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 30 E p r ê c a  x e i n i s L c e s á t a QUÍMICA NOVA NA ESCOLA Experiências Lácteas N° 6, NOVEMBRO 1997 O leite recebe, no comércio, di- ferentes classificações base- adas em critérios que consi- deram desde a forma de ordenha até o transporte e o processamento. A T a- bela 1 resume alguns desses critérios.  Até que ponto essa classificação resulta em produtos uniformes? Ou seja, todos os leites do mesmo tipo (A, B, C etc.) são semelhantes? Têm o mesmo teor de nutrientes? Primeira experiência: comparação de diferentes tipos de leite quanto à quantidade de proteínas Nesta experiência serão separadas a caseína e a albumina, as principais proteínas do leite. É importante que cada grupo trabalhe com um tipo dife- rente de leite para que os resultados da classe possam ser comparados. É importante também comparar leites de mesmo tipo mas de diferentes fabri- cantes. Material por grupo 200 mL de leite de algum dos tipos indicados na Tabela 1 (o grupo que trabalhar com leite em pó deverá re- constituí-lo seguindo as instruções da embalagem) 10 mL de vinagre 2 pedaços de pano fino (20 cm x 20 cm aproximadamente) 2 béqueres de 250 mL Sistema para aquecimento (tripé com tela refratária, bico de gás) Procedimento geral  Aqueça o leite em um dos béque- res até ficar bem morno, mas sem fer- ver. Retire do fogo e acrescente vinagre aos poucos, até que se for- mem grumos de um material branco. Esse material é uma das proteínas do leite: a caseína. Coe a caseína utilizan- do um dos pedaços de pano, reco- lhendo o soro no outro béquer. Lave o béquer que continha o leite para utili- zação na próxima etapa. Julio Cezar Foschini Lisbôa Monique Bossolani A seção “Experimentação no ensino de química” descreve experimentos cuja implementação e interpretação contribuem para a construção de conceitos químicos por parte dos alunos. Os materi ais e reagentes utilizados são facilmente encontráveis, permitindo a realização dos experimentos em qualquer escola. Este número traz dois artigos, com cinco experiências relacionadas ao leite. No primeiro, são propostas três experiências: a primeira sugere um estudo comparativo de diversos tipos de leite por meio da separação de caseína e albumina; a segunda consiste na realização de testes que possam indicar a presença de alguns materiais estranhos ao leite como amido, ácido bórico e ácido salicílico, e a terceira mostra como proceder para obter o polímero formol-caseína a partir do leite. No segundo artigo são relatadas duas experiências: uma de determinação da acidez do leite e outra descrevendo a preparação de cola de caseína, um adesivo natural. características do leite, identificação de componentes do leite, fraudes do leite, polímero formol-caseína, acidez do leite, cola de caseína EXPERIMENTAÇÃO NO ENSINO DE QUÍMICA Cl assifica çã o do leite Caracterís ti ca s Tipo A Ordenha mecânica; pasteurização na própria granja leiteira Tipo “B” Ordenha mecânica; transporte sob refrigeração; pasteurização na usina Tipo COrdenha manual ou mecânica; transporte sem refrigeração às usinas para pasteurização Reconstituído Leite em pó ao qual se adicionou água Leite em pó Leite desidratado Leite longa vida Esterilizado pelo processo UHT (ultra high temperature), pelo qual o leite é aquecido durante 4 a 6 s a temperaturas próximas de 140 o C. T abela 1: Alguns tipos de leite. Tipos de Leite, Substâncias Estranhas e Obtenção de Plástico

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    E p r c ax e i n i sL c e s t a

    QUMICA NOVA NA ESCOLA Experincias Lcteas N 6, NOVEMBRO 1997

    Oleite recebe, no comrcio, di-ferentes classificaes base-adas em critrios que consi-deram desde a forma de ordenha ato transporte e o processamento. A Ta-bela 1 resume alguns desses critrios.

    At que ponto essa classificaoresulta em produtos uniformes? Ouseja, todos os leites do mesmo tipo(A, B, C etc.) so semelhantes? Tmo mesmo teor de nutrientes?

    Primeira experincia:comparao de diferentestipos de leite quanto quantidade de protenas

    Nesta experincia sero separadasa casena e a albumina, as principaisprotenas do leite. importante quecada grupo trabalhe com um tipo dife-rente de leite para que os resultadosda classe possam ser comparados. importante tambm comparar leites de

    mesmo tipo mas de diferentes fabri-cantes.

    Material por grupo200 mL de leite de algum dos tipos

    indicados na Tabela 1 (o grupo quetrabalhar com leite em p dever re-constitu-lo seguindo as instrues daembalagem)

    10 mL de vinagre2 pedaos de pano fino (20 cm x

    20 cm aproximadamente)2 bqueres de 250 mLSistema para aquecimento (trip

    com tela refratria, bico de gs)

    Procedimento geralAquea o leite em um dos bque-

    res at ficar bem morno, mas sem fer-ver. Retire do fogo e acrescentevinagre aos poucos, at que se for-mem grumos de um material branco.Esse material uma das protenas doleite: a casena. Coe a casena utilizan-do um dos pedaos de pano, reco-lhendo o soro no outro bquer. Lave obquer que continha o leite para utili-zao na prxima etapa.

    Julio Cezar Foschini LisbaMonique Bossolani

    A seo Experimentao no ensino de qumica descreve experimentos cuja implementao einterpretao contribuem para a construo de conceitos qumicos por parte dos alunos. Os materiais ereagentes utilizados so facilmente encontrveis, permitindo a realizao dos experimentos emqualquer escola.Este nmero traz dois artigos, com cinco experincias relacionadas ao leite. No primeiro, so propostastrs experincias: a primeira sugere um estudo comparativo de diversos tipos de leite por meio daseparao de casena e albumina; a segunda consiste na realizao de testes que possam indicar apresena de alguns materiais estranhos ao leite como amido, cido brico e cido saliclico, e a terceiramostra como proceder para obter o polmero formol-casena a partir do leite.No segundo artigo so relatadas duas experincias: uma de determinao da acidez do leite e outradescrevendo a preparao de cola de casena, um adesivo natural.

    caractersticas do leite, identificao de componentes do leite, fraudes do leite,polmero formol-casena, acidez do leite, cola de casena

    EXPERIMENTAO NO ENSINO DE QUMICA

    Classificao do leite Caractersticas

    Tipo A Ordenha mecnica; pasteurizao na prpriagranja leiteira

    Tipo B Ordenha mecnica; transporte sob refrigerao;pasteurizao na usina

    Tipo C Ordenha manual ou mecnica; transporte semrefrigerao s usinas para pasteurizao

    Reconstitudo Leite em p ao qual se adicionou guaLeite em p Leite desidratadoLeite longa vida Esterilizado pelo processo UHT (ultra high

    temperature), pelo qual o leite aquecido durante4 a 6 s a temperaturas prximas de 140 oC.

    Tabela 1: Alguns tipos de leite.

    Tipos de Leite, Substncias Estranhas eObteno de Plstico

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    QUMICA NOVA NA ESCOLA Experincias Lcteas N 6, NOVEMBRO 1997

    Aquea agora o soro, deixando-oferver. Aps algum tempo de fervura,formam-se grumos que so constitu-dos por outra protena do leite: a albu-mina. Tal como procedeu com a case-na, coe o material para reter a albumi-na no pano e recolha o soro em outrobquer, que j dever estar limpo.Guarde o soro para testes que serorealizados na prxima experincia.

    Compare as quantidades de case-na e de albumina que seu grupo obte-ve com as que outros grupos obtive-ram e registre as observaes anotan-do tipos e marcas de leite usados. Pro-cure ordenar os tipos de leite deacordo com a quantidade de cadaprotena que contm.

    Segunda experincia: testespara verificar a presena desubstncias estranhas ao leite

    Nesta parte da experincia sodescritos testes para verificar se no lei-te h amido, cido saliclico ou cidobrico. Estes foram escolhidos porempregarem materiais e reagentes defcil aquisio.

    Teste para amido

    MaterialLeite

    Soluo de iodo de farmciaTubo de ensaio (16 mm x 150 mm,

    aproximadamente)Cilindro graduado de 10 mL

    ProcedimentoColoque 10 mL de leite em um tubo

    de ensaio e aquea ligeiramente. Pin-gue de cinco a seis gotas de soluode iodo. Se o leite contiver amido,aparecer uma colorao que podeser azul, roxa ou quase preta. Essacolorao deve-se formao de umcomplexo de amido e iodo.

    Teste para cido saliclico esalicilatos

    MaterialSoro de leite (obtido na primeira

    experincia)Soluo aquosa de cloreto de ferro

    (III) - 2 g/100 mL (Fe Cl3 encontradoem lojas de materiais eletrnicos como nome de percloreto de ferro)

    Cilindro graduado de 10 mL

    ProcedimentoAcrescente de quatro a cinco gotas

    de soluo de cloreto de ferro (III) emcerca de 10 mL de soro. O apareci-mento de uma colorao que vai dorosa at o violeta indica a presena donion salicilato.

    Teste para cido brico

    MaterialLeiteGlicerinaSoluo aquosa de NaOH 0,1 mol/

    L (pode ser usada soda custica parapreparar a soluo)

    Soluo de fenolftalena a 0,5% (es-ta soluo pode ser obtida acrescen-tando-se dois comprimidos de Lacto-purga triturados a 50 mL de lcool.Acrescentam-se 50 mL de gua, agita-se bem e filtra-se. A soluo obtidaconter tambm lactose, que no inter-ferir no teste.)

    Tubo de ensaio (16 mm x 150 mm,aproximadamente)

    Cilindro graduado de 10 mL

    ProcedimentoAcrescente cerca de trs gotas de

    soluo de fenolftalena a 5 mL de leite.Junte gota a gota a soluo de NaOH0,1mol /L at o aparecimento de umaleve cor rsea. Acrescente ento 1 mLde glicerina. Se a cor rsea desapare-cer pode ser indcio da presena decido brico. Isso porque o H3BO3,que cido muito fraco em soluesaquosas, apresenta maior grau de io-nizao em glicerina, o suficiente parafazer desaparecer a colorao rsea.

    Terceira experincia:obteno do plstico formol-casena (galalite)

    Este foi um dos primeiros plsticosa ser utilizado. um polmero termo-fixo, isto , no amolece com o aqueci-mento e portanto no pode ser molda-do. Entretanto, pode ser lixado e poli-do. Teve amplo uso na fabricao debotes, pentes e cabos de facas.

    MaterialPano contendo a casena obtida na

    primeira experincia10 mL de formol (soluo de for-

    maldedo a 40 %)Tubo de ensaio

    ProcedimentoLave muito bem a casena, no pr-

    prio pano, para retirar todo o soro.Comprima bem o material obtido

    e d-lhe alguma forma, como porexemplo um dado, uma esfera etc.

    Mergulhe esse material em um tu-bo de ensaio contendo 10 mL de for-mol e deixe em repouso por dois ou

    Fraudes no leiteA qualidade do leite controlada pelos institutos de sade pblica por

    meio de testes especficos que envolvem determinao de densidade, teorde gordura, rancidez e acidez, e a presena de aditivos usados paraconservao ou de materiais estranhos ao leite para esconder seu batismocom gua. A tabela a seguir mostra alguns materiais que j foram encontra-dos no leite e sua funo no processo de fraude.

    Materiais Funo

    antibiticos conservar o leite, evitando a ao de microorganismos

    formol conservar o leite, evitando a ao de microorganismos

    urina disfarar a adio de gua ao leite, mantendo adensidade inicial

    amido disfarar a adio de gua ao leite, mantendo adensidade inicial

    cido saliclico e salicilatos conservar o leite, evitando a ao de microrganismos

    cido brico e boratos conservar o leite, evitando a ao de microrganismos

    bicarbonato de sdio disfarar o aumento de acidez do leite observadoquando ele est em estgio de deteriorao

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    QUMICA NOVA NA ESCOLA Experincias Lcteas N 6, NOVEMBRO 1997

    Referncias BibliogrficasBEHMER, M.L.A. Lacticnios. So

    Paulo: Melhoramentos, 3a edio 1965.VILLELA, G.G; Bacila, M & Tastaldi, H.

    Tcnicas e experincias de bioqumica. Riode Janeiro: Guanabara Koogan, 1973.

    trs dias. Aps esse tempo, retire-o doformol, lave bem e deixe secar ao ar.Depois de seco o objeto poder serlixado e polido.

    CUIDADO: o formol irritante, prin-cipalmente para os olhos.

    Questes propostas1. O que se observou quanto ao

    teor de protenas (casena e albumina)nos diferentes tipos de leite?

    2. A classificao do leite em umdeterminado tipo uniforme quantoaos teores de protenas?

    3. Que procedimento deve serseguido para confirmar se materiaisestranhos encontrados no leite cons-tituem fraude?

    4. Por que importante a remoodo soro do leite para a formao doplstico formol-casena?

    5. Se os diferentes tipos de leite

    forem deixados expostos ao ar, qualdever apresentar maior crescimentode fungos?

    Julio Cezar FJulio Cezar FJulio Cezar FJulio Cezar FJulio Cezar Foschini Lisbaoschini Lisbaoschini Lisbaoschini Lisbaoschini Lisba, licenciado emqumica professor titular e vice-diretor da Faculdadede Filosofia, Cincias e Letras da Fundao SantoAndr, em Santo Andr - SP. Monique BossolaniMonique BossolaniMonique BossolaniMonique BossolaniMonique Bossolani, licenciada em qumica pela Fundao Santo Andre monitora da disciplina qumica inorgnica noDepartamento de Cincias, na Faculade de Filosofia,Cincias e Letras da Fundao Santo Andr, emSanto Andr - SP.

    Um dos fatores que determinaa qualidade do leite a suaacidez. Por outro lado, a case-na, principal protena contida no leite,pode ser usada para a fabricao deum adesivo natural, bastante utilizadono passado. Neste artigo so relatadasduas experincias: uma de determina-o da acidez do leite e outra descre-vendo a preparao da cola de casena.

    Primeira experincia:determinao da acidez do leite

    O leite fresco levemente cido(acidez natural), devido presena decasena, fosfatos, albumina, dixido decarbono e citratos. A acidez podeaumentar atravs da hidrlise da lac-tose por enzimas microbianas (fermen-tao), que leva formao de cidoltico. Se essa acidez desenvolvida formuita elevada, o leite imprprio parao consumo, pois ela indica alta atividademicrobiana. Neste experimento, o quese determina a acidez total do leite, oque permite avaliar a sua qualidade(condies para consumo). A acidez se-r expressa em graus Dornic.

    Material e reagentes1 pipeta volumtrica de 10 mL

    1 erlenmeyer de 50 mL1 bureta de 10 mLSoluo de NaOH 1/9 mol/L (0,111

    mol/L), chamada de soda DornicAmostras de leite de origens ou

    marcas diferentesSoluo alcolica de fenolftalena

    Observaes1) A pipeta volumtrica e a bureta

    podem ser substitudas por seringasdescartveis e o erlenmeyer, por umcopo de vidro.

    2) A soluo de fenolftalena pode-r ser preparada a partir de um compri-mido de Lacto-purga (vide QumicaNova na Escola n 5, p. 28).

    CuidadosEvite o contato do NaOH e de sua

    soluo com a pele. Caso isso ocorra,lave a regio afetada com bastante gua.

    ProcedimentoColoque, com o auxlio da pipeta

    volumtrica, 10 mL de leite no erlen-meyer e, depois, adicione cerca de 10mL de gua. Adicione algumas gotasda soluo alcolica de fenolftalena.Encha a bureta com a soluo de sodaDornic e proceda a titulao do leiteat que ele adquira uma colorao r-

    sea persistente por cerca de um minu-to. Anote o volume de soda Dornicgasto. Repita esse procedimento paraas outras amostras de leite.

    Sabendo que cada 0,1 mL de sodaDornic gasto corresponde a uma aci-dez de um grau Dornic (1 D), calculea acidez das amostras de leite emgraus Dornic e conclua se as amostrasso prprias para consumo (acidezentre 16 e 20 D).

    DiscussoNos laticnios, a acidez do leite

    expressa em graus Dornic, fazendo-se a aproximao de que toda ela sedeve a cido ltico (CH3CHOHCOOH,M = 90,0 g/mol). Para 10 mL de leite,utiliza-se uma soluo de hidrxido desdio de concentrao 1/9 mol/L(0,111 mol/L), tal que cada 0,1 mL dasoluo neutraliza o equivalente a0,0010 g (1,0 mg) de cido ltico (essasoluo conhecida como sodaDornic). Neste caso, 0,1 mL de sodaDornic gasto na titulao correspondeao que se denomina de um grauDornic (1 D); assim, a acidez do leiteem graus Dornic pode ser calculadapor meio da seguinte regra de trs:

    0,1 mL de soda Dornic 1 Dx mL de soda Dornic gasta y D

    ObservaoA acidez do leite decorre da

    presena de cidos orgnicos fracos.Portanto, a simples medida do seu pHno permite o clculo da quantidade

    FERNANDES, J. Qumica analticaqualitativa. So Paulo: Hemus, 1982.

    AMBROGI, A.; LISBOA, J.C.F &SPARAPAM, F.R.F. Qumica para omagistrio. So Paulo: Editora Harbra,1995.

    Para saber mais:BENDER, A.E. Dicionrio de Nutrio

    e Tecnologia de Alimentos. Trad. da 4a.ed. So Paulo: Livraria Roca.

    VANIN, J.A. Alquimistas e qumicos -o passado, o presente e o futuro. SoPaulo: Editora Moderna, 1995.

    Qualidade do Leitee Cola de Casena

    Luiz Henrique FerreiraAna Maria G. Dias Rodrigues

    Dcio R. HartwigCesar Roberto Derisso(Grupo Qumica Legal)