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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL A PRESENÇA PATERNA NO PERÍODO GESTACIONAL: LIMITES E POSSIBILIDADES ATRAVÉS DO PROJETO CEGONHA CARIOCA. PABLO IRIO FERREIRINHA PEREIRA RIO DE JANEIRO 2017. A PRESENÇA PATERNA NO PERÍODO GESTACIONAL: LIMITES E POSSIBILIDADES ATRAVÉS DO PROJETO CEGONHA CARIOCA. Monografia exigida como requisito parcial para conclusão do curso de graduação em Serviço Social da Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro. ORIENTADORA: Professora Ana Izabel Moura de Carvalho Moreira. BANCA EXAMINADORA: ___________________________________________________ Professora Dr ª Andrea Moraes.

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Page 1: Federal University of Rio de Janeiro - Professora Dr ª Andrea ...Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017. O presente trabalho de conclusão de curso busca realizar

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIROCENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL

A PRESENÇA PATERNA NO PERÍODO GESTACIONAL: LIMITES E POSSIBILIDADES ATRAVÉS DO PROJETO CEGONHA CARIOCA.

PABLO IRIO FERREIRINHA PEREIRA

RIO DE JANEIRO2017.

A PRESENÇA PATERNA NO PERÍODO GESTACIONAL: LIMITES E POSSIBILIDADES ATRAVÉS DO PROJETO CEGONHA CARIOCA.

Monografia exigida como requisito parcial para conclusão do curso de graduação em Serviço Social da Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro.ORIENTADORA: Professora Ana Izabel Moura de Carvalho Moreira.

BANCA EXAMINADORA:

___________________________________________________Professora Dr ª Andrea Moraes.

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___________________________________________________Professora Drª Mariléia Inoue.

___________________________________________________Professora Drª Orientadora Ana Izabel Moura de Carvalho Moreira.

Dedicatória“Dedico este trabalho a minha família, especialmente aos meus pais,

Pedro Irio e Maria da Conceição, que ao longo desses anos, me ajudaram sempre da maneira que esteve alcance, e promoveram os

meios necessários para minha sobrevivência e reprodução nesta sociedade que me permitiram chegar até aqui.”

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AgradecimentosNa reta final as lembranças dos momentos vividos até aqui, nos remetem a pessoas que fizeram parte de nossa trajetória. Correndo o risco de ser injusto, gostaria de registar meu profundo agradecimento a algumas pessoas. Como meus grandes amigos Daniel e Leandro Blossey e família, por todo apoio e carinho, que foram essências e importantes nestes últimos anos. E os amigos que fizeram parte dessa história e que não poderia deixar de registrar: Diogo, Rodrigo Oliveira, Rafael Ricardo, Emmanuel Gonsalves Gregory Rodrigues, Larissa Souza, Iorrane Cunha, Fernando, Elton, Fred Borges, Fábio Mattos dentre outros. E minha grande amiga Karine Cuppelo pelos dias, conversas, viagens e de todos os momentos divididos nesses últimos anos.Ao meu primo Renan Ferreirinha, pelas discussões, conversas e viagens e que apesar da distância cotidiana, seu amor e companheirismo foram essenciais para minha formação enquanto cidadão.Ao meu tio Franduya pelas conversas e discussões durante a madrugada, que com certeza, me estimularam a seguir sempre estudando.Ao Seu Tião FC., Time de futebol do curso, com o qual pude consolidar amizades e por vezes extravasar e relaxar do cotidiano e cansativo dessa sociedade e faculdade.Um agradecimento especial a minha orientadora, que em um dos momentos mais difíceis em minha vida, já havia me demonstrado uma imensa compressão, e agora nesta reta final do TCC foi muitas vezes o gás que precisava para continuar escrevendo, gratidão e admiração pelo profissional e pessoa que é.Quase terminando, a minha namorada, Ana Carolina, que nesses últimos meses com muito carinho compreensão, aguentou e ajudou os meus problemas, e me estimulou a concluir muitas linhas desse trabalho.Finalmente, mas com muita importância, aos meus pais e família, razão de todo meu amor e inspiração para seguir mesmo nas dificuldades, construindo o meu caminho que por mais longe que possa ser, meu coração sempre estará perto deles.

ResumoPereira, P. I. F. A PRESENÇA PATERNA NO PERÍODO GESTACIONAL: LIMITES E POSSIBILIDADES ATRAVÉS DO PROJETO CEGONHA CARIOCA. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Serviço Social) Escola de Serviço Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.

O presente trabalho de conclusão de curso busca realizar uma reflexão acerca da presença paterna no período gestacional, reafirmando sua importância, já comprovada em outros estudos, a partir das experiências vividas durante o período de estágio de 2015 e 2016.1 na Maternidade Escola da UFRJ, localizada na Rua das Laranjeiras, no Rio de Janeiro.O objetivo deste trabalho é demonstrar que através das experiências e relatos observados no contato cotidiano com tais sujeitos, sem excluir outros determinantes que incidem neste processo e suas devidas importâncias para o debate, um grande motivo que os impede de fazer parte deste processo é a necessidade de garantir os meios para sua reprodução material, via trabalho, seja ele formal ou informal.

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Para isso foi realizada uma revisão dos diários de campo, que cobre o período de um ano e oito meses de estágio, além de revisão bibliográfica acerca dos autores que norteiam nossa compressão de sociedade.O que se constatou é que para este público específico, classe trabalhadora dos setores mais subalternos, que sofre diariamente com as incidências da “questão social”, fruto de um modo de produção explorador e opressor, apresentam-se empecilhos materiais e cotidianos que impedem que os homens estejam presentes e participem de um dos períodos mais importantes e vitais para o nascimento do recém nascido e posteriormente sua criação, bem como a manutenção e criação dos vínculos afetivos dessa família. Situação esta que poderá ter implicações e refrações em toda a vida desta família.

Palavras-chaves: Capitalismo; Paternidade; Gestação; Politica Social

ABSTRACT:The present work of course completion seeks to reflect on the presence of the father in the gestational period, reaffirming its importance, already proven in other studies, based on the experiences lived during the period of the 2015 and 2016 internship at the UFRJ School Maternity, located In Rua das Laranjeiras, in Rio de Janeiro. The objective of this work is to demonstrate that through the experiences and reports observed in the daily contact with such subjects, without excluding other determinants that influence this process and its due importance for the debate, a great reason that prevents them from being part of this process is the necessity To guarantee the means for their material reproduction, through work, be it formal or informal. For that, a review of the field diaries was carried out, which covers the period of one year and eight months of internship, as well as a bibliographical review about the authors that guide our society compression. What has been verified is that for this specific public, the working class of the subaltern sectors, which suffer daily from the effects of the "social question", fruit of an exploitative and oppressive mode of production, present themselves with material and daily obstacles that prevent Men are present and participate in one of the most important and vital periods for the birth of the newborn and its creation, as well as the maintenance of the affective ties of this family. This situation may have implications and refractions throughout the life of this family.

Keys-word: Capitalism; Paternity; Gestation; Social policy

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“Se você é capaz de tremer de indignação a cada vez que se comete uma injustiça no mundo, então somos companheiros. ”

Ernesto Guevara de la Serna

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................. 08

CAPÍTULO 1: Capitalismo e “questão social”: acumulação de capital e as bases da exploração ............................................................................. 10

1.1 Capitalismo e acumulação de capital: as bases da exploração.............. 111.2. Capitalismo e “questão social”: exploração, acumulação e pauperismo.................................................................................................... 15

CAPÍTULO 2: Questão social e política social ......................................... 21

2.1 O Estado e a “questão social”................................................................. 21

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2.2 “Questão social” e Política Social no Capitalismo Monopolista................................................................................................... 27

CAPÍTULO 03: A presença paterna no período gestacional: reflexões sobre limites e possibilidades das políticas sociais junto aos pais trabalhadores a partir da experiência no Projeto Cegonha Carioca.

3.1 Conclusões e reflexões sobre a experiência de estágio a partir de outros estudos e experiências ................................................................................. 413.2 Reflexões sobre limites e possibilidades das políticas sociais junto aos pais trabalhadores a partir da experiência no projeto cegonha carioca........................................................................................................... 53

Considerações Finais ............................................................................. 58

Referências Bibliográficas ......................................................................... 62

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Introdução

A ideia de desenvolvimento do tema apresentado nesse trabalho

monográfico partiu do contato com as situações de ausência dos pais (os

homens) ao longo do período gestacional, ocorrido durante o período de

estágio de 2015 e 2016.1 na Maternidade Escola da UFRJ, localizada na Rua

das Laranjeiras, no Rio de Janeiro.

Nossa apreciação pelo tema deu-se devido ao fato tanto de termos

percebido essa ausência quanto à procura dos pais para nos relatar a

vontade de estarem presentes neste momento, e o real motivo para sua

ausência.

Devemos mencionar que, ainda que fosse importante para um estudo

mais acurado, não foram realizadas entrevistas com os sujeitos em questão,

em razão do processo burocrático que envolveria a busca das autorizações,

bem como pelo período prolongado que aguardaríamos para termos acesso

aos prontuários de atendimento de cada um por parte da instituição de

saúde.

Neste trabalho buscamos introduzir uma reflexão sobre a situação de

ausência dos homens no período já mencionado, apontando hipóteses

baseadas na experiência vivida, seus relatos e suas repercussões na vida

desta família. Para tanto, trabalhamos de três maneiras: a) posicionando o

tema na sociedade em que vivemos, no modo de produção capitalista e

nossa compreensão sobre este modo de produção e reprodução; b) situando

o tema como expressão da “questão social”, suas conceituações e relações

com as politicas sociais, bem como seu desenvolvimento histórico; e c) uma

reflexão mais aprofundada das situações vividas do período de estágio e da

bibliografia que aponta a importância da presença do pai neste momento,

além de outros estudos que apresentam resultados semelhantes. Cabe

ressaltar a grande dificuldade em levantar conteúdo bibliográfico que

abordasse o tema no que tange à bibliografia do serviço social.

Concluímos como é difícil apresentar uma visão mais simplificada da

questão, ainda que fosse o nosso intuito, uma vez que o tema referido já é

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complexo, fundamentalmente se tratando de suas relações com o modo de

produção capitalista, o que além de tudo é controverso. Desse modo,

optamos por uma exposição que contivesse ideias, conceitos, interpretações,

estudos sobre o tema, além da análise dos diários de campo do período

mencionado.

Portanto, situamos a ausência paterna no período gestacional como uma das expressões da “questão social”, o que a relaciona com aspectos históricos, culturais, econômicos e sociológicos, e que é produto do modo de produção capitalista. Assim sendo, que sofre profundas transformações desde o seu surgimento histórico, em meados do século XIX, mas que guarda uma relação de continuidade com os aspectos fundantes desse modo de produção. Contudo, não deixamos de apontar, com sua devida importância, outras manifestações que incidem nesse processo, como a presença constante do machismo e patriarcado na sociedade brasileira. Citaremos conceitos a respeito da nossa compreensão sobre o modo de produção capitalista, política social e a “questão social” para balizar nossa reflexão. Abordaremos também os conteúdos extraídos dos diários de campo que permitiram compreender e detalhar melhor o relato dos sujeitos mencionados.

Por fim, apontaremos para a necessidade de mais elaboração de pesquisas acerca desta relação tão complexa do homem e a sua presença na gestação, principalmente porque as consequências, sejam elas econômicas ou sociais, podem ser enormes, incidindo ao longo da vida do recém-nascido e de sua família, como consequência do afastamento desses homens.

CAPÍTULO 1: Capitalismo e “questão social”: acumulação de capital e as bases da exploração

O ser humano, mesmo possuindo um incontornável vínculo com a natureza pelas suas necessidades biológicas (comer, beber, se reproduzir, etc.), extrapolou os limites estreitos que os animais possuem na sua relação meramente biológica, na medida em que a própria natureza (e os chamados “instintos naturais”) se subordinam ao social. É com esse entendimento que compreendemos que a gestação não compete exclusivamente à mãe (mesmo que só a mulher tenha a capacidade biológica de desenvolver um feto); ou seja, os impactos do período gestacional comparecem também no cotidiano do pai e não apenas no da mãe. Assim, compreendemos que dentre as expressões da “questão social”, a presença do pai no período que compreende a gestação é uma dessas manifestações. Este problema apresenta-se nas relações sociais, principalmente no mundo do trabalho, e podem ser vivenciados principalmente por homens que estão inseridos em postos informais e precários no mercado de trabalho, com fortes

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desdobramentos nas condições de reprodução social. Portanto, é prática de violação dos direitos humanos e de saúde, visto que os pais, apesar de peça importante neste período, tanto para mulher como para a criança, como podemos observar no guia do pré-natal para o parceiro do Ministério da Saúde de 2016, deparam-se com o dilema das condições e exigências do mundo do trabalho, onde as necessidades de acumulação de capital e de produção de riqueza se sobrepõem às questões de saúde, educação, moradia, e, inclusive, gestacional, como queremos mostrar nessa monografia.

Desta forma, por constituir-se com uma expressão da questão social é essencial inserir nessa monografia nossa compreensão sobre o modo de produção em que nos reproduzimos, o capitalismo e o que compreendemos como “questão social”, apoiados em determinados autores marxistas e no próprio Marx, que consideramos continuar sendo o melhor analista da sociedade capitalista.

1.1 Capitalismo e acumulação de capital: as bases da exploração

Para que o capital pudesse se fazer o “senhor” do chamado novo tempo era necessário romper uma série de correntes existentes no mundo feudal1. Do âmbito econômico ao cultural, passando pelo político e social, a modernidade representou uma revolução que incidiria sobre o cotidiano de cada habitante, a curto, médio ou longo prazo. Decerto nenhum parto ocorre sem dores, uns mais e outros menos, e o parto da nova época deixa traumas permanentes sobre o mundo todo, iniciando e se alojando na Europa e crescendo na medida em que ganha consistência e força para subsumir tudo que lhe opõe resistência ao longo do tempo.

Os primórdios desse tempo nos remetem aos primeiros passos que se dá no interior da antiguidade para a constituição de comércios, a partir da inserção de novas tecnologias no campo, que gera a expulsão de camponeses para as cidades à procura de meios de sustento próprio, carregando consigo apenas o seu corpo. Aqui temos o início da constituição da chamada Indústria Moderna, com o desenvolvimento gradual de meios e técnicas de transformação da natureza e grandes avanços científicos que permitem maiores descobertas sobre o mundo e sobre a própria humanidade. Papel central teve a chamada acumulação primitiva, que dá o alicerce da forma capitalista de acumular, arrancando os produtores de seus meios de produção e lhes dando a “liberdade” de transitar pelo território somente com sua força de trabalho a ser utilizada pelos novos “senhores”, os capitalistas, donos das indústrias, provedores do novo tipo de servidão: a “servidão assalariada”, melhor conhecida como exploração capitalista.

Este processo histórico culminou na existência de duas classes distintas, e que não é resultado de uma lei natural ou acidente, mas resulta de um período histórico que propiciou as condições para que se encontrassem, como o próprio Marx (1988, p. 829) escreveu:

1 O Feudalismo foi um sistema econômico, político e social que se desenvolveu na Europa a partir da decadência do Império Romano, no séc. V d.C., e tem seu declínio por volta dos sécs. XVII e XVIII, marcadamente com as revoluções burguesas (Revolução Gloriosa de 1688 e Revolução Francesa de 1789), porém o início de seu declínio pode ser localizado no séc. XV, com as expedições marítimas.

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Duas espécies bem diferentes de possuidores de mercadorias têm de confrontar-se e entrar em contato: de um lado, o proprietário de dinheiro, de meios de produção e de meios de subsistência, empenhado em aumentar a soma de valores que possui, comprando a força de trabalho alheia, e, do outro, os trabalhadores livres, vendedores da própria força de trabalho e, portanto, de trabalho. Trabalhadores livres em dois sentidos, porque não são parte direta dos meios de produção, como escravos e servos, e porque não são donos dos meios de produção, como o camponês autônomo, estando assim livres e desembaraçados deles. Estabelecidos esses dois pólos do mercado, ficam dadas as condições básicas da produção capitalista. [...] O processo que cria o sistema capitalista consiste apenas no processo que retira ao trabalhador a propriedade de seus meios de trabalho, um processo que transforma em capital os meios sociais de subsistência e os de produção e converte em assalariados os produtores diretos.

Desse modo, ao compreendermos como surge a sociedade capitalista, temos o entendimento de como está estruturada a partir de certos pilares sobre os quais se afirmam as novas relações sociais. Assim que, paulatinamente, o capital toma o controle de todos os poros do tecido social, carregando em si sua lógica inerente, sem a qual não permanece. Essa lógica é o que chamamos de acumulação de capital, conteúdo de qualquer forma que assuma na sociedade. A acumulação capitalista, que necessariamente deve ser produção e reprodução ampliada (para que se mantenha o movimento do capital), se dá a partir da já mencionada exploração dos trabalhadores pelos capitalistas, extraindo mais-valia do processo de trabalho então realizado e reinvestindo em um novo processo produtivo. Assim que:

A forma típica da reprodução no MPC [Modo de Produção Capitalista] é a reprodução ampliada (ou alargada). Nela, apenas uma parte da mais-valia apropriada pelo capitalista é empregada para cobrir seus gastos pessoais; outra parte é reconvertida em capital, isto é, utilizada para ampliar a escala da sua produção de mercadorias (aquisição de máquinas novas, contratação de mais força de trabalho etc.). (NETTO e BRAZ, 2010, p. 125)

Esse processo, imprescindível ao capital, se dá por meio da apropriação privada da riqueza socialmente produzida, onde uma maioria trabalha em prol de uma minoria parasitária que detém os meios fundamentais de produção. O trabalho, meio a partir do qual o homem se constitui como ser social, é todo organizado em prol da acumulação capitalista.

Sob essa dinâmica se efetiva o que podemos compreender como produção de mais-valia. É no decurso da produção capitalista que se realiza a exploração do trabalho. No âmbito dessa vinculação entre trabalhador e capitalista, este não comete nenhum golpe ou ato ilegal ao admitir o trabalhador e lhe pagar um salário fixo para uma jornada de oito horas, por exemplo. Deveria este pagar mediante o salário os valores necessários para sua reprodução no cotidiano da vida social. Todavia, durante o período em que o trabalhador está contratado produzindo para o capitalista, o mesmo produz mais que o valor necessário para sua reprodução. É o valor que excede a quantidade necessária para sua reprodução, estipulada pelos

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capitalistas, que o capitalista se apropria, sem esforço ou custo nenhum, que chamamos de mais-valia ou mais valor, fonte do lucro.

Numa palavra, do valor criado pela força de trabalho, a parte que excede o valor de sua produção/reprodução é apropriada pelo capitalista – a relação capital/trabalho, personalizada na relação capitalista/proletário, consiste, pois, na expropriação (ou extração, ou extorsão) do excedente devido ao produtor direto (o trabalhador): é nessa relação de exploração que se funda o MPC. (NETTO E BRAZ, 2010, p. 101)

De acordo com a concepção ontológica do trabalho, entende-se que essa atividade é um processo que acontece quando o ser humano prevê, antecipadamente, a ação que realizará para transformar o meio em que se encontra. Tanto aranhas e abelhas quanto tecelões e arquitetos constroem algo, porém o que diferencia as primeiras dos segundos é que aquelas fazem suas atividades como algo biologicamente dado, sem grandes alterações ou readequações, enquanto arquitetos e tecelões já têm na sua mente o que querem construir, mesmo que o produto final não seja exatamente aquilo que esperavam. Assim, a chamada capacidade teleológica humana é o que nos diferencia radicalmente dos animais. Portanto, entendemos trabalho como toda atividade humana que quer transformar a natureza, orientada a um fim previamente determinado, envolvendo seu objeto e seus meios, sendo que o ser humano, nesse mesmo processo, também transforma a si mesmo. Como nos diz Marx (s/d, p. 208):

o processo de trabalho [...] é atividade dirigida com o fim de criar valores de uso, de apropriar os elementos naturais às necessidades humanas; é condição necessário do intercâmbio material entre o homem e a natureza; é condição natural eterna da vida humana, sem depender, portanto, de qualquer forma dessa vida, sendo antes comum a todas as suas formas sociais.

Ou seja, o homem, se valendo de suas capacidades físicas e intelectuais, no ato cujo resultado já antecipa mentalmente, utiliza os meios de trabalho que se encontram ao seu dispor para transformar a matéria-prima (a natureza, podendo já conter trabalho prévio ou não) em produtos que serão úteis às suas necessidades. Nesse processo, o sujeito que realizou o ato de trabalho, ao transformar a natureza, também transformou a si mesmo, transformou suas próprias capacidades humanas.

No capitalismo, o trabalho é condicionado aos ditames dessa sociedade, em prol da acumulação ampliada de capital. Nesse sentido, “o trabalhador trabalha sob o controle do capitalista, a quem pertence seu trabalho” (MARX, s/d, p. 209) e, consequentemente, “o produto [do trabalho] é propriedade do capitalista, e não do produtor imediato, o trabalhador” (MARX, s/d, p. 209). Ou seja, o processo de trabalho, inerente à condição humana e, portanto, à sua reprodução enquanto tal, na sociedade capitalista vira produção e reprodução de capital por meio da produção de mais-valia, que é o tempo de trabalho excedente apropriado pelo capitalista e incorporado à circulação de capital, ampliando-o.

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Para afirmarmos que na sociedade capitalista a força de trabalho é convertida em uma mercadoria devemos entender como tal sociedade se encontra dividida, fundamentalmente, entre capitalistas e trabalhadores, sendo que aqueles contêm a propriedade privada dos meios de produção e estes apenas a própria força de trabalho, ou seja, a sua capacidade produtiva. Como o capitalista precisa de alguém que produza e seja sua fonte de lucro, encontra o trabalhador no mercado, precisando que lhe comprem a força de trabalho para garantir suas condições de vida, seus meios de subsistência. Nesse sentido, por ser vendável (ter valor de troca) e por ser útil a alguém (ter valor de uso), a força de trabalho, ao ser adquirida por um preço, torna-se mercadoria.

Dentro do processo de produção de mercadorias, temos tanto matérias-primas quanto meios de produção. Ambos são produtos de processos anteriores, que, nesse em específico, tiveram suas funções redefinidas para atingir determinado objetivo final. Um mesmo produto, portanto – no mesmo processo de produção – pode ser tanto meio de produção quanto matéria-prima, que varia pela sua função múltipla num processo produtivo. Como afirma Marx (s/d, p. 206): “o mesmo produto pode no mesmo processo de trabalho servir de meio de trabalho e de matéria-prima”. 1.2. Capitalismo e “questão social”: exploração, acumulação e pauperismo.

Retomando o que já anunciamos, capitalismo é a afirmação de relações sociais histórica e socialmente determinadas, apoiadas sobre a apropriação privada da riqueza socialmente produzida, quando capitalistas e trabalhadores encontram-se no mercado de trabalho, sobrevindo daí uma relação de exploração que, ao final, se condensa em mercadoria que necessita ser vendida para retornar ao capitalista a quantidade que se excedeu de valor a ser reincorporado no processo produtivo que retoma toda a engrenagem fundamental do capital. Retomamos, com o risco de parecer repetitivo, para elucidar que esse é o processo que produz tudo o que existe nessa sociedade, e sobre o qual erguem-se (sem determinismos) as demais formas ideológicas e políticas que conectam o capitalismo enquanto uma totalidade social, reafirmando-o.

O processo de produção capitalista reproduz […], mediante seu próprio procedimento, a separação entre força de trabalho e condições de trabalho. Ele reproduz e perpetua, com isso, as condições de exploração do trabalhador. Obriga constantemente o trabalhador a vender sua força de trabalho para viver e capacita constantemente o capitalista a comprá-la para se enriquecer. […] O processo de produção capitalista, considerado como um todo articulado ou como processo de reprodução, produz, por conseguinte não apenas mercadoria, não apenas a mais-valia, mas produz e reproduz a própria relação capital, de um lado o capitalista, do outro o trabalhador assalariado. (MARX, 1984 apud NETTO; BRAZ, 2010, 137)

Por se encontrar sob a lógica do capital, a produção de riqueza na sociedade capitalista (inegavelmente maior do que nas que a precederam, dado o necessário avanço das forças produtivas em prol da acumulação) é,

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imediatamente, enriquecimento do polo que detém os meios fundamentais de produção: da burguesia. Na mesma razão e pelo mesmo processo a que está vinculado, ainda que produzindo toda a riqueza existente, ao trabalhador (já expropriado antes mesmo do início da produção) só resta a pauperização.

Os trabalhadores experimentam, no curso do desenvolvimento capitalista, processos de pauperização que decorrem necessariamente da essência exploradora da ordem do capital. A pauperização pode ser absoluta ou relativa. A pauperização absoluta registra-se quando as condições de vida e trabalho dos proletários experimentam uma degradação geral: queda do salário real, aviltamento dos padrões de alimentação e moradia, intensificação do ritmo de trabalho, aumento do desemprego. A pauperização relativa é distinta: pode ocorrer mesmo quando as condições de vida dos trabalhadores melhoram, com padrões de alimentação e moradia mais elevados; ela se caracteriza pela redução da parte que lhes cabe no total dos valores criados, enquanto cresce a parte apropriada pelos capitalistas. (Netto e Braz, 2010, p. 135)

Ora, a pauperização é, para a classe trabalhadora, a principal consequência da relação que estabelece com a classe burguesa. Pela sua lógica de acumulação ampliada, o capital empurra cada vez mais os trabalhadores à miséria. Uma nova (aparentemente) forma de pobreza se apresenta à sociedade, totalmente distinta àquelas formas passadas, decorrentes de incapacidade produtiva, pestes, guerras etc., subjazendo às próprias relações sociais capitalistas. A nova pobreza então produzida nos marcos da sociedade burguesa advirá do mesmo solo em que se produz a riqueza; riqueza e pobreza, no capitalismo, constituirão uma unidade de contrários que se reproduz e se reatualiza constantemente com novas expressões. Denomina-se, destarte, a nova pobreza de “questão social”.

Seguindo os pensadores da tradição critica, afirmamos que a expressão “questão social” começou a ser utilizada no início do século XIX, para caracterizar um fenômeno novo sem precedente: o pauperismo em larga escala que afetava a ascendente classe trabalhadora inglesa que, desde o final do século XVIII, sofre os impactos da industrialização e urbanização provocada pela instituição do capitalismo industrial – concorrencial. O caráter de novidade deste pauperismo é que se antes a desigualdade entre ricos e pobres estava vinculada aos próprios limites das forças produtivas do sistema, que resultava numa escassez; no capitalismo a ampliação da pobreza é acompanhada pelo desenvolvimento das forças produtivas e das possibilidades de ampliar o processo da produção de riqueza (NETTO, 2001).

A partir de meados do século XIX, a expressão “questão social” é incorporada pelo pensamento conservador e laico, que desassocia a “questão social” com o modo de produção capitalista e a partir dessa lógica passa a ser entendida como conjunto de problemas sociais, que tem sua gênese em dificuldades individuais e naturais a qualquer ordem social. Deste modo, a mesma não poderia ser solucionada de forma alguma (descartando por princípio a proposta revolucionária), mas apenas amenizada por meio de medidas paliativas, focalizadas, fragmentadas e com feitio moralizador e filantrópico.

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A classe proletária passa a questionar essa explicação após as revoluções de 1848, no entanto é com a análise da lei geral de acumulação capitalista desenvolvida por Marx em “O Capital” (1867), que se consolida a explicação dos fundamentos da “questão social”, como determinado pelo modo de produção capitalista. Como explicado por Netto e Braz (2010), a reprodução capitalista requer não apenas a produção de mercadorias, mas também a reprodução das relações sociais em que os proprietários – a burguesia – exploram a classe trabalhadora que, não possuindo os meios de produção, é obrigada a vender sua força de trabalho, de modo que o proletariado produz a riqueza, mas quem se apropria dela é a burguesia. Essa contradição é acentuada com o desenvolvimento das forças produtivas, pois o aumento da produção da riqueza é concomitante ao aumento da exploração, tendo em vista que essa riqueza se concentra entre os capitalistas e o trabalhador continua destituído dos bens que produz2.

Vale apontar que a “questão social” só é certificada devido à organização política dos trabalhadores, ao se reconhecerem como classe3 e se organizarem em movimentos como sindicatos e partidos políticos, exigem respostas às expressões da “questão social” por parte da classe hegemônica.

A questão social não é senão as expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção mais além da caridade e repressão (IAMAMOTO & CARVALHO. 2011, pp. 83 e 84).

Neste sentido, a “questão social” é o conjunto de desigualdades sociais, produto da contradição entre capital e trabalho no modo de produção capitalista, que provém da apropriação privada da riqueza socialmente produzida e que ganha visibilidade a partir da organização política dos trabalhadores.

2[...] todos os métodos de produção da mais valia são, simultaneamente, métodos de

acumulação e toda expansão da acumulação torna – se, reciprocamente, meio de desenvolver aqueles métodos. [...]. À medida que se acumula capital, a situação do trabalhador, qualquer que seja o seu pagamento, alto ou baixo, tem de piorar [a acumulação] ocasiona uma acumulação de miséria correspondente á acumulação de capital. A acumulação da riqueza num polo é, portanto, ao mesmo tempo, a acumulação de miséria, tormento de trabalho, escravidão, ignorância, brutalização, e degradação moral no polo oposto [...] (MARX, 1984 apud NETTO; BRAZ, 2010, p.138).

3 Marx distingue o primeiro momento em que o operariado é em classe si, ou seja,

existiam como classe, mas ainda não se reconheciam como tal; do momento em que se tornam classe para si ao tomarem consciência de sua unidade como classe e passam a defender seu interesse. Nos termos do autor “as condições econômicas, inicialmente, transformaram a massa [...] em trabalhadores. A dominação do capital criou para esta massa uma situação comum, interesses comuns. Esta massa, pois, é já, face ao capital, uma classe, mas não o é para si mesma. Na luta [...], esta massa se reúne, se constitui em classe para si mesma. Os interesses que defende se tornam interesses de classe” (MARX, 1848 apud MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011, p.97).

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Em outras palavras, “questão social” significa uma determinada forma de pobreza que só acontece dentro de um tipo de sociedade e que incomoda aquela mesma sociedade, o capitalismo. Esse fenômeno tem fundamento na exploração do trabalho pelo capital, onde quem produz a riqueza é aquele que mais se empobrece, física e mentalmente. Já diz Marx: “o trabalhador torna-se tanto mais pobre quanto mais riqueza produz”. A “questão social” só é tomada como tal a partir do momento em que o sujeito que sofre diretamente com esse fenômeno se percebe como sujeito histórico, explorado e alienado pelo modo de produção capitalista e se opõe a este, em suas variadas expressões sociais. Como expõe Netto (2011, p. 154): “foi a partir da perspectiva efetiva de uma eversão da ordem burguesa que o pauperismo se designou como ‘questão social’”. Ao entendermos que a “questão social” é inerente a esse modo de produção, pois está associada à condição de sua sobrevivência – a exploração da classe trabalhadora pela burguesia –, gestando-se por essa lei, e compreendendo que continuamos no capitalismo é que, segundo Netto, inexiste uma “nova questão social”, pois as bases que estruturam nossa sociedade são as mesmas daquelas do século XIX, quando surge esse fenômeno. Atualmente, com as grandes mudanças ocorridas na própria sociedade, o que temos são novas expressões da “questão social”, mas cujas estruturas sociais e econômicas não se alteraram, mas, inclusive se intensificaram.

Assim, resume Netto (2011, pp.152 e 153):

A expressão “questão social” tem história recente: seu emprego data de cerca de cento e setenta anos. Parece que começou a ser utilizada na terceira década do século XIX e foi divulgado até a metade daquela centúria por críticos da sociedade e filantropos situados nos mais variados espaços do espectro político. A expressão surge para dar conta do fenômeno mais evidente da Europa Ocidental que experimentava os impactos da primeira onda industrializante, iniciada na Inglaterra no último quartel do século XVIII: trata-se do fenômeno do pauperismo. Com efeito, a pauperização (neste caso, absoluta) massiva da população trabalhadora constitui o aspecto mais imediato da instauração o capitalismo em seu estágio industrial-concorrencial.

No Brasil, o surgimento do capitalismo possuiu algumas particularidades se comparamos com o berço do capitalismo ocidental: a Inglaterra e, posteriormente a consolidação plena desse ordenamento societário, nos Estados Unidos. Considerando os limites dessa monografia, destacamos que não será feita qualquer análise mais abrangente sobre as características do capitalismo brasileiro em seus vínculos com os países desenvolvidos. Entendemos ser suficiente indicar que no Brasil, a gênese do capitalismo pode ser reconhecida a partir do esgotamento da chamada economia agrária e exportadora, ainda na virada do século XIX, o aparecimento das primeiras fábricas, acompanhadas das experiências de urbanização. Esses processos se alimentam dos suspiros republicanos que se faziam sentir nas Américas colonizadas e exigiam alguns requisitos imprescindíveis ao capitalismo: a liberdade e a democracia liberais. Assim, visualizamos como característica mais expressiva no capitalismo brasileiro a herança do trabalho escravo e a inexistência de direitos sociais, civis e

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políticos. A marca da mão de obra escrava, sem nenhuma qualificação, terá impactos profundos na conformação do mercado de trabalho brasileiro, na medida em que os processos de produção se desenvolvem, fundamentalmente, a partir do final da segunda guerra mundial, quando o Brasil “desponta” no cenário mundial como uma das alternativas para a crise do capitalismo nos países desenvolvidos de Europa e Estados Unidos, dizimados pelos intensos conflitos da segunda guerra mundial.

No próximo capítulo discorreremos sobre como o Estado vinha lidando com as expressões da “questão social” no período industrial-concorrencial e, na passagem para o período monopolista, reorienta totalmente sua lógica, conectado às mudanças no modo de produção capitalista, desenvolvendo as Políticas Sociais como medidas interventivas de caráter contínuo e sistemático de enfrentamento às expressões, sequelas, refrações, rebatimentos, etc. da “questão social”.

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CAPÍTULO 2 – ESTADO, “QUESTÃO SOCIAL” E POLÍTICA SOCIAL

2.1 O Estado e a “questão social”Temos em Marx (com a fundamental colaboração de Engels) a

compreensão de como as relações de produção configuram a base da sociedade, sobre a qual se erguem as demais esferas da vida social, a superestrutura jurídico-política.

[…] na produção social da própria existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; essas relações de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas sociais determinadas de consciência. O modo de produção da vida material condiciona o processo de vida social, política e intelectual. (MARX, 2008: 47)

Dessa maneira, Marx compreende o Estado como intrinsecamente articulado à base econômica da sociedade, ao espaço onde ocorrem as relações sociais de produção, denominada por ele de sociedade civil. Assim, para Marx, “a gênese do Estado reside na divisão de sociedade de classes, razão por que ela só existe quando e enquanto existir essa divisão (que decorre por sua vez das relações sociais de produção).” (COUTINHO, 2007, p. 123).

O Estado, nesse sentido, existe e se afirma como ente universal, com o único propósito de assegurar a reprodução das relações sociais capitalistas, na medida em que a burguesia se utiliza de mecanismos vários para impor suas ideias a toda a sociedade. Ou seja, o Estado possui um inerente caráter de classe, atende à classe dominante dessa sociedade. Assim, em uma determinada sociedade:

Suas ideias são produto das relações burguesas de produção e de propriedade, assim como o Direito não é nada mais que a vontade de sua classe erigida em lei, uma vontade cujo conteúdo é determinado pelas condições materiais de sua própria classe. (MARX e ENGELS, 2008: 36)

Em outras palavras, para Marx e Engels, “o poder do Estado moderno não passa de um comitê que administra os negócios comuns da classe burguesa como um todo” (Marx e Engels, 2008, p. 12). Nesse sentido, para Marx, o Estado buscaria assegurar tais “negócios comuns da classe burguesa” essencialmente pela força, pela coerção, detendo o monopólio legal da violência. No período em que Marx escreve (meados do século XIX), o Estado apresentava esse viés fundamentalmente coercitivo, enquanto que o direito ao voto era apenas para proprietários, sendo colocados grandes limites para a organização da classe trabalhadora. Valendo-se, portanto, da força do Direito (e do direito da força), visa controlar uma classe operária em vertiginoso crescimento, no mesmo passo em que a acumulação de capital

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significava acumulação de pobreza para os trabalhadores, a já referida “questão social”.

Conforme dito anteriormente, esse período, do capitalismo concorrencial4, foi a fase de estabilização do modo de produção capitalista, um momento que o capitalismo buscava romper com as estruturas do feudalismo, que limitava o desenvolvimento do modo de produção. É neste momento que a burguesia captura o Estado para que atenda aos seus interesses, tornando-o um importante instrumento na consolidação do capitalismo. Tendo como suporte teórico as ideias liberais, principalmente através de David Ricardo e Adam Smith, o Estado passa a ser entendido como uma espécie de “mal necessário”, como proposto por Behring e Boschetti (2011).

Netto e Braz (2010) sustentam que é neste período que se inicia a luta de classe entre burgueses e trabalhadores. Os operários reivindicavam a limitação das longas jornadas de trabalho, no que receberam concessões pontuais e o Estado burguês respondia de maneira fundamentalmente violenta.

O essencial das funções do burguês restringia-se às tarefas repressivas: cabia-lhe assegurar o que podemos chamar de condições externas para a acumulação capitalista – a manutenção da propriedade privada e da “ordem pública” (leia se enquadramento dos trabalhadores). Tratava-se do Estado reivindicado pela teoria liberal: um Estado com mínimas funções econômicas; mas isso não significa um Estado alheio à atividade econômica – pelo contrário: ao assegurar as condições externas para a acumulação capitalista, o Estado intervinha no exclusivo interesse do capital (e era exatamente essa a exigência liberal). (NETTO; BRAZ, 2010, p. 145)

A partir da segunda metade do século XIX, o modo de produção capitalista passa por uma série de transformações que alteram a dinâmica da produção e reprodução, culminando num novo estágio deste modo de produção: a fase monopolista.5 Netto e Braz (2010) destacam como principais transformações o desenvolvimento tecnológico a concentração e centralização do capital e o protagonismo alcançado pelos bancos no desenvolvimento capitalista.

O grande desenvolvimento das forças produtivas (pela própria necessidade do capital) permite acelerar a produção de mercadorias e exige um maior investimento no capital constante6 (maquinaria, etc) o que

4 Netto e Braz (2010) apontam que o capitalismo concorrencial (clássico ou liberal) vigorou do fim do século XVIII o último quarto do século XIX liderado pela Inglaterra. Os autores afirmam que foi o período de consolidação do capitalismo, marcado pela industrialização e urbanização dos países europeus e a formação de um mercando mundial, com a predominância de pequenas e médias empresas. 5 Netto e Braz (2010) para fins metodológicos, fundamentados em Mandel (1982), utilizam a distinção do capitalismo imperialista (ou monopolista) em três fases: o imperialismo clássico (1890-1940), os anos dourados (1940-1970) e o capitalismo contemporâneo.

6 O aumento no investimento em capital constante é paralelo à redução do gasto com capital variável, a força de trabalho, o que contribui para o aumento do exército industrial de reserva, expondo a tendência do capitalismo de subconsumo.

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inviabiliza a competição para os pequenos capitalistas. Essa situação leva à centralização e concentração de capitais – monopólio – em que as grandes empresas, detentoras de uma enorme soma de capital, são as únicas capazes de manter e, consequentemente, dominar o mercado, de modo que as pequenas e médias empresas ou são postas a falência ou se subordinam aos grandes monopólios. Neste cenário, os bancos assumem um papel central com a concessão de empréstimos às indústrias e com a própria aquisição de ações de empresas. Esta fusão entre capital industrial e bancário constitui o capital financeiro, que passa a comandar o mercado mundial na fase monopolista (NETTO; BRAZ, 2010).

Estas alterações compõem a passagem para uma nova etapa do capitalismo, o imperialismo em sua fase clássica. Sobre isso, Lenin sinteticamente afirma:

O imperialismo é o capitalismo na fase de desenvolvimento em que ganhou corpo a dominação dos monopólios e do capital financeiro, adquiriu marcada importância a exportação de capitais, começou a partilha do mundo pelos trusts internacionais e terminou a partilha de toda a terra entre os países capitalistas mais importantes (LENIN, 1977 apud NETTO; BRAZ, 2010, p. 180.)

Tais modificações requerem uma alteração na função do Estado, que é demandado a expandir sua atuação, visionando a acumulação e intensificação de lucros do capital. Netto elucida as novas funções do estado:

O elenco de suas funções econômicas diretas é larguíssimo. Possuem especial relevo a sua inserção como empresário nos setores básicos não rentáveis (nomeadamente aqueles que fornecem aos monopólios, a baixo custo, energia e matérias-primas fundamentais), a assunção do controle de empresas capitalistas em dificuldades (trata-se, aqui, da socialização das perdas, a que frequentemente se segue, quando superadas as dificuldades, a reprivatização), a entrega aos monopólios de complexos destruídos com fundos públicos, os subsídios imediatos aos monopólios e a garantia explícita de lucro pelo Estado. As indiretas não são menos significativas; as mais importantes estão relacionadas às encomendas/compras do Estado aos grupos monopolistas, assegurando aos capitais excedentes possibilidades de valorização; não se esgotam aí, no entanto – recordem-se os subsídios indiretos, os investimentos públicos em meios de transporte e infraestrutura, a preparação institucional da força de trabalho requerida pelos monopólios e, com saliência peculiar, os gastos com investimentos e pesquisa. (2011, pp. 25 e 26).

Além disso, o Estado é requisitado para preservar a reprodução da força de trabalho e controlá-la, pois o capitalismo em seu estágio monopolista intensifica as contradições entre capital e trabalho. Assim, o Estado é requisitado a ampliar suas funções direcionadas aos trabalhadores para atuar na manutenção da força de trabalho, ocupada e excedente, assegurando o consumo, socializando os custos do capital.

No entanto, outro aspecto levantado por Netto (2011) é que o Estado se vê obrigado a intervir nas expressões da “questão social”, para além da repressão, não apenas por necessidades econômicas, mas também políticas. É na passagem do capitalismo concorrencial para o monopolista que a classe

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trabalhadora se consolida como classe-para-si e, como tal, começa a reivindicar pela ampliação dos direitos políticos e sociais. É neste período que em muitos países da Europa a classe trabalhadora avança em direção à maior participação na vida política (o sufrágio universal é um exemplo) e organização em grandes partidos e sindicatos.

Aqui cabe falar brevemente acerca das características novas que o Estado assume diante das alterações na sociedade de classes (da concorrência para o monopólio), desenvolvida fundamentalmente em Gramsci na perspectiva da chamada “ampliação do Estado”, sendo central nesse debate o conceito de sociedade civil no mencionado autor.

Como já dito, para Marx sociedade civil correspondia à estrutura, ao conjunto de relações econômicas; já Gramsci identifica essa categoria sociedade civil, segundo Coutinho, como:

Um momento ou esfera da superestrutura. Designa, mais precisamente, o conjunto das instituições responsáveis pela representação dos interesses de diferentes grupos sociais, bem como pela elaboração e/ou difusão de valores simbólicos e de ideologias: ela compreende assim o sistema escolar, as Igrejas, os partidos políticos, as organizações profissionais, os meios de comunicação, as instituições de caráter científico e artístico etc. (COUTINHO, 1984, p.53).

Neste sentido, a hegemonia – a direção social através do consenso – tem sua base material nos “aparelhos privados de hegemonia” como igreja, partidos políticos e mídia, que constituem a denominada sociedade civil.

Portanto, o Estado Ampliado no entendimento de Gramsci é composto pela sociedade política, que se refere ao Estado “restrito” de Marx, com papéis essencialmente coercitivos, e pela sociedade civil, correspondente aos aparelhos privados de hegemonia.

O termo Estado “ampliado” se desenvolve a partir da percepção do fenômeno da socialização da política, que já mencionamos anteriormente. Ou seja, a incorporação de novas determinações no sentido de o Estado responder às expressões da “questão social” não apenas via coerção, mas também via consenso. Isto é, o Estado burguês não utiliza apenas da coerção para consolidar sua dominação. Para isso é necessário desenvolver junto à classe trabalhadora um consenso, em que os valores, ideologia, cultura são absorvidos e reproduzidos socialmente, garantindo a direção social da classe hegemônica economicamente, que passa a ter a legitimação das classes subalternas. A esse processo de forma alguma excluem-se os conflitos, o dissenso, os antagonismos e as lutas de classe.

O Estado, assim, deve ser visto como uma instituição própria do sistema capitalista, orientado a: a) garantir os fundamentos da acumulação capitalista (a propriedade privada, a exploração, o controle capitalista sobre o destino da riqueza socialmente produzida e a repressão a todo ato que ameace a “estabilidade social”; b) promover a legitimação da ordem social vigente (tanto garantindo o envolvimento e o respeito às leis, quanto criando a vinculação e o compromisso dos cidadãos com um ideológico Estado neutro e um também ideológico sistema de liberdade e igualdade de oportunidades para todos); e c) responder a demandas das classes trabalhadoras, desde que não corroam os

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aspectos anteriores, constituindo tais respostas (leis e direitos trabalhistas, direitos e serviços sociais, direitos políticos), verdadeiras conquistas de trabalhadores e setores subalternos da população (MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011, p. 143).

Para tanto, utiliza-se de diferentes estratégias para representar os interesses da classe capitalista como o interesse do conjunto da sociedade. Bem como o Estado endossa a produção e reprodução capitalista, os direitos sociais, os direitos civis e políticos, políticas sociais e os serviços sociais não devem ser concebidos como mera estratégia de dominação burguesa, as políticas sociais e os direitos expressam a correlação de forças entre as classes.

Dentro deste cenário, o aparelho estatal é então obrigado a atender alguns dos pleitos da classe trabalhadora, com vistas manter sua legitimação perante os segmentos subalternos, produzindo um consenso. É importante deixar claro que o Estado não abandona em nenhum momento suas estratégias coercitivas, mas amplia suas funções. É no capitalismo monopolista que o Estado inicia uma “intervenção contínua, sistemática, estratégica sobre as sequelas da 'questão social' através das políticas sociais” (NETTO, 2011, p. 26) 7.

2.2 “Questão social” e Política Social no Capitalismo Monopolista

Na fase clássica do imperialismo, conforme o pensamento liberal vigente na época, o Estado não deveria interferir no mercado e não se reconhecia o atendimento das necessidades sociais como direitos, afirmando que as politicas sociais, ao intervir na pobreza (considerada natural), incentivavam a preguiça. Assim, as ações sociais eram paliativas e constituíam-se principalmente através dos seguros sociais contributivos. Ademais, as expressões da questão social eram tratadas de forma individualizada e moralizante, conforme Behring e Boschetti (2011).

Apesar das políticas sociais representarem uma contradição em relação ao pensamento liberal, elas são implantadas de maneira que não rompam com tal tradição. Conforme Netto “na escala em que se programam medidas públicas para enfrentar as refrações da questão social, a permanência de suas sequelas é deslocada para o espaço da responsabilidade dos sujeitos individuais que as experimentam. ” (NETTO, 2011, p. 32).

Durante as três décadas pós 2° Guerra Mundial, o capitalismo monopolista vivenciou os chamados “anos dourados”. Fundamentando no modo de produção fordista-taylorista e no Estado keynesiano, o capitalismo apresentou uma onda longa expansiva o que fez parte de “períodos cíclicos de prosperidade que [são] mais longos e intensos, e mais curtas e mais superficiais as crises cíclicas”. (MANDEL, 1982 apud NETTO; BRAZ, 2010,

7 Um importante ponto a ser levantado é o caráter fragmentador destas políticas sociais. O Estado responde as expressões da “questão social” (habitação, previdência, educação, violência e etc) como fenômenos isolados, os designados problemas sociais, de modo a desvincular com o modo de produção capitalista, tendo em vista se trata de um Estado Burguês que como vimos buscar conservar a ordem capitalista.

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p.213). A capacidade de produção aumentou, assim como as taxas de lucro das empresas e o crescimento econômico nos países centrais, sob a liderança política e econômica dos Estados Unidos, que se consolidam como a grande potência capitalista. As determinações do período provocaram uma ampliação das funções do Estado, que resultaram na expansão da proteção social da classe trabalhadora.

As transformações na estrutura capitalista decorrem da reconfiguração do capital como resposta a crise de 1929. Advertimos que tal crise não foi novidade à estrutura capitalista em razão de que a própria sociabilidade burguesa, em sua essência e natureza, condiciona o sistema a crises de superprodução e financeiras. Segundo Netto e Braz (2010) o que particulariza a crise no sistema capitalista é que são crises de superprodução, já que os capitalistas produzem incessantemente as mercadorias em busca do lucro, sem um controle global, todavia, estas não conseguem ser escoadas por falta de mercado consumidor, tendo em vista que a classe trabalhadora tem dificuldades materiais para adquirir produtos. Ainda sobre este assunto os autores discorrem que

A análise teórica e histórica do modo de produção capitalista comprova que a crise não é um acidente de percurso, não é aleatória, não é algo independente do movimento do capital. Nem é uma enfermidade, uma anomalia ou uma excepcionalidade que pode ser suprimida no capitalismo. Expressão concentrada das contradições inerentes ao MPC, a crise é constitutiva do capitalismo: não existiu, não existe e não existirá capitalismo sem crise. (NETTO; BRAZ, 2010, p. 157).

Como resposta à crise de 1929, o capital vê a necessidade de um Estado que promova “uma intervenção que envolvesse as condições gerais de produção e de acumulação” (NETTO; BRAZ, 2010, p. 193), ou seja, o Estado é requisitado a ampliar suas funções econômicas, a intervir nas relações de mercado e amenizar as manifestações da questão social.

Na esfera produtiva o capital também introduz mudanças na organização da produção, que passa a ser predominantemente organizado apoiado nos princípios do fordismo–taylorismo. Conforme Harvey (2012), este modelo se refere aos métodos de organização de produção introduzidos por Henry Ford8 que tem como principais fundamentos a produção em massa e a divisão do trabalho (através da linha de montagem móvel, em que os trabalhadores se inserem de modo fixo e o produto que é deslocado) e aumento salarial para proporcionar o consumo também massificado. Ademais, o fordismo incorporou os princípios científicos de Taylor que em busca do aumento da produtividade, promoveu técnicas de “racionalização” da produção, com medidas como rígido controle do tempo do processo de trabalho. É importante salientar que tais medidas provocam uma intensificação da exploração do trabalhador, que tem seu ritmo de trabalho controlado constantemente, além disso, ao promover a divisão de tarefas exacerba a fragmentação do trabalho, aprofundando a separação entre o trabalho intelectual e o manual.

8 Henry Ford foi um empresário norte americano que na década de 1910 implantou a linha de montagem e de produção em massa no ramo automobilístico. No pós-guerra esses princípios foram expandidos mundialmente.

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Harvey (2012) designa esse modo de organização de produção de acumulação rígida, pois “havia problemas com a rigidez dos investimentos de capital fixo em larga escala e de longo prazo em sistemas de produção em massa [...] havia problemas de rigidez no mercado, na alocação e no contrato de trabalho” (HARVEY, 2012, p.135).

Neste contexto, o Estado também é requisitado a ampliar sua regulação social, visando desonerar o custo de reprodução do capital e ampliar o poder de consumo dos trabalhadores, para comportar a poder em massa, apesar da tendência de subconsumo. Assim, a ampliação dos serviços sociais é resultante da necessidade do Estado atender aos interesses do capital, fornecendo as condições de absorção das mercadorias, que são produzidas em larga escala segundo a organização de produção fordista. Deste modo, entendemos que o Welfare State reforça o caráter contraditório das políticas sociais, pois a melhora das condições de vida de parcelas da classe trabalhadora foi atrelada a uma valorização muito maior do capital.

Outro fator importante para a ampliação dos direitos é o contexto sócio histórico. Em um primeiro momento, no contexto da Revolução Russa em 1917 e o avanço do movimento socialista e concomitante, o robustecimento do movimento operário. Além disso, o contexto social e histórico que o capitalismo evidenciava, como a Guerra Fria, o fortalecimento de sindicatos e partidos, a ameaça socialista na antiga URSS era um perigo para a ordem burguesa.

Desse modo, a expansão dos direitos sociais pela via da ampliação do papel regulador do Estado burguês foi importante na administração do consenso na sociedade. Para a burguesia alcançar a hegemonia, necessitou atender algumas demandas dos operários e/ou atuar sobre as expressões da “questão social”, via políticas sociais (não exclusivamente) que são expandidas.9 Vale destacar a importância da categoria consenso expressada em Gramsci, como objeto fundamental de controle social exercida pela classe dominante sobre a classe dominada, em que pela ideologia garante-se a cooptação da massa com vistas à reprodução do status quo.

E a partir daí o Estado é obrigado a expandir suas funções, visto que sua intervenção é uma necessidade do capital para garantia de direção ideológica.

Desses processos complexos decorre, então, uma espécie de “contestação burguesa” do liberalismo ortodoxo, expressa principalmente na chamada “revolução keynesiana”. As proposições de Keynes estavam sintonizadas com a experiência do New Deal americano, e inspiraram principalmente as saídas europeias da crise, sendo que ambas têm um ponto em comum: a sustentação pública de um conjunto de medidas anticrise ou anticíclicas, tendo em vista amortecer as crises cíclicas de superprodução, superacumulação e subconsumo, ensejadas a partir da lógica do capital (BEHRING; BOSCHETTI, 2011, p. 71).

9 Ademais, o Estado de Bem-Estar Social reforça o controle exercido pelos capitalistas e Estado sobre os trabalhadores, os benefícios sociais são atrelados à fiscalização dos operários. Conforme vimos no modelo de produção fordista combinado com um Estado regulador para vigiar, monitorar e limitar o cotidiano dos operários.

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Como suporte teórico o principal representante é Keynes que defende maior intervenção do Estado na economia e descarta a tese de que a economia capitalista é autônoma e autorregulada, propondo a necessidade da participação do Estado na dinamização da economia através da geração de empregos, aumento de salários, etc. Essas ideias serão expandidas como suporte teórico, político e ideológico utilizado pela burguesia para justificar suas ações e a consolidação dos Estados de bem-estar social. As transformações do Estado apoiadas nas ideias de Keynes e seus seguidores se colocam como uma necessidade do capital de ampliar o Estado e suas atribuições.

Keynes assevera que a mão invisível do mercado por si só não é suficiente para gerir a economia, segundo o autor os empresários não pensam na coletividade e por isso, não alcançaria uma conciliação entre capitalistas e trabalhadores. Por isso, evoca o Estado10 regulador como juiz neutro e imparcial que tem como função a organização da vida econômica, social e política, além de ser o salvaguarda da dívida pública.

Um dos pilares do Estado keynesiano é a chamada política do pleno emprego, destarte afirma-se que com a geração de empregos haveria um aumento do consumo e o escoamento de mercadorias, e, a partir dessa lógica, incentiva-se e impulsiona-se o crescimento e desenvolvimento da economia capitalista; outro pilar dessa teoria é o alcance do aumento da igualdade social através do acréscimo da renda, ampliando as ofertas de serviços sociais e políticas sociais à classe trabalhadora.

O keynesianismo ao combinar-se com o fordismo contribuem com a acumulação acelerada do capital, segundo Behring e Boschetti (2011), alcança altas taxas de lucro, intensificando o processo de mundialização do capital. Muitos pensadores acrescem a isso a elevação do padrão de vida do trabalhador, contudo esse padrão de qualidade não se refletiu nas classes operárias dos países periféricos. Após a Grande Depressão consolidou-se

A convicção sobre a necessidade de regulação estatal para seu enfrentamento. Esta só foi possível pela conjugação de alguns fatores como: a) estabelecimento de políticas keynesianas com vistas a gerar pleno emprego e crescimento econômico num mercado capitalista liberal; b) instituição de serviços e políticas sociais com vistas a criar demanda e ampliar o mercado de consumo; e c) um amplo acordo entre esquerda e direita, entre capital e trabalho (BEHRING; BOSCHETTI, 2011, p. 92).

Portanto, nos chamados “anos dourados” do capitalismo, houve a expansão de direitos sociais materializada com as políticas sociais, como por exemplo, o crescimento de beneficiários de aposentadorias, expansão dos serviços de saúde, cobertura de acidentes de trabalho, seguro-doença, seguro-desemprego, aposentadoria por invalidez e auxílio-maternidade. Esses direitos sociais são produtos das lutas da classe trabalhadora, apesar

10Tal como mencionado acima, neste trabalho defendemos a ideia de que o Estado

não é um ente desvinculado dos interesses de classe, além dos interesses unilaterais, o Estado é um instrumento da classe dominante que tem um claro compromisso de classe, sendo a burguesia. Pode haver momentos em que cede às pressões da classe trabalhadora para garantir determinado direito, todavia este é o comitê executivo da burguesia.

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do que o projeto societário dos trabalhadores não ter confluído na transformação da ordem, os direitos sociais têm um limite claro na acumulação capitalista, no entanto contribuem com a melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores explorados.

No entanto, ao final da década de 1960, de acordo com a tendência à queda de taxa de lucros, o modelo fordista-keynesiano já apresentava sinais de esgotamento, com a redução dos lucros e de crescimento econômico nos países centrais, sendo o epicentro da crise o ano de 1973.

Uma crise clássica de superprodução, se observadas as tendências de longo prazo fundadas na lei do valor. O já presente agravamento do problema do desemprego pela introdução de técnicas capital-intensivas e poupadoras de mão de obra, a alta dos preços de matérias-primas importantes, a queda do volume do comércio mundial e um poder de barganha razoável dos trabalhadores empregados, advindo do ainda recente período de pleno emprego no capitalismo central, são elementos que estão na base da queda da demanda global (de um ponto de vista keynesiano) e da erosão inexorável da taxa média de lucros, de uma óptica marxista, no início dos anos de 1970 (BEHRING; BOSCHETTI, 2011, p. 116)

Com intuito de reverter estes sinais, os Estados burgueses dos países centrais apostam no aumento de emissão de moedas, que provocam o agravamento da inflação e crise inerentes ao Estado capitalista. O capital ainda enfrentava uma crise política em decorrência dos fortes movimentos sociais que desde a década de 1960, lutavam por direitos, transformações culturais e a construção de um novo sistema de produção, conforme Netto e Braz (2010).

Como já mencionado, as crises no capitalismo são estruturais, produtos das contradições inerentes ao modo de produção capitalista, e ascendem a partir de detonadores. Em 1973, a desvinculação do dólar norte-americano ao ouro, que fundamentava o sistema financeiro mundial e o aumento do preço do petróleo em virtude de decisão dos países da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) eclodem como detonadores da crise.

Deste modo, na década de 1970 o capitalismo mundial entra em recessão generalizada, com queda das taxas de lucro e crescimento somados ao aumento descontrolado da inflação. Utilizando os termos de Netto e Braz (2010), o capitalismo entra em uma onda longa recessiva, que perdura até a atualidade, em que as crises se tornam mais intensas e mais constantes em relação aos períodos de crescimento.

A fim de retomar as taxas de lucro, o capital sofre uma série de modificações econômicas, políticas e culturais, que constituem a atual etapa do imperialismo – o capitalismo contemporâneo.

Harvey (2012) identifica que para enfrentar a crise estrutural do capital e retomar as taxas de lucros, a partir da década de 1970 o capital requer encontrar novas formas de organização, dessa forma consolida-se a sua reestruturação, modificando produção, substituindo a lógica de acumulação rígida pela organização flexível.

A acumulação flexível, como vou chama-la, é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo. Ela se apoia na

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flexibilidade dos processos de trabalho dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial tecnológica e organizacional [...] Ela também envolve um novo movimento que chamarei de ‘’compreensão do espaço tempo” no mundo capitalista (HARVEY, 2012, p.140).

Nesta reestruturação, o capital financeiro assume a liderança no processo de acumulação, acompanhado pela reestruturação produtiva e a refuncionalização do papel do Estado.

Sabemos que o capitalismo passou por modificações no decorrer do seu desenvolvimento, na atualidade o capital financeiro traz consigo uma grande inovação permitindo a sustentação do capitalismo através da garantia da reprodução e a acumulação. O capital financeiro, que se origina da junção do capital industrial com o capital bancário, obtém lucro a partir dos juros da massa de capital monetário. Portanto, o capital financeiro pertence à esfera de circulação, de modo que não cria valor, já que não produz mercadorias, através da exploração do trabalho.

Propiciado pelos recursos informacionais, que garantem comunicações instantâneas entre agentes econômicos situados nos mais distantes rincões do planeta, esse processo tem suportes na gigantesca concentração do sistema bancário e financeiro. Esta, ao longo dos últimos trinta anos, acompanhou a concentração geral operada na economia capitalista; contudo, teve efeitos específicos, dada a amplitude que as atividades especulativas adquiriram nesse lapso de tempo: menos de 300 bancos (e corretoras de ações e títulos) globais controlam, em finais do século XX, as finanças internacionais (NETTO; BRAZ, 2010, p. 230).

Alguns capitalistas passaram a viver exclusivamente do capital portador de juros, são os chamados capitalistas rentistas. Neste processo, acontece a fetichização do capital financeiro, que passa a ser considerado como autônomo à esfera da produção, desconsiderando que os juros provêm da mais-valia.

A financeirização do capitalismo contemporâneo deve-se a que as transações financeiras (isto é: as operações situadas na esfera da circulação) tornaram-se sob todos os sentidos hipertrofiadas e desproporcionais em relação à produção real de valores – tornaram-se dominantemente especulativas. Os rentistas e os possuidores de capital fictício (ações, cotas de fundos de investimentos, títulos de dívida pública) extraem ganhos sobre valores frequentemente imaginários – e só descobrem isso quando, nas crises do “mercado financeiro”, papéis que, à noite, “valiam” X na bela manhã seguinte passam a “valer” –X ou, literalmente, a não “valer” nada (NETTO; BRAZ, 2010, p. 232).

Outra saída para a crise estrutural da década de 1970 é o investimento no avanço tecnológico, principalmente na indústria robótica e microeletrônica, que permite a flexibilização na organização da produção vinculada a um impressionante aumento da produtividade. No modo de produção capitalista,

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o desenvolvimento das forças produtivas é acompanhado pela redução do trabalho vivo inseridos de forma direta na produção, em consequência de alteração na composição orgânica do capital de rebaixar custos de produção para alcançar lucros maiores. Portanto, a acumulação flexível também provoca modificações no modo de organização da produção, com intuito de permitir uma maior acumulação do capital, garantindo o aumento da taxa de lucros, o que é feito com a substituição do modelo de produção fordista-taylorista pelo toyotista assentando na flexibilização.

As mudanças na organização da produção apoiam-se no toyotismo que se refere a um modelo de produção que surge na empresa japonesa Toyota durante da década de 1950, que pode ser caracterizado da seguinte forma.

Em seus traços mais gerais, o toyotismo (via particular de consolidação do capitalismo monopolista do Japão do pós-45) pode ser entendido como uma forma de organização do trabalho que nasce a partir da fábrica Toyota, no Japão e que vem se expandindo pelo Ocidente capitalista, tanto nos países avançados quanto naqueles que se encontram subordinados. Suas características básicas (em contraposição ao taylorismo/fordismo) são: 1) sua produção muito vinculada à demanda; 2) ela é variada e bastante heterogênea; 3) fundamenta-se no trabalho operário em equipe, com multivariedade de funções. 4) tem como princípio o just in time, o melhor aproveitamento possível do tempo de produção e funciona segundo o sistema de kanban, placas ou senhas de comando para reposição de peças e de estoque que, no toyotismo, devem ser mínimos. Enquanto na fábrica fordista cerca de 75% era produzido no seu interior, na fábrica toyotista somente cerca de 25% é produzido no seu interior. Ela horizontaliza o processo produtivo e transfere à “terceiros” grande parte do que anteriormente era produzido dentro dela (ANTUNES,2010, p. 106)

Além disso, cabe ressaltar que o toyotismo permite um menor investimento e economia de capital devido à flexibilidade de produção de mercadorias, evitando desperdícios, de maneira que permite adaptar o custo investido na produção à demanda do mercado. Outro traço do toyotismo é a intensificação na exploração do trabalhador, pois este passa a desempenhar múltiplas funções (trabalhador polivalente), garantindo assim uma maior extração da mais-valia para o capital.

Nos termos de Antunes (2010) há uma heterogeneização, fragmentação e complexificação da classe operária. A fragmentação da classe operária também não é isenta, por haver divisões dos trabalhadores, enfraquecimento de sua organização política e perda da força sindical gera-se dentro do movimento um estranhamento, não se reconhecendo como pertencente a uma classe e que possui uma luta conjunta.

Há uma redução do contingente da classe trabalhadora nos espaços fabris deslocando-se para as indústrias de serviços. O capital prioriza a ampliação de empregos sem estabilidade, o emprego de trabalhadores nos setores de serviços, empregos temporários e terceirizados. Dessa forma

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barateia-se a força de trabalho, pois há uma precarização do trabalho e da remuneração, assim como um aumente da flexibilização dos direitos trabalhistas, como estratégia para atenuar o ônus da redução da taxa média de lucro e garantir a acumulação e valorização do capital, que tem em uma de suas causas a crise econômica cíclica. Soma-se a esse quadro o processo de robotização e intensificação do uso da tecnologia, substituindo o trabalho vivo por trabalho morto, investindo-se em capital constante em detrimento do capital variável. O processo de reestruturação produtiva também contribui para o crescimento do desemprego estrutural e de subempregos.

Antunes sintetiza:

É preciso que se diga de forma clara: desregulamentação, flexibilização, terceirização, bem como todo esse receituário que se esparrama pelo “mundo empresarial”, são expressões de uma lógica societal onde o capital vale e força humana de trabalho só conta enquanto parcela imprescindível para a reprodução desse mesmo capital. Isso, porque o capital é incapaz de realizar sua autovalorização sem utilizar-se do trabalho humano. Pode diminuir o trabalho vivo, mas não eliminá-lo. Pode precarizá-lo e desempregar parcelas imensas da população, mas não pode extingui-lo (ANTUNES, 2010, p.192).

Destaca-se a vulnerabilidade da classe trabalhadora que ocorre e exacerba-se na crise contemporânea do capital e comprova-se com dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que revela que cerca de um bilhão e duzentos milhões de trabalhadores estão desempregados ou em condições precárias de trabalho.

O ponto fundamental é questionar o que acontece com esse contingente de trabalhadores, isto é, a superpopulação relativa, conforme denominado por Marx. Segundo Antunes (2010), a transformação societária carrega consequências com fortes implicações para a vida dos trabalhadores. O autor também sustenta que nos países centrais há uma dificuldade na inserção de jovens e idosos no mercado de trabalho, pois dificilmente os idosos conseguem retornar a atividade laboral e os jovens não conseguem empregos regulamentados; nos países emergentes há um numero crescente de crianças que ingressam ilegalmente no mercado e trabalho, além de vastos casos de trabalhadores em condições de trabalho análogo ao de escravo.

Podemos então afirmar que há um aumento da superpopulação relativa, que é definida pela teoria marxiana como uma população excedentária ás necessidades de acumulação e reprodução do capital. Nos termos de Marx

A acumulação capitalista produz constantemente – e isso em proporção á sua energia e ás suas dimensões – uma população trabalhadora adicional relativamente supérflua ou subsidiária, ao menos no concernente ás necessidades de aproveitamento por parte do capital (MARX, 1984 apud NETTO; BRAZ, 2010, p. 199).

Cabe observar que esse crescimento da população mais miserável é

resultado do próprio desenvolvimento do capitalismo, de maneira que a

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tendência é a ampliação desse contingente populacional. Marx explica tal fenômeno através da lei geral de acumulação capitalista

Quanto maiores a riqueza social, o capital em funcionamento, o volume e a energia de seu crescimento, portanto também a grandeza absoluta do proletariado e a força produtiva de seu trabalho, tanto maior o exército industrial de reserva. A força de trabalho disponível é desenvolvida pelas mesmas causas que a força expansiva do capital. A grandeza proporcional do exército industrial de reserva cresce, portanto, com as potências da riqueza. Mas quanto maior esse exército de reserva em relação ao exército ativo de trabalhadores, tanto mais maciça a superpopulação consolidada, cuja miséria está em razão inversa do suplício de seu trabalho. Quanto maior, finalmente, a camada lazarenta da classe trabalhadora e o exército industrial de reserva, tanto maior o pauperismo oficial (MARX, 1984 apud NETTO; BRAZ, 2010, p. 209).

O desenvolvimento do modo de produção capitalista exige uma reestruturação do Estado, que para atender as necessidades de valorização do capital deve promover uma desregulamentação da economia e dos direitos sociais, formando “um Estado mínimo para classe trabalhadora e máximo para o capital" (NETTO; BRAZ, 2010, p. 227). De um lado, o Estado tem um papel ativo em garantir as condições atuais de reprodução do capital, que sob a liderança do capital financeiro requer uma liberalização da economia, com a desobstrução de quaisquer limites ao capital. O Estado também desempenha importante papel ao transferir recursos aos grandes capitalistas, seja a partir de privatizações e isenções fiscais, ou pelo superávit.

Por outro lado, procura se destruir a base protetiva do trabalho do “Estado de bem-estar social”, com a flexibilização das leis trabalhistas e direitos sociais, com o intuito de atender as novas necessidades do capital. O Estado que passa a minimizar as políticas sociais, também é requisitado para combater a organização da classe trabalhadora, o que é realizado tanto através da repressão policial como por legislação antisindical.

Para justificar tais transformações como necessárias há o suporte político ideológico neoliberal, cujo principal teórico foi Friedrich Hayek, que criticava o Welfare State, responsabilizando o Estado pelo declínio do crescimento econômico, pela perda de liberdade individual e pelo aumento da dependência dos indivíduos.

As raízes da crise, afirmavam Hayek e seus companheiros, estavam no poder excessivo e nefasto dos sindicatos e, de maneira mais geral, do movimento operário, que havia corroído as bases de acumulação capitalista com suas pressões reivindicativas sobre os salários e com sua pressão parasitária para que o Estado aumentasse cada vez mais os gastos sociais (ANDERSON, 1995, p.10).

Desta maneira, para o pensamento neoliberal, para a saída da crise "o remédio, então, era claro: manter um Estado forte, sim, em sua capacidade de romper o poder dos sindicatos e no controle do dinheiro, mas parco em todos os gastos sociais e nas intervenções econômicas" (ANDERSON, 1995, p. 9).

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O ideário neoliberal se expande mundialmente na década de 1980. No entanto, como exposto por Anderson (1995), a receita neoliberal, apesar de ter conseguido controlar a inflação nos países centrais europeus, fracassa economicamente, pois o capital não consegue recuperar o alto nível de crescimento dos “anos dourados”. No Brasil, a diferença de outros países da América Latina, o ideário neoliberal é implementado na década de 1990, com determinações próprias.

Essas modificações do capital provocam uma série de transformações no mundo do trabalho. Com buscas a ampliação da lucratividade devido à redução da taxa média de lucro, os trabalhadores sofrem consideráveis cortes como a redução de salários, a flexibilização dos direitos sociais conquistados, uma exponenciação da terceirização e o agravamento do desemprego estrutural11. Há uma radicalização da questão social com o crescimento do desemprego, da pobreza e desigualdade social. Todavia a intervenção do Estado nessas expressões é reduzida, em decorrência da necessidade de corte nos gastos sociais para atender as necessidades do capital.

Deste modo, o trabalhador é a classe que mais sofre impactos com a crise, intensifica sua exploração, cresce a superpopulação. Esse contexto de transformações demanda uma atuação diferente do Estado, tendo em vista a necessidade de controle da força de trabalho e da população mais pobre ausente do mercado formal de trabalho. Conforme observado anteriormente, o Estado assume funções diferenciadas, como o exacerbamento do caráter punitivo, a sua redução de atuação na esfera social, ou seja, as políticas sociais passam a ser focalizadas e pontuais, em que somente os mais pobres têm acesso a tal, um exemplo concreto é o programa de transferência de renda voltado aos indigentes para que se retirem dessa linha de miséria.

Assim, entendemos que a crise contemporânea do capital produz uma exponenciação das manifestações da “questão social”, com a ampliação da miséria absoluta e relativa da maior parte da classe trabalhadora, diferente de dizer que produz uma “nova questão social”, o que é falso. Entretanto, as respostas do Estado direcionadas a proteger os cidadãos se reduzem cada vez mais, à medida que a “questão social” passa a ser tratada através da articulação entre repressão e assistência.

Em outras palavras: uma vez que as políticas sociais se tornam cada vez mais minimizadas, focalizadas e paliativas, o Estado investe mais na política de assistência social, que passa a ser entendida como central na proteção social, voltada ao alívio da pobreza.

Dessa maneira, das múltiplas crises produzidas pelo capitalismo, buscamos destacar aqui a crise da década de 1970. Atingindo, num primeiro momento, os países capitalistas centrais, atacando políticas sociais e trabalhistas, flexibilizando e reestruturando a própria forma de sociabilidade, produção e reprodução da vida social, incidindo principalmente sobre o trabalho e a classe trabalhadora. A acumulação flexível provoca modificações

11Caracteriza-se pela generalização do desemprego. Ocorre pelas mudanças na

esfera econômica e pelo avanço de tecnologia, onde há um desencontro entre a oferta e procura de competências de trabalho. A força de trabalho representava uma utilidade dentro do mercado, e posteriormente, com o desenvolvimento tecnológico onde possa substituir a mão de obra do trabalhador. Esta é uma tendência geral da sociedade capitalista.

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no modo de organização da produção, com o objetivo de permitir uma maior acumulação do capital, garantindo o aumento da taxa de lucros, o que é feito com a substituição do modelo de produção fordista-taylorista pelo toyotista. Com buscas a ampliação da lucratividade devido à redução da taxa média de lucro, os trabalhadores sofrem consideráveis cortes como a redução de salários, a flexibilização dos direitos sociais conquistados, um enorme crescimento da terceirização e o agravamento do desemprego estrutural. A fragmentação da classe operária também não é isenta, por haver divisões dos trabalhadores, enfraquecimento de sua organização política e perda da força sindical gera-se dentro do movimento um estranhamento, não se reconhecendo como pertencente a uma classe e que possui uma luta conjunta. Há um aprofundamento das expressões da “questão social” com o crescimento do desemprego, da pobreza e desigualdade social. Todavia a intervenção do Estado nessas expressões é reduzida, em decorrência da necessidade de corte nos gastos sociais para atender as necessidades do capital.

Assim, as transformações nos processos produtivos impactam nas condições de reprodução dos trabalhadores e, invariavelmente aumenta o grau de vulnerabilidade daqueles que vivem do trabalho. Assim é também para os “sujeitos trabalhadores pais” que estamos analisando nessa monografia e pretendemos melhor desenvolver no capítulo seguinte. Deparamo-nos com uma realidade de pais que precisam sustentar a família com empregos precários, que engrossam as fileiras da superpopulação ativa latente e flutuante. Ora empregados, ora desempregados, vivem o dilema diário da responsabilidade em “colocar a comida em casa” e, objetivamente, não podem/conseguem acompanhar suas companheiras no período gestacional. De forma alguma desconsideramos os determinantes do patriarcado sobre essa realidade, no sentido de sobrecarregar a mãe como se fosse responsável “natural” dessas questões e o pai como único provedor. Porém, como demonstra o trabalho que viemos desenvolvendo até aqui, apontamos para as relações concretas de produção e reprodução sociais o fundamento dessa expressão da “questão social” e respostas do Estado na perspectiva de direitos sociais, apesar da realidade que aponta cada vez mais à sua minimização, focalização e desestruturação com a permanência de aspectos regressivos da realidade brasileira.

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CAPÍTULO 3 – A PRESENÇA PATERNA NO PERÍODO GESTACIONAL: reflexões sobre limites e possibilidades das políticas sociais junto aos pais trabalhadores a partir da experiência no Projeto Cegonha Carioca.

3.1 Conclusões e reflexões sobre a experiência de estágio a partir de outros estudos e experiências

O período gestacional é, certamente, um momento repleto de emoções, significados e grandes responsabilidades. Considerando o perfil a que nos propomos estudar nesses escritos monográficos – famílias oriundas das camadas mais subalternizadas da classe trabalhadora, em condições bem precárias para se reproduzirem materialmente –, acumulam-se dificuldades, que se acentuam cada vez mais na medida em que tais famílias são sobrecarregadas pelas múltiplas contradições da sociedade em que vivemos.

Dantes, a paternidade era acatada como alguma coisa natural, e tanto a sociedade quanto a ciência não apontavam para a importância do “pai-presente” e sua influência direta no desenvolvimento da criança. Há muito tempo o pai é esquecido nas pesquisas, e a reprodução da lógica de cuidado e obrigações direcionadas exclusivamente à mãe tem sido reproduzido nos estudos acerca do tema, o que acaba por produzir um descuido em relação ao pai, como podermos observar em Pereira e Arpini (2012). Portanto, é importante começarmos a identificar e estimular os estudos que deem conta de abarcar a figura paterna e, principalmente, a importância de suas funções nas relações familiares. A presença paterna é importantíssima no período da gestação na medida em que o pai adota uma postura de

[…] novos cuidados como: carinho, ajuda com afazeres domésticos, cuidados com os demais filhos, preocupação com seu bem-estar. Nota-se que o homem como companheiro transmite amor e segurança a mulher, compartilhando as alegrias do nascimento e as tarefas diárias outrora reservadas culturalmente e exclusivamente as mulheres, colaborando com as atividades da vida diária, apoio biopsicossocial para que esta tenha uma gestação humanizada. (SILVA, CARDOSO, CALHEIROS, et al., 2013, p. 1379)

Essa lógica de aproximação do homem é importante ao passo em que se apresenta como uma importante estratégia para quebrar e modificar, na prática, construções sociais de gênero que responsabilizam as mulheres em tudo que envolve cuidados e criação das crianças e, assim sendo, afastam os homens tanto dos seus deveres quanto de aprendizados e prazeres que estão para ser conhecidos neste universo.

Nesse aspecto envolvem-se diversos determinantes sociais que precisam ser considerados com atenção, no sentido de poder compreender de fato quais nos interessam para o debate em questão. Cabe dizer: em como se dá (ou não se dá) a inserção do pai ao longo do período de gestação a partir do que se percebeu durante o estágio curricular na instituição Maternidade-Escola, da UFRJ, na participação como profissional de saúde do projeto Cegonha Carioca e, de outros estudos e pesquisas que extraíram dados que acrescentam informações relevantes ao nosso debate, e apresentam resultados semelhantes com a experiência vivida na instituição

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citada. Dessa maneira, quais fatores para nós, podem limitar a presença paterna no acompanhamento da gestação junto à mãe.

Portanto, as reflexões que desenvolvemos se dão a partir de inserção como estagiário em Serviço Social junto a gestantes e puérperas, e seus respectivos acompanhantes no Hospital Maternidade-Escola da UFRJ, situada na Rua das Laranjeiras, 180 – Laranjeiras, Rio de Janeiro. A Maternidade é uma unidade especializada que presta assistência integral, ambulatorial e hospitalar, oferecendo linhas de cuidado específicas para a atenção de gestantes e recém-nascidos de médio e alto risco. É uma instituição de natureza pública, credenciada ao Sistema Único de Saúde – SUS, de nível terciário. Seus recursos financeiros são provenientes da própria UFRJ, já que também é vinculada à universidade, sendo campo de estudo e estágio de seus profissionais; e também do Ministério da Saúde. Seu público-alvo, gestantes de médio e alto risco, das classes mais pobres e pauperizadas do município, e estão situados na área programática AP2.1, são direcionados pelo SISREG, Sistema de regulação de vagas do Rio de Janeiro, assim como gestantes de risco de todas as partes do município, inclusive em alguns casos de outras cidades e estados.

Ao longo de 18 meses participei de 403 atividades orientadas às gestantes (público-alvo do projeto), em sua maioria com a participação de seus acompanhantes, além de atividades destinadas somente aos acompanhantes (que em sua maioria não eram os pais, e sim, familiares, do sexo feminino, como mães, irmãs e primas). Quais sejam: atendimento nos leitos, entrevista inicial, demanda espontânea, grupos de gestantes diabéticas, de acolhimento, e de acompanhamento, e ação educativa do Projeto Cegonha Carioca com visita guiada pelas instalações da instituição, na qual participei diretamente, guiando a visita e apresentando a palestra – que consistia em uma apresentação do Serviço Social, Enfermagem e Nutrição, onde eram passadas as informações mais importantes nesse período que antecede ao parto e abria-se para uma roda de conversa – durante quase todo período de estágio, e muitas vezes sozinho. Esta última foi à porta de entrada para o contato direto com os pais, foco desta monografia, tendo em vista que era o momento de maior presença real desses sujeitos, estimulados a participar das palestras e visitas guiadas, e incentivados a se expressar e tirar suas dúvidas junto com as gestantes. Importante ressaltar que este contato, muitas vezes inicial, gerava um vínculo com o respectivo pai, encontrando-o outras vezes, seja em outras consultas, grupos ou nos dias posteriores ao nascimento, visto que toda manhã realizava entrevistas e visitas cotidianas aos alojamentos conjuntos. Ao todo, participei de 105 ações educativas, com a participação total de 400 pais, a partir das quais, principalmente, depois do vínculo criado, pude ter cada vez mais contato com os problemas dos mesmos que, ao nos procurarem e relatarem suas adversidades se tornou objeto de investigação e inquietações diárias em meus diários de campo e, estimulo para produção deste trabalho, com o acumulo de pesquisas e informações de outras produções acadêmicas que identificaram através da experiência cotidiana e métodos de pesquisa, resultados e conclusões que apresentam semelhanças.

A contradição real que se apresentava cotidianamente em seus relatos apontava para a grande dificuldade de estar presente na Maternidade. Em tais relatos e aproximações cotidianas, muitas vezes fora dos grupos ou de

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atendimentos formais – como nos corredores e nos espaços mais variados da instituição –, esses pais, em sua maioria reflexivos e sensibilizados pelo constante trabalho de estímulo realizado pela equipe de saúde, apresentavam uma realidade em que demonstravam vontade de participar mais presencial e ativamente nesse período da gestação juntamente à mãe. Inclusive, vários deles expressavam arrependimento de não ter acompanhado seus outros filhos, levantando reflexões sobre o cuidado paterno e do casal, e especificamente o seu vínculo, muitas vezes fragilizado, com este citado filho. Visto que ainda carregam fortemente suas opiniões e atitudes machistas e patriarcais.

Sendo assim, os fatos expostos por esses relatos apontavam para uma realidade concreta e imposta neste no modo de produção capitalista, que, como já mencionamos, atinge fundamentalmente as classes mais pauperizadas, e giravam em torno das dificuldades que esbarram as necessidades humanas e de saúde dos trabalhadores com as necessidades de produção e reprodução do capital. Assim, não surpreendiam e eram rotineiras, as narrativas que descreviam a dificuldade de liberação no trabalho, assédios trabalhistas e acordos ilegais, acentuando-se a isso a falta de informação dos pais quanto aos seus direitos e, para além, esbarrando nas questões trabalhistas e legais, já que o Estado através de suas leis não garante sua presença progressiva nem durante a gestação (nas consultas do pré-natal), que dirá após o nascimento, (art. 473, III da CLT) só garante cinco dias corridos após o nascimento do bebê.

A discussão da presença paterna no período da gestação vem sendo reconhecido no mundo, e no Brasil esse debate vem sendo ampliado pelo país e algumas localidades como Cuiabá, Niterói, Florianópolis, Manaus, Pernambuco, Porto Alegre e João Pessoa já criaram leis locais que ampliam a licença paternidade para 10,15 ou 30 dias para os servidores públicos. Além disso, a emenda constitucional 63/2015, de 22 de dezembro de 2015, estende a licença paternidade para o prazo de 30 dias para todos servidores civis e militares no estado do Rio de Janeiro. E com objetivo de ampliar esse direito foi sancionada a Lei 13.257/2016 no dia 08 de março de 2016, que dispõe sobre as políticas públicas para primeira infância. Nesta lei, existem artigos exclusivos ligados ao exercício da paternidade ativa e consciente, como ampliação da licença paternidade para os funcionários das empresas cidadãs que atualmente tem direito a 20 dias. Portanto, como se pode observar, o movimento em direção a maior garantia de acesso a presença paterna, ainda é pequeno, se consideramos a extensão do país, contudo, ele existe, mas fundamentalmente, não atinge toda a população e, menos ainda, as classes mais pobres da sociedade, população real sendo estudada neste trabalho.

Outro fator frequentemente citado durante os relatos e atendimentos estava ligado ao fato do sistema de saúde estimular no discurso a participação paterna, mas na prática não realizar atividades e estratégias que possam de fato tornar real sua presença, desde os horários das atividades até um formato mais interessante das mesmas, visto que, por estarem cansados da rotina de trabalho, reiteram a necessidade de um processo de atividades mais interessante.

Mais um fato exposto está relacionado aos atendimentos estarem focados sempre nas mães, e que apesar de compreenderem a necessidade

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por motivos biológicos de uma atenção maior à gestante, queixam-se da necessidade de um espaço que é seu, por direito. Sob essas mesmas experiências, constata-se que:

Além disso, no contexto de uma gestação, com a chegada do bebê, que se configura como mais um membro da família, o trabalho como fonte de sustento financeiro, tende a ser ainda mais valorizado pelo homem. No que se refere ao desinteresse dos homens em participar das consultas, discute-se a falta de incentivo dessa participação, seja pela gestante, seja pela ausência de acolhimento dos serviços de saúde. O acolhimento é referido no PHPN como “aspecto essencial da política de humanização”. Observa-se que o profissional de saúde foca sua atenção, durante as consultas de pré-natal, especificamente, na gestante, não permitindo que o homem participe e interaja neste momento. (SILVA, CARDOSO, CALHEIROS, et al., 2013, p.X)

Outro estudo realizado pela Revista de Enfermagem da UFPE (2013), com abordagem qualitativa, de natureza exploratório-descritiva, desenvolvido em uma maternidade pública de um hospital geral, na cidade de Alfenas, Minas Gerais, Brasil, com 15 puérperas sendo atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), conclui que:

[…] o trabalho é um fator que dificulta a participação dos pais nas consultas pré-natal, pois os horários das mesmas acontecem no período comercial, tornando-se pouco favoráveis à inclusão paterna. A sociedade e o mercado de trabalho não incentivam a participação do pai trabalhador, possibilitando sua falta ao trabalho para dar assistência à sua mulher e filho durante a consulta pré-natal por considerar que quem precisa de cuidados é a mulher grávida e que ela deve ser capaz de cuidar-se ou ter alguém que cuide dela, não necessariamente o parceiro. (p. 1378)

Posto isso, não é nada desprezível o fato da maioria desses sujeitos se encontrarem em condições precárias de vida e emprego, e que diante de suas condições reais acaba não configurando uma realidade de “simples” abandono, no sentido de culpabilizar tais homens a partir de um viés moralista, quanto à sua não participação no período gestacional, claro que aqui não podemos desconsiderar as problemáticas das relações patriarcais e machistas que assolam o cotidiano, e influenciam fortemente este processo mencionado.

A presença paterna no período gestacional é de extrema importância para a gestação e consequentemente para a mulher e o recém-nascido, como já foi mencionado neste trabalho, e diante disso, as equipes de saúde pública são orientadas a estimular a presença dos mesmos, conforme podemos constatar no Guia do Pré-natal do Parceiro, do Ministério da Saúde (2016), que orienta aos profissionais de saúde, “(..) as equipes de saúde devem incentivar o envolvimento do pai/parceiro e sua participação desde o teste de gravidez, passando pelo puerpério até o acompanhamento do desenvolvimento integral do filho/a”(p.18).

Com isso, a partir da experiência que vem sendo mencionada e os estudos sobre o tema, apesar da importância apontada pelos estudos e pesquisas, podemos afirmar que há um grande percentual de pais que estão ausentes durante todo ou quase todo o período gestacional, constituindo uma

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realidade nada incomum em países fortemente marcados pelo patriarcado, donde o machismo é presença cotidiana na vida das mulheres, das suas formas mais sutis (assédio na rua) às mais graves (feminicídio¹). Isso sem contar a grande quantidade de homens que abandonam suas companheiras grávidas para não assumirem seus filhos, ou os que não pagam a pensão. Inclusive, é dentro dos próprios lares onde as mulheres sofrem as maiores violências, muitas vezes escondida pelo medo e pela dependência econômica frente aos seus companheiros. Dessa maneira, também não há dúvidas de que há um forte determinante de classe que estrutura essa realidade, tendo em vista que é dentre os mais pauperizados onde as informações chegam de forma enviesada ou não chegam, e as possibilidades de conhecimento dos direitos das mulheres são reduzidos, além da questão econômica ser presente, pela falta de condições concretas de reproduzir suas vidas sem a presença do homem12.

Para ilustrar nossa afirmação, de acordo com o Mapa da Violência 2015, entre 1980 e 2013, 106.093 brasileiras foram assassinadas, sendo que de 2003 para 2013 houve um crescimento de 21% (de 3.937 para 4.762) na década. Estimativas de pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) em 2014 apontam que no período de 2001 a 2011 ocorreram mais de 50 mil mortes de mulheres por feminicídio, “acredita-se que grande parte destes óbitos foram decorrentes de violência doméstica e familiar contra a mulher, uma vez que aproximadamente um terço deles tiveram o domicílio como local de ocorrência” (IPEA, 2014, p. 01). Além disso, foi constatado que a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) não representou melhoria nos índices de feminicídio ao longo dos anos, havendo somente um leve decréscimo no ano seguinte à vigência da lei, mas logo retomando aos patamares anteriores registrados.

O que podemos incorporar ao debate é que além do mais, e como já foi mencionado durante o trabalho, há um enorme peso sobre essas mulheres da classe trabalhadora no que diz respeito à criação do filho, recebendo o estigma de “mãe cuidadora”, naturalizada como reprodutora da espécie e cuidadora da prole; cabendo ao homem o título de “pai-provedor”, afastado dos filhos para dedicar-se às questões econômicas. Este fator social é deveras significativo para nosso tema, na medida em que, o que de fato temos é a cristalização dessa realidade nas famílias atendidas pelo programa, donde o pai – por se dedicar ao trabalho – se ausenta do acompanhamento da gestação junto à sua companheira e, nesta lógica, progressivamente, da criação do seu filho.

Aqui queremos dizer que, considerando todos os elementos já elencados quanto à determinação do patriarcado e suas expressões no cotidiano das famílias, entendemos que há uma questão central que explica realmente essa realidade de “abandono” ou “negligência” e que se torna inalterável na sua raiz se não for resolvida. Ou seja, o principal motivo para não estarem presentes no período da gestação de seu filho – inclusive de

12Caracteriza-se pela generalização do desemprego. Ocorre pelas mudanças na

esfera econômica e pelo avanço de tecnologia, onde há um desencontro entre a oferta e procura de competências de trabalho. A força de trabalho representava uma utilidade dentro do mercado, e posteriormente, com o desenvolvimento tecnológico onde possa substituir a mão de obra do trabalhador. Esta é uma tendência geral da sociedade capitalista.

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pais separados que lidavam bem com este tipo de situação e os homens que ainda reproduzem uma forte relação opressora – se relaciona a questões trabalhistas (aqui queremos aludir que as leis e regulamentações legais se configuram como concessões que a classe trabalhadora conquistou diante de lutas e organizações, mas que não alteram a lógica e estrutura que o capital carece para se reproduzir), tanto para os que trabalham formalmente, quanto para os que muitas vezes procuram no trabalho informal e nos bicos os meios de garantir sua reprodução social.

O que cabe aqui acrescentar, é que diante de toda dificuldade do cenário já mencionado, os pais que de acordo com sua realidade conseguiram acompanhar de alguma forma grande parte do período gestacional ou somente o parto e participaram das atividades e atendimentos posteriores ao nascimento eram estimulados a se expressar, e diante de seus relatos o que pudemos extrair foram alguns discursos que se repetiam, e, portanto, se apresentam como uma realidade comum diante da experiência citada, como:

Os pais que possuíam outros filhos expressavam a diferença positiva de acompanhar a gestação e/ou o parto, e que de outros filhos não tiveram esta oportunidade. Citam desde a criação de maiores vínculos, com seu filho e mulher, e a valorização e importância desses momentos com sua família.

A possibilidade de aumentar e estreitar os laços com sua companheira, visto que compreendem suas necessidades, já que participando ativamente deste momento é possível criar uma maior empatia com as gestantes. A partir daí, traduzem tal empatia e vivencia no afazer de suas relações e atividades cotidianas.

Os benefícios que perceberam em seu cotidiano, pois após acompanhar este período de gestação de seus filhos, se percebem mais felizes, ao passo que, sentiam-se menos angustiantes com as noticiais e suas inquietações, já que muitas delas eram esclarecidas pela equipe de saúde.

Relatam a importância deste momento e das atividades realizadas pela instituição, para refletir sobre sua vida e de sua mulher, já que inclusive podem ser pais de meninas. Os relatos expressam as opiniões das relações cotidianas, opressoras, machistas. Possibilitando os mesmos a refletir sobre questões de gênero e suas atitudes.

Querem participar mais da criação dos seus filhos, e os que já possuem filhos, expressam tristeza em não ter participado de outros momentos, e hoje alguns com vínculos rompidos ou fragilizados, lamentam não terem participado deste momento e, posteriormente sua criação.

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Esses relatos caminham de encontro às conclusões do relatório produzido pela ONG Pro Mundo e seus parceiros, “A situação da Paternidade no Mundo: Resumo e Recomendações (2015) ”, que visa trazer uma visão global sobre os cuidados do homem e da paternidade. E depois de anos de pesquisa e atuação, apontaram algumas conclusões semelhantes aos relatos cotidianos da experiência já citada que nos dão embasamento para fortalecer e estimular a presença paterna, como:

O envolvimento na paternidade torna os homens mais felizes e

saudáveis.

“O relato dos pais que mergulham neste processo, demonstra que os mesmos que está relação se torna a principal fonte de bem-estar e felicidade na sua vida. Além disso, alguns estudos apontam para a relação de pais que tem vínculos próximos e não violentos com seus filhos com a qualidade e longevidade, tendo menos problemas mentais ou físicos, além de serem mais produtivos no trabalho. ” (p.04)

Pais querem passar mais tempo com seus filhos e filhas.

“Muitos pais de todo o mundo dizem que querem se envolver mais na vida de seus filhos. Os dados da pesquisa internacional Homens e Igualdade de Gênero (IMAGES) mostram que a maioria dos pais (variando de 61% na Croácia a 77% no Chile) relata que trabalharia menos se pudesse passar mais tempo com seus filhos e filhas. Uma pesquisa realizada nos Estados Unidos constatou que 46% dos pais disseram que não estavam passando tempo suficiente com seus filhos e filhas, em comparação com 23% das mães”. (p.05)

A participação e o apoio dos homens são extremamente

necessários para garantir que todas as crianças sejam crianças

desejadas.

“Mais de 220 milhões de mulheres não têm acesso ou não usam métodos de contracepção seguros e eficazes. Isso faz com que elas se tornem incapazes de evitar uma gravidez ou de prolongar o período entre gravidezes, aumentando o risco de morte materna e neonatal.Em 2012, cerca de 85 milhões de gravidezes em todo o mundo não foram planejadas, o que representa 40% de todas as gestações. O uso de contraceptivos pelas mulheres representa aproximadamente três quartos do uso de anticoncepcionais total mundial, proporção que mudou pouco ao longo dos últimos 20 anos.Mais precisa ser feito para envolver os homens no uso de contraceptivos e na tomada de decisão de forma a apoiar as escolhas reprodutivas das mulheres e garantir que todas as gestações sejam desejadas. Além de ser uma questão de

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igualdade de gênero, estudos em todo o mundo comprovam que os pais tendem a se envolver mais na vida dos filhos que foram desejados, trazendo benefícios duradouros para as crianças”. (p. 05)

A promoção do envolvimento dos pais deve incluir esforços

para interromper o ciclo de violência.“Cerca de uma em cada três mulheres sofre violência nas mãos de um parceiro masculino durante sua vida. Três quartos das crianças entre 2 e 14 anos de idade em países de baixa e média renda sofre com algum tipo de disciplina violenta em sua casa. Essas formas de violência muitas vezes ocorrem concomitantemente. Estudos realizados em países de alta renda sugerem que 45 a 70% das crianças cujas mães sofrem violência também sofrem abuso físico. Pesquisas confirmam que algumas formas de violência – em particular a violência dos homens contra as mulheres – são frequentemente transmitidas de uma geração para a outra. Dados de oito países indicam que homens que testemunharam suas mães serem espancadas por um parceiro do sexo masculino quando eram crianças, são aproximadamente duas a duas vezes e meia mais propensos a usarem violência contra a parceira, quando adultos.Ao mesmo tempo, uma divisão mais equitativa da prestação de cuidados contribui para diminuir os índices de violência contra as crianças: um estudo nacional representativo na Noruega descobriu que os índices de violência contra as crianças – por mães e pais – foram menores em domicílios nos quais a prestação de cuidados era mais bem dividida entre homens e mulheres”. (p.07)

O envolvimento do homem no exercício da paternidade e do

cuidado ajuda as crianças a desenvolverem-se.

“Estudo realizado em diversos países tem apontado que a interação com os pais estimula melhor desempenho nas habilidades sociais de seus filhos”. (p.04)

Desse modo, fica claro para nós que a participação paterna alinhada a uma série de atividades durante o período da gestação é excelente ferramenta para estimular cuidados e responsabilidades paternas, visando o bem-estar desta criança que está por vir e, além de suscitar a discussão de gênero, machismo e patriarcado. E Para além do que já foi mencionado, torna-se uma importante ferramenta para informar a importância do envolvimento de homens, sejam eles adolescentes, jovens, adultos ou idosos, nas ações voltadas ao planejamento reprodutivo e a ampliação e melhoria do acesso e acolhimento desta população, aos serviços de saúde, com foco na atenção básica.

Após todo o desenvolvimento exposto ao longo do trabalho, que se enfocou na relação paterna durante a gestação e seus benefícios neste processo, compete mencionar outras conclusões que baseadas em experiências em longo prazo, assinalam resultados futuros que confirmam a importância de uma gestação com a presença paterna, como no ciclo que

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vem sendo estudado. A ONG Pro Mundo, que atua em diversos países, no seu relatório de 2015, já citado neste trabalho, apresenta outras conclusões:

O envolvimento de homens na paternidade permite que mulheres e meninas atinjam seu potencial máximo — agora e nas futuras gerações.

“Mulheres ao redor do mundo ganham cerca 24% a menos do que os homens. A presença dos homens no cuidado permite uma maior participação das mulheres no mercado de trabalho e de forma geral, na busca pela igualde de gênero.Esta participação possibilita transmitir esses valores através de gerações: e contribui para que meninos aceitem a equidade de gênero e como consequência o empoderamento das meninas e em incentivando sua autonomia. Prova disso, estudo comprovam que vários países, filhas de pais que dividem tarefas domesticas, são mais propensas a buscar trabalhos menos tradicionais e com salários mais elevados”. (p.04)

Crianças, mulheres e homens se beneficiam quando pais usufruíram da licença paternidade.

“Apenas 92 países oferecem direito a licença paternidade e, em metade desses países a licença é menor do que três semanas. A garantia de direito a licença paternidade combinadas com políticas para estimulo da mesma, creche gratuita ou a preços mais acessíveis, possuem maior potencial para alterar o fardo historicamente direcionado para as mulheres e assegurar a licença para o pai é uma estratégia vital para o reconhecimento da importância da divisão dos cuidados das crianças, e como consequência, um importante meio de promoção de bem-estar e igualdade de gênero no lar, no trabalho e na sociedade em geral.No Reino Unido, os pais que tiraram licença após o parto de seus filhos ou filhas eram 19% mais propensos a participarem na alimentação e a se acordarem a noite para cuidar dos bebês 8 a 12 meses depois, em comparação com pais que não tiraram a licença. Além disso, a licença para os pais também proporciona a melhoria da saúde materna, incluindo a saúde mental, e reduz o estresse parental”. (p.07)

3.2 Reflexões sobre limites e possibilidades das políticas sociais a partir da experiência no Projeto Cegonha Carioca

Portanto, como já viemos apontando nos capítulos anteriores, a realidade da classe trabalhadora é uma realidade de exploração e pauperização constante, pelo mesmo processo em que produz toda a riqueza existente, desde que surge o capitalismo. O trabalho é a forma primeira de sociabilização e desenvolvimento do ser humano enquanto tal é seu primeiro ato histórico, porém se torna o seu espaço de sofrimento (por estar dentro dele, empregado, ou por estar fora dele, desempregado), na medida em que no capitalismo a forma assalariada de trabalho é aquela que determina as relações sociais. Nesse sentido (e trazendo para a contemporaneidade), a classe trabalhadora vive uma realidade de incertezas e desgastes quanto à

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sua reprodução como ser social, para quem trabalha (no sentido de labor, ter um emprego) e para quem não trabalha (desempregado).

Conforme desenvolvemos nos capítulos anteriores, o capitalismo altera bastante sua maneira de organizar a sociedade – sempre baseada no pilar da extração de mais valia – tanto na produção quanto na reprodução social. Neste movimento, importa ressaltar o papel que passa a cumprir o Estado a partir da passagem da concorrência para os monopólios, se tornando um “Estado integral” para assegurar os interesses da classe dominante frente a nova correlação de forças com a classe trabalhadora (mais numerosa e organizada).

O Estado então passa a incidir sobre as expressões da “questão social” de forma sistemática, racionalizada e organizada, com programas, políticas, serviços e benefícios sociais. Até os anos 1970, nos principais países capitalistas centrais prevalece o chamado Estado de Bem-Estar Social, com uma política de pleno emprego e políticas sociais universais e integradas para atender às demandas da classe trabalhadora num contexto de crescimento da produção baseada no fordismo-taylorismo. Porém, além de ser uma realidade específica de poucos países (e sustentada sobre a exploração de países da periferia do capitalismo), se esgota com a crise do capital de 1973, momento a partir do qual se desenvolve a política de “Estado mínimo”, com cortes em políticas sociais (na mesma medida em que se focaliza e desestrutura), ataques a direitos trabalhistas para intensificação da exploração. A lógica, portanto, passa a ser a da retirada de direitos com progressiva satanização do Estado (acusado de ser burocrático e muito custoso para os contribuintes) e implementação de formas distintas de precarização do trabalho (via terceirização, quarteirização, etc.). Temos, portanto, essa realidade na qual a classe trabalhadora vive em condições cada vez mais precárias, de vida e de trabalho.

Não distinto dessa lógica, “a Rede Cegonha, lançada em 2011, pelo Ministério da Saúde, consiste numa rede de cuidados que visa assegurar à mulher o direito ao planejamento reprodutivo e à atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério, bem como o direito ao nascimento seguro e ao crescimento e desenvolvimento saudáveis das crianças” (Ministério da Saúde, 2016), apresentou relativo avanço na situação do Rio de Janeiro, visto que o Programa Cegonha Carioca, projeto em que consistiu a participação e experiências citadas neste trabalho, assinala como seus principais objetivos: “humanizar e garantir o melhor cuidado para mãe e para o bebê – desde o pré-natal até o parto, para reduzir a mortalidade materno-infantil e incentivar a realização de exames pré-natal” (Prefeitura do Rio de Janeiro, 2011).

De fato, o que se verificou foi a redução da mortalidade materno infantil, ao passo que as gestantes recebem o Cartão da Gestante com o Passaporte Cegonha, que registra a maternidade de referência e, por meio do programa, todas as gestantes que fazem o pré-natal em uma unidade pública de saúde no município do Rio de Janeiro ficam sabendo, antes do parto, em qual maternidade terão seus bebês e têm a oportunidade de visitar o local. Mas apesar destes avanços, sua natureza como uma política social não permite atender todas as esferas necessárias para que uma gestação e parto de qualidade sejam realizados para esta família13, seja pela qualidade

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dos hospitais sucateados, ou seja no que tange a presença paterna, dentre outros.

Historicamente, os programas e estratégias no Brasil voltados para o pré-natal e gestação, parto e puerpério foram direcionados a atenção da saúde das mulheres gestantes, focalizando sua atuação e concepção no binômio mãe-criança. Apesar disso, um movimento crescente no mundo, que começa a refletir no Brasil, defende que os homens podem e devem ser incluídos em todo o processo que envolve a tomada de decisão reprodutiva, e assim, por conseguinte, no processo posterior ao nascimento, ou seja, desde a decisão de ser pai, participação ativa na gestação e parto até o cuidado nas tarefas e educação das crianças.

Portanto, algumas estratégias como a Rede Cegonha, o Guia para o Pré-Natal do Parceiro para profissionais de Saúde e PNAISH (Política Nacional de Atenção Integral a Saúde do homem), que apontam a importância da presença paterna e orientam estratégias para o atrair o pai, apresentaram relativos avanços. Mas ainda assim, não foram capazes de alterar a realidade concreta que se apresenta na pratica aos profissionais de saúde, visto que como mencionado neste trabalho, não altera de forma significativa a estrutura da sociedade em que vivemos que, e apesar de todos os esforços das equipes de saúde que começam a introduzir em suas práticas, com as devidas resistências, o estimulo a presença paterna, não é possível de garantir de forma real a presença paterna no período da gestação.

Neste sentido, como mencionamos, apesar dessas estratégias na esfera da saúde pública apontarem e orientarem a necessidade da presença do pai, as instituições de saúde ainda encontram resistências internas, como qualquer processo de mudança. Na maternidade escola o tema ainda é questão de debate entre as equipes, e é possível encontrar obstáculos e resistências, principalmente após a garantia do exercício da lei do acompanhante em tempo integral, que apesar de ser lei desde 2005 (Lei nº 11.108/05), só conseguiu ser uma realidade, na prática, em 2015. Uma parte da equipe, em sua maioria os médicos, entendem a presença do pai ou de outro acompanhante como um problema para sua atuação, com o discurso de que tal presença (do acompanhante) significa mais alguém para atrapalhá-los.

Contudo, a experiência cotidiana e o contato com os acompanhantes em geral, e neste trabalho específico com os pais, apresentam uma realidade sempre positiva, tanto para os pais, que apesar não possuírem as mínimas condições humanas para permanência com a gestante ou puérpera, (visto que a leia do acompanhante garante acompanhamento integral, durante todo período na instituição e o espaço destinados para os mesmos permanecerem

13 Do ponto de vista econômico, as políticas sociais permitem a preservação e controle dos trabalhadores, o que ainda auxilia na socialização dos custos da reprodução da força de trabalho. Por outro lado, ao atender, ainda que de forma parcial, as demandas da classe trabalhadora, as políticas sociais auxiliam na legitimação da ordem, porque política social é uma conquista da ordem capitalista, e produção de consenso. É importante ressaltar que as políticas sociais são contraditórias, ou seja, trata se de “um processo conflitivo atravessado pelas lutas de classes, onde os diferentes grupos nele inseridos tem ganhos e perdas, ao mesmo tempo que lutam e pressionam, ‘conquistam’ e ‘concedem’ alguma coisa aos demais envolvidos. ” (PASTORINI, 1997, p. 97).

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na Maternidade Escola, se resume a uma cadeira de plástico), o que dificulta sua permanência e necessita de uma organização familiar para trocar de quem irá acompanhar. Obstante a isto, tanto o acompanhante quanto a gestante/puérpera expressam os demasiados sentimentos e relatos positivos já mencionados neste trabalho, como o conforto e atenção de um familiar ou uma pessoa próxima, pode gerar um momento de mais prazer para esta mulher.

Nessa ótica, cabe ressaltar aqui o protagonismo da equipe de Serviço Social na maternidade escola e a importância de um profissional comprometido com valores éticos e com a construção de uma sociedade mais justa, como o compromisso dos serviços prestados a população, como preveem os princípios do Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais em vigência (CFESS, 1993), que em seus princípios fundamentais orientam para: “Defesa intransigente dos direitos humanos, recusa do arbítrio e autoritarismo; (...) Compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população (...)” que em seu espaço cotidiano de atuação, nas reuniões de equipe, nos grupos de atendimento, atua na linha tênue desta relação que encontra resistência ainda de alguns setores mais conservadores, e assim trava lutas diárias, nas trincheiras do cotidiano, para fortalecer institucionalmente o que já é de direito dos usuários e no processo de conscientização e formação dos mesmos, e que assim reforça a importância da presença do pai em todo esse período, desde os primeiros contatos com a gestante, como na busca de estratégias mais criativas para poder garantir a presença do pai neste processo.

Considerações Finais

A presença paterna no período que compreende a gestação não se dá

somente nos atos em que se tem presente a intencionalidade, uma vez que

se apresentam distintas manifestações, mas que se relacionam, onde uma

contribui para a exacerbação da outra.

Portanto, apontamos que para além dos fatores culturais, contextuais,

e interpessoais, que se apresentam como especificidades nas formas de

apresentação e de reprodução desse fenômeno e que serão permanentes na

vida cotidiana. Destacamos que este modelo de sociedade, o capitalismo,

influencia diretamente como um determinante crucial que impede os pais de

estarem presentes neste período tão importante, como em outras

manifestações da questão social.

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Sendo assim, situar este tema como uma das expressões da “questão

social” é tão complexo quanto o próprio conceito acerca da “questão social”,

tendo em vista o fato que essa é o conjunto das expressões das

desigualdades sociais da sociedade capitalista contemporânea. Assim como

conceituar a importância da presença paterna de maneira singular, já que ela

é viabilizada sob determinadas condições sócio históricas, que revela

dimensões desconhecidas da vida social, influenciada por impactos

econômicos, políticos e sócios culturais, não devendo ser assentada somente

no âmbito individual.

É importante ressaltar também que este problema assume patamares

diferenciados diante de diferentes realidades sócias econômicas

manifestadas e materializadas em diferentes espaços. Como no caso deste

estudo, referindo-se às classes mais subalternizadas da sociedade.

Vale também ressaltar que nas relações sociais cotidianas, o

patriarcado, bem como o machismo são formas de dominação masculina,

que acentuam diretamente este processo, além de serem expressões de

violência. Essa dominação representa uma das violências que se legitima

dentre outros fatores devido à cultura dominante, e que muitas vezes é

tratada de maneira “natural”, por conseguinte, inevitável. Essa violência pode

ser exercida por diferentes instituições da sociedade, sendo a família a

instituição que, historicamente, ‘naturalizou’ essa dominação masculina. E

assim, acentuam e se exponenciam as condições objetivas que não

permitem o pai estar presente neste momento, na medida em que colocam o

homem numa relação de dominação, onde as mulheres se apresentam como

as responsáveis de cuidar dos filhos e da casa, cabendo a elas a culpa por

todos os futuros problemas.

Além da instituição família, outra instituição que possui total relação

com a violência sofrida pelas mulheres, é a instituição Saúde que com a

elaboração da CF88, confiava-se que a Constituição Cidadã não se

aglutinasse a outras legislações. No entanto, o que se viu foi à criação

distintas políticas afirmativas fragmentadas, mas que sem dúvida pode se

inferir a sua importância devido às especificidades de cada qual.

Porém, a dominação masculina ainda que muito presente em nossa

sociedade, atualmente passa por um intenso questionamento, se assim

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podemos dizer. Dentre alguns fatores que contribuíram para essa tensão,

tivemos o movimento feminista; e a inserção da mulher ao mercado de

trabalho, fazendo com que ela também se tornasse um dos mantenedores da

sobrevivência familiar, e em muitas famílias se tornasse a provedora.

Com isso, queremos dizer que as políticas sociais de proteção a outros

segmentos da sociedade brasileira, os documentos acerca da Política

Nacional à Saúde, o Projeto Cegonha Carioca e outras tentativas

fragmentadas, não incidem de forma incisiva sobre o problema da presença

paterna no período gestacional, menos ainda, garantem um

acompanhamento de forma integral ao pai, e, diga-se de passagem, não

garantem a própria presença integral materna ao pré-natal. Pois há um

problema estrutural neste modelo hegemônico atual em que os homens

produzem e se reproduzem, que de maneira geral, e desumana coloca os

interesses da classe trabalhadora subjugados aos interesses do capital.

Logo, o que essa segmentação pode propiciar é uma fragmentação

teórica e prática, eliminando uma em detrimento da outra, colocando-a como

de maior interesse á política pública, e consequentemente criando

especialista (teóricos ou práticos) que irão atuar nas expressões da questão

social de maneira singular, como se diante das relações sociais fosse

possível desconsiderar a categoria totalidade.

Desta forma, o Serviço Social como profissão e os assistentes sociais

como profissionais que exercem determinado tipo de trabalho, podem

reforçar com maior ou menor intensidade sua participação frente a estes

processos. Os assistentes sociais possuem uma inserção profissional

significativa no campo da vida cotidiana, pois sua atuação se dá nas ações

cotidianas da vida social, nas mazelas da classe trabalhadora. Trata-se de

um profissional privilegiado porque pode ocupar determinados nichos

singulares da sociedade em consequência de sua atuação, especialmente no

campo das políticas sociais, assim como no aumento da produção acadêmica

e de conhecimentos referentes a diversos temas que afligem a vida da classe

trabalhadora, como este em questão.

As refrações da questão social, como o que tange a garantia do pai de

estar presente neste processo, não são demandas que devem ser tratadas

apenas de maneira técnica. Mais ainda, elas estão inseridas no exercício

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profissional do assistente social nos exigindo um conhecimento teórico,

posicionamento político e realização prática com fundamentação interventiva.

De modo que faz do assistente social um personagem imprescindível para

atuar diante dessas demandas.

Portanto, em se tratando desta relação, existem outras manifestações

de tão importância quanto, que ampliam os embates das relações sociais.

Que atingem de maneira incisiva a vida das mulheres e que apesar de não

ser foco deste trabalho foram trazidas e mencionadas com sua devida

importância, e que alteram e acentuam os problemas para que o pai esteja

presente neste processo, como machismo e patriarcado. E que sendo assim

os assistentes sociais devem estar preparados e capazes de intervir de

maneira ética e compromissada com o fim da violência de gênero, no

horizonte de uma sociedade mais justa.

Imerso neste processo e na realidade cotidiana, como já foi

mencionado significativas mudanças nos locais de trabalho e domicílio vem

estimulando a participação dos homens no cuidado. Contudo, apesar disso,

estratégias para envolver os homens no cuidado não tem sido objetivo

decisivo nas políticas públicas, seja pela carência ou esforços no

levantamento de pesquisas e proposição das ações, ou pela ausência de

esforços para promoção da autonomia, conscientização e empoderamento

das mulheres.

Diante disso, acreditamos que os movimentos que questionam a

reprodução deste “problema” são de fundamental importância para a

elaboração de políticas públicas voltadas para a inserção do pai neste

processo, e creio que na existência de respaldo entre os profissionais da

área.

Em vista disso, é imprescindível que os debates acerca da presença

paterna e da emancipação das mulheres sejam ampliados e posteriormente

tornem efetivas políticas de proteção que resguardem a sua vida e garantam

a sua dignidade. Temos ciência que o processo de tornar as reflexões desses

debates em constituição de políticas protetivas passa pela publicização

dessas demandas, assim como construí-las de forma que a sua aceitação

frente à sociedade possa transmitir a realidade que estão inseridos, mas que

não se desvinculam por determinados fatores, sendo um deles e talvez o

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principal que é o fato de que a sociedade que vivenciamos é determinada por

uma estrutura social e de reprodução, que acentuam e incentivam as

opressões de gênero, mas fundamentalmente, coloca as necessidades da

classe trabalhadora, subjugadas as obrigações que o capital necessita para

se reproduzir.

Perante a isso, o movimento em direção ao maior envolvimento do homem na paternidade carece de ser apoiado como parte de uma agenda mais ampla que provoque as estruturas e ideologias que limitam o nosso desenvolvimento como seres humanos em uma sociedade mais justa e igualitária. Onde a emancipação humana de fato seja uma realidade e não mais um sonho.

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