formaÇÃo inicial e trabalho docente : relaÇÕes...
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FORMAÇÃO INICIAL E TRABALHO DOCENTE : RELAÇÕES REVELADAS POR
PROFESSORES DE CIÊNCIAS E DE BIOLOGIA NAS FASES INICIAIS DA CARREIRA.
Luciana Maria LUNARDI CAMPOS Departamento de Educação – Instituto de
Biociências – UNESP Botucatu e Programa de Pós Graduação em
Educação para Ciências – FC UNESP Bauru
Eixo temático : 1- Formação inicial de professores da educação básica
INTRODUÇÃO
O ensino de Ciências “requer que os professores compreendam as origens das
inovações científicas e tecnológicas; lutem contra as desigualdades impostas pelo capital
e pelo exercício do poder; e abram novos horizontes aos estudantes no sentido de se
desenvolverem humana e integralmente”, articulando, assim, “o trabalho desenvolvido
nas escolas com o processo de democratização e reconstrução da sociedade”, conforme
indicado por Nascimento, Fernandes e Mendonça (2010, p.254).
Estas exigências remete-nos à formação do professor, entendida como uma
trajetória de formação de indivíduos, intencionalmente planejada, para a efetivação do
ensino (enquanto prática social) e que precisa ser analisada na “complexa trama social
da qual faz parte” e a partir da “contradição entre o dever ser da referida formação e as
concretas para sua efetivação”, sendo que “ a materialização do referido dever ser não
pode prescindir da luta pela superação das condições que lhe impõem obstáculos”
(MARTINS, 2010, p. 14) .
Reconhecemos, assim, a complexidade da formação de professores, seu caráter
contínuo, a existência de fases nesse processo e a sua relação com o trabalho docente.
Em relação à complexidade, no processo de formação de professores de Ciências
nos últimos cinquenta anos
houve a progressiva tomada de consciência dos agentes do
campo sobre a complexidade da tarefa. No início o privilégio de
uma boa instrumentação (livro, material didático e estratégia de
ensino) parecia dar conta do ensino, caracterizando-se a
formação do professor para saber aplicar a instrumentação.
Recentemente a formação procura dar conta de administrar as
múltiplas variáveis que o influenciam ( BAROLLI E VILLANI, 2013,
p.289 e 290)
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O conceito de desenvolvimento profissional expressa essa complexidade e o
caráter de continuidade do processo de formação, reconhecendo-se a existência de
diferentes fases ou ciclos nesse processo.
Freiman (1982 apud JESUS E SANTOS, 2004) identifica quatro fases no
desenvolvimento do professor : 1- pré-formação (como aluno) 2- pré-serviço ( formação
prévia à prática profissional) 3- indução (primeiros anos de serviço) e 4- serviço (durante
o resto da carreira).
O reconhecimento da relação entre formação e atuação profissional é consensual,
como relatado por Saviani
“o entendimento de que o trabalho docente é condicionado
pela formação resulta uma evidência lógica, assumindo o caráter
consensual do enunciado de que uma boa formação se constitui
em premissa necessária para o desenvolvimento de um trabalho
docente qualitativamente satisfatório. Inversamente, é também
consensual que uma formação precária tende a repercutir
negativamente na qualidade do trabalho docente”. (SAVIANI,
2011, p.18)
Gatti (2010) também indica essa relação, quando expressa que “a formação
desses professores é fundamental para que uma boa qualidade de ensino seja garantida
na educação básica”.
No entanto, muitos outros fatores estão relacionados ao trabalho docente de
qualidade. Pereira-Diniz (2011, p. 48) alerta para a existência de outras dimensões
relacionadas ao sucesso e ao fracasso do trabalho docente, mencionando a existência de
“ processos “deformadores” e “desqualificadores” ” aos quais esses profissionais estão
submetidos e o “princípio da indissociabilidade entre a formação o e as condições
adequadas para a realização do trabalho docente: salários dignos, autonomia
profissional, dedicação exclusiva a uma única escola, pelo menos um terço da jornada de
trabalho para planejamento, reflexão e sistematização da prática, estudos individuais e
coletivos, salas de aula com um número reduzido de alunos” .
Com estas considerações, aceitamos como premissa básica deste estudo o
estabelecimento de relações entre formação e trabalho docente, direcionando a nossa
análise para as relações entre formação inicial e fases iniciais da vida profissional .
No Brasil, a formação inicial – o primeiro momento formal de preparação- se dá no
curso de licenciatura, no qual há a primeira apropriação crítica de conhecimentos
específicos, filosóficos, psicológicos, sociológicos e pedagógicos que se constituíram
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como referenciais para o trabalho docente. O futuro professor precisa conhecer “com
rigor, cientificidade e criticidade as dimensões técnicas próprias de seu exercício
profissional e as condições histórico- sociais nas quais esse exercício ocorrerá e que
precisam ser transformadas” (MARTINS, 2009, p. 455). A formação inicial constitui-se,
assim, em um dos pilares para o trabalho docente futuro competente e compromissado
com a transformação social (CAMPOS, 2012).
O trabalho docente insere-se em um processo de desenvolvimento da carreira,
que segundo Huberman, é formado por ciclos profissionais: 1- entrada na carreira (1 a 3
anos)- marcado pelo estágio da sobrevivência e descobertas, aspectos que são vividos
paralelamente, 2- Fase de estabilizacão ( 4 a 6 anos)-3-Fase de diversificação ( 7 a 15
anos); 4- Pôr-se em questão (15-25) - crise existencial em relação ao seguimento da
carreira; 5- Serenidade e distanciamento afetivo - menos vulneráveis e sensíveis às ava-
liações de outras pessoas; 6 - Conservantismo e lamentações (30 anos) - maior rigidez e
resistência às mudanças e 7- Desinvestimento (35-40 anos). Gonçalves ( apud
ESTRELA, 2010 ) identificou cinco fases: 1-Início (1-4 anos), 2- Estabilidade ( 5-7 anos);
3- Divergência (8-15 anos); 4- Serenidade (15- 20/25 anos) e Renovação do interesse ou
desencanto (25-40 anos). Nas duas propostas, os períodos iniciais - entrada na
carreira/inicio e estabilização, totalizando os sete primeiros anos da carreira profissional,
são descritos como marcados pela inexperiência, descobertas, dificuldades, contradições
e do desenvolvimento de segurança e de capacidade e de comprometimento com a
profissão.
Estudos sobre a fase inicial (1-3/4anos) revelam o choque com a realidade, as
dificuldades, conflitos, tensões , contradições entre crenças e ações e estratégias para
enfrentar essas situações, indicando potencialização de conflitos, em uma profissão
“eminentemente conflituosa” (COLOMBO JUNIOR ,2009). Na fase de estabilização, há
maior preocupação com os objetivos, a metodologia e a aprendizagem dos alunos,
assumindo responsabilidades. Encontra-se um estilo próprio e adquiri-se autoridade,
contribuindo para a construção da identidade profissional.
Considerando-se a importância das fases iniciais para a efetivação do dever ser
do trabalho docente, com a consolidação de compromissos com a aprendizagem dos
alunos, com a escola, com sua profissão e com a sociedade e com o movimento de re-
significação de conhecimentos apropriados na formação inicial, questionamos: quais as
relações entre formação inicial e fases iniciais da carreira docente? Quais aspectos da
formação inicial favorecem ou dificultam o trabalho nessas fases? A teoria, apropriada na
licenciatura, efetiva-se como instrumento de análise da realidade e de ação, contribuindo
para a “ sobrevivência” e as descobertas na fase inicial e para a estabilização na fase
seguinte ?
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Face a esses questionamentos, desenvolvemos um estudo com o objetivo de
identificar e analisar relações entre formação inicial e trabalho docente de professores de
Ciências e de Biologia, nas fases iniciais da vida profissional, a partir da fala dos sujeitos.
Neste texto, serão apresentados dados obtidos no pré-teste realizado.
METODOLOGIA
O estudo caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa e explicativa ( GIL, 2005).
Participarão do estudo professores de Ciências e de Biologia que atuam na rede
pública de ensino, ex-alunos do curso de um curso de licenciatura em Ciências
Biológicas de uma universidade pública de Botucatu, após 2008, que tenham de dois a
sete anos de exercício profissional e que aceitem, espontaneamente, o convite para
participar do estudo.
Os ex-alunos que atendam aos critérios expostos acima serão convidados a
participar do estudo, num total de 30% dos identificados e no máximo 28 professores
(aproximadamente 5% do total dos formados em licenciatura nesse período). Os
professores deverão assinar o termo de consentimento livre e esclarecido.
No pré-teste participaram cinco professoras, ex-alunas de universidades públicas
do estado de São Paulo, embora tenham sido enviados 12 questionários.
Coleta de dados
Para o estudo, inicialmente serão identificados os (as) ex-alunos (as) do período
de 2008 a 2014 e que atuam como professores na rede de ensino básico, a partir de
endereços existentes na instituição universitária.
Inicialmente será enviado um questionário, composto por questões abertas e
fechadas, a todos os ex-alunos localizados, visando coletar dados gerais que possibilitem
a identificação daqueles que atuam como professores. Os dados serão coletados por
meio de entrevistas, na perspectiva da entrevista reflexiva e recorrente.
A entrevista é considerada como uma situação de interação, envolvendo
percepções, expectativas, sentimentos e sentidos do entrevistador e do entrevistado; o
que requer diálogo e movimento constante para a expressão e a compreensão do que foi
expresso. Seguindo a recomendação de Szymanski (2002), haverá um aquecimento,
marcado neste estudo, pelo contato já existente com entrevistado(a) , já que este foi
aluno(a) em momento anterior. Em seguida, será utilizada uma questão desencadeadora:
Comete a(s) contribuição(coes) e a(s) não contribuição (coes) da formação inicial para
as fases iniciais do seu trabalho docente.
A entrevista recorrente é necessária para o aprofundamento das informações
sobre a relação entre formação inicial e fases iniciais da vida profissional, com a
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construção de conhecimento sobre essa temática, já que será possível o retorno à fonte
original dos dados para que ele seja efetivamente compreendido. (LAROCCA, 1999).
As entrevistas serão semi-estrututadas e os roteiros terão três temas básicos: as
características do curso de formação inicial e avaliação crítica desse processo; principais
ações, pensamentos e sentimentos do professor em relação ao seu trabalho nesses
anos iniciais e a relação entre formação inicial e o período inicial de trabalho.
Os dados coletados serão analisados a partir da Análise de Conteúdo, proposta
por Bardin (1979), o que envolve classificação de elementos e agrupamento para o
estabelecimento de categorias.
Em relação ao pré–teste foi elaborado um questionário, com quatro seções: 1-
identificação dos participantes, 2- ser professor (três questões) e 3- anos iniciais da
profissão ( 10 questões) e 4- outros comentários e enviado por meio eletrônico a ex-
alunos de licenciatura de dois cursos de licenciatura em Ciências Biológicas que atuam
como professores. Os dados obtidos foram analisados e serão apresentados a seguir.
Resultados
As participantes serão identificadas como P1, P2, P3 , P4 e P5 e são todas do
sexo feminino. Algumas informações sobre as participantes estão indicadas na tabela 1.
Tabela 1 – Informações sobre participantes
Aspectos P1 P2 P3 P4 P5Pós- graduação Não Não Sim Sim Sim Tempo de atuação (anos) 5 Não indicou 2 5 6 Disciplina responsável Ciências Ciências Ciências Ciências e
Biologia
Ciências e
BiologiaAtuação em Escola Pública Particular Particular Pública Particular Concursada Sim Não Não Sim Não
Solicitou-se a indicação de um título para os seus anos iniciais de profissão e as
respostas foram : “Ser ou não ser, eis a questão...”
“E eu só estou começando!”
“Surpresa
“Introdução à burocracia”.
“ Vivendo, lecionando e aprendendo”
A surpresa foi relacionada ao fato da participante ter se surpreendido de gostar
tanto de dar aulas.
Consideramos que os títulos (com exceção de P3 e P4), expressam o
reconhecimento desse período como de duvidas e aprendizagens.
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As principais dificuldades enfrentadas nesse período foram organizadas em
categorias.Tabela 2- Primeiras dificuldades
Categorias No. De indicações Gestão 3Conteúdos e currículos 3Realidade 1Impotência frente à decisões de instancias superiores 1Salario 1ser reconhecida como autoridade pelos pais dos alunos 1Burocracia (preencher diário de classe, convocações, atribuição
de aulas)
1
Domínio da sala (comportamento) 1Relação com professores mais experientes 1
Em relação à realidade, uma professora indicou o choque de realidade, que a “ levou
a uma depressão, pois entrei em contato com realidades extremamente dolorosas, como
o analfabetismo, violência sexual, tráfico de drogas, abandono”.
Em relação à gestão foram relatadas dificuldades relativas :
-ao descompromisso “com a qualidade da escola e com o aprendizado e bem estar dos
alunos” -imposição religiosa de uma coordenadora -“cobrança por parte da equipe que produziu o material didático para usar TODA a
apostila”.
Já em conteúdos e currículos foram reunidas as seguintes dificuldades :
- Ausência e falta de especificidade de um currículo “oficial” para seguir em uma
instituição que possuía um material um tanto quanto deficitário nos conteúdos;
- dificuldade em seguir e cumprir o conteúdo de uma apostila de uma escola particular,
visto que o tempo era muito pequeno e a quantidade de matéria era muito grande;
- dificuldade em conseguir transformar alguns conteúdos científicos em escolares”
-Verificar – e “consentir” - que constantemente as dimensões sociais e problemas
corriqueiros são priorizados em detrimento do conteúdo escolar.
Quando questionadas sobre por que essas dificuldades ocorreram, vários motivos
foram apresentados, sedo organizados em três categorias, indicadas na tabela 3.
Tabela 3 – Fatores relacionados às dificuldades
Fatores ´ Total Exemplo de respostas própria pessoa 4 “minha falta de conhecimento da realidade de boa parte das
pessoas que vivem em comunidades”,“aparento ser mais nova
e sou menor do que alguns alunos”;“Não suporto intolerância
religiosa ou presença religiosa numa escola,“não aceitava
imposições autoritárias, “falta de “maturidade profissional e
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“achava que os alunos tinham que dar conta de aprender tudo
e eu de ministrar todos os conteúdos a eles”, Não suporto
intolerância ou presença religiosa na escola”, “não consegui
impor respeito” e “ falta de maturidade profissional” Estrutura e
organização
geral escolar
3 “gestores deveriam ser eleitos pela comunidade escola”, “falta
de democracia na tomada de decisões sobre os rumos da
instituição”, “ a apostila me poda” Formação inicial 1 Deficiência durante formação inicial Outras pessoas 1 Imposições autoritárias
Apenas uma resposta se referiu à formação inicial.
Em relação à superação das dificuldades, uma professora considerou que estas foram
superadas e quatro indicaram sim e não ou parcialmente.
A professora que respondeu que sim, possuía 5 anos de experiência profissional e
indicou dificuldades relativas ào currículo e ao conteúdo . Ela considera que: “Aprendi
que nem todos aprendem de forma igual e que o modo como os alunos recebem as
nossas aulas variam muito. Cabe a mim buscar formas e meios para que as aulas
atendam aos interesses particulares deles, mesmo sabendo que não atingirei cem por
cento da sala. A respeito dos documentos, aprendi a procurá-los e a estudá-los".
Algumas ideias expressas pelas demais participantes foram:
“existe um outro tipo de “jeitinho brasileiro”, eu acho, que serve para “utilizarmos as
ferramentas que temos”. “
“Para certas coisas, deixei de pedir permissão”.
“ todos os professores se uniram para exigir e conseguimos algumas (poucas) coisas”.
Já tive algumas reuniões de pais, onde eles puderam ficar mais tranquilos em relação à
minha postura como professora.
sou capaz de me expressar melhor e fazer ser entendida e respeitada na escola pelo
reconhecimento do corpo docente e gestor sobre a qualidade do trabalho que
desenvolvo.
Em algumas salas e situações não consegui ( impor respeito)”. Já em outras salas,
consegui o respeito dos alunos “
A professora que indicou o choque de realidade considerou que “acho que nunca
haverá uma superação plena. E acho que é bom que seja assim, porque é importante
não banalizarmos ou nos anestesiarmos com coisas que não devem ser consideradas
aceitáveis... mas aprendi melhor a dosar o sofrimento para que ele não me impeça de
continuar”.
Em relação aos fatores que auxiliaram no enfrentamento/superação das
dificuldades, apenas duas participantes indicaram formações posteriores à licenciatura
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em Ciências Biológicas: graduação em Pedagogia, especialização, e pós- graduação,
uma dela se referiu aos “coletivos de professores e discussões teóricas oferecidas pela
pós graduação em educação e graduação em pedagogia... ”. Não houve nenhuma
referência à licenciatura em Ciências Biológicas.
As respostas estão apresentadas a seguir:
Tabela 4 – Fatores que auxiliaram no enfrentamento / superação das dificuldades
Fatores total Trocas de experiências/contato com colegas 4Calma-paciencia, 2Formação posterior à graduação em biologia 3Perceber mudanças nos alunos 1Mudar a metodologia de ensino 1Discussões teóricas 1A experiência 1Reflexão 1
Quando questionados se a formação inicial poderia ter auxiliado na não existência ou
na superação dessas dificuldades, todas responderam que sim.
Uma professora relatou que “poderia ter auxiliado no preparo e nas tentativas de
superação. Extinguir as dificuldades não é possível, na minha visão” e sugeriu “recolher
relatos de acontecimentos de sala de aula com professores e coloca-los para os alunos
da licenciatura refletirem como agiriam naquela situação... “
Outra participante relatou que a formação “ajudou a ter calma para enfrentar essas
dificuldades” e para outra “a formação inicial foi primordial na superação das
dificuldades”.
Uma delas indicou que “Os estágios supervisionados deveriam ser um momento de
contato com o que se é possível fazer superando esta realidade. A atuação do estagiário
com professores críticos e projetos emancipatórios selecionados e pré-dispostos seria
uma forma de aprendizado mais interessante, do que apenas aprender como um
processo de inserção, de adaptação, de verificação de erros por parte do estagiário”.
Outra participante acredita que há “muito pouco contato com os documentos oficiais e
que ainda não existe um curso de licenciatura que consiga articular o conhecimento
biológico com os saberes pedagógicos; e isso faz muita falta no momento de lecionar...”.
Em relação aos três principais aspectos da formação inicial que favoreceram a sua
atuação no inicio de sua atividade profissional, o estágio supervisionado foi o mais
indicado, conforme indicado na tabela abaixo. Tabela 5 –Aspectos da formação inicial que favoreceram a atuação profissional .
Aspectos Total Outras experiências 3
Estágio supervisionado 3
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Disciplinas ( As teorias da aprendizagem “Filosofia da Biologia” e “Sociologia da
Biologia”;disciplinas de metodologia)
2
Estímulo à reflexão sobre a minha prática e 1
exploração da criatividade na elaboração das atividades e aulas. 1Novas ideias apresentadas 1
Professores 1
Compreensão de aspectos relacionados ao ensinar e aprender 1
Compreensão de conteúdos específicos 1
A participante que se referiu a professora indicou “consigo enxergar minhas
professoras da Licenciatura nas ideias, no meu objetivo final, o que eu planejo alcançar
dando aquela matéria”.
Já outras experiências citadas foram: participação em Centro Acadêmico , Programa
de Educação Tutorial (PET) e cursinho pré-vestibular.
Uma professora que indicou outras experiências afirmou que pode “perceber que a
formação docente se faz também em um permanente movimento de fazer sem medo de
arriscar, e constante ressignificação crítica, aprendendo com meus próprios erros”.
Apenas uma participante teceu outros comentários, com indicações muito
interessantes relacionadas às dificuldades ( “nem sempre tenho disposição para refletir
ou pensar em aulas que possam ser profundamente interessantes. Sou humana”) e a
sua formação como profissional: “Quando fiz o estágio, durante a licenciatura, julguei,
talvez injustamente, as professoras das escolas, na minha cabeça. Mas ali estamos
muito crus ainda... muitas vezes não enxergamos que aquilo que vemos é uma fatia
minúscula de tempo dentro de um universo de relações e acontecimentos, de frustrações
e (des)respeito”. Segundo ela , hoje faz “uma autocrítica aos meus pensamentos
flutuantes e levianos de estudante, embora entenda que tudo isso fez parte de meu
desenvolvimento. E, como diria Machado de Assis, “antes cair das nuvens, do que de um
terceiro andar”.
Os dados apresentados apontam que os anos iniciais de atuação profissional são
de dificuldades e de aprendizagem, de naturezas variadas. As participantes relataram
dificuldades mais frequentes em relação à gestão, ao ensino de conteúdos e ao currículo,
e as relacionaram a sua própria pessoa e à estrutura e organização geral da escola. As
dificuldades foram pouco relacionadas á formação inicial, mas também a licenciatura em
Ciências Biológicas não foi indicada, espontaneamente, como fator que auxiliou no
enfrentamento/superação das dificuldades. O estágio supervisionado e as disciplinas
foram apontados como fatores que poderiam ter auxiliado na superação das dificuldades,
além de experiências extra-curriculares.
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Considerações finais
Inicialmente destacamos, que este estudo possibilitou alterações no questionário
(conteúdo e forma). Dentre elas, inclusão da solicitação de justificativa para o título
indicado para os anos iniciais; esclarecimento ou substituição de termos fatores e
aspectos, alteração da redação “ ... a formação poderia ter auxiliado” para “... a formação
auxiliou” e elaboração de questões fechadas, com múltiplas alternativas para escolha.
Os relatos obtidos indicam características descritas na fase de entrada da
carreira, mas também compromisso deliberado com a profissão, identificado na fase de
estabilização (HUBERMAN, 1992). Não foram identificados, embora uma participante
tenha se referido ao choque de realidade, indicativos de que os anos iniciais foram
draumáticos e desmotivadores.
A formação inicial parece ter tido uma influência positiva, no sentido de que as
professoras não ficaram presas a modelos aprendidos nesse período, e tão pouco
imobilizadas pela realidade da escola, conforme descrevem alguns estudos . O estágio e
as disciplinas favoreceram, de modo geral, a atuação inicial das professoras.
Giovanni e Guarnieri ( 2014, p.41) indicam que em diferentes pesquisas sobre
professores iniciantes e aprendizagem profissional evidenciam que “ a escola enquanto
local de trabalho assume papel central no processo de constituição da docência ,
sinalizando desarticulação entre a formação docente e as condições exibidas pelos
professores iniciantes para o inicio da profissão”. Também reconhecemos a escola como
espaço de aprendizagem profissional, pois assumimos o processo de formação docente
como continuo e constante.
Mas defendemos a formação inicial como central nesse processo continuo, que
possibilite a formação do professor culto e intelectual, que “domina os fundamentos
científicos e filosóficos que lhe permitem compreender o desenvolvimento da humanidade
e, a partir daí, realizar um trabalho profundo de formação dos alunos” ( SAVIANI, 2011,
p.13). Nessa perspectiva, um dos problemas dos cursos de formação de professores, no
nosso entendimento, não é excesso de teoria pedagógica e sim a falta dela (alguns
autores se referem ao “esvaziamento teórico”) – de teoria, a partir de uma concepção
dialética da relação com a prática.
Cabe refletir como um licenciado formado nessa perspectiva ( professor culto –
intelectual) enfrenta a difícil realidade da escola? A nossa compreensão é que enfrentará
com instrumentos, não prontos e fechados, e sim amplos e de análise, e com
compromisso com a escola, os alunos e o coletivo de professores. Sem romantismo ou
sem pessimismo, mas com realismo crítico e compromissado- o que já será um excelente
início.
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