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FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA PARAIBA – FESP CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
MAYARA RAYANNE OLIVEIRA DE ALMEIDA
MEDIDAS ASSECURATÓRIAS CAUTELARES REAIS NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL BRASILEIRO
CABEDELO-PB 2016
MAYARA RAYANNE OLIVEIRA DE ALMEIDA
MEDIDAS ASSECURATÓRIAS CAUTELARES REAIS NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL BRASILEIRO
Artigo Cienfífico apresentado à Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – FESP – Curso de Graduação em Direito – como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Processual Penal. Orientador: Prof. Esp. Ricardo Sérvulo Fonseca da Costa.
CABEDELO-PB 2016
MAYARA RAYANNE OLIVEIRA DE ALMEIDA
MEDIDAS ASSECURATÓRIAS CAUTELARES REAIS NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL BRASILEIRO
Artigo Científico apresentado à Banca Examinadora de Artigos Científicos da Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – FESP, como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.
APROVADO EM ____/_________________/2016
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________ Prof. Esp. Ricardo Sérvulo Fonseca da Costa
(ORIENTADOR)
__________________________________________ Prof. Ms. Rafael Pontes Vital
(MEMBRO – FESP)
__________________________________________ Profa. Ms. Luciana Vilar de Assis
(MEMBRO – FESP)
AGRADECIMENTOS
À minha mãe Magaly Agnes Oliveira de Almeida, advogada militante, por ter me incentivado a cursar direito e exercer com dignidade a missão jurídica. Ao meu pai Roberto Moreira de Almeida, Procurador Regional da República e professor, pelo exemplo de honra, honestidade e trabalho. Aos empregados da Fesp Faculdades, em especial a José Carlos, por toda paciência, compreensão e vontade em me auxiliar em todos os momentos em que necessitei nessa longa jornada. Ao meu orientador, Professor Ricardo Sérvulo Fonseca da Costa, pela paciência e profícua orientação do presente artigo científico. À professora Socorro Menezes, pelas lições de metodologia científica e pelas orientações na feitura final do presente trabalho acadêmico, permitindo que estivesse de acordo com as normas da ABNT. Enfim, a todos que contribuíram e torceram pela efetivação deste sonho que ora se concretiza com a construção deste TCC.
TERMO DE RESPONSABILIDADE/DIREITOS AUTORAIS
Eu MAYARA RAYANNE OLIVEIRA DE ALMEIDA, RG nº 3.784.876 SSDS/PB,
acadêmica do Curso de Bacharelado em Direito, autora do Trabalho de Conclusão
de Curso – TCC, intitulado MEDIDAS ASSECURATÓRIAS CAUTELARES REAIS
NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL BRASILEIRO orientado pelo professor
RICARDO SÉRVULO FONSECA DA COSTA, declaro para os devidos fins que o
TCC que apresento atendem as normas técnicas e científicas exigidas na
elaboração de textos, indicadas no Manual para Elaboração de Trabalho de
Conclusão de Curso da Fesp Faculdades. As citações e paráfrases dos autores
estão indicadas e apresentam a origem da ideia do autor com as respectivas obras e
anos de publicação. Caso não apresente estas indicações, ou seja, caracterize
crime de plágio, estou ciente das implicações legais decorrentes deste
procedimento.
Declaro, ainda, minha inteira responsabilidade sobre o texto apresentado no TCC,
isentando o professor orientador, a Banca Examinadora e a instituição de
qualquer ocorrência referente à situação de ofensa aos direitos autorais.
Cabedelo, PB, 07 de novembro de 2016
________________________________ MAYARA RAYANNE OLIVEIRA DE ALMEIDA
Matrícula nº 2015110072
S U M Á R I O RESUMO....................................................................................................................06 1 INTRODUÇÃO..................................................................................................06 2 ATRIBUTOS.....................................................................................................08 2.1 JURISDICIONALIDADE....................................................................................08 2.2 ACESSORIALIDADE, PREVENTIVIDADE E PROVISORIEDADE..................09 3 MEDIDAS CAUTELARES REAIS SEGUNDO O CPP.....................................10 3.1 SEQUESTRO....................................................................................................11 3.1.1 Conceito...........................................................................................................11 3.1.2 Objeto...............................................................................................................11 3.1.3 Fator Preponderante, Oportunidade e Competência...................................12 3.1.4 Legitimidade....................................................................................................12 3.1.5 Procedimento...................................................................................................13 3.1.6 Perda de Eficácia.............................................................................................13 3.1.7 Destinação dos Bens Sequestrados.............................................................14 3.2 HIPOTECA LEGAL............................................................................................14 3.2.1 Conceito...........................................................................................................14 3.2.2 Objeto...............................................................................................................14 3.2.3 Oportunidade...................................................................................................15 3.2.4 Legitimidade....................................................................................................15 3.2.5 Requisitos........................................................................................................18 3.2.6 Procedimento .................................................................................................19 3.3 ARRESTO.........................................................................................................19 3.3.1 Conceito...........................................................................................................19 3.3.2 Objeto...............................................................................................................20 3.3.3 Natureza Jurídica.............................................................................................21 3.3.4 Legitimidade....................................................................................................21 3.3.5 Procedimento...................................................................................................22 4 CONCLUSÕES.................................................................................................22 ABSTRACT................................................................................................................23 REFERÊNCIAS..........................................................................................................23
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MEDIDAS ASSECURATÓRIAS CAUTELARES REAIS NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL BRASILEIRO
MAYARA RAYANNE OLIVEIRA DE ALMEIDA
RICARDO SÉRVULO FONSECA DA COSTA
RESUMO
O presente artigo enfoca as medidas assecuratórias cautelares reais no Código de Processo Penal brasileiro. Trata em especial do sequestro que é a medida judicial a tornar indisponíveis os bens do indiciado ou réu adquiridos com os recursos da prática infracional penal; da hipoteca legal, que consiste no direito real de garantia a incidir sobre os bens imóveis pertencentes ao acusado da prática de um ilícito penal (patrimônio lícito do infrator), com o desiderato de reparar o dano causado à vítima, assim como o pagamento de futuras penas pecuniárias e/ou despesas processuais penais; e do arresto que representa a apreensão de certos bens do criminoso com o afã de garantir a reparação do dano causado pelo crime e/ou pagamento de eventuais penas pecuniárias e/ou despesas processuais penais. A temática é bastante instigante, o que vem despertando interesse em função da crescente demanda da sociedade em exigir que o criminoso promova a reparação do dano causado pelo crime e que exigem uma releitura, sobretudo após a Constituição Federal de 1988.
Palavras-chave: Medidas Assecuratórias. Cautelares Reais. Arresto, Sequestro e Hipoteca Legal.
1 INTRODUÇÃO
A prática do ilícito penal, além de causar lesão aos interesses da coletividade,
invariavelmente, gera danos materiais e/ou morais ao ofendido, o qual,
naturalmente, tem a expectativa de vir a ser um dia indenizado. As medidas
cautelares reais1, intituladas pelo Código de Processo Penal de medidas
assecuratórias, são as providências judiciais deliberadas no âmbito criminal (no bojo
do processo penal ou mesmo antes do oferecimento da denúncia ou queixa-crime)
com o desiderato de garantir ao ofendido pela infração penal o ressarcimento, a
indenização ou a reparação do dano decorrente da prática infracional, bem como
assegurar o pagamento futuro de valores fixados em penas pecuniárias e/ou
despesas processuais impostas nas sentenças condenatórias. Destinam-se,
Discente do Curso de Direito da FESP Faculdades e estagiária da Procuradoria da República no Estado da Paraíba. Ex-estagiária da Seção Judiciária Federal da Paraíba (João Pessoa/PB). E-mail: [email protected]. Advogado e professor da FESP Faculdades. Especialista em direito. 1 O Código de Processo Penal, ao lado das assecuratórias reais, prevê também medidas cautelares
de natureza pessoal, tais como, exempli gratia, a prisão preventiva do acusado. Estão correlacionadas com a sua liberdade de ir e vir.
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outrossim, a evitar que o criminoso aufira vantagens ou tenha por lucrativa a
atividade delituosa.
Diz-se que as medidas assecuratórias são reais porque incidem sobre bens
móveis e imóveis do criminoso. Para a sua concessão, em razão de sua natureza
cautelar, está sempre a depender da comprovação de dois elementos, quais sejam:
a) o periculum in mora: risco de dano irreparável decorrente da demora na
prestação jurisdicional; e b) o fumus boni juris: existência de pleito reparatório. A
rigor, o transcurso do tempo decorrente da demora na prestação jurisdicional, exige
que o Estado-juiz adote medidas urgentes com o afã de proteger e acautelar
determinados bens jurídicos. É nessa seara que se inserem as medidas cautelares
reais. Nesse diapasão, leciona Mendonça (2011, p. 23), in litteris:
Como é sabido, o tempo é inerente ao processo e, mais especificamente, ao procedimento. Durante a tramitação procedimental é intuitivo que haverá um lapso temporal, dentro do qual é possível que haja alterações fáticas que venham a comprometer o resultado final do processo […]. Justamente consciente desse risco é que o legislador processual estabelece medidas que seja aptas a evitar que o processo, quando chegue ao fim, seja inútil. Busca-se, por meio das medidas e procedimentos cautelares, assegurar o resultado útil de um processo de conhecimento e de execução. Para tanto, são estabelecidas medidas cautelares, com o intuito de se proteger e acautelar, durante o processo, bens jurídicos contra os perigos do tempo e, especialmente, contra a ação do investigado ou do réu...
No processo penal, este risco pode ser trazido sobretudo pela liberdade do
acusado, que poderá comprometer interesses relevantes ao longo do processo, seja
destruindo fontes de provas ou ameaçando testemunhas. As medidas cautelares
reais no CPP vieram substituir ao comando normativo contido no Decreto-lei n.º
3.240/1941, como bem recordaTucci (2014, p. 23):
Realmente, estabeleceu a ainda vigente Codificação processual penal o cabimento de sequestro de bens imóveis e móveis (destes, no caso de inadmissibilidade de busca e apreensão), adquiridos pelo indiciado com os proventos da infração, 'ainda que já tenham sido transferidos a terceiro, sempre que existentes indícios veementes da proveniência ilícita dos bens' (arts. 125, 126 e 132). Assim também, e obviamente nas mesmas circunstâncias, a hipoteca legal sobre imóveis pertencentes ao indiciado, com a correspondente efetivação de sequestro (arts. 134 a 136) extensivo, subsidiariamente a móveis (art. 137) e ambos com a finalidade de garantir o ressarcimento do dano causado ao ofendido e o pagamento das despesas processuais e da pena pecuniária (art. 140). […]. Dúvida não pode restar, portanto, acerca de que as referenciadas medidas cautelares constritivas patrimoniais passaram a reger-se pelo Código de Processo Penal de 1941, a partir de 1942, não mais incidindo sobre elas as normas do Dec-lei 3.240/41.
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No presente ensaio, examinaremos, sob a ótica dogmática, as aludidas
medidas precautórias no ordenamento jurídico brasileiro, eis que de suma
importância o estudo das referenciadas medidas cautelares constritivas patrimoniais
que se encontram inseridas no corpo do vetusto Código de Processo Penal
brasileiro, mas de grande aplicabilidade na atualidade.
2 ATRIBUTOS
Pode-se dizer que quatro são os atributos comuns às medidas cautelares
reais no processo criminal brasileiro:
2.1 JURISDICIONALIDADE
A medida acautelatória é matéria sujeita à reserva de jurisdição, não obstante
possa ser decretada antes ou depois de oferecida a denúncia ou a queixa-crime.
Não cabe, por exemplo, à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), decretar
sequestro, arresto ou hipoteca legal no ordenamento jurídico brasileiro. Nesse
sentido, os seguintes arestos:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO CONCESSIVA DE LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA: DESCABIMENTO: EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. I. Comissão Parlamentar de Inquérito: "poderes de investigação próprios das autoridades judiciais (CF, art. 58, § 3º): inteligência: liminar deferida para sustar os efeitos de decisão da CPI que decretou indisponibilidade de bens e a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico de cidadão sujeito a investigação: fundamentos. II. Agravo regimental interposto pelo Presidente da CPI: razões de manutenção da decisão liminar agravada e do não conhecimento do agravo, conforme a jurisprudência consolidada no STF, malgrado reiteradas objeções do relator, depois rendido
2.
EMENTA: COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO: MS CONTRA DECISÃO DE CPI QUE DECRETOU A INDISPONIBILIDADE DE BENS E A QUEBRA DE SIGILOS DO IMPETRANTE: PROCEDÊNCIA, NO MÉRITO, DOS FUNDAMENTOS DA IMPETRAÇÃO, QUE, NO ENTANTO, SE DEIXA DE PROCLAMAR, DADO QUE O ENCERRAMENTO DOS TRABALHOS DA CPI PREJUDICOU O PEDIDO DE SEGURANÇA. 1. Incompetência da Comissão Parlamentar de Inquérito para expedir decreto de indisponibilidade de bens de particular, que não é medida de instrução - a cujo âmbito se restringem os poderes de autoridade judicial a elas conferidos no art. 58, § 3º - mas de provimento cautelar de eventual sentença futura, que só pode caber ao Juiz competente para proferi-la.
2 STF, MS: 23466 DF, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, Data de Julgamento: 01/07/2014, Tribunal
Pleno, Data de Publicação: DJ 06-04-2015, PP-00071, EMENT VOL-02026-15, PP-00683.
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2. Quebra ou transferência de sigilos bancário, fiscal e de registros telefônicos que, ainda quando se admita, em tese, susceptível de ser objeto de decreto de CPI - porque não coberta pela reserva absoluta de jurisdição que resguarda outras garantias constitucionais -, há de ser adequadamente fundamentada: aplicação no exercício pela CPI dos poderes instrutórios das autoridades judiciárias da exigência de motivação do art. 93, IX, da Constituição da República. 3. Sustados, pela concessão liminar, os efeitos da decisão questionada da CPI, a dissolução desta prejudica o pedido de mandado de segurança
3.
Nota-se, portanto, que as medidas acautelatórias penais estão sujeitas à
apreciação do Poder Judiciário, eis que não cabe sequer às Comissões
Parlamentares de Inquérito o seu decreto, mesmo em estando presentes os
requisitos legais para a sua decretação.
2.2 ACESSORIALIDADE, PREVENTIVIDADE E PROVISORIEDADE
Toda medida assecuratória é tida como providência cautelar acessória, pois,
quando acatada, o é de forma preventiva ou incidental ao próprio processo penal ou
na fase inquisitorial. Possui, destarte, caráter instrumental. A medida cautelar real é
tomada de forma preventiva, ou seja, tem por escopo proteger, em princípio, os
direitos da vítima até que sobrevenha sentença definitiva.
Em caso de a sentença vir a ser absolutória ou o juízo decretar a extinção da
punibilidade do réu, as medidas deferidas em sede cautelar devem ser levantadas
ou canceladas (CPP, art. 141). É digno de nota, todavia, esclarecer que a simples
suspensão da pretensão punitiva do Estado, decretada em qualquer grau de
jurisdição, não terá o condão de levantar o arresto ou cancelar a hipoteca. Nesse
diapasão, o seguinte julgado4:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. INFRAÇÃO À ORDEM TRIBUTÁRIA. ARTS. 1º, I, II, III E V, E 2º, I, DA LEI N. 8.137/90 E 288 DO CP. ADESÃO A PROGRAMA DE PARCELAMENTO DA DÍVIDA. SUSPENSÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO. LEVANTAMENTO DO SEQUESTRO E CANCELAMENTO DA HIPOTECA LEGAL DOS BENS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. 1. A adesão a programa de parcelamento de dívida fiscal não implica, de forma necessária, a extinção da punibilidade, que está condicionada ao pagamento integral do débito. 2. No caso, somente se evidenciou a suspensão da pretensão punitiva em razão de adesão a programa de recuperação fiscal, consequentemente,
3 STF, MS: 23480 RJ, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, Data de Julgamento: 04/05/2013, Tribunal
Pleno, Data de Publicação: DJ 15-09-2013 PP-00119 EMENT VOL-02004-01 PP-00061. 4 STJ, AgRg no REsp: 1177748 RS 2010/0014886-4, Relator: Ministro Sebastião Reis Júnior, Data de
Julgamento: 12/04/2012, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/05/2012.
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inadequado o levantamento das constrições judiciais (art. 9º da Lei n. 9.964/2000). 3. A garantia prestada para a homologação da opção pelo Refis é de natureza administrativa e não pode substituir as medidas assecuratórias judiciais. 4. A tese esposada pelo Tribunal Regional consolidou-se em reiterados julgados deste Tribunal (Súmula 83/STJ). 5. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão agravada. 6. Agravo regimental improvido.
Portanto, os casos de desfazimento automático das medidas assecuratórias
são taxativos (numerus clausus), ou seja, somente são aceitos na hipótese de
decisão judicial transitada em julgado ou por decretação da extinção da punibilidade
por sentença irrecorrível. Uma vez decretada a medida assecuratória, no processo
criminal ou quando da tramitação do inquérito policial, a decisão não tem o cunho de
definitividade, pois pode vir a ser revogada ou modificada a qualquer tempo.
3 MEDIDAS CAUTELARES REAIS SEGUNDO O CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
O Capítulo VI do Título VI do Código de Processo Penal, intitulado “DAS
MEDIDAS ASSECURATÓRIAS”, nos artigos 125 a 144, trata expressamente de três
medidas cautelares reais: a) sequestro (CPP, arts. 125 a 133); b) hipoteca legal
(CPP, arts. 134 e 135); e c) arresto (CPP, arts. 136 a 144). Vale registrar, como é
cediço, que a busca e apreensão e a restituição de coisas apreendidas poderiam
tranquilamente ter sido incluídas como medidas assecuratórias, mas o legislador
processual penal resolveu inseri-las em capítulos diversos do CPP.
Com efeito, o pedido de restituição de coisas apreendidas foi traçado nos arts.
118 a 124 do Código de Processo Penal (espécie das questões e processos
incidentes) e a busca e apreensão veio traçada nos arts. 240 a 250 do mesmo
diploma legal (capítulo de prova). Estudaremos no presente ensaio as medidas
cautelares reais ou as medidas assecuratórias, segundo a sistemática dogmática
traçada pelo CPP, não obstante se diga que, com o advento das Leis n.º 9.613/98,
11.343/06 e 12.694/12, a distinção tradicional entre sequestro, arresto e hipoteca
legal tenha perdido relevância, eis que aludidos diplomas legais, hodiernamente,
tratam genericamente o tema como sendo indisponibilidade geral de ativos.
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3.1 SEQUESTRO
3.1.1 Conceito
Segundo Mirabete (2015, p. 236), “o sequestro é retenção judicial do bem
imóvel ou móvel, havido com os proveitos da infração, com o fim de assegurar as
obrigações civis advindas deste”. Sequestro é a medida judicial que torna
indisponíveis os bens do indiciado ou réu adquiridos com os recursos da prática
infracional penal.
3.1.2 Objeto
Tornaghi (2013, p. 254) faz severas críticas ao emprego do termo sequestro
pelo CPP, nos seguintes termos: “o Código de Processo Penal não empregou a
palavra sequestro em seu sentido estrito e técnico: deu-lhe compreensão
demasiadamente grande, fazendo entrar nela não apenas o que tradicionalmente se
costuma denominar sequestro, mas também outros institutos afins e, especialmente,
o arresto”.
Nas palavras de Polastri (2014, p. 140), “é o sequestro cabível quando
demonstrado que os bens adquiridos são produtos do crime ou foram adquiridos
com o proveito da prática delituosa (fumus boni juris). Destarte, para sua
caracterização não se indaga se a propriedade dos bens é controvertido, como no
Processo Civil, pois aqui, o que dá especificidade a esses bens é terem sido
adquiridos e pagos com haveres obtidos por meios criminosos”.
De fato, pode-se empregar no processo penal o termo sequestro para a
constrição de bens imóveis (CPP, art. 125) ou de bens móveis (CPP, art. 132)5, os
quais necessariamente tenham sido adquiridos com o proveito do crime (proventos
do delito), estejam em poder do indiciado ou acusado ou mesmo quando já tenham
sido transferidos a terceiros, salvo se o terceiro provar sua boa-fé, através da
interposição de embargos.
Nos termos dos §§ 1.º e 2.º do artigo 91 do Código Penal, incluídos pela Lei
n.º 12.694/12, podem se sujeitar ao sequestro os bens ou valores equivalentes ao
produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se
5 Os bens móveis que são produtos diretos da infração penal não se sujeitam a sequestro, mas a
busca e apreensão, nos termos dos dispositivos legais inseridos nos art. 240 a 250 do Código de Processo Penal.
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localizarem no exterior. Por seu turno, o Decreto-lei n.º 3.240, de 8 de maio de 1941,
passou a disciplinar o sequestro de bens de pessoas indiciadas por crimes de que
resulta prejuízo para a Fazenda Pública.
3.1.3 Fator Preponderante, Oportunidade e Competência
O fator preponderante para a decretação do sequestro é a existência de
indícios veementes da proveniência ilícita dos bens. O sequestro pode ser decretado
em qualquer fase do processo penal ou mesmo antes de oferecida a denúncia ou
queixa-crime como medida cautelar, visando evitar futuros danos ao processo.Nesse
sentido, o seguinte julgado:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO CONCESSIVA DE LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA: DESCABIMENTO: EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. I. Comissão Parlamentar de Inquérito: "poderes de investigação próprios das autoridades judiciais (CF, art. 58, § 3º): inteligência: liminar deferida para sustar os efeitos de decisão da CPI que decretou indisponibilidade de bens e a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico de cidadão sujeito a investigação: fundamentos. II. Agravo regimental interposto pelo Presidente da CPI: razões de manutenção da decisão liminar agravada e do não conhecimento do agravo, conforme a jurisprudência consolidade no STF, malgrado reiteradas objeções do relator, depois rendido
6.
Destarte, a aplicação do sequestro é medida atribuída a autoridade investida
de jurisdição, pois não poderá ser decretada por autoridade policial ou mesmo por
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que possuem poderes de investigação
próprios das autoridades judiciais, nos limites do art. 58, § 3º, da Constituição da
República Federativa do Brasil.
3.1.4 Legitimidade
Nos termos do art. 124 do Código de Processo Penal, o juiz poderá decretar o
sequestro: a) ex officio; b) a requerimento do Ministério Público ou do ofendido; ou c)
por representação da autoridade policial. Tratando-se de um sistema
verdadeiramente acusatório, tal qual o programado para existir a partir do advento
da Constituição Federal de 1988, não haveria espaço para se decretar a medida de
6 STF, MS 23466 DF, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, Data de Julgamento: 01/07/2011, Tribunal
Pleno, Data de Publicação: DJ 06-04-2012 PP-00071, EMENT VOL-02026-04, PP-00683.
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tal jaez pelo juiz (haja vista não dever, via de regra, exercer atividade investigativa)
nem pela polícia (pelo fato de não caber ao órgão policial capacidade postulatória).
A propósito, há entendimento firmado pela 2ª Câmara de Coordenação e
Revisão do Ministério Público Federal (Procedimento n.º 1.00.001.000095/2010),
posicionamento confirmado pelo Conselho Superior do MPF, no sentido de que a
autoridade policial não teria legitimidade para representar diretamente ao magistrado
para a decretação de qualquer medida cautelar, eis que a titularidade de tais
demandas incumbiria com exclusividade ao Ministério Público. Nada impediria, por
consectário lógico, que a polícia apresentasse o pleito ao Parquet e este, conforme o
entendesse pertinente, o encaminharia ao Poder Judiciário.
3.1.5 Procedimento
Autuado em apartado o requerimento do Ministério Público ou do ofendido, o
juiz examinará se estão presentes os requisitos para a decretação do sequestro e,
em caso positivo, decidirá favoravelmente independentemente da oitiva prévia da
parte contrária (decisão inaudita altera parte). O juiz ordenará, tratando-se de bem
imóvel, a inscrição do sequestro no Registro de Imóveis. A decisão que defere ou
indefere o sequestro é recorrível mediante apelação (CPP, art. 593, II).
É possível, todavia, a interposição de embargos, perante o próprio juízo
criminal: a) pelo acusado: sob o fundamento de não terem os bens sido adquiridos
com os proventos da infração; ou b) por terceiro, a quem houverem os bens sido
transferidos a título oneroso: sob o fundamento de tê-los adquirido de boa-fé.
Esses embargos podem vir a ser ajuizados a qualquer tempo, mas somente serão
julgados após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (CPP, art. 130,
parágrafo único).
3.1.6 Perda de Eficácia
A medida assecuratória de sequestro, conforme já ilustrado acima, tem
caráter provisório, eis que pode vir a ser revogada ou substituída a qualquer tempo.
Nos termos dos incs. I a III do art. 131 do CPP, o sequestro será levantado, isto é,
perderá a eficácia:
a) se a ação penal não for ajuizada no prazo de sessenta dias, contado da
data em que ficar concluída a diligência;
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b) se o terceiro, a quem tiverem sido transferidos os bens, prestar caução
suficiente a garantir o valor que constitua o proveito do agente com a prática
delituosa; ou
c) se for julgada extinta a punibilidade ou absolvido o réu, por sentença
transitada em julgado.
3.1.7 Destinação dos Bens Sequestrados Uma vez não interpostos os embargos ou não tendo sido estes acolhidos,
depois do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, o juiz, de ofício ou a
requerimento do interessado, como já salientado supra, determinará a avaliação e a
venda dos bens em hasta pública. O dinheiro arrecadado será destinado para a
satisfação do lesado ou de terceiro de boa-fé. Se houver sobra de numerário, será
revertida em favor do Tesouro Nacional. É plenamente possível, conforme já
estudado, nas hipóteses legalmente previstas e havendo autorização judicial, a
utilização dos bens sequestrados por órgãos e entidades da administração pública.
3.2 HIPOTECA LEGAL 3.2.1 Conceito
A hipoteca legal ou pedido de especialização de hipoteca legal é a segunda
medida assecuratória tratada no Código de Processo Penal. Ela consiste no direito
real de garantia que incide sobre bens imóveis pertencentes ao acusado da prática
de um ilícito penal (patrimônio lícito do infrator), com o desiderato de reparar o dano
causado à vítima, assim como pagamento de futuras penas pecuniárias e/ou
despesas processuais penais. Diz-se hipoteca legal, eis que derivada do comando
normativo insculpido nos arts. 134 e 135 do CPP. Presentes os requisitos legais,
basta que o ofendido requeira a sua especialização e o magistrado determine a sua
subsequente inscrição no registro imobiliário.
3.2.2 Objeto
A hipoteca legal, como antes já salientado, há de recair sobre o patrimônio
imobiliário lícito ou não litigioso do réu ou indiciado. Nesse sentido, expõe Costa
(2012, p. 145): “o legislador do processo penal, mais inteligente e num terreno em
que, naquele processo, mais desenvolvimento tiveram as medidas preventivas,
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manda fazer a hipoteca legal em bens do acusado, em garantia da indenização
devida à vítima, em qualquer fase do processo, desde que haja certeza da infração e
indícios suficientes da autoria. Como não esteja fixada na sentença a importância do
dano, faz-se por arbitramento a avaliação da responsabilidade”.
Impende destacar, sobretudo em razão da importância do tema, que a
proteção legal de bem de família não pode vir a ser utilizada como argumento a se
impedir a decretação da hipoteca legal. De fato, nos termos do inc. VI do art. 3.º da
Lei n.º 8.009/90, a impenhorabilidade não pode ser acolhida “por ter sido adquirida
com produto do crime ou para execução de sentença penal condenatória a
ressarcimento, indenização ou perdimento de bens”.
3.2.3 Oportunidade
Pela literalidade do art. 134 do Código de Processo Penal, “a hipoteca legal
sobre os imóveis do indiciado poderá ser requerida pelo ofendido em qualquer fase
do processo, desde que haja certeza da infração e indícios suficientes da autoria”.
Diversamente do sequesto, a hipoteca legal somente poderá ser requerida, portanto,
no bojo do “processo penal”. Nesse sentido, também se posiciona Pitombo (2013, p.
44), in verbis:
“A hipoteca legal, contudo, ao contrário do sequestro (art. 127, do Cód. de Proc. Penal), não lhe pode requerer a inscrição, em mera fase policial. O requerimento, portanto, repita-se, deve vir em qualquer fase do processo (art. 134, do Cód. de Proc. Penal). […]. A inscrição da hipoteca legal há de pedir-se em Juízo, e depois do despacho de recebimento da denúncia, ou da queixa, peças iniciais da acusação (art. 394, do Cód. de Proc. Penal). A contar deste momento inexiste indiciado, na melhor técnica, mas sim acusado, réu...”.
Entrementes, da mesma forma que o sequesto, e não há qualquer razão para
dar tratamento jurídico diverso, advogamos a tese segundo a qual a especialização
da hipoteca legal poderá ser decretada antes ou depois do oferecimento da
denúncia ou queixa-crime, ou seja, no curso do processo penal (como recomenda o
dispositivo legal) ou na fase do inquérito policial.
3.2.4 Legitimidade
O pedido de hipoteca legal poderá vir a ser formulado pelo Ministério Público
ou pelo ofendido, seu representante legal ou herdeiros. O art. 142 do Código de
Processo Penal dispõe caber ao Ministério Público promover a especializaçao da
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hipoteca legal sempre que houver interesse da Fazenda Pública ou se o ofendido for
pobre e o requerer. Essas hipóteses, a rigor, merecem ser devidamente
esclarecidas. A priori, o interesse público defendido pelo Ministério Público não se
confunde com o interesse da Fazenda Pública. A propósito, reza o inc. IX do art. 129
da Constituição Federal ser vedado ao Parquet “a representação judicial e a
consultoria jurídica de entidades públicas”. Destarte, se houver mero interesse
patrimonial de ente da Administração Pública, haverá de ser requerida a
especialização da hipoteca legal, por seu representante legal. Nesse sentido, o
seguinte julgado:
EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADO. INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NÃO-OBRIGATORIEDADE. INTERESSE PATRIMONIAL DA FAZENDA QUE, POR SI SÓ, NÃO SE IDENTIFICA COM O "INTERESSE PÚBLICO" A QUE ALUDE O ART. 82 DO CPC. 1. A divergência jurisprudencial ensejadora do conhecimento do recurso especial pela alínea c deve ser devidamente demonstrada, conforme as exigências dos arts. 541, § único, do CPC e 255, §§ 1º E 2º, do RISTJ. 2. Está assentada nesta Corte orientação no sentido de que o interesse patrimonial da Fazenda Pública, por si só, não se identifica com o "interesse público" a que alude o art. 82, III, do CPC, para fins de intervenção do Ministério Público no processo. No presente caso, o interesse se situa no âmbito ordinário da administração pública (ação de cobrança em face de Município), não sendo obrigatória a intervenção do MP na condição de custos legis. 3. Recurso especial a que se nega provimento
7.
Por seu turno, também não incumbe ao Ministério Pùblico a realização da
defesa de interesse de pobres individualmente identificados no processo brasileiro.
Com efeito, nos termos do inc. LXXIV do art. 5.º da Constituição Federal, “o Estado
prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de
recursos”. Essa tarefa, a rigor, é da alçada da Defensoria Pública. De fato, a
Defensoria Pública corresponde a instituição essencial à função jurisdicional do
Estado incumbida da orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos
necessitados ou hipossuficientes, na forma da lei. Não obstante, sendo o ofendido
pobre, na forma da lei, não existindo Defensoria Pública instalada na comarca ou na
subseção judiciária e se houver prévio requerimento, o Ministério Público tem
legitimidade para agir como substituto processual do hipossuficiente no pleito
indenizatório.
7 STJ, REsp: 777196 CE 2005/0142023-3, Relator: Ministro Teori Albino Zavascki, Data de
Julgamento: 04/11/2014, T1 - Primeira Turma, Data de Publicação: DJe 12/11/2014.
17
Nesse sentido, é aplicável à matéria o entendimento oriundo do Pretório
Excelso ao aplicar a teoria da inconstitucionalidade progressiva, quando considerou
a norma encartada no art. 68 do CPP ainda constitucional, em estágio intermediário
e de caráter transitório. Tal pensamento é plenamente aplicável ao art. 142 do CPP.
A decisão está assim ementada:
EMENTA: MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO CIVIL "EX DELICTO". LEGITIMIDADE. CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, ART. 68. NORMA AINDA CONSTITUCIONAL. ESTÁGIO INTERMEDIÁRIO - DE CARÁTER TRANSITÓRIO - ENTRE A SITUAÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE E O ESTADO DE INCONSTITUCIONALIDADE. A QUESTÃO DAS SITUAÇÕES CONSTITUCIONAIS IMPERFEITAS. SUBSISTÊNCIA DO ART. 68 DO CPP, ATÉ QUE SEJA INSTITUÍDA E REGULARMENTE ORGANIZADA, PELO ESTADO DE SÃO PAULO, A DEFENSORIA PÚBLICA LOCAL. PRECEDENTES. A controvérsia constitucional objeto do recurso extraordinário, a que se refere o presente agravo de instrumento, já foi dirimida pelo Supremo Tribunal Federal, cujo Plenário, ao julgar o RE 135.328/SP, Rel. Min. MARÇO AURÉLIO, fixou entendimento no sentido de que, enquanto o Estado de São Paulo (RTJ 177/879) não instituir e organizar a Defensoria Pública local, tal como previsto na Constituição da República, subsistirá íntegra a regra inscrita no art. 68 do CPP, na condição de (art. 134) norma ainda constitucional - que configura um transitório estágio intermediário situado "entre os estados de plena constitucionalidade ou de absoluta inconstitucionalidade" -, mesmo que tal preceito legal venha a expor-se, em face de modificações (GILMAR FERREIRA MENDES, "Controle de Constitucionalidade", p. 21, 1990, Saraiva) supervenientes das circunstâncias de fato, a um processo de progressiva inconstitucionalização, como registra, em lúcida abordagem do tema, a lição de ROGÉRIO FELIPETO. É que a omissão estatal, no adimplemento de imposições ditadas pela Constituição ("Reparação do Dano Causado por Crime", p. 58, item n. 4.2.1, 2001, Del Rey) - à semelhança do que se verifica nas hipóteses em que o legislador comum se abstém, como no caso, de adotar medidas concretizadoras das normas de estruturação orgânica previstas no estatuto fundamental - culmina por fazer instaurar "situações constitucionais imperfeitas", cuja ocorrência justifica "um tratamento diferenciado, não necessariamente (LENIO LUIZ STRECK," Jurisdição Constitucional e Hermenêutica ", p. 468-469, item n. 11.4.1.3.2, 2002, Livraria do Advogado Editora) reconduzível ao regime da nulidade absoluta", em ordem a obstar o imediato reconhecimento do estado de inconstitucionalidade (J. J. GOMES CANOTILHO, "Direito Constitucional", p. 1.022, item n. 3, 5ª ed., 1991, Almedina, Coimbra - grifei) no qual eventualmente incida o Poder Público, por efeito de violação negativa do texto da Carta Política. É por essa razão que HUGO NIGRO MAZZILLI, ao destacar o caráter residual (RTJ 162/877, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno) da aplicabilidade do art. 68 do CPP - ("A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo", p. 72, item n. 7, nota de rodapé n. 13, 14ª ed., 2002, Saraiva) que versa hipótese de legitimação ativa do Ministério Público, em sede de ação civil "ex delicto" - assinala, em observação compatível com a natureza ainda constitucional da mencionada regra processual penal, que "Essa atuação do Ministério Público, hoje, só se admite em caráter subsidiário, até que se viabilize, em cada Estado, a implementação da defensoria pública, nos termos do art. 134, parágrafo único, da CR" .Daí a exata afirmação feita pelo eminente Ministro TEORI ALBINO ZAVAS (...) CK I , cuja lição, a propósito do tema ora em exame, põe em evidência o relevo ("Eficácia das Sentenças na Jurisdição Constitucional", p. 115/116, item n. 5.5, 2001, RT) que podem assumir, em
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nosso sistema jurídico, as transformações supervenientes do estado de fato:"Isso explica, também, uma das técnicas de controle de legitimidade intimamente relacionada com a cláusula da manutenção do estado de fato: a da 'lei ainda constitucional'. O Supremo Tribunal Federal a adotou em vários precedentes (...). Com base nessa orientação e considerando o contexto social verificado à época do julgamento, o Supremo Tribunal Federal rejeitou a arguição de inconstitucionalidade da norma em exame, ficando claro, todavia, que, no futuro, a alteração do status quo poderia ensejar decisão em sentido oposto."(grifei) Cabe referir, por necessário, que esse entendimento tem sido observado em sucessivas decisões proferidas por esta Suprema Corte (RTJ 178/423, Rel. Min. MOREIRA ALVES - RE 196.857-AgR/SP, Rel. Min. ELLEN GRACIE - RE 208.798/SP, Rel. Min. SYDNEY SANCHES - RE 229.810/SP, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA - RE 295.740/SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - RE 341.717/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO), como o demonstra o julgamento do RE 147.776/SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, efetuado pela Colenda Primeira Turma deste Tribunal :"Ministério Público:(RTJ 175/309-310) legitimação para promoção, no juízo cível, do ressarcimento do dano resultante de crime, pobre o titular do direito à reparação: C. Pr. Pen., art. 68, ainda constitucional (cf. RE 135328): processo de inconstitucionalização das leis.1. A alternativa radical da jurisdição constitucional ortodoxa, entre a constitucionalidade plena e a declaração de inconstitucionalidade ou revogação por inconstitucionalidade da lei com fulminante eficácia ex tunc, faz abstração da evidência de que a implementação de uma nova ordem constitucional não é um fato instantâneo, mas um processo, no qual a possibilidade de realização da norma da Constituição - ainda quando teoricamente não se cuide de preceito de eficácia limitada - subordina-se muitas vezes a alterações da realidade fáctica que a viabilizem.2. No contexto da Constituição de 1988, a atribuição anteriormente dada ao Ministério Público pelo art. 68 C. Pr. Penal - constituindo modalidade de assistência judiciária - deve reputar-se transferida para a Defensoria Pública: essa, porém, para esse fim, só se pode considerar existente, onde e quando organizada, de direito e de fato, nos moldes do art. 134 da própria Constituição e da lei complementar por ela ordenada: até que - na União ou em cada Estado considerado - se implemente essa condição de viabilização da cogitada transferência constitucional de atribuições, o art. 68 C. Pr. Pen. será considerado ainda vigente: é o caso do Estado de São Paulo, como decidiu o plenário no RE 135328." Todas essas considerações, indissociáveis do exame da presente causa, evidenciam que o acórdão ora recorrido ajusta-se à orientação jurisprudencial que esta Suprema Corte firmou na matéria em análise. Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, nego provimento ao presente agravo de instrumento, eis que se revela inviável o recurso extraordinário a que ele se refere
8.
Em suma, embora esteja previsto no art. 142 do CPP ter o MP legitimidade
para promover hipoteca legal em favor de hipossuficiente, tal pleito somente haverá
de ser formulado caso não se tenha Defensoria Pública instalada na comarca ou
subseção judiciária.
8 STF, AI: 482332 SP, Relator: Min. Celso de Mello, Data de Julgamento: 30/04/2014, Data de
Publicação: DJ 02/06/2014 PP-00068.
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3.2.5 Requisitos
Devem estar presentes basicamente dois requisitos para que se possa levar a
cabo a inscrição da hipoteca legal, quais sejam: a) a prova da infração penal; e b)
indícios suficientes de autoria delitiva. Não havendo a presença desses dois
requisitos cumulativamente, incumbirá ao magistrado examinar o caso concreto e
indeferir, se for o caso, o pedido.
3.2.6 Procedimento
A parte legitimada deverá dar entrada na petição contendo postulação da
especialização da hipoteca legal e na qual estimará o valor da responsabilidade civil,
assim como designará e estimará o imóvel (ou imóveis) que deverá ficar gravado.
Referido pedido deverá ser instruído com as provas ou a indicação das provas em
que se fundar a estimação da responsabilidade, bem como a relação dos imóveis
que o responsável for possuidor, além dos indicados no requerimento e, ainda, os
documentos comprobatórios do domínio. Ao receber o pedido, em autos apartados,
caberá ao magistrado nomear perito9 para arbitrar o valor da responsabilidade e
promover a avaliação do bem imóvel indicado.
Depois de apresentado o laudo avaliatório, as partes deverão ser ouvidas, no
prazo de dois dias, devendo o magistrado corrigir o arbitramento do valor da
responsabilidade10, se entender excessivo ou deficiente. Estando presentes os
requisitos legais, o magistrado determinará a inscrição da hipoteca legal do imóvel
(ou imóveis) necessários para garantir a responsabilidade do suposto criminoso,
salvo se este oferecer caução suficiente, em dinheiro ou em títulos da dívida pública,
pelo valor de sua cotação em Bolsa. Transitada em julgado a sentença penal
condenatória, os autos da hipoteca legal deverão ser remetidos para o juízo cível
(CPP, art. 143). A especialização da hipoteca legal será cancelada se, por sentença
condenatória irrecorrível, o acusado for absolvido ou a houver decretação da
extinção da punibilidade (CPP, art. 141).
9 Somente haverá nomeação de perito particular, onde não houver avaliador judicial (CPP, art. 135, §
2.º). 10
O valor da responsabilidade deverá ser liquidado definitivamente após a sentença condenatória, mas é possível ser requerido novo arbitramento se qualquer das partes não se conformar com o arbitramento anterior à sentença condenatória (CPP, art. 135, § 5.º).
20
3.3 ARRESTO 3.3.1 Conceito
O vocábulo arresto é oriundo do francês “arrêt”, que traduz a ideia de
impedimento, prisão ou embargo. Tradicionalmente fala-se na origem do termo
arresto, assunto que é tratado por diversos autores, dentre os quais se tem por
maior relevo a cátedra de Barros (2009, p. 428), que faz um estudo a partir do
conceito etimológico do vocábulo:
Tal etimologia não deve fazer supor que o instituto tem origem francesa. Na verdade, o arresto do devedor é produto do Direito Costumeiro medieval e se destinava a embargar os passos do devedor fugitivo ou que se preparava para fugir. Era providência extrajudicial e cautelar, forma de exercício direto das próprias razões e não de processo judiciário. Dirigia-se contra o próprio devedor, não contra o patrimônio dele ou, pelo menos, não apenas contra os bens. Só em época mais avançada é que passou a recair somente sobre as coisas do devedor, mas ainda como penhor privado, não judicial como o sequestro. Isto explica o fato de os italianos, que usam a palavra sequestro tanto para designar o nosso sequestro, de coisa litigiosa, quando o arresto indiscriminado de quaisquer bens do devedor, chamarem o primeiro sequestro judiciário e ao outro conservativo.
O arresto, no âmbito processual penal, não tem qualquer vinculação à palavra
de origem francesa. Corresponde à apreensão de certos bens do criminoso com o
afã de garantir a reparação do dano causado pelo crime e/ou pagamento de
eventuais penas pecuniárias e/ou despesas processuais penais. É a terceira
modalidade ou terceira medida assecuratória e com previsão legal encartada nos
arts. 136 a 144 do CPP.
3.3.2 Objeto
A rigor, o CPP prevê duas modalidades de arresto: a) o arresto prévio ou
preventivo de bens imóveis para hipoteca legal; e b) arresto de bens móveis, a
saber:
a) Arresto Prévio ou Preventivo de Bens Imóveis para Hipoteca Legal (CPP, art. 136)
Ramos (2012, p. 304), com muita pertinência, discorre no seguintes termos
acerca do arresto prévio:
Tendo em vista os danos que podem causar a alienação antes de inscrita a hipoteca, idealizou a lei processual penal um instrumento preordenado à garantia da eficácia do procedimento de especialização da hipoteca legal. É
21
o assim chamado arresto prévio, regulado pelo artigo 136 do Código de Processo Penal, que o chama, indevidamente, de sequestro. Considerando-se a definição de sequestro como depósito judicial da coisa litigiosa em mãos de terceiro para futura definição a seu respeito, percebe-se facilmente que o sequestro prévio do art. 136 não é, na verdade, um sequestro, mas isto sim, um arresto […]. Esse arresto prévio existe unicamente para garantir a eficácia do procedimento de especialização de hipoteca penal: enquanto arrestado o bem -, com a respectiva inscrição no registro de imóveis – não poderá o imputado aliená-lo.
É o que recai sobre bens imóveis integrantes do acervo patrimonial do
acusado. Dar-se-á em fase preparatória ou prévia à concessão da especialização da
hipoteca legal. Com efeito, sabendo-se ser complexo e moroso o procedimento da
inscrição da hipoteca legal, o legislador previu a possibilidade de se promover o
quanto antes o arresto de imóvel do criminoso como medida a garantir a sua própria
eficácia, isto é, a eficácia do próprio procedimento da hipoteca legal que ficaria na
iminência de vir a ser frustrado com a possibilidade de eventual dilapidação
patrimonial. O arresto prévio ou preventivo, todavia, será revogado se, uma vez
concedido, não for promovido pelo interessado o processo de inscrição de hipoteca
legal (CPP, art. 136).
b) Arresto de Bens Móveis (CPP, art. 137)
Segundo o art. 137 do CPP, quando o responsável não possuir bens imóveis
ou os possuir de valor insuficiente, poderão ser arrestados bens móveis suscetíveis
de penhora. Diversamente do que ocorre no sequestro, os bens móveis que são
objeto de arresto devem ser de origem lícita e integrantes do acervo patrimonial do
acusado.
3.3.3 Natureza Jurídica
Indiscutivelmente, ambas as modalidades de arresto tratam-se de medidas
cautelares reais ou patrimoniais. Nesse sentido leciona Messa (2014, p. 519): “as
medidas assecuratórias têm natureza patrimonial, pois visam preservar bens para
garantir a reparação civil e o pagamento das custas. As espécies são: o sequestro,
arresto e hipoteca legal”.
3.3.4 Legitimidade
Aplica-se, na hipótese, a mesma sistemática utilizada para a hipoteca legal,
ou seja, o Ministério Público tem legitimidade para postular pela medida cautelar
22
quando houver interesse da Fazenda Pública ou quando o ofendido for pobre e o
solicitar ao “Parquet”. Repetimos, a propósito, o que escrevemos alhures, isto é, o
interesse público defendido pelo Ministério Público não se confunde com o interesse
da Fazenda Pública, bem como incumbe à Defensoria Pública a orientação jurídica e
a defesa, em todos os graus, dos necessitados ou hipossuficientes, na forma da lei.
3.3.5 Procedimento
O arresto prévio de bens imóveis e o arresto de bens móveis precisam ser
requeridos pela parte legitimada. No arresto prévio de bens imóveis, uma vez
acolhido, deverá a parte interessada promover a respectiva especialização da
hipoteca legal, no prazo de quinze dias, sob pena de revogação, salvo de houver
prorrogação de prazo por motivo justificado. Quanto ao segundo tipo de arresto, uma
vez requerido e concedido, o interessado deverá aguardar a decisão final do
processo penal.
Da mesma forma que se dá no sequestro, com o trânsito em julgado da
sentença penal condenatória, os autos do arresto deverão ser remetidos para o
Juízo Cível, local onde será promovida a execução da sentença. Em sendo a
sentença irrecorrível absolutória ou havendo decretação da extinção de punibilidade,
o arresto deverá ser levantado.
4 CONCLUSÕES
Em apertada síntese, podemos extrair as seguintes conclusões:
1) Pelo fato de o delito, invariavelmente, causar lesões materiais e/ou morais
ao ofendido, há de haver a possibilidade de se buscar a reparação do dano em face
do criminoso;
2) As medidas assecuratórias, isto é, as providências judiciais adotadas no
âmbito criminal com o afã de garantir o ressarcimento, a indenização ou a reparação
do dano ao ofendido, destinam-se a evitar que o criminoso aufira vantagens ou
tenha por lucrativa a atividade delituosa;
3) Diz-se que tais medidas são reais porque incidem sobre bens imóveis e
móveis do criminoso;
4) Sendo medidas cautelares, passa sua concessão, o magistrado há de
verificar a presença de dois requisitos: a) periculum in mora: haver risco na demora
da prestação jurisdicional; e b) fumus boni juris: haver pleito reparatório;
23
5) São atributos comuns às medidas assecuratórias: a) jurisdicionalidade: a
matéria há de estar submetida ao crivo do Poder Judiciário; b) acessoriedade: a
medida é acessória (preventiva ou incidental) ao procedimento inquisitorial [inquérito
(IPL), termo circunstanciado (TCO) ou mesmo procedimento de investigação criminal
(PIC)]; c) preventividade: a decisão há de ser tomada antes de proferida a decisão
final; e d) provisoriedade: a decisão pode vir a ser alterada ou modificada a qualquer
tempo;
6) O Código de Processo Penal, no Capítulo VI do Título VI, intitulado “DAS
MEDIDAS ASSECURATÓRIAS”, expressamente dispõe sobre o sequestro (arts. 125
a 133), a hipoteca legal (arts. 134 e 135) e o arresto (arts. 136 a 144).
THE PRECAUTIONARY MEASURES IN THE BRAZILIAN CRIMINAL PROCEDURE CODE
ABSTRACT
This article focuses on the precautionary measures in the Criminal Procedure Code of Brazil. It in particular kidnapping which is the legal measure to be unavailable assets of the accused or defendant acquired the resources of criminal law infraction; legal hypothec, which is the real security interest to focus on the real property belonging to the accused of a criminal offense (lawful heritage of the offender), in order to repair the damage caused to the victim, as well as the payment of future monetary penalties and/or criminal legal costs; and attachment that is the seizure of certain criminal goods with the desire to ensure compensation for damage caused by crime and/or payment of any monetary penalties and/or criminal legal costs. The theme is quite exciting, which is attracting interest due to the increasing demand of society to demand that the criminal promote the repair of damage caused by the crime and that require a reinterpretation, especially after the Federal Constitution of 1988. Keywords: Precautionary Criminal Measures. Attachment, Kidnapping and Legal Hypothec.
REFERÊNCIAS
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24
MESSA, Ana Flávia. Curso de direito processual penal. São Paulo: Saraiva, 2014. MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. São Paulo: Atlas, 2015. PITOMBO, Sérgio M. de Moraes. Do sequestro no processo penal brasileiro. São Paulo: José Bushatsky, 2013. POLASTRI, Marcellus. A tutela cautelar no processo penal. São Paulo: Atlas, 2014. RAMOS, João Gualberto Garcez. A tutela de urgência no processo penal brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2012. TORNAGHI, Hélio. Processo penal. Rio de Janeiro: Saraiva, 2013. TUCCI, Rogério Lauria. Sequestro prévio e sequestro no CPC: distinção. Revista de Ciências Criminais. São Paulo: RT, ano 2, n. 5, p. 138, jan./mar. 2012.
FICHA CATALOGRÁFICA
A444m Almeida, Mayara Rayanne Oliveira de.
Medidas assecuratórias cautelares reais no código de processo penal brasileiro. / Mayara Rayanne Oliveira de Almeida. – Cabedelo, 2016.
18F.
Orientador: Profº. Esp. Ricardo Sérvulo Fonseca da Costa.
ARTIGO CIENTÍFICO (GRADUAÇÃO EM DIREITO).FACULDADES DE ENSINO
SUPERIOR DA PARAÍBA – FESP
1. Medidas Assecuratórias. 2. Cautelares Reais 3. Arresto, Sequestro e Hipoteca Legal. I. Título
BC/FESP CDU: 343.1 (043)