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  • 7/26/2019 Flvia Varella

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    Histria Unisinos

    18(3):589-600, Setembro/Dezembro 2014 2014 by Unisinos doi: 10.4013/htu.2014.183.08

    Resumo: Este artigo tem por objetivo principal enquadrar Robert Southey emum novo contexto discursivo, diverso do habitual contexto romntico, visando melhorcompreender a sua posio historiogrfica, principalmente no que diz respeito Historyof Brazil(1810-1819). No cenrio brasileiro, as reflexes de Maria Odila da Silva Dias,principalmente graas ao O fardo do homem branco (1974), tornaram-se preponderantespara o entendimento da History of Brazil. Nesse livro, assim como em sua dissertao,Dias apresenta a History of Brazil como uma obra precursora do Romantismo ingls efundamentalmente preocupada com o reviver histrico. Sustento, ao longo desse artigo,uma hiptese de pesquisa diversa que situa Southey dentro de outra realidade discursiva,

    relacionada com a pesquisa documental e a monumentalizao do passado. Para tanto,em um primeiro momento, realizo um panorama das apreciaes recentes que a categoriaRomantismo vem recebendo dentro da crtica literria, para, logo em seguida, passar auma breve comparao entre as historiografias de Southey e Thomas Babington Macaulay,realizada atravs da anlise dos artigos que ambos produziram, no mesmo perodo, sobrea Constitutional History of Englandde Henry Hallam. De forma irnica, Macaulay parecedefender a historiografia que Dias atribuiu a Southey. Desse modo, objetivo explicitar ototal descompasso que existe entre o que Southey pensava que fazia e as linhas mestrasdo Romantismo. Por fim, realizo uma anlise pontual de algumas partes do trabalho deDias, que serviram para comprovar a sua hiptese de que a preocupao historiogrficacentral de Southey era reviver o passado.

    Palavras-chave:Histria da historiografia, Romantismo, Robert Southey.

    Abstract:The aim of this article is to situate Robert Southey in a new discursive context,different from the usual romantic one, to better understand his historiographical position,especially regarding the History of Brazil(1810-1819). In Brazil, Maria Odila da SilvaDiass statements, especially in O fardo do homem branco(1974), became prominent forthe understanding of the History of Brazil. In this book, as in her masters dissertation,Dias presents the History of Brazilas a precursor of English Romanticism and as beinglargely concerned with reliving the past. I argue, throughout this paper, other researchhypothesis which locates Southey in another discursive context, related to documentaryresearch and the monumentalization of the past. For this, at first, I provide an overviewof recent criticism on Romanticism within literary criticism and then undertake a briefcomparison between Southeys and Thomas Babington Macaulays historiographies,based on the analysis of articles that both wrote, in the same period, on Henry Hallams

    Reviver ou reunir o passado?: Um novo enquadramentoda proposta historiogrfica de Robert Southey1

    Reliving or collecting the past?: A new frame forRobert Southeys historiographical proposal

    1 Este artigo resultado do dou-

    torado que realizo, sob orientao

    do professor Temstocles Cezar, na

    Universidade Federal do Rio Grande

    do Sul (UFRGS), com financiamento

    do Conselho Nacional de Desen-

    volvimento Cientfico e Tecnolgico

    (CNPq) e da Coordenao de Aper-

    feioamento de Pessoal de Nvel Su-

    perior (CAPES).2 Doutoranda no Programa de Ps-

    Graduao em Histria da Universi-

    dade Federal do Rio Grande do Sul.

    Flvia Varella2

    [email protected]

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    Apesar do reconhecimento de Robert Southeycomo um dos principais historiadores que versaram sobrea escrita da histria luso-brasileira, o primeiro e nico tra-balho monogrfico sobre a History of Brazil(1810-1819)foi publicado em 1974 por Maria Odila da Silva Diascom o ttulo O fardo do homem branco: Southey historiadordo Brasil (um estudo dos valores ideolgicos do imprio docomrcio livre). Nesse livro, oriundo de sua tese de douto-rado, Dias apresenta uma leitura dessa monumental obrahistoriogrfica como precursora do Romantismo inglse fundamentalmente preocupada com o reviver histrico(Dias, 1974). Essa mesma hiptese havia sido anterior-mente defendida na dissertao da autora intituladaO Brasil na historiografia romntica inglesa. Um estudode afinidades de viso histrica: Robert Southey e WalterScott (Curly, 1967). Nesses dois estudos, Dias buscaentender a History of Brazilpelo prisma da historiografiaromntica e concluique Southey teria uma concepoessencialmente intuitiva e sensvel da histria, o que lhe

    permitiria, alis, desenvolver um mtodo todo imaginativode revivncia emptica do passado (Dias, 1974, p. 60).O objetivo central deste artigo apresentar outra

    hiptese interpretativa da historiografia produzida porSouthey, assim como realizar uma abordagem crtica departe do trabalho de Dias. Southey nasceu na cidade deBristol, Inglaterra, no ano de 1774 e veio a falecer em1843, em Keswick, acometido por uma doena mentaldegenerativa. Ao longo da vida, Southey teve os mais vas-tos interesses literrios, escreveu diversas obras poticas eduas histrias ademais a incompleta History of Portugalalm de numerosos ensaios e obras de outros gneros.

    Comeou na vida literria como poeta, mas no decorrerdas dcadas de 1800 e 1810 sentia-se menos engajado coma poesia, encarando-a mais como passatempo pessoal doque vocao pblica. De fato, depois de muitas investidasna esfera potica, Southey acabou por abandonar essegnero quase que por completo em prol do histrico e daprosa. Apesar da perda de centralidade em seus projetoseditoriais, nunca deixou de escrever poesia, tambm porcausa de sua nomeao como Poeta Laureado, em 1813,que lhe trazia o encargo de escrever poemas em ocasiesespeciais (Speck, 2006; Storey, 2006).

    O apagamento da importncia de Robert Southeyno cenrio poltico-intelectual britnico ocorreu princi-palmente aps os vitorianos comearem a considerar oRomantismo como uma influncia dominante no inciodo sculo XIX (Speck, 2006, p. XVI). Os aspectos de in-terveno social de suas obras e dos escritores ditos romn-ticos foram totalmente ignorados pela crtica do sculoXX e somente h poucas dcadas vm sendo recolocadoscomo centrais na vida cultural de finais do sculo XVIII eincio do XIX. Southey estava envolvido em diversas que-relas e assuntos pblicos, no sendo possvel enquadr-lodentro da definio clssica do letrado romntico comoum homem voltado para o espao privado e introspectivo.Os interesses principais de Southey estavam nos debatespblicos vigorosos e nas controvrsias polticas e literriase no em uma vida privada contemplativa (Pratt, 2004),pois considerava que seu principal papel como escritorera mostrar os princpios morais corretos aos seus leitores(Bolton, 2007, p. 8). Existia, do mesmo modo, na poca

    vitoriana, um pressuposto de que, de um lado, estariamos romnticos, conservadores, idealistas e cultos, e, dooutro, os utilitaristas, progressistas, materialistas e filisteus.A sntese da vida intelectual oitocentista entre esses doisgrandes blocos dificultou a valorizao do aspecto deinterveno social como componente daquela sociedade.O Romantismo tambm foi uma categoria, por muitosanos, ligada apenas poesia e, assim, os escritos em prosados romnticos foram descartados como objeto de anlisejunto com a tradio de crtica social que continham. Ape-nas a partir da dcada de 1930 as atenes foram voltadaspara o discurso em prosa (Connell, 2005, p. 276-277).

    Embora o enfoque da categoria Romantismotenha sido extremamente influente na anlise da produoliterria da primeira metade do sculo XIX britnico, esseenfoque pode ser, na mesma medida, considerado proble-mtico. A proposio de um pensamento romntico mos-tra-se enganosa principalmente porque cria a impressode que havia um Iluminismo relativamente unificado, quefoi suprimido por um Romantismo igualmente unificado(Craig, 2007, p. 4-6). A categoria Romantismo, de fato,nos ajuda a entender a histria da literatura, em um sen-tido bastante amplo, mas no efetiva como ferramenta

    Constitutional History of England. Ironically, Macaulay seems to argue in favor of thehistoriographical approach that Dias attributed to Southey. Thus, I aim to show thecomplete mismatch that exists between what Southey thought he was doing and themain characteristics of Romanticism. Finally, I provide a specific analysis of some parts ofDiass work, which served to prove her hypothesis that Southeys main historiographicalconcern was reliving the past.

    Keywords:History of historiography, Romanticism, Robert Southey.

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    analtica das obras escritas no incio do sculo XIX. Emoutras palavras, no existe um objeto histrico de anlisechamado Romantismo, mas a partir dele possvel en-tender a histria da recepo literria (Perry, 2001, p. 9).

    No obstante o intrincado debate em relao aoRomantismo, a transposio dessa categoria como de

    relevncia analtica para os estudos historiogrficos geroumuitos erros interpretativos no que toca History of Brazilde Robert Southey. Nessa histria, Southey construiu umanarrativa linear, que pretendia ser um verdadeiro registrodo passado, evitando digresses autorais e muitas vezesanalticas no texto. Southey no era um entusiasta doque chamou de histria filosfica, pois julgava que as his-trias produzidas por alguns historiadores segundo essasdiretrizes tinham tendncia determinista e acreditava queas generalizaes feitas excluam a complexidade fatuala fim de disfarar possveis inclinaes polticas (Craig,

    2007, p. 136-137). Esses historiadores, em sua opinio,acabavam por levar ao extremo a influncia das causasgerais, considerando os homens como plenas criaturasdas circunstncias em que eles so colocados, e tendo-osmuito mais como marionetes de uma necessidade fatal doque como seres responsveis, livres para escolherem entreo bem e o mal (Southey, 1828b, p. 196).3

    Se buscssemos definir um alinhamento historio-grfico em que Southey estaria inserido, este certamenteno estaria em sintonia com o cnone historiogrficobritnico, j que os grandes escritores setecentistas comoDavid Hume e William Robertson favoreceram em

    suas narrativas o universal em vez do peculiar (Phillips,1989, p. 119). Southey igualmente no poderia ser en-quadrado caso esse fosse o objetivo dentro de umanova historiografia que tinha na evocao do passado opropsito central da histria. No decorrer da anlise deduas resenhas-ensaios que o Poeta Laureado e o jovemThomas Babington Macaulay publicaram, respectivamen-te, no Quarterly Reviewe noEdinburgh Review os doisprincipais peridicos britnicos da poca na dcada de1820, espera-se, em um primeiro momento, pr mostrauma parte do universo discursivo mobilizado por ambosos escritores no intuito de salientar a diferena de seus

    projetos historiogrficos e, a partir dessas constataes,pr em evidncia a dificuldade de enquadrar a histo-riografia de Southey como romntica. Em um segundo

    momento, o debate torna-se um pouco mais especficosobre a concepo de histria southeyana, tida pela crticahistoriogrfica como emptica e preocupada com o reviverhistrico, mas que, argumento, deve ser pensada dentrode outra realidade discursiva, relacionada com a pesquisadocumental e a monumentalizao do passado.

    A divergncia terico-historiogrfica entre Sou-they e Macaulay bastante visvel na anlise das resenhasque produziram do livro The Constitutional History ofEngland from the Accession of Henry VII to the Death ofGeorge II, escrito por Henry Hallam. As recenses crti-cas de obras publicadas em peridicos como o Quarterlye o Edinburgh, de forma geral, eram muito mais do quejuzos das obras recentemente lanadas, eram verdadeirosensaios abrangentes sobre temas explorados no livro emquesto (Hayden, 1969; Cutmore, 2008; Butler, 2010).A resenha de Southey foi publicada no Quarterly Review

    de janeiro-maro de 1828 e contava com assustadoras 66pginas. Poucos meses depois, Macaulay estampou a suadefesa de Hallam e seu ataque a Southey em 73 pgi-nas da edio de setembro do Edinburgh Review. HenryHallam, assim como Macaulay, contribua regularmentepara oEdinburgh com resenhas e fazia parte da ala Whig.Dentre suas obras, a Constitutional Historyfoi a que tevemaior destaque entre seus contemporneos.

    A avaliao negativa escrita por Southey da Con-stitutional Historyno foi bem recebida por Macaulay, queacreditava que Hallam resume com uma imparcialidadecalma, firme, no virando nem para direita nem para a

    esquerda, no evitando falar sobre nada, no exagerandonada (Lord Macaulay, 1848, p. 66).4Essa tendncia imparcialidade de Hallam iria [...] desgostar particu-larmente essas pessoas que, em suas especulaes sobrepoltica, no so pensadores, mas amadores. Esse homemde extremos, em cada partidrio furioso ele v ou o que ele agora ou o que ele foi antigamente, o pensionista que , ou ojacobino que foi (Lord Macaulay, 1848, p. 67, grifos meus).5

    Macaulay nem precisaria nomear Southey como sendo ohomem de extremos a que se referia tendo em vista oselementos introduzidos em seu texto, suficientes para quequalquer contemporneo reconhecesse Southey em sua

    descrio.6A caracterizao do pensamento de Southeycomo extremista, tendo a forte inclinao jacobina juvenilsido suplantada por um conservadorismo na idade adulta,

    3Todas as tradues apresentadas no decorrer deste artigo foram realizadas por mim; em caso contrrio, vir sinalizado o nome do tradutor. No original: carry the influence

    of general causes too far, considering men as entirely the creatures of the circumstances wherein they are placed, and regarding them rather as the puppets of a fatal necessity,

    than as accountable beings, to whom it has been free to choose between good and evil.4No original: He sums up with a calm, steady impartiality, turning neither to the right nor to the left, glossing over nothing, exaggerating nothing [].5No original: [] particularly disgust those people who, in their speculations on politics, are not reasoners but fanciers [] In every furious partisan he sees either his present

    self or his former self, the pensioner that is, or the Jacobin that has been.6 certo que Macaulay conhecia a crtica de Southey a Hallam: He [Southey] has treated Mr. Owen of Lanark, for example, with infinitely more respect than he has shown to Mr.

    Hallam or to Dr. Lingard; and this for no reason that we can discover, except that Mr. Owen is more unreasonably and hopelessly in the wrong than any speculator of our time

    (Lord Macaulay, 1848, p. 123).

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    tpica da poca e muito comum aos leitores dessesperidicos. Southey tambm era, de fato, um pensionistado Estado devido ao seu posto de Poeta Laureado, o ques agregou mais fora s crticas em relao sua supostaapostasia poltica.

    Tendo em vista as diferenas interpretativas sobre

    os rumos da sociedade passada ou presente, no nenhumasurpresa que os ensaios de Southey e Macaulay tenhamavaliaes muito diversas sobre a qualidade da obra deHallam. Contudo, o que interessa em especial a definiofeita por ambos nesses ensaios do ofcio do historiador ede suas prticas.

    Quando os detalhes no tornamo passado presente

    Parte considervel da resenha de Southey continha

    ataques aos julgamentos feitos por Hallam das aes dehomens de destaque na poltica, como Henrique VII,Carlos I, Thomas Cranmer e William Laud. SegundoSouthey, as anlises incorretas de Hallam evidenciamque o livro a produo de um partidrio resoluto;apresentando no a histria em si, mas o que chamadode filosofia da histria, e para ser recebido com a maiorsuspeita,porque diz respeito a dedues e no aos detalhes.7AConstitutional Historyno seria fruto de pesquisa acuradados fatos, mas mera deduo, sem fundamento algum, dahistria. Em sua opinio, Hallam fazia parte do conjuntode escritores que preferiam dividir a histria em partes poltica, militar, religiosa, literria, comercial, etc. e que,com isso, obscureciam sua conexo mtua, sua influnciae dependncia (Southey, 1828a, p. 194-195, grifos meus).8A histria, contudo, seria lida, em sua opinio, com maisprazer e lembrada com mais facilidade se o historiadorseguisse a ordem natural da narrao [...], que procede deacordo com o curso do tempo e eventos, e registra as coisascomo elas so, misturadas nas preocupaes mltiplas dasociedade.9Qualquer obra de histria estaria necessaria-mente subjugada cronologia pelo simples fato de que[...] o labirinto poderoso dos assuntos humanos no existe

    sem um plano e que os caminhos de Deus so justificados

    pelo curso da Providncia (Southey, 1828a, p. 199).10Ao ignorar o plano cronolgico traado pela Providncia,o historiador estaria automaticamente reorganizando emodificando o curso e a interpretao da histria.

    Na avaliao de Southey, Hallam tambm estariaerrado ao ir de acordo com a mxima francesa que precei-

    tuava que para ser um bom historiador, no se deve ter nen-huma religio, nenhum pas, nenhuma profisso, nenhumpartido.11Exceto pela ligao poltica, os demais vnculosenriqueceriam a obra histrica, caso o historiador tivesseuma s conscincia e uma inteno correta. O historiador

    [...] se apresenta para a sua tarefa, no como umadvogado com o objetivo de trazer luz certas partesdo caso, para quem sabe favorecer o lado que o con-tratou, e manter outras na escurido; mas imbudoda certeza de uma responsabilidade mais sria eum dever maior. Ele expor fielmente os fatos quecuidadosamente reuniu, e quando isso realizadocom um julgamento slido, a melhor histria seraquela que contm os mximos detalhes (Southey,1828a, p. 197, grifos meus).12

    Visto que a fundamentao da histria seria dadapor meio dos fatos e no das generalizaes, a principaltarefa do historiador no estaria na seleo de partes dahistria e nem mesmo na interpretao vistas comoindesejadas por Southey mas na reuniodos fatos e nasua exposio detalhada. A obra histrica seria considerada

    imparcial no por causa da anulao do historiador en-quanto ator social, mas pelo seu comprometimento com ahistria e pela sua retido moral. Dessa forma, a convicoreligiosa seria igualmente importante para quem desejasseescrever histria, j que quanto mais religioso um historiador, mais imparciais sero suas afirmaes, mais caridosa a suadisposio, mais abrangente a sua viso, mais esclarecida a suaf ilosofia. O historiador deveria estar atento para o fato deque apenas na religio que a verdadeira filosofia podeser encontrada; a filosofia que contempla o homem emtodas as suas relaes e em toda a sua natureza; que sebaseia no conhecimento da natureza e que derivada dEle

    que o Comeo e o fim (Southey, 1828a, p. 197-198).13

    7No original: The book is the production of a decided partisan; presenting not the history itself, but what is called the philosophy of history, and to be received with the more

    suspicion, because it deals in deductions and not in details.8No original: Their mutual connexion, their influence and dependence.9No original: natural order of narration [] which proceeds according to the course of time and events, and records things as they are intermingled in the multifold concerns

    of society.10No original: [...] the mighty maze of human affairs is not without a plan; and that the ways of God are vindicated by the course of Providence.11No original: Pour tre bon historien, il ne faudroit tre daucune religion, daucun pas, daucune profession, daucun parti.12No original: [] sane conscience and an upright intention [] comes to his task, not like an advocate with the purpose of bringing forward such parts of the case as may

    favour the side on which he is retained, and of keeping others in the shade; but under the sense of a more serious responsibility, and a higher duty. He will faithfully state the

    facts which he has carefully collected, and when this is performed with a sound judgment, the best history will be that which contains the fullest details.13No original: The more religious an historian is, the more impartial will be his statements, the more charitable his disposition, the more comprehensive his view, the more

    enlightened his philosophy.In religion alone i s true philosophy to be found; the philosophy which contemplates man in all his relations, and in his whole nature; which is founded

    upon a knowledge of the nature, and which is derived from Him who is the Beginning and the end.

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    A religio seria uma filosofia muito mais til ao historia-dor ao fornecer princpios morais para o entendimentodo homem e no prend-lo a avaliaes contemporneas.No entendimento de Southey, a Constitutional Historyteria sido uma obra imparcial se Hallam tivesse sido umhistoriador com convices religiosas e tivesse buscado o

    entendimento da histria atravs do percurso traado pelaProvidncia, em vez de dedicar-se a generalizaes queapenas objetivavam disfarar escolhas pessoais.

    A resenha de Macaulay da Constitutional Historydiferencia-se radicalmente da de Southey no apenaspela avaliao positiva j esperada da obra, maspela completa mudana de vocabulrio no que tange aouniverso historiogrfico. Em sua opinio, o historiadorideal seria aquele capaz de combinar imaginao e razono intuito de criar uma histria viva que tornasse opassado presente e trouxesse o distante para perto.14Razo e imaginao seriam faculdades igualmenteimportantes ao historiador, apesar de considerar quea ltima havia sido negligenciada nos ltimos sculos.A parte racional das histrias apresentava aos leitoresverdadeiros mapas em que o historiador aferia compreciso as dimenses, as distncias e os ngulos. Emoutro polo, situavam-se as obras histricas imaginativasnas quais o leitor encontrava a paisagem pintada diantedos seus olhos (Lord Macaulay, 1848, p. 65).15A boahistria, para Macaulay, seria a fuso entre o ensaio e oromance histrico, deveria combinar o olhar de escultorde Walter Scott, que buscava dar uma imagem clara

    e vvida de sua forma externa, e o de anatomista deHallam, que tinha como sua tarefa dissecar o assuntoat seu mais ntimo recndito, e pr a nu diante de nstodas as molas do movimento e todas as causas da de-cadncia (Lord Macaulay, 1848, p. 66).16A histria, aomenos em seu estado de perfeio ideal, uma misturade poesia e filosofia. Ela grava verdades gerais na mentepor meio de uma representao viva de personalidadese incidentes especficos (Lord Macaulay, 1848, p. 65).17Em sua resenha, Macaulay aponta a fuso entre razo eimaginao como o grande desafio narrativo vivido pelohistoriador na dcada de 1820. Em suma, o historiador

    ideal deveria superar o divrcio entre a racionalidade dos

    historiadores analticos e o poder evocativo do romancehistrico (Phillips, 2000, p. 41).

    Algumas partes da teoria sobre a historiografiaimaginativa haviam sido explicadas mais longamentepor Macaulay na edio anterior doEdinburgh Review.18Ao longo do seu manifesto sobre o verdadeiro historiador

    e a correta escrita historiogrfica, Macaulay reivindicavaHerdoto como o mais antigo e o melhor entre os histo-riadores romnticos pela sua animao, sua ternura de umcorao simples, seu maravilhoso talento para a descrioe dilogo, e o puro fluxo agradvel de sua linguagem(Macaulay, 1840, p. 179).19A histria imaginativa deHerdoto havia fabricado um verdadeiro estilo narrativo,que conta tudo dramaticamente, tornando impossvelpara o leitor distinguir onde se encontrava a verdade norelato, pois as fices so to parecidas com os fatos, eos fatos to parecidos com as fices (Macaulay, 1840,p. 181).20Em sua opinio, na poca em que Herdotovivia, a filosofia estava em sua infncia e a prosa era muitopouco difundida, o que contribuiu de forma direta paraque o interesse na narrativa e a beleza do estilo fossemajudados pelo efeito de composio da recitao, peloesplendor do espetculo , pela poderosa influncia dasimpatia (Macaulay, 1840, p. 182).21

    Assim, a rusticidade da sociedade grega e sua ten-dncia imaginativa permitiram ao temperamento poticochegar perfeio (Otten, 1969, p. 36). Contudo, aps aGuerra do Peloponeso, a Grcia passou por grandes mu-danas, onde milhares de intelectos aguados e prontos

    eram constantemente empregados em especular sobreas qualidades das aes e sobre os princpios do governo,[sendo] impossvel que a histria mantivesse seu carterantigo, fazendo com que ela se tornasse menos conversabanal e pitoresca, mas muito mais acurada e um pouco maiscientfica (Macaulay, 1840, p. 186).22Com o desenvolvi-mento da razo e a proeminncia da filosofia, a imaginaoe o estilo foram suplantados como dignidades da histria.

    Mudanas igualmente significativas ocorreramdurante os sculos posteriores, as quais contriburampara o avano da filosofia e da razo e desembocaramno ofuscamento completo da imaginao na escrita da

    histria na poca moderna. Os melhores historiadores

    14No original: living history [] past present [] distant near.15No original: with accuracy the dimensions, the distances, and the angels [] painted landscape.16No original: give an express and lively image of its external form [] dissect the subject to its inmost recesses, and to lay bare before us all the springs of motion and all

    the causes of decay.17No original: History, at least in its state of ideal perfection, is a compound of poetry and philosophy. It impresses general truths on the mind by a vivid representation of

    particular characters and incidents.18O ensaio de Macaulay era para ser uma resenha do livro The Romance of History, England de Henry Neele, mas Macaulay no analisa e nem cita o livro em nenhuma linha.19No original: romantic historians [] animation, his simple-hearted tenderness, his wonderful talent for description and dialogue, and the pure sweet flow of his language.20No original: style of narration [] tell everything dramatically [] the fictions are so much like the facts, and the facts so much like the fictions.21No original: the interest of the narrative, and the beauty of the style, were aided by the imposing effect of recitation, by the splendor of the spectacle, by the powerful

    influence of sympathy.22No original: where thousands of keen and ready intellects were constantly employed in speculating on the qualities of actions, and on the principles of government, it was

    impossible that history should retain its old character [] became less gossiping and less picturesque; but much more accurate, and somewhat more scientific.

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    caram na armadilha da razo, acreditando na arte dededuzir um princpio geral dos fatos e distorcendo fatospara atender princpios gerais (Macaulay, 1840, p. 217).23No entendimento de Macaulay, a boa histria no seriaproduzida nem atravs da deduo baseada em um con-junto limitado de eventos, nem atravs da exausto dos

    detalhes. A manipulao histrica s poderia ser evitadaatravs do efeito do todo propiciado pela vivacidade narra-tiva gerada pela seleo dos aspectos principais da poca.

    Os historiadores no deveriam se preocupar comas artes da controvrsia que levavam apenas a negligen-ciar miseravelmente a arte da narrao, a arte de interessaras afeies e apresentar quadros imaginao. A digni-dade da histria no estava na apresentao de opiniesdiversas sobre um tpico, nem na fabricao de princpiosgerais, mas no impacto de seus cenrios. Enquanto os his-toriadores no entenderem a importncia da imaginao,enquanto pensarem que rebaixa a dignidade dos homensque descrevem as revolues das naes, debruar-se so-bre os detalhes que constituem o encanto da biografia,Macaulay profetizava que suas histrias continuariamno lidas nas prateleiras de bibliotecas ostentatrias(Macaulay, 1840, p. 221).24

    Macaulay via na negligncia da imaginao o grandeproblema dos historiadores contemporneos que, concen-trando-se em fatos e datas, produziam uma histria ridae sem vida. A faculdade da imaginao, apesar de ligadaao ficcional, comportaria uma verdade diferente da razo,uma verdade do corao humano, que fornecia ao historia-dor particulares e vivacidade capazes de contribuir para acriao de um efeito nas emoes de seus leitores (Otten,1969, p. 40-42). A razo obviamente era importante parao trabalho histrico, pois permitia extrair a filosofia dahistria, dirigir nosso julgamento dos eventos e dos homens,traar a conexo de causas e efeitos e extrair dos aconte-cimentos dos tempos passados as lies gerais de moral esabedoria poltica (Lord Macaulay, 1848, p. 65),25mas oshistoriadores deveriam igualmente trazer a imaginao devolta histria, lanarem mo de estratgias retricas edescritivas empregadas no romance histrico para tornaremsuas histrias mais vvidas. O historiador, para Macaulay,

    deveria lembrar que a verdade literria existia apesar de serconstruda de forma diferente, ou seja, atravs de associaesimaginativas presentes na poesia (Otten, 1969, p. 36).

    A evocao do passado seria alcanada com maiorfacilidade com uma criteriosa seleo, rejeio e arranjo,[que] d verdade aqueles encantos que so usurpadospela fico (Lord Macaulay, 1848, p. 187).26Em suma, aimaginao deveria:

    tornar o passado presente, trazer o distante paraperto, nos colocar na sociedadede um grande homemou no cume que contempla o campo de uma grandebatalha, cobrir com a realidade da carne humana edo sangue dos seres que estamos demasiadamenteinclinados a considerar como tendo personificado asqualidades em uma alegoria, chamar nossos ante-passados diante de ns com todas as suas peculiari-dades da linguagem, costumes e roupas, nos mostrarnovamente as suas casas, nos colocar em suas mesas,vasculhar seus roupeiros antiquados, explicar os usosde suas moblias pesadas, essas partes do dever quepropriamente per tencem ao historiador foramapropriadas pelo romancista histrico(Lord Ma-caulay, 1848, p. 65, grifos meus).27

    O historiador teria permitido ao romancista his-trico invadir e dominar seu territrio, usurpando a ima-ginao e transformando-a em componente exclusivo dafico e deixando, assim, a histria incompleta e desnuda.As alegaes de Macaulay sugerem que a fico teria seapropriado dos recursos histricos na forma do romancehistrico e, consequentemente, anulado a evocao dopassado como propsito central da histria (Phillips,1989, p. 119, 128). Muitos dos termos mobilizados porMacaulay pertenciam ao vocabulrio da crtica literria definais do sculo XVIII e no faziam parte das discussessobre histria. O vocabulrio da teoria literria, que co-locava sentimento e imaginao no centro da literatura,foi incorporado conscientemente por Macaulay na suacrtica historiografia contempornea como uma formaliterria que negligenciava a arte da narrao, de interessaras afeies e de apresentar quadros imaginao. Em seudiagnstico, os escritores de histria deveriam reconhecer aamplitude da obra histrica para que fosse possvel surgir o

    grande historiador que, com uma imaginao disciplinada,pudesse unir mais uma vez a representao acurada coma instruo vvida (Phillips, 1989, p. 121).

    23No original: in the art of deducing general principal from facts [] facts to suit general principles.24No original: the arts of controversy [] miserably neglect the art of narration, the art of interesting the affections, and presenting pictures to the imagination [] beneath

    the dignity of men who describe the revolutions of nations, to dwell on the details which constitute the charm of biography [] unread on the shelves of ostentatious libraries.25No original: to extract the philosophy of history, to direct our judgment of events and men, to trace the connexion of causes and effects, and to draw from the occurrences

    of former times general lessons of moral and political wisdom.26No original: by judicious selection, rejection, and arrangement, he gives to truth those attractions which have been usurped by fiction.27No original: To make the past present, to bring the distant near, to place us in the society of a great man or on the eminence which overlooks the field of a mighty battle, to

    invest with the reality of human flesh and blood beings whom we are too much inclined to consider as personified qualities in an allegory, to call up our ancestors before us with

    all their peculiarities of language, manners, and garb, to show us over their houses, to seat us at their tables, to rummage their old-fashioned wardrobes, to explain the uses of

    their ponderous furniture, these parts of the duty which properly belongs to the historian have been appropriated by the historical novelist.

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    Reviver ou reunir o passado?: Um novo enquadramento da proposta historiogrfica de Robert Southey

    Estaramos, ento, diante de uma verdadeira aporiacaso estivssemos de acordo com a interpretao tradicio-nal do romantismo britnico como um movimento queteria vigorado entre 1780-1830 e dos poetas romnticoscomo reconhecedores da centralidade da imaginao paraa literatura e, por derivao, para a histria (Phillips, 1989,

    p. 121). O poeta da chamada primeira gerao romnticaRobert Southey no parecia se preocupar muito em es-crever uma histria viva e, diferentemente de Macaulay,em nenhum momento, para alm desse pequeno exemploexposto, articulou os vocabulrios associados imaginaocomo relevantes para a historiografia e nem o reviver opassado como sua tarefa central. De forma irnica, Ma-caulay parece defender a historiografia que Dias legava aSouthey ao colocar como funo central da histria tornaro passado presente, trazer o distante para perto.

    Reviver ou reunir o passado?Apesar de a History of Brazilser tida pela histo-

    riografia, de forma geral, como a primeira obra completade histria do Brasil publicada, ainda no obteve umagrande variedade de estudos. Sua importncia no resideapenas na construo do Brasil enquanto um pas comuma histria prpria, ainda que fortemente devedora dePortugal, mas tambm para o entendimento das prticase concepes histricas fundamentadoras da historiografiaenquanto prtica discursiva. Como j mencionado, forado cenrio brasileiro no existe nenhuma obra dedicada

    a analisar a History of Brazil, sendo a maioria dos estu-dos sobre Southey voltados para seus escritos em verso.Ao analisarmos ambas as publicaes anteriormentemencionadas de Maria Odila da Silva Dias, o conceito dereviver posto claramente pela autora como pea-chaveno entendimento da proposta historiogrfica do PoetaLaureado. O sentimento de reviver o passado, dessa forma,seria o efeito principal que as longas descries feitas porSouthey objetivavam produzir em seu leitor.

    Ao longo das anlises de Dias, principalmente nadissertao publicada nosAnais do Museu Paulista, existemdiversas citaes de Southey, traduzidas livremente pela

    autora, que so postas como comprovao de sua hiptese.Contudo, quando as passagens em ingls so verificadas,algumas divergncias substanciais entre a traduo feita e oque est escrito nos originais so bastante visveis. Explorartodas as passagens de forma exaustiva acarretaria um tra-balho monogrfico que visasse apenas comparao dostrechos, dada a complexidade e variedade das adaptaes

    feitas. So inmeros os casos em que citaes so trazidasfora de seu contexto, adaptadas sem nenhuma indicaoou mesmo informaes erradas so apresentadas, ao pontode Dias afirmar que Southey estava se referindo obrade David Hume enquanto, na verdade, Southey escreviasobre Henry Hallam (Dias, 1974, p. 78-79; cf. Southey,

    1828a, p. 194). Com isso, optou-se por realizar a escolhade algumas passagens exemplificadoras dessa questo.

    Quando Dias descreveu as propostas de Sou-they e Walter Scott para a histria, afirmou que ambosentendiam que escrever a histria subentendia aindacerta atividade afetiva, e de simpatia com os homens dopassado, atividade subjetiva a que deveria corresponderum estilo peculiar de narrativa. Como comprovao desua proposio, cita a traduo das palavras de Southeyem uma carta a John May:

    no se tratava apenas de preencher uma cronologia,mas de reviver, de reencarnaros modos e os tempera-mentos dos homens (Curly, 1967, p. 13, grifos meus).28

    Contudo, Southey escreveu a May as seguintespalavras:

    mas eles [os dramaturgos e romancistas]prestamateno apenas cronologia e deixam de lado oscostumes e o pensamento do perodo (Southey, 1855,p. 107).29

    Quando existe a possiblidade de cotejar os doistrechos, possvel ver claramente a discrepncia entreo que foi originalmente escrito em ingls e a traduo.Esse movimento no possvel de ser feito dentro dotexto de Dias tendo em vista que so raros os casos emque apresenta ao seu leitor o texto original. Alm disso,as cartas e demais fontes citadas pela autora, at poucotempo, ou encontravam-se exclusivamente em arquivosingleses ou eram edies do sculo XIX, que no obtive-ram reimpresso. Mesmo levando em considerao queo trecho apresentado acima uma traduo livre para alngua portuguesa, a diferena de significado das duas fra-

    ses patente. No existe dvida de que ambas as citaesreferem-se mesma carta, mas a adaptao realizada foito grande que s possvel distinguir que se trata da cartacitada por Dias pela data e destinatrio da mesma, assimcomo pela permanncia de algumas palavras na traduoque constavam no original. Como se pode ver atravsda comparao dos dois trechos, ao reescrever a carta de

    28Apesar de no constituir uma citao de mais de trs linhas, julgamos necessrio destacar esse trecho pelo seu valor analtico.29A carta, na verdade, de 14 de dezembro de 1798 e no 15 de dezembro, como indica Dias. No original: but they [dramatist and novelists] only pay attention to the chronol-

    ogy, and not to the manners or mind of the period.

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    Southey, Dias inseriu as palavras reviver e reencarnar,que condizem com a sua hiptese argumentativa, dentrodo horizonte discursivo de Southey a fim de criar o efeitode verdade para sua proposio.

    Dias indica tambm quais seriam os requisitosessenciais para o verdadeiro historiador na perspectiva

    de Southey: o dom de reproduzir com fidelidade oscostumes de outros tempos; um estilo apto a transmitir aatmosfera, o esprito de uma outra poca e a capacidadede ressuscitar uma realidade extinta e, pois, de impres-sionar e prender os leitores. Dessa forma, para que [anarrativa] fosse completa, algo deveria ser acrescentado objetividade e ao rigor crtico de uma obra histrica, poisos fatos deviam despertar os sentimentos do leitor a fimde ficarem gravados em sua memria (Curly, 1967, p. 15).Logo no final dessa frase insere uma nota de rodap emque cita as palavras de Southey como balizadoras de suaanlise: ... to be understood, and felt and remembered...

    (Carta de Southey a Mr. Ebenezer [...].30Ao que tudoindica, a citao do original em ingls de Southey avali-zaria a proposta da autora em relao ao reviver histrico;contudo, quando se analisa um fragmento maior da carta,tal proposio parece no se sustentar. Na carta citada,Southey se referia ao estilo de seu poema pico Madoc(1805) e argumentava que

    minha norma de escrita, seja para prosa ou verso, a mesma, e pode ser brevemente especificada. Isto ,primeiro, me expressar com a maior perspicuidadepossvel, segundo, ser o mais conciso possvel e, terceiro,o mais impressionante possvel. Essa a forma paraser entendido, sentido e lembrado (Southey, 1855, p.267).31

    Em momento algum Southey toca no assunto dodespertar os sentimentos do leitor ou em ressuscitar umarealidade extinta, pois provavelmente seus pensamentosestavam mais preocupados com o impacto retrico quepoderia causar aos seus leitores do que com a propostahistoriogrfica dita romntica de reviver o passado.A descontextualizao das palavras de Southey umartifcio utilizado com frequncia nos dois textos de Diasno intuito de adaptar as proposies de Southey s suashipteses de pesquisa.

    Dando continuidade ao seu argumento de queSouthey seria o precursor de uma nova historiografia,essencialmente romntica e profundamente preocupadacom o reviver histrico, Dias apresenta a traduo livre demais uma carta de Southey: uma coisa sobretudo hei detentar escrevendo histria, entrelaar tanto quanto poss-

    vel, na narrativa, os estudos e os modos da poca, de sortea aproximar-me, nesse ponto, mais dos velhos cronistas doque dos modernos historiadores.32A citao das palavrastraduzidas de Southey o que permite autora afirmarque tinham [Southey e Scott] a inteno de reviver oshbitos, os sentimentos e a mentalidade dos velhos tempossem releg-los, como Hume, para apndices e notas.33Pesquisando a carta na integra, pudemos verificar o ar-gumento de Southey mais claramente:

    Uma coisa, particularmente, eu devo tentar realizar aoescrever histria tecer as maneiras dos tempos, tanto

    quanto for possvel ser feito, dentro da narrativa, emvez de encher o livro com captulos de anexo e, nesteponto, parecer mais com os velhos cronistas que com oshistoriadores modernos (Southey in Robberds, 1843,p. 342).34

    Existe uma diferena sutil, mas importante, dostrechos traduzidos por Dias e a carta em si. Southey pa-rece apenas elucidar que no pretendia incluir apndicesem sua obra e, para no ter que recorrer a essa estratgia,tentaria entrelaar ao mximo as maneiras nanarrativa, oque, de fato, deixou sua Historybastante longa e repletade muitos detalhes. Novamente no existe a incorporaodo conceito, que parece mais uma categoria apropriadapor Dias da literatura sobre o Romantismo, de reviverno vocabulrio utilizado por Southey. A possibilidade dea erudio gerar um tipo de presentificao do passadoj foi anteriormente ressaltada (Araujo, 2006, p. 324).35Apesar disso, importante frisar que no existe umaequao perfeita entre descrio e reviver o passado,tendo em vista que nem toda descrio tem esse carterepifnico e, fundamentalmente, no visa a este fim. Asdescries produzidas por Southey devem ser entendidasno contexto mais amplo das disputas sobre as formas deescrita da histria e do papel da erudio e do antiqua-riato na historiografia.

    30Traduo: ...para ser entendido, sentido e lembrado.31No original: my rule of writing, whether for prose or verse, is the same, and may very shortly be stated. It is, to express myself 1st, as perspicuously as possible; 2nd, as con-

    cisely as possible; 3rd, as impressively as possible. This is the way to be understood, and felt, and remembered.32As trs citaes que seguem da obra de Dias se referem Curly, 1967, p. 13-14. Essa primeira passagem tambm citada em Dias, 1974, p. 73. Contudo, o trecho traduzido

    por entrelaar tanto quanto possvel na narrativa, os estudos e os modos da poca modificado para entrelaar tanto quanto possvel na narrativa os estilos e os maneirismos

    da poca. Dias no apresenta o original em ingls.33Ao fim desse trecho, Dias cita em nota de rodap a seguinte parte da carta que havia traduzido anteriormente: to weave the manners of times, as far as possibly can be done,

    into the narrative, instead of crowding the volume with appendix chapters.34No original: One thing I shall especially attempt in writing history to weave the manners of times, as far as possibly can be done, into the narrative, instead of crowding the

    volume with appendix chapters; rather, in this point to resemble the old chroniclers than the modern historians.35Uma argumentao tambm nesse sentido, mas de forma bastante distinta, pode ser encontrada em Bann, 1994, p. 129-152.

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    Reviver ou reunir o passado?: Um novo enquadramento da proposta historiogrfica de Robert Southey

    Em momento algum conseguimos delimitar umapassagem na qual Southey afirme que sua historiografiaestaria preocupada com o reviver histrico. Pelo contrrio,todos os indcios que temos so de que sua fixao pelasdescries detalhadas no se refere ao desejo de reviver opassado, mas manifestao de um erudito que acreditava

    que a tarefa do historiador era reunir a documentaoexistente sobre o assunto. Quando Southey escrevia oterceiro volume da History of Brazil, deparou-se coma falta de informaes sobre alguns anos que sua obra abordava e pensou: [...] ali,ento, eu certamente deveriaexibir uma descrio dos costumes etc., e a minha principaldificuldade ser manter o livro dentro de seus limites,pois, por amar o mximo de informao, a prolixidadede assuntos (no de costumes) o pecado que mais co-mumente me acomete (Southey in Leo, 1943, p. 54).36Sua narrativa tendia, devido s suas inclinaes eruditas

    e sua concepo de histria, a longas descries e amploconjunto de informaes.A defesa da unidade do chamado perodo romn-

    tico foi corrente aps a dcada de 1920 e fortementebalizada pelas histrias literrias comparativas quereforavam a existncia de ideais-chave que teriam seperpetuado por um longo perodo em diversos contextosnacionais (Hogle, 2010, p. 6). Nesse processo camale-nico de identificao e construo dos conceitos centraisdo Romantismo e do seu cnone, muitas interpretaesforam feitas e propostas (Ferber, 2010; Hogle, 2010,p. 1-33). A tese de Dias de que a Histria do Brasilde

    Southey foi em sua poca uma obra pioneira da novanarrativa e da viso imaginativa da histria, que estavana vanguarda da historiografia romntica (Curly, 1967,p. 52, 102), parece-me to insustentvel quanto o prprioconceito de Romantismo.

    Pesquisar, reunir emonumentalizar o passado

    Entre os anos de 1809 e 1813, Southey contribuiupara o peridicoEdinburgh Annual Registerna escrita do

    que se propunha ser os anais da histria contemporneada Europa.37Nessa poca, recebeu censuras quanto mi-ncia das informaes e consequente extenso do seurelato. A parte que escreveu para o primeiro volume do

    Edinburgh Annual Register, relativo ao ano de 1808,continha aproximadamente 250 mil palavras, mas j nosegundo volume essa quantidade havia praticamentetriplicado. O prprio editor, John Ballantyne, tentoupersuadi-lo a cortar algumas pginas, mas, tendo falhadoem sua misso, viu-se obrigado a justificar, nas pginas

    da advertncia, esse incontornvel impasse aos assinantesdo anurio (Speck, 2006, p. 142). Southey pensava que:

    acusao de falta de condensaoeu posso melhorresponder: o [presente]nmero est sobre a mesmaescala que o seu antecessor e seu tamanho devido maior quantidade de matria que o ano oferecia.[...] Eu acredito que a censura implica um elogioao trabalho, pois significa que as pessoas desejamler o livro, mas ainda no querem dar tanto tempoa ele, como requer a sua extenso. Ora, os AnnualRegisters at o momento no foram lidos: eles sodeclaradamente antes obras para referncia do quepara a leitura e, portanto, quanto mais minuciososforem, melhor respondero f inalidade para a qualforam concebidos. Se, portanto, aquele que l o livroagora pensa que essa uma tarefa que dura muitotempo, quem consult-lo daqui a dez anos no estardisposto a censur-lo em relao a isso(Southey inWarter, 1856a, p. 250).38

    A escrita narrativa vastamente minuciosa evolumosa apresenta-se, em parte, como uma caracte-

    rstica da prosa histrica de Southey, mas igualmente importante salientar que Southey e seus contemporneospareciam no concordar com a pluralidade de objetivosque uma histria poderia ter e que seriam esses objetivos,fundamentalmente, que definiriam a realizao da obra.O Edinburgh Annual Register, assim como a History ofBrazil, eram declaradamente antes obras para refernciado que para a leitura. A natureza de um anurio, assimcomo de uma histria, acreditava Southey, pedia que omaior nmero de informao fosse reunido, e, se a crticaao seu trabalho apontava que isso havia ocorrido, signifi-cava que o havia realizado adequadamente.

    Essa queixa lhe foi apresentada como sendo ummal grave, mas, de maneira oposta, pensava que, alm detais crticas no o influenciarem em absolutamente nada,considerava-as injustas, pois em uma histria deste tipo,

    36Carta a Henry Koster, sem data. No original: [...] so there of course I must bring in the picture of manners etc..., and the main difficulty will be to keep within the limits of the

    volume, for loving the fullest information myself, prolixity of matters (not of manners) is the sin which most easily besets me.37Southey utilizou diversos materiais pesquisados para a escrita da parte histrica da Edinburgh Annual Registerem sua History of the Peninsular War(Speck, 2006, p. 153).38Carta a Charles Wynn, Keswick, 4 de fevereiro de 1812. No original: To the charge of want of compression I can better reply: the volume is upon the same scale as its prede-

    cessor, and its bulk is owing to the greater quantity of the matter which the year afforded. [] I believe the censure is one which implies a compliment to the work; for it means

    that people wish to read the book, and yet do not wish to give so much time to it as the length requires. Now Annual Registers have hitherto not been read: they are professedly

    works rather for reference than for reading; and therefore the more minute they are, the better they answer the purpose for which they are designed. If, therefore, he who reads

    the book now thinks it too long, he who consults it ten years hence will not be disposed to censure it upon that score.

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    o trabalho do analistano tanto considerar a diversode sua prpria poca, mas a informao de quem estpara vir depois dele (Southey in Knight, 1887, p. 143,grifos meus).39A histria, em sua opinio, no era umpassatempo, que deveria ser adaptada ao gosto do leitor,mas um gnero literrio que requeria grande preciso e

    o maior levantamento documental possvel. Southey nopartilhava do entendimento que tinham alguns de seusleitores da histria como uma composio panormica,que contribua para o divertimento pessoal e que deve-ria ser narrada segundo a brevidade do gosto da poca.O descompasso entre Southey e alguns leitores da suaprosa histrica residia no entendimento diverso do queseria um livro de histria e seu pblico. Erravam em suascrticas ao imaginar que Southey escrevia para o pblicocomum e que tinha como meta instru-los e entret-los.Southey estava seguro de que essa no era a sua tarefa, novisava tornar a histria brasileira uma moda, difundi-laentre os crculos letrados ingleses, colori-la com as inme-ras cores disponveis na literatura, mas reunirum conjuntoslido de material em uma compilaoque pudesse lutare vencer o tempo.

    Se alguns leitores no apreciavam o que escrevia,ele, em seu turno, pensava que

    Sou mais bem pago para o que vale menos, e seeu consultasse apenas o meu prprio interesse,no deveria deixar nada para a posteridade, masempregar-me totalmente em escrever tais ensaios

    desconexos que aparecem dentro dos limites de umaresenha e, por isso, no invademdemais o lazer deum leitor moderno (Southey in Knight, 1887, p.143, grifos meus).40

    Em ltima instncia, o tempo que os leitoresoitocentistas estavam dispostos a empregar na leitura dehistrias era incompatvel com o tempo requisitado porum livro que buscava informar em vez de entreter. As obrashistoriogrficas de Southey, inclusive a History of Brazil,eram entendidas como um legado para as futuras geraes,escrito com cuidadosa mincia de modo a no deixar que

    nada de importante escapasse e acabasse se perdendo com

    o passar do tempo. Para tal tarefa, era mais importantereunirdo que reviver o passado. Assim explicava Southeynas ltimas linhas da History of Brazil:

    Com que cuidado foi composta a obra, e com quolonga e diligente pesquisa de materiais, facilmente opercebero os leitores inteligentes: o mais censrio den-tre eles no ser mais rigoroso para com os inevitveisdefeitos deste trabalho, do que o sou eu mesmo. Masse o valor duma obra histrica est na proporo damassa dos fatos que ela incorporou, da fidelidadecom que so relatados, e da adio que dali resultapara a soma de conhecimentos gerais, posso afirmara respeito desta histria, imperfeita como , que atais respeitos no tem ela sido muitas vezes igualada,nem facilmente ser excedida. Popular no pode elaserno pas em que a escrevo, to remoto o assunto eto extensa a obra; mas leitores competentes sei queh de encontr-los, e ao mundo a entrego com indife-rena quanto ao seu acolhimento imediato, e inteiraconfiana na aprovao dos homens para quem aescrevi, e dos sculos a que a lego (Southey, 1862,p. 539-540, grifos meus).41

    A History of Brazilfoi pensada para ser um mo-numento escrito para o qual as geraes futuras pudes-sem olhar e guardar os acontecimentos pretritos. Essemonumento deveria ser construdo no com o auxlioda interpretao e seleo dos fatos ocorridos, mas pela

    compilaodas fontes. Histria, para Southey, era quasesinnimo de anais na medida em que buscava ser o relatopreciso dos acontecimentos e no interpretao da prpriahistria. Descrevia sintomaticamente o seu trabalho decompor a History of Brazilcomo o de um escritor de anais,um annalist, julgava que essa obra qual muito trabalhoassim como escrupulosa pesquisatm sido aplicados, comojamais foi ou ser dado quando se trata de compilaohistrica (Southey inHolland e Everett, 1855, p. 334,grifo meu).42Em 1819, quando saiu o ltimo volume daHistory of Brazil, Southey escrevia que estava prximodo fim do trabalho mais longo e mais rduo de toda a

    sua vida e para o qual havia dedicado dez longos anos.

    39Carta a Sir George Beaumont, Keswick, 28 de setembro de 1811. No original: In a history of this kind it is the business of the annalistnot so much to regard the amusement

    of his own age as the informationof those who are to come after him.40Southey se refere aos ensaios que escrevia para o peridico Quarterly Review. Carta a Sir George Beaumont, Keswick, 28 de setembro de 1811. No original: I am best paid

    for what is worth least; and if I consulted merely my own interest, should leave nothing for posterity, but employ myself wholly in writing such desultory essays as come within

    the limits of a review, and therefore do not trespass too much upon the leisure of a modern reader.41No original: How carefully it has been composed, and with what long and diligent research,the judicious reader may perceive: the most censorious one will not be so sensible

    of its inevitable imperfections as I myself. But if the value of an historical work be in proportion to the store of facts which it has first embodied, to the fidelity with which they

    are recorded, and to the addition which thereby is made to the stores of general knowledge,then may I affirm of the present History, imperfect as it is, that in these respects it

    has not often been equalled, and will not easily be surpassed. Popular it cannot be, because of the remoteness of the subject, and the extent of the work; fit audience however I

    know that it will find; and I deliver it to the world with proper indifference as to its immediate reception, in full reliance upon the approbation of those persons for whom it has

    been written, and of those ages to which it is bequeathed (Southey, 1819, p. 879, grifos meus).42Carta a James Montgomery, Keswick, 26 de maro de 1812. No original: upon which as much labour and scrupulous researchhas been bestowed as ever was or will be given

    to historical compilation.

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    Reviver ou reunir o passado?: Um novo enquadramento da proposta historiogrfica de Robert Southey

    Naquele momento, acreditava que nenhuma histriajamais foi antes compilada, com tal diligncia infatigvel,a partir de documentos dispersos (Southey inKnight,1887, p. 186, grifo meu).43

    A reunio da documentao, a solidez de suahistria do ponto de vista da pesquisa documental, era

    o que sustentaria a History of Brazildurante os sculos eno, como props Dias, uma viso emptico-romnticado passado que objetivava reviv-lo. Em uma de suascartas, Southey reconheciaque, para mim, a melhorescultura em comparao com uma pintura parece seruma fria abstrao:

    Mas, por outro lado, h uma durabilidade no mrmoreque afeta minha mente de uma maneira muito forte[...] e neste mundo de decadncia e mudana conso-lador contemplar qualquer coisa sobre a qual o tempo

    no tem nenhum poder.Portanto, se, como Canova,eu pudesse ter escolhido entre as duas artes, eu teria,como ele, confiado a minha fama ao mrmore em vezda tela(Southey in Knight, 1887, p. 207, grifo meu).44

    Southey escolheu a dureza e longevidade domrmore, em vez da impermanncia da pintura e de suastintas. A History of Brazilno deve ser entendida comouma obra de pintura sobre tela, mas como uma obra emmrmore, que deve sua durabilidade escrupulosa pesquisadocumental. Southey certamente pensava nesses termosquando iniciou as pesquisas sobre a histria do imprio

    portugus, que teve como nica publicao a History ofBrazil. Utilizava a mesma metfora para se referir ao le-vantamento documental que realizava em Lisboa: agoraeu s empilho mrmore: o edifcio deve ser construdo naInglaterra, mas devo voltar novamente para a pedreira.O futuro leitor dessa histria vai encontrar meu estilosimples e curto e de significado condensado, simplescomo um edifcio drico, e, espero, de durabilidade eterna(Southey, 1850, p. 133).45A acelerao do tempo histrico,sentida por meio da voracidade do tempo, era respondidapor Southey em termos de monumentalizao do passado.

    O descompasso entre a expectativa e a experinciade leitura de Southey e alguns de seus leitores no estavarelacionado apenas ao seu estilo de escrita minucioso eenfadonho e abrangncia do relato, mas tambm pode

    ser interpretado como um sintoma de uma divergnciaterica mais profunda relacionada ao papel social da histria.Enquanto os leitores trabalhavam com um horizonte tpicodo sculo XVIII, em que termos como ensinar e entretereram constantemente evocados para legitimar a importnciasocial das obras de histria, Southey avaliava a histria em

    termos enciclopdicos e monumentais, como uma obra dereferncia. Em que medida Southey estaria em descompas-so com seu tempo por um atraso escrevendo como umcronista ou por antecipao privilegiando a pesquisadocumental no cabe-me dizer. No obstante, Southeyparece ter acertado ao pensar que a History of Brazilera umtrabalho sobre a qual minha reputao pode descansar comsegurana (Southey inWarter, 1856b, p. 132).46

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    43Carta a Sir George Beaumont, Keswick, 8 de fevereiro de 1819. No original: of a long and most arduous labour [] I believe no History was ever before compiledwith such

    unweariable diligence from scattered documents.44Carta a Sir George Beaumont, Keswick, 8 de outubro de 1822. No original: To me the finest sculpture compared with a picture seems like a cold abstraction [] But on the

    other hand there is a durability in marble which affects my mind very strongly [] and in this world of decay and changeit is consolatory to contemplate anything over which

    time has no power.Therefore if, like Canova, I could have chosen between the two arts, I should, like him, have trusted my fame to marble rather than to canvas.45Carta a Charles Wynn, Lisboa, 21 de fevereiro de 1801. No original: Now I only heap marble: the edifice must be erected in England; but I must return again to the quarry []

    You will find my style plain and short, and of condensed meaning, plain as a Doric building, and, I trust, of eternal durability. Os editores da Collect Letters of Robert Southey

    indicam que Southey estaria se referindo inacabada History of Portugal.46Carta a Longman and Co., 7 de maio de 1819. No original: work upon which my reputation may safely rest.

  • 7/26/2019 Flvia Varella

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    Flvia Varella

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    Submetido: 13/12/2013

    Aceito: 09/04/2014

    Flvia VarellaUniversidade Federal do Rio Grande do SulAv. Bento Gonalves, 9090, Agronomia,90540-000, Porto Alegre, RS, Brasil