fundaÇÃo universidade federal do tocantins - uft...
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FUNDAO UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS - UFT
CMPUS UNIVERSITRIO DE PALMAS
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM GESTO DE POLTICAS
PBLICAS
MRIAM LUCAS DA SILVA PARENTE
O DESCORTINAR DAS MANIFESTAES DA CULTURA
ORGANIZACIONAL: A PERCEPO DOS TCNICOS-
ADMINISTRATIVOS E GESTORES DA REITORIA DA UFT
PALMAS-TO
2016
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MRIAM LUCAS DA SILVA PARENTE
O DESCORTINAR DAS MANIFESTAES DA CULTURA
ORGANIZACIONAL: A PERCEPO DOS TCNICOS-
ADMINISTRATIVOS E GESTORES DA REITORIA DA UFT
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Gesto de Polticas Pblicas
da Universidade Federal do Tocantins como
requisito parcial para obteno do ttulo de
mestre em Gesto de Polticas Pblicas.
Orientador: Prof. Dr. Francisco Gilson
Rebouas Prto Jnior.
PALMAS-TO
2016
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s minhas filhas, Letcia e Alice, motivo do meu
viver e da continuidade dos meus estudos. A elas
devo ser exemplo de vida antes de ser pesquisadora.
minha me, Maria Jos, que sempre lutou por
mim e pela minha educao.
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AGRADECIMENTOS
chegado o momento em que se materializa todo o esforo e dedicao desses dois anos de
mestrado. Mesmo com todas as dificuldades, a concluso deste trabalho merece ser celebrada
com as pessoas que me apoiaram e colaboraram com a pesquisa. Melhor o fim das coisas
do que o princpio delas (Ecl., 7,8). Assim, agradeo especialmente:
Deus, que guia meus passos e me permite atravessar obstculos. Sem Ele me auxiliando e
concedendo f, nada disso teria acontecido.
Ao meu orientador, Professor Gilson, que me aceitou como sua orientanda, acreditou na
minha capacidade, e sempre me apoiou e incentivou nesta caminhada.
minha famlia, que nesta trajetria foi esteio para meus anseios, aconchego para minhas
angstias e tranquilidade para minha inquietao. minha me, Maria Jos, pelo cuidado e
amor incondicionais, pelo estmulo ao meu crescimento pessoal e profissional desde sempre.
Ao meu marido, Alusio, por seu amor, cuidado, parceria e incentivo em todos os momentos.
s minhas pequenas Letcia e Alice, alegrias da minha vida, pelo carinho e compreenso nos
momentos de ausncia, de falta de tempo, de ansiedade e nervosismo.
Aos meus amigos que ao longo destes dois anos acompanharam minha jornada, me apoiando
e incentivando. Especialmente, s colegas de trabalho, Denise e Virgnia, pelo conforto e pela
torcida.
Universidade Federal do Tocantins pelo investimento em minha qualificao.
Aos colegas de mestrado que compartilharam comigo reflexes, angstias, almoos e risadas.
Em especial Ana Lcia e Joselma, pela amizade e apoio dispensado nos momentos
difceis.
todos os servidores tcnico-administrativos e gestores da Universidade Federal do
Tocantins que gentilmente disponibilizaram tempo e suas vozes para a realizao deste
trabalho.
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RESUMO
No presente trabalho buscou-se compreender de que forma a relao indivduo-organizao,
envolvendo valores, aspectos comportamentais e simblicos pode orientar a cultura
organizacional na Universidade Federal do Tocantins-UFT. A anlise tem como pretenso
captar aspectos da complexidade e da dinmica da organizao, pelo recorte da cultura
organizacional. Para tanto, foram estabelecidos trs objetivos especficos: identificar a
percepo do que os gestores e tcnicos-administrativos compreendem como cultura
organizacional; conhecer os pontos crticos dessa cultura; e verificar se as prticas de gesto
(no) contribuem para imprimir nos indivduos o sentimento de pertencimento. A cultura da
UFT neste contexto entendida como um conjunto de ideias, valores, vises de mundo e
conhecimentos construdos e compartilhados de forma efmera por indivduos de uma
organizao, influenciados constantemente pelo contexto social e histrico, estando
continuamente em modificao e sobreposio. O estudo de caso est fundamentado numa
abordagem tanto quantitativa como qualitativa e a coleta de dados ocorreu por meio das
seguintes estratgias metodolgicas: pesquisa bibliogrfica e documental, aplicao de
questionrios aos servidores tcnico-administrativos e realizao de entrevistas
semiestruturadas com gestores, ambos lotados na Reitoria da UFT, localizada no Cmpus de
Palmas. Para anlise dos dados, utilizou-se estatstica descritiva, anlise de contedo e
triangulao dos dados. Os resultados apontam que tanto os tcnicos-administrativos como os
gestores tem conscincia da importncia da cultura organizacional no desenvolvimento
humano, profissional e institucional. Entretanto, essas percepes divergem em vrios
aspectos. Segundo os atores pesquisados, alguns pontos crticos (questes relativas
meritocracia, avaliao, planejamento, comunicao, valorizao, carreira, burocracia, etc.)
impactam negativamente na cultura organizacional, limitando a relao indivduo-
organizao. Alm disso, verificou-se que a instituio no dispe de uma poltica,
especificamente orientada pela cultura organizacional, capaz de fundamentar prticas que
minimizem os conflitos de interesse que permeiam a organizao. Ao que foi averiguado, as
aes existentes no correspondem s necessidades e aos anseios do pblico pesquisado.
Infere-se, portanto, que a UFT, por meio de seus gestores, deve repensar e aprimorar suas
prticas de gesto, proporcionando subsdios que propiciem um ambiente de trabalho
equilibrado e sustentvel, e influenciem positivamente no comprometimento organizacional.
Palavras-chave: Cultura, Cultura Organizacional, Organizao, Universidade.
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ABSTRACT
In the present study we sought to understand how the individual-organization relationship,
involving values, behavioral and symbolic aspects may influence the organizational culture at
the Federal University of Tocantins, UFT. The analysis has the intention to capture aspects of
the complexity and dynamics of the organization, by clipping of the organizational culture.
For this, three specific objectives were established: identify the perception of understanding of
administrative managers and technicians on organizational culture; know the critical points of
this culture; and verify the contribution of management practices in the printing sense of
belonging. The culture of UFT in this context is understood as a set of ideas, values,
worldviews and knowledge built and shared ephemerally by individuals in an organization.
The case study is based on an approach both quantitative and qualitative and data were
collected through the following methodological strategies: bibliographical and documentary
research, questionnaires to technical and administrative staff and carrying out semi-structured
interviews with managers, both established at the Rectory of UFT, located in the Palmas
Campus. For data analysis, it was used descriptive statistics, content analysis and
triangulation of data. The results show that both the technical-administrative and managers are
aware of the importance of organizational culture in professional and institutional human
development. However, these perceptions differ in several respects. According to the authors
surveyed, some critical points (issues related to meritocracy, assessment, planning,
communication, appreciation, career, bureaucracy, etc.) negatively impact on organizational
culture, limiting the individual-organization relationship. Moreover, it was found that the
institution does not have a policy specifically driven organizational culture, able to support
practices that minimize conflicts of interest that permeate the organization. When it was
examined, existing actions do not correspond to the needs and desires of the public searched.
Therefore it can be inferred that the UFT, through its managers, must rethink and improve
their management practices by providing subsidies that provide a balanced and sustainable
work environment and a positive influence on organizational commitment.
Keywords: Culture, Organizational Culture, Organization, University.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Principais dimenses do conceito de organizao .................................................. 44
Figura 2 Perfil geral da amostra ............................................................................................ 80
Figura 3 Eixo Orientao para Competncias e Cooperao ................................................ 81
Figura 4 Eixo Motivao e Satisfao ................................................................................... 84
Figura 5 Eixo Planejamento e Flexibilidade.......................................................................... 87
Figura 6 Eixo Estrutura Hierrquica de Poder ...................................................................... 88
Figura 7 Eixo Comunicao .................................................................................................. 89
Figura 8 Eixo Sistema Organizativo ...................................................................................... 90
Figura 9 Eixo Prticas de Integrao ..................................................................................... 91
Figura 10 Eixo Prticas de Recompensa e Treinamento ....................................................... 93
Figura 11 Eixo Relacionamento Interpessoal ........................................................................ 95
Figura 12 Eixo Orientao para Mudana ............................................................................. 97
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Aspectos Epistemolgicos dos Estudos sobre Cultura Organizacional................. 20
Quadro 2 Competncias e orientaes voltadas subjetividade ........................................... 22
Quadro 3 Categoria de anlise Impacto da cultura organizacional ...................................... 98
Quadro 4 Categoria de anlise Influncias na construo da cultura organizacional ........ 100
Quadro 5 Quantidade de gestores (populao) .................................................................... 101
Quadro 6 Categoria de anlise Influncias na construo da cultura organizacional ........ 103
Quadro 7 Categoria de anlise Processos de Mudana e Tomada de Deciso .................... 103
Quadro 8 Categoria de anlise Impacto da cultura organizacional .................................... 105
Quadro 9 Categoria de anlise Homogeneidade X Heterogeneidade.................................. 106
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CEP Comit de tica em Pesquisa
Consepe Conselho de Ensino, Pesquisa e Extenso
Consuni Conselho Universitrio
Copese Comisso Permanente de Seleo
CNO Cultura nas organizaes
CO Cultura organizacional
CPA Comisso Prpria de Avaliao
DAI Diretoria de Assuntos Internacionais
DCF Diretoria de Contabilidade e Finanas
DDH Diretoria de Desenvolvimento Humano
DDRG Diretoria de Desenvolvimento e Regulao da Graduao
Deinfra Diretoria de Engenharia e Infraestrutura
Dicom Diretoria de Comunicao
Dirad Diretoria Administrativa
Dirca Diretoria de Registro e Controle Acadmico
Dirpesq Diretoria de Pesquisa
Dirps Diretoria de Ps-Graduao
Diurb Diretoria de Arquitetura, Urbanismo e Meio Ambiente
DPEE Diretoria de Programas Especiais em Educao
DSE Diretoria de Servios Essenciais
DTE Diretoria de Tecnologias Educacionais
DTI Diretoria de Tecnologia da Informao
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MEC Ministrio da Educao e Cultura
PDI Plano de Desenvolvimento Institucional
Proad Pr-Reitoria de Administrao e Finanas
Proap Pr-Reitoria de Avaliao e Planejamento
Proest Pr-Reitoria de Assuntos Estudantis
Proex Pr-Reitoria de Extenso
Progedep Pr-Reitoria de Gesto e Desenvolvimento de Pessoas
Prograd Pr-Reitoria de Graduao
Propesq Pr-Reitoria de Pesquisa e Ps-Graduao
Sinaes Sistema Nacional de Avaliao da Educao Superior
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UFT Universidade Federal do Tocantins
Unitins Fundao Universidade do Tocantins
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SUMRIO
1 INTRODUO..................................................................................................................... 13
2 METODOLOGIA ................................................................................................................. 18
2.1 Bases metodolgicas ....................................................................................................... 19
2.2 Percurso Metodolgico ................................................................................................... 24
3 A UNIVERSIDADE E A CULTURA ORGANIZACIONAL ............................................ 32
3.1 Organizaes e Universidade .......................................................................................... 33
3.2 Cultura: Distintas abordagens ......................................................................................... 47
3.2.1 Elementos da Cultura Organizacional ...................................................................... 63
4 PANORAMA INSTITUCIONAL DA UFT ........................................................................ 71
5 CULTURA ORGANIZACIONAL O CASO DA REITORIA DA UFT .......................... 75
5.1 Apresentao dos resultados ........................................................................................... 75
5.1.1 O que dizem os documentos institucionais? ............................................................ 75
5.1.2 A voz dos tcnicos-administrativos pesquisa de opinio ...................................... 79
5.1.3 A voz dos gestores entrevista semiestruturada .................................................... 101
5.2 Discusso dos resultados .............................................................................................. 107
6 CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................. 127
REFERNCIAS .................................................................................................................... 131
ANEXO 1 Aprovao de projeto no Comit de tica em Pesquisa com Seres Humanos
................................................................................................................................................ 143
APNDICE A Questionrio sobre Cultura Organizacional na UFT na viso dos tcnicos-
administrativos ....................................................................................................................... 145
APNDICE B Roteiro Semiestruturado de Entrevista ....................................................... 150
APNDICE C Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - Questionrio .................. 153
APNDICE D Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - Entrevista ....................... 155
APNDICE E Compilao de Dados para um Diagnstico da Cultura Organizacional na
UFT ........................................................................................................................................ 158
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1 INTRODUO
A humanidade caminha a passos largos. Essa afirmao, um tanto clich, permite
vislumbrar o contexto em que vivemos, marcado por constantes e rpidas transformaes que
vo desde o campo da cincia, tecnologia, artes, religio e poltica at os novos modelos de
relaes sociais existentes.
Descortina-se um novo mundo onde no existem respostas ou frmulas acabadas: h
uma desordem mundial. Quer dizer ento que tudo est fora de ordem? No! Significa dizer
que h novas formas de se apresentar as demandas.
As coisas so ordenadas se elas se comportam conforme planejamos, com o mnimo
de esforo. No h surpresas. No h obstculos. Tudo ocorre como previsto. Contudo, na
atualidade derreteu-se tudo que era slido e profanado, tudo que era sagrado (BAUMAN,
2008, p. 79). O mundo agora instvel, imprevisvel, com mudanas sem direo,
experimentaes contnuas e resultados incertos; em resumo, o prprio oposto da imagem da
ordem (BAUMAN, 2008, p. 48). a chamada ps-modernidade que questiona as noes
clssicas de verdade, razo, identidade e objetividade, a ideia de progresso ou emancipao
universal, os sistemas nicos, as grandes narrativas ou os fundamentos definitivos de
explicao (EAGLETON, 1998, p. 7).
No contexto organizacional as mudanas nunca deixaram de existir. Mesmo nas
organizaes mais conservadoras sempre se fizeram presentes, influenciando o ambiente e
demandando ajustes e adaptaes para sua manuteno e sobrevivncia. O que se verifica
atualmente o aumento da velocidade das mudanas, tornando-se necessria uma nova forma
de pensar por parte das organizaes, frente as vicissitudes ocasionadas pelo progresso da
humanidade.
Nessa conjuntura, as pesquisas chamadas de Estudos Organizacionais surgiram como
um horizonte a proporcionar melhor entendimento das organizaes formadas por pessoas em
constante interao entre si e com o meio no qual esto inseridas; acredita-se que as
organizaes so influenciadas pelas questes culturais em praticamente todas as suas
dimenses, e, por isso, a cultura desponta como um importante aspecto da anlise
organizacional, capaz de fornecer elementos teis para uma compreenso detalhada do
comportamento organizacional. O entendimento destes aspectos tem significativa
importncia, agregada necessidade de refletir e debater sobre as formas que a nova realidade
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conduzem as organizaes um processo de readequao de variveis, visando uma maior
integrao entre ambientes interno e externo.
Temas de estudo que se baseiam na cultura organizacional tm sido muito debatidos
por diversos autores (GONNET, 2012; MUZZIO; COSTA, 2012; ROCHA, 2014) nos ltimos
anos, trazendo inmeras contribuies s organizaes; inclusive no mbito das Instituies
de Ensino Superior (BATISTA, 2012; BEPPLER, 2012; FERRAZ, 2012; ROSA, 2011;
TEIXEIRA, 2012; SCHWINGEL, 2012), tal como esta proposta de pesquisa. Todavia, nem
sempre o tema cultura empregado da mesma forma. Apesar do crescente interesse pelo
assunto, os pesquisadores que estudam cultura se opem, criando uma profuso de conceitos e
objetos de estudo. Entre essa infinidade de definies, ainda existem diversas abordagens para
os estudos em cultura organizacional: abordagens funcionalistas (cultura da organizao: a
cultura tem uma funo dentro da organizao, entendida como algo coeso e que pode ser
gerenciado), e abordagens interpretativistas, (culturas na organizao: a organizao uma
cultura, complexa, mltipla e que no pode ser gerenciada).
Logo, compreender as subjetividades e encontrar abordagens capazes de entender os
aspectos da cultura organizacional e suas diversas subdimenses e manifestaes um desafio
almejado neste estudo. Pela situao vivenciada e pela inquietao em querer investigar sobre
a efetividade do tema em questo, este trabalho despertou o interesse em observar e refletir
sobre as percepes dos gestores e tcnicos administrativos da Universidade Federal do
Tocantins-UFT, do que vem a ser cultura organizacional, de tal modo que o resultado dessa
investigao contribua para unir esforos em prol do aprimoramento das prticas de gesto,
proporcionando subsdios para a melhoria da relao indivduo-organizao.
Com esse intuito, o presente estudo vislumbra fomentar estudos sobre experincias
vivenciadas no mbito destas instituies (UFT, 2014, p. 3), numa perspectiva
interdisciplinar entre os conhecimentos provenientes das cincias da Administrao,
Sociologia, Psicologia e Antropologia, que contribuam, sobremaneira, para a construo de
uma cultura favorvel tanto para os interesses das organizaes, como para os das pessoas que
dela fazem parte.
Considerando as universidades como organizaes complexas e dinmicas, tanto no
que tange as suas estruturas quanto nas suas funes; os esforos terico-metodolgicos que
permitem abordagens mais aprimoradas e abrangentes para dar conta desta complexidade, e,
por consequncia, o avano nas preocupaes com a cultura, a grande questo levantada nesse
estudo : Como se manifesta a relao indivduo-organizao, envolvendo valores, aspectos
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comportamentais e simblicos? Uma vez que a essncia de valores, smbolos e crenas
fundamentam as prticas organizacionais e contribuem com as universidades em sua atuao,
na realizao de sua misso institucional, no aperfeioamento humano e no desenvolvimento
da organizao em sua misso social junto sociedade.
Quando se fala em cultura sabemos que ainda existem lacunas a serem preenchidas,
que no h consenso nem certezas, tampouco sero encontradas respostas definitivas ao final
deste trabalho. Contudo, as nuances das relaes sociais, a complexidade da mente humana e
a evoluo natural da sociedade reforam a importncia de se repensar os processos de gesto
das organizaes que voltam-se para a demonstrao de valor. Portanto, compreender a
realidade interna da organizao, como so tomadas as decises pelos gestores e como estas
so assimiladas, analisar os mecanismos organizacionais, verificar como se instauram os
processos de mudana e como so recebidos pela organizao, analisar os conflitos de
interesse existentes nas diferentes subculturas torna-se relevante forma de preencher as
lacunas do sistema organizacional.
Alm da necessidade, de certo modo determinada pelo contexto, a definio do tema
desta dissertao, no repertrio de alternativas, deu-se em funo da experincia profissional
da autora, enquanto administradora na UFT h 10 anos , que permitiu vivenciar de perto
muitos dos problemas enfrentados com relao cultura organizacional. A partir dessa
situao com a qual nos deparamos, imprescindvel e urgente que se discuta sobre o tema
cultura organizacional e a responsabilidade da gesto de pessoas para com os indivduos,
dado que a sociedade vive um perodo de transio, em que as prticas organizacionais
encontram novo eco. Assim, considerando-se a relevncia social deste estudo, ter uma
universidade que se preocupa com as pessoas, traduz-se em benefcios vitais para a sociedade.
Destarte, nosso objetivo geral compreender de que forma a relao indivduo-
organizao, concebida como sistema cultural, simblico e imaginrio, onde se entrecruzam
desejos e valores distintos, pode orientar a cultura organizacional na UFT1. A compreenso
da cultura possibilita uma organizao do trabalho mais humana, mais propcia ao convvio e
mais bem-sucedida, com relaes melhores e maior qualidade. Como diversos estudiosos
citados ao longo do trabalho, acredita-se que a cultura complexa, que no h um
compartilhamento absoluto de crenas e valores, visto que as pessoas tm individualidade e
subjetividade prprias, que levam e trazem consigo caractersticas intrnsecas relativas sua
1 No decorrer deste trabalho pode-se verificar que o itlico bastante utilizado. Isso ocorre para destacar alguma
palavra ou frase. O uso de aspas foi reservado para as citaes diretas de outros autores.
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crena, religio, etnia, gnero, etc., impossibilitando, dessa maneira, tratar a organizao de
forma homognea, e falar de uma cultura de uma organizao; assim, a compreenso dessa
relao permite desvendar como a realidade organizacional socialmente construda dando
voz aos indivduos e grupos muitas vezes ignorados. Ao aproximarmos das representaes
sociais dos indivduos, aproximamo-nos tambm dos conhecimentos provenientes da maneira
singular de cada um comportar-se e agir cotidianamente. Podemos, assim, [] captar os
saberes do Outro dentro dessa noo de contemporaneidade, onde tudo se dilui, se mistura,
se fragmenta (CAVEDON, 2005, p.11).
A partir da problematizao e do objetivo geral, delineou-se trs objetivos especficos.
Primeiro, identificar as percepes dos gestores e tcnicos administrativos que representam o
esboo do que pode ser compreendido como aspectos da cultura organizacional da UFT,
isto , pretende-se identificar quais fatores/elementos contribuem na formao da cultura
organizacional e como eles interagem na constituio do imaginrio (vis gestores e
servidores tcnico-administrativos). Segundo, conhecer os pontos crticos da cultura
organizacional na UFT a serem priorizados pela gesto. E, terceiro, verificar, caso existam,
como as prticas de gesto tem impresso nos indivduos o sentimento de pertencimento, por
meio do compartilhamento e integrao entre valores pessoais e organizacionais.
Com esses objetivos em foco, foram estabelecidas trs hipteses para o estudo:
H1: As diferenas de percepo do que vem a ser cultura podem levar a disparidades entre o
discurso da organizao (dos gestores) e os valores e prticas percebidas pelos indivduos.
Como consequncia, cria-se um distanciamento entre as pessoas, onde cada um cumpre sua
funo de forma cada vez menos integrada, desfavorecendo o cumprimento da misso
institucional, a consolidao da universidade no ambiente externo, o desenvolvimento
humano e a prestao de servios de qualidade.
H2: H uma dissonncia entre objetivos individuais e organizacionais. A partir desta
constatao verifica-se a necessidade de enfocar a satisfao dos indivduos como mola
propulsora para um bom desempenho organizacional. Se a relao de colaborao e troca
entre a organizao e os indivduos, do tipo ganhar-perder, precisa-se avanar para um
patamar estratgico que identifique fatores limitadores e principalmente potencializadores
desta relao, buscando o alinhamento de objetivos.
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H3: As polticas e prticas de gesto so orientadas pela cultura organizacional. Com base
nisso, as tomadas de deciso so efetivadas em decorrncia da percepo das necessidades e
demandas dos colaboradores, buscando equilbrio entre objetivos pessoais e organizacionais.
Nessa perspectiva a gesto influencia positivamente o comprometimento organizacional.
Consciente dos desafios de se pesquisar cultura e universidade, visto serem elementos
abstratos, que se reinventam dia aps dia, e sem a pretenso de desvendar com preciso toda a
complexidade que envolve a organizao, procurou-se realizar um trabalho abrangente e til
para a tomada de decises na organizao. Espera-se, ainda, que os objetivos atingidos sejam
uma luz no fim do tnel que possibilite a reflexo sobre cultura no interior da UFT; que as
teorias apresentadas e o mtodo aqui adotado contribuam, de algum modo, para a resoluo
de problemas e a busca de respostas para as questes que se apresentam no exerccio dirio
das atividades dentro da Universidade.
Apesar de parecer repetitivo, cabe ressaltar, que mesmo no encontrando
homogeneidade na Universidade, e tampouco entre universidades, pois estas so diferentes
entre si, inclusive quando suas misses e vises so parecidas, acredita-se que a UFT tem uma
caracterstica prpria, um jeito de ser s dela e uma forma exclusiva de fazer as coisas,
sendo, portanto, oportuno e estratgico compreend-la em suas diversas instncias para
avanar em diferentes aspectos organizacionais, em busca do constante aperfeioamento
institucional.
Na busca por respostas, esta dissertao est organizada em seis captulos. Alm desta
parte introdutria onde apresenta-se o problema de pesquisa e os objetivos do estudo, o leitor
encontrar no segundo captulo, o percurso metodolgico da pesquisa, ou seja, a forma em
que o trabalho foi construdo. O terceiro captulo, por sua vez, dedica-se s contribuies
tericas sobre os temas que pautam esta dissertao: universidade e cultura organizacional.
Para tanto, o captulo se subdivide em duas grandes sees: a primeira, que destaca a
universidade enquanto organizao pblica, ressaltando as consideraes histricas, e a
segunda que trata dos conceitos de cultura, sua relevncia e as discusses contemporneas
sobre o assunto. O quarto captulo trata da caracterizao da UFT, sua histria, o processo de
formao e os preceitos que movem a Universidade. O quinto captulo destina-se aos
resultados e a discusso da pesquisa. E, por fim, nas consideraes finais faz-se um apanhado
geral do trabalho, onde destacam-se algumas reflexes suscitadas no processo de
desenvolvimento desta dissertao.
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2 METODOLOGIA
Para que todos os aspectos e incertezas que permearam o desenvolvimento da presente
pesquisa sejam entendidos, algumas explanaes so fundamentais.
O primeiro contato com o tema em questo foi com a obra Organizaes em Anlise,
de Eugne Enriquez (1997), o qual concebe as organizaes como sistema cultural, simblico
e imaginrio2. A partir da leitura, vislumbrou-se que esta perspectiva de anlise que busca
questionar, na vida organizacional, o desejo de um ambiente sem conflitos e de uma imagem
monoltica da organizao, poderia ser aplicada UFT. Enriquez acredita piamente na
contribuio da psicanlise3 de Freud para a anlise das organizaes, visto que, tanto as
cincias sociais como a psicanlise tm como objeto de estudo a criao e evoluo do
vnculo social.
Contudo, de imediato surgiram vrias indagaes sobre como realizar esta pesquisa,
que apesar de tratar-se de demandas prticas e oportunas para a qualificao profissional
proposta no Mestrado Profissional de Gesto de Polticas Pblicas, um tema complexo,
abrangente, exigindo tempo e aprofundamento nas questes culturais, do que realmente se
carece, considerando as demandas envolvidas na pesquisa, tamanho e complexidade da UFT.
Aos poucos, e sob orientao, compreende-se que possvel, sim, estudar cultura.
Mesmo porque, em dez anos de experincia profissional na Universidade, o caminho
percorrido levou certezas de que, determinadas questes so essenciais no trato cultural.
Neste aspecto, a inteno converter a aproximao entre pesquisador e objeto pesquisado, a
priori considerada inconveniente, em aspecto positivo que permite a observao mais de perto
da organizao, por uma lgica talvez inatingvel por um consultor externo. No significa
dizer que, no papel de investigador, as opinies e resultados sejam influenciados, mas que,
2 O termo Imaginrio, a partir da acepo proposta por Eugne Enriquez (1997), est sendo usado como mundo
de significaes compartilhadas. O imaginrio o elemento que orienta cada sistema institucional, que cria e
determina as conexes simblicas; a maneira singular de ver, viver e fazer a sua prpria histria; sua percepo
de mundo e suas relaes com ele; o significado central das coisas, no discutido e no passvel de discusso; o
conjunto de ideias do que importa e do que no importa (CASTORIADIS, 1995, apud FREITAS, 1999). O
sistema imaginrio possibilita uma melhor compreenso da natureza dos vnculos psicolgicos e afetivos, que se
desenvolvem na relao indivduo-organizao. 3 No devemos confundir esta perspectiva de anlise das organizaes com um processo de psicanlise de grupo
nem, tampouco, com anlises individuais no ambiente organizacional. Os aportes da psicanlise, nesse caso, tm
o propsito somente de compreender como se d o enfrentamento dos problemas da organizao, atravs da
anlise das relaes que os indivduos e os grupos estabelecem com a organizao. Consideramos que ela pode
ser muito til para entendermos esses aspectos da vida nas organizaes, uma vez que a descoberta do
Inconsciente oportuniza um maior domnio do conhecimento.
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fazendo parte do meio organizacional, intrinsecamente ligados a ele, mostre competncia para
elucidar questes que, pela convivncia, sejam identificadas como obscuras e problemticas
na organizao.
2.1 Bases metodolgicas
Aps definio do tema, foram estudadas vrias teorias em busca de abordagens
epistmicas e propostas metodolgicas para melhor compreender a cultura organizacional na
UFT. Os estudos organizacionais4, especialmente os relativos cultura, tm se caracterizado
pelo esforo de entrever a complexidade das organizaes, e da se explica a multiplicidade de
perspectivas epistemolgicas e metodolgicas existentes (FLEURY; FISCHER, 2009).
Como citado na introduo, duas abordagens epistmicas so amplamente difundidas
nos estudos sobre cultura organizacional, a saber: funcionalista e interpretativista. Tomando
como base as cincias sociais, Burrell e Morgan (1982) conceituam tais abordagens como um
conjunto de formulaes metatericas, que define uma viso de mundo partilhada por uma
comunidade de cientistas. Essas diversas correntes de pensamento, ou paradigmas5, referem-
se categoria da cincia (objetiva ou subjetiva); existncia da sociedade (nfase na
regulao ou na mudana social) e essncia humana (determinista ou no determinista).
Dessa maneira, imprescindvel a definio da linha filosfica para orientar os desafios
propostos nesta dissertao, na medida em que o paradigma escolhido, por si s j define uma
srie de opes metodolgicas.
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Os Estudos Organizacionais, conforme citado na Introduo, foram instaurados a partir de mudanas
econmicas, polticas e socioculturais que determinaram distintos olhares e ideologias no intuito de analisar as
organizaes, vez que estas influenciavam (e influenciam) sobremaneira, o comportamento dos indivduos e, por
conseguinte, o alcance de objetivos e metas. Surgem da variadas escolas de pensamento, numa confluncia de
disciplinas (Sociologia, Cincia Poltica, Administrao, Antropologia, Psicologia, Histria e Economia), que
criaram diferentes teorias que direcionam os estudos e as intervenes organizacionais (FISCHER, 2003). 5 A palavra paradigma empregada de diversas formas, mas ao longo desta pesquisa [paradigma o] conjunto
de ilustraes recorrentes e quase padronizadas de diferentes teorias nas suas aplicaes conceituais,
instrumentais e na observao (KUHN, 2006, p. 67). Ou ainda, como conclui Burrell (1999, p. 447), os
paradigmas definem: [...] uma forma de ver o mundo e como este deveria ser estudado, e que este ponto de vista
compartilhado por um grupo de cientistas que vivem em uma comunidade marcada por uma linguagem
conceitual comum, que buscam fundar um edifcio conceitual comum, e que so possudos por uma postura
poltica muito defensiva em relao aos de fora.
-
20
A abordagem funcionalista pressupe que a sociedade tem existncia concreta e real,
sistmica e orientada para a consecuo de objetivos. As conjecturas ontolgicas creem em
uma cincia social objetiva e isenta de acepes de valor, com um maior rigor cientfico. A
perspectiva funcionalista fundamentalmente reguladora e prtica, em sua base, e est
interessada em explicar o mundo social (concreto e tangvel), focando o entendimento do
papel das pessoas, de maneira que produza conhecimento emprico til. A literatura
funcionalista privilegia a busca de um consenso e harmonia difceis de serem atingidos,
relegando aspectos imprescindveis, tais como o conflito e a diversidade de interesses
ocasionados pelas relaes de poder estabelecidas nas organizaes. (BURRELL; MORGAN,
1982; ROSA; TURETA; BRITO, 2006; FRIEDBERG, 1995).
Na contramo, a abordagem interpretativista acredita que a realidade social no existe
em sentido concreto e busca entend-la a partir da subjetividade dos indivduos. Da mesma
forma que a abordagem funcionalista, a interpretativista pressupe que h uma ordem e um
padro implcito no mundo social; no entanto, inviabiliza a tentativa funcionalista de
estabelecer uma cincia social objetiva. A cincia considerada uma rede de jogos de
linguagem, baseada em grupos de conceitos e regras subjetivamente determinados pelos
tericos (MORGAN, 2005; VERGARA; CALDAS, 2005).
Com o intuito de contribuir com o entendimento a respeito dos aspectos
epistemolgicos relacionados s pesquisa em Cultura Organizacional, apresenta-se o quadro
abaixo:
Quadro 1 Aspectos Epistemolgicos dos Estudos sobre Cultura Organizacional
VIESES FUNCIONALISTA INTERPRETATIVISTA
Cultura Organizacional Como algo que a organizao tem
(varivel)
Como algo que a organizao
(metfora)
Razes Antropolgicas Funcionalismo, Funcionalismo-
Estrutural
Etnocincia, Antropologia Simblica,
Estruturalismo
Tpicos na Pesquisa Administrao Crs-Cultural ou
Comparativa e Cultura Corporativa
Cognio Organizacional, Simbolismo
Organizacional e Processos
Inconscientes e Organizao
Paradigma da Integrao da Diferenciao e da Ambiguidade
Fundamentao Sociolgica Antropolgica
Abordagem Funcional Semitica
Escolas/Autores mais
importantes do paradigma
Comte, Spencer, Durkheim, Pareto,
Malinowski , Radcliffe Brown,
Parsons, Simmel, G. H. Mead, Herbert
Blumer, Weber, Rex, Eldridge,
Goldthorpe, Silverman, Blau, Merton,
Coser, Gouldner, Buckley e Skinner
Dilthey, Husserl, Weber, Gadamer,
Schutz, Scheller, Heidegger, Sartre,
Merleau -Ponty Garfinkel, Cicourel,
Schegloff, Sacks, McHugh, Denzin,
Zimmerman e L. Wieder.
Mtodos Quantitativos Qualitativos
Fonte: Elaborado pela autora com base nas pesquisas de Rocha e Pelogio (2011); Carrieri e Luz (1998).
-
21
Estas duas correntes que buscam entendimentos sobre o conceito de cultura,
fundamentadas em formulaes antropolgicas, tm reflexos no campo da administrao, e
geram debates constantes, na medida em que uma corrente (funcionalista) aborda que a
cultura organizacional tem elementos universais e/ou generalizveis, com relaes
consensuais, coesas e sistmicas; enquanto a outra (interpretativista), despreza o consenso a
partir das diferentes vises percebidas nos grupos, no segue um caminho instrumental ou
intervencionista e busca desenvolver estudos para a compreenso e interpretao de sistemas
simblicos, ou seja, aborda as culturas nas organizaes (SILVA; MEDEIROS; ENDERS,
2011).
A partir da anlise dessas correntes, verificamos o predomnio do paradigma
funcionalista no campo da administrao. O enfoque dado ao tema nos trabalhos e autores
dessa corrente o chamado mainstream6 prope estudos comparativos e metodologias de
interveno e mudana, buscando uma instrumentalizao do conhecimento, onde a cultura
elemento essencial para que a gesto tenha resultados organizacionais eficientes. Nesta
concepo os sistemas sociais so concebidos de forma harmnica, sincrnica, onde todas as
coisas esto reguladas e ordenadas (SGUIN; CHANLAT, 1992 apud ANDION, 2012).
Ante os pontos apresentados, convm frisar, que nesta dissertao, numa postura
antropolgica, adotado o conceito de cultura nas organizaes7, que considera o mundo
social organizacional permeado de significados, incertezas e ambiguidades, e que trata a
cultura como uma construo e desconstruo das pessoas que fazem parte das organizaes
(CARRIERI; CAVEDON; LEITE-DA-SILVA, 2008). Assim, de forma semelhante ao
6 Alguns autores (ROSA, TURETA; BRITO, 2006; CALDAS, 2005; VIEIRA; CALDAS, 2006; AKTOUF,
1994) tm apontado a existncia de uma teoria hegemnica, corrente principal ou dominante (mainstream),
que tece uma viso estreitamente funcionalista e instrumental da cultura, considerando que esta pode ser
diagnosticvel, reconhecvel, transformada, manipulada e mudada. A partir desse ponto de vista, toda
organizao pode ter ou ser uma cultura; criada por lderes, campees e heris, que lhe imprimem valores e
smbolos. Contudo, embora os gestores tenham um papel importante na construo da realidade organizacional,
no so capazes de fabricar mitos, smbolos e sistemas de representao. Muitas destas definies utilizam o
termo cultura de forma restritiva e abusiva, vinculado aos elementos sociais, administrativos e tcnicos, prprios
de uma dada organizao ou de um setor especfico. Esta corrente tenta incutir nos membros da organizao as
ideias dos gestores. Em suma, este enfoque denominado gerencialista, limita qualquer tipo de "construo
terica voltada ao desenvolvimento de formas de gesto que visem o incremento da eficcia ou do desempenho
das organizaes. 7 No presente estudo h uma diferena entre os termos Cultura Organizacional (CO) e Cultura nas Organizaes
(CNO). A utilizao dos termos varia de acordo com as dimenses e formas de se enxergar o mundo social, tais
como: se a organizao considerada nica produtora de padres culturais, ou seja, homognea; se h ou no
uma dependncia e influncia dos fatores culturais do ambiente externo; e quais os nveis apropriados para a
compreenso do fenmeno cultural indivduo, grupo, organizao, sociedade. A CO foi sempre desenvolvida
numa abordagem funcionalista, normativa e instrumentalista, enquanto a CNO parte do pressuposto que a cultura
organizacional no capaz de criar-se por si s, mas fruto de um ambiente macrossocial e das pessoas que dele
fazem parte (CARRIERI, 2002).
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22
antroplogo que pesquisa as sociedades primitivas, h que se aprofundar na vida
organizacional com o objetivo de compreend-la (FLEURY; FISCHER, 2009). No entanto,
apesar de acolher o paradigma interpretativista, sem desprezar ou tentar eliminar a
subjetividade inerente ao exerccio crtico de interpretao, no tem como ignorar, neste
estudo, a vertente epistemolgica funcionalista de anlise da cultura organizacional. Pois, a
cultura um atributo essencial nos resultados organizacionais, podendo os pesquisadores e
gestores identificar e compreender seus elementos, a fim de manej-la para o bem comum.
De nada adianta discutir a ideia de cultura sem coloc-la em prtica. Comunga-se com o
entendimento de que as duas abordagens so necessrias e complementares para a pesquisa
em questo, vez que, sem incorporar alguma medida ou direo de relevncia, o estudo se
torna esotrico (WOOD JR., 1999, p. 270; BURRELL; MORGAN, 1979 apud CALDAS,
2005; VERGARA; CALDAS, 2005; VIEIRA; CALDAS, 2006).
Corroborando com tal ideia, Santos (1988) profere que os estudos interdisciplinares
exigem um novo enfoque epistemolgico que ultrapasse as divises clssicas da cincia
(sujeito x objeto, quantitativo x qualitativo, indivduo x sociedade, subjetividade x
objetividade), para uma nova perspectiva integradora e no dualista da realidade social.
Admitir que a objetividade impossvel, no significa render-se ao subjetivismo, intuio e
alquimia mas, desenvolver mtodos interpretativos apropriados, promovendo a aproximao
da realidade (MIGUELES, 2003). Essa abordagem envolve uma epistemologia sistmico-
complexa, que tem como prioridade elucidar as relaes de interdependncia que permeiam o
meio social. Para esses autores, a complexidade deve ser acolhida como um propsito a ser
seguido, um desafio a ser ultrapassado, buscando unir o que antes estava separado e no como
uma soluo, a resoluo de todas as questes (MORIN; LE MOIGNE, 1999 apud ANDION,
2012).
O fato que parece no existir um caminho nico (ou melhor) para seguir. Diante
disso, concebe-se a necessidade de traar caminhos e desenvolver competncias, capazes de
lidar com as pessoas e suas percepes. Vergara e Davel (2001) contribuem nesse sentido:
Quadro 2 Competncias e orientaes voltadas subjetividade
Competncias e Sensibilidades para:
- utilizar de estratgias de interveno para verificar a existncia de tenses ou estabilidade;
- verificar as formas de expresso de pensamentos das pessoas, no plano individual, coletivo ou organizacional;
- identificar as estruturas, processos e estilos cognitivos de comunicao entre as pessoas quando lideram,
provocam a motivao, avaliam, negociam e decidem;
- observar como se constituem as relaes de poder;
-
23
- observar como as pessoas se identificam, idealizam e projetam desejos e sentimentos na concepo e
desempenho de atividades;
- expressar se, e como, as pessoas expressam emoes, atitudes de prazer e divertimento no dia-a-dia de
trabalho;
- avaliar a atuao profissional das pessoas;
- verificar a existncia de prticas e discursos que superficializam, amedrontam e excluem processos, atividades
e pessoas. Fonte: Adaptado pela autora (VERGARA; DAVEL, 2001).
Importa esclarecer que, aps as explanaes, apesar das possveis crticas adoo de
uma metodologia mais flexvel e da possibilidade de sermos julgados como diletantes, nosso
papel nessa pesquisa no contribuir para uma mudana radical, mesmo porque no temos
um vis ativista, mas poder colaborar com a organizao dando voz aos indivduos que dela
fazem parte. Nosso objetivo no se restringe a levantar parmetros para uma melhor gesto
da cultura, pois, o que melhor para uns no para outros. A preocupao no desenvolver
teorias ou mtodos a serem replicados em outras organizaes, posto que essa perspectiva
contrria ao propsito da pesquisa. Mas, partindo do princpio de que a realidade
socialmente construda, faz-se necessrio estabelecer um processo de compreenso,
procurando entender o mundo a partir do ponto de vista daqueles que nele vivem.
Por esse motivo, considerando-se a complexidade e a interdisciplinaridade do tema em
questo, justifica-se a utilizao das abordagens no estudo, visto que possibilitam explorar
no somente as ambiguidades e contradies, mas tambm os vrios modos de
representaes, os mltiplos valores e a construo das significaes da vida organizacional
pelos atores envolvidos.
Num esforo de alcanar os objetivos propostos, tomou-se com ponto de partida que:
a) as interaes sociais no so determinsticas, pelo contrrio, variam conforme o
conhecimento, o entendimento e as explicaes que os indivduos levam em conta; b) as
situaes sociais devem ser pesquisadas de maneira que revelem a natureza interior dos
indivduos; c) os resultados obtidos por meio do estudo no sejam generalizados, pois so
especficos e relativos a um contexto prprio.
Primeiramente, h que se considerar que os grupos, organizaes e sociedade como
um todo, resultam de um desejo inconsciente compartilhado pelos indivduos, ou seja, uma
imagem inconsciente foi compartilhada e construda resultando numa ao. Assim sendo, as
interaes sociais devem levar em conta o modo pelo qual as pessoas elaboram a ordem
-
24
social, suas percepes individuais, incgnitas, emoes, como enxergam e entendem o
contexto.
Somente a partir do entendimento de que as pessoas exibem caractersticas
psicolgicas distintas quando vistas isoladamente, podemos pesquisar e entender os meandros
da vida social, resultados da ao e da interao humana.
A partir dos resultados obtidos, poder-se- visualizar a singularidade nas
interpretaes de cada participante da vida social. Esta caracterstica demonstra a
complexidade das organizaes e da sociedade de maneira geral. Por conta desse mosaico de
interaes e percepes, cada grupo nico. Isso implica afirmar que as pesquisas sobre
cultura organizacional no podem ser generalizadas, em virtude das particularidades de seu
contexto.
2.2 Percurso Metodolgico
Diante dos desafios para proceder a realizao desta pesquisa, vez que o tema
complexo, difcil de ser compreendido e que envolve uma pluralidade de conceitos, valores e
dimenses, pertinente esclarecer os procedimentos metodolgicos necessrios para a
construo do trabalho, destacando-se o tipo de pesquisa, a populao, os instrumentos de
coleta de dados, os procedimentos de coleta de dados e os procedimentos para a anlise dos
dados coletados.
A pesquisa configura-se como um estudo de caso na Reitoria da Universidade Federal
do Tocantins, cuja escolha foi motivada pelo fato de ser especialmente apropriado quando se
busca compreender, examinar, descrever ou explorar acontecimentos e contextos intrincados,
que envolvem simultaneamente diversos fatores (YIN, 2005). Tambm bastante adequado
na anlise de fenmenos sociais e organizacionais em um contexto onde os limites no esto
claramente definidos, e para situaes complexas em que no possvel ter controle sobre as
variveis causais de determinados fenmenos. Alm disso, permite uma investigao para se
preservar as caractersticas holsticas e significativas dos acontecimentos da vida real (YIN,
2005, p.20). O estudo de caso proporciona um retrato vlido da realidade social, que permite
as pessoas entenderem o que est acontecendo na organizao.
-
25
Haja vista os objetivos propostos, esta pesquisa pode ser caracterizada como
exploratria e descritiva. Exploratria no sentido de que existe um gap na viso de cultura
organizacional na UFT, sendo necessrio identificar os problemas, as capacidades de ao e
de interveno na organizao, e descritiva por buscar compreender percepes, valores e
aspectos culturais dos servidores da referida instituio, a partir de uma anlise cientfica. As
pesquisas exploratrias, juntamente com as descritivas, so as mais utilizadas pelos
pesquisadores sociais preocupados com a atuao prtica. So tambm as mais solicitadas
por organizaes como instituies educacionais (GIL, 2009, p. 28).
Com foco mais amplo e aberto, a pesquisa exploratria objetiva aprofundar conceitos
preliminares, buscando a gerao de ideias ou insights. Este tipo de pesquisa constitui uma
estratgia para investigar fenmenos e processos complexos, ou pouco conhecidos, ou difceis
de ser sistematizados, ou ainda passveis de diferentes perspectivas interpretativas; como o
caso das relaes sociais estabelecidas por seres humanos que possuem uma historicidade,
crenas e valores (VASCONCELOS, 2002). J a pesquisa descritiva foca a compreenso do
fenmeno sob investigao, evidenciando as caractersticas de determinada populao por
meio da identificao de conceitos e constructos. Estas pesquisas objetivam levantar opinies,
atitudes e crenas dos indivduos (GIL, 2009).
Conforme j exposto, o tema cultura nas organizaes amplo, complexo e
profundo. Amplo na medida em que a cultura pode ser vista como uma varivel, capaz de ser
criada e controlada, ou como uma metfora da prpria organizao ou do contexto social em
que esto inseridas, com seus aspectos simblicos e ideolgicos. Complexo, pois a cultura
pode ser apreendida como nica e consensual, ou como vrias, ambguas e contraditrias,
provenientes de um processo histrico. E profundo, em razo da impossibilidade de
dominao da cultura; pode-se apenas realizar inferncias a fim de compreender melhor as
organizaes e seus indivduos (CARRIERI, 2002). Assim, a presente dissertao delineia-se
como uma investigao de natureza qualitativa-quantitativa.
Os estudos sobre cultura organizacional, em sua maioria, tm utilizado a metodologia
qualitativa, onde os pesquisadores a descrevem com base nas percepes dos indivduos. Para
Gonzlez Rey (2005, p. 105), a pesquisa qualitativa um processo aberto submetido a
infinitos e imprevisveis desdobramentos, cujo centro organizador o modelo que o
pesquisador desenvolve e em relao ao qual as diferentes informaes empricas adquirem
significados. Segundo Fleury (2009), nesta concepo a investigao pode assumir trs tipos
de postura:
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26
- A postura Empiricista, vista como a postura de um fotgrafo da realidade social, que
pesquisa a realidade sem um referencial terico, considerando-a como a somatria de
indivduos e a cultura como a somatria de comportamentos e opinies destes.
- A postura do Antroplogo, que adentra na vida organizacional e a investiga com base
em conceitos tericos previamente formulados, constantemente revistos e reformulados.
- A postura do Clnico ou Terapeuta, que investiga a organizao a partir de um
modelo terico prvio, o qual orienta a coleta, anlise e interpretao das informaes,
buscando resolver problemas apontados por ela mesma.
Por outro lado, os pesquisadores que abordam a pesquisa quantitativa defendem a
utilizao de tipologias classificatrias e quadros conceituais, afirmando que estas
proporcionam uma melhor compreenso da cultura organizacional, alm de levar menos
tempo para a coleta e interpretao de dados. Sustentam tambm, que existem elementos
culturais universais e, portanto, passveis de comparao entre as organizaes e/ou entre as
subculturas existentes. Nesta perspectiva, a adoo de tcnicas estatsticas confere um maior
grau de credibilidade, uma maior preciso e objetividade nos resultados (SILVA;
MEDEIROS; ENDERS, 2011).
Optou-se por combinar mtodos qualitativos e quantitativos, uma vez que as duas
abordagens apresentam possibilidades e limitaes especficas. A abordagem qualitativa
aproxima-se mais da subjetividade e complexidade caractersticas da cultura, por outro lado,
no permite comparaes e generalizaes. Ao passo que a abordagem quantitativa compensa
os aspectos que a qualitativa deixa a desejar, entretanto, falha na generalizao e
superficialidade de seus mtodos.
Essa disputa sobre qual mtodo deve ser utilizado nos estudos sobre cultura
organizacional, vai alm de uma falta de consenso em termos metodolgicos, reflete tambm
uma divergncia de paradigmas e metodologias. A abordagem quantitativa considera a
universalidade dos elementos culturais, permitindo comparaes entre culturas de diversas
organizaes. A abordagem qualitativa, por sua vez, entende que esses elementos da cultura
so singulares dentro do contexto cultural e, portanto, no possibilitam fazer generalizaes.
(LIMA, 2013).
Deste modo, ainda que sejam questionadas tentativas de compreender a cultura por
uma ou outra abordagem, com base nos objetivos estabelecidos, utilizou-se a tcnica de
-
27
triangulao8, a qual consiste na associao dos mtodos qualitativos e quantitativos, a fim de
compensar as deficincias de cada abordagem (SILVA; MEDEIROS; ENDERS, 2011). A
combinao dos mtodos permite uma descrio mais holstica9 da cultura, favorecendo sua
compreenso, vez que pode clarear algo que no poderia ser entendido com a utilizao de um
nico mtodo.
Tomando por base os objetivos, inicialmente, realizou-se uma pesquisa bibliogrfica,
buscando embasamento terico que subsidiasse a compreenso de ncleos ou eixos que
contribuem na formao da cultura organizacional e como eles interagem na constituio do
imaginrio.
Para a constituio do imaginrio derivamos do entendimento de que os indivduos ou
grupos definem seus ideais e os interiorizam. Antes de um grupo existir de fato, ele se
imaginou e vislumbrou o que poderia ser e fazer, ou seja, criou uma imagem desejvel de si.
O imaginrio justamente isso, a capacidade de um indivduo, grupo, organizao ou
sociedade dar significao aos seus desejos: como se v, o que pensa, o que deseja, aonde se
quer chegar? Desta conscincia o imaginrio o elemento fundador da sociedade, que
engendra a vida social e todas as representaes originadas a partir da, inclusive a cultura
organizacional (FREITAS, 1999). um conjunto de significaes constitudas e
compartilhadas pelos membros de uma organizao ou grupo social. As organizaes no
criam as estruturas psquicas dos indivduos, mas ajudam a moldar o imaginrio e dele podem
se utilizar como maneira de compreender os grupos e a forma como sua cultura construda,
o que eles definem como sendo os seus problemas e o meio de lidar com esses problemas, a
relao que estabelece com o mundo e o seu lugar nesse mundo.
valido ressaltar, que a reviso de literatura, nesse estudo, no buscou a definio de
categorias a priori para ajustar os dados a posteriori. Ao contrrio, os ncleos ou eixos de
sentido no so categorias com ttulo, mas mecanismos que permitem a construo de novas
zonas de sentido que tornam a situao estudada compreensvel para o leitor (PALASSI;
8 A triangulao a combinao de metodologias no estudo de um dado fenmeno. O termo uma metfora
advinda da navegao e da estratgia militar que localiza a posio de determinado objeto atravs de vrios
pontos de referncia. No estudo em questo utilizaremos a triangulao de teoria (que consiste na utilizao de
vrias perspectivas ao invs de uma nica) e a triangulao metodolgica (na qual utilizamos diferentes mtodos
e tcnicas para coletar e interpretar dados, como exemplo, a combinao de tcnicas qualitativas e quantitativas).
A triangulao baseia-se no argumento de que a fraqueza de um nico mtodo pode ser compensada pela fora
de outro (FLEURY; SHINYASHIKI; STEVANATO, 2009). 9
A cultura organizacional considerada holstica permite uma maior integrao, valorizao da intuio,
desenvolvimento pessoal e interao. A partir dessa viso as pessoas tm conscincia da sua importncia na
organizao, buscando resgatar valores, estabelecer o dilogo, questionar e refletir sobre as aes e decises
tomadas, fazendo surgir assim, a criatividade e um agradvel convvio entre si.
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28
PAULA, 2014, p. 173). Nenhuma tipologia especfica foi utilizada, e no houve inteno de
confirmar ou rejeitar as informaes obtidas a partir dos autores citados no referencial terico.
Tambm no se teve uma preocupao com a descoberta da verdade, mas sim em reunir peas
no contexto que componham um panorama o mais representativo possvel da realidade
estudada, na qual estamos inseridos.
Uma vez estabelecido o tema e os mtodos, a vez de nos aproximarmos para ver de
perto a realidade estudada. Nesse intento, utilizou-se trs formas para obteno dos dados:
pesquisa documental, pesquisa de opinio ou survey e entrevistas.
Com a pesquisa documental, buscou-se dentro dos documentos institucionais
Planejamento Estratgico, Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), Relatrios de
Gesto e Relatrios de Avaliao Institucional, informaes sobre a histria da UFT, os
diferentes momentos de gesto, suas metas, prioridades, polticas de desenvolvimento
humano, enfim, tudo que pde nos ajudar a caracterizar o contexto estudado.
Apesar da primordialidade em se realizar uma pesquisa que possibilitasse
compreender a lgica que rege o dia-a-dia da Universidade, dada a natureza do objeto
estudado, a complexidade da cultura, e o universo de aproximadamente 21 mil pessoas, entre
alunos, professores e tcnicos-administrativos, a pesquisa abrangeu apenas a Reitoria.
Exercida pelo Reitor, a Reitoria o rgo de poder executivo, de coordenao, de
fiscalizao e de superintendncia das atividades universitrias, e composta da seguinte
forma: 1) Gabinete do Reitor, 2) Gabinete do Vice-Reitor, 3) Pr-Reitorias (Graduao,
Pesquisa e Ps-Graduao; Extenso e Assuntos Comunitrios, Administrao e Finanas,
Avaliao e Planejamento, Assuntos Estudantis, Gesto e Desenvolvimento de Pessoas), 4)
Procuradoria Jurdica10
e 5) Prefeitura Universitria. Figuram tambm como rgos
diretamente vinculados ao Gabinete do Reitor, as Diretorias de Tecnologia da Informao
(DTI), de Comunicao (Dicom), de Assuntos Internacionais (DAI), de Tecnologias
Educacionais (DTE) e a Comisso Permanente de Seleo (Copese), todas alvo da pesquisa.
Participam deste estudo, portanto, dois tipos de populao. Uma, composta pelos
tcnicos- administrativos, lotados na Reitoria da UFT, localizada no Cmpus de Palmas, aos
quais aplicou-se um questionrio. A outra, constitui-se dos gestores da Reitoria que em
10
A Procuradoria Jurdica por ser um rgo consultivo, independente dentro da instituio, onde os procuradores
so lotados na Advocacia Geral da Unio (AGU), a quem respondem diretamente, no foi pesquisada.
-
29
alguns casos so tcnicos-administrativos, e em outros professores , com os quais foram
realizadas entrevistas.
A opo por utilizar o survey se deu, tendo em vista a possibilidade de levantar um
nmero maior de dados pela interrogao direta das pessoas envolvidas com o objeto cujo
comportamento se deseja conhecer do que seria possvel com o uso de outras tcnicas.
Conforme afirmao anterior, diferentes autores tm procurado desenvolver modelos
tericos destinados a explicitar os diferentes traos ou elementos atravs dos quais a cultura
organizacional pode se manifestar, entretanto, no foi encontrado instrumento que atendesse
aos objetivos em tela, razo pela qual nenhuma tipologia ou modelo em especfico foi
utilizado para a coleta e anlise dos dados. Na elaborao do questionrio, optou-se pela
adaptao de ferramentas j existentes, com a insero e eliminao de questes, ao invs da
concepo pela raiz. Foi considerado para este fim: a investigao de Maull et al. (2001, apud
SOUSA, 2011), que parte da abordagem de cultura organizacional de Hofstede et al. (1990,
apud SOUSA, 2011) que compreende as manifestaes culturais sob a forma de valores e
prticas (agregando a estas: smbolos, heris e rituais); a Escala de Valores Organizacionais,
elaborada por Tamayo e Gondim (1996); o Questionrio de Comprometimento
Organizacional (Organizational Commitment Questionnaire - OCQ), elaborado por Mowday,
Poter e Steers (1982, apud COSTA, 2005); o Inventrio de Cultura Organizacional
(Organizational Culture Inventory - OCI), proposto por Cooke e Lafferty (1989, apud
OLIVEIRA; GOMIDE JR., 2009) e adaptado e validado para o contexto brasileiro por
Oliveira e Gomide Jr. (2009), e o roteiro de entrevista desenvolvido por Rodrigues (2013) em
sua pesquisa sobre Cultura Organizacional e Mudanas na Gesto roteiro este que foi
utilizado tambm com os gestores da UFT.
Reunindo influncias dos modelos aqui mencionados, o questionrio (Apndice A)
com perguntas abertas e fechadas foi desenvolvido com base no referencial terico, sendo
composto por trs partes: a primeira parte com seis questes de identificao do perfil dos
respondentes; a segunda com 56 afirmativas de mltipla escolha, a respeito da percepo dos
tcnicos-administrativos em relao s questes culturais que permeiam a relao indivduo-
organizao na UFT, analisadas em uma escala Likert11
; e, por ltimo, duas questes abertas
11
A escala de Likert baseada em uma ordem numrica, onde se demonstra a concordncia ou discordncia em
relao s questes relacionadas ao objeto de estudo. A escala indica que quanto maior o resultado, maior ser a
intensidade de ocorrncia do valor ou prtica organizacional na organizao.
-
30
de preenchimento facultativo (no obrigatrio), que tambm fizeram parte do roteiro de
entrevista aplicada aos gestores.
Considerando que na Reitoria trabalham 271 tcnicos-administrativos, foi estimado
um quantitativo de, aproximadamente, 161 respondentes, com um nvel de confiana de 95%
e margem de erro de at 5% (BARBETTA, 2008). O link do formulrio eletrnico12
com o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE (Apndice C) e as perguntas foram
enviados para o e-mail institucional de todos os servidores tcnico-administrativos lotados na
Reitoria, e ficou disponvel para respostas durante o perodo de trs meses (25 de setembro
25 de dezembro de 2015), de modo que a amostra foi definida por acessibilidade e
convenincia. Para o cruzamento e anlise dos dados quantitativos utilizou-se da estatstica
descritiva a partir do processamento dos dados pelo software Statistical Package for Social
Science for Windows-SPSS.
Concomitantemente a aplicao dos questionrios, foram realizadas entrevistas com os
gestores para se ter ideia dos dois lados da moeda: a percepo da cultura pelos tcnicos e
gestores, cujo roteiro de entrevista (Apndice B) foi adaptado do estudo desenvolvido por
Rodrigues (2013). Ao discutir tcnicas para uma possvel investigao dos fenmenos
culturais em uma organizao, Schein (2009) atribui grande relevncia s entrevistas com os
gestores, por estes serem elementos-chave da organizao. Um informante-chave tem
conhecimento dos meandros da cultura, contudo pode levar o pesquisador a uma compreenso
errnea se as falas dessa pessoa forem consideradas em separado. Por isso, durante as
entrevistas procura-se ir alm do nvel mais evidente do universo simblico das organizaes,
buscando adentrar no domnio dos pressupostos inconscientes (SCHEIN, 2009).
importante ponderar que a pesquisa no buscou somente encontrar respostas para as
perguntas, mas tambm descobrir questes, surpreendentes sob alguns aspectos, mas
geralmente, mais pertinentes e adequadas do que aquelas que se colocava no incio
(DESLAURIERS; KRISIT, 2010, p. 148). Desta forma, foi necessrio flexibilidade na
seleo das questes e no comando das entrevistas, o que possibilitou a alterao ou
modificao na conduo destas, a partir das respostas apresentadas.
As entrevistas seguiram um modelo semi-estruturado e foram autorizadas, via TCLE
(Apndice D). Alm disso, foram preparadas, gravadas em forma de udio e transcritas pela
prpria pesquisadora.
12
Google Docs.
-
31
A anlise dos documentos, tanto das entrevistas como das questes abertas do
questionrio, teve como objetivo levantar os elementos que pudessem ser teis discusso
proposta no problema de pesquisa. Dentre o leque de possibilidades, foi utilizada a tcnica de
anlise de contedo, desenvolvida por Bardin (2011), que visa interpretao de
conhecimentos relativos ao objeto da pesquisa, por meio de procedimentos sistemticos e
objetivos. A construo da anlise seguiu os seguintes passos: pr-anlise; explorao do
material e tratamento dos resultados; inferncia e interpretao (BARDIN, 2011);
representados neste estudo pelas categorias descritas no captulo referente discusso e
anlise dos dados.
Sobre a tcnica, oportuno ressaltar que, apesar de ser um ponto polmico e causar
conflito entre qualitativistas e quantitativistas (CAMPOS, 2004), recorreu-se ao
agrupamento de temas frequentemente repetidos pela maioria dos respondentes e aos assuntos
que no se repetem, mas que tem valor e relevncia ao estudo.
Por fim, aps a interpretao dos resultados observados qualiquantitativamente, por
meio da triangulao entre o referencial terico, a anlise documental e a anlise dos dados
provenientes dos questionrios e entrevistas, a devoluo dos dados para a populao
pesquisada ocorrer atravs de um compilado dos elementos deste estudo de caso (Apndice
E), com informaes detalhadas, na forma de tabelas, que ilustram os principais tpicos
verificados, dos aspectos e percepes do que os tcnicos-administrativos compreendem da
cultura organizacional na UFT. Espera-se, que esse conjunto de dados (produto da
dissertao), possa ser aproveitado em uma eventual reaplicao desta pesquisa, servindo de
parmetro para comparar o desenvolvimento de cada Eixo analisado.
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3 A UNIVERSIDADE E A CULTURA ORGANIZACIONAL
Um primeiro olhar sobre este trabalho, poderia causar a ideia de que trata-se de
cultura, gesto pblica, organizaes, organizaes pblicas, instituies e universidades.
medida que se avana, percebe-se a inteno de levar adiante no apenas o objetivo puro e
simples de compreender a relao indivduo-organizao. H, por trs das propostas dos
estudos sobre cultura organizacional, uma finalidade mais abrangente, que envolve
transformao e aprimoramento das organizaes, por meio destas relaes, e, acima disto,
fazer com que as organizaes sirvam, de forma satisfatria, aos anseios da sociedade, o que
possvel pelo equilbrio entre objetivos individuais e organizacionais. Tal encadeamento faz
desta dissertao um trabalho sobre as organizaes pblicas, mais propriamente as
universidades, sob a perspectiva das manifestaes da cultura organizacional, num momento
em que, cada vez mais, os estudos organizacionais reconhecem a importncia do simblico na
dinmica das organizaes.
Apesar de, historicamente, as pesquisas sobre o tema cultura organizacional estarem
direcionadas mais para organizaes voltadas ao mercado, sua aplicao tambm
sustentvel em organizaes pblicas, o que viabiliza a proposta aqui apresentada. Como
veremos, porm, um estudo sobre cultura nas organizaes bastante amplo e seus conceitos
se confundem, se interseccionam por qualquer via que tomemos.
Os referenciais aqui apresentados foram trazidos com o intuito de possibilitar uma
reflexo interdisciplinar e mais dilatada sobre o fenmeno em estudo. Destacam-se autores
que apresentam discusses sobre cultura organizacional, num contexto geral, amplo e
especfico, sem ater-se somente aos autores de uma nica vertente, buscando referenciais
crticos sobre a temtica e suas diversas abordagens e aplicaes em contextos distintos.
Referenciais da rea da Administrao, Antropologia, Sociologia e Psicologia foram
abordados com o objetivo de apresentar melhor entendimento das nuances que permeiam o
termo cultura organizacional. Comecemos, pois, a falar das organizaes.
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3.1 Organizaes e Universidade
Em todos os tempos a humanidade tem se preocupado em organizar sua estrutura
social, poltica, econmica e cultural. Nesse af, o conhecimento13
foi (e ainda continua
sendo) o melhor meio de estruturar as sociedades, sempre divididas e conflitantes. Em vista
disso, com o intuito de disseminar o conhecimento e promover o desenvolvimento, sobretudo
aps a Revoluo Francesa, a universidade foi concebida como uma instituio social
(republicana, pblica e laica), comprometida com a vida da sociedade em que est inserida.
Essa relao ntima entre universidade e sociedade explica seu carter social, consolidado a
partir do reconhecimento pblico de sua legitimidade fundada na ideia da universidade, que
como um organismo vivo, elabora, desenvolve e transmite conhecimento para alm da
satisfao das necessidades urgentes, mas principalmente para conduzir a evoluo social em
todos os aspectos (CHAU, 2003; LIMA; CASTRO; CARVALHO, 2000; SILVA, 1999).
Em sua essncia, a universidade possui uma autonomia sobre a universalidade do
saber, que passa a ser sua atribuio a partir das revolues sociais desencadeadas no sculo
XX, pelas quais a educao torna-se direito dos cidados, desvencilhando-se da religio e do
Estado, com a democratizao do saber (CHAU, 2003).
No que concerne especificidade institucional da universidade, necessrio salientar
ainda, que suas estruturas caracterizadas por ordenamentos, regras, normas e valores de
reconhecimento e legitimidade associam-se, tanto natureza particular de suas atividades,
quanto ao seu carter social historicamente enraizado. Assim, a universidade pode ser descrita
como uma instituio diferenciada e definida por sua autonomia intelectual determinada pela
estrutura da sociedade e do Estado, e tal como estes, exprime pontos de vista, entendimentos e
posicionamentos muitas vezes conflitantes. Embora no tenhamos a pretenso de discutir, em
profundidade, a questo da autonomia, cabe ressaltar que esta relativa quando observada no
contexto ideolgico das articulaes polticas, econmicas e sociais, as quais se refletem nas
atividades acadmicas, cientficas e culturais, que dependem de financiamento
governamental. De fato, a universidade distingue-se por incorporar objetivos variados e
inclusive divergentes entre si, em momentos servindo manuteno do sistema poltico
13
Segundo Lima, Castro e Carvalho (2000, p. 2), o conhecimento aqui tido no somente como acumulao
linear ou circular de saberes emergentes, mas, tambm, como processo de construo de saberes que podem ser
postulados e flexibilizados de acordo com as modificaes que se fizerem necessrias a um determinado
momento histrico ou at mesmo ao momento histrico desejado, com vistas ao desenvolvimento social.
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34
dominante, e em outros servindo como fator de transformao social (GARCIA;
CARLOTTO, 2013; SILVA, 1999).
Ocorre que o ensino superior vem experimentando significativas mudanas em sua
morfologia e funcionamento, o que tm dificultado o acompanhamento das universidades por
todo o mundo. Fenmenos como a globalizao e os sucessivos avanos tecnolgicos tm
influenciado no s a educao, mas todas as reas da vida, a maneira de se fazer poltica, a
economia, a cultura, o relacionamento com o meio ambiente e o meio social.
De acordo com Bauman (2008), o conceito de globalizao vem substituir o conceito
de universalizao, a partir do momento em que percebeu-se que os vnculos e redes globais
no tinham os traos caractersticos do antigo conceito. O novo termo resultado da natureza
desordenada dos processos, das mudanas rpidas e constantes e da imprevisibilidade que
tomou conta do mundo.
Nesta tica, compreender a natureza das transformaes que incidem atualmente sobre
as universidades, bem como conhecer e entender sua dinmica interna, essencial para um
diagnstico aprofundado dos problemas que se apresentam e para levantar proposta de
solues plausveis, visando projetar uma redefinio de seu papel e funcionamento
institucional. Em outras palavras, de extrema relevncia discutir universidade e sociedade
como um todo, vez que os problemas da universidade vo alm da sua constituio e
desenvolvimento, pois englobam os movimentos e conflitos de um cenrio mais amplo que
envolve toda a Educao Superior e a sociedade.
Com a internacionalizao da Educao Superior, novas demandas socioeconmicas,
polticas e culturais surgem, trazendo consigo a chamada Sociedade do Conhecimento, que
acompanha a transformao do capital e da cincia14
(a partir dessa nova configurao
modifica-se o financiamento das pesquisas, que passam a se submeter s exigncias do
prprio capital), e a transformao da universidade em organizao ou em entidade
operacional (CHAU, 2003; MOROSINI; FERNANDES, 2011).
De uma forma clssica, Bernoux (s.d.) caracteriza as organizaes pelos seguintes
traos:
14
As mudanas geradas pelo modo de produo capitalista e pela tecnologia, a partir de 1940, transformaram a
cincia, que deixa de ser a investigao de um objeto alheio realidade do pesquisador (investigao terica com
aplicaes prticas) para se tornar uma fora produtiva (CHAU, 2003).
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35
- Diviso das tarefas: um princpio da organizao e pressupe que o grupo
estruturado e tem as suas atividades definidas e formalizadas (por escrito ou no);
- Distribuio dos papis: a cada membro da organizao so atribudas tarefas
definidas, ou seja, todo indivduo deve agir de acordo com sua funo. Numa analogia ao
teatro, cada ator tem seu papel, e consequentemente, cada interpretao singular, assim
como tambm no ambiente organizacional;
- Sistema de autoridade: tem a finalidade de zelar pela adequao do comportamento
dos indivduos aos objetivos organizacionais;
- Sistema de comunicaes: tem como objetivo contribuir com o relacionamento entre
os sujeitos. Permite aos membros do grupo contato rpido e a troca de informaes;
- Sistema de contribuio-retribuio: o que as pessoas devem dar e o que devem
receber. Estabelece-se na relao de trabalho uma troca, que nem sempre compreende
somente a vantagens pecnias.
Nesta lgica, o advento da Sociedade do Conhecimento expandiu o conceito de
universidade e sociedade, na medida em que um grande nmero de informaes passou a
circular com o intermdio das novas tecnologias, aproximando espao e tempo virtuais,
exigindo que as organizaes tornem-se flexveis, criem estratgicas e se adequem a
ambientes fluidos e instveis. Naturalmente, a continuidade de uma organizao depende no
apenas de sua estrutura interna, mas tambm de sua capacidade de adaptao ao ambiente
externo com suas mudanas contnuas e inesperadas. Segundo Chau:
Ao se tornarem foras produtivas, o conhecimento e a informao passaram a
compor o prprio capital, que passa a depender disso para sua acumulao e
reproduo. Na medida em que, na forma atual do capitalismo, a hegemonia
econmica pertence ao capital financeiro e no ao capital produtivo, a informao
prevalece sobre o prprio conhecimento, uma vez que o capital financeiro opera com
riquezas puramente virtuais, cuja existncia se reduz prpria informao (CHAU,
2003, p. 8).
Sob o status de organizao (regida por contratos de gesto e com sistemas contnuos
de planejamento e avaliao de produtividade), a universidade deixa a formao intelectual e
a pesquisa15
e rende-se a estratgias competitivas, o que faz "as fronteiras entre a universidade
15
A universidade se relaciona com a sociedade e o setor produtivo buscando a soluo de seus problemas. Essa
relao uma viso da universidade-empresa, que se aproxima da ideia de fbrica de conhecimentos em
detrimento da imagem universitria de formadora de seres humanos. Da ento, a heteronomia da universidade
autnoma (quando a universidade busca produzir conhecimentos com o intuito de aumentar as informaes para
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e o setor produtivo se fluidificarem na gerao da fbrica do conhecimento" (VELHO, 1999
apud PEREIRA, 2009, p. 48). Estruturada por normas e planos de eficcia organizacional
torna-se indiferente ao conhecimento e formao, ocupando-se de abastecer a um mercado
de trabalho vido por profissionais, que por sua vez, logo se tornam descartveis, caso no se
reciclem ao longo da vida. No que se refere pesquisa, a universidade passa a ser uma
fbrica de conhecimentos destinados apropriao privada.
Nesta perspectiva, em que a lgica utilitarista da universidade tende a reduzir a
construo do conhecimento mera produo de conhecimento mercadolgico baseado nas
questes econmico-financeiras, Dias Sobrinho (2005, p. 122) analisa:
No passado, a universidade foi pensada por intelectuais do peso dos Humboldt,
Kant, Fichte, Karl Jasper, Heidegger, s para citar alguns alemes. Hoje, quem diz
para os pases subdesenvolvidos e em desenvolvimento o que deve ser uma
universidade so os economistas e funcionrios do Banco Mundial, do BID, do FMI,
da OCDE, da COM e, nos mbitos nacionais, tcnicos dos Ministrios da Fazenda e
do Planejamento.
A partir de ento, em meio ao que alguns autores chamam de crise, o sentido de
universidade se alterou no mundo todo. De fato, firmado num novo modelo poltico-
econmico global, orientado pelos princpios neoliberais empregados por grande nmero de
pases do mundo ocidental, inclusive o Brasil, o Estado acaba investindo cada vez menos nos
servios pblicos de educao, transferindo para os setores privados, suas responsabilidades.
De um modo geral, h uma progressiva dissociao entre Estado e universidade: a educao
deixa de ser concebida como um direito passando a ser considerada um servio que pode tanto
ser privado como privatizado (CHAU, 2003; LIMA; CASTRO; CARVALHO, 2011).
Este cenrio que vivenciamos indica que todas as formas institucionalizadas da
atividade humana incluindo as universidades so melhor entendidas e administradas
quando concebidas como organizaes (GARCIA; CARLOTTO, 2013). E como uma
sociedade organizacional, multiconectada em redes, se reinventando a cada dia na era da
informao, as universidades necessitam de uma reorientao, pois, ainda que haja uma clara
suprir as necessidades do mercado) e a progressiva irrelevncia de suas atividades (quando suas pesquisas so
determinadas pelas exigncias de mercado, normalmente impostas pelos financiadores). Nesta perspectiva, a
universidade abstm-se de sua caracterstica principal, a formao, e se utiliza de estratgias como aumento de
horas/aula, avaliao de docentes pela quantidade de publicaes, diminuio do prazo para mestrados e
doutorados e mais outra infinidade de relatrios e avaliaes, visando a otimizao na gerao de conhecimento.
Por sua vez, as pesquisa passa a ser uma ttica de interveno e controle de instrumentos capaz de transpor
obstculos para o alcance de determinado objetivo.
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distino entre organizao e instituio16
, e que usualmente alguns estudiosos no vejam com
bons olhos o discurso da universidade como organizao, a crise do sistema de natureza
estrutural e exige reformas profundas, devendo a universidade, portanto, evoluir para a forma
da organizao moderna, que promove eficincia tcnica e social da instituio, superando a
forma da comunidade corporativa e ineficiente que se autogoverna visando atingir objetivos
autodefinidos (GARCIA; CARLOTTO, 2013, p. 660).
Fundamentado a partir de uma perspectiva crtica dessa teoria organizacional, o
conceito de organizao moderna, aplicado s universidades, amplia a viso e compreenso
destas, para alm de questes institucionais operacionais e abstratas. Para Garcia e Carlotto
(2013), tal conceito pode ser definido por quatro caractersticas bsicas. A primeira que ele
refere-se independncia relativa dos elementos, isto , uma mudana engendra outras, que
emergem como consequncias naturais das decises tomadas anteriormente. Neste sentido,
caractersticas histricas apontam problemas para os quais as mudanas organizacionais so a
soluo. A segunda caracterstica da organizao moderna baseia-se no fortalecimento das
fronteiras institucionais que ampliam o controle das relaes entre universidade e ambiente
externo. Esse formato possibilita a criao de uma identidade institucional. O terceiro
componente organizacional a responsabilidade institucional. Neste caso, as universidades
devem definir uma misso clara inclusive misso social e desenvolver estruturas formais,
com tcnicas e procedimentos para alcan-la. A quarta caracterstica organizacional a ideia
de gesto centralizada e hierarquizada com o controle das decises e das aes dos indivduos
na organizao.
possvel afirmar, segundo os autores (GARCIA; CARLOTTO, 2013), que as
mudanas que perpassam a universidade s podem ser entendidas ao analisarmos seus
diferentes contextos (interno e externo) e dimenses (histrica e cultural). Isto expressa
claramente que as organizaes so um fenmeno bem mais complexo que uma mera
associao formal e hierrquica de pessoas, que, de modo estruturado, trabalham
cooperativamente para o cumprimento de determinados fins (FRIEDBERG, 1995; SROUR,
1998).
16
Embora saibamos que o termo organizao difere de instituio, visto que o ltimo ultrapassa o carter
instrumental e operacional conferido s organizaes, conseguindo articular interesses internos e externos, em
uma filosofia organizacional que tem como seus princpios e valores a sociedade, para fins de conceituao neste
trabalho, compreendemos organizaes e instituies como sinnimos, enquanto coletividades sociais
formalmente institudas, pblicas ou privadas, determinadas a cumprir objetivos legitimados, e com obrigao de
prestar contas sociedade.
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Morgan (2010), diante da diversidade e complexidade com que as organizaes so
definidas e estudadas, relaciona algumas metforas17
que possibilitam a anlise dos
fenmenos organizacionais, a saber:
- Mecanicismo: organizaes percebidas como mquinas adotam formas burocrticas
visando a um processo racional e tcnico, exigindo um rgido padro de comportamento e
interao entre as pessoas.
- Organicidade: organizaes vistas como uma rede de relacionamentos entre
indivduos, grupos e ambiente. Sofre grande influncia da teoria da motivao, a fim de
integrar as necessidades individuais e organizacionais.
- Ciberntica: organizaes vistas como crebro, caracterizam-se pela flexibilidade,
criatividade e inteligncia.
- Cultura: organizaes consideradas realidades socialmente construdas, baseadas em
valores, ideias, ritos, normas e crenas.
- Sistema poltico: organizaes baseadas nos princpios de poder e autoridade e nas
relaes superior-subordinado.
- Priso Psquica: organizaes que tendem a aprisionar as pessoas numa teia psquica
dos seus prprios pensamentos, crenas ou preocupaes que surgem no inconsciente
humano.
- Fluxo e transformao: organizaes que se consideram parte de um macroambiente
e por isso mudam e evoluem com este.
- Instrumento de dominao: organizaes que exploram; certas pessoas criam
instrumentos de dominao sobre outras.
De acordo com o autor, toda organizao encontra-se incorporada em um espao
cultural e social; toda organizao ao processar matria-prima e proporcionar sociedade
produtos e servios correspondentes sua funo social, est constantemente sujeita a
transformaes do ambiente no qual esto inseridas, e deve, portanto ser examinada enquanto
parte de um todo, com faces e implicaes econmicas, polticas, cu