fortificação de alimentos e políticas públicas no...
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13/09/2017
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Fortificação de alimentos e políticas públicas no Brasil: análise crítica
Lara Lívia Santos da Silva Mestre em Nutrição e Saúde - UFG
Doutoranda em Nutrição em Saúde Pública – FSP/USP
XI Jornada de Atualização em Nutrição Pediátrica
25 de Agosto de 2017
O que é a fortificação de alimentos?
“É o processo de adicionar vitaminas e minerais em um alimento para melhorar sua
qualidade nutricional
Prevenir ou reduzir a
ocorrência de deficiência de micronutrientes em uma
população ou grupos populacionais específicos.”
Fonte: Mühlenchemie
(WHO, 2006)
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Por que a deficiência de micronutrientes é um problema de saúde pública?
• 2 bilhões de pessoas no mundo
• Países desenvolvidos e em desenvolvimento
• Impacto direto em indivíduos e sociedades
(Bailey et al, 2015; Brasil, 2007)
Crianças < 5 anos (↑ demanda e múltiplas doenças)
Crianças < 5 anos: 20,9% anemia (PNDS 2006) 17,4% DVA
Tipos de Fortificação
• Fortificação em massa: fortificação de alimentos amplamente consumidos pela população em geral mandatória
• Fortificação destinadas a populações-alvo: fortificação
de alimentos para grupos populacionais específicos (ex: fórmulas infantis) voluntária ou mandatória
• “Fortificação orientada pelo mercado” (market-driven fortification): fortificação voluntária de alimentos realizado pela indústria
(WHO, 2006)
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Outros tipos de Fortificação
• Fortificação Caseira (home fortification ou point-of-use fortification): adição de uma mistura de vitaminas e minerais em pó em alimentos prontos para o consumo
• Biofortificação: técnica de melhoramento genético que possibilita elevar o teor de micronutrientes dos alimentos modificação da reprodução e genética das plantas
(WHO, 2006; WHO, 2011; Nestel et al, 2006)
Fortificação de alimentos “industrial”: Vantagens e desvantagens
(WHO, 2006; Brasil, 2007)
Van
tage
ns
• Não requer a mudança de hábitos alimentares
• Ampla cobertura populacional
• Ótimo custo-benefício
• Socialmente aceita
• Baixo risco de intoxicação
• Importante em locais com baixa disponibilidade de alimentos fonte de vitaminas e minerais
Des
van
tage
ns
• Resultados à longo prazo
• Não eficaz em locais com deficiências mais graves
• Depende da disponibilidade e engajamento da indústria alimentícia
• Não optativa para os indivíduos com EN adequado
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Políticas Públicas de Fortificação de Alimentos no Brasil
Fortificação do sal com iodo
Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico
Fortificação da alimentação infantil com micronutrientes
Políticas Públicas de Fortificação de Alimentos no Brasil
Fortificação do sal com iodo
Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico
Fortificação da alimentação infantil com micronutrientes - NutriSUS
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Iodo
• Iodo: elemento traço essencial para a produção de hormônios tireoidianos (T4 e T3) metabolismo e crescimento físico e neurológico
• Baixa ingestão de iodo Hipotireoidismo “DDI”
(Brasil, 2007)
Deficiência de iodo: Hipotireoidismo
• Principais distúrbios:
Bócio endêmico (hipertrofia da glândula tireoide)
Cretinismo (retardo mental grave e irreversível)
Surdo-mudez, anomalias congênitas, dentre outros...
(Brasil, 2007)
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Excesso de iodo
• Tireoidite Crônica autoimune (Tireoidite de Hashimoto)
• Hipertireoidismo induzido por iodo
(Medeiros-Neto, 2009)
Consumo: - Sal de cozinha - Alimentos industrializados
Iodação do Sal no Brasil: histórico
(Brasil, 2007; Brasil, 2013)
2003: RDC nº 130
20-60mg de I/kg
1953 Lei nº 1.944: obrigatoriedade da iodação do sal para consumo humano nas áreas de bócio endêmico
1974: Lei nº 6.150: obrigatoriedade da iodação de todo sal produzido no Brasil
10-30mg de I/kg
1994: criação do PNCDDI
40–60mg de I/kg
1999: Portaria 218:
40–100mg de I/kg
2005: Programa Nacional para Prevenção e Controle dos DDI (MS) – Pró-iodo
2013: RDC nº23
15-45mg de I/kg
1983: criação do Programa de Combate ao Bócio Endêmico (MS/INAN)
1956 – Emenda: todo o sal para consumo humano
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Iodação do Sal no Brasil: histórico
(Brasil, 2007; Brasil, 2013)
2003: RDC nº 130
20-60mg de I/kg
1953 Lei nº 1.944: obrigatoriedade da iodação do sal para consumo humano nas áreas de bócio endêmico
1974: Lei nº 6.150: obrigatoriedade da iodação de todo sal produzido no Brasil
10-30mg de I/kg
1994: criação do PNCDDI
40–60mg de I/kg
1999: Portaria 218:
40–100mg de I/kg
2005: Programa Nacional para Prevenção e Controle dos DDI (MS) – Pró-iodo
2013: RDC nº23
15-45mg de I/kg
1983: criação do Programa de Combate ao Bócio Endêmico (MS/INAN)
1956 – Emenda: todo o sal para consumo humano
Iodação do Sal no Brasil: histórico
(Brasil, 2007; Brasil, 2013)
2003: RDC nº 130
20-60mg de I/kg
1953 Lei nº 1.944: obrigatoriedade da iodação do sal para consumo humano nas áreas de bócio endêmico
1974: Lei nº 6.150: obrigatoriedade da iodação de todo sal produzido no Brasil
10-30mg de I/kg
1994: criação do PNCDDI
40–60mg de I/kg
1999: Portaria 218:
40–100mg de I/kg
2005: Programa Nacional para Prevenção e Controle dos DDI (MS) – Pró-iodo
2013: RDC nº23
15-45mg de I/kg
1983: criação do Programa de Combate ao Bócio Endêmico (MS/INAN)
1956 – Emenda: todo o sal para consumo humano
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Inquéritos Nacionais - monitoramento
(Brasil, 2007; Brasil 2016)
1955 (MS) 20,7%
escolares
1974-76 (MS) 14,7%
escolares
2001: Projeto Thyromobil 1,4% escolares
Mas... excesso de iodo em 86%
2010 (SP) 58% escolares excesso de iodo
2008-2009/2013-2014:PNAISAL concentração urinária de iodo (dados nacionais - escolares): - 9,7% déficit - 20,4% adequada - 25,2% mais que adequada - 44,6% excessiva
Análise crítica
PORÉM....
• Monitoramento periódico (produto e população) Evitar carência ou excesso de iodo!!
• Harmonização das políticas de iodação do sal com as demais iniciativas voltadas para ↓ ingestão de sódio
• Identificação dos grupos de risco
para a deficiência de iodo (gestantes 57% DI - SP?) Mais estudos!!
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Políticas Públicas de Fortificação de Alimentos no Brasil
Fortificação do sal com iodo
Fortificação mandatória das farinhas com ferro e ácido fólico
Fortificação da alimentação infantil com micronutrientes - NutriSUS
Ferro • Mineral essencial que atua principalmente na síntese de
células vermelhas do sangue e no transporte do oxigênio no organismo.
• Deficiência de ferro:
- Compromete o desenvolvimento cognitivo e psicomotor;
- Diminui a imunidade celular, que resulta na menor resistência às infecções;
- Baixo desempenho escolar e baixa produtividade na vida adulta;
- ↑ risco de morbidades e mortalidade infantil e materna;
- Principal causa da anemia (50% dos casos)
(WHO, 2001)
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Ácido fólico
• Forma sintética da vitamina B9 (folato)
• Funções:
- Síntese, replicação e reparo do DNA e RNA
- Coenzima no metabolismo de ácidos nucleicos e aminoácidos
- Formação de células sanguíneas e de alguns constituintes do sistema nervoso
(Ebara, 2017)
Deficiência de folato
• Defeitos do Tubo Neural (DTN)
- Espinha bífida e anencefalia fetal
Espinha bífida Anencefalia
(Ebara, 2017)
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Defeitos no Tubo Neural
(WHO, 2007)
Recomendações
• 400 μg AF/dia para mulheres que estão tentando engravidar (início: 2 meses antes)
• 400 μg AF/dia até 12 sem. gestacionais
• 55,4% gestações não são planejadas • Descoberta da gravidez após 12
semanas gestacionais (Viellas et al, 2014)
Fortificação mandatória das farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil: histórico
• 1999: “Compromisso Social para Redução da Anemia Ferropriva” (↓ 1/3 de ADF até 2003)
Enriquecimento facultativo das farinhas de trigo e milho com ferro
• 2001: Consulta pública obrigatoriedade da fortificação das farinhas com 4,2 mg de ferro/ 100 g de farinha (30% IDR)
Sugestão de incluir o ácido fólico (150 µg/100 g)
(Brasil, 2007)
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Fortificação mandatória das farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil: histórico
* Farinhas pré-embaladas na ausência do cliente e prontas para oferta ao consumidor, as destinadas ao uso industrial, incluindo as de panificação e as farinhas adicionadas nas pré-misturas.
RDC 344/2002 – fortificação obrigatória de todas as farinhas de trigo e milho* comercializadas no Brasil
(Vigência: desde 18/06/2004)
Público Teor adicionado na fortificação
População brasileira
Mínimo 4,2mg ferro /100g
Mínimo 150µg ácido fólico /100g
Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil: evidências - FERRO
• Prevalência de anemia: (crianças < 6 anos)
Ausência de impacto na redução da anemia
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• Prevalência de anemia (gestantes):
Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil: evidências - FERRO
Impacto positivo na redução da anemia
em gestantes
• Consumo de ferro (adultos):
Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil: evidências - FERRO
• Resultados: - Redução da prevalência de inadequação do consumo de ferro - Exceção: mulheres em idade reprodutiva ** Ferro de baixa disponibilidade!
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Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil: evidências – ÁCIDO FÓLICO
• Prevalência de Defeitos do Tubo Neural (DTN):
Redução de 35% após a fortificação
Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil: evidências – ÁCIDO FÓLICO
• Ingestão de folato: > 12 anos
• ↓ prev. de inadequação da ingestão de folato
• Elevada inadeq. em mulheres adultas (38%)
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Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil: evidências – ÁCIDO FÓLICO
• Deficiência de folato:
Prevalência de DF: - Total: 0,3% - Crianças: - - Gestantes: 0,3% - Lactantes: - - Idosos: 0,4%
2009 Iniciou-se o processo de atualização da RDC 344/2002
Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil: atualização da RDC
Diante dessas evidências
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Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico no Brasil: atualização da RDC
RDC 150/2017 – Dispõe sobre enriquecimento das farinhas de milho e trigo com ferro e ácido fólico.
(vigência: 24 meses após publicação da RDC 150)
Público Teor adicionado na fortificação
(2002) Teor adicionado na fortificação
(2017)
População brasileira
Mínimo 4,2mg ferro/100g 4 a 9 mg de ferro / 100g
Mínimo 150µg ácido fólico/100g 140 a 220 µg de ácido fólico /
100g
Compostos permitidos (2002) Compostos permitidos (2017)
sulfato ferroso; fumarato ferroso; ferro reduzido; ferro eletrolítico; EDTA de ferro e
sódio; e ferro bisglicina quelato.
sulfato ferroso e fumarato ferroso e de suas formas encapsuladas.
Fortificação mandatória das farinhas com ferro e ácido fólico: NOVAS EVIDÊNCIAS
(WHO, 2009)
Alta ingestão de ácido fólico (fortificação + suplementação)
• Idosos: anemia e comprometimento cognitivo
• Gestantes: diabetes e resistência insulínica, BPN e adiposidade filhos Crianças: anemia
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Análise crítica FORTIFICAÇÃO DAS FARINHAS COM FERRO E ÁCIDO FÓLICO
FERRO
• ↓ prevalência de anemia em gestantes
• ↓ prevalência de inadequação do consumo de ferro em adultos
• Sem impacto na prevalência de anemia em crianças
Necessidade de ações para
prevenção e controle da anemia em crianças, especialmente crianças <
de 2 anos
ÁCIDO FÓLICO
• ↓ significativa da prevalência de DTN no Brasil
• ↓ prevalência de deficiência de folato inadequação do consumo
PORÉM...
• Necessidade de monitoramento do EN de folato especialmente mulheres em idade reprodutiva
• Mais estudos para investigar os efeitos adversos das altas [folato]
Políticas Públicas de Fortificação de Alimentos no Brasil
Fortificação do sal com iodo
Fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico
Fortificação da alimentação infantil com micronutrientes
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Fortificação da alimentação infantil com micronutrientes em pó
• 2011: OMS recomendou o uso da “fortificação caseira com múltiplos micronutrientes em pó”
• Eficaz para a prevenção da anemia e deficiência de ferro
• Adotada por mais de 40 países
(OMS, 2011)
melhorar o aporte de vitaminas e minerais na alimentação complementar
• Consiste na adição de um sachê com vitaminas e minerais na forma de pó, em qualquer alimento semissólido pronto para o consumo.
• Vantagens: • Boa aceitabilidade
• Poucos efeitos colaterais
• Baixo custo
• Fácil de usar
• Leve, simples de estocar e transportar
• Vários micronutrientes podem ser adicionados
• Não altera características físico-químicas dos alimentos
• Quantidades dentro das recomendações nutricionais
Fortificação da alimentação infantil com micronutrientes em pó
(OMS, 2011)
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Estudo Nacional de Fortificação caseira da Alimentação Complementar
• Objetivo: Avaliar o impacto da fortificação caseira com MNP na prevenção da anemia e deficiência de ferro em crianças de um ano.
• Coleta de dados: junho de 2012 – junho 2013
• Público-alvo: Crianças de 6-8 meses e 10-14
meses
↓ 38%
↓ 20%
↓ 55%
(Cardoso et al, 2016)
• Principais resultados:
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Fortificação da alimentação infantil com micronutrientes em pó
OBJETIVOS: • Potencializar o pleno desenvolvimento infantil
• Prevenir e controlar as deficiências de vitaminas e minerais
(Brasil, 2015)
Fortificação da alimentação infantil com micronutrientes em pó
Tipo de estratégia Fortificação com 15 micronutrientes
Público-alvo 6 meses a 3 anos e 11 meses
Como funciona Adição de vitaminas e minerais em uma das refeições oferecidas para crianças nas creches do Programa Saúde na Escola-PSE A adesão municipal e a realização da fortificação da alimentação infantil nas creches são opcionais Ação é supervisionada, apoiada e monitorada pelas equipes de AB Aquisição dos sachês pela União e entrega aos municípios.
(Brasil, 2015)
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Análise crítica Fo
rtal
ezas
• Efetiva na redução da anemia e deficiência de micronutrientes em crianças brasileiras
• Melhora o EN de vários micronutrientes em uma única estratégia
• Oportunidade para a promoção da alimentação complementar adequada e saudável
Des
afio
s
• Sustentabilidade e expansão da ação
• Monitoramento adesão à esta estratégia pelos municípios é opcional e depende da concordância dos pais
Considerações finais
• Fortificação de alimentos apresenta resultados satisfatórios na população brasileira;
• Deve integrar um conjunto de estratégias para prevenção e controle das deficiências nutricionais;
• Principal desafio: necessidade de monitoramento do estado nutricional de vitaminas e minerais dos indivíduos e da adição de micronutrientes nos alimentos garantir um consumo seguro de micronutrientes para toda a população
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Para saber mais...
• Cursos Online da RedeNutri
http://ecos-redenutri.bvs.br/tiki-index.php?page=cursos_off
Referências WHO/FAO. Guidelines on food fortification with micronutrients. 2006. http://www.who.int/nutrition/publications/guide_food_fortification_micronutrients.pdf
Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Carências de Micronutrientes. Brasília: Ministério da Saúde; 2007. http://189.28.128.100/nutricao/docs/geral/abcad20.pdf.
Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução nº. 23, de 24 de abril de 2013. Dispõe sobre o teor de iodo no sal destinado ao consumo humano e dá outras providências. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2013/res0023_23_04_2013.html
Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução nº. 150, de 13 de abril de 2017. Dispõe sobre o enriquecimento das farinhas de trigo e de milho com ferro e ácido fólico. http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=37&data=17/04/2017
WHO - World Health Organization. Use of multiple micronutrient powders for home fortification of foods consumed by infants and children 6-23 months of age. 2011. http://whqlibdoc.who.int/publications/2011/9789241502047_eng.pdf
Brasil. Ministério da Saúde. NutriSUS–Estratégia de fortificação da alimentação infantil com micronutrientes (vitaminas e minerais) em pó: manual operacional. 2015. http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/manual_operacional_nutrisus.pdf