exegese genesis 19 30-38
TRANSCRIPT
-
UNIVERSIDADE METODISTA DE SO PAULO
FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS DA
RELIGIO
ELMER MENDES BARBOSA
GNESIS 19, 30-38
So Bernardo do Campo Maro de 2014
-
UNIVERSIDADE METODISTA DE SO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA E CINCIAS DA RELIGIO
PS-GRADUAO EM CINCIAS DA RELIGIO CONCENTRAO EM LINGUAGENS DA RELIGIO
ELMER MENDES BARBOSA
GNESIS 19, 30-38
Exegese apresentada ao curso de Ps-
Graduao em Cincias da Religio da
Universidade Metodista de So Paulo,
Segundo semestre, como requisito parcial
para obteno do ttulo de Mestre em
Cincias da Religio.
Orientadores: Prof. Dr. Jos Ademar Kaefer;
Prof. Dr. Trcio Machado Sirqueira.
So Bernardo do Campo Abril de 2014
-
Contedo
I. Traduo Interlinear .............................................................................................................. 4
1.1. Traduo Literal ............................................................................................................. 5
II. Critica Textual ........................................................................................................................ 6
III. Delimitao do Texto ........................................................................................................ 8
IV. Estrutura do Texto ............................................................................................................. 9
V. Coeso do Texto .................................................................................................................. 11
VI. Anlise Semntica ........................................................................................................... 12
VII. Data e Autoria ................................................................................................................. 16
VIII. Formas Literrias ............................................................................................................. 17
IX. Contexto do Texto ........................................................................................................... 18
X. Os Descendentes de L ...................................................................................................... 20
XI. Atualizao ...................................................................................................................... 22
Bibliografia .................................................................................................................................. 23
-
I. Traduo Interlinear
wyt'nOb. yTev.W rh'B' bv,YEw: r[;ACmi jAl l[;Y:w: 19:30 fillhas-dele e-duas-de no monte e-ele -habitou De - Zoar L E Ele Subiu
`wyt'(nOb. yTev.W aWh hr"['M.B; bv,YEw: r[;Ac+B. tb,v,l' arEy" yKi AM[i filhas-dele e-duas-de ele em-a-caverna e-ele-habitou em-Zoar para-habitar ele-temeu porque com-ele
!qE+z" Wnybia' hr"y[iC.h;-la, hr"ykiB.h; rm,aTow: 19:31 idoso nosso-pai A mais nova-para (a)primognita E (ela)disse
`#r !yIy: Wnybia'-ta, hqL:B; !yIy: !hw: 19:34 a mais nova - para a primognita e (ela) disse no dia seguinte E Ele foi
ybik.vi yaiboW hl'y>L;h;-~G: !yIy: WNq,v.n: ybi_a'-ta, vm,a, yTib.k;v'-!he deita e-entra esta noite- tambm vinho demos (a) beber meu pai onten eu deitei - vs
`[r;z") Wnybia'me hYW AM[i semente. de nosso pai e preservemos com ele
!yIy"+ !h
- `!h
-
II. Critica Textual
19,30 - wyt'(nOb. (venotayv) o Pentateuco samaritano, a septuaginta, a vulgata e alguns
manuscritos hebraicos medievais acrescentam: AM[i - sufixo de ~[i (preposio
que indica companhia ou proximidade; regime de numerosos verbos; partcula
concessiva. Com, junto, junto/a, em companhia de; tambm, ademais, alm disso, e,
inclusive, incluso, ao lado de, beirando, pegando, apesar de, no obstante. 1
Assim, wyt'(nOb. (venotayv) um acrscimo que d nfase a companhia :
L habitou numa caverna, ele na companhia (ao lado) de suas duas filhas. No
mudando o sentido do texto da BHS.
19,32 hk'l. ( lechah) Para ser lido (no Pentateuco samaritano): (leciy) ybil. ? talvez:
caminhemos, vamos, transladar-se de um ser mvel ou animado de um lugar para o
outro. 2
Que pode ser traduzido como Vamos, demos a beber vinho a nosso pai... que
tem coerncia com a interpretao de que foi tomada a deciso em conjunto, e no
baseado na ordem da primognita: vem, demos a beber vinho a nosso pai...
19,33 aWh+ (hu), provavelmente para ser lido (severin3, pentateuco samaritano):
awhh; (hahv) aquela, naquela. E deram de beber vinho a seu pai naquela (aquela)
noite. Tambm no interfere na traduo da BHS.
19, 34 - ybi_a' (avi ), na septuaginta, sufixo na primeira pessoa do plural , para ser lido:
Wnyba (vinu)? Incerto. No muda o sentido do texto, as tradues optam por pai ,
ybi_a'-ta meu pai.
1 SCHOKEL, Luis Alonso. 1997, p.502.
2 Idem, p.177.
3 Severin (lit. so supostos, so sugeridos, so cogitados): leituras sugeridas, supostas ou cogitadas.
FRANCISCO, Edson de Faria, 2008, p92-93.
-
19, 37 - ba'_Am ( moav) A septuaginta inseriu: le,gousa evk tou/ patro,j mou,, , inserido
ybia'ime rmoale ?
A LXX com este acrscimo da nfase a descendncia de L, a preservao da
semente. Esta verso tenta dar significado ao nome Moabe, ou explicar a razo da
primognita ao d-lhe o nome de Moabe.
Texto da Septuaginta
kai. e;teken h` presbute,ra ui`o.n kai. evka,lesen to. o;noma auvtou/ Mwab le,gousa evk tou/ patro,j mou ou-toj path.r Mwabitw/n e[wj th/j sh,meron h`me,raj
Traduo Literal:
A primognita gerou filho e ela o chamou de Moabe, dizendo: a partir do meu pai.
Este o pai dos moabitas at o dia hoje.
dizendo: a partir do meu pai; do meu pai; semente de um pai.
ybia'ime rmoale ? lemor meabiy - significado incerto. A tentativa da LXX ao acrescentar
na traduo valida no sentido de optar por uma traduo da palavra ba'_Am (Moabe).
(lemor): dizendo ( passim; equivale a) meabiy = moabe?
19,38 - Amv. A Septuaginta e a Vulgata acrescentou: Amman (Ammon). A
Septuaginta e alguns manuscritos hebraicos medievais4 acrescentou: Amman le,gousa =
rmoale !woMc; (amon lemor) dizendo, equivale a amon (Ammon).
4 Mss Manuscrito(s) hebraico(s) medieval(is) citado (s) nas edies de B. Kennicott, de G.B. de Rossi e
de C.D. Ginsburg.
-
III. Delimitao do Texto
O captulo 18 e 19 apresenta ser uma unidade entendida a partir da narrativa da
destruio de Sodoma e Gomorra (18, 1 - 19,38) que inicia-se na apario de YHWH -
E fez se v por YHWH nos carvalhos de Mamre, at a gerao (descendncia) dos
sobreviventes de Sodoma (L e suas filhas).
Schwantes aborda o capitulo (19) como uma unidade que recebeu diversos
adendos e incorporaes, por exemplo, no comeo quando foi integrado num s
conjunto, ao cap.18.5
H quem proponha subdividir este captulo em duas ou mais narraes, por exemplo
em que uma trata de L (v.1-28), e outra de suas filhas (v.29-38). o que se v , por
exemplo, na traduo do Joo Ferreira de Almeida, que encontra trs unidades em
nosso captulo. 6
A estreita relao entre o captulo 18 e 19, e a sequencia da narrativa em torno
de Abrao, L e suas filhas e a destruio de Sodoma e Gomorra no nos deixa dvida
de que uma diviso de percope nestes captulos custosa e pode comprometer a
anlise do texto. Mas levando em considerao que cada percope trabalha com seu
contexto, conclui-se que exegeticamente possvel trabalhar uma parte menor do
texto dentro de uma unidade maior.
Contudo, nossa percope de anlise Genesis 19, 30-38, que tem consistncia
dentro do cap. 18 e 19, ser estudada a partir de uma exegese nestes versculos que
mostram a posteridade de L, pai dos moabitas e amonitas.
5 SCHWANTES, Milton, Deus V Deus Ouve, 2013, p.137.
6 IDEM, p.140.
-
IV. Estrutura do Texto
A narrativa desta percope estrutura-se, com base em nove versos, mas
encabeada pela narrativa do verso 307 que faz uma transferncia (ligao) entre a
sada de L com suas filhas da cidade de Sodoma e a descendncia de L.
Estrutura do Captulo 198
Captulo 19
v.1-3 L, bom Hospedeiro
v.4-11 No, meus irmos
12-28 Um resgate difcil
v.31-38 Descendncia de L
Estrutura da percope (v.30-38)
I. Ttulo: L e Suas Duas Filhas (v.1 a)
1. Habitao Numa Caverna (v.1 b)
II. Inicio da Trama Para Conservar a Descendncia de l (v.31-32)
1. A velhice de L e o Costume de Toda Terra (v.31 b)
1.a. A Deciso das Filhas (v.31 a)
2. O Vinho Para Embriaguez (v.32)
2.a. A Preocupao Com a Descendncia (32 b)
III. A Embriaguez de L (33 35)
1. Incesto (33b , 35b)
2. L No Percebe (no deitar e no levantar) de Suas Filhas (v.33b , 35b) 7 Alguns biblistas entendem que o verso 29 tambm faz parte desta ligao, isso ser discutido na
coeso do texto. 8 SCHWANTES, Milton. 2013, p.147.149 -153
Quando Deus arrasou as cidades da
plancie, lembrou-se de Abrao e tirou
L do meio da catstrofe que destruiu
as cidades onde L vivia. L partiu de
Zoar com suas duas filhas e passou a
viver nas montanhas, porque tinha
medo de permanecer em Zoar. Ele e
suas duas filhas ficaram morando
numa caverna. 29-30 (NVI)
-
IV. A Concepo Das Filhas de L (v.36)
V. Moabe O filho da primognita (v.37)
1. O Surgimento dos Moabitas (v.37b)
VI. Amom o filho da mais nova (v.38)
1. O Surgimento dos Amonitas (v.38b)
-
V. Coeso do Texto
Dentro da estrutura do captulo 19, Kidner trata esta percope (19, 30-38) como
um eplogo: L e suas filhas9. Shcwantes entende que o verso 29 faz parte desta
ligao (29,30) que conclui a unidade do captulo 19, e o intitulou como As filhas: do
silncio a decises (v.29-38)10.
importante que se pense de fato na seguinte conjuno: 29, 30 fazem a ligao
ou uma espcie de introduo para dar base a narrativa seguinte das filhas que ao se
encontrarem morando em caverna (gruta), viu-se a semente do pai sendo ameaada
de extino.
A narrativa sobre as filhas no exclusividade tambm desta percope. J havia
sendo descritas nos versos anteriores: v.8, 12,15 e 16.
O que diferencia esta percope da unidade que o cap.19 e tem levantado
questionamento sobre sua posio neste captulo a genealogia (histria de
parentelas)11, o que no se encontra no cap. 18 e 19.
YHWH havia dado ordem para L escapar para o monte (montanha) no v.17, no
para Zoar, e do verso 24 a seguir YHWH comea a destruio de Sodoma, no qual a
esposa de L e seus genros (prometidos de suas filhas) tambm foram destrudos.
Com o extermnio de toda Sodoma, e a sobrevivncia de L e suas filhas necessrio
considerar esta percope como parte do cap.19.
modo de concluso, poder-se- destacar que as diversas partes deste captulo se
encaixam muito bem. Os v. 1-3 abrem a cena e, ao faz-lo, direcionam nosso cap.19
para o 18, o que de resto tambm se d pela preferncia a Abrao em v.27-29. Os v. 4-
11 enfocam o problema, a ameaa dos homens em visita casa de L. O conjunto
maior de versculos v.12-28 trata do resgate de L. O relativismo insucesso deste
prepara as cenas finais entre as duas filhas e seu pai na caverna. Eis, uma narrao
bem sequenciada. 12
9 KIDNER, Derek. 1979, p.126.
10 SCHWANTES, Milton. 2013, p.147.
11 IDEM, p.143.
12 IDEM, p.143.
-
VI. Anlise Semntica
Subiu L de Zoar e habitou no monte (caverna). bv,YEw (vayeshev) e ele habitou,
(morfologia em bv;y" particpio com valor substantivado. Apresenta sentido de
autoridade ou de habitante)13. Aparece duas vezes no verso 30, e ele habitou, e uma
vez tb,v,l (lashevet), para habitar, no mesmo sentido: L e suas filhas passou a ser
habitante, a povoar, ser morador das cavernas.
Ele e suas duas filhas. wyt'(nOb (venotayv) filhas dele. Aparece duas vezes no
verso 30, (tB substantivo comum feminino: filha), no v. 36 aparece novamente
(tAn*b) venot filhas de.
A primognita disse a menor: nosso pai j velho e no h homem na terra que
entre a ns. hr"ykiB.h; (habechirah) a primognita, h; particle article rykiB'
adjective feminine singular absolute 14 = primognita , primeiro parto, primicia de sua
virilidade. A palavra primognita (habechirah) aparece 5 vezes nesta percope (31, 33,
34 e 37), em todas relacionadas a hr"y[iC.h; (hatseirah) a mais nova, de ry[ic'
adjective feminine singular absolute15, a pequena, mida, a menor, caula.
v. 31 - A mais velha disse a mais nova (habechirah - hatseirah
v. 33 A mais velha deitou com o pai (habechirah)
v.34 Disse a mais velha mais nova (habechirah - hatseirah)
v. 35 A mais nova deitou com o pai (hatseirah)
Nosso pai j velho ( !qE+z" - zaqen) de !qz verb qal perfect 3rd person masculine
singular16
- ser um homem velho, idoso, tornou-se velho. [...] E no homem na terra
que entre a ns, segundo o costume de toda a terra. Algumas palavras aparecem
apenas aqui no verso 31: vyaiw> veish homem , (w> particle conjunction vyai noun 13
SCHOKEL, Luis Alonso. 1997, p.299. 14
BibleWorks. 15
BibleWorks. 16
BibleWorks.
-
common masculine singular absolute17
). #r - venishkevah26
bK;v.Tiw: - vatishkav27
Hb'k.viB. -beshichvah28 yTib.k;v'-!he shachavti-hen29
Bkv (raiz primitiva) deitar-se
(para descansar; relao sexual;
morrer; ou qualquer outro
propsito) ; -x absolutamente,
17
BibleWorks 18
BibleWorks. 19 l[; particle preposition suffix 1st person common plural homonym 2 20 l. particle preposition awb verb qal infinitive construct 21 &. particle preposition %r,D, noun common both singular construct 22
hqv verb hiphil imperfect 1st person common plural suffix 3rd person masculine singular 23 w> particle conjunction hqv verb hiphil waw consec imperfect 3rd person feminine plural 24
hqv verb hiphil imperfect 1st person common plural suffix 3rd person masculine singular 25
!yIy: noun common masculine singular absolute 26
w> particle conjunction bkv verb qal imperfect 1st person common plural 27
w> particle conjunction bkv verb qal waw consec imperfect 3rd person feminine singular 28
B. particle preposition bkv verb qal infinitive construct suffix 3rd person feminine singular
-
Deita-te com ele v. 34 ybik.vi - shichvi30
derrubar, cobrir(-se), deitar (-se),
fazer deitar, deitar para dormir,
deitar-se com, alojar, hospedar,
violentar, descansar, dormir, ficar.
STRONG, 2010,p.1964
Preservemos a Semente de
Nosso pai. V.32, 34
[r;z") zara 31 [r;z semente, sementeira,
posteridade, descendncia, prole.
STRONG, 2010,p 1622.
Passamos a analisar agora uma frase que se encontra em dois versos de nossa
percope: E ele no soube quando ela se deitou, nem quando ela se levantou v.33, 35.
As palavras: [d:y"-al{)w> - yada-velo32 (e ele no soube) , da raiz [dy conhecer, saber
(propriamente, constatar pela viso); palavra usada numa grande variedade de
sentidos, figurados, literais, em eufemismo e deduo (incluindo observao, cuidado,
reconhecimento, e causativo instruo, designao, punio, etc) [Como segue]: -
reconhecer, familiaridade, familiarizado com, aconselhar ... STRONG, 2010,p 1674.
Assim, na bebida, L sai de cena; seus ltimos atos no lhe so coneecidos (v. 35,36).
H ai um impactante jogo de sentidos: L no conhece ao conhecer! Ora, o verbo
conhecer seguidamente expressa, no hebraico, a relao sexual (Gnesis 4,1). Aqui,
nos v. 33.35, L no conhece (=percebe) ao conhecer (manter relaes sexuais).
Desumaniza-se! 33
As duas filhas conceberam (!'yr
-
LXX ? incerto; Moabe pai dos moabitas. Bem-Ami o nome do filho da mais nova
(!AM[;-ynE)b.) filho do meu povo35, pai dos filhos de Amon amonitas.
O dia at (at hoje)v.37, 38 (~AY*h;-d[;) = d[; particle preposition homonym 3 h;
particle article ~Ay noun common masculine singular absolute.
35
STRONG, 2010,p 1130.
-
VII. Data e Autoria
O cap. 19 de Gnesis complexo nos quesitos data e autoria. Algum redator
estava interessado em contar a histria de L e sua genealogia, ento comps este
texto (?). Surge a hiptese da nossa percope (v.30-38), dentro desta autoria
desconhecida:
1. Um redator escreve a histria (estria?) para narrar o surgimento dos moabitas
e amonitas, dando assim nfase ao modo imoral (incestuoso) pelo qual eles
surgiram, fundamentando ainda mais sua inimizade, ou no aceitao dos
moabitas e amonitas por parte dos hebreus.
A peculariedade desta percope faz-nos pensar que o redator queria claramente
afrontar os moabitas e amonitas, dando claramente sua origem como sendo de uma
relao imoral.
Schwantes diz que o texto do cap. 19 indica que sua origem (do texto) no
poderia ser to antiga, e que os exegetas adeptos da critica literria das fontes
designam seu autor como o javista, tido por muitos, do 10 sculo a. C.36 Seguimos por
este mesmo entendimento.
36
SCHWANTES, Milton. 2013, p.146.
-
VIII. Formas Literrias
Nossa percope pode ser entendida dentro da etiologia37, por se tratar de uma
narrativa que fornece uma explicao para um determinado nome ou situao. Para
tal deveramos considerar o acrscimo da LXX ao fazer o trocadilho com o nome
Moabe, semente de um pai.
Pode-se classificar tambm como genealogia, apesar de que no temos uma lista
grande (10 geraes / 14 geraes) que traa a descendncia ou parentesco, mas
temos as geraes de L Moabe e Amom.
Coats classifica nossa percope como saga familiar. Uma prosa longa, uma
narrativa tradicional tendo uma estrutura de episdios e desenvolvida ao redor de
temas ou assuntos esteiotipados. COATS, G, Comentrio a Genesis, p.319.
Talvez ela tenha um pouco da etiologia, e da genealogia, mas a forma mais
evidente desta percope seja de fato a saga.
37
Roland E. Murphy, O. Carm. Introduo ao Pentateuco.
-
IX. Contexto do Texto
A percope (v.30-38) est muito bem contextual com a histria de Abrao, afinal
de contas L era seu sobrinho. O contexto maior exatamente quando YHWH chama
Abro e lhe faz promessas (cap.12). Ao partir de em busca das promessas, Abro vai
acompanhado de L (12, 4). Na sequencia temos:
12, 10 ss Abro desce ao Egito
13, 1 ss Abro volta do Egito
13, 7 ss Abro e L se Separam
14, 1 ss Guerra dos Reis / L Levado Cativo / Abro Resgata L
15, 1 ss YHWH promete um filho a Abro / Sarai e Hagar
17, 1 ss Abro passa a se chamar Abrao
18, 1 ss Visitao de YHWH Abrao
19, 1 ss - Visitao de YHWH L / Destruio de Sodoma e Gomorra
A Descendncia de L cap. 19, 30-38
20, 1 ss Abrao Nega Sara em Gerar
21, 1 ss Nascimento de Isaque
22, 1 ss Sacrifico de Isaque
23, 1 ss Morte de Sara
24, 1 ss Isaque & Rebeca
25 A Morte de Abrao
O capitulo 19, este sim, est na continuidade da segunda parte do cap.18 e dos cap.
13-14. A destruio de Sodoma o assunto, em 19, 1-38. E aqui chega a concluso o
que iniciara no cap.13, o que da a esta narrao sobre a cidade, que acolhem L, uma
importncia especial. O final do cap.19 ainda parte desta composio, que vem
desde o cap.13. [...] O tema e o conto das duas filhas de L, que do continuidade
famlia, em meio s muitas runas, so um desafio para interpretao: havamos-nos
-
acostumado a entender as filhas de L como smbolo de decadncia, mas para o
(contexto do) cap. 19, esta no a tnica. 38
Sodoma, Gomorra e Zoar.
Sodoma39 cidade ao lado sul do mar morto, marcava o limite geogrfico dos
cananeus a sudeste, numa fronteira que comeava a sudoeste, em Gaza.
Aparentemente localizada numa regio frtil, conforme se conclui da escolha feita por
L para ali fixar moradia (Gn 13.10). A cidade se tornou um grande centro comercial, e
por isso, objeto de cobia por parte dos reis poderosos (Gn 14).
Entendo ser provvel que Sodoma e Gomorra se situavam, para o imaginrio de nosso
cap.19, onde em tempos histricos e at hoje est o mar morto, onde agora se cheira
enxofre (19,24), se v estelas de sal (19,26), onde, enfim, acabou a vida, devido a sais e
a falta de chuva. Sim, a junto s guas do mar tudo morto! Este o lugar por
assim dizer vivencial do cap. 19: atravs dele se explica porque aquelas guas se
tornaram antivida. Junto s guas a vida se foi! Um tal fenmeno raro da natureza
abriga a memria. O contexto humano e social do cap.19 deveras histrico, no
assim o local, a cidade, onde a narrao est ancorada. 40
Zoar nosso contexto menor, pois L pediu pra ir para Zoar (19 23). Depois
subiu L de Zoar e habitou no monte (caverna), conf. 19,30. Esta cidade ficava na
extremidade suleste do mar morto, posteriormente Moabe, filho de L, toma esta
cidade.
38
SCHWANTES, Milton, 2013, p.17,18. 39
HARRIS, R. Laird. ; ARCHER, Jr. Gleason L. & WALTKE, Bruce K. 1998, p.1466. 40
SCHWANTES, Milton, 2013, p.144.
-
X. Os Descendentes de L
Quase L morre em Sodoma. Os anjos insistiram com L para sarem de Sodoma,
tendo ele hesitado, foi levado a fora (19, 15-16). J em Zoar, nas montanhass,
encontra-se numa situao difcil, seus genros (prometidos) tinham achado que ele
estava brincando e no saiu de Sodoma, morreram l (19,14).
Com suas filhas (sua esposa havia se tornado uma esttua de sal conf. 19, 26),
nas montanhas, surge a questo: L no teria descendentes? A quem interessa saber a
de descendncia de L? Como esta trama ser contada?
A narrativa altamente estilizada: os nomes das filhas (a velha e a nova); a
facilidade como elas logram o pai e a descrio idntica de cada encontro. O
significado do sucinto relato do nascimento o de que as linhagens de Moab e Amon,
genealogicamente aparentadas de Israel, provm das filhas de L. O escrnio de Moab
e Amon (que mais tarde se tornaram inimigos de Israel) por nascerem de forma
ridcula e tipicamente oriental. O principal impulso da narrativa, entretanto, servir de
contraste entre Abrao e L. O Justo Abro espera pelo Senhor para lhe dar terras e
um filho. L e suas filhas esto sem nada, apenas tentando sobreviver. E ainda se
encontram nesta condio graas a sua relao com o escolhido Abrao. 41
Moabe Moabita
O filho da mais velha se tornou pai dos moabitas. Em deuteronmio 2, 10 YHWH
diz pra no perturbar os moabitas, nem os provoquem a guerra, pois Ele havia
entregado aquela regio aos descendentes de L (regio de Ar, habitada antigamente
pelos emins).
Foi Moabe que tentou contratar um profeta (Balao) para amaldioar Israel
(relato no livro de nmeros). Tambm praticou atos (rituais) de prostituio religiosa,
associados com sacrifcios de mortos (Nm 25). Vrios profetas dirigiram mensagens
contra Moabe: Ams (cap. 2), Isaas (15-16) , Jeremias (48) e Ezequiel (25).
41
BROW, Raymond E. ; FITZMYER, Joseph A & MURPHY, Roland E., 2007, p.89
-
Rute (a moabita), casou-se com Boaz e se tornou uma antepassada de Davi e do
Messias (livro de Rute). Mas foi tambm sob Davi que Israel conquistou as terras dos
moabitas. Eles conquistaram sua independncia apenas depois da morte de Acabe (2
Sm 8,2; 2 Rs 3, 4-27).
Amon Amonitas
O filho da mais nova torna-se o pai dos amonitas. Assim como aos moabitas,
YHWH no permitiu que Israel invadisse a terra dos amonitas (Nm 2,19), Israel tinha
que incluir Amon como seu parente.
Ao contrario do que fizeste a Moabe, Israel no atacou os amonitas (Dt 2,37), mas
tambm tiveram uma convivncia conflitante.
Os amonitas por sua vez, se uniram algumas vezes com os moabitas para tentar
arruinar Israel, por isso, de acordo com deuteronmio 23, perderam o direito de se
identificar com Israel por pelo menos dez geraes.
Salomo levou mulheres amonitas para seu arem (1 Rs 11), uma dessas mulheres
se chamava Naam, me de Roboo (1 Rs 14).
Os amonitas foram derrotados pelos israelenses em vrias ocasies: por Jeft (Jz
11), por Saul (1 Sm 11), por Davi (2 Sm 10;12). Os amonitas tinham seu prprio deus,
chamado Milcom (1 Rs 11.5). Tambm adorava camos, o deus de Moabe (Jz 11.29;
mencionado tambm na pedra moabita). As duas divindades tambm foram adoradas
pelos israelitas em certas oportunidades.
Os amonitas afligiram continuamente os descendentes de Abrao (Am 1. 12-15; Jr
40. 13; Ne 2. 10,19). Vrios profetas pronunciaram a maldio de Deus sobre eles (Sf
2.8-9; Jr 49. 1-6; Ex 25. 1-7). Ao invs de desfrutar as bnos da aliana, a atitude
deles para com o povo da aliana fez sobrevir-lhes a maldio divina. 42
42
HARRIS, R. Laird. ; ARCHER, Jr. Gleason L. & WALTKE, Bruce K. 1998, p.1136.
-
XI. Atualizao
Uma deciso errada e toda vida parece no se acertar mais. E se L tivesse
buscado se entender com Abrao (nem foram eles que se desentenderam foram os
pastores dos seus rebanhos), ao invs de seguir cada um pro seu lado, no poderiam
ter conversado e resolvido? E se L no tivesse escolhido ir pelo vale do Jordo? E se,
e se ?
O problema de L foi suas escolhas ou foi no ser escolhido? Talvez os dois. Mas
diante de tantos acontecimentos, poderamos dizer que L no foi destrudo em
Sodoma por causa da intercesso de Abrao junto a YHWH. A cidade no escapou,
afinal no tinha nem dez justos para livrar aquela cidade da destruio.
L recebeu a benevolncia da vida preservada por YHWH, ele e suas filhas. Mas seus
atos resultaram em consequncias desastrosas. Afinal melhor ter um futuro
desastroso ou ter filhos que carreguem o nome da famlia? Decises que pesam sobre
toda humanidade, at os dias de hoje.
-
Bibliografia
Bblias / Verses:
ALMEIDA, Joo Ferreira de. Trad. A Bblia Sagrada (revista e corrigida no Brasil). So
Paulo. Sociedade Bblica Brasileira, 1993.
BBLIA, Portugus. Bblia sagrada nova verso internacional. So Paulo: Geogrfica,
2000.
BBLIA. Portugus. Bblia sagrada. NVI. So Paulo: Vida, 2000.
BBLIA SAGRADA: Nova Traduo na Linguagem de Hoje (NTLH). Barueri/SP: Sociedade
Bblica do Brasil, 2000.
A BBLIA VIVA Editora Mundo Cristo, 2000.
Bblia Edio Pastoral, Paulinas, 1990.
Bblia de Jerusalm, 2012, Paulus.
Bblia Sagrada Edio Popular, 1976, Paulinas.
BHS Biblia Hebraica Stuttgartensia
FRANCISCO, Edson de Faria. Manual da Bblia Hebraica, Vida Nova, 2003, 715p.
Dicionrios:
HARRIS, R. Laird. ; ARCHER, Jr. Gleason L. & WALTKE, Bruce K. Dicionrio Internacional
de Teologia do Antigo Testamento, Vida Nova, 1998, 1789p.
STRONG, James. Lxico Hebraico, Aramaico e Grego. Sociedade Bblica do Brasil, 2002.
SCHOKEL, Luis Alonso. Dicionrio Bblico Hebraico Portugus. Paulos, 1997, 798p.
Comentrios:
BROW, Raymond E. ; FITZMYER, Joseph A & MURPHY, Roland E., Novo Comentrio
Bblico So Jernimo Antigo Testamento, Acadmia Crist & Paulus, 2007, 1263p.
KIDNER, Derek. Introduo e Comentrio de Gnesis, Vida Nova, 1979, 208p.
-
BRUCE, F.F. (org.). Comentrio Bblico NVI, editora Vida, 2008, 2271p.
SCHWANTES, Milton. Deus V, Deus Ouve ! Oikos, 2013, 280p.
ALTER, Robert. Genesis: translation and commentary. New York: Norton & Company, 1996 COATS, George W. Genesis: with an introduction to Narrative Literature. The Forms of the Old Testament Literature. Vol.1. Grand Rapids: Eerdmans, 1983 Teologia
RAD, Gerhard. Teologia do Antigo Testamento. Traduo Francisco Cato. 2ed. So Paulo: ASTE/Targumim, 2006 SCHMIDT, Werner H. A f no Antigo Testamento. Traduo Vilmar Schneider. So Leopoldo,RS: Sinodal, 2004 SELLIN, E.; FOHRER, G. Introduo ao Antigo Testamento Volumes 1 e 2. Traduo D.Mateus Rocha. So Paulo: Academia Crist; Paulus, 2012 ROSEL, Martin. Panorama do Antigo Testamento: Histria, Contexto, Teologia. Traduo deNelson Kilpp. So Leopoldo: Sinodal / EST, 2009 WOLFF, Hans Walter. Antropologia do antigo Testamento. Traduo Antonio Steffen. SoPaulo: Ed. Hagnos, 2007 Digital Bible Works