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  • 8/19/2019 Georges Didi

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    Georges Didi-Huberman | Diante do tempo

    Tradução: Alberto Pucheu

    DIANTE - DO - TEMPO 

    história da arte e anacronismo das imagens [1]

    Diante da imagem, estamos sempre diante do tempo. Como o pobre iletrado da

    narrativa de Kafka, estamos diante da imagem como  Diante da Lei: como diante do vão de uma

     porta aberta. Ela não nos esconde nada, bastaria entrar nela, sua luz quase nos cega, ela nos

    impõe respeito. Sua própria abertura –  não falo do guardião –  nos faz parar: olhá-la é desejar, é

    estar à espera, é estar diante do tempo. Mas de que gênero de tempo? Que plasticidades e que

    fraturas, que ritmos e que choques do tempo podem estar em questão nesta abertura da imagem?Repousemos, por um instante, nosso olhar neste painel de pintura [2] renascentista (fig.

    1). É um afresco do convento de São Marco, em Florença. Muito provavelmente, ele foi pintado

    nos anos 1440 por um frei dominicano que habitava o local e, mais tarde, foi apelidado de Beato

    Angélico. No corredor oriental da clausura, ele se encontra à altura do olhar. Logo acima dele

    está pintada uma Santa Conversação. Como nas celas, todo o resto do corredor se mostra

     branco de cal. Nesta dupla diferença –  a cena figurada em cima, o fundo branco todo em volta – ,

    o painel de afresco vermelho, crivado de manchas erráticas, produz como uma deflagração: um

    fogo de artifício colorido que ainda traz o traço de seu jorrar originário (em um naco de instante,

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    o pigmento foi projetado à distância, em chuva) e que, a partir de então, se perpetuou como uma

    constelação de estrelas fixas.

    Diante desta imagem, em um relance, nosso presente pode se ver tragado e,

    simultaneamente, trazido à luz na experiência do olhar. Mesmo que –  para o que me concerne –  

    mais de quinze anos tenham se passado[3] desde esta experiência singular, meu “presente

    reminiscente” parece não ter terminado de tirar dela todas as lições. Diante de uma imagem –  

    não importa quão antiga  – , o presente não cessa jamais de se reconfigurar, mesmo que o

    desapossamento do olhar tenha completamente cedido lugar ao hábito enfadado do

    “especialista”. Diante de uma imagem –  não importa quão recente, quão contemporânea ela seja

     – , o passado também não cessa jamais de se reconfigurar, pois esta imagem não se torna

     pensável senão em uma construção da memória, chegando ao ponto de uma obsessão. Diante de

    uma imagem, temos, enfim, de reconhecer humildemente: provavelmente, ela sobreviverá a nós,

    diante dela, nós somos o elemento frágil, o elemento passageiro, e, diante de nós, ela é o

    elemento do futuro, o elemento da duração. Freqüentemente, a imagem tem mais memória e

    mais porvir do que o ente que a olha.

    Como, entretanto, nos mantermos à altura de todos os tempos que, diante de nós, esta

    imagem conjuga sobre tantos planos? E, antes de tudo, como dar conta do presente desta

    experiência, da memória que ela convocava, do porvir a que ela se engajava? Parar diante do

     painel de Fra Angelico, submeter-se a seu mistério figural, já consistia em, modesta e

     paradoxalmente, entrar no saber que tem o nome de história da arte. Entrada modesta, porque a

    grande pintura da Renascença florentina era abordada justamente por suas bordas: suas parerga,

    suas zonas marginais, os registros bem –  ou bem mal –  ditos “inferiores” dos ciclos de afrescos,

    os registros do “adorno”, dos simples “falsos mármores”. Entrada paradoxal, entretanto, e para

    mim decisiva, porque se trata de compreender a necessidade intrínseca, a necessidade figurativa

    ou, antes, figural , de uma zona da pintura facilmente apreensível sob a classificação de arte

    “abstrata”[4]. 

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     No mesmo movimento –  na mesma perplexidade – , tratava-se de compreender porque,

    em Fra Angelico (mas também em Giotto, Simone Martini, Pietro Lorenzetti, Lorenzo Monaco,

    Piero della Francesca, Andrea Del Castagno, Mantegna e tantos outros), toda esta atividade

     pictural intimamente misturada à iconografia religiosa, todo este mundo de imagens

     perfeitamente visíveis, não fora, até então, nem vista nem interpretada e nem mesmo entrevista

    na imensa literatura científica consagrada à pintura renascentista[5]. Aqui, fatalmente, surgiu a

    questão epistemológica: o estudo de caso  –  uma singularidade pictural que, um dia, suspendeu

    meus passos no corredor de São Marco  –   colocou uma exigência mais geral quanto à, como

    disse Michel Foucault, “arqueologia” do saber sobre a arte e sobre as imagens.

    Positivamente, esta exigência poderia ser formulada da seguinte maneira: em que

    condições um objeto –  ou um questionamento –  histórico novo pode emergir tão tardiamente em

    um contexto tão conhecido, tão bem “documentado”, como se diz, quanto o da Renascença

    florentina? Com razão, poder-se-ia também exprimir a referida exigência de modo mais

    negativo: o que é que, na história da arte como disciplina, como “ordem do discurso”, pôde

    manter tal condição de cegueira, tal “vontade de não ver” e de não saber? Quais são as razões

    epistemológicas de tal denegação –  a denegação que, na Santa Conversação, consiste em saber

    identificar o menor atributo iconográfico e, ao mesmo tempo, não prestar a mínima atenção ao

    espantoso fogo de artifício colorido que se estende logo abaixo dela em três metros de largura e

    um metro e cinqüenta de altura?

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    Saídas de um caso singular (mas possuindo, espero, algum valor exemplar), estas questões

    muito simples comprometem a história da arte em seu método, em seu próprio estatuto  –   seu

    estatuto “científico”, como se gosta de dizer – , em sua história. Deter-se diante do painel de Fra

    Angelico é, em primeiro lugar, tentar dar uma dignidade histórica, ou seja, uma sutileza

    intelectual e estética, a objetos visuais considerados até então inexistentes ou, pelo menos,

     privados de sentido. Torna-se rapidamente evidente que, para se aproximar um pouco mais do

     painel, necessitava-se empregar outras vias que as magistral e canonicamente fixadas por ErwinPanofsky sob o nome de “iconologia”[6]: difícil, aqui, inferir uma “significação convencional” a

     partir de um “tema natural”; difícil encontrar um “motivo” ou uma “alegoria”, no sentido

    habitual destes termos; difícil identificar um “assunto” bem claro ou um “tema” bem distinto;

    difícil exibir uma “origem” escrita que pudesse servir de interpretação verificável. Não há

    nenhuma “chave” a tirar dos arquivos ou da  Kunstliteratur , como o mágico-iconólogo soube

    tirar tão bem de seu chapéu a única chave “simbólica” de uma imagem figurativa. 

    Será preciso então deslocar e complexar as coisas, requestionar o que “tema”,

    “significação”, “alegoria” e “origem” podem, no fundo, querer dizer para um historiador da arte.Será necessário mergulhar de novo na semiologia não iconológica  –  no sentido humanista de

    Cesare Ripa[7] –  que, nos muros do convento de São Marco, constituía o universo teológico,

    exegético e litúrgico dos dominicanos. E, consequentemente, fazer surgir a exigência de uma

    semiologia não iconológica  –   no sentido “científico” e atual, saído de Panofsky – , de uma

    semiologia que não fosse positivista (a representação como espelho das coisas) nem

    estruturalista (a representação como um sistema de signos). Diante do painel , é a própria

    representação que teria de ser questionada. Com o comprometimento de se engajar em um

    debate de ordem epistemológica sobre os meios e os fins da história da arte como disciplina.

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    Tentar, em suma, uma arqueologia crítica da história da arte  própria a destituir o

     postulado panofskiano da “história da arte como disciplina humanista”[8].  Para isso, seria

     preciso colocar em questão todo um conjunto de certezas quanto ao objeto “arte” –  o objeto

    mesmo de nossa disciplina histórica  – , certezas que têm por pano de fundo uma longa tradição

    teórica que vai, particularmente, de Vasari a Kant e além dele (especialmente, até o próprio

    Panofsky)[9]. Deter-se diante do painel  não é apenas interrogar o objeto de nossos olhares. É

    também se deter diante do tempo. É, então, na história da arte, interrogar o objeto “história”, a

     própria historicidade. Tal é a aposta do presente trabalho: estimular uma arqueologia crítica dos

    modelos do tempo, dos valores de uso do tempo na disciplina histórica que desejou fazer das

    imagens seus objetos de estudo. Questão tão vital, concreta e quotidiana  –   cada gesto, cada

    decisão do historiador, desde a mais humilde classificação de suas fichas até suas mais altas

    ambições sintéticas não revelam, a cada vez, uma escolha de tempo, um ato de temporalização?

     –  que é difícil de ser clarificada. Muito rapidamente, mostra-se, aqui, que nada permanece por

    muito tempo na serena luz das evidências.

    Partamos justamente disso que, para o historiador, parece constituir a evidência das

    evidências: a recusa do anacronismo. A regra de ouro : sobretudo, não “projetar”, como se diz,

    nossas próprias realidades  –   nossos conceitos, nossos gostos, nossos valores  –   sobre as

    realidades do passado, objetos de nossa pesquisa histórica. Não é evidente que a “chave” para

    compreender um objeto do passado se encontra no próprio passado e, ainda mais, no mesmo

     passado que o passado do objeto? Regra de bom-senso: para compreender os painéis coloridos

    de Fra Angelico, será então preciso procurar uma fonte de época capaz de nos dar acesso ao

    “instrumento mental” –   técnico, estético, religioso etc.  –   que tornou possível esse tipo de

    escolha pictural. Nomeemos essa atitude canônica do historiador: não é nada diferente de uma

     busca de concordância do tempo, de uma busca da consonância eucrônica.

    Tratando-se de Fra Angélico, possuímos uma “interpretação eucrônica” de primeira

    ordem: em 1481, o julgamento pronunciado acerca do pintor pelo humanista Cristoforo

    Landino. Michael Baxandall apresentou esse julgamento como o tipo de uma fonte de épocacapaz de, a partir das “categorias visuais” próprias ao seu tempo –   ou seja, “historicamente

     pertinentes”[10] – , nos fazer compreender uma atividade pictural mais próxima de sua realidade

    intrínseca. Eis a evidência eucrônica: chega-se a exibir uma fonte específica (o julgamento de

    Landino, de fato, não é geral, mas nominal) e, graças a ela, interpreta-se o passado com as

    categorias do passado. Não é o ideal do historiador?

    O que é, entretanto, o ideal senão o resultado de um processo de idealização? O que é o

    ideal senão a edulcoração, a simplificação, a síntese abstrata, a denegação da carne das coisas?

    O texto de Landino é, sem dúvida, “historicamente pertinente”, no sentido em que, como oafresco de Fra Angelico, ele pertence à civilização italiana do Renascimento: a esse título, ele

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    testemunha a recepção humanista de uma pintura produzida sob o mecenato de Cosme de

    Médici. É ele, contudo, “historicamente pertinente” no sentido em que permitiria compreender a

    necessidade pictural –  mas também intelectual e religiosa –  dos painéis coloridos de São Marco?

    De maneira alguma. Comparado à produção de Fra Angelico, o julgamento de Landino nos leva

    a imaginar que ele jamais colocou os pés na clausura  do convento florentino  –  o que é muito

     provável  –  ou que ele olhou esta pintura sem vê-la, sem compreender muita coisa dela. Cada

    uma de suas “categorias” –  o bem-estar, a alegria, a devoção ingênua  –  está nos antípodas da

    complexidade, da gravidade e da sutileza operadas na pintura altamente exegética do frei

    dominicano[11]. 

    Estamos, então, diante do painel  como diante de uma questão nova colocada ao

    historiador: se a fonte “ideal” –  específica, eucrônica –  não é capaz de dizer o que quer que seja

    sobre o objeto da pesquisa, não nos oferecendo senão uma fonte sobre sua recepção, e não sobre

    sua estrutura, a que santos, desde esse momento, a que intérpretes, precisamos nos devotar.

    Quanto à dignidade abusivamente concedida ao texto de Landino, uma primeira coisa a se

    considerar: ela é declarada pertinente porque “contemporânea” da pintura (falo aqui

    de eucronia para sublinhar o valor de coerência ideal, de  Zeitgeist , emprestada a tal

    contemporaneidade). É, entretanto, de maneira verdadeira? Ou antes: segundo que escala,

    segundo que ordem de grandeza, ela pode ser considerada como tal? Landino escreveu trinta

    anos depois da morte do pintor  –   nesse lapso de tempo, muitas coisas se transformaram na

    esfera estética, religiosa e humanista. Landino era versado no latim clássico (com suas

    categorias e retórica próprias), mas também era um defensor ardente da língua vulgar[12]; Fra

    Angelico era versado exclusivamente no latim medieval, com suas distinções escolásticas e

    hierarquias sem fim, de suas leituras de noviciado: apenas isso poderia bastar para suspeitar,

    entre o pintor e o humanista, a cisão de um verdadeiroanacronismo.

    Vamos mais longe: não apenas Landino foi anacrônico em relação a Fra Angélico no

    desvio do tempo e da cultura que, evidentemente, os separava, mas, ainda, o próprio Fra

    Angélico parece ter sido anacrônico em relação a seus contemporâneos mais imediatos, se

    consideramos como tal Léon Battista Alberti, por exemplo, que teorizava sobre a pintura nomesmo momento e a algumas centenas de metros do corredor onde as superfícies vermelhas se

    cobriam de respingos brancos projetados à distância. Mesmo eucrônico, o De pictura não

    consegue dar conta da necessidade pictural operada nos afrescos de São Marco[13]. Tiramos de

    tudo isso a impressão que, frequentemente, os contemporâneos não se compreendem melhor

    que os indivíduos separados no tempo: o anacronismo atravessa todas as contemporaneidades.

    A concordância dos tempos –  praticamente –  não existe.

     Fatalidade do anacronismo? Eis que se pode separar os dois contemporâneos perfeitos

    que foram Alberti e Fra Angélico porque eles não pensaram “no mesmo tempo”. Essa situaçãonão pode ser qualificada de “fatal” –  negativa, destrutiva  –  senão ao olhar de uma concepção

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    ideal, portanto, empobrecida, da própria história. Melhor reconhecer a necessidade do

    anacronismo como uma riqueza: ela parece interna aos próprios objetos –  as imagens –  com os

    quais tentamos fazer a história. Em uma primeira aproximação, o anacronismo seria assim a

    maneira temporal de exprimir a exuberância, a complexidade e a sobredeterminação das

    imagens.

     No único exemplo do painel salpicado de Fra Angélico, pelo menos três tempos  –  três

    tempos heterogêneos e, portanto, anacrônicos uns dos outros  –   se entrelaçam de modo

    admirável. Em sua evidência, o enquadramento em trompe l’oeil  realça um mimetismo

    “moderno” e uma noção da  prospectiva que, grosso modo, podem ser qualificados de albertiana:

    “eucrônico”, então, a este XVo século florentino da primeira Renascença. Mas, por outro lado, a

    função memorativa da cor supõe uma noção da figura que o pintor tirou dos escritos

    dominicanos dos séculos XIII e XIV: artes da memória, “somas de similitudes” ou exegeses da

    Escritura bíblica (nesse sentido, pôde-se qualificar Fra Angelico de pintor “caído em desuso”,

    adjetivo que, na língua corrente, é dado como um equivalente de “anacrônico”). Enfim,

    a dissimilitudo, a dessemelhança, em obra neste painel de pintura remonta a um tempo ainda

    anterior: ela constitui a interpretação específica tanto de toda uma tradição textual

    cuidadosamente reunida na biblioteca de São Marco (Denys o Areopagita comentado por

    Alberto o Grande ou São Tomás de Aquino) quanto de uma antiga tradição figural chegada à

    Itália desde Bizâncio (uso litúrgico de pedras semipreciosas multicores) via a arte gótica e o

     próprio Giotto (falsos mármores da capela Scrovegni)... Tudo isso consagrado a outro paradoxo

    do tempo: a saber, a repetição litúrgica  –   propagação e difração temporais  –   do momento

    originário e capital de toda essa economia, o momento mítico da Encarnação[14]. 

    Eis-nos aqui bem diante do painel  como diante de um objeto de tempo complexo, de

    tempo impuro: uma extraordinária montagem de tempos heterogêneos formando anacronismos.

     Na dinâmica e na complexidade dessa montagem, noções históricas tão fundamentais quanto as

    de “estilo” ou de “época” se verificam, subitamente, de uma perigosa plasticidade (perigosa

    apenas para quem gostaria que toda coisa estivesse, de uma vez por todas, em seu lugar na

    mesma época: figura, bastante comum, daquele que eu nomearei de “o historiador fóbico dotempo”). Colocar a questão do anacronismo é interrogar, então, essa plasticidade fundamental e, 

    com ela, a mistura, tão difícil de analisar, de diferenciais de tempo operando em cada imagem.

    A história social da arte, que há alguns anos domina toda a disciplina, freqüentemente

    abusa da noção estática  –  semiótica e temporalmente rígida  –  de “instrumento mental”, que, a

     propósito de Fran Angelico e Landino, Baxandall nomeou de um “equipamento” (equipment )

    cultural ou cognitivo[15].  Como se bastasse a cada um tirar palavras, representações ou

    conceitos já formados e prontos para o uso de uma caixa de ferramentas. Isso é esquecer que, da

    caixa à mão que as utiliza, as ferramentas estão elas mesmas em formação, ou seja, aparecemmenos como entidades do que como formas plásticas em perpétua transformação. Imaginemos,

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    antes, ferramentas maleáveis, ferramentas de cera dúctil tomando, em cada mão e contra cada

    material a ser trabalhado, uma forma, uma significação e um valor de uso diferentes. Fra

    Angélico talvez tenha tirado de sua caixa de ferramentas mental a distinção contemporânea de

    quatro tipos de sermões religiosos  –   subtilis, facilis, curiosus, devotus  –   que, utilmente, nos

    lembram Baxandall[16].  Dizer isso, entretanto, não é fazer senão um pequeno começo do

    trajeto.

    O historiador da arte deve compreender, sobretudo, em quê e como o trabalho pictural

    de Fra Angelico terá consistido precisamente em subverter tal distinção e, portanto, em

    transformar, reinventar, tal instrumento mental. Como um quadro religioso terá podido se

    apresentar pelo modo facilis, fácil de ver do ponto de vista da iconografia, mas, ao mesmo

    tempo, pelo modo subtilis, que opera o ponto de vista bem mais complexo da exegese bíblica e

    da teologia encarnacional[17]. Diante de nosso painel de pintura, o modo facilis consistiria em

    ver apenas um registro suntuário, desprovido de sentido “simbólico”: uma simples moldura

    ornamental, um painel de falso mármore em trompe l’oeil  servindo de base a uma Santa

    Conversação. O modo subtilis emerge sobre muitos planos possíveis, conforme o que requer

    atenção na indicação litúrgica proposta aqui pelo pintor (o painel de falso mármore está para

    aSanta Conversação exatamente o como um altar está para um retábulo), ou então em suas

    associações devocionais (as manchas brancas constelam a parede do corredor como o fazem,

    diz-se, as gotas de leite da Virgem sobre a parede da gruta da Natividade); ou então às alusões

    alegóricas fazendo, do mármore multicor, uma figura Christi; ou, ainda, às implicações

     performativas da projeção à distância de um pigmento (estritamente falando, ato técnico

    definível como unção); ou, enfim, às numerosas referências místicas que associam o ato de

    contemplação à frontalidade “abstrata” das superfícies multicores (o mármore manchado

    comomaterialis manuductio da visio Dei, segundo João Escoto Erígena, o abade Suger ou o

    dominicano Giovanni di San Gimignano)[18]. 

    A imagem é altamente sobredeterminada: pode-se dizer que ela se desloca por muitos

    quadros ao mesmo tempo. O leque de possibilidades simbólicas que acabo de esboçar a

     propósito apenas deste painel de afresco italiano não ganha seu sentido –  e não pode receber uminício de verificação –  senão ao olhar do leque aberto de sentidos em geral tal como a exegese

    medieval forjou suas condições, práticas e teóricas, de possibilidades[19]. É em tal campo de

     possibilidades que, sem dúvida, é preciso compreender o aspecto de montagem de

    diferenças que caracteriza esta simples –  mas paradoxal –  imagem. Com essa montagem, é todo

    o leque do tempoque se abre também em grande escala. A dinâmica temporal dessa montagem

    deveria, então, logicamente, realçar um paradigma teórico e uma tecnicidade própria: o que, na

    longa duração da Idade Média, oferecem as “artes da memória”[20]. 

    Ao olhar do tempo, a imagem é, portanto, altamente sobredeterminada. Isso implicareconhecer o princípio funcional dessa sobredeterminação em certa dinâmica da memória.

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    Muito antes que a arte fosse uma história –  diz-se que isso começou ou recomeçou com Vasari – 

    , as imagens possuíram, conduziram e produziram a memória. Ou a memória, também ela, se

    espalha sobre todos os quadros do tempo. É a ela e à sua “arte” medieval que se deve a

    montagem dos tempos heterogêneos para que, sobre nosso painel de pintura, um pensamento

    místico do século V –  o de pseudo-Denys o Areopagita a propósito dos mármores manchados – ,

    dez séculos mais tarde, possa se encontrar lá, sobrevivente e transformado, encravado em uma

     perspectiva toda “moderna” e albertiniana. 

    Soberania do anacronismo: em alguns pedaços do presente, um artista da Renascença  –  

    que acabou de projetar pigmento branco sobre uma camada de afresco vermelho rodeada de sua

     borda em trompe-l’oeil   –  concretizou, para o futuro, essa verdadeira constelação, feita imagem,

    de tempos heterogêneos. Soberania do anacronismo: o historiador que, hoje, se remetesse

    apenas ao passado exclusivamente “eucrônico” –  apenas ao Zeitgeist  de Fra Angelico –  perderia

    completamente o sentido de seu gesto pictural. O anacronismo é necessário, o anacronismo é

    fecundo quando o passado se revela insuficiente, quando constitui um obstáculo à compreensão

    do passado. O que Alberti ou Landino não nos permitem compreender no painel de Fra

    Angelico as múltiplas combinações de pensamentos separados no tempo  –  Alberto o Grande

    com o pseudo-Denys, Tomás de Aquino com Gregório o Grande, Jacques de Voragine com

    Santo Agostinho  –   nos permitem amplamente. Sonhemos que, nesse lugar anacrônico por

    excelência que foi a biblioteca do convento de São Marco, o artista dominicano os tivesse

    continuamente à disposição: pensamentos de todos os tempos  –  pelo menos, dezenove séculos,

    de Platão a Santo Antônio –  reunidos sobre as mesmas prateleiras[21]. 

    Em casos semelhantes, não se pode contentar com fazer história de uma arte sob o

    ângulo “eucrônico”, ou seja, sob o ângulo conhecido como o do “artista e seu tempo”. O que tal

    visualidade exige é que seja encarada sob o ângulo de sua memória, ou seja, de suas

    manipulações do tempo, através da qual nós descobrimos antes um artista anacrônico, um

    “artista contra seu tempo”. Devemos também considerar Fra Angélico como um artista

    do passado histórico (um artista de seu tempo, que foi o Quatrocento), mas igualmente como um

    artista do mais-do-que-passado memorativo (um artista manipulando tempos que não eramseus). Essa situação gera um paradoxo suplementar: se o passado eucrônico (Landino) acortina

    ou obstaculiza o mais-do-que-passado anacrônico (Denys O Areopagita), como fazer para rasgar

    a cortina, para ultrapassar o obstáculo?

    Ousarei dizer que é preciso uma estranheza a mais, na qual se confirma a

     paradoxal fecundidade do anacronismo. Para acessar aos múltiplos tempos estratificados, às

    sobrevivências, às longas durações do mais-do-que-passado mnemônico, é necessário o mais-

    do-que-presente de um ato reminiscente: um choque, um rasgo do véu, uma irrupção ou

    aparição do tempo, tudo isso de que Proust e Benjamin falaram tão bem sob a designação da“memória involuntária”. Diante do painel salpicado do século XV, o que Landino e todos os

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    historiadores da arte foram incapazes de ver e de dar a ver Jackson Pollock  –  eis o anacronismo

     –  se mostrou altamente capaz de tal ação. Se ensaio hoje rememorar o que suspendeu meu passo

    no corredor de São Marco, creio não me enganar dizendo que foi uma espécie de semelhança

    deslocada entre o que eu descobria lá, em um convento da Renascença, e os drippings do artista

    americano admirado e descoberto muitos anos antes[22]. 

    É certo que tal semelhança resultou do domínio do que se chama de um

     pseudomorfismo: as relações de analogia entre o painel manchado de Fra Angélico e um quadro

    de Jackson Pollock não resistem por muito tempo à análise (desde a questão da horizontalidade

    até a das apostas simbólicas). De maneira alguma Fra Angélico é o ancestral da action painting ,

    e seria completamente tolo buscar, nas projeções pigmentárias de nosso corredor, alguma

    “economia libidinal” do tipo “expressionismo abstrato”. É evidente que a arte de Pollock não

     pode servir de intérprete adequado às manchas de Fra Angélico. Mas o historiador não consegue

    escapar disso muito bem, pois subsiste o paradoxo, a doença do método: é que a emergência

    do objeto histórico como tal não será fruto de uma démarche histórica convencional  –  factual,

    contextual ou eucrônica  – , mas de um momento anacrônico  quase aberrante, algo como um

    sintoma no saber do historiador. A própria violência e incongruidade, a própria diferença e

    inverificabilidade terão, de fato, provocado uma suspensão da censura, a emergência de um

    novo objeto a ver e, além disso, a constituição de um novo problema para a história da arte.

     Heurística do anacronismo: como uma démarche, nesse ponto, contrária aos axiomas

    do método histórico pode chegar à descoberta de novos objetos históricos? Com sua paradoxal

    resposta –  é Pollock e não Alberti, é Jean Clay e não André Chastel, que tornaram possível ser

    “reencontrada” uma grande superfície de afresco pintado por Fra Angélio, visível por todos mas

    mantida invisível pela própria história da arte  – , a questão toca o difícil problema da “boa

    distância” que o historiador sonha manter em relação ao seu objeto. Demasiadamente presente,

    o objeto corre o risco de não ser mais que um suporte para fantasmas; demasiadamente passado,

    ele se arrisca de não ser mais que um resíduo positivo, morto, mortificado em sua própria

    “objetividade” (outro fantasma). É preciso não pretender fixar nem eliminar essa distância: é

     preciso fazê-la trabalhar no tempo diferencial  dos momentos de proximidades empáticas,intempestivas e inverificáveis, com os momentos de recuos críticos, escrupulosos e

    verificadores. Toda questão de método se torna talvez uma questão de tempo[23]. 

    A partir daí, o anacronismo não poderia ser reduzido a esse horrível pecado como,

    espontaneamente, o vê todo historiador diplomado. Ele poderia ser pensado como um momento,

    um batimento rítmico do método, seu momento de síncope. Que ele seja paradoxal, que ele seja

     perigoso, como necessariamente o é todo empreendimento de risco. O presente livro gostaria de

    empreender uma tentativa de exploração de alguns desses tempi, dar alguns exemplos do risco

     para abrir o método. Trata-se, principalmente, de estender, sobre a questão do tempo, umahipótese já levantada e argumentada sobre a questão do sentido: se a história das imagens é uma

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    história de objetos sobredeterminados, é preciso então aceitar  –  mas toda questão está em até

    onde?, como?  –   que um saber sobreinterpretativo[24] corresponde a esses objetos

    sobredeterminados. A vertente temporal dessa hipótese poderia ser formulada da seguinte

    maneira: a história das imagens é uma história dos objetos temporalmente impuros, complexos,

    sobredeterminados. É, então, uma história dos objetos policrônicos, de objetos heterocrônicos

    ou anacrônicos. Isso já não é dizer que a história da arte é ela mesma uma disciplina

    anacrônica, para o pior, mas, também, para o melhor?

    ***

    [1] Paris: Les Éditions de Minuit, 2000

    [2] “Pan de peinture” [que traduzi por “painel de pintura”] é um termo proustiano. É a parte

    maldita dos quadros, a que traz uma inquietude não-dita, uma negação do que o quadro afirma

    na ordem mimética. Encontra-se aí a potência, o próprio sintoma da pintura: a dessemelhança.

    Esta abre a imagem ao jogo da associação. Ela é o lugar privilegiado de todas as redes

    exegéticas, de todos os deslocamentos da figura, onde o visual se torna instrumento por

    excelência do virtual. [N.T]

    [3] Cf. G. Didi-Huberman, “La dissemblance des figures selon Fra Angelico”,  Mélanges de

    l’École française de Rome, Moyen Âge-Temps modernes, XCVIII, 1986, no. 2, p. 709-802.

    [4] Id., Fran Angelico –  Dissemblance et figuration, Paris, Flammarion, 1990 (rééd. 1995, coll.

    “Champs”). 

    [5]  Na monografia que, à época em que este trabalho foi empreendido, era mais reconhecida,

    a Santa Conversação de Fra Angélico foi interpretada, fotografada e medida apenas na metade

    de sua superfície real, como se simplesmente não existisse o tão surpreendente registro dos

     painéis multicores. Cf. J. Pope-Hennessy, Fra Angelico, Londres, Phaidon, 1952 (2ª. Ed. Revue,

    1974), p. 206.

    [6] Cf. E. Panofsky, Essais d’iconologie. Thèmes humanistes dans l’art de la

     Renaissance (1939), trad. C. Herbette ET B. Teyssèdre, Paris, Gallimard, 1967, p. 13-45.

    [7] Cf. C. Ripa, Iconologia overo Descrittione dell’Imagini universali cavate dall’Antichità e

    da altri luoghi [...] per raprresentare Le virtù, vitii, affetti, e passioni humane (1593), Padoue,

    Tozzi, 1611 (2e. Ed. Illustrée), rééd. New York-Londres, Garland, 1976.

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    [8] E. Panofsky, “L’hhistoire de l’art est une discipline humaniste” (1940), trad. B. et M.

    Teyssèdre, L’Oeuvre d’art et ses significations. Essais sur les “arts visuels”, Paris, Gallimard,

    1969, p. 27-52.

    [9] Cf. G. Didi-Huberman, Devant l’image. Question posée aux fins d’une histoire de

    l’art, Paris, Minuit, 1990.

    [10] M. Baxandall, L’Oeil du Quattrocento. L’usage de la peinture dans l’Italie de la

     Renaissance (1972), trad. Y. Delsaut, Paris, Gallimard, 1985, p. 224-231. O texto de Landino é

    este: “Fra Angelico era alegre, devoto e dotado do maior bem-estar” ( Fra Giovanni angelico et

    vezoso et divoto et ornato molto com grandíssima facilita)

    [11] Cf. G. Didi-Huberman, Fra Angelico –  Dissemblance et figuration, op. cit., p. 25-29 (reed.

    1995, p. 41-49).

    [12] Cf. M. Santoro, “Cristoforo Landino e il volgare”, Giornale storico della letteratura

    italiana, CXXXI, 1954, p. 501-547. 

    [13] Cf. G. Didi-Huberman, Fra Angelico –  Dissemblance et figuration, op. cit., p. 49-51 (reed.

    1995, p. 70-74).

    [14] Ibid, passim, especialmente p. 113-241 (reed. 1995, p. 209-381) sobre a Anunciação

    analisada como figura paradoxal do tempo.

    [15] M. Baxandall, L’Oeil d u Quattrocento, op. Cit., p. 168.

    [16] Ibid, p. 227-231.

    [17] Cf. G. Didi-Huberman, Fra Angelico –  Dissemblance et figuration, op. cit., p. 17-42 (reed.

    1995, p. 27-56)

    [18] Ibid., p. 51-111 (reed. 1995, p. 74-145).

    [19] Cf. H. de Lubac, Exégèse médiévale. Les quatre sens de l`Écriture, Paris, Aubier, 1959-

    1964. E. Auerbach, Figura (1938), trad. M. A. Bernier, Paris, Belin, 1993. G. Didi-Huberman,

    “Puissances de la figure. Exégèse et visualité dans l`art chrétien”,  Encyclopaedia Universalis –  

    Symposium, Paris, E.U., 1990, p. 596-609.

    [20] Cf. F. A. Yates, L’Art de la mémoire (1966), trad. D. Arasse, Paris, Gallimar, 1975. M. J.

    Carruthers, The Book of Memory. A Study of Memory in Medieval Culture, Cambridge-NewYork, Cambridge University Press, 1990.

    [21] Cf. B. L. Ullman e P. A. Stadter, The Public Library of Renaissance Florence. Niccolò

     Niccoli, Cosimo de’ Medici and the Library of San Marco, Padoue, Antenore, 1972.

    [22] É preciso acrescentar a essa reminiscência um elemento impor tante da “tomada em

    consideração da figurabilidade”: é a amizade, a proximidade intelectual com Jean Clay (autor,

     principalmente, de um artigo luminoso intitulado “Pollock, Mondrian, Seurat: la profondeur

     plate” (1977),  L’Atelier de Jackson Pollock , Paris, Macula, 1982, p. 15-28) sob a palavra de

    ordem de ... a mancha (macula). Essa palavra de ordem teórica, comprometida nodebate contemporâneo em torno de artistas como Robert Ryman, Martin Barré ou Christian

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  • 8/19/2019 Georges Didi

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    Bonnefoi, parecia tomar corpo, em Florença, na dimensão histórica mais inesperada, a da Idade

    Média e da Renascença. Observemos que Jean-Claude Lebensztejn, que, entre 1976 e 1979,

    ofereceu importantes contribuições à revista Macula, desde então, elaborou uma outra anamnese

    da mancha a partir das experiências de Cozens no século XVIII. CF. J.-C. Lebensztejn, L’Art de

     La tache.  Introduction à La “Nouvelle méthode” d’Alexander Cozens, s.l., Éditions Du Limon,

    1990.

    [23] Patrice Loraux mostrou mesmo, de modo admirável, que toda questão de pensamento é

    uma questão de tempo. Cf. P. Louraux, Le Tempo de La pensée, Paris, Le Seuil, 1993.

    [24] Cf. G. Didi-Huberman, Devant l’image, op. cit., p. 192-193, onde a resposta era procurada

    do lado das formulações freudianas.

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