gestão escolar

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GESTÃO ESCOLAR E SUAS COMPETÊNCIAS: UM ESTUDO DA CONSTRUÇÃO SOCIAL DO CONCEITO DE GESTÃO. CAMPOS, Marli 1 -FURB [email protected] SILVA, Neide de Melo Aguiar 2 -FURB [email protected] Eixo Temático: Políticas Públicas e Gestão da Educação Agência Financiadora: Não contou com financiamento Resumo O artigo discute a construção social do conceito de “bom” gestor fundamentado na Teoria das Representações Sociais, com um grupo de gestores das Unidades Escolares do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Ensino de Blumenau, levando em consideração o novo enfoque de gestão escolar, incorporado pela sociedade contemporânea, a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº. 9394/96. A construção social do conceito de “bom” gestor é uma dissertação de mestrado que se encontra em andamento e está ancorada na Teoria e Metodologia das Representações Sociais. A referida teoria é o meio para compreender os saberes do grupo, as marcas sociais, o contexto histórico e social onde a renovação desses saberes é elaborada por meio das práticas sociais, das experiências individuais desenvolvidas pelos sujeitos da pesquisa no desempenho de sua ação profissional. A atuação do gestor no âmbito de suas atribuições perpassa por três dimensões: técnica, pedagógica e política como espaços de competências interligados. Como instrumento de pesquisa foi utilizado um questionário, cujas questões foram elaboradas com base na técnica da associação livre e hierarquizada dos itens, de acordo com Bardin. Os gestores conceituaram a função de gestão escolar quando solicitados que completassem a frase: Bom Gestor... e, indicassem as palavras mais relevantes naquela concepção. As palavras foram classificadas e aglutinadas de acordo com as competências de gestão e a mais relevante serviu para agrupar nas referidas competências. Os resultados obtidos até o momento apontam que a dimensão técnica exige dos gestores conhecimento da legislação educacional, do sistema de ensino e da escola. A dimensão política é a ação, onde os gestores pesquisados estão mais focados. Na dimensão pedagógica as ações culminam com a elaboração do Projeto Político Pedagógico. 1 Graduada em Pedagogia/Administração Escolar e Supervisão Escolar pela Universidade Regional de Blumenau – FURB; Especialização em Administração escolar pela UNIVALI; Mestranda em Educação pelo PPGE/ME da FURB (Turma 2008); pesquisadora na Linha de Pesquisa Educação, Estado e Sociedade. Diretora do Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de Educação de Blumenau/SC, no período de 15/01/07 a 09/02/09. 2 Doutora em Educação Matemática pela UNESP – Campus de Rio Claro-SP. Professora permanente no PPGE/ME/FURB na Linha de Pesquisa Educação, Estado e Sociedade, tendo Representações Sociais como foco de pesquisa.

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Artigo sobre gestão escolar

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Page 1: Gestão escolar

GESTÃO ESCOLAR E SUAS COMPETÊNCIAS: UM ESTUDO DA CONSTRUÇÃO SOCIAL DO CONCEITO DE GESTÃO.

CAMPOS, Marli1-FURB

[email protected]

SILVA, Neide de Melo Aguiar2-FURB [email protected]

Eixo Temático: Políticas Públicas e Gestão da Educação

Agência Financiadora: Não contou com financiamento Resumo O artigo discute a construção social do conceito de “bom” gestor fundamentado na Teoria das Representações Sociais, com um grupo de gestores das Unidades Escolares do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Ensino de Blumenau, levando em consideração o novo enfoque de gestão escolar, incorporado pela sociedade contemporânea, a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº. 9394/96. A construção social do conceito de “bom” gestor é uma dissertação de mestrado que se encontra em andamento e está ancorada na Teoria e Metodologia das Representações Sociais. A referida teoria é o meio para compreender os saberes do grupo, as marcas sociais, o contexto histórico e social onde a renovação desses saberes é elaborada por meio das práticas sociais, das experiências individuais desenvolvidas pelos sujeitos da pesquisa no desempenho de sua ação profissional. A atuação do gestor no âmbito de suas atribuições perpassa por três dimensões: técnica, pedagógica e política como espaços de competências interligados. Como instrumento de pesquisa foi utilizado um questionário, cujas questões foram elaboradas com base na técnica da associação livre e hierarquizada dos itens, de acordo com Bardin. Os gestores conceituaram a função de gestão escolar quando solicitados que completassem a frase: Bom Gestor... e, indicassem as palavras mais relevantes naquela concepção. As palavras foram classificadas e aglutinadas de acordo com as competências de gestão e a mais relevante serviu para agrupar nas referidas competências. Os resultados obtidos até o momento apontam que a dimensão técnica exige dos gestores conhecimento da legislação educacional, do sistema de ensino e da escola. A dimensão política é a ação, onde os gestores pesquisados estão mais focados. Na dimensão pedagógica as ações culminam com a elaboração do Projeto Político Pedagógico.

1 Graduada em Pedagogia/Administração Escolar e Supervisão Escolar pela Universidade Regional de Blumenau – FURB; Especialização em Administração escolar pela UNIVALI; Mestranda em Educação pelo PPGE/ME da FURB (Turma 2008); pesquisadora na Linha de Pesquisa Educação, Estado e Sociedade. Diretora do Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de Educação de Blumenau/SC, no período de 15/01/07 a 09/02/09. 2 Doutora em Educação Matemática pela UNESP – Campus de Rio Claro-SP. Professora permanente no PPGE/ME/FURB na Linha de Pesquisa Educação, Estado e Sociedade, tendo Representações Sociais como foco de pesquisa.

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Palavras-chave: Gestão Escolar. Representações Sociais. Competências.

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Introdução

A pesquisa que fundamenta o presente artigo está sendo realizada como dissertação de

mestrado no Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Educação pela Universidade

Regional de Blumenau – PPGE/ME-FURB, na linha Educação, Estado e Sociedade, no Grupo

de Pesquisa Edupesquisa que estuda a Teoria das Representações Sociais, cujo precursor foi

Sérge Moscovici3. O artigo apresenta a construção social do conceito de “bom” gestor, a

partir de um grupo de gestores das Unidades Escolares do Ensino Fundamental da Rede

Municipal de Ensino de Blumenau, Santa Catarina, sujeitos da pesquisa. A pesquisa justifica-

se pelas dificuldades no cotidiano dos gestores quando descreviam suas ações à pesquisadora

e a preocupação dos mesmos em serem “bons” gestores, no sentido de articularem a teoria

trabalhada nos cursos de formação e o exercício diário de suas funções.

A elaboração da construção social do conceito de “bom” gestor definida pelo grupo de

gestores escolares são construídas a partir da apropriação que eles fazem da prática, das suas

relações e dos saberes históricos e sociais. Para compreender o conceito de gestão do grupo

pesquisado, foi aplicado um questionário, onde os sujeitos da pesquisa completariam a frase

com o que significaria para eles ser um bom gestor. A partir da definição, da concepção que

os sujeitos possuíam a respeito de gestão, os mesmos destacaram as palavras relevantes. As

palavras relevantes foram classificadas em categorias de competências: técnica, política e

pedagógica.

O conceito de gestão escolar passa a ser incorporado pela sociedade contemporânea, a

partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, quando no seu Art. 206, dispõe ao

longo do mesmo, a “gestão democrática do ensino público, na forma da lei” e da Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº. 9394/96, no seu Art. 14 destaca o

preceito da gestão democrática como um dos seus princípios, pressupondo a gestão

democrática como um trabalho coletivo, participativo e dialógico.

A relevância do estudo como produção científica para a área de Representações

Sociais e Gestão Escolar está na escassez dos trabalhos que discutem os saberes sociais

construídos pelos próprios gestores no desempenho de suas funções, na construção do

conceito social de “bom” gestor.

3 Sérge Moscovici – estabeleceu a Teoria das Representações Sociais por meio de uma redefinição dos problemas e conceitos da Psicologia Social, a Psicanálise. O referido estudo é sistematizado na obra La Psycanalyse: son image el son public (1961).

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Para efeitos de organização do artigo o leitor encontra quatro tópicos; a gestão escolar

sob novo enfoque; os conceitos e competências da gestão escolar; o contexto, os sujeitos da

pesquisa; a metodologia e a definição dos gestores nas competências, permeados pela Teoria

das Representações Sociais que estuda os saberes do senso comum, no caso, a construção do

conceito social de “bom” gestor. Finalizando a discussão, as considerações finais.

Gestão Escolar sob novo enfoque

No contexto da educação brasileira, emerge um conceito novo, gestão da escola, que

vem superar o enfoque limitado de administração, a partir do entendimento que os problemas

educacionais são complexos e que demandam uma ação articulada e conjunta na superação

dos problemas cotidianos das escolas.

A gestão da escola sob essa nova perspectiva surge como orientação e liderança

competente, exercida a partir de princípios educacionais democráticos e como referencial

teórico para a organização e orientação do trabalho em educação, afinado com as diretrizes e

políticas educacionais públicas para a implementação das políticas educacionais e o Projeto

Político Pedagógico das escolas.

Para Lück, 2005, p.17:

O conceito de gestão está associado à mobilização de talentos e esforços coletivamente organizados, à ação construtiva conjunta de seus componentes, pelo trabalho associado, mediante reciprocidade que cria um “todo” orientado por uma vontade coletiva.

Anterior a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº. 9394/96, a

escola era administrada por princípios fundamentados na Administração Escolar, que se

constatava na assimilação do modelo de administração científica ou Escola Clássica,

orientado pelos princípios da racionalidade limitada; da linearidade; da influência estabelecida

de fora para dentro; do emprego mecanicista de pessoas e de recursos para realizar os

objetivos organizacionais de sentido limitado.

O modelo de direção da escola era centralizado na figura do diretor, que agia como

tutelado aos órgãos centrais, competindo-lhe zelar pelo cumprimento de normas,

determinações e regulamentos deles emanados. Atuava sem voz própria para determinar os

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destinos da escola e, portanto, desresponsabilizado do resultado de suas ações. O trabalho do

diretor constituía-se em repassar informações, como controlar, supervisionar, “dirigir” o fazer

escolar, de acordo com as normas estabelecidas pelo sistema de ensino.

Segundo, Lück, (2006, p. 35). “ Bom diretor era o que cumpria essas obrigações plena

e zelosamente, de modo a garantir que a escola não fugisse ao estabelecido em âmbito central

ou em nível hierárquico superior”.

A Escola Crítica surgiu na contraposição da identificação educacional com a

administração geral de empresas e, de maneira menos enfática que a Escola Clássica e dá

indícios, de que compreende a condução política e pedagógica da escola e da educação, de

onde emergiria um campo de conhecimento da administração educacional. A Escola Clássica

ou Administração Científica perdurou até o início dos anos de 1970 e a Escola Crítica do final

dos anos de 1970 e início dos anos de 1980. (SOUZA, 2008).

Com o movimento da redemocratização e a conseqüente promulgação da Constituição

Federal de 1988 e a LDBEN 9394/96, o movimento de democratização, descentralização e

construção da autonomia, princípios democráticos da Carta Magna e da LDBEN vigente, os

mesmos, passaram a constituir novas formas de mecanismos e ações no interior das Unidades

Escolares, oportunizando a participação da comunidade escolar e local nas decisões que

envolvem as questões educacionais, ampliando a responsabilidade e atuação do gestor

escolar.

O sistema escolar sempre sofreu, em maior ou menor grau, as marcas oriundas de

grupos sociais que ocupam posições diferentes ao mesmo, ou seja, discurso dos políticos, dos

administradores, dos agentes institucionais dos diferentes níveis de hierarquia e dos usuários

do sistema escolar. Esse entendimento é necessário na medida em que a área educacional

aparece como um campo privilegiado para se observar como as representações sociais se

constroem, evoluem e se transformam no interior dos grupos sociais, e para esclarecer o papel

dessas construções nas relações desses grupos com o objeto de sua representação. Desta

forma, compreender as representações sociais de um grupo de gestores escolares sobre “bom”

gestor, suscita a indagação central do estudo em questão.

As representações sociais dos gestores são construídas a partir da apropriação que eles

fazem da prática, das suas relações e dos saberes históricos e sociais. Considerando a idéia,

dos saberes históricos e sociais e que nada é definitivo, que a renovação desses saberes é

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necessária, e que os mesmos são elaborados através de práticas sociais é que a escola é

concebida.

Dotta (2006) confirma que por meio da Teoria das Representações Sociais podemos

apreender esses saberes, pois, está envolvido o esforço em apreender os problemas da

educação no processo que articula o homem concreto, em sua especificidade e complexidade,

à totalidade social, dentro do movimento histórico que os engloba em espaço e tempo

definidos.

O gestor escolar sob esse novo paradigma passa a atuar de forma mais dinâmica,

comprometido com os destinos da instituição escolar, co-responsabilizando todos os atores da

instituição escolar e da comunidade escolar no fazer pedagógico.

Conceitos e competências da gestão escolar

A gestão escolar vai além do sentido de mobilizar as pessoas para a realização eficaz

das atividades, pois implica intencionalidade, definição de um rumo, uma tomada de decisão

diante dos objetivos sociais e políticos de uma escola. A escola, ao cumprir sua função social

influi na formação da personalidade humana e não é possível estruturá-la para o cumprimento

da sua função social, sem levar em consideração objetivos políticos, técnicos e pedagógicos.

Segundo Libâneo (2004) a intencionalidade projeta-se nos objetivos que dão o rumo, a

direção da ação. Na escola, isso leva à busca deliberada, consciente, planejada de integração e

unidade de objetivos e ação, em torno de normas e atitudes comuns.

O gestor responsável pelo espaço educacional, assume posturas profissionais

decorrentes do seu compromisso profissional na dimensão educacional. Essa postura envolve

os aspectos referentes ao contexto da prática escolar, suas experiências pessoais, a influência

das políticas públicas, do entorno onde a escola está inserida, do grupo de profissionais nas

dimensões: pedagógica, técnica e política.

Segundo Wittmann (2004) podemos falar que a gestão escolar possui três aspectos

inalienáveis e interrelacionados: a competência técnica, a liderança na comunidade e o

compromisso público-político, as demais funções da gestão escolar, por mais importantes e

indispensáveis, são adjetivas e complementares.

A dimensão pedagógica envolve a organização do trabalho escolar no que diz respeito

à elaboração do projeto pedagógico, no planejamento anual, nas reuniões pedagógicas, nos

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conselhos de classe, na recuperação da aprendizagem dos alunos com menor rendimento

escolar, na organização do tempo e do espaço escolar, no acolhimento às famílias e os alunos,

no índice de aprovação e correção da defasagem idade/aprendizagem.

Lück (2005) relaciona habilidades e conhecimentos em áreas: administrativas;

relacionamento interpessoal e pedagógica elencando as principais habilidades e

conhecimentos que os profissionais da gestão, precisam refletir de modo que possam liderar

de forma competente uma escola, independentemente do nível de escolaridade que esta

ofereça.

Na área pedagógica a autora sugere:

Compreensão dos fundamentos e bases da ação educacional; Compreensão da relação entre ações pedagógicas e seus resultados na aprendizagem e formação dos alunos; Conhecimento sobre organização do currículo e articulação entre seus componentes e processos; Habilidade de mobilização da equipe escolar para a promoção dos objetivos educacionais da escola; habilidade de orientação e feedback ao trabalho pedagógico. (2005, p. 85)

A dimensão ou competência técnica refere-se à organização do trabalho escolar na

dimensão administrativa e financeira. Essa competência requer do gestor conhecimentos para

o gerenciamento de recursos humanos e materiais, na obtenção dos recursos e prestação de

contas dos mesmos, conservação dos materiais e patrimônio público.

Em relação à competência técnica, Wittmann (2004) diz que a gestão demanda

competências específicas. Há conhecimentos, aptidões cognitivas e aptidões atitudinais

requeridas para o exercício da gestão escolar. Para gerir a escola há necessidade de formação

específica.

Lück (2005, p. 84) define para o gestor na área administrativa uma:

Visão de conjunto e de futuro sobre o trabalho educacional e o papel da escola na

comunidade; Conhecimento de política e da legislação educacional; Habilidade de planejamento e compreensão do seu papel na orientação do trabalho conjunto; Habilidade de manejo e controle do orçamento; habilidade de organização do trabalho educacional; habilidade de acompanhamento e monitoramento de programas, projetos e ações; habilidade de avaliação diagnóstica, formativa e somativa; habilidade de tomar decisões eficazmente; habilidade de resolver problemas criativamente e de emprego de grande variedade de técnicas.

A dimensão política está associada à participação na gestão e a responsabilidade

individual de cada membro da equipe escolar. O gestor coordena, mobiliza, motiva, lidera,

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delega responsabilidades decorrentes das decisões dos membros da equipe escolar, presta

contas e submete à avaliação do grupo o desenvolvimento das decisões tomadas

coletivamente.

Essa dimensão associa-se ao desenvolvimento do trabalho no sentido de buscar

parcerias, articular a comunidade escolar na representatividade dos conselhos escolares, nas

ações que envolvem o trabalho no cotidiano escolar, trazendo a comunidade exterior para o

interior da escola, ou seja, abrir as portas do espaço educacional para que toda a comunidade

possa usufruir e participar das decisões decorrentes daquele ambiente educacional.

O gestor escolar na dimensão política exerce o princípio da autonomia que requer

vínculos mais estreitos com a comunidade educativa, os pais, as entidades e organizações

paralelas à escola. (LIBÂNEO, 2004).

Segundo Libâneo (2004) “autonomia é a faculdade das pessoas de autogovernar-se, de

decidir sobre seu próprio destino”. Autonomia de uma instituição significa ter o poder de

decisão sobre seus objetivos e suas formas de organização, manter-se relativamente

independente do poder central, administrar livremente recursos financeiros. As escolas

públicas como não são organismos isolados, dependem do sistema central, das políticas e da

gestão pública, possuem uma autonomia relativa, ou seja, a autonomia de uma escola pública

pauta-se no planejamento, na organização, na orientação e o controle de suas atividades

internas estando sujeita a adequação e aplicação das diretrizes gerais que recebem dos níveis

superiores da administração do ensino.

A presença da comunidade na escola, em especial os pais, significa representatividade

e participação nos Conselhos de Escola, Associação de Pais e Professores para a elaboração e

ou reformulação do Projeto Político Pedagógico, acompanhando e avaliando a qualidade dos

serviços prestados.

Contexto da pesquisa

No estudo em questão é imprescindível situar o contexto pois o processo histórico é

contínuo, possui avanços e recuos, mudanças de rumos, idas e vindas. As pessoas fazem parte

deste cenário, da dinamicidade que é fator que impulsiona a vida. Segundo Jodelet (2001)

sempre há necessidade de informar-se sobre o mundo à nossa volta, para ajustar-se a ele,

saber comportar-se, identificar e resolver os problemas que apresentam-se. As

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representações são sociais e estão ao redor de todas as pessoas e fazem parte do mundo e por

isso existentes na vida de todas as pessoas.

A pesquisa sobre a construção social do conceito de “bom” gestor foi realizada no

município de Blumenau, que localiza-se na região metropolitana do Vale do Itajaí, ao longo

do rio Itajaí-Açu, no Estado de Santa Catarina, na região sul do Brasil. O município foi

fundado em 02 de setembro de 1850, pelo filósofo alemão Dr. Hermann Bruno Otto

Blumenau que obteve do governo Provincial uma área de terras de duas léguas para nela

estabelecer uma colônia agrícola, com imigrantes europeus. (SILVA, 1988).

Segundo os dados do sítio eletrônico: www.furb.br/ips/sigad o município de Blumenau

possui 296 mil habitantes, sendo destes 270 mil residentes na zona urbana e o restante da

população residentes na zona rural. É a terceira cidade mais populosa do Estado, constituindo

como um de seus principais pólos industriais e tecnológicos, com destaque nas áreas de

informática, comércio e indústria. A indústria têxtil é a principal atividade econômica do

município.

Segundo os indicadores demográficos e educacionais divulgados pelo Ministério da

Educação - MEC o município apresenta Índice de Desenvolvimento Humano4 - IDH de 0,86,

Índice de Desenvolvimento Infantil - IDI de 0,77.

A cidade de Blumenau apresenta-se como um dos municípios com o nível de educação

acima da média brasileira. A taxa de analfabetismo é de 0,8 na faixa etária de 10 a 15 anos de

idade e de 2,8 na população de 15 anos ou mais. (http://portal.mec.gov.br).

A taxa de escolarização líquida no ensino fundamental, de acordo com o censo

demográfico de 2000, fonte IBGE, em Blumenau, é de 95,3%. O Índice de Desenvolvimento

da Educação Básica – IDEB5, da rede municipal apurado em 2005, foi de 4,4 nas séries

iniciais e 3,6 nas séries finais do ensino fundamental; No ano de 2007 o índice apurado nas

séries iniciais foi de 4,8 e nas séries finais 4,3 (www.mec.gov.br).

“O conhecimento só pode ser analisado tendo como contraponto o contexto social em

que emerge, circula e se transforma”. (SPINK, 1994, p.93). Ainda nos apoiando em SPINK

4 O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é uma referência para avaliar o desenvolvimento humano dos países, utilizando como critérios indicadores de educação (alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (esperança de vida ao nascer) e renda (PIB per capita). 5 O IDEB foi criado pelo Ministério da Educação, no ano de 2007 para aferir a qualidade de ensino das escolas públicas. O indicador é apresentado numa escala de zero a dez. O índice é medido a cada dois anos e o objetivo do país é alcançar a nota 6 até 2022, indicador este, que corresponde à qualidade do ensino em países desenvolvidos.

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(1994, p. 121) “o contexto só nos interessa porque sem ele não poderíamos compreender as

construções que dele emanam e nesse processo o transformam”.

Sujeitos da Pesquisa

Os sujeitos da pesquisa são 41 diretores das Unidades Escolares da Rede Municipal de

Ensino de Blumenau. A rede municipal possui 50 unidades de Educação Básica que atendem

o nível do Ensino Fundamental. Para a realização da pesquisa, o critério utilizado na escolha

dos sujeitos foi às escolas que atendiam as séries iniciais e finais do ensino fundamental.

Os sujeitos participantes da pesquisa são sujeitos sociais inseridos em um contexto

social, partícipes de uma construção histórica, ou seja, das representações sociais do grupo de

pertença e remete à atividade do sujeito na elaboração das representações sociais SPINK

(1994).

O perfil do grupo de gestores que participaram nesse estudo em relação à formação

acadêmica, 18 possui especialização e 23 possuem graduação. A nomeação ao cargo de gestor

na Rede Municipal de Ensino de Blumenau acontece por meio de eleição direta, conforme

prescreve a Lei Eleitoral Municipal específica nº. 5.867 de 19/04/02, alterada em 05/07/07. A

eleição acontece de dois em dois anos com a participação da comunidade escolar e local. A lei

prevê uma recondução. Sendo que vinte e sete estão no seu primeiro mandato e doze no

segundo mandato e dois abstiveram-se da resposta.

Metodologia da Pesquisa

A abordagem metodológica deste estudo é de caráter qualitativo e visa compreender as

representações sociais de um grupo de gestores escolares sobre “bom” gestor. Para que seja

possível o entendimento dessa construção social, a pesquisa utiliza-se do questionário como

instrumento de coleta de dados.

Os resultados encontrados, enriquecidos de novos estudos, podem contribuir para a

compreensão do conceito de “bom” gestor, suas áreas de competências para a área da

educação, bem como servir de possibilidade e sugestão de algumas práticas de mudança para

a formação continuada de gestores escolares.

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A categorização dos dados foi feita de acordo com o modelo proposto por Bardin

(1977), organizada em três momentos:1) A pré-análise; 2) A exploração do material; 3) O

tratamento dos dados, a inferência e a interpretação.

O instrumento de coleta de dados e categorização

Como instrumento de pesquisa foi utilizado um questionário para a coleta de dados,

cujas questões foram elaboradas com base na técnica da associação livre e hierarquizada dos

ítens (BARDIN, 1977). A técnica da associação livre consiste em apresentar ao sujeito uma

frase, ou palavra indutora, e solicitar que ele produza outras palavras relacionadas, depois

justifique sua produção (ALMEIDA e COSTA, 1999, p.272).

O questionário é composto de 14 questões e apresenta-se subdividido em três núcleos.

As primeiras 07 questões identificam o perfil dos gestores, sujeitos da pesquisa. O segundo

núcleo busca entendimento dos gestores à respeito da formação continuada e o terceiro e

último núcleo são as questões que fundamentam o presente artigo, pois busca identificar nas

palavras hierarquizadas mais relevantes, as dimensões, ou seja, as competências de gestão,

indicadas pelos gestores.

Os gestores definindo as competências de gestão Os sujeitos da pesquisa no preenchimento do questionário que visava sobre a

construção social do conceito de “bom” gestor, destacaram quatro palavras relevantes. Estas

por sua vez, foram categorizadas por dimensões de ações; técnica, pedagógica e política. Para

Bardin (1977) a categorização é uma operação de classificação de elementos constitutivos de

um conjunto, por diferenciação e, por reagrupamento segundo o gênero, semelhança, com os

critérios previamente definidos.

A dimensão técnica é tomada como referência na compreensão das rotinas escolares

no que se refere ao gerenciamento de recursos humanos e materiais, conservação dos

materiais e do patrimônio público, enfim toda a rede de relações que permeiam o cotidiano da

instituição escolar. As palavras que formam essa dimensão e que expressam a competência

técnica dos gestores, mais evocadas formam a categoria: Gerenciamento. O gestor, na

dimensão técnica, gerencia, coordena e organiza todas as atividades da escola, atendendo às

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leis, regulamentos e determinações dos órgãos superiores do sistema de ensino e às decisões

no âmbito da escola assumidas pela equipe escolar e pela comunidade (LIBÂNEO, 2004).

A dimensão política é vista como parâmetro na habilidade de se comunicar

eficazmente, de mobilizar a comunidade escolar e local, desenvolver e motivar a equipe,

negociar e resolver conflitos, avaliar e dar opinião construtiva aos trabalhos dos outros. Para

FERREIRA (2000) a participação é sempre uma participação política, pois envolve interesses

e organização da sociedade, que associada à formação da qualidade, vai possibilitar o

exercício da cidadania.

As palavras que foram destacadas pelos gestores, que serviram de análise para agrupá-

las na dimensão política, formam a categoria liderança. Como uma sub-categoria das palavras

surgiu: democrático. O último núcleo da dimensão política apresentada pelos sujeitos da

pesquisa é humanista. Os gestores quando apontam as palavras que foram aglutinadas na

categoria humanista apresentam uma preocupação com as pessoas ao seu redor, no sentido de

serem mais humanos e criarem um ambiente acolhedor e mais justo no espaço escolar.

A dimensão política por ser constituída de várias palavras evocadas dos sujeitos fez-se

necessário criar núcleos de sentidos. Para Bardin (1977) fazer uma análise temática, consiste

em descobrir os “núcleos de sentido” que compõem a comunicação e cuja presença, ou

freqüência de aparição podem significar alguma coisa para o objetivo analítico escolhido.

A dimensão pedagógica sendo também uma competência da gestão escolar, não

menos importante que as anteriores, porém todas interligadas e na prática indissociáveis, está

diretamente ligada à finalidade da escola. As palavras que foram evocadas pelos sujeitos que

integram a dimensão pedagógica e que formam a categoria do Projeto Político Pedagógico.

O projeto político pedagógico engloba e norteia todas as ações da escola, perpassando

pelo mesmo a concepção que a escola possui sobre as palavras mencionadas pelos gestores. O

Projeto Político Pedagógico é a sistematização nunca definida, de um processo de

planejamento participativo, que é aperfeiçoado e concretizado na caminhada.

(VASCONCELLOS, 1995).

Assim, as competências dos gestores evocadas pelos sujeitos constituem a gestão da

escola. A combinação, o balanceamento e as expressões das mesmas, no cotidiano da escola

dependem do perfil de cada gestor e da realidade de cada escola.

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Considerações Finais

Este artigo buscou discutir a função de gestão escolar sob o novo enfoque, permeado

pela Teoria das Representações Sociais, onde o gestor passa a atuar mais comprometido com

os destinos da instituição escolar, co-responsabilizando os parceiros no fazer pedagógico.

O gestor escolar no desempenho da sua função, assume posturas profissionais que

decorrem do seu perfil profissional e da influência de políticas públicas, do entorno onde a

escola está inserida, do grupo de profissionais que compõem o quadro funcional, apresentadas

nas dimensões: pedagógica, técnica e política. As referidas dimensões entendidas como

competências dos gestores estão interligadas e no cotidiano da ação indissociáveis para a

concretização dos objetivos educacionais da Escola.

Na representação social do grupo de gestores escolares sobre “bom” gestor, a partir da

categorização das palavras mais relevantes indicadas pelo grupo e aglutinadas conforme os

sentidos sobressalentes são categorizadas três dimensões: técnica, política e pedagógica como

competências intrínsecas no desempenho de suas funções.

A atuação do gestor na dimensão técnica amplia as suas responsabilidades para gerir a

complexidade da escola atual. Competência técnica no sentido de ser um conhecedor da

legislação educacional, da origem dos recursos financeiros, bem como a prestação de contas

dos mesmos, das atribuições do sistema de ensino e da escola. A categoria que formou essa

dimensão foi representada pela palavra gerenciamento.

Na dimensão política sua atuação está vinculada à pertinência e relevância do que

executa na escola. O significado social, político e histórico da aprendizagem é que faz com

que a proposta educativa da escola seja um projeto político, além de pedagógico.

(WITTMANN, 2004). As palavras liderança, democrático e humanista constituem a

dimensão política, onde a ação dos sujeitos pesquisados está mais focada.

Encerrando a discussão a dimensão pedagógica é definida pelos gestores pela palavra:

Projeto Político Pedagógico, onde o mesmo engloba e norteia todas as ações da escola, sendo

este, liderado pelo gestor e construído por todo o coletivo de educadores.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Ângela Maria de Oliveira; COSTA, Wilse Arena da. Teoria das representações sociais: uma abordagem alternativa para se compreender o comportamento cotidiano dos

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