressuposio
de um sujeito/espectador universal (apesar de possuidor de corpo fsico) tal como
defendia o modelo fenomenolgico. Artistas como Michael Asher, Marcel Broodthaers,
Daniel Buren, Hans Haacke e Robert Smithson, tal como muitas artistas mulheres,
incluindo Mierle Laderman Ukeles, de forma varivel conceberam o lugar no s em
termos fsicos e espaciais, mas como uma estrutura cultural definida pelas instituies
de arte29.
Finalmente o terceiro e ltimo paradigma apontado por Kwon, seria aquele que est
relacionado esfera pblica e consequentemente orientadas para um contedo discursivo da
obra como em casos da arte baseada em comunidade (como ltima forma de atualizarprticas artsticas calcadas na categoria site-specific). Neste caso, o pblico se estenderia a
comunidade de um local em que e com que o artista trabalha, mas tambm para o pblico dos
espaos da arte, pelo projeto orientado para o espao especializado. Neste sentido a arte
ganharia uma transitoriedade e consequentemente uma trans-territorialidade pelo formato
discursivo, que pode ser apresentado em distintos locais e contextos. Para Kwon este ltimo
paradigma avanaria sobre a questo dos lugares e das operaes dos artistas um lugar aps o
outro. Desse modo, na tese de Kwon, a crtica que deve ser estabelecida para as formas de
operar, no capitalismo tardio: seria pelo estabelecimento de metas e relaes com o lugar e ou
territrio, em que a arte se colocaria por contingncias de longo prazo30.
29Id;. ibid. pg. 3.30 Aqui podemos pensar sobre a necessidade das residncias artsticas (caso do Programa CAPACETE (RJ/ SP) ou deprojetos como Ateli 397 (SP). Estas plataformas trabalham na direo apontada por Kwon e tem muito a contribuir
para a produo de um novo modelo de gesto cultural. Neste sentido torna-se urgente pensar como apoiar estesespaos criando, por exemplo, editais que contemplem este modelo de produo e difuso da cultura. Seria esteum relevante indicador das polticas culturais na arte contempornea.
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3.6.1 Os espaos discursivos da Arte e suas relaes com as cidades e suas economias
Algumas questes podem ser desdobradas destes projetos de formato discursivo
apontado por Kwon, o caso dos trabalhos de artistas itinerantes, aqueles residentes em
diversos pases - os trabalham sob a lgica de adequao de pesquisas em seus projetos
individuais ao lugar (cidade) em que realizam as residncias. Estes deslocamentos de contexto
promovem, portanto, trocas e produo de cultura imaterial, dificilmente mensurvel. Este o
caso de plataformas como CAPACETE (RJ/ SP)31 que gera uma economia participativa com os
pases que mantm relaes - atravs dos artistas estrangeiros que enviam seus projetos para
esta plataforma no Brasil.
Para Garbelotti e Menna Barreto:
Tal ampliao tornou a noo de site mais inclusiva e complexa, alterando tambm a
maneira como a obra se relacionaria com esse lugar. Aspectos sociais, econmicos,
histricos e polticos tornam-se assim ingredientes importantes dessa relao. A partir
da dcada de 90 do sculo passado, as prticas orientadas para um lugar especfico
comearam a operar a partir de perspectivas de impermanncia, descontinuidade,
ambiguidade e desterritorializaes. [] O lugar da obra deixa de ser somente um
lugar literal e torna-se um informational site como caracteriza o autor James Meyer,
que inclui desde o lugar fsico (sem prioriz-lo), at fotografias, textos, vdeos,
objetos etc. que no se encontram confinados a uma localidade especfica nem literal
e que remetem a outros lugares e situaes num exerccio infinito de associaes e
encadeamentos32.
Lugares como Ateli 39733 (So Paulo/ Brasil), geram sua prpria receita, tanto por
meio de editais do MinC, como pela colaborao e financiamentos prprios, gerados por
exemplo, pela venda de trabalhos dos artistas colaboradores deste espao. Esta plataforma
apresenta exposies de artistas de diversos locais do Brasil e tambm publicaes, alm de
debates e conversas entre diferentes autores.
Este modelo de espao de produo artstica, pde ser evidenciado tambm na 8 a
Bienal do Mercosul34 - que operou em distintos nveis de produo de obras e de
conhecimento, desdobrando a experincia da arte em espao museolgico (Galpes da
31 Para maiores informaes do CAPACETE: http:/www.capacete.net < ltimo acesso em 28/11/2011>32GARBELOTTI, Raquel e MENNA BARRETO, Jorge. Op. Citp. 111-115.33
Ver: http://atelie397.com/ < ltimo acesso em 28/11/2011>34 Para maiores informaes da 8
aBienal do MERCOSUL: http://www.bienalmercosul.art.br/ .
http://www.bienalmercosul.art.br/http://www.bienalmercosul.art.br/http://www.bienalmercosul.art.br/http://www.bienalmercosul.art.br/ -
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Bienal), para os projetos da Casa M35 um lugar de encontro e debates, apresentaes de
projetos e workshops, que contemplava o formato discursivo da arte, como arena para a
abertura outros pblicos em distintos formatos.
No exemplo da Casa M, temos, no entanto, uma economia gerada pelo MinC, atravsda Bienal do Mercosul; embora esta plataforma tenha apresentado um formato
conceitualmente calcado em espaos independentes de arte, como o caso do CAPACETE. De
certa forma, podemos pensar aqui na institucionalizao de um modelo econmico de cultura.
Um outro exemplo pde ser verificado durante a 29a Bienal de So Paulo36, em que a
mesma trabalhou em parceria com o projeto CAPACETE, porque viabilizou financeiramente,
durante esta edio da Bienal, esta plataforma nas mesmas bases conceituais que o programa
j contempla, dinamizando por assim dizer, um misto de economias (a imaterial, como por
exemplo, os contatos com curadores e artistas nacionais e internacionais com os quais seu
gestor Helmut Batista mantm contato e a economia gerada pelo MinC, atravs do
financiamento deste programa na durao da 29a Bienal de So Paulo).
Para Kwon:
[] Mas alm dessa expanso dual da arte na cultura, que obviamente diversifica o
site, a caracterstica marcante da arte site-oriented hoje a forma como tanto a
relao do trabalho de arte com a localizao em si (como site) como as condies
sociais da moldura institucional(como site) so subordinadas a um site determinado
discursivamente que delineado como um campo de conhecimento, troca intelectual
ou debate cultural. Alm disso, diferente dos modelos anteriores, esse site no
definido como pr-condio, mas antes gerado pelo trabalho (freqentemente como
contedo), e ento comprovado mediante sua convergncia com uma formao
discursiva existente37.
Seriam os casos dos exemplos citados acima, como do Projeto CAPACETE e do Ateli
397, no Brasil.
35 Ver:http://bienalmercosul.art.br/blog/casa-m-de-mercosul/.36 O programa CAPACETE realizou uma srie de palestras e debates, assim como projetos no Teatro Arena em So
Paulo durante todo o ano em que houve a 29a
Bienal. Como artista convidada Raquel Garbelotti pode testemunhardiferentes formas de produo colaborativa neste formato.37Id;. ibid. Pg. 6.
http://bienalmercosul.art.br/blog/casa-m-de-mercosul/http://bienalmercosul.art.br/blog/casa-m-de-mercosul/http://bienalmercosul.art.br/blog/casa-m-de-mercosul/http://bienalmercosul.art.br/blog/casa-m-de-mercosul/ -
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4. Economia(s) da cultura: pluralidade de economias decorrente
dos diversos circuitos de valorao e legitimao da Arte
Contempornea38
Conforme citado por Catherine David em palestra no Instituto Goethe em Porto Alegre
em outubro de 1998, a arte contempornea ainda enfrenta trs paradigmas herdados do
pensamento clssico e que tambm se aplicariam arte moderna. Seriam eles:
1) a iluso de ubiquidade, que se refere noo de que uma obra ter o mesmosignificado independente de onde ela se encontre;
2) a iluso de transparncia, que diz respeito noo de que o significado de umaobra est contido todo nela mesma e que ela fala por si;
3) a iluso de permanncia, que nos diz que uma obra tem a sua importncia fixaindependente do seu contexto histrico. A autonomia da obra, que gerada a
partir desses trs paradigmas, facilita o sistema de mercantilizao da mesma.
De acordo com Douglas Crimp no seu livro On the Museums Ruins, a dependncia do
lugar e da situao das primeiras obras site specific tinham uma inteno crtica em relao ao
comrcio de arte por sua recusa de mobilidade e circulao. Assim, a insistncia da arte na
especificidade poderia ser considerado um dos eixos importantes de crtica que o pensamento
contemporneo exerce em relao a alguns aspectos do projeto moderno.
[] a noo de site expandiu-se e passou a incluir outros aspectos do lugar at ento
no considerados. [] Aspectos sociais, econmicos, histricos e polticos tornam-se assim
ingredientes importantes dessa relao39.
De acordo com o que desenvolvem os autores possvel ampliar estes aspectos
polticos, no sentido do pensamento do territrio da cultura, como de seu lugar de difuso e
troca, diversificando os modelos j existentes e j entendidos como parmetro do que o
mercado em arte contempornea.
Segundo o documento realizado pela Unidade de Inteligncia Comercial Apex-Brasil,
de 2008 de autoria de Suelma Rosa dos Santos40:
38 Item desenvolvido pela artista e professora Raquel Garbelotti.39 Trecho retirado de: GARBELOTTI, Raquel e MENNA BARRETO, Jorge. Especificidade e (in) traduzibilidade. In: XIIIEncontro Nacional da Associao Nacional dos Artistas Plsticos (ANPAP), Arte em pesquisa: especificidades,
Universidade de Braslia, de 10 a 13/11/04. 2004, Braslia DF. Arte em Pesquisa: especificidades. Braslia DF: Editorada Ps-Graduao da Universidade de Braslia, 2004. v. 1. p. 111-115.40 Ver: ROSA DOS SANTOS, Suelma. Mercado de Arte Contempornea na China. Apex-Brasil. 2008.
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Existem duas formas possveis de mensurar as estatsticas de vendas de obras de arte:
o registro de vendas dos leiles e o registro de importao e exportao dos pases.
Em relao a vendas e leiles, o Brasil encontra-se no quarto grupo de pases com
menores vendas em leiles. O nmero faz referncia venda de obras de arte em geral
[]41.
Para a autora:
As exportaes brasileiras de artes visuais segundo o registro do SICOMEX/ MDI para
os quatro SH6, anteriormente mencionados, concentram-se em mercados de destino
como Estados Unidos (37%), Reino Unido (26%) e Suia (17%). Os demais pases
representam apenas 20% dos destinos das exportaes brasileiras 42.
Fonte: MDIC. Elaborao UIC/ Apex-Brasil
Nos grficos que seguem fica possvel acompanhar esta distribuio das exportaes
de obras de arte para outros pases segundo as categorias: pintura e desenho, escultura e
gravura e litografia. Estes so os vetores formais para a avaliao da economia da Arte de um
pas.
41Id.; ibid. Pg. 9.42Id.;. ibid. Pg.10.
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Fonte: MDIC. Elaborao: UIC/ Apex-Brasil.
Fonte: MDIC. Elaborao: UIC/ Apex-Brasil.
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Fonte: MDIC. Elaborao: UIC/ Apex-Brasil.
Portanto, segundo o documento realizado pela Unidade de Inteligncia Comercial
Apex-Brasil, de 2008 de autoria de Suelma Rosa dos Santos:
A retrao no Mercado das aes em decorrncia da crise imobiliria norte americana
no afetou como esperado o Mercado das artes internacional. Segundo o Artprice, o
principal responsvel pela manuteno dos preos e do nvel de consumo de arte foi o
crescente interesse dos mercados emergentes em artes, em especial, China, Emirados
rabes Unidos e India43.
Este continua sendo como dito anteriormente, um vetor formal de identificao das
economias de um pas em mbito do cultural, mais especificamente da arte-contempornea -
dado o que vimos nos exemplos de espaos independentes de arte, temos tambm
atualmente uma economia de trocas entre os pases, porm de forma dificilmente mensurvel,
mas no por isto menos importante. Torna-se por isto de suma importncia pensarmos sobre
o papel das Bienais de So Paulo/ Mercosul, etc. (contextos44 especializados da arte), como
tambm o papel de artistas e gestores independentes; na produo uma Esfera Pblica nos
debates das formas de produo de cultura em artes visuais; para formarmos assim, uma idia
de representaes e identidades na discusso do atual estado da arte contempornea.
43Id.; ibid. Pg. 5.44 A 28a Bienal de So Paulo realizou um ciclo de palestras/ relatos, intitulado: Memria e Projeo, organizadopor Ivo Mesquita, Ana Paula Cohen e Luisa Duarte. Neste ciclo - artistas, curadores e outros agentes da artecontempornea foram convidados a pensar e tambm testemunhar sobre o papel e importncia da Bienal em suas
formaes/ carreiras individuais, de modo a retomar tambm sob a perspectiva discursiva, a memria do ArquivoWanda Svevo. Neste sentido foi possvel pensar nos tantos projetos realizados nas Bienais tambm como contextoimaterial da cultura.
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4.1 Recortes possveis
O campo da arte contempornea composto por diferentes instncias de formao,
produo, circulao, legitimao e comercializao - cada qual com dinmicas prprias,
embora muitas vezes prximas e mesmo interdependentes. Todas elas podem existir/atuar em
diferentes planos local, regional, nacional, internacional - de forma permanente, ou, mais
comumente, em espaos/tempos determinados.
Para que a construo de metas e indicadores para o setor seja precisa e pertinente, e
sirva para orientar polticas pblicas eficientes, devemos considerar instncias e contextos
especficos, assim como organizar informaes e alinhar diferentes iniciativas, no plano
governamental e para-governamental, a fim de somar esforos e no incorrer em
redundncias.
Por exemplo: o mercado de arte contempornea hoje tem um papel fundamental no
funcionamento do sistema das artes no Brasil, no s porque permite a comercializao de
parte da produo, mas porque atua como legitimador e promotor dessa produo no mbito
internacional, alm de contribuir para formao e profissionalizao de artistas, acompanhar e
registrar sua produo, fomentar publicaes, apoiar exposies institucionais, etc.
Trata-se de um setor em expanso e com tendncia profissionalizao, tendo hoje
uma associao representativa (Associao Brasileira de Galerias de Arte Contempornea) e
um programa especfico voltado internacionalizao (Programa Setorial Integrado Apex-
Brasil), promovendo aes que visam contribuir para a melhoria do ambiente para os negcios
(no plano das polticas pblicas e tributrias), aumentar o volume de negcios no plano
nacional e internacional e promover aes de promoo da visibilidade e reconhecimento da
produo brasileira no plano internacional.
Existem indicadores sobre volume de exportaes, pases que mais consomem a
produo brasileira (dados APEX) e uma pesquisa mais detalhada sobre o setor est em
andamento, iniciativa conjunta da ABACT e APEX-Brasil, sob a coordenao de Ana Letcia
Fialho45. Cabe avaliar em conjunto com essas instituies quais dados poderiam ser produzidos
de forma a complementar a pesquisa em curso.
45Pesquisa sobre o mercado de arte contempornea - ABACT/APEX. A pesquisa, coordenada por Ana Letcia Fialho,
visa coletar e organizar dados sobre o Mercado de arte contempornea, e tem foco nas galerias que fazem parte do
programa setorial integrado (PSI) gerenciado pela ABACT e apoiado pela APEX. Dois aspectos desse Mercado estosendo analisados de forma prioritria por este estudo:
a) o tamanho e a profissionalizao das galerias de arte contempornea.
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O amplo levantamento realizado pelo IBRAM, Museu em nmeros, tambm oferece
subsdios a essa reflexo. O IBRAM tambm est desenvolvendo, sob a coordenao de
Leandro Valiatti, um estudo sobre a cadeia produtiva dos museus.
O Sistema Estadual de Museus da Secretaria Estadual de Cultura do Estado de SoPaulo tambm realizou pesquisa extensiva sobre os museus do Estado. Como no caso do
Museus em nmeros do IBRAM, o estudo da SEC/SP tem um escopo mais abrangente e no
traz um enfoque especfico para os museus de arte contempornea, mas constitui um ponto
de partida a ser considerado.
A anlise de tais pesquisas, j realizadas, deve ser o ponto de partida para novos
estudos.
Especial nfase deve ser dada tambm s Bienais, pois elas so eventos importantes
de validao da produo contempornea e espaos privilegiados de articulao entre os
agentes locais e internacionais. Cabe tambm avaliar o seu impacto econmico para alm do
sistema das artes, pois tais eventos geram emprego, renda, atraem turistas, do visibilidade
cidade.
Sugesto: anlise das Bienais de So Paulo e MERCOSUL.
Um outro aspecto que poderia ser aprofundado diz respeito insero internacional
das instituies brasileiras. Alguns indicadores parecem-nos fundamentais para avaliar tal
insero:
- organizao de exposies internacionais, identificando o que concebido noBrasil e o que importado;
- exportao de exposies concebidas pelas instituies brasileiras;
Exemplos de questes levantadas: volume de negcios, regime fiscal, nmero de funcionrios, tipo de vnculofuncional, tipo de relao estabelecida com o artista (contrato, artista pj ou pf)? Quais os pontos consideradosgargalos para desenvolvimento da atividade? etc.
b) Mapeamento da insero internacional das galerias, seus agentes e seus artistas.Exemplos de questes levantadas: quais artistas representados pela galeria x esto em colees internacionais equais colees? A galeria tem parcerias internacionais? Seus artistas so representados por galerias fora? A galeriatem clientes internacionais, onde? etc.O estudo ter trs desdobramentos importantes:
- criao de ferramentas de promoo comercial que a associao e as galerias podero utilizar paramelhorar seus negcios (ex. Plataforma online com dados sobre a internacionalizao, mostrando ospontos onde estamos no mapa)
- fornecer informaes para ajustes e melhor desenvolvimento do programa de exportao e para asatividades da ABACT
- fornecer informaes objetivas, organizadas e confiveis aos agentes do sistema da arte, agentespblicos, patrocinadores, investidores e demais interessados sobre o setor da arte contempornea.
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- participao das instituies e seus agentes (diretores/curadores/educadores,etc.) em exposies, publicaes, seminrios e outras atividades relacionadas
arte contempornea no exterior;
- colecionismo internacional (identificar quais instituies esto conseguindoconstituir colees internacionais).
4.2 Espaos independentes e residncias artsticas
Setor a ser mapeado e estudado, pois atuam fortemente como plataformas de
inovao e internacionalizao para o sistema de arte contempornea. As residncias artsticas
so locais de troca e articulao entre local e o internacional. Observao participativa indica
uma grande expanso desses espaos e a sua participao fundamental na dinamizao do
sistema de arte contempornea no Brasil. Enquanto os espaos independentes foram objeto
de uma publicao estavam constituindo uma rede46, as residncias ainda no foram
mapeadas.
Indicadores: nmero, localizao, atividades realizadas/ano, oramento anual
(receita/despesas), fontes de financiamento, parcerias, nmero de empregados, faixa salarial,
servios terceirizados contratados, produtos/servios oferecidos.
Para as residncias, alm das questes anteriores: descrio do processo seletivo,nmero de residentes, perfil de residentes, benefcios oferecidos aos residentes, atividades
desenvolvidas pelos residentes, atividades abertas ao pblico, follow up com ex-residentes,
desdobramentos.
4.3 As produtoras
Agentes quase invisveis do sistema das artes, as produtoras tm, no entanto, papel
fundamental no desenvolvimento e realizao de projetos museolgicos e expositivos.Empresas com vocao comercial desenvolvem e gerenciam projetos em parceria com
instituies culturais, beneficiam-se dos mecanismos de incentivo fiscal e captam recursos
junto iniciativa privada. Trabalham em colaborao com outros agentes da cadeia produtiva,
como transportadoras especializadas, montadores, musegrafos, despachantes, empresas de
logstica, seguros, etc. O estudo do modelo de negcio e das produtoras permita identificar
46Encontro dos espaos culturais independentes. Ver: http://www.casadaribeira.com.br/ieei2011/www/, ltima
consulta 06/12/2011.
http://www.casadaribeira.com.br/ieei2011/www/http://www.casadaribeira.com.br/ieei2011/www/http://www.casadaribeira.com.br/ieei2011/www/ -
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com preciso os diversos agentes envolvidos na realizao de exposies, e tambm
estabelecer parmetros de valores praticados para os principais servios contratados.
4.4 Mecanismos de financiamento para arte contempornea (editais, prmios-
residncia, prmios para produo, prmios para aquisio, etc.)
Os editais, por exemplo, assumiram um papel fundamental no fomento produo
artstica e tambm realizao de exposies e constituio de acervo, sobretudo para
instituies e espaos voltados arte contempornea de pequeno porte.
O levantamento dos principais mecanismos de financiamento da produo artstica e
para atividades do circuito da arte contempornea, e uma anlise do seu impacto e
desdobramentos parece-nos fundamental para o aprimoramento e expanso dos mesmos.
4.5 O mercado
Algumas tentativas de estudos do mercado brasileiro j foram feitas, no entanto ainda
no existe um diagnstico do setor que apresente dados objetivos e confiveis, sobretudo em
relao ao mercado primrio (composto pelas galerias que representam artistas e
comercializam obras de arte que esto entrando no mercado pela primeira vez).
Artigos e estudos existentes at hoje trazem dados do mercado externo, sobretudo
com base em bancos de dados existentes sobre transaes feitas em casas de leilo, e/ou
informaes qualitativas/parciais sobre o mercado nacional (S Earp, VEIGA). O tema foi
objeto da tese de doutorado de Ana Letcia Fialho, cuja pesquisa de campo chegou at 2006, e
foi atualizada parcialmente em artigos posteriores (2010). Recentemente, provavelmente dada
a expanso do mercado nacional e de uma maior insero internacional da produo
brasileira, o tema vem interessando tambm jovens pesquisadores e dissertaes e teses de
doutorado a respeito esto em andamento47
.
Para suprir essa lacuna, A ABACT, em parceria com a APEX-Brasil, est desenvolvendo
uma pesquisa sob a coordenao de Ana Letcia Fialho sobre o mercado de arte
contempornea no Brasil. O estudo visa dimensionar o tamanho do negcio, o grau de
profissionalizao e de internacionalizao das galerias brasileiras de arte contempornea. Tal
47Daniela Stocco (Doutoranda do Departamento de Sociologia da UFRJ), Tatiane Elias (Doutoranda na Staatliche
Akademie der Bildenden Knste Stuttgart), Mariana Albuquerque (Ps-graduao FGV/RJ), Camille Labanca(Graduao em artes visuais, UERJ), para citar exemplos recentes de pesquisadores que entraram em contato comAna Letcia Fialho para solicitar informaes sobre o tema.
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pesquisa abrange somente as galerias associadas ABACT e ao Programa Setorial Integrado
ABACT-APEX-Brasil, que hoje chegam a 40.
Seria interessante estabelecer um dilogo com essas duas instituies para
compartilhamento de informaes e metodologia, e tambm a fim de definir em dilogo como setor outros aspectos a serem estudados, complementando o diagnstico do setor j
iniciado.
Alguns outros aspectos a serem analisados, que no esto contemplados na pesquisa
ABACT-APEX:
- Mercado secundrio (galerias, escritrios de arte, casas de leilo quetrabalham com obras que j foram comercializadas anteriormente);
- Novssimas galerias e associaes/espaos independentes que vem obras dearte;
- Fundos de investimento;- Impacto econmico das feiras de arte realizadas no Brasil: ArtRio e SP Arte.
4.6 Editoras que tm foco na arte contempornea
Levantamento das editoras que publicam contedo sobre a produo contempornea
e sobre o sistema da arte, identificao das publicaes bilngues e das editores que tm
distribuio internacional; mapeamento da mdia impressa e sites que produzem contedo
relevante; identificao dos gargalos do setor, que tornam a publicao
4.7 Curadores independentes
5. O Sistema da Arte Contempornea e sua Insero Internacional48
Recentemente o Ministrio da Cultura, por meio de sua Secretaria da Economia
Criativa, manifestou interesse em avaliar a insero internacional da arte contempornea
brasileira. Sem dvida, uma anlise objetiva de tal insero fundamental para que o
Ministrio entender a posio que o Brasil ocupa no cenrio internacional e,
consequentemente, melhor direcionar esforos e recursos para atividades, aes, programas
que de fato contribuam para que o Brasil conquiste, mantenha e amplie seu lugar no mapa
internacional das artes. Mas para tanto preciso tambm delimitar o que se entende por
48Item desenvolvido pela pesquisadora Ana Letcia Fialho.
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insero internacional (do ponto de vista geopoltico), assim como quais aspectos dessa
insero sero prioritariamente abordados/avaliados.
A insero internacional pode ser pensada de acordo com as diferentes instncias j
referidas: insero no circuito institucional (de exposies como bienais e documenta,exposies em museus e outras instituies e ainda entrada em colees internacionais de
referncia), insero no plano da histria e da crtica (teses, publicaes, artigos na mdia
especializada internacional); insero de artistas no mercado internacional (representatividade
em galerias internacionais, presena em leiles); participao de agentes do mercado
brasileiro no mercado internacional (participao de galerias em feiras internacionais,
participao de galeristas em boards de feiras internacionais e fruns de debates). Outros
desdobramentos possveis dessa anlise: insero de artistas e curadores nos circuitos de
residncias internacionais; participao de curadores brasileiros em projetos de exposies
internacionais; participao de curadores, artistas e outros agentes nacionais em publicaes,
fruns e debates internacionais, etc.
Uma anlise abrangente desse tema foi desenvolvida em pesquisa realizada por Ana
Letcia Fialho, e que resultou na sua tese de doutorado defendida na Ecole des Hautes Etudes
em Sciences Sociales/Paris, em 2006: Linsertion internationale de lart Brsilien. Une analyse
de linsetion internationale de lart Brsilien dans les institutions et dans le march.
Nela, Fialho faz uma anlise da insero internacional da arte contempornea
brasileira nas instituies e no mercado a partir dos anos 1990, quando o circuito internacional
da arte contempornea, at ento centrado no eixo Europa-Estados Unidos, comea a
flexilibilizar suas fronteiras e integrar a produo de outras regies at ento consideradas
perifricas. A pesquisa de campo chegou at o ano de 2005, tendo sido atualizada
parcialmente no que se refere a algumas instituies/eventos internacionais e aos leiles.
A metodologia e os dados produzidos por Ana Letcia Fialho em sua tese para medir a
insero internacional da produo brasileira poderiam servir de base para a criao de
indicadores a serem alimentados e atualizados periodicamente, por equipe designada para
este fim.
Exemplos de indicadores:
1) Representao brasileira nas principais bienais e eventos equivalentes de arte
contempornea
Exemplo:
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Presena brasileira na Documenta de Kassel 1959-200749
Documenta II
1959
Documenta III
1964
Documenta IV
1968
Arthur Luiz Piza (1928) Almir Mavigner (1925) Almir Mavigner (1925)
Fayga Ostrower (1920-2001)Srgio de Camargo (1930-1990)
Documenta IX
1992
Curador: Jan Hoet
Documenta X
1997
Curadora:Catherine David
Documenta XI
2002
Curador:Okwui Enwezor
Documenta XII
2007
Diretores artsticos:Roger Bruegel/RuthNoak
Waltrcio Caldas (1946)Lygia Clark (1937-1980)
Arthur Barrio
(1945)
Dias & Riedweg
Cildo Meireles (1948) Tunga (1952)Cildo Meireles(1948)
Iole de Freitas(1945)
Jac Leirner (1961) Cabelo (1967)
Luis Sacilotto (1924-2003)
Jos Resende (1945)Hlio Oiticica(1937-1980)
Mira Schendel (1919-1988)
Saint Clair Cemin (1951)Ricardo Basbaum(1961)
Informaes complementares interessantes de serem coletadas dizem respeito ao
impacto da participao em tais eventos, altamente legitimadores e de grande visibilidade,
sobre a carreira dos artistas e, sobretudo, sobre sua valorizao comercial. Se tal indicador for
aplicado, poder-se-ia fazer tambm um acompanhamento da carreira dos artistas, ver que
desdobramentos e que oportunidades foram geradas, assim como contato com as galerias que
os representam para saber o impacto do evento no valor das obras e em sua comercializao.
2) Presena brasileira em colees internacionais de instituies que tm alta
visibilidade
Exemplo:
49
Tabela extrada de tese de doutorado: Ecole des Hautes Etudes em Sciences Sociales/Paris, em 2006: Linsertioninternationale de lart Brsilien. Une analyse de linsetion internationale de lart Brsilien dans les institutions etdans le march. Paris, 2006, e atualizada at 2007.
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Artistas brasileiros na coleo do MoMA (1980-2005)50
1980-1989
AnoN de
obras Artista Forma de entrada na coleo
1980 2 Nair Benedicto (1940) The Family of Man Fund
1981 1 Anna Bella Geiger (1933) Cossio del Pomar Fund
1986 1 Fayga Ostrower (1922) Doao do artista
1988 8 Oscar Niemeyer (1907) Don Hester Diamond
1990-1999
Ano
N de
obras Artista Forma de entrada na coleo1990 1 Sebastio Salgado (1944) The Fellows of Photography Fund
1991 3 Burle Marx (1909-1994)
Roblee McCarthy, Jr. Fund andLily Auchincloss Fund (2), RobertoBurle Marx Fund e aquisio dodepartamento (1)
1991 2 Jac Leirner (1961)Doao do artista (1), DavidRockefeller for Latin AmericaFund and Brazil Fund (1)
1993 7 Cildo Meireles (1948) Doao de Paulo Herkenhoff
1994 1 Valdir Cruz Doao de Barbara Foshay-Miller
1995 1 Waltrcio Caldas (1946)
Doao de Gilberto
Chateaubriand (em memria deMonroe Wheeler, FranciscoMasjuan e John Brady)
1996 2 Mario Cravo Neto (1947) Doao do artista
1997
4Hlio Oiticica(1937-1980)
Compra subvencionada porPatricia Cisneros (2), doao dafamlia Oiticica (2)
8 Vik Muniz (1961)
The Fellows of Photography Fundand Anonymous Purchase Fund(1), doao de Tricia Collins (2),doao do Contemporary ArtsCouncil of the MoMA (2), doao
do artista (3)1 Waltrcio Caldas (1946) Doao de Lilian Tone
1998 4 Hlio Oiticica (1937-1980)
Compra subvencionada por Mariade Lourdes Eugydio Villela (1),compra subvencionada porGilberto Chateaubriand e M.F.Nascimento Brito (1), doao da
50 Uma anlise extensiva da presena brasileira na coleo do MoMA foi feita na tese de doutorado (FIALHO, 2006)e sintetizada no artigo Brazil in the MoMA Collection.An analysis of the insertion of Brazilian art in an internationalart institution. Springerin, Viena, maro de 2005. O interessante dos dados que trazemos aqui a crescente
presena brasileira, exatamente a partir dos anos 1990, e a participao de diversos agentes brasileiros que fizeramdoaes nesse perodo. S muito recentemente observamos um investimento direto do museu na aquisio dasobras.
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AnoN de
obrasArtista Forma de entrada na coleo
famlia Oiticica (2)
1 Waltrcio Caldas (1946)
Doao coletiva: ManuelFrancisco do Nascimento Brito,Beatriz Pimenta Camargo,
Gilberto Chateaubriand, JoachimEsteve, Jos Mindlin, Maria deLourdes Egydio Villela (1)
1 Vik Muniz (1961) Doao de Margaret Weston
1999
4 Fernando Campana (1961) Doao de Patricia de Cisneros
5 Leonilson (1955)
Doao do Friends ofContemporary Drawing (3),doao do esplio do artistaLeonilson (2)
1999
Waltrcio Caldas (1946)Doao de Luiz Buarque deHollanda
1 Cildo Meireles (1948) Doao de Paulo Herkenhoff
1 Hlio Oiticica (1937-1980) Doao da famlia Oiticica
1 Mira Schendel (1919-1988)Doao de Luiz Buarque deHollanda
2000-2005
Ano N de obras Artista Forma de entrada na coleo
2000
10 Almir Mavigner (1925) Doao do artista
8 Vik Muniz (1961)Doao annima (1), compraatravs do Frances Keech Fund(7)
1 Lygia Pape (1932-2004) Doao de Patricia de Cisneros1 Helio Oiticica (1937-1980) Doao da famlia Oiticica
2001
2 Willys de Castro (1926-1988) Doao de Hercules Barsotti
30 Anna Maria Maiolino (1942)Compra (29), doao de MichelMaiolino (1)
9 Iran do Espirito Santo (1963) Compra
2 Mira Schendel (1919-1988) Doao de Luisa Strina
1 Leonilson (1957-1993) Doao de Carmen Bezerra Dias
1 Cildo Meireles (1948) Doao de Luisa Strina
1 Vik Muniz (1961) Doao do artista
1 Lygia Pape (1932-2004) Doao de Patricia de Cisneros
1 Hrcules Barsotti (1914)
Doao de Sylvio Nery da Fonseca
Escritrio de Arte Ltda
2002
1 Beatriz Milhazes (1960)Compra subvencionada por RickiConway
1 Ernesto Neto (1964) Compra
2 Beatriz Milhazes (1960)
Compra subvencionada por AgnesGund e Nina and Gordon BequestFund (1), doao do LibraryCouncil of The Museum ofModern Art (1)
20042 Hlio Oiticica (1937-1980) Doao de Patricia de Cisneros
2 Lygia Clark (1920-1988) Doao de Patricia de Cisneros
2005
4 Hrcules Barsotti (1914) Compra
1 Fernando Campana (1961)Doao de Jo Carole e Ronald S.Lauder
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Ano N de obras Artista Forma de entrada na coleo
3 Willys de Castro (1926-1988) Compra
5 Lygia Clark (1920-1988)Compra subvencionada pelaEdward John Noble Foundation
3 Iran do Esprito Santo (1963) Compra
28 Mira Schendel (1919-1988)
Compra atravs do Scott Burton
Fund (1), compra (27)
6 Alfredo Volpi (1896-1988)Compra (5), compra atravs doJoanne M. Stern Fund (1)
1 (a-m) Rivane Neuenschwander (1967)Compra atravs do Fund for theTwenty First Century
Informaes complementares interessantes a serem obtidas dizem respeito
provenincia das obras e seu valor de compra, comparando o valor de mercado com o valor
praticado na negociao com as instituies.
Uma iniciativa interessante foi a publicao, em 2011, pelo Ministrio das Relaes
Exteriores, do livro/catlogo Arte Brasileira nos Museus de Nova York. Embora no exaustivo,
nem compreendendo detalhes sobre a entrada das obras nas colees, o livro apresenta uma
seleo de obras, com ficha tcnica e imagens de alta qualidade. Uma iniciativa positiva, a ser
aprimorada e replicada talvez em outras cidades.
3) Exposies individuais e retrospectivas de artistas brasileiros em instituies
internacionais de grande visibilidade
4) Publicaes sobre a produo brasileira (catlogos, livros, ensaios, artigos, teses)
5) Publicao sobre arte contempornea de autores brasileiros no exterior
6) Participao de curadores brasileiros em curadorias internacionais
7) Presena de galerias brasileiras em feiras internacionais
Exemplo:
Galerias brasileiras na feira Art Basel 1999-201151
Art Basel1999
Art Basel2000
Art Basel2001
Art Basel2002
Art Basel2003
Art Basel2004
CamargoVilaa
CamargoVilaa
CamargoVilaa
Fortes Vilaa Fortes Vilaa Fortes Vilaa
Luisa Strina Luisa Strina Luisa Strina Luisa Strina Luisa Strina Luisa Strina
Brito Cimino Brito Cimino Brito Cimino Brito Cimino Brito Cimino
Millan
51Tabela elaborada a partir de anlise dos catlogos da feira e da mdia especializada.
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Art Basel2005
Art Basel2006
Art Basel2007
Art Basel2008
Art Basel2009
Art Basel2010
Art Basel2011
CamargoVilaa
Fortes Vilaa Fortes Vilaa Fortes VilaaFortesVilaa
FortesVilaa
FortesVilaa
Luisa Strina Luisa Strina Luisa Strina Luisa Strina Luisa StrinaA gentilcarioca
A gentilcarioca
Millan Millan Millan MariliaRazuk
Luisa Strina Luisa Strina
NaraRoesler
Millan Millan Millan
8) Artistas brasileiros representados por galerias internacionais
Elementos para a construo de Indicadores:
1) Compilar e manter acessvel para consulta o resultado de vendas dos leilesno Brasil (existem servios pagos: no Brasil: www.catalogodasartes.com.br e
para o mercado internacional:www.artprice.com);
2) Acompanhar o fluxo de importaes e exportaes para arte contempornea,junto APEX e ao MDIC, e desenvolver polticas de fomento tendo esses dados
em considerao.
6. Concluso
Algumas escolhas e premissas precisam ser explicitadas sobre o presente trabalho,
premissas estas que embasaram o recorte e a necessria coerncia terica e poltica para
aplicabilidade das indicaes aqui resultantes a ttulo de concluso.
Em primeiro lugar nosso foco o campo das Polticas Pblicas de Cultura e isto quer
dizer que priorizaremos o horizonte de um funcionamento desejvel e em consonncia com a
especificidade da Poltica de Cultura do Brasil, levando em conta os desafios que sagraram-se
como foco na primeira dcada dos anos 2000. Estabelecemos assim um recorte espao-
temporal que singulariza os potenciais e os obstculos da criao de Indicadores para polticas
pblicas em Arte Contempornea. Diferenciando assim o papel das instncias pblicas do
papel d