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GOVERNANÇA SUSTENTÁVEL - I PROFESSSORES DORIVAL GUIMARÃES PEREIRA JÚNIOR MAURÍCIO LEOPOLDINO DA FONSECA EDGAR GÁSTON JACOBS FLORES FILHO

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GOVERNANÇA SUSTENTÁVEL - I

PROFESSSORESDORIVAL GUIMARÃES PEREIRA JÚNIORMAURÍCIO LEOPOLDINO DA FONSECA

EDGAR GÁSTON JACOBS FLORES FILHO

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SKEMA BUSINESS SCHOOL

SKEMA BUSINESS SCHOOLWWW.SKEMA.EDU

SKEMA CAMPUSES

Belo Horizonte CampusR. Bernardo Guimarães, 3071Santo Agostinho, Belo HorizonteMG, 30140-083, Brazil

Lille CampusAvenue Willy Brandt59777 Euralille, France

Paris CampusPôle Universitaire Léonard de VinciEsplanade Mosa Lisa - Courbevoie92916 Paris La Défense Cédex, France

Raleign Campus920 Main Campus DriveVenture II, Suite 101 RaleignNC 27606 - USA

Sophia Antipolis Campus60 rue Dostoïevski CS 3008506902 Sophia Antipolis Cédex, France

Stellenbosch CampusRyneveld Street,Stellenbosch 7 600, South Africa

Buzhou CampusBuilding A4 & A599, Ren’ai Road, Dushu LakeHigher Education Town215123 SIP SuzhouJiangsu Province, China

Global Lab in AI4200 Boulevard Saint-LaurentPorte 685, Montréal, H2W 2R2 (QC),Canada

Belo Horizonte Cape Town-Stellenbosch Lille Paris Raleigh Sophia Antipolis Suzhou

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G721

Governança sustentável I [Recurso eletrônico on-line] organização Congresso Internacional de

Direito e Inteligência Artificial: Skema Business School – Belo Horizonte;

Coordenadores: Dorival Guimarães Pereira Júnior, Maurício Leopoldino da Fonseca e

Edgar Gastón Jacobs Flores Filho – Belo Horizonte: Skema Business School, 2020.

Inclui bibliografia

ISBN: 978-65-5648-094-7

Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações

Tema: Desafios da adoção da inteligência artificial no campo jurídico.

1. Direito. 2. Inteligência Artificial. 3. Tecnologia. I. Congresso Internacional de Direito

e Inteligência Artificial (1:2020 : Belo Horizonte, MG).

CDU: 34

_____________________________________________________________________________

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CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO E INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

GOVERNANÇA SUSTENTÁVEL I

Apresentação

É com enorme alegria que a SKEMA Business School e o CONPEDI – Conselho Nacional

de Pesquisa e Pós-graduação em Direito apresentam à comunidade científica os 14 livros

produzidos a partir dos Grupos de Trabalho do I Congresso Internacional de Direito e

Inteligência Artificial. As discussões ocorreram em ambiente virtual ao longo dos dias 02 e

03 de julho de 2020, dentro da programação que contou com grandes nomes nacionais e

internacionais da área, além de 480 pesquisadoras e pesquisadores inscritos no total. Estes

livros compõem o produto final deste que já nasce como o maior evento científico de Direito

e da Tecnologia do Brasil.

Trata-se de coletânea composta pelos 236 trabalhos aprovados e que atingiram nota mínima

de aprovação, sendo que também foram submetidos ao processo denominado double blind

peer review (dupla avaliação cega por pares) dentro da plataforma PublicaDireito, que é

mantida pelo CONPEDI. Os quatro Grupos de Trabalho originais, diante da grande demanda,

se transformaram em 14 e contaram com a participação de pesquisadores de 17 Estados da

federação brasileira. São cerca de 1.500 páginas de produção científica relacionadas ao que

há de mais novo e relevante em termos de discussão acadêmica sobre os temas Direitos

Humanos na era tecnológica, inteligência artificial e tecnologias aplicadas ao Direito,

governança sustentável e formas tecnológicas de solução de conflitos.

Os referidos Grupos de Trabalho contaram, ainda, com a contribuição de 41 proeminentes

professoras e professores ligados a renomadas instituições de ensino superior do país, os

quais indicaram os caminhos para o aperfeiçoamento dos trabalhos dos autores. Cada livro

desta coletânea foi organizado, preparado e assinado pelos professores que coordenaram cada

grupo. Sem dúvida, houve uma troca intensa de saberes e a produção de conhecimento de

alto nível foi, certamente, o grande legado do evento.

Neste norte, a coletânea que ora torna-se pública é de inegável valor científico. Pretende-se,

com esta publicação, contribuir com a ciência jurídica e fomentar o aprofundamento da

relação entre a graduação e a pós-graduação, seguindo as diretrizes oficiais. Fomentou-se,

ainda, a formação de novos pesquisadores na seara interdisciplinar entre o Direito e os vários

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campos da tecnologia, notadamente o da ciência da informação, haja vista o expressivo

número de graduandos que participaram efetivamente, com o devido protagonismo, das

atividades.

A SKEMA Business School é entidade francesa sem fins lucrativos, com estrutura

multicampi em cinco países de continentes diferentes (França, EUA, China, Brasil e África

do Sul) e com três importantes acreditações internacionais (AMBA, EQUIS e AACSB), que

demonstram sua vocação para ensino e pesquisa de excelência no universo da economia do

conhecimento. A SKEMA, cujo nome é um acrônimo significa School of Knowledge

Economy and Management, acredita, mais do que nunca, que um mundo digital necessita de

uma abordagem transdisciplinar.

Agradecemos a participação de todos neste grandioso evento e convidamos a comunidade

científica a conhecer nossos projetos no campo do Direito e da tecnologia. Já está em

funcionamento o projeto Nanodegrees, um conjunto de cursos práticos e avançados, de curta

duração, acessíveis aos estudantes tanto de graduação, quanto de pós-graduação. Até 2021,

será lançada a pioneira pós-graduação lato sensu de Direito e Inteligência Artificial, com

destacados professores da área.

Agradecemos ainda a todas as pesquisadoras e pesquisadores pela inestimável contribuição e

desejamos a todos uma ótima e proveitosa leitura!

Belo Horizonte-MG, 07 de agosto de 2020.

Profª. Drª. Geneviève Daniele Lucienne Dutrait Poulingue

Reitora – SKEMA Business School - Campus Belo Horizonte

Prof. Dr. Edgar Gastón Jacobs

Coordenador Acadêmico da Pós-graudação de Direito e Inteligência Artificial da SKEMA

Business School

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1 O autor é graduado em Direito e Mestre em Gestão de Políticas Públicas pela UNIVALI. Atualmente é acadêmico, doutorando em Ciências Jurídicas pelo PPCJ UNIVALI. Itajaí, SC, Brasil: [email protected].

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A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NO CENTRO DA CRISE DA DEMOCRACIA

ARTIFICIAL INTELLIGENCE AT THE HEART OF DEMOCRACY CRISIS

Níkolas Reis Moraes dos Santos 1

Resumo

Buscou-se com a presente pesquisa identificar na literatura Política e Jurídica-Constitucional,

e no seu confronto com com outras ligadas à Tecnologia da Informação, História e mesmo da

Física, a relação entre as novas tecnologias virtuais, com ênfase na Inteligência Artificial, e a

crise da Democracia, tanto no sentido de sua eventual influência no aprofundamento desta,

como no sentido de interferência potencial de triunfo sobre ela, de modo que se utilizou do

método indutivo, a partir da pesquisa bibliográfica e análise de estudos de caso.

Palavras-chave: Democracia, Tecnologia, Inteligência artificial

Abstract/Resumen/Résumé

This paper search for to identify on the Political and Juridical-Constitutional Literature, and

in its confrontation with others related to Information Technology, History and even Physics,

the relation between new virtual technologies, especially Artificial Intelligence, and the crisis

of the Democracy, both in the sense of its possible influence on the aggravation of this, as in

the sense of potential interference of triumph over it, so that was used the inductive method,

from the bibliographic research and analysis of case studies.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Democracy, Technology, Artificial intelligence

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Introdução

A ideia central deste resumo que se pretende posteriormente um artigo, é a de que a

inteligência artificial em particular, mas em regra grande parte das tecnologias

contemporâneas ligadas à internet, são ao mesmo tempo veneno e antídoto para a crise da

democracia que ganha amplitude global e na qual o Brasil está fortemente inserido.

Adotou-se como pressuposto, assim, o fato de que a inteligência artificial é uma

realidade contemporânea intransponível na vida de grande parte das pessoas, ao menos até o

horizonte que se pode enxergar, assim como é a crise dos sistemas de governo democráticos

do centro e de parte da periferia do capitalismo ocidental, o que justifica o trabalho. O tema e

referente geral, portanto, é a Democracia na Era da Inteligência Artificial, e o problema que se

apresentou é se a inteligência artificial está ou não no centro da crise da democracia, sendo

que a hipótese confirmada sugere que sim, está, especialmente como instrumento essencial

para sua superação.

Dito isto, o objetivo geral do estudo foi o de identificar na literatura Política e

Jurídica-Constitucional, confrontando-a com outras ligadas à Tecnologia da Informação,

História e mesmo da Física, a relação entre as novas tecnologias virtuais, no sentido de sua

relação com a internet - com ênfase na inteligência artificial, e a crise da democracia, tanto no

sentido de sua eventual influência no agravamento desta, como no sentido de interferência

potencial de triunfo sobre ela.

Como objetivos específicos, ainda, a ideia foi de investigar como as lideranças

políticas estão utilizando as tecnologias virtuais e o que tem sido feito na prática cotidiana

para qualificar o debate democrático por parte da sociedade civil, políticos e governos, como

também investigar e propor soluções de aperfeiçoamento do processo democrático pela via da

inteligência artificial. O método utilizado foi o indutivo, a natureza da pesquisa é básica, a

abordagem do problema qualitativa, os objetivos descritivos e prescritivos, e o procedimento

técnico bibliográfico e de estudo de casos. As categorias fundamentais do trabalho, doravante

sinalizadas com a inicial em maiúsculo, assim, são: a Democracia, a Democracia Liberal; a

Inteligência Artificial, o Algoritmo, o BlockChain, e a Accountability Democrática.

Os objetos de estudo são a Inteligência Artificial e a Democracia, sendo que a

revisão da literatura se baseou na consulta de publicações de autores dedicados ao estudo da

dinâmica dos Estados centrais do capitalismo ocidental e de outros dedicados exclusivamente

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ao estudo das relações de poder no Brasil. Também em outras identificadas sobre Inteligência

Artificial e seu impacto nas instituições do Estado. Já os estudos de caso têm relação com a

experiência prática do autor/doutorando, enquanto membro de organizações que se

apresentam como reformadoras da prática política nacional.

Caso aprovado este resumo, além dos tópicos abaixo, o artigo dele derivado deverá

ter ainda outros dois.

1. A crise da Democracia

Abranches (2018, p. 9), constata em obra recente que “a democracia vai mal em todo

o mundo”. Em resumo da sua análise, pode-se dizer que a crise da Democracia tem dimensão

global, embora destaque que no Brasil hajam também “motivações internas”, como ameaças

de rompimento de coalizões de governo, acusações de corrupção e mesmo a judicialização do

contencioso político. Em outra obra também recente (ABRANCHES, 2017, p. 59), defende

que o mundo vive uma Era de transição que combina “três dimensões cruciais”, quais sejam:

a socioestrutural, a científica e tecnológica e a climática, sendo que a segunda, que “permitiu

a digitalização da sociedade e a emergência desta em rede”, tende a se ampliar com

consequências no relacionamento social e na forma de fazer política.

Castells (2018, p. 7-70), por sua vez, se fundamenta em diagnósticos similares para

destacar a “mais profunda” das crises contemporâneas: a “ruptura da relação entre

governantes e governados”. Ainda que trate da crise da Democracia liberal como fenômeno

global, “acima das características próprias de cada sociedade”, não deixa de anotar que é total

“a decomposição do sistema político do Brasil, país fundamental da América Latina”.

Mounk (2019, p. 8/26/43), a partir das evidências citadas acima e também anotadas

por ele, da derrocada da Democracia pela via do processo democrático, fala do surgimento de

uma “democracia iliberal, ou da democracia sem direitos”, no sentido da ascensão de

populistas ao poder em todo o globo e da impaciência desses e mesmo dos eleitores deles com

as instituições liberais, inclusive independentes como o judiciário ou a imprensa, e com os

direitos das minorias. Basicamente, afirma que os populistas se dizem “a verdadeira voz do

povo”, e que “acham que toda a resistência a seu governo é ilegítima”. O Brasil também passa

aos olhos do autor, que afirma que os eventos do ano de 2018 pelo mundo todo e

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especialmente no Brasil, sugerem que “por ora, a ameaça populista à democracia é mais séria

do que nunca”.

2. Tecnologia e Inteligência Artificial: aspectos destacados

Hawking (2016, p. 173-175), o físico, quando com sucesso procurou popularizar suas

ideias na obra O Universo Numa Casca de Noz, cuja primeira edição data do ano de 2001,

afirmava que os seres humanos precisam aumentar sua complexidade se quiserem “que os

sistemas biológicos permaneçam à frente dos eletrônicos”. Afirmava, também, que os

computadores ainda não tinham “nenhum sinal de inteligência”, mas que isso era só uma

questão de tempo, já que, embora em algum momento o desenvolvimento tecnológico nesta

área tenda a desacelerar, ele continuará se desenvolvendo exponencialmente “até os

computadores terem uma complexidade semelhante à do cérebro humano”.

De forma mais pragmática, defendia, ainda, que aqueles que asseguram que os

computadores jamais teriam uma inteligência genuína estariam enganados, já que lhe parecia

que “se moléculas químicas muito complicadas podem operar em humanos para torná-los

inteligentes, então circuitos eletrônicos igualmente complicados também podem fazer

computadores agir de maneira inteligente.” E mais, sendo inteligentes, ainda segundo ele,

poderão desenvolver tecnologias para projetar outros com “inteligência ainda maiores”. Daí

em diante as previsões atingem questões bioéticas. Para Halking, a limitação da inteligência

humana se dá pelo tamanho do cérebro, mas seres humanos gerados fora do útero - o que para

ele é algo inevitável na prática e para além de eventuais restrições do Direito - poderão

competir com os eletrônicos. Ou seja, outro tipo de ser humano pode ser capaz de subsistir no

futuro, não estes que estão aí.

Mas a par do caráter ilustrativo de se utilizar das ideias de um físico em um texto

jurídico, é fundamental que se tenha presente, inclusive na ciência jurídica, que há

divergências do potencial e dos limites da Inteligência Artificial, mas não de sua realidade

como componente presente e, senão apenas diretamente, direta e indiretamente de sua

influência nas relações políticas, jurídicas e sociais de toda a humanidade.

Mounk (2019, p. 32), já citado, destaca ainda que no decorrer do último quarto de

século “o veloz crescimento da internet, e, em especial, das mídias sociais desequilibrou a

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balança do poder entre insiders e outsiders políticos”. Uma das consequências é que os custos

de se organizar politicamente, para ele, “despencaram”.

Pois bem, não é forçado supor e relevar mesmo para fins acadêmicos, que líderes

políticos em ascensão no Brasil e no mundo estejam utilizando, em conjunto com as redes

sociais, a Inteligência Artificial no sentido de postarem conteúdos que garantam maior

engajamento. De acordo com dados levantados pela plataforma CrowdTangle e compilados

pela agência de comunicação BCW Global, divulgada em abril de 2019, o brasileiro Jair

Bolsonaro é o líder mundial em engajamento no Facebook, à frente de Donald Trump, dos

Estados Unidos, e Nareandra Modi, da Índia. Sendo o engajamento determinado por

algoritmos, é evidente que não se adquire ignorando-se questões técnicas, mas dominando-as,

de modo que líderes de economias tão importantes utilizarem-se das redes sociais

combinando-as com o domínio dos algoritmos da Inteligência Artificial destas plataformas diz

muito sobre a nova relação entre representante e representado.

Mas para além dos líderes, governos centrais como os de Estados Unidos, Dinamarca

e Austrália, já estudam utilizar a tecnologia do Blockchain em seus processos eleitorais, algo

que em se concretizando, poderia reduzir significativamente o custo das eleições, já que o

cidadão ou cidadã poderia votar por um celular ou terminal qualquer com absoluta segurança

no resultado e de que ninguém votaria duas vezes. Entidades do terceiro setor com atuação

global também utilizam desta tecnologia para combater fraudes e melhorar a accountability.

Por fim, a sociedade civil passa a se utilizar de algoritmos para avaliar ações de

governos e até tomar decisões econômicas, por exemplo. É o caso do Índice de Sentimento

das Redes Sociais, desenvolvido pela Startup Arquimedes, que fornece dados para empresas e

mercado financeiro, que ficou conhecido nacionalmente quando anunciou uma queda de 30

pontos em relação a expectativa pela aprovação da reforma da previdência.

Conclusão

Fenoll (2018, p. 32-33), em texto onde analisa a influência da Inteligência Artificial

no processo judicial, destaca os limites que devem ser perseguidos para que se evite conflitos

éticos e constitucionais na aplicação do Direito versus o uso da Inteligência Artificial.

Traçando-se um paralelo com sua ideia de que a defesa de um réu deve conhecer os critérios

por trás da Inteligência Artificial que eventualmente sugira uma decisão para o Magistrado,

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por um razão de direito fundamental ao próprio direito de defesa, tem-se como primeira

conclusão, a partir deste seu pensamento o destaque de que é fundamental que estes critérios

sejam sempre de domínio público, como forma de se evitar a tirania dos algoritmos. A

legislação deve impor que se conheçam os critérios dos algoritmos, em atenção a

accountability. Ou seja, o cidadão-eleitor deve saber, ou, no mínimo, possuir meios acessíveis

de saber como o líder político ou o próprio governo organizam seus algoritmos.

Seja através dos exemplos de utilização cada vez mais frequente de novas

tecnologias por empresas, governos, terceiro setor, sociedade civil e líderes políticos, seja

pelos próprios estudos de caso e pela revisão bibliográfica, conclui-se, ainda, que as relações

sociais e políticas contemporâneas nas principais democracias ocidentais vivem sob a

influência permanente das redes sociais e da Inteligência Artificial acoplada e fora delas, por

meio especialmente dos algoritmos de Inteligência Artificial.

Pois bem, se a crise é algo presente e praticamente unânime na literatura política do

Brasil e do mundo, medida por indicadores e validada pelo confronto dos fatos com

pressupostos largamente aceitos pelas ciências afins, é fundamental, no mais, que se

desenvolvam ideias e ações que apontem para um rumo de reorganização dos Estados

democráticos com vistas ao restabelecimento do processo de crescimento das democracias no

nível global, e, especialmente, de retomada do fortalecimento da democracia brasileira,

mirando-se, quem sabe, no otimismo de Castells (2018, p. 148) que propõe ao final de sua

obra já citada que a humanidade configure “um caos criativo”, no qual se aprenda a “fluir com

a vida, em vez de aprisioná-la em burocracias e programá-las em algoritmos”.

Neste sentido, é possível, porque crível, ainda que seja só uma hipótese carente de

mais e melhores estudos que a confirmem ou não, que os algoritmos dos sites de busca e das

redes sociais, sobretudo estes, mas também os de diversos aplicativos que utilizamos

cotidianamente, estejam (no mínimo) potencializando a polarização política vigente nestes

tempos de resseção democrática. Isto porque é fato que eles segregam a informação dentro de

“caixas” personalizadas, o que ao menos em tese dificulta uma compreensão mais holística

dos diferentes pontos de vista sobre os mais variados tópicos do dia-dia, inclusive político-

ideológicos ou político-partidários, por parte do cidadão “encaixotado”.

Mas se fosse tomada tal hipótese por pressuposto, o que, como se viu, não seria

inovador na literatura política que analisa o tema, ter-se-ia como conclusão que a Inteligência

Artificial é um vilão com peso considerável na crise da Democracia no nível nacional e

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internacional, ainda que como parte de um processo, este sim com alto grau de confiabilidade

acadêmica, que é a redução do engajamento civil condizente às horas que se passa em frente

ao computador, à televisão e outros aparelhos de entretenimento.

A ideia principal que se apresenta como conclusão deste resumo que se pretende um

artigo, assim, é inversamente proporcional, ou seja, sendo ou não a Inteligência Artificial uma

vilã que ajuda a corroer as estruturas do Estado liberal em geral e da Democracia

representativa em particular, certamente é através dela que se executará um antídoto em favor

da retomada do crescimento das democracias no mundo e reconquista das perdas

democráticas já identificadas em democracias antigas e consolidadas, inclusive como

instrumento poderoso de organização de métodos de Democracia participativa, que já conta

com muitos projetos pilotos.

Referências das Fontes Citadas

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ABRANCHES, Sérgio Henrique Hudson de. Presidencialismo de Coalizão: raízes e evolução do modelo político brasileiro. 1ª edição. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.

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1 Graduando em Direito, modalidade Integral, pela Escola Superior Dom Hélder Câmara

2 Graduanda em Direito, modalidade Integral, pela Escola Superior Dom Hélder Câmara

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A LUTA POR JUSTIÇA PELOS DESALOJADOS EM CONSEQUÊNCIA DA LAMA DA VALE

LA LOTTA PER LA GIUSTIZIA PER GLI HOMELESS COME RISULTATO DEL FANGO DELLA VALLE

Arthur Bernardo Cunha e Silva 1Clara Borges Cerqueira 2

Resumo

Essa pesquisa examina as tecnologias oferecidas pelo Estado à população, proporcionando a

ela meios para reivindicarem seus direitos de propriedade violados pela lama e pela

apropriação da mineradora, bem como analisa os processos adotados pela empresa. Discute-

se, também, sobre o termo de confidencialidade assinado entre a Vale e os moradores. Tal

projeto trouxe evidências quanto aos atos da empresa em Brumadinho, possibilitou uma

análise crítica acerca da situação dos moradores. A pesquisa que se propõe pertence à

vertente metodológica jurídico- sociológica. Quanto à investigação, pertence à classificação

de Witker (1985) e Gustin (2010), o tipo jurídico-projetivo. Predominará o raciocínio

dialético.

Palavras-chave: Direito a propriedade, Apropriação, Violação de direitos, Desalojados

Abstract/Resumen/Résumé

Questa ricerca esamina le tecnologie offerte dallo Stato alla popolazione, fornendo loro i

mezzi per rivendicare i loro diritti di proprietà violati dal fango e l'appropriazione della

società mineraria, nonché analizzando i processi adottati dalla società. Viene inoltre discusso

l'accordo di riservatezza firmato tra Vale e i residenti. Tale progetto ha portato prove relative

alle azioni dell'azienda a Brumadinho, ha permesso un'analisi critica della situazione dei

residenti. La ricerca proposta appartiene all'aspetto metodologico giuridico-sociologico. Per

quanto riguarda l'inchiesta, appartiene alla classificazione di Witker (1985) e Gustin (2010),

il tipo legale-proiettivo. Il ragionamento dialettico prevarrà

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Ho detto alla proprietà, Appropriazione, Violazione dei diritti, Senza casa

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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A presente pesquisa tem como temática o Direito de Propriedade, o qual foi violado

pela queda da barragem de rejeitos da Vale S/A na cidade de Brumadinho, e a falta de uma

assistência jurídica aos atingidos, evidenciando uma deficiência tecnológica de comunicação

do Estado com o indivíduo. Outrossim, os rejeitos prejudicaram o abastecimento de água,

fazendo-se necessária a apropriação de terrenos para realização das obras para sanar a

necessidade pública emergida, contudo há evidências de ilegalidade nesse processo.

É necessário ponderar que a propriedade é um Direito de todos os cidadãos, conforme

está disposto no art. 5, inciso XXII da CR/88. Entretanto há duas formas em que o indivíduo

pode perder sua moradia: se desalojado ou desapropriado. No primeiro caso, é dever do Estado

oferecer assistência ao desamparado, pois esse está em situação de vulnerabilidade sanitária e

social, como previsto no art.6º da Constituição. A segunda forma, é quando o Estado, por

necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, carece da apropriação de uma

propriedade particular, tomando-a para si através do procedimento legal disposto no Decreto-

Lei 3.365/1941.

Nesse seguimento, é possível afirmar que é preciso uma comunicação eficiente entre

o Estado e o indivíduo, para que esse tenha acesso a justiça e possa reivindicar o reconhecimento

dos seus Direitos, seja em situação de desapropriação ou desalojamento. Dessa forma, é

importante salientar que, a partir das situações supracitadas, é dever do Estado estabelecer essa

comunicação, pois, no primeiro caso, o poder público se interessa pela posse de propriedade

particular e no segundo, o indivíduo não tem condição de buscar esse acesso. Não obstante, em

Brumadinho observou-se uma carência ao acesso à justiça por parte afetados, demonstrando

um atraso do Estado com a chamadas TICs (Tecnologia da Informação e Comunicação), por

meio da qual seria possível uma comunicação mais rápida e efetiva.

A pesquisa que se propõe pertence à vertente metodológica jurídico-sociológica. No

tocante ao tipo de investigação, foi escolhido, na classificação de Witker (1985) e Gustin

(2010), o tipo jurídico-interpretativo. O raciocínio desenvolvido na pesquisa será

predominantemente dialético. Dessa maneira, a pesquisa se propõe a esclarecer se a

Constituição brasileira de 1988 e o Decreto de Lei nº 3.365, de 21 de Junho de 1941, no tocante

ao direito de propriedade, está sendo executado corretamente, e investigar os recursos

tecnológicos oferecidos pelo Estado para prestação de assistência jurídica aos afetados.

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2- LESÃO AOS DIREITOS DE PROPRIEDADE VIOLADOS PELA VALE S/A

A propriedade começou a ser vista como direito fundamental com Locke, o qual defendia

que todos, indistintamente, a alcançariam por estar intrínseca ao ser humano, isto é, o homem

é um proprietário, seja de si mesmo, da sua liberdade ou de seus bens. Complementando o

iluminista, Diniz afirma que a posse da propriedade privada é importante pois ela permite ao

indivíduo “um melhor desenvolvimento de suas faculdades e de sua atividade” (2012, p. 127).

Portanto, a defesa da propriedade privada, sendo um direito fundamental, é imprescindível para

o desenvolvimento da sociedade e sua convivência.

A queda da barragem em Brumadinho resultou na violação da propriedade pela lama,

desalojando moradores das comunidades do Córrego do Feijão e do Parque da Cachoeira. Dessa

forma, fez-se necessário o amparo a esses indivíduos pela da mineradora, a fim de garantir as

vítimas os direitos sociais defendidos no art. 6º da CR/88. Porém quanto ao processo, aos

valores e as assistências prestadas a esse público nada se sabe até o presente momento, pois foi

assinado um acordo de confidencialidade entre as partes. Contudo, essa conciliação pode ser

perigosa devido ao fato das comunidades atingidas serem habitadas por pessoas de baixo nível

econômico-social e, principalmente, baixo nível de escolaridade. Portanto a negociação coletiva

se faz necessária em favor dos cidadãos para que esses tenham ciência dos seus direitos e

possam reivindica-los em caso de negligência. Como sustenta Sperling, promotor de justiça,

A Vale se aproveita da situação criada pela tragédia que ela mesma provocou

para fazer com que as pessoas aceitem acordos violadores. E depois que tiver

vários acordos individuais, a empresa poderá apresentá-los à Justiça como

padrão de indenização (SPERLING apud PEDUZZI, 2019).

O fundamento social da negociação coletiva pode ser compreendido a luz de Honneth

(2003, pg. 119, 120), “só quando dois indivíduos se veêm confirmados em sua autonomia por

seu respectivo defrontante, eles podem chegar de maneira complementária a uma compreensão

de si mesmos como EU autonomamente agente e individuado”. Ou seja, o indivíduo consegue

maior efetividade na busca pelo reconhecimento quando está adequado dentro de um grupo.

Dentre as consequências dos rejeitos provenientes do rompimento da barragem, houve

um prejuízo no abastecimento de água em toda Região Metropolitana de Belo Horizonte, pois

a lama atingiu o ponto de captação do Rio Paraopeba. Dessa forma, é necessário a construção

de um novo ponto para satisfazer a necessidade pública emergida, devendo ser realizada

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naquele dado momento. Assim sendo, em outubro de 2019 a justiça autorizou a execução das

obras a serem feitas pela Vale S/A sob o pedido da Copasa (Companhia de Saneamento de

Minas). Contudo para realização dessas construções seria necessário desapropriar alguns

moradores, dado isso, a juíza Perla Salibo Brito determinou em sua decisão da Tutela

Antecipada Antecedente do TJMG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais), seguindo o decreto

lei 3.365/1941, o processo de desapropriação a ser aplicado para realização das obras

Entretanto há denúncias de irregularidade no processo legal de desapropriação da

Vale. O art. 10-A do Decreto-lei nº 13.867, de 26 de agosto de 2019, o qual altera o dispositivo

do Decreto nº 3.365, afirma: “O poder público deverá notificar o proprietário e apresentar-lhe

oferta de indenização” (BRASIL, 2019).

Dessa forma, é possível afirmar que é necessário ciência prévia do proprietário

quanto ao processo que está para ocorrer. Conforme isso, a decisão da Tutela Antecipada

Antecedente do TJMG (MINAS GERAIS, 5002285-98.2019.8.13.0090, 2019), dispõe:

Ressalvado o ingresso imediato nas frações dos imóveis em questão nas quais

haja necessidade de demolição e/ou desalojamento de edificações, caso em

que, à luz dos princípios da dignidade da pessoa humana, da razoabilidade e

da proporcionalidade, prestigiados pela Constituição Federal, será concedido

o prazo de 30 (trinta) dias para o proprietário proceder à desocupação, a contar

da intimação desta decisão.

Porém, denúncias feitas a BandNews FM demonstra um desacordo da mineradora e

da Copasa com a jurisprudência, como é o caso da Claudia Saraiva, a moradora afirma que foi

desapropriada sem nunca ter sido procurada pela mineradora ou por qualquer representante do

poder público (Notícias Band Oul, 2020). É importante informar que seu não nome consta

como requerido na decisão da tutela supracitada. Esse caso permanece em aberto e demonstra

um confronto com a decisão judiciária por parte da Vale e do Ministério Público Estadual.

O decreto-lei 13.867, de 26 de agosto 2019, pormenoriza o art.5º, inciso XXIV

da Constituição Federal de 1988, dita que a desapropriação deve ser feita com justa e prévia

indenização em dinheiro (BRASIL, 1988). Todavia, houve relatos de moradores afirmando que

essa lei foi transgredida, Norma Saraiva Soares em entrevista ao MG no Ar (R7, 2019), alega

que sua indenização foi injusta, “[...] ainda me sinto roubada, porque um terreno que vale um

milhão e quinhentos as pessoas (Vale) estão pagando 200 mil”. Contudo, a decisão da Tutela

Antecipada Antecedente do TJMG (MINAS GERAIS, 5002285-98.2019.8.13.0090, 2019)

alega que houve uma justa indenização e justifica a diferença: “sobre a diferença entre o valor

a ser levantado pelos expropriados e o valor a ser fixado na sentença haverá incidência de juros

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compensatórios”. Porém, indo de forma contrária a esse fragmento, Meirelles (2015, p.730),

aponta que a justa indenização inclui, o valor do bem, sua renda, danos emergentes e lucros

cessantes, além dos juros compensatórios e moratórios, despesas judiciais, honorários de

advogado e correção monetária. Portanto, pode-se questionar a “justa indenização” determinada

pela juíza, já que em sua visão seria ela o montante do valor pago mais os juros compensatórios,

resultando no valor do bem, por outro lado, para Meirelles o justo seria o valor do imóvel, os

compensatórios, as despesas do processo mais outros valores que devem ser levados em conta.

3- A UTILIZAÇÃO DA TECNOLOGIA COMO ALIADA NA COMUNICAÇÃO

ESTADO E INDIVÍDUO

É correto afirmar que a possível negligência de Direitos assinado pelos desalojados em

um acordo com a Vale é fruto da desinformação, demonstrando o atraso das comunidades mais

pobres. Paralelo a isso, tem-se as denúncias de transgressão dos Direitos de Propriedade, as

quais demonstram uma deficiência da comunicação entre o Estado e o indivíduo, dificultando

a busca por justiça deste último. Portanto, observa-se um atraso do Estado com a Tecnologia

da Informação e Comunicação (TIC).

A TIC tem por objetivo estabelecer estratégias e recursos para captação, organização,

interpretação e manuseio das informações, sendo, também, utilizada para potencializar os

processos de comunicação. Sua importância é justificada pelo seu benefício a popularização do

acesso à informação, o que permite o desenvolvimento humano através da troca de experiências

e compreensão crítica da realidade.

A partir disso, é possível afirmar que o Estado não possui meios tecnológicos que

facilitam sua comunicação com o indivíduo, dificultando a busca por reconhecimento de seus

cidadãos. Verdade acentuada pelo descumprimento da jurisprudência que ditava o processo de

desapropriação em Brumadinho, fato é, Cláudia Saraiva foi desapropriada sem nunca ter sido

comunicada. Além disso, essa deficiência do poder público também dificulta o acesso de sua

população a justiça, como é bem observado no caso da Norma Saraiva Soares, a moradora se

sente injustiçada pelo preço pago a sua propriedade, contudo ela não possui meios eficazes para

buscar reconhecimento do Estado.

Além do sucateamento da comunicação, o Estado também deixa a desejar quando o

assunto é acesso à informação. As comunidades atingidas pelos rejeitos são carentes e

pertencem a zona rural, o que facilita a omissão de Direitos no acordo de confidencialidade,

pois, de acordo com o IBGE (2017) cerca de 50% da população rural não tem acesso à internet,

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a qual, hoje, é considerada o principal meio de se obter informação. Entretanto, 30% desses

cidadãos afirmam não possuir esse meio por não saber usá-lo e outros 40% alegam falta de

interesse. Esses dados evidenciam a ignorância dessa parcela da sociedade, proveniente do

descaso do poder público. Dessa forma é importante a instalação de telecentros nessas

comunidades, porque eles não permitem apenas o acesso à informação, mas também consistem

“em fornecer a comunidade local um espaço que possibilite geração de novas oportunidades,

desenvolvimento e transformação de sua realidade” (PANTOJA, 2008, p.11).

4- CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir do exposto, verifica-se que há possível desaplicação de Direitos no termo de

confidencialidade assinada entre Vale e as vítimas desalojadas, pois os padecedores não

possuem acesso amplo à informação, dessa forma, estão suscetíveis ao desconhecimento de

seus direitos. Ademais, existem evidências de transgressão da jurisprudência sobre a

desapropriação e há o que se questionar nessa decisão quanto a indenização.

Não obstante, a carência da tecnologia dificulta o acesso à informação e facilita falhas

na comunicação, podendo resultar em um desentendimento com os termos legais, como pôde

ser observado na pesquisa apresentada. Assim, com exatidão, é possível afirmar que o desdém

com a tecnologia contribuiu de forma direta para gerar os problemas apresentados.

O alcance à informação exige do Estado um empenho na criação de telecentros, os

quais facilitariam o acesso dos desfavorecidos a ela e poderia abrir novas oportunidades de

conhecimento. Aliado a isso, há o que se desenvolver quanto a comunicação do poder público

com a sua população, sendo necessário o desenvolvimento de um meio eficiente e efetivo.

5- REFERÊNCIAS.

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2020.

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21 de junho de 1941. Brasília, DF: Presidência da República, 26 ago. 2019. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13867.htm#art1. Acesso em:

16 maio 2020.

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VALE desapropria moradores afetados por barragem em Brumadinho sem aviso prévio:

Copasa diz que precisava dos terrenos para construir um novo ponto de captação de água no

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https://noticias.band.uol.com.br/noticias/100000984605/vale-desapropria-moradores-

afetados-por-barragem-em-brumadinho-sem-aviso-previo.html. Acesso em: 25 abr. 2020.

WITKER, Jorge. Como elaborar uma tesis en derecho: pautas metodológicas y técnicas para

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1 Graduanda em Direito, modalidade Integral, pela Escola Superior Dom Helder Câmara.1

A NATUREZA GRITA PELA VIDA: O DIREITO AMBIENTAL E AS TECNOLOGIAS DE COMBATE À EXTINÇÃO DE ESPÉCIES

NATURE CRIES FOR LIFE: ENVIRONMENTAL LAW AND TECHNOLOGIES TO FIGHT SPECIES EXTINCTION

Edwiges Carvalho Gomes 1

Resumo

A presente pesquisa aborda os animais sob a perspectiva do ordenamento jurídico brasileiro e

a relação entre as ações humanas e o aumento da extinção de espécies. Conclui-se que esse

fenômeno é natural, todavia o ser humano é o principal precursor para que essa circunstância

ocorra de forma degradante na natureza. Assim, as tecnologias representam importantes

instrumentos no combate à extinção de espécies. A pesquisa pertence à vertente

metodológica jurídico-sociológica. Quanto à averiguação das informações, foi selecionado na

classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), o tipo jurídico-projetivo. Predominará o

raciocínio dialético.

Palavras-chave: Extinção de espécies, Biodiversidade, Ordenamento jurídico

Abstract/Resumen/Résumé

This research addresses animals from the perspective of the Brazilian legal system and the

relationship between human actions and the increase in species extinction. It is concluded

that this phenomenon is natural, however the human being is the main precursor for this

circumstance to occur in a degrading way in nature. Thus, technologies represent important

instruments in the fight against species extinction. The research belongs to the juridical-

sociological methodological aspect. As for the investigation of the information, the legal-

projective type was selected in the classification of Witker (1985) and Gustin (2010).

Dialectical reasoning will predominate.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Species extinction, Biodiversity, Legal order

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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A presente pesquisa expõe seu primórdio no tema que aborda a questão das

tecnologias que auxiliam no combate à extinção de espécies animais e como o Direito

Ambiental se manifesta frente a essa complexa conjuntura. Sob esse viés, é possível analisar

como as ações antrópicas têm acarretado significativos efeitos no aumento do

desaparecimento de espécies e como as inovações tecnológicas estão contribuindo para

amenizar essa realidade. À vista disso, urge averiguar essa temática sob a perspectiva jurídica.

A princípio, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CR/1988),

norma de maior hierarquia do ordenamento jurídico do país, prevê ao Poder Público e à

coletividade preservar a multiplicidade do complexo genético brasileiro, bem como proteger a

fauna e a flora. Todavia, a realidade, majoritariamente, diverge desses princípios

constitucionais, tendo em vista que as atividades humanas acompanhadas pelo viés

econômico, principalmente, transformam o meio ambiente conforme suas necessidades e

interesses, o que altera a biodiversidade e modifica o ciclo ecológico. Assim, muitas espécies

são afetadas diariamente.

Segundo Diniz (2017), os principais fatores que ocasionam a extinção da fauna

nativa são: expansão urbana; tráfico de animais silvestres; queimadas; formação de áreas de

cultivo; caça e pesca excessivas; destruição de florestas para extração de madeira; poluição e

o uso indevido dos recursos naturais. Nessa perspectiva, o ambiente terrestre e marinho são

acometidos diretamente pelo comportamento humano, posto que muitos habitats são afetados

e toda a ordem sistêmica deformada. Há, portanto, o desequilíbrio da diversidade biológica.

Dessa forma, a pesquisa que se apresenta pertence à vertente metodológica jurídico-

sociológica. No que se refere à averiguação das informações e dados, foi selecionado na

classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), o tipo jurídico-projetivo. O raciocínio

desenvolvido na pesquisa será predominantemente dialético. Logo, a presente pesquisa se

propõe a analisar as tecnologias como meio de auxiliar no combate à extinção de espécies,

para que essas possam exercer plenamente sua função ecológica na natureza, conforme os

princípios constitucionais e o entendimento do Direito Ambiental.

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2. OS ANIMAIS À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO E A

EXTINÇÃO DE ESPÉCIES

A Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), de 5 de outubro de 1988,

representa uma nova forma de proteção aos animais em âmbito constitucional, posto que

assegura a eles direitos fundamentais. Sob esse viés, essa parcela de viventes é tutelada por

direitos que consistem em princípios e valores primordiais ao ordenamento jurídico brasileiro.

Logo, há uma transformação significativa da concepção jurídica no que tange aos animais.

Nesse sentido, a CR/88 explicita com clareza que:

Capítulo VI - Do Meio Ambiente

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de

uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder

público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e

futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:

[...]

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem

em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os

animais a crueldade (BRASIL, 1988).

À vista disso e em conformidade com Dias e Salles (2017), os constituintes

possibilitaram aos animais a garantia dos direitos fundamentais, que foram considerados e

positivados pelas Constituições dos Estados. Entretanto, o que se observa no cenário atual

brasileiro é que o índice de animais ameaçados de extinção está aumento sem precedentes, o

que representa uma divergência dos preceitos constitucionais estabelecidos. Logo, há um

desequilíbrio ecológico evidente que afeta ecossistemas e influencia na vivência humana.

Segundo Costa (2018), BBC Brasil, a fauna está sendo suprimida pelas atividades

humanas, seja com o desmatamento e o tráfico de animais silvestres, seja com as ondas de

calor geradas pela mudança climática. Por conseguinte, essas alterações no meio ambiente

acarretam inúmeros efeitos que levam à extinção de espécies, como a impossibilidade dos

animais exercerem suas respectivas funções ecológicas e um desequilíbrio sistêmico. À vista

disso, o uso indevido e descontrolado dos recursos naturais pela espécie humana tem gerado,

ao longo do tempo, resultados irreparáveis a todos os ecossistemas.

Sob esse viés, o Direito Ambiental se tornou paradigma no ordenamento jurídico

brasileiro. Pois, trouxe a debate questões pertinentes à degradação do meio ambiente, bem

como a busca por alternativas que tornem as normas ambientais mais eficazes. No entanto, o

Direito Animal ainda é considerado uma vertente transversal ao Direito Ambiental.

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De acordo com Bizawu (2015), os ideais humanos têm convergido para uma maior

seguridade dos animais não-humanos, como pode ser constatado pela Declaração Universal

dos Direitos dos Animais de 1978, que considera como princípio basilar que eles possuem o

direito à vida. Nesse sentido, urge analisar a Teoria dos Direitos dos Animais, proposta pela

doutora e professora brasileira Edna Cardozo Dias, sob uma perspectiva autônoma e singular:

Assim como as pessoas jurídicas ou morais possuem direitos de personalidade reconhecidos desde o momento em que registram seus atos constitutivos em órgão competente, e podem

comparecer em Juízo para pleitear esses direitos, também os animais tornam-se sujeitos de direitos

subjetivos por força das leis que os protegem. Embora não tenham capacidade de comparecer em

Juízo para pleiteá-los, o Poder Público e a coletividade receberam a incumbência

constitucional de sua proteção [...]. Se cotejarmos os direitos de uma pessoa humana com os

direitos do animal como indivíduo ou espécie, constatamos que ambos têm direito à defesa de

seus direitos essenciais, tais como o direito à vida, ao livre desenvolvimento de sua espécie, da

integridade de seu organismo e de seu corpo, bem como o direito ao não sofrimento.

Podemos concluir que os animais são sujeitos de direitos e que seus direitos são deveres de

todos os homens (DIAS, 2000, p. 36-37).

A teoria dos direitos dos animais proposta pela professora em Direito Ambiental contribuiu

para que o Direito Animal se tornasse debatido no Brasil e discutido no âmbito das ciências

jurídicas. Pois, reconhece os animais como seres que possuem direitos, sendo que estes devem ser

protegidos pelos seres humanos. Dessa forma, pela circunstância dos animais serem sujeitos dos

deveres humanos é o que torna estes como protetores da garantia da proteção animal.

Logo,a ideia é se voltar para o presente contexto dos animais, levando em consideração que

muitos deles estão ameaçados de extinção devido a transgressão de seus direitos fundamentais pelo

ser humano principalmente. Portanto, é primordial averiguar e examinar a relevância do Direito

Ambiental e das tecnologias de combate a extinção de espécies, tendo em vista promover a proteção

e defesa dos direitos dos animais e, consequentemente, a preservação da biodiversidade.

3. AS TECNOLOGIAS QUE CONTRIBUEM NA MINIMIZAÇÃO DA

EXTINÇÃO DE ESPÉCIES SOB A PERSPETIVA DA ÉTICA AMBIENTAL

“A ameaça ao meio ambiente é questão relativamente ética. Para que ela cesse, o

mundo depende urgentemente de uma alteração de conduta. É necessário saber, conhecer qual

o caminho deve ser seguido para alcançar tal propósito” (DIAS; SALLES, 2017, p.23). Nesse

sentido, as inovações tecnológicas representam aliadas importantes na busca pela conservação

ambiental e, por conseguinte, na preservação da vida de espécies ameaçadas de extinção. Em

vista disso, torna-se primordial investigar a atribuição dessas tecnologias no meio ambiente.

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Conforme Raxter (2018), National Geographic, existem promissoras inovações

tecnológicas direcionadas à temática proposta. A título de exemplo, as câmeras térmicas

localizadas ao longo de áreas de preservação e trilhas, são capazes de rastrear de forma

remota a entrada de caçadores ilegais em áreas protegidas, dado que distingue movimentos

naturais de comportamentos humanos e, consequentemente, enviam alertas imediatos aos

guardas-florestais quando detectam esse tipo de situação. Portanto, contribuem para a

proteção da fauna e o bem-estar ecológico nas proximidades onde são instaladas.

Ademais, a análise de DNA (incorporada inicialmente pela Universidade de

Washington) representa uma das formas de investigar crimes contra os animais silvestres.

Pois, é capaz de examinar o DNA do marfim na ocasião em que compara ao mapeamento das

manadas de elefantes com base no DNA. Desse modo, torna-se possível aos agentes descobrir

a procedência do marfim ilegal e aumentar a fiscalização em áreas de risco (RAXTER, 2018).

Nessa continuidade, o código de barras desenvolvido por pesquisadores canadenses

viabiliza identificar espécies por meio de mínimas parcelas de seus respectivos compostos

genéticos. À vista disso, desenvolveu-se o projeto “Código de Barras Internacional da Vida”

que consiste em um conjunto de dados global de espécies através do código de barras de

DNA, que já é factual e abarca participação brasileira na iniciativa. Logo, a identificação das

espécies torna-se mais célere e a verificação de seus pertinentes riscos (RAXTER, 2018).

Como afirmado por Raxter (2018), alguns países desenvolveram aplicativos que

notificam em tempo real guardas locais quanto a informações sobre a movimentação dos

animais rastreados e dados ambientais onde eles estão inseridos. Nessa perspectiva, os

dispositivos de rastreamento, elaborados por ambientalistas, funcionam por meio de Sistema

de Posicionamento Global (GPS) e smartphones, que enviam dados sobre a localização e

mobilidade dos animais via satélite ou pelas redes móveis locais, o que alerta acerca de

possíveis ameaças. Destarte, essa tecnologia contribui na preservação da biodiversidade local.

Conforme o Projeto Tamar (2020), os microchips também representam uma inovação

tecnológica, uma vez que possuem pequena dimensão e expressam maior durabilidade se

comparados às anilhas metálicas. À vista disso, eles são inseridos nas nadadeiras dianteiras

das fêmeas das tartarugas-de-couro (Dermochelys coriacea), consideradas como

“Criticamente Ameaçada de Extinção” no Brasil, após a desova dos ovos; a nova tecnologia é

identificada através de um leitor próprio para essa marcação. Dessa forma, é possível uma

identificação individual mais eficaz das tartarugas e melhores medidas para sua conservação.

Para Dias e Salles,

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A formação de uma consciência ecológica ética é vista como única alternativa para

tornar possível a vida num planeta vítima de tantas degradações. Uma ética capaz de

converter a ideia de que a natureza é um meio para que o homem alcance os seus

fins. É mais que urgente reavivar os valores éticos como a bondade e a solidariedade

para com o meio ambiente e com todas as espécies de um modo geral (DIAS;

SALLES, 2017, p.24-25).

À vista disso, urge debater a temática de que o meio ambiente é um bem comum de

toda a humanidade, como também reconhecer que a natureza não é um espaço de satisfação

das necessidades e desejos antrópicos, mas um grande ecossistema que deve ser preservado.

Desse modo, a educação é um meio crucial para alcançar este fim e, por conseguinte, uma

ética ambiental, como afirma Freire: “Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem

ela tampouco a sociedade muda” (FREIRE, 2000, p. 31). Assim, as tecnologias analisadas

representam instrumentos importantes na busca pela conservação ambiental e na preservação

da vida de espécies ameaçadas de extinção, o que reforça o princípio da ética ambiental.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da análise, é possível verificar que os animais não humanos são

considerados, no ordenamento jurídico brasileiro, como sujeitos de direitos fundamentais.

Todavia, esse princípio é violado na medida que as ações humanas representam a principal

causa, majoritariamente, para que um fenômeno natural possa ocorrer de maneira drástica e

rápida no meio ambiente, que é a extinção de espécies. Logo, o ser humano tem se tornado o

agente principal da minimização da heterogeneidade biológica no Brasil e no mundo.

À vista disso, é notório que as tecnologias estão se tornando, progressivamente,

importantes instrumentos na busca por alternativas mais sustentáveis e ecológicas. Nessa

perspectiva, é necessário ressaltar a importância que as inovações tecnológicas analisadas, em

especial, têm contribuído para a preservação de espécies, uma vez que possibilitam formas

mais otimizadas de fiscalização e manutenção do equilíbrio sistêmico. Dessa forma, a

tecnologia tem sido uma ferramenta relevante para reparar os efeitos humanos na natureza.

Por fim, a problemática ambiental representa instabilidade e divergência dos valores

éticos humanos. Sob esse viés, a consciência ética está relacionada no fato do indivíduo

superar a concepção de que o meio ambiente deve mitigar suas necessidades e direcionar-se a

uma compreensão de que o equilíbrio e a preservação da natureza são aspectos primordiais

para uma harmoniosa qualidade de vida. Assim, torna-se possível compreender a ética

ambiental como princípio regulador para o bem viver entre o ser humano e o meio ambiente.

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Freire-Pedagogia-da-indigna%C3%A7%C3%A3o.pdf. Acesso em: 30 mai. 2020.

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el estudiante o investigador del derecho. Madrid: Civitas, 1985.

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1 Graduanda em Direito, modalidade integral, pela Escola Superior Dom Helder Câmara e em Ciências do Estado pela UFMG

2 Graduando em Direito, modalidade integral, pela Escola Superior Dom Helder Câmara

1

2

A SEGUNDA CORRIDA ESPACIAL: A CORRIDA NO ÂMBITO INTERNACIONAL PARA A EXPLORAÇÃO DA LUA E O DIREITO AMBIENTAL

SUSTENTÁVEL NO ESPAÇO SIDERAL

THE SECOND SPACE RACE: THE RACE ON INTERNATIONAL AMBIT FOR THE MOON EXPLORATION AND ENVIRONMENTAL LAW IN OUTER SPACE

Thaís Peixoto Saraiva Coimbra 1Wesley Bartolomeu Fernandes de Souza 2

Resumo

A pesquisa apresentada se consiste na avaliação da Lua ser um dos focos de possível

mineração principalmente para os Estados Unidos. Portanto, a problemática seria o

questionamento de violação ao Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades dos

Estados na exploração e Uso do Espaço Cósmico, inclusive a Lua e demais Corpos Celestes.

Como será aplicado o Direito Ambiental neste caso? A sustentabilidade se aplicará ao astro?

É possível afirmar aprioristicamente que os Tratados internacionais referentes ao espaço

serão questionados e que, provavelmente, o capitalismo será levado em consideração de

maneira primordial ao estabelecer os limites sustentáveis do astro explorado.

Palavras-chave: Direito espacial, Direito ambiental, Direito internacional, Lua, Mineração

Abstract/Resumen/Résumé

The presented research consists from an evaluation of the moon being the focus of a possible

mining operation for United States. Therefore, the question of focus would be on violation of

the Treaty on Principles Governing the Activities of States in the Exploration and Use of

Outer Space. How would the Environmental Law be applicable in this case? The

sustainability is applicable to celestial body? It is possible to affirm that international treaties

referring to outer space will be questioned and capitalism would be first taken in

consideration for establishment of sustainable limits to the celestial body in question.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Space law, Environmental law, International law, Moon, Mining

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2

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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A Corrida Espacial ocorrida entre os Estados Unidos da América (EUA) e a União

Soviética (URSS), de 1957 a 1975, gerou um grande desenvolvimento tecnológico para a

Humanidade, tendo ocorrido a tão almejada chegada à Lua, há 51 anos. Ademais, tal corrida

foi dada como finalizada após uma missão conjunta de americanos e soviéticos, marcando

assim uma nova era de desenvolvimento tecnológico baseado na cooperação internacional.

Entretanto, como esclarece Stephen Hawking em sua última obra, “Breves perguntas

para grandes respostas”:

Não há dúvida de que ingressamos em uma nova era espacial. Os primeiros astronautas da iniciativa privada serão pioneiros, e os primeiros voos serão caríssimos, mas minha esperança é que, com o tempo, eles ficarão ao alcance de muito mais pessoas. Levar cada vez mais passageiros ao espaço trará novo significado a nosso lugar na Terra e a nossas responsabilidades como seus guardiães e nos ajudará a aceitar nosso lugar e nosso futuro no cosmos. (HAWKING, 2018)

Ou seja, a tendência de expansão é eminente, e podemos enxergar tal fato no

lançamento histórico do foguete Falcon 9, pela SpaceX com o apoio dos Estados Unidos da

América, ocorrida em 30 de Maio de 2020. Dois astronautas foram enviados em missão à

Estação Espacial Internacional (ISS), pela empresa privada referida, diretamente do solo

Americano. Uma ação similar a esta não ocorre há quase 9 anos.

Desde 1972, a Lua se mantém praticamente intocada, mas seu potencial como fonte de

minérios e outros recursos naturais a serem explorados não é ignorado. Diante disso, diversas

empresas e nações possuem interesse em explorá-la, buscando ouro, platina e até mesmo

água. Incluindo os Estados Unidos da América.

O pronunciamento do presidente Trump, a respeito da Lua e sua exploração no

primeiro semestre de 2020, reafirmou o interesse, de tom colonizatório, em explorar os

recursos lunares, assinando um decreto entregando o direito, ao seu próprio país, de explorar o

astro. Portanto, é justificado os avanços decorrentes e acelerados de parcerias da SpaceX e

National Aeronautics and Space Administration (NASA). Em suma, foi dada a largada de

uma Segunda Corrida Espacial, dessa vez entre mais de dois países específicos.

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2. DAS LEIS ESPACIAIS

Primeiramente, segundo José Monserrat Filho, o Direito Espacial está inserido no

Direito Internacional Público e é responsável pela regulamentação de todas as atividades no

espaço cósmico, o estabelecendo um regime jurídico. Nesse sentido, o Direito Espacial nasce

junto a corrida Espacial, no momento em que a União Soviética lança o primeiro Satélite

artificial - Sputnik 1 - surgindo assim a necessidade de regulamentação com a sua entrada em

órbita.

Diante disso, um dos principais documentos da legislação espacial seria o Tratado

sobre Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na exploração e Uso do Espaço

Cósmico, inclusive a Lua e demais Corpos Celestes, de 1967, também chamado de Tratado

Espacial. Tratado este que estabelece, em seu artigo 1º, que o espaço sideral deve ser livre

para exploração e uso por todos os Estados mas serão realizadas em benefício e pelo interesse

de todos os países sendo uma província de toda a humanidade. Além disso, estabelece, em seu

artigo 2º, que “o espaço exterior não está sujeito a apropriação nacional por reivindicação de

soberania, por meio de uso ou ocupação, ou por qualquer outro meio”.

Joanne Wheeler, diretora da empresa especializada em temas espaciais Alden

Advisers, descreve o tratado supracitado como a "Carta Magna do espaço", afinal o acordo

em seus primeiros artigos define o espaço cósmico e os corpos celestes como bem comum da

humanidade (res communis omnium) sendo proibido sua apropriação, e seu uso e exploração

devem contemplar os interesses de todos os países. Portanto, os Estados Unidos da América

como signatário de tal tratado desde 27 de Janeiro de 1967, tendo sediado uma das aberturas

para assinaturas, está violando os artigos referidos quando seu representante divulga a

necessidade exploratória do astro lunar. O presidente Trump está violando um tratado base do

Direito Espacial.

Vale ressaltar também, a instauração em 2015, da Lei de Competitividade Comercial

do Espaço, aprovado pelos EUA, que reconhece o direito dos cidadãos terem posse de

qualquer recurso minerado de asteroides. Vemos o princípio, que não se estende à Lua ainda,

sendo disseminado e criando uma possibilidade de se estender em aplicabilidade para o astro

lunar.

3. A JURISDIÇÃO AMBIENTAL DIANTE DO ASTRO LUNAR

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A Humanidade está prestes a iniciar a mineração da superfície da Lua. De acordo com

Schmitt, autor do livro “Return to the moon: exploration, enterprise and energy in the human

settlement of space” (2006), a grande dificuldade seria enviar foguetes da Terra para a lua a

um custo muito mais baixo do que os que mantêm a Nasa. Fator este resolvido pela SpaceX e

sua parceria com os EUA. Entretanto, como se aplicaria o Direito Ambiental?

Gerald Kulcinski, da Universidade de Wisconsin, um dos responsáveis pela pesquisa

sobre fusão nuclear nos Estados Unidos, estima que exista um milhão de toneladas de hélio-3

na Lua, sendo que somente 25% pode ser trazido à Terra. Contudo, essa quantidade é

suficiente para suprir as demandas de energia do nosso planeta por dois séculos ou mais.

Ainda que a futura mineração além da Terra represente um marco da exploração espacial, é

necessário abordar a questão do dano que causaremos. Afinal, com a participação das

empresas privadas, certamente o lucro será o grande objetivo das ações tomadas, sendo

necessário refletir em questões de responsabilidade ambiental.

Supondo um descumprimento do Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades

dos Estados nessa nova corrida espacial, devemos buscar a maior sustentabilidade possível

nas ações mineradoras lunares.

Citando o exemplo do Tratado da Antártida, a Antártida, juntamente com o espaço e

os fundos oceânicos, constitui uma grande fronteira para a humanidade. Este Continente é o

mais desconhecido e o mais preservado de todos os continentes, por ser difícil entrar em

contato com ele. Portanto, foi criado o Tratado da Antártida com o objetivo de sempre

utilizar o continente exclusivamente para fins pacíficos afastando um cenário de discórdias

internacionais.

Em 1991, foi instaurado o Protocolo ao Tratado da Antártica sobre Proteção do Meio

Ambiente, responsável pelo reforço do caráter de proteção e preservação ambiental, que deve

permear todas as atividades na região. Sendo assim, foi banida a possibilidade de mineração

na Antártica e o continente foi declarado como “reserva natural, dedicada à paz e à ciência.”

Em suma, é possível fazer uma analogia da responsabilidade ambiental da Antártida

com a Lua. Seria necessário o mesmo nível de proteção ambiental, e instauração de um

protocolo lunar. Concomitantemente a tal fato, ainda que o Tratado sobre Princípios

Reguladores das Atividades dos Estados seja descumprido e uma exploração lunar ocorra,

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cairemos em um ciclo vicioso, onde a história se repetirá. Era permitida a mineração na

Antártida, parcialmente, e posteriormente foi proibida. O mesmo ocorrerá no astro Lunar.

Urge que a comunidade internacional deve consolidar uma posição sancionatória

frente à exploração indevida da Lua, que pode ser enquadrada com um verdadeiro patrimônio

comum da humanidade. Todavia, há uma situação emblemática no julgamento de crimes

contra o patrimônio comum da humanidade: não há tribunal, convenção ou tratado

internacional que atine de forma específica quanto a isso, levantando assim uma discussão do

que poderia ser feito ante a essa situação.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Finalizando, é possível enxergar como o Direito Internacional, Espacial e Ambiental é

colocado em xeque ao se tratar de uma exploração fora da Terra. Afinal, para solucionar os

problemas que tendem a ocorrer com o desenvolvimento tecnológico, vulgo exploração da

Lua, basta não criá-los.

Com o presidente dos Estados Unidos deixando explícito seu interesse e atitudes que

visam dominar os recursos naturais da Lua, descumprindo tratados internacionais, devemos

refletir sobre as atitudes necessárias da comunidade internacional perante tais atos. Além

disso, precisamos refletir se devemos explorar não somente nosso planeta, que sofre de

degradações ambientais cada vez mais devido a sede capitalista, mas também para fora de

nosso mundo.

A eminente disputa pelos Estados Unidos por minerar a Lua pode causar uma nova

espécie de corrida espacial entre as demais grandes potências mundiais, especialmente na

disputa pela água que está abaixo da superfície, a qual pode ser convertida em combustível

para foguetes. Dissimuladamente, pode haver também um interesse do país em questão para a

extração de Hélio 3, uma substância de alto potencial energético e que pode ser utilizada para

a produção de bombas atômicas.

O Direito Ambiental, neste caso fará uma Analogia ao Tratado da Antártida e seu

consequente Protocolo de 1991. A Lua após ser explorada se verá em necessidade de

recuperação, e regiremos mais um acordo, esperando que desta vez seja cumprido. Com o

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evidente descumprimento do Tratado da Antártida pelos Estados Unidos, que garantia haverá

de que sua intenção não é minerar a lua e produzir bombas atômicas através da grande

quantidade de Hélio 3 que extrairá do astro? Isso tornaria explícito também o descumprimento

do Tratado de Não-Proliferação de Armas.

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A UTILIZAÇÃO DA TECNOLOGIA EM FAVOR DA REDUÇÃO DO CONSUMO DE ÁGUA E DE ENERGIA

THE USE OF TECHNOLOGY FOR THE REDUCTION OF WATER AND ENERGY CONSUMPTION

Gabriel Junio da Fonseca Santos

Resumo

O presente artigo tem como objetivo verificar os consumos de água de energia no Brasil e

nas escolas públicas da região metropolitana de Belo Horizonte - RMBH, MG, sendo

verificado um consumo fora do recomendado pelas organizações internacionais. Em que pese

no Brasil existir regulamentações no âmbito constitucional, bem como infraconstitucional

acerca do meio ambiente, verifica-se que tais medidas públicas estão sendo insuficientes para

combater o alto consumo hídrico e energético que assola o país, sendo necessária a busca de

meios alternativos criados através da tecnologia, como a criação de um aplicativo com uma

assistente virtual.

Palavras-chave: Consumo, Água, Energia, Tecnologia

Abstract/Resumen/Résumé

This article aims to verify the consumption of energy water in Brazil and in public schools in

the metropolitan region of Belo Horizonte - RMBH, MG, being verified a consumption

outside the recommended by international organizations. In spite of the fact that there are

regulations in Brazil in the constitutional scope, as well as infraconstitutional about the

environment, it appears that such public measures are being insufficient to combat the high

water and energy consumption that plagues the country, being necessary the search for

alternative means created through technology, such as creating an application with a virtual

assistant.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Consumption, Water, Energy, Technology

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1 INTRODUÇÃO

Em tempos de escassez, é de vital importância a implantação de meios

alternativos eficazes para a redução do consumo de água e de energia, no intuito de evitar

o agravamento da crise hídrica que assola diversos países do mundo.

Embora a água seja um recurso natural essencial para a sobrevivência de todas

as espécies existentes na terra, ela está sendo considerada cada vez mais um recurso

ameaçado, em razão do alto consumo nos setores da agricultura irrigada, do abastecimento

animal, do abastecimento urbano, da indústria de transformação, da termoeletricidade e

das hidrelétricas.

Por sua vez, a energia, em que pese ser considerada um dos principais fatores

para o crescimento do desenvolvimento econômico e do nível de qualidade de vida da

população, é vista como um fator agravante para o aumento do consumo de água. O

consumo de energia está atrelado aos setores industrial, comercial e doméstico.

Com efeito, a degradação irracional ao meio ambiente, principalmente o

natural, impacta negativamente a qualidade de vida das pessoas e coloca em risco as

futuras gerações, tornando-se crucial a tutela dos recursos ambientais pelo Poder Público

e por toda a coletividade.

Como é sabido, o marco da tutela ambiental no mundo foi a Conferência de

Estocolmo, ocorrida em 1972, na Suécia. O evento foi promovido pela ONU onde se

reuniu 113 países, colocando-se em pauta a alta degradação ambiental como risco à

existência humana.

A constitucionalização do direito ambiental no Brasil ocorreu com à

Constituição de 1988, em seu artigo 225 (Brasil, 1988). O nascimento do direito

fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado decorre dos eventos mundiais

ocorridos em prol do meio ambiente, como a Conferência de Estocolmo, em 1972,

realizada pela ONU.

Não obstante o legislador constituinte originário tenha positivado o meio

ambiente como direito fundamental, considerado como de terceira dimensão, pois é

coletivo, transindividual, com eficácia plena, uma vez que sua aplicação independe de

regulamentação, estabelecendo como dever tanto do poder público, como da coletividade

à proteção do meio ambiente, seja natural, cultural e artificial, tais medidas públicas estão

sendo insuficientes para combater o alto consumo hídrico e de energia.

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Nesse contexto, acredita-se que a busca de meios alternativos criados através

da tecnologia, como a criação de um aplicativo voltado a anotação mensal dos valores

consumidos de água e de energia pelo consumidor, com uma assistente virtual, seja uma

forma viável para conscientizar a população na redução do consumo de água e de energia.

O presente trabalho tem como objetivo verificar as pesquisas bibliográficas e

documentais no tocante ao consumo de água e de energia, identificar os fatores que

agravam à escassez hídrica e analisar as formas alternativas de redução de consumo.

Quanto a abordagem do problema, a pesquisa será qualitativa e quantitativa,

utilizando-se do método indutivo. Já em relação aos objetivos, o presente trabalho será

realizado por meio de uma pesquisa explicativa e descritiva. No que tange a coleta de

dados, utiliza-se de pesquisa bibliográfica e documental.

No primeiro momento, serão apresentados o consumo da água no Brasil e nas

escolas da rede pública da região metropolitana de Belo Horizonte, MG. Em seguida, o

consumo de energia no Brasil e nas escolas da rede pública da região metropolitana de

Belo Horizonte, MG. Por fim, o foco se volta na utilização da tecnologia como uma forma

alternativa de reduzir os altos consumos de água e de energia.

2 O CONSUMO DE ÁGUA E DE ENERGIA NO BRASIL E NAS ESCOLAS DA

REDE PÚBLICA DA REGIÃO METROPOLITANA DE BELO HORIZONTE, MG

A distribuição de água doce no mundo, segundo os dados da Agência

Nacional de Água (ANA, 2020), é de 2,5%, sendo 69% de difícil acesso, em razão de estar

concentrada em geleiras, 30% são águas subterrâneas e apenas 1% encontra-se nos rios.

Em relação ao Brasil, em termos globais, ele possui, por sorte, uma boa quantidade de

água doce do planeta, embora a distribuição desse recurso natural não seja equilibrada.

Em razão do crescimento econômico e do aumento da população no mundo, a

demanda de energia elétrica vem crescendo a cada a ano, sendo este um recurso que pode

ser obtido por várias formas, como as hidrelétricas, as eólicas, as solares, as térmicas e as

nucleares. Todas as formas de obtenção de energia elétrica degradam o meio ambiente de

alguma forma, principalmente as termoelétricas e as hidrelétricas, de forma indireta, pois

impacta negativamente o meio ambiente na sua construção.

No Brasil, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL, 2016),

a geração de eletricidade mais utilizada são as hidrelétricas (66%) e as termoelétricas

(27%). Já as eólicas comportam cerca de 6% e as nucleares 1%.

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Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU, 2015), a recomendação de

consumo por habitante/dia é de 110 litros, mas como será visto, isto não está sendo

observado pela coletividade, que tem como dever, conforme o art. 225, caput, da CF/88,

defender e preservar o meio ambiente.

2.1 O consumo de água

De acordo com o Instituto Trata Brasil (ITB, 2020), o consumo médio de água

no Brasil é de 154, 9 litros por habitante/dia, ficando cerca de 51% acima do recomendado

pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Além disso, segundo os dados da Agência Nacional de Água (ANA, 2012),

verifica-se que os principais causadores da escassez hídrica são os setores da agricultura

(72%), consumo animal (11%), consumo urbano (9%), indústria (7%) e consumo rural

(1%). Veja-se o gráfico abaixo:

Fonte: ANA (2012)

Nesse contexto, analise-se que tanto o consumo direto (consumo de água

urbano) que consiste no uso doméstico da água, e o consumo indireto (consumo de água

na agricultura, na indústria, etc) que se traduz na quantidade de água utilizada e poluída

no ciclo de produção de um produto, que posteriormente será consumido pela população,

impactam no aumento da escassez desse recurso natural, principalmente este último.

Nesse sentido, foi desenvolvida a pegada hídrica direta e indireta pela “Water

Footprint Network”, que consiste, segundo Hoekstra,

a pegada hídrica indireta do consumidor da carne depende das pegadas hídricas

diretas do comerciante que vende a carne, do frigorifico que prepara a carne

para a venda, da fazenda que cria o animal e do produtor da ração que alimenta

o animal. A pegada hídrica indireta de um comerciante depende das pegadas

hídricas diretas do frigorifico, das fazendas produtoras de gado e de ração e

assim por diante. (HOEKSTRA, 2002, p.21)

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Acontece que, muitas vezes, o consumo indireto é esquecido pela população

que foca na maior parte no consumo direto, ou seja, os consumidores acabam esquecendo

que a maior parte de seus consumos indiretos estão associado aos produtos que eles

compram em supermercados, frigoríficos ou em outros lugares e não à água que eles

consomem em casa.

Portanto, em que pese a ver regulamentações tanto de natureza regulatória,

estruturadoras, bem como indutoras no Brasil, é essencial a criação de meios alternativos

através da tecnologia para criar formas de conscientização e redução do consumo de água.

Nesse sentido, o Grupo de Iniciação Científica do Projeto Ecos vem

desenvolvendo e monitorando indicadores para avaliar o consumo de água e de energia

em escolas públicas na Região Metropolitana de Belo Horizonte – RMBH, MG.

Para avaliar esses consumos de água foram utilizadas na contabilização as

contas de água dessas escolas públicas, fornecidas voluntariamente pela Secretaria da

Educação de Minas Gerais, referente ao período de outubro de 2018 a julho de 2019.

A fórmula utilizada para contabilizar o índice de água foi somar o consumo de

água em litros do período de 2018 a julho de 2019 e dividir por 10 para se obter à média

mensal. Com o resultado da média mensal divide-se por 30 para se obter a média diária

em litros. Em seguida, utiliza-se o resultado da média diária em litros e divide pela

quantidade total de alunos e funcionários da escola para se obter o resultado do consumo

per capita.

Por fim, para se obter o resultado do indicador de água, deve-se utilizar o

menor consumo per capita de uma escola e dividi-lo pela própria escola que obteve o

menos resultado e pelas demais, multiplicando por 10 em seguida. Foram avaliados o

consumo de água de 63 escolas da Região Metropolitana de Belo Horizonte – RMBH,

MG.

Confira-se o consumo médio mensal em litros de água das escolas que tiveram

os melhores indicadores:

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Fonte: elaboração própria

Dessa forma, por meio da análise desses resultados, foi possível verificar o

que de fato agrava a crise hídrica no Brasil e no mundo, sendo essencial a implantação de

políticas voltadas a informatizar e conscientizar a população no tocante ao consumo de

água, principalmente nas escolas.

2.2 O consumo de energia

O Consumo de energia no Brasil e no mundo vem aumentando a cada ano,

seja em razão do crescimento econômico, seja em razão do aumento populacional. A

utilização da energia decorre na maioria das vezes do uso de luzes e eletrodomésticos

como chuveiros, computadores, liquidificadores, etc.

Segundo os dados da Empresa de Energia Elétrica (EPE, 2020), o maior

consumidor de energia é o setor industrial, que durante o período de 2013 a 2019, utilizou

cerca de 1.204,112 GWh. Já o setor residencial utilizou cerca de 935.185 GWh no mesmo

período. O que já de início chama atenção pela baixa diferença de valor entre os dois

setores citados. O asterisco no ano de 2019 que dizer que são valores preliminares.

Fonte: dados do consumo nacional de energia elétrica na rede por classe: 1995 – 2018 da Empresa de Energia

Elétrica (EPE, 2020)

Já em relação as escolas públicas da Região Metropolitana de Belo Horizonte

– RMBH, MG , conforme visto acima, também foram contabilizados os consumos de

energia referente ao período de agosto de 2018 a julho de 2019, utilizando-se da mesma

fórmula do consumo de água.

. Foram avaliados o consumo de energia de 59 escolas da Região

Metropolitana de Belo Horizonte – RMBH, MG. Veja-se as escolas que tiveram os

melhores indicadores em consumo médio mensal em KWh:

-

50.000

100.000

150.000

200.000

2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019*

Consumo de energia em GWh no Brasil

RESIDENCIAL INDUSTRIAL COMERCIAL OUTROS

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Fonte: elaboração própria

Diante dos dados apresentados, tanto do consumo de água e de energia, é

necessária a implementação de formas alternativas para reduzir tais consumos, sendo um

dos meios mais propícios é o uso da tecnologia.

3 A UTILIZAÇÃO DA TECNOLOGIA COMO UMA FORMA ALTERNATIVA

DE REDUZIR OS ALTOS CONSUMOS DE ÁGUA E DE ENERGIA

Com o aumento do consumo da água e de energia no Brasil, é de vital

importância a criação de políticas alternativas para conscientizar e reduzir tais consumos,

e a tecnologia, por sua vez, é considerada uma forma viável para alcançar esse objetivo,

uma vez que ela é utilizada por grande parte da população do mundo e degrada

minimamente o meio ambiente.

Em que pese existir diversas regulamentações em torno do meio ambiente, tais

medidas não são eficazes para combater o alto consumo hídrico e energético que assola o

Brasil. Nesse sentido, a criação de um aplicativo de celular pode ser visto como uma forma

alternativa de conscientizar e reduzir os gastos ambientais.

O aplicativo de celular que poderá ser chamado de “ Guia redutor de água e

de energia” tem como objetivo acompanhar o consumidor, informando-o formas para

reduzir seus gastos hídricos e energéticos. Mas, vai depender da anotação mensal das

contas de água de energia, pois isso irá ser analisado pelo assistente virtual que dará dicas

e formas para ele reduzir os seus gastos.

Além de auxiliar na redução do consumo de água e de energia, irá ajudar o

consumidor a reduzir os seus gastos financeiros. Portanto, a criação do aplicativo de

celular “ Guia redutor de água e de energia” irá contribuir de forma fundamental para a

redução dos gastos de água e de energia.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao se analisar a situação do consumo de água e de energia no Brasil e também

nas escolas públicas da região metropolitana de Belo Horizonte - RMBH, MG, percebe-

se um consumo excessivo desses recursos, sendo de vital importância a implantação de

meios alternativos eficazes para a redução do consumo de água e de energia, no intuito de

evitar o agravamento da crise hídrica que assola diversos países do mundo.

Embora haja no Brasil regulamentações no âmbito constitucional, bem como

infraconstitucional acerca do meio ambiente, verifica-se que tais medidas públicas estão

sendo insuficientes para combater o alto consumo hídrico e de energia.

Nesse contexto, acredita-se que a criação de meios alternativos criados através

da tecnologia, como a criação de um aplicativo voltado a anotação mensal dos valores

consumidos de água e de energia pelo consumidor, com uma assistente virtual, seja uma

forma viável para conscientizar a população na redução do consumo hídrico e energético.

A criação do aplicativo de celular “ Guia redutor de água e de energia” irá

contribuir de forma fundamental para informar e reduzir tais gastos.

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Brasil. Brasil, 2016. Disponível em: <

https://www.aneel.gov.br/documents/656877/15142444/Fontes+de+Energia+no+Brasil/2

eb48f5c-cc7f-4f63-867e-b2a4f3603418?version=1.0 > acesso em: 14 de jun. de 2020.

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<http://www.tratabrasil.org.br/saneamento/principais-estatisticas/no-brasil/agua> acesso

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em: < https://nacoesunidas.org/acao/agua/ acesso em: 14 de jun. de 2020.

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Mesfin M. Manual de avaliação da pegada hídrica: estabelecendo o padrão global.

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A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DOS ANIMAIS NA INDÚSTRIA DA CARNE

THE VIOLATION OF ANIMAL RIGHTS IN THE MEAT INDUSTRY

Alice Aleixo Xavier

Resumo

Este projeto de pesquisa, pretende analisar o papel da tecnologia a favor dos animais na

indústria da carne e como o lucro pode auxiliar que isso não seja uma prioridade pelos

produtores. Têm o intuito também de apresentar que o consumo de carne está presente para a

sociedade desde os primórdios, considerado sinônimo de riqueza e poder. Além disso, os

direitos dos animais sempre estiveram presentes, mas tampouco cumpridos. A pesquisa

proposta pertence à vertente metodológica jurídico-sociológica. Quanto à investigação,

pertence à classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), o tipo histórico-interpretativo.

Predominará o raciocínio dialético.

Palavras-chave: Tecnologia, Lucro, Animais, Pecuária

Abstract/Resumen/Résumé

This research project aims to analyze the role of technology in the animals industry and how

profit can help that this is not a priority for producers. They also aim to present that the

consumption of meat has been present to society since the beginning, considered

synonymous with wealth and power. Moreover, animal rights have always been present, but

not fulfilled. The proposed research belongs to the juridical-sociological methodological

aspect. As for the investigation, it belongs to the classification of Witker (1985) and Gustin

(2010), the historical-interpretative type. Dialectical reasoning will predominate.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Technology, Profit, Animals, Livestock

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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A seguinte pesquisa busca a apresentação do quanto os direitos dos animais na

indústria da carne é violado e quais são poderão ser os aliados para diminuir esse sacrifício,

perante a perspectiva cultural, tecnológica e sociológica. O hábito do consumo de carnes é

carregado pela sociedade desde os primórdios, não só o consumo, mas a utilização dos

recursos animais, sabe-se também que, tal hábito era considerado sinônimo de riqueza e

poder. No entanto, é de suma importância que haja a garantia dos direitos dos animais,

principalmente na indústria que os mata diariamente há séculos.

Para que ocorra a manutenção desses direitos, é válido considerar que a pecuária no

Brasil, movimenta milhões de reais todos os anos e gera incontáveis empregos para a

população. Dentre esses e outros fatores, fazer com que o bem-estar dos animais seja mantido

torna-se algo desafiador, mas extremamente essencial e importante. Além disso, a

necessidade dos brasileiros de consumirem carne diariamente é algo muito presente e forte,

levando em conta também, o aspecto dos produtores em si, que na maioria das vezes pouco

importam com as vidas acabadas.

Apesar de não receberem muita assistência, os animais de corte, utilizados na

indústria na carne merecem e necessitam de possuírem seus direitos. Uma vez que, a

sociedade como um todo deve voltar atenção de todos os problemas que ocorrem dentro

dessa indústria tão cruel, que visa apenas o lucro. Logo, com o desenvolvimento tecnológico

que encontra-se cada vez mais presente nas indústrias pecuárias, é de extrema importância

que tal aprimoramento esteja a favor dos animais também.

A pesquisa que se propõe pertence à vertente metodológica jurídico-sociológica. No

tocante ao tipo de investigação, foi escolhido, na classificação de Witker (1985) e Gustin

(2010), o tipo histórico-interpretativo. O raciocínio desenvolvido na pesquisa será

predominantemente dialético. Dessa maneira, a pesquisa se propõe a esclarecer se a

tecnologia poderá atuar em favor dos animais na indústria da carne e apresentar os motivos

pelos quais a sociedade não se atenta o quanto deveria às condições que os animais são

submetidos.

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2. A INDÚSTRIA DA CARNE, OS ANIMAIS DE CORTE, E SEUS

DIREITOS

Os direitos dos animais muitas vezes são deixados de lado, principalmente tratando-

se dos animais de corte. Porém, em 1978 com a promulgação da Declaração Universal dos

Direitos dos Animais inúmeros de pontos foram ressaltados, como por exemplo o

reconhecimento da vida e do valor desses seres vivos que só são vistos apenas como objetos

de lucro. Sendo assim, esse e mais outros pontos apresentados nesta Declaração tomaram

proporções internacionais.

No entanto, na legislação brasileira há aspectos que favorecem os animais e

prometem seu bem-estar, mas na realidade isso não está presente de maneira efetiva. Uma

vez que, a ocorrência de maus tratos aos animais de corte aumenta dia após dia, colocando

os seres a condições precárias e desumanas. Além disso, não só os animais de corte são

prejudicados nessa indústria, mas é de extrema importância ressaltar que a pecuária é

responsável por inúmeros danos ambientais, como por exemplo a responsabilidade de 40%

do aquecimento global, sendo a causa principal das mudanças climáticas.

O processo de conscientização da indústria, da sociedade e da legislação brasileira

tratando-se dos processos aos quais são submetidos aos animais, é considerado algo

demorado e desafiador, mas necessário. Contudo, a junção de tal conscientização e o

aumento da fiscalização desses direitos, poderia tornar os processos nos abatedouros menos

dolorosos para os protagonistas desse feito. E infelizmente, por ser algo fortemente presente

na cultura brasileira, o hábito de consumir alimentos de origem animal, tornou se um tópico

essencial para o capitalismo.

Sendo assim, é possível identificar o fato de que acabar com o consumo desses

alimentos é algo inconsiderável. Logo, fazer com que o processo nos abatedouros seja menos

prejudicial é necessário. E como referenciado anteriormente, existem normas que

regulamentam os processos nas indústrias da carne que visam assegurar a integridade dos

animais, mas na prática isso é escasso.

No entanto, além da Declaração Universal dos Direitos dos Animais no âmbito

internacional, têm-se na legislação brasileira a Contituição Federal de 1988 no Art. 225,

inciso V, a garantia dos direitos dos animais, principalmente no controle da produção e

comercialização dos animais. (BRASIL, 1988). Contudo, sabe-se que a relação homem e

animal é presente na sociedade desde os primórdios, ora os seres eram vistos como melhores

amigos, ora como apenas um pedaço de carne.

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A tecnologia com o passar do tempo, é cada vez mais participante das atividades

econômicas que visam alta produtividade e lucro exacerbado. E como a pecuária não é

diferente disso, nas indústrias da carne a tecnologia vêm sendo empregado em volumes

altíssimos e com qualidades de ponta. Com isso, as tecnologias estão presentes em todos os

tipos de produção, desde as produções caseiras, até as indústrias em grande escala. Porém, o

mercado da pecuária por sua alta demanda impõe o uso de equipamentos tecnológicos e de

grande porte.

E como dito anteriormente, a consequência do uso cada vez mais aprimorado dessas

tecnologias é extremamente lucrativo e positivo, mas para os animais não. Uma vez que, elas

auxiliam o grande produtividade que só traz prejuizos as milhares de vidas que são

sacificadas diariamente. Assim, como a adoção de tecnologias está cada vez mais presente

no meio produtor, tais tecnologias deveriam favorecer os animais também, ou seja, tornar os

abatedouros ambientes menos traumáticos e precários.

3. OS BENEFÍCIOS QUE A TECNOLOGIA PODE TRAZER À PECUÁRIA

O desenvolvimento de equipamentos tecnológicos se faz cada vez mais presente na

sociedade e nas indústrias. E a adoção da tecnologia e de novos softwares na pecuária vêm

trazendo inúmeros benefícios aos produtores, como por exemplo o aumento da produtividade

e a identificação individual dos animais (Premix, 2019). Assim, a partir da implementação

dessas novas técnicas torna-se quase impossível abandoná-las, visto que, as consequências

que elas trazem aos produtores são extremamente benéficas.

Como o abastecimento da pecuária pela tecnologia tornou-se essencial, tal

modernização poderá ser voltada também, aos animais e seus direitos. Contudo, sabe-se que

a conscientização do valor das vidas dos animais não ocorrerá instantaneamente. Porém,

dessa forma será claramente visível que é possível sim, continuar a obtenção de lucro com a

produção de animais de corte, mas de maneira consciente e ética.

Ademais, a gravidade das ocorrências de maus tratos nos abatedouros deve ser

ressaltada e nunca esquecida, além do reconhecimento de seus direitos. Desse modo, a

atuação conjunta da tecnologia seria uma alternativa eficiente para diminuir os sacrifícios

acometidos aos animais. Com isso, juntamente com a tecnologia, a atuação do Estado poderá

se fazer mais presente por meio das fiscaizações nos abatedouros e no controle de qualidade

dos animais, que logo mais tornam mercadorias.

Sendo assim, é de extremo conhecimento do quanto a pecuária contribui para o

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capitalismo e vice-versa, do quanto a sociedade é refém desse consumo cruel, e que essa

crueldade não ocorre apenas para a indústria da carne, mas a cosmética e a de vestuários

também. Entretanto, por ser um hábito que advém desde os primórdios, como qualquer

assunto possue ônus e bônus tanto nos aspectos dos consumidores, produtores e dos produtos

em si.

Dentro dessa perspectiva, em São Paulo surgiu a primeira Associação no Brasil a

favor dos Direitos dos animais e na cidade do Rio de Janeiro a surgiu também, a Sociedade

Brasileira Protetora dos Animais que sempre demonstrou o interesse em defender os animais

através do ativismo (OSTOS, 2017). Tais associações citadas mostram que, apesar de todos

os maus tratos que os animais recebem, sempre houveram grupos afim de defendê-los.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir do exposto, concluí-se que o uso da tecnologia na pecuária têm seus pontos

negativos e positivos e em perspectivas distintas. No âmbito de defesa da integridade dos

animais, ela não está atualmente, efetuando um papel positivo a eles, pois quem a coordena

não está visando isso. Logo, se tal papel for executado para o bem de ambos os benefícios

serão ainda maiores.

Desse modo, é de suma importância a valorização da vida dos animais de corte, do

seu bem-estar e do que eles representam para a natureza também. Pois, apesar dos direitos

desses seres vivos estarem garantidos é necessário que eles sejam de fato assegurados, que o

Estado não continue sendo omisso às crueldades advindas dos abatedouros e que os animais

possuem direitos de se defenderem.

Portanto, a tecnologia deverá caminhar junto com a vida dos seres vivos, os

produtores se conscientizarem com os direitos ambientais garantidos e que o lucro seja

apenas uma consequência de todos os cuidados obtidos pelos animais. Logo, não somente o

Estado e os produtores que devem se conscientizar e colocar a integridade dos animais em

prática, e sim a sociedade consumidora desses produtos que são resultados de tanta crueldade.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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https://www.ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-ambiental/proteção-aos-animais/.

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ABANDONO DE ANIMAIS DOMÉSTICOS: ASPECTOS JURÍDICOS DA EXPERIÊNCIA COM OS CASTRAMÓVEIS

ABANDONMENT OF DOMESTIC ANIMALS: LEGAL ASPECTS OF THE CASTRAMOBLE EXPERIENCE

Aline Oliveira Rodrigues

Resumo

O presente resumo expandido aborda sobre como a implantação dos castramóveis, atrelada às

jurisdições correspondentes, pode mitigar o número de animais domésticos abandonados nas

ruas. Por meio da metodologia jurídico-sociológica, compreende-se o fenômeno analisado e

seus efeitos preliminares, que demonstram a execução dos procedimentos de esterilização

cirúrgica. Destarte, pela responsabilidade de controle populacional atribuída ao poder

público, entende-se que o castramóvel é uma alternativa simples e eficaz, em virtude dos

resultados satisfatórios já observados naquelas localidades onde o veículo itinerante atuou.

Quanto à investigação, pertence à classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), o tipo

jurídico-interpretativo, predominando o raciocínio dialético.

Palavras-chave: Direito animal, Castração, Castramóvel, Animais abandonados, Esterilização cirúrgica

Abstract/Resumen/Résumé

The present expanded summary addresses how the implantation of castramobiles, linked to

the corresponding jurisdictions, can mitigate the number of domestic animals abandoned on

the streets. Through the legal-sociological methodology, the analyzed phenomenon and its

preliminary effects are understood. Thus, due to the responsibility for population control

attributed to the public power, is understood that the castramobile is a simple and effective

alternative, due to the satisfactory results already observed in those locations where the

traveling vehicle operated. As for the investigation, it belongs to the classification of Witker

(1985) and Gustin (2010), the legal-interpretative type, with dialectical reasoning

predominating.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Animal law, Castration, Castramobile, Abandoned animals, Surgical sterilization

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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A presente pesquisa pretende apresentar os procederes jurídicos acerca da implantação

dos castramóveis, com o propósito de realizar esterilizações cirúrgicas em massa e

consequentemente minimizar o número de animais domésticos abandonados nas ruas. Visto

que a responsabilidade do controle populacional de cães e gatos é assegurada legalmente,

compete ao poder público mediante necessidades locais – precipuamente onde há índices de

superpopulação, ou quadro epidemiológico – atuar a fim de minimizar esse panorama.

É preciso considerar que a presença desses animais nas vias públicas, remete a

inúmeros problemas, não só relacionados à suas condições de bem estar. Assim como esses

ficam vulneráveis a atropelamentos, falta de alimentação adequada e proliferação da espécie,

os seres humanos também são afetados, pois se tornam suscetíveis a ataques, como mordeduras.

Sob essa perspectiva, a castração não só atua na contenção das taxas de natalidade, como

interfere diretamente na questão comportamental, devido as diferenças hormonais ocasionadas.

Desse modo, tal procedimento apresenta um nível de relevância que contempla toda

comunidade, e se associado ao Castramóvel, pode ser realizado de maneira muito mais ligeira,

contemplando tanto mais animais, quanto mais localidades. A facilidade está principalmente na

presença de um centro cirúrgico já equipado, dispensando eventuais gastos com aparelhagem e

instalações, os quais superariam a contratação desse serviço, que pode ser realizada somente

em ocasiões oportunas. Ademais, o serviço também conta com a presença de profissionais

capacitados responsáveis tanto pelo processo de castração como pelo acompanhamento do

quadro clínico do animal.

Nesse sentido, a vertente na qual a pesquisa se enquadra é a metodológica jurídico-

sociológica. Simultaneamente, em referência ao tipo de investigação, foi escolhido, na

classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), o tipo jurídico-projetivo. Outrossim, o

raciocínio desenvolvido será predominantemente dialético. Por conseguinte, a pesquisa procura

clarificar como a castração se apresenta como uma solução para os imbróglios do abandono

animal, e os respectivos procederes jurídicos para implementação do castramóvel.

2. A REALIDADE DO ABANDONO ANIMAL EM FACE DAS ATUAIS

LEGISLAÇÕES

Em 1978 foi elaborada pela Unesco, uma Declaração Universal dos Direitos dos

Animais, da qual o Brasil é signatário, dispondo sobre o direito à vida e consequentemente

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proibindo os maus tratos e o abandono. Todavia, na esfera nacional o primeiro regulamento

existente é a Lei n.9.605 de 1998, conhecida como Lei dos Crimes Ambientais, a qual delibera

sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio

ambiente. Contudo, devido ao seu caráter genérico aplica-se a inúmeras situações como o caso

dos animais domésticos.

O conceito de animais domésticos é definido pela portaria nº93, 7 de julho de 1998

pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA),

sendo reconhecidos como aqueles que apresentam características biológicas e comportamentais

em estreita dependência do ser humano. Nessa perspectiva, os homens são os responsáveis por

assegurar o bem estar dos animais, garantindo a esses um habitat e condições sociais dignas,

bem como alimentação adequada. Assim:

A questão da guarda responsável de animais domésticos é uma das mais urgentes

construções jurídicas do Direito Ambiental, haja vista a crescente demanda que se tem

verificado nas sociedades, pois a urbanização cada vez mais crescente vem

suplantando hábitos coletivos entre os indivíduos que, isolados em seus lares, têm

constituído fortes laços afetivos com algumas espécies, como é o caso dos cães e

gatos, transformando-os em verdadeiros entes familiares (SANTANA; OLIVEIRA,

2008, p. 69).

Em contraposição, quando esse acolhimento não acontece de forma efetiva, a principal

consequência é o abandono - embora considerado crime - o qual resulta em uma elevada

dinâmica populacional de animais nas vias públicas. Haja vista, “o seu precoce amadurecimento

sexual e as crias numerosas contribuem para o crescimento descontrolado de cães e gatos”

(OLIVER; SILVA, 2008 apud CORADASSI et al., 2017, p. 66), expondo-os aos perigos

urbanos e a falta de assistência, o que também pode provocar riscos aos seres humanos.

Todavia, essa negligência, razão fundamental da superpopulação de animais

desassistidos, requer amplos estudos para que as causas que a motivam possam ser mitigadas,

como elucida Rita de Cassia Maria Garcia, doutora em Epidemiologia Experimental Aplicada

ao Controle de Zoonoses:

O número crescente de cães abandonados é uma preocupação para as autoridades de

saúde pública em vários países. Controlar as populações caninas e felinas não é apenas

equilibrar a demanda de animais com o número de tutores responsáveis por eles, mas

é principalmente neutralizar os fatores que colaboram para o abandono (GARCIA,

2009, p. 174).

Muitos tutores desconhecem os fundamentos sobre a guarda responsável, os quais

associados ao baixo grau de instrução por parte desses e a questões relativas ao comportamento

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animal, resultam nesse desamparo, sendo capazes de afetar diretamente a saúde mútua e

ocasionar diversas consequências como o aumento nos índices de zoonoses. Dessa maneira:

O comportamento reprodutivo dessas espécies, a falta de conhecimento por parte dos

responsáveis sobre as necessidades fisiológicas e psicológicas dos animais, o manejo

inadequado, os aspectos sociais e culturais, associados à situação socioeconômica da

população e à falta de políticas públicas que visem à resolução da situação do descaso

para com os animais, podem ser citadas como pontos fundamentais para a perpetuação

do abandono de animais e dos riscos inerentes a estas atitudes (ACHA.; SZYFRES,

2003 apud LIMA; LUNA, 2012, p. 34).

Nesse contexto, é necessário promover medidas educativas para mitigar esse

abandono, mas também realizar intervenções necessárias pelo bem-estar daqueles animais já

abandonados, de modo que esses não procriem nas ruas, aumentando assim quantitativamente

o número de animais errantes. Abarcados nessa conjuntura, os processos de esterilização por

meio de cirurgias de castração apresentam-se como uma alternativa viável.

3. EFETIVIDADE DO PROCESSO CIRURGÍCO PELA ATUAÇÃO DOS

CASTRAMÓVEIS

Por muito tempo considerou-se como medida a eutanásia desses animais, portanto, não

existem provas que tal ação tenha gerado impactos significativos sobre a densidade

populacional, bem como na contenção de doenças como a raiva. Isso se deve em decorrência

das altas taxas de procriação que atreladas aos índices de sobrevivência sobrepõem a taxa de

eliminação. Em consequência, esse procedimento foi proibido legalmente no Brasil quando se

trata de animais saudáveis, mas não deixa de se revelar como uma solução desumana e contra

ao bem-estar e direitos dos animais. Sendo assim:

Dentre as várias medidas que se fazem necessárias para alcançar o manejo

populacional e conseguir equilíbrio entre as espécies, estão a castração dos animais e

a educação dos seus responsáveis baseando-se na guarda responsável, na prevenção e

controle de zoonoses e no bem-estar animal (GARCIA et al., 2012, p.142)

No que tange a castração, tal procedimento é de baixo risco, recuperação rápida e pós

operatório simples, além de reduzir a probabilidade de várias doenças como piometra e

neoplasia mamária em cadelas. Ademais, é uma solução eficaz no controle populacional de

animais dado que colabora para redução das taxas de natalidade, evitando assim que aqueles

que já estão em situação de abandono possam se reproduzir. Portanto:

Para a saúde pública, a esterilização cirúrgica de cães assume importância não apenas

para a questão de controle animal, mas também para reduzir o número de agressões a

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seres humanos, uma vez que os animais esterilizados mordem três vezes menos do

que os não esterilizados (SACKS; LOCKWOOD; HORNEICH, 1996 apud GARCIA

2009, p. 38).

Por meio da esterilização cirúrgica é possível a estabilização dessas populações, assim

como a prevenção e mitigação das zoonoses – doenças infecciosas que podem ser transmitidas

entre animais e humanos – e outros demais benefícios tanto para a saúde animal, tal qual para

a saúde pública. Outro imbróglio que também pode ser atenuado são os acidentes de trânsito

que prejudicam tanto os seres humanos devido as perdas materiais e riscos a integridade física,

quanto aos animais, ocasionando ferimentos, sofrimento por atropelamentos ou até mesmo

morte.

Por conseguinte, é necessário toda uma estrutura para realização do procedimento e

profissionais capacitados, assim, o castramóvel apresenta-se como melhor alternativa. Esse

consiste em um trailer equipado com um centro cirúrgico, que de forma itinerante pode ser

levado as cidades que necessitam de tal controle populacional. A contratação desse serviço é

de incumbência governamental, devido a existência da Lei Federal nº13.426, de 30 de março

de 2017, que dispõe sobre o controle de natalidade de cães e gatos mediante esterilização

permanente por cirurgia. Logo, por já contar com todos aparatos necessários assim como a

presença de especialistas, o castramóvel poupa esforços da administração pública local em

promover inúmeras licitações e processos seletivos.

Por esse ângulo, o veículo itinerante também pode suprir as deficiências dos Centros

de Controle de Zoonoses locais, dado que esses atuam com uma capacidade operacional

limitada. Além disso, outros fatores como falta de funcionários qualificados e infraestrutura

adequada podem comprometer as castrações, assim como submeter os animais a processos de

maneira não humanitária.

Ademais, leis estaduais como a legislação mineira nº 21.970 de 15 de janeiro de 2016,

reforçam essa responsabilidade, além de permitir que tais ações sejam realizadas em parcerias

com entidades privadas, favorecendo a admissão do castramóvel, a qual já acontece em algumas

cidades. Nesse sentido, como exemplo:

Inserido nessa ideia, existe em Minas Gerais um programa de castramóveis,

encabeçado pelo Deputado Noraldino, em parceria com a ONG Ajuda, de Juiz de

Fora. O Deputado fez uso de emendas parlamentares para a compra e adaptação de

veículos, que passam por diversas cidades promovendo castrações gratuitas de cães e

gatos, com a manutenção de cadastro com fotos de todos os animais atendidos, para

garantir a transparência das ações e permitir o controle (RIBEIRO; MAROTTA, 2017,

p.80).

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Destarte, abarcada pela esfera jurídica, a atuação do veículo itinerante simplificaria e

facilitaria a execução do procedimento em inúmeras localidades. A longo prazo a unidade

móvel de esterilização atenuaria o número de cães e gatos nas ruas, equilibrando assim a

dinâmica populacional sem infringir o bem estar desses e da comunidade, a qual possui um

relacionamento intrínseco para com os animais.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Á face do exposto, a presente pesquisa demonstra a importância do controle de animais

domésticos abandonados, em virtude de tal mazela social resultar na expansão da dinâmica

populacional de cães e gatos nas vias públicas. Essa, por sua vez, admite-se não só como um

grande problema para causa animal, dado que também afeta de diversas maneiras os seres

humanos. Ademais, do ponto de vista jurídico, esses seres devem ter seu bem estar resguardado

pela responsabilidade delegada aos humanos, visto que apresentam um nível de dependência

para com seus protetores.

Nesse viés, compreende-se que a castração em massa representa uma solução ideal a

fim de mitigar parcialmente esse impasse, e consequentemente os diversos outros imbróglios

que se interligam a ele. Contudo é imprescindível que esse procedimento seja realizado da

melhor forma para conter esse avanço, onde o método mais acessível seria pela implantação de

castramóveis, devido a eficiência de sua estruturação e a facilidade atrelada ao fator da

itinerância.

Em suma, as legislações e garantias constitucionais são de extrema importância no que

se refere à proteção animal. Por meio dessas, os processos de esterilização cirúrgica podem ser

realizados de modo legal pelos munícipios, além de salvaguardar que ocorram de maneira ética,

sem ferir os direitos dos animais. Contudo, também é fundamental que os cidadãos se dediquem

as devidas responsabilidades para com os animais que se encontram sob sua tutela, eliminando

a hipótese de que o abandono seja solução para qualquer problema na relação humano-animal.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9605.htm. Acesso em: 17 maio 2020.

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Acesso em: 17 maio 2020.

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1 Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

2 Discente do Curso de Graduacao em Direito do Centro de Ciencias Sociais Aplicadas (CCSA) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

1

2

ABUSIVIDADE DA PUBLICIDADE DIRIGIDA ÀS CRIANÇAS POR MEIO DOS ADVERGAMES

ABUSIVENESS OF ADVERTISING DIRECTED AT CHILDREN THROUGH ADVERGAMES

Fabrício Germano Alves 1Pedro Henrique da Mata Rodrigues Sousa 2

Resumo

Os advergames surgem como uma maneira de divertir o consumidor infantil, entretanto, a

problemática é relativa à captura publicitária da criança, por meio desses jogos de

publicidade, cujo intuito é despertar ou fomentar o desejo por produtos e serviços.

Demonstrar-se-á quais são os limites jurídicos para o desenvolvimento dessa prática por meio

da metodologia hipotético-dedutiva ao analisar o sistema de consumo. Conclui-se, portanto,

que a referida prática configura publicidade abusiva nos moldes dos artigos 36, caput e 37,

§2º do Código de Defesa do Consumidor e da Resolução CONANDA n° 163/2014.

Palavras-chave: Advergames, Publicidade, Crianças, Consumidor

Abstract/Resumen/Résumé

The advergames appear as a way to amuse the child consumer, however, the problem is

related to the advertising capture of the child, through these advertising games, whose

purpose is to awaken or foster the desire for products and services. It will be demonstrated

what are the legal limits for the development of this practice by means of the hypothetical-

deductive methodology when analyzing the consumption system. It is concluded, therefore,

that the referred practice configures abusive advertising in the terms of articles 36, caput and

37, paragraph 2 of the Consumer Protection Code and of Resolution CONANDA no. 163

/2014.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Advergames, Advertising, Children, Consumer

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2

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1 INTRODUÇÃO

No mundo globalizado do século XXI, a concorrência entre os fornecedores tem

aumentado consideravelmente e muitas das estratégias publicitárias antes vistas como eficazes

tornaram-se obsoletas e antiquadas. Anúncios em meios de comunicação clássicos como

outdoors e televisão em horário nobre não suprem mais da mesma forma as necessidades de

captura dos consumidores.

Nesse aspecto, a ampliação das estratégias de captura em massa de consumidores

específicos tem se desenvolvido. Nesse contexto, destacam-se os advergames. Esse mecanismo

de veiculação publicitária por um meio de comunicação alternativo (jogos de computador, de

smartphones ou de videogames) tem sua origem etimológica na fusão dos termos advertise e

game, que significam “publicidade” e “jogo”, respectivamente. Funciona como uma ferramenta

inovadora de disseminação publicitária nos jogos, podendo ser considerado um advergame

tanto os que são desenvolvidos exclusivamente para fins de publicidade, como também jogos

diversos que contenham mensagens publicitárias inseridas em sua interface.

O público alvo de grande parte desses jogos são as crianças. Com a evolução dos jogos

e com a sua facilidade de acesso, esse público tornou-se alvo fácil para os

fornecedores/anunciantes que buscam disseminar seus produtos, serviços ou marcas.

Entretanto, no mercado de consumo, além da vulnerabilidade comum que está presumidamente

presente nos consumidores, existe uma hipervulnerabilidade (vulnerabilidade acentuada) das

crianças, que deveria impedir a proliferação desse tipo de estratégia, ao considerar que esses

consumidores infantis não tem discernimento o suficiente para ficaram a salvo de técnicas

publicitárias abusivas que, muitas vezes, podem incitar comportamentos lesivos ao seu

desenvolvimento.

Em primeiro, a criança é protegida pela Constituição da República Federativa do Brasil

de 1988 (artigo 227) e, notadamente, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº

8.069/1990). Em segundo, caracterizada como consumidora, é respaldada pelos princípios do

Código de Defesa do Consumidor no que se refere à vulnerabilidade (artigo 4°, inciso I), bem

como, quando exposta à publicidade, enquadrar-se-á nos dispositivos éticos do Código

Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (BRASIL, 1988, 1990a, 1990b, 1980). Mais

ainda, a Resolução CONANDA n° 163/2014, de 13 de março de 2014, dispõe acerca da

abusividade da publicidade dirigida às crianças (BRASIL, 2014).

O empecimento da questão gira em torno da análise deliberativa entre dois fatores. Por

um lado, a premência fornecedora para com a inovação eficaz e criativa de campanhas

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publicitárias mais específicas que, quando não tem a devida regulamentação, acabam por lesar

o consumidor e o mercado de consumo como um todo. Por outro, a manipulação do consumidor

infantil que não possui discernimento suficiente para se proteger de peças publicitárias abusivas

presentes nos seus jogos supostamente desenvolvidos para entreter e divertir.

2 OBJETIVOS

Analisar os advergames a partir dos parâmetros normativos de controle da

comunicação publicitária instituídos pelo microssistema consumerista, dentro do qual estão

incluídos o Código de Defesa do Consumidor juntamente com a legislação complementar que

dispõe sobre as relações de consumo.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para essa caracterização, utiliza-se de pesquisa de natureza objetiva descritiva, cujas

características do empecimento são descritas juntamente com suas possibilidades de solução.

Adequa-se às técnicas de coleta padrão de pesquisas doutrinárias e de leituras documentais, de

maneira informativa por seleção interpretativamente. Por fim, apresenta abordagem hipotético-

dedutiva no sentido de confirmar a ilicitude da publicidade voltada para crianças por meio dos

jogos (advergames).

4 DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA

A relação jurídica de consumo é caracterizada a partir da presença de seus elementos

constitutivos: subjetivos, objetivos e causal (MIRAGEM, 2019). Os elementos subjetivos

dizem respeito a consumidor e a fornecedor, já os objetivos são relativos ao produto e ao serviço

(GARCIA, 2020). O elemento causal, por sua vez, refere-se à necessidade de destinação final

do bem, a qual é norteada por três teorias: a maximalista (NETTO, 2020), a finalista (PAIVA,

2015) e a finalista atenuada (BRASIL, 2005a).

À vista disso, a criança pode ser respalda pelo Código de Defesa do Consumidor desde

que a relação de consumo seja configurada pela presença de todos os seus elementos. Assim,

quando uma criança (consumidor) é exposta a um anúncio publicitário no contexto de um jogo,

configura-se a relação de consumo por equiparação nos termos do artigo 29 do Código de

Defesa do Consumidor, em decorrência da exposição à publicidade.

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As campanhas publicitárias apresentam ferramentas que incitam a aquisição de

produtos (REYES LÓPES, 2012) e despertam desejos no consumidor (PEREIRA, 2018). Mais

ainda, se ele não possuir discernimento para identificar se está sendo alvo de uma publicidade,

como a criança quando está se divertindo por meio dos advergames, a publicidade vai de

encontro ao princípio da identificação publicitária previsto no artigo 36, caput do referido

Código (BRASIL, 1990b).

Nesse contexto, como afirmava Sigmund Freud, as distrações eficientes e as

satisfações substitutivas são os principais mecanismos para lidar com a melancolia e para se

viver em sociedade (FREUD, 2011). Essas ferramentas psicológicas são influenciadas pelo

consumo, isto é, a necessidade de consumo de um indivíduo vulnerável é o que incentiva o

fornecedor/anunciante a disponibilizar no mercado itens que o capture, supostamente curando

sua melancolia, aqui vista como desejo de consumo para com determinado bem.

É justamente nesse aspecto de educação e de manipulação sistemática da criança que

surge a tecnologia dos jogos eletrônicos e virtuais. Os desejos por diversão infantil são

supostamente supridos pela compra e pela utilização de jogos específicos disponibilizados pelos

fornecedores às crianças.

A publicidade, em casos como este, pode ocorrer por meio de duas etapas. A primeira

consiste em influenciar o consumidor infantil a adquirir os jogos, mediante compra realizada

por seus responsáveis, por meio de anúncios simples veiculados na televisão ou em canais de

comunicação em massa. Mas é a segunda etapa que caracteriza a maior problemática. A

jogabilidade das crianças, por vezes, não é administrada pelos pais/responsáveis e, dentro

desses jogos, podem ser disponibilizados anúncios publicitários específicos de marcas que os

patrocinaram, influenciando a criança a consumir produtos e serviços diversos (FREITAS;

PATRIOTA, 2011).

O advergame, também chamado de jogo de publicidade, vem sendo explorado de

maneira crescente com o fito de divulgar marcas e produtos por meio da mídia alternativa dos

jogos disponibilizados às crianças, um público alvo com necessidades mais específicas,

aumentando as vendas e o lucro do patrocinador (KIM, 2008).

Em virtude da necessidade de investimento em peças publicitárias veiculadas por meio

mídias alternativas, o desenvolvimento dos advergames tornou-se extremamente eficaz, mas

que pode se tornar uma prática ilegal e antiética. Portanto, essa publicidade disfarçada de jogos

voltados ao público infantil possibilita que o fornecedor/patrocinador/anunciante capture

consumidores específicos e vulneráveis de maneira ilícita.

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O Código de Defesa do Consumidor dispõe de um rol (artigo 37, §2º) considerado

exemplificativo no que se refere a caracterização da publicidade abusiva, podendo o advergame

ser facilmente integrado a essa lista por explorar o inconsciente da criança por intermédio de

peças publicitárias presentes nos jogos, nem sempre de maneira identificável, indo de encontro

ao princípio da identificação da publicidade respaldado pelo artigo 36, caput do referido Código

(BRASIL, 1990b).

Ademais, a Resolução CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do

Adolescente) n° 163/2014, de 13 de março de 2014, dispõe sobre a abusividade quando a

publicidade for dirigida às crianças (BRASIL, 2014). Por último, o Código Brasileiro de

Autorregulamentação Publicitária também tem disposições específicas relativas à publicidade

voltada ao público infantil nos seus artigos 33 e 37 e no seu Anexo A (BRASIL, 1980).

5 CONCLUSÕES

À vista disso, conclui-se que a estratégia publicitária materializada pelos advergames

configura-se como abusiva, haja vista que explora a vulnerabilidade da criança consumidora,

capturando-a para ascender a marca/produto do fornecedor anunciante. Assim, baseado nas

disposições da Constituição Federal, do Estatuto da Criança e do Adolescente e, notadamente,

do Código de Defesa do Consumidor, do Código Brasileiro de Autorregulamentação

Publicitária e da Resolução do CONANDA n° 163/2014, configura-se abusividade publicitária

e pode-se perceber que a impossibilidade de identificação da publicidade por parte do

consumidor infantil pode vir a lesar o seu discernimento para com a suposta necessidade de

consumo.

Assim, cabe à família e à sociedade garantir o pleno desenvolvimento mental e social

das crianças, haja vista que os jogos de publicidade (advergames) podem influenciar

negativamente a evolução infantil. Somado a isso, cabe ao Estado, na figura do Poder Judiciário

em parceria com as instituições que promovem a tutela administrativa do consumidor (v.g.

PROCON), atuar de maneira intensa nesse ambiente publicitário.

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ANÁLISE DO SACRIFÍCIO DE ANIMAIS EM RITUAIS RELIGIOSOS À LUZ DA LEI 9.605 DE 1998 E DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 494.601

ANALYSYS OF ANIMAL SACRIFICE IN RELIGIOUS RITUALS BASED IN THE LAW 9.605 FROM 1998 AND THE EXTRAORDINARY APPEAL NUMBER 494.601

Raquel Luiza Borges BarbosaHelena Gontijo Duarte de Oliveira

Resumo

O artigo pretende desenvolver é a prática de sacrifício de animais presente em rituais

religiosos, tendo como base o art. 32 da Lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais) e a decisão

do Supremo Tribunal Federal (STF) no recurso extraordinário nº 494.601. O problema objeto

da investigação científica proposta é: o sacrifício de animais realizado em tais rituais

configura crime de maus tratos? O objetivo geral do trabalho é analisar o conflito entre

liberdade religiosa e o direito dos animais e, dessa forma, concluir se é possível enquadrar

práticas de sacrifício de animais como uma afronta ao Direito Ambiental brasileiro.

Palavras-chave: Direito animal, Liberdade religiosa, Sacrifício de animais

Abstract/Resumen/Résumé

This article covers the practice of animal sacrifice in religious rituals, in the light of article 32

of Environmental Criminal Law (9.605/98) and the Brazilian Supreme Court decision in the

extraordinary appeal number 494.601. The problem that is the object of the proposed

scientific investigation is: does animal sacrifice performed in such rituals constitute a crime

of mistreatment? The general object of this paper is to analyze the conflict between religious

freedom and animals rights, and therefore concludes if its possible to fit the animal sacrifice

as an act against the Brazilian Environmental Right.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Animal rights, Religious freedom, Animal sacrifice

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1. INTRODUÇÃO

Toda atmosfera relativa ao Direito do Animais é envolta pelas mais diversas

discussões. No âmbito penal, as discussões se afloraram quando tal tema é colocado em análise

sob a perspectiva da Lei 9.605 de 1998 (Lei de Crimes Ambientais), que apresenta um rol de

crimes contra a fauna em nove artigos, sendo um desses crimes o de maus tratos, tipificado no

artigo 32 da referida lei.

A pesquisa que se propõe pertence à vertente metodológica jurídico-sociológica. No

tocante ao tipo de investigação, foi escolhido, na classificação de Witker (1985) e Gustin

(2010), o tipo jurídico-projetivo e a técnica a pesquisa teórica. O tipo de argumento selecionado

foi o dialético. Em frente a amplitude e complexidade do tema, o trabalho se propõe a refletir a

extrema necessidade de respeito à manifestação religiosa e, ao mesmo tempo, ao direito dos

animais.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1. Problema

Os rituais feitos pelas religiões de matriz africana são, para alguns, um claro crime de

maus tratos, tipificado no artigo 32 da Lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais). Por outro lado,

outras pessoas acreditam que a liberdade religiosa assegura a essas religiões o direito de praticar

suas crenças e realizar rituais de sacrifício de animais. Dessa maneira, o sistema jurídico

enfrenta um impasse: deverá ele assegurar as religiões de matriz africana o seu direito a

sacrificar animais, ou então deverá ele proibi-los completamente?

O principal problema que o presente trabalho se presta a enfrentar é o conflito entre o

direito constitucional à manifestação religiosa e a vedação aos maus tratos. A Constituição

Federal, em seu artigo 5º, inciso VI, estipula ser inviolável a liberdade de consciência e de

crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos e garantindo, na forma da lei, a

proteção aos locais de culto e as suas liturgias. Por outro lado, o art. 32 da Lei 9.605/98

estabelece que nenhum animal, seja ele silvestre, doméstico, nativo ou exótico, poderá sofrer

maus tratos ou abuso de qualquer maneira.

Entretanto, outro questionamento deve ser levantado: o sacrifício feito pelas religiões

de matriz africana possui alguma semelhança com o abate de animais realizado pela indústria

pecuária? Esse problema faz necessária a análise das condições degradantes às quais são

submetidos os animais criados em abatedouros. Ademais, é preciso questionar, também, o

motivo pelo qual jamais foi colocada à prova a legalidade das práticas que ali são realizadas.

2.2. Rituais das religiões de matriz africana

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As religiões de matriz africana foram, e ainda são, religiões marginalizadas e

oprimidas pela sociedade e, por esse motivo, por diversas vezes ao longo dos anos, tiveram que

praticar sua religiosidade em segredo e, consequentemente, abandonar certos rituais por eles

praticados. Como exemplos de religiões de matriz africana temos o Candomblé, a Umbanda, o

Catimbó e o Xangô. (MACIEL; CUNHA JÚNIOR, 2019).

Também é necessário ressaltar que os rituais variam de acordo com a religião, porém,

há um certo padrão a ser seguido. O animal geralmente é morto por um integrante que possui,

especialmente, essa função. Após esse momento, as partes do animal são colocadas em lugares

específicos, com o intuito de oferecê-las aos deuses (orixás). O sangue será utilizado para

sacramentar imagens, a carne será servida como refeição e, algumas vezes, até o couro do

animal poderá ser utilizado na produção de instrumentos típicos da religião.

(CAVALCANTE,2019)

2.3 Direito dos Animais

Em 1947, foi editado o decreto-lei 16.590, que regulamentava o uso de animais em

casas de diversão pública, proibindo a utilização de touros, galos, canários, entre outros animais.

Desde então, diversas leis de proteção aos animais foram editadas pelo poder público e

legislativo, tal como o Decreto-Lei n.º 3.688 (Lei de Contravenções Penais) que, em seu artigo

64, proibia a crueldade contra os animais. Igualmente importante em relação à proteção aos

animais, temos, por outro lado, a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, proclamada

pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) em 27 de

janeiro de 1978, na cidade de Bruxelas na Bélgica. (DIAS, p. 55, 2017)

Porém, como ensinam Queiroz, Gurgel e Costa (2013, p. 304)

Contudo, o Direito Ambiental só perdeu o caráter privatista a partir da publicação da

Lei n.6938, de 31 de agosto de 1981, que instituiu a Política Nacional do Meio

Ambiente; da vigência da Lei n. 7.347, de 24 de julho de 1985, que criou a Ação Civil

Pública; e da elevação do meio ambiente à categoria de bem jurídico

constitucionalmente assegurado, o que se verificou com a Constituição Cidadã de

1988.

A constituição traz, em seu art. 225, inciso VII, a vedação a práticas cruéis contra

animais. (BRASIL, 1988). A Lei de Crimes Ambientais também consagra, em seu art. 32, a

vedação aos maus tratos, aos abusos, ferimentos e mutilação de animais, sejam eles silvestres,

domésticos, nativos ou exóticos. (BRASIL, 1998).

No ano de 2018, o deputado federal Ricardo Izar, do Partido Social Democrático

(PSD), apresentou o Projeto de Lei 27, que acrescenta dispositivos à lei 9.605 de 1998 (Lei de

Crimes Ambientais) que dispõem sobre a natureza jurídica dos animais. Dessa maneira, seria

criado um regime jurídico sui generis que determinaria que os animais não humanos são sujeitos

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de direitos despersonificados, dos quais devem gozar e obter tutela jurisdicional em caso de

violação, vedado o seu tratamento como coisa. (OGLOBO, 2019)

2.4 Entendimento do Supremo Tribunal Federal

O Supremo Tribunal Federal, na análise do Recurso Extraordinário nº 494.601, no qual

se discutia a validade da Lei Estadual 12.131/2004 do Rio Grande do Sul, fixou a seguinte tese:

“É constitucional a lei de proteção animal que, a fim de resguardar a liberdade religiosa, permite

o sacrifício ritual de animais em cultos de religiões de matriz africana” (BRASIL, 2019). O

tema chegou à discussão no plenário em setembro de 2006, mas apenas em março de 2019 o

julgamento foi concluído.

O recurso foi interposto pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul após ter o

pedido de declaração de inconstitucionalidade de um dispositivo da Lei Estadual 11.915/2003

(que institui o Código Estadual de Proteção aos Animais, no âmbito do Estado do Rio Grande

do Sul) negado pelo Tribunal de Justiça gaúcho. Esse dispositivo é o parágrafo único do artigo

2º, que fora incluído pela Lei 12.131/2004, e dispõe: “Não se enquadra nessa vedação o livre

exercício dos cultos e liturgias das religiões de matriz africana”. Dessa forma, as proibições do

artigo 2º, que incluem diferentes formas de maus tratos a animais, não seriam oponíveis a casos

de sacrifício de animais em rituais religiosos.

O artigo 5º, inciso VI da CR/88 dispõe que “é inviolável a liberdade de consciência e

de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei,

a proteção aos locais de culto e a suas liturgias” (BRASIL, 1988). Dessa forma, é um direito

fundamental do indivíduo brasileiro a manifestação religiosa, e a lei deve assegurar o exercício

desse direito. Porém, como aponta Aguiar (2019) também é “dever do estado zelar pelos

animais, como parte integrante do meio-ambiente”.

Percebe-se, portanto, que no aparente conflito entre estes dois preceitos

constitucionais, o STF priorizou a manifestação religiosa em detrimento do direito a um meio

ambiente ecologicamente equilibrado. Porém, é necessário entender a maneira pela qual o

tribunal fixou essa tese. Ao analisar o dispositivo da Lei Estadual 11.131/2004, o STF entendeu

que vedações a maus tratos não se aplicam ao abate de animais em rituais religiosos. Dessa

forma, não houve regulamentação de como esse abate deve ocorrer, mas sim se preconizou um

afastamento de tais atos da esfera de controle do poder público. Assim sendo, não há como

garantir que o abate de animais em rituais religiosos será feito de maneira não cruel.

2.5 Crime de maus-tratos aos animais

O artigo 32 da Lei 9.605/98 define como crime a prática de “ato de abuso, maus-tratos,

ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos” (BRASIL,

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1998). Além disso, o §2º do referido artigo prevê em aumento de pena se tal prática resultar na

morte do animal. Esse crime é um dos crimes contra a fauna tipificados na Lei de Crimes

Ambientais que visa cumprir um mandato constitucional expresso de criminalização contido no

artigo 225, §1º, inciso VII da CR/88, que incube ao Poder Público o dever de “proteger a fauna

e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica,

provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade” (BRASIL, 1988).

O meio ambiente cultural é “composto pelo patrimônio histórico, artístico,

arqueológico, paisagístico, turístico, científico e pelas sínteses culturais que integram o universo

das práticas sociais das relações de intercâmbio entre o homem e a natureza” (GOMES, 1997

apud RICHTER, 1999, p. 26). Os artigos 215 e 216 da CR/88 incubem ao Poder Público a

proteção ao meio ambiente cultural. Dessa forma, é importante identificar quais são os bens

reveladores da cultura brasileira, a fim de protegê-los. Nesse sentido, parece evidente que as

práticas religiosas são parte do meio ambiente cultural de um povo e, portanto, merecem

proteção.

Uma análise jurisprudencial tornou claro que o sacrifício de animais em rituais

religiosos não é tema pacífico, uma vez que “por um lado, a jurisprudência decidiu certas

práticas como cruéis e, por outro, utilizou-se do meio ambiente cultural para defender a

preservação do exercício religioso, uma vez que a religião caracteriza-se como patrimônio

cultural da sociedade”. (KOENIG, 2013, p. 93).

Por fim, é necessário entender o que são práticas consideradas cruéis contra animais.

Nesse sentido, Koenig (2013, p. 68) entende que “práticas necessária ao bem-estar, saúde e

dignidade da vida da coletividade não são tidas como cruéis aos olhos da Constituição”.

2.6 Sacrifício de animais em outras áreas

Ressalta-se que o sacrifício de animais faz parte do cotidiano da vida humana em outras

áreas diversas da religiosa. Seja para a alimentação, ou até mesmo para a extração de produtos,

diversos animais morrem para satisfazer um padrão de vida tido como “normal” pela sociedade

atual. Nesse item, iremos estudar o sacrifício de animais especialmente pela indústria

alimentícia, para entender se o abate para a alimentação também pode ser considerado uma

prática cruel e, portanto, crime de maus tratos.

Uma interpretação do artigo 225, §1º, VII da CR/88 nos permite inferir que a

Constituição tolera o abate de animais desde que esses não sejam submetidos à crueldade.

Porém, a ONG World Animal Protection, em relatório produzido sobre a situação dos

matadouros no Brasil concluiu que

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Bilhões de animais de produção passam por situações de estresse e de sofrimento

desnecessário antes e durante o seu abate. Isso porque muitas vezes os profissionais

que trabalham com estes animais não dispõem de conhecimento, nem de técnicas

apropriadas para assegurar um manejo humanitário destes animais. (WORLD

ANIMAL PROTECTION)

Dessa forma, percebe-se que é possível afirmar que ao tratarem animais de forma cruel durante

o abate, os profissionais dessa área estão cometendo crime de maus tratos.

A partir disso, emerge a discussão daquilo que é socialmente aceitável, uma vez que o

Princípio Penal da Adequação Social infere que determinada conduta “não será considerada

típica se for socialmente adequada ou reconhecida, isto é se estiver de acordo com a ordem

social da vida historicamente condicionada” (PRADO, 2002, p. 124). Certamente em uma

sociedade em que a maioria consome proteína animal, o abate de animais para o consumo

alimentício é considerado aceitável e até mesmo encorajado. Mas isso não quer dizer que o

abate pode se dar de qualquer forma. É preciso que o animal não seja exposto a sofrimento

maior do que o necessário.

2.7 Discriminação racial nas religiões de matriz africana no Brasil

A Lei nº 7.716 de 1989 (Lei da Discriminação Racial) prevê, em seu artigo 1º, como

uma das formas de discriminação, o preconceito em relação à religião. Dessa forma, são

punidos, nos termos da lei, atos relacionados a esse tipo de discriminação no Brasil.

Contudo, persiste no Brasil o preconceito com as religiões de matriz africana.

Por um lado o racismo e a discriminação que remontam à escravidão e que desde o

Brasil colônia rotulam tais religiões pelo simples fato de serem de origem africana, e,

pelo outro, a ação de movimentos neopentecostais que nos últimos anos teriam se

valido de mitos e preconceitos para "demonizar" e insuflar a perseguição a

umbandistas e candomblecistas. (PUFF, 2016)

Percebe-se, portanto, que o preconceito com religiões de matriz africana remonta de

anos atrás e, mesmo com instrumentos legais para coibição de tal ato, persiste e até mesmo

ganha força atualmente. Como demonstrado anteriormente, o sacrifício de animais é

considerado aceitável em diversas situações, porém a discussão se torna polêmica quando

analisada juntamente com a religião. A conclusão que chegamos é que isso pode estar

relacionado com o racismo estrutural que as religiões de matriz africana sofrem no Brasil.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Levando em consideração todos os aspectos acima expostos, conclui-se que o Direito

dos animais tem evoluído no Brasil no sentido de considerá-los cada vez mais como sujeitos de

direitos. Muito embora parte da doutrina ainda acredite que a Lei de Crimes Ambientais, ao

tipificar crimes contra a fauna, visa proteger um direito difuso da sociedade a um meio ambiente

equilibrado, para nós a Lei visa proteger a própria fauna. Dessa forma, o sujeito passivo do

crime de maus tratos tipificado no artigo 32 dessa Lei é o próprio animal.

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O sacrifício de animais ocorre em diferentes áreas da vida humana e existem

determinações legais que impedem que tal prática seja realizada de maneira cruel. Além disso,

o princípio da Adequação Social exclui a tipicidade das condutas de abate quando este é para a

alimentação. Porém o fato da Lei Estadual 11.131/2004 ter excepcionado a prática do sacrifício

de animais em rituais religiosos de matriz africana, para que não fosse considerado como maus

tratos, nos faz perceber que tal prática não é pacificamente aceita como socialmente adequada.

O fato de tal discussão ter chegado ao Supremo Tribunal Federal mostra como o tema

não é pacífico e como essa discussão é de suma importância atualmente. Consideramos,

entretanto, que a corte constitucional pecou ao deixar de analisar, em sua decisão, questões

como os animais como sujeito de direitos e a discriminação às religiões de matriz africana.

Por fim, consideramos que a prática de sacrificar animais em rituais religiosos de

matriz africana é parte do meio ambiente cultural brasileiro e merece proteção especial. Dessa

forma, tal prática deveria ser considerada como socialmente adequada e, assim, os praticantes

não estariam incorrendo no crime de maus tratos aos animais tipificado no artigo 32 da Lei de

Crimes Ambientais.

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BLOCKCHAIN NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

BLOCKCHAIN IN PUBLIC ADMINISTRATION

Carolina de Bortoli Garcia

Resumo

O presente artigo aborda a tecnologia blockchain na Administração Pública com o intuito de

criar potenciais para o desenvolvimento do governo digital. Além disso, é necessário aplicar

os princípios para governar, agir democraticamente e melhorar a capacidade do serviço da

administração pública. A aplicação da tecnologia blockchain no Brasil, proporcionaria mais

transparência nas transações econômicas do país, combate a fraudes e corrupções. Desta

forma, o sistema blockchain é o mais seguro para o governo digital pois é protegido

criptograficamente e garante a irreversibilidade das informações. O método adotado é o

hipotético-dedutivo e instrumento qualitativo.

Palavras-chave: Tecnologia blockchain, Modernidade, Administração pública

Abstract/Resumen/Résumé

This article deals with blockchain technology in Public Administration in order to create

potential for the development of digital government. In addition, it is necessary to apply the

principles to govern, act democratically and improve the capacity of the public administration

service. The application of blockchain technology in Brazil would provide more transparency

in the country's economic transactions, combat fraud and corruption. In this way, the

blockchain system is the most secure for the digital government as it is cryptographically

protected and guarantees the irreversibility of the information. The method adopted is the

hypothetical-deductive and qualitative instrument.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Blockchain technology, Modernity, Public administration

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1. Introdução

O Brasil passou por grandes modificações na gestão pública, especialmente no trânsito

para a democracia e a globalização. Neste percurso, a administração pública proporcionou

inovações no princípio da eficiência, como a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal,

inclusive a tecnologia da informação conhecida como o Governo Eletrônico que levou aos

menores custos e aumento na transparência reduzindo o potencial de corrupções e levando

maior interatividades aos cidadãos. A aplicação blockchain tem como característica viabilizar

a inalterabilidade dos registros feitos em uma rede, com a autoridade central certificadora dos

mesmos registros, além disso, proporciona maior segurança de realizações e transparências nas

transações efetuadas na rede. Em razão disso, a tecnologia está promovendo relevantes ações

estratégicas e políticas em diversas economias no redor do mundo, inclusive os países como

Reino Unido, Nova Zelândia, Israel e principalmente a Estônia vêm destacando interesse de

diversos meios de Governo Tecnológico. Desta maneira, o Brasil está passando por processo

de análise de métodos para aplicação da tecnologia. Segundo a Serpro, o sistema blockchain é

uma das novas apostas para o sistema tecnológico do Governo brasileiro, pois ira proporciona

mais qualidade do serviço público, bem como nas transações da gestão pública.

O objetivo deste trabalho, é qualificar pontos positivos para a aplicação da tecnologia

no Brasil, viabilizando maior participação ao cidadão brasileiro, bem como diminuição de

fraudes e corrupções, proporcionando mais transparência na administração pública.

Este trabalho adota o método hipotético-dedutivo e foi desenvolvido a partir de

instrumento qualitativo. Realizou-se ampla pesquisa bibliográfica, voltada à revisão de

literatura sobre o processo de modernização da administração púbica e o novo desenvolvimento

e aplicação da tecnologia blockchain no Brasil.

2. Sistema (Tecnologia) Blockchain.

A tecnologia blockchain foi desenvolvida para proporcionar maior segurança nas

transações de moedas digitais, sendo concebido pela moeda Bitcoin. Assim sendo, o sistema de

Bitcoin é um sistema de caixa eletrônico descentralizado, arquitetado e confeccionado pelo

pseudônimo de Satoshi Nakamoto, sendo configurado pela a moeda digital descentralizada e

que não necessita de terceiros para funcionar, no qual, não precisaria de bancos ou governos

para administrar o seu dinheiro.

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Em síntese, o blockchain é um sistema descentralizado de registro que utiliza meios

para compartilhar informações apenas em uma única entidade, que posteriormente ordenados e

controlado por todos participantes, através de um mesmo sistema de comunicação (o protocolo)

para validar e armazenar as mesmas informações registradas em uma das redes, a elementos

necessários para que as informações coletadas não possam ser modificadas porque os

algoritmos criptográficos complexos é adicionados à capacidade coletiva da rede, e ajuda a

garantir a irreversibilidade das informações (ROBICHEZ,2019) .Diante deste sistema, as

empresas como propriedades intelectuais e instituições financeiras necessitam da nova

tecnologia, pois não há somente mudanças tecnológicas, mais também cultural e regulatória.

Entre outras razões, a mudança cultural e o operacional destaca o novo modelo de negócio e

distribuições de capacidades dos novos concorrentes surgidos na rentabilidade bancária.

3. Modernização na Administração Pública.

A Administração Pública iniciou-se no ano de 1808 com a chegada da Coroa no Brasil,

diante disso foi caracterizado o sistema patrimonialismo que abordava o nepotismo e a grande

corrupção. Desta forma, os traços do nepotismo incumbiu o favoritismo no poder público diante

dos familiares da Coroa, inclusive não haviam distinções em relação aos patrimônio público e

o patrimônio da Coroa (privado) que agora é qualificado como a corrupção dos dias atuais ,

também houve o clientelismo que a Coroa consistia em privilegiar, amigos ou familiares ao

serviços públicos. Além disso, é importante ressaltar que nos dias atuais é considerado crime o

nepotismo conforme expressa o Decreto nº 7.203, de 4 de junho de 2010.

No entanto, o Brasil adotou o modelo burocrático na Era Vargas que proporcionou o

foco no controle dos processos pelo o Órgão Departamento Administrativo do Serviço Público

(DASP) previsto na Constituição de 1937, criado em 1938, com a finalidade de aprofundar a

reforma administrativa destinada a organizar e a racionalizar o serviço público no país, este

departamento foi o primeiro passo no sentido da profissionalização da administração pública

no Brasil. Além disso, foi definido por Getúlio Vargas a obrigação do DASP em elaborar e

auxiliar na execução do orçamento. A burocracia é a base da extinção do patrimonialismo. Bem

como, no Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, estabeleceu no artigo 6° os princípios

fundamentais nas atividades da Administração Pública, inclui o planejamento, coordenação,

descentralização e a delegação de competência e o controle (DL-200, 1967). Inclusive, foi

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estabelecido o princípio da impessoalidade que tem como intuito em estabelecer a promoção

pessoal e fins públicos em satisfazer o bem comum da sociedade (ALCANTARA, 2019).

É indiscutível que a administração pública passou por grandes modificações,

especialmente no trânsito para a democracia e a globalização. Desta forma, o processo de

redemocratização foi constituído para tentar corrigir os erros cometidos pelos os militares, com

pouco importância em construir um novo Estado, diante deste fato, o regime autoritário foi

pródigo em intensificar os problemas na administração pública, como por exemplo o

descontrole financeiro. Além disso, para combater o espólio deixado pelo regime militar a

Constituição de 1988 , incluiu várias mudanças incluindo a democratização do Estado, que

favoreceu o fortalecimento do controle externo da administração pública que neste contexto,

também inclui o reforço dos princípios da legalidade, da publicidade, eficiência,

impessoalidade e moralidade expressos no artigo 37 da CF/88 (BRASIL, 1988). Inclusive, a

descentralização inicia a oportunidade para a maior parte da participação cidadã e para a

inovações no campo da gestão pública (ABRUCIO, 2007).

No entanto, houve uma série de inovações no decorrer do tempo, sendo uma delas o

princípio da eficiência que viabilizou ao cidadão maior participação social com os servidores

públicos, bem como a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) ou Lei

Complementar nº 101, cuja a responsabilidade foi direcionada especialmente a dos gestores

com relação às finanças públicas. Além da aprovação da LRF, foi impulsionado ao governo de

São Paulo um modelo eletrônico, a qual experiência trouxe bons resultados, isto é, se espalhou

para outros estados e governos. De fato, a tecnologia da informação tem levado à redução dos

custos, bem como ao aumento de transparência nas compras governamentais, reduzindo o

potencial de corrupções e levando maior interatividades aos cidadãos. Desta forma, a

responsabilidade do poder público e a transparência constitui o ultimo eixo estratégico para

inovações da administração pública, pois de alguma forma essa modernização será mais

eficiente e efetiva, que possa ser cobrada e controlada pela sociedade.

4. Aplicação do blockchain na Administração Pública.

A tecnologia blockchain tem como principais características em aplicar a imutabilidade

dos registros feitos em uma rede, como a ausência de uma autoridade central certificadora dos

mesmos, a dispensa da confiança entre sujeitos para realizações, transações e a principal

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transparência dos registros efetuados na rede. Desta forma, a tecnologia se apresenta como uma

geração de inovações e como uma ferramenta fundamental para relevância de transformação

digital. Além disso, concebem a capacidade de transações em livros distribuídos que oferecem

novas oportunidades para o Governo melhorar a transparência, evitarem fraudes e estabelecer

confiança no setor público. Bem como a Instituição Serpro (a maior empresa pública de

tecnologia de informação do mundo) e a Associação Brasileira das Empresas de TIC encontra-

se em um estudo para a aplicação da tecnologia blockchain no Governo Eletrônico, que visa ao

uso de tecnologias de informação e comunicação (TICs) operadas nas ações de Governo

(RESENDE; FREY, 2005) , sendo assim, garante a maior expectativa e principalmente melhores

serviços para o Governo, entre outros aspectos como a gestão, transparência, prestações de

contas, ética, integridade, legalidade e participação social dos cidadãos nas decisões do Estado.

Em vista disso, o sistema blockchain está promovendo relevantes ações estratégicas e

políticas em diversas economias em torno do mundo. Inclusive, os países da Digitais 5, que

representa o Reino Unido, Estados Unidos, Estônia, Nova Zelândia e Israel, porém os países

que têm mais se destacados em interesses de diversos meios de Governo Tecnológico é a

Estônia, Dubai e Holanda (ALCANTARA, 2019).

Entretanto, a Estônia é o modelo mundial na integração de tecnologias na

administração pública. Desta forma, é considerado o mais adequado ao governo público pois

reduz o custo e contém mais conteúdo democrático como participação dos cidadãos de forma

direta e indiretamente. Deste modo, o país adota a auto prestação de serviço como portais

tecnológicos que engloba a identificação segura como ID card (carteira de identidade), mobile

ID (ID celular) e smart ID (ID inteligente, aplicativo) aos cidadãos. Além disso, a Estônia foi

o primeiro país a utilizar a infraestrutura do sistema blockchain na saúde digital, isto é, o e-

health (portal do paciente) que tem uma estrutura abordando os sistemas e-prescription, e-

health records, e- ambulance, esta plataforma permite que os cidadãos, os prestadores de

cuidados de saúde ou as companhias de seguros de saúde possuam, e caso necessário

readquiram todas as informações sobre os prontuários médicos dos pacientes.

Consequentemente, o Brasil ainda está em análise para o total investimento da

tecnologia blockchain na Administração Pública, porém cabe ressaltar que na Constituição

Federal estabelece no artigo 218 que o “Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento

científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação” (BRASIL, 1988),

além disso, promoverá o direito “da adesão a padrões tecnológicos, estruturado em escala

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mundial para uso público”, entre outros aspectos, conforme expressa o artigo 4° da LEI nº

12.965/14 (BRASIL, 2014). Além de, está previsto o direito de inovação na Constituição

Federal, a Instituição Serpro tem como princípio o investimento na tecnologia blockchain, como

uma proposta de introduzir no trabalho público inovação e informação na tecnologia do

Governo Federal. (SERPRO, 2017).

Nessa perspectiva, cria potenciais benéfico para inclusão da tecnologia blockchain no

Brasil, bem como para o maior desenvolvimento do governo digital. Além do mais para

melhorar a capacitação do cidadão democraticamente, necessitando de princípios para a

governança em direção ao setor público. Desta maneira, abordaremos o princípio

Accountability que os agentes de governança devem prestar contas de sua atuação de forma

voluntária, como também o princípio da eficiência que precisa garantir a qualidade com o

menor custo possível, o princípio de legitimidade que embora não deva apenas ver se a lei foi

cumprida, sendo necessário saber se o interesse público e o bem comum foram atingidos, o

princípio da probidade que os gestores tem o dever de observar as regras e procedimento ao

utilizar, gerenciar e administrar os bens públicos, assim como, garantir o princípio da

transparência que visa proporcionar clima de confiança tanto internamente quando nas relações

de órgãos e entidades com terceiros. Tanto quanto aos princípios como para o desenvolvimento

do e-governança a de estabelecer, buscar ampliar a democracia por meio de instrumentos como

transparência, controle público e participação.

5. Conclusão

A introdução da tecnologia blockchain na Administração Pública vai desenvolver o

acesso à Informação e Transparência como forma de armazenamento em diversos locais e

verificação de histórico de transações, no qual acrescentará no processo da democratização.

Além disso, terá controle contra fraudes e corrupção, pois conforme o armazenamento ficará

disponível em diversos locais, e terá o histórico de transações, que vai gera trilhas de auditoria,

aumentando o controle contra fraudes e corrupção. Bem como, aumentará a eficiência como

qualidade e redução de custo e maior segurança da informação, entre outros.

Tendo em vistas aspectos observados, a Transparência Pública é essencial em diversas

situações em que há um ente público envolvido, isto é, a transparência é uma exigência legal

conforme ordena a Lei de Acesso à Informação (LAI – Lei no 12.527/2011). Outrossim, a

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tecnologia blockchain é conciliável e confiável para os fatos de recursos humanos, finanças e

compartilhamentos de dados bancários, entre outros. Desta forma, o a tecnologia trás segurança

e participação ao povo brasileiro, no qual permitam que todos participem de forma igual e sem

nenhuma restrição ou dificuldade no acesso ao sistema. Sem dúvida, a tecnologia blockchain

proporcionaria maior confiança no Governo brasileiro, apesar de estarmos presenciando uma

crise de confiança, corrupção e o uso inadequado do dinheiro público. Inclusive, é uma forma

de mostrar que o sistema está inovando cada vez mais e que a prioridade é o cidadão brasileiro.

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COMO O ACESSO CADA VEZ MAIS PRECOCE DE CRIANÇAS NA INTERNET TEM CONTRIBUÍDO PARA A VIOLAÇÃO DE SEUS DIREITOS FUNDAMENTAIS

HOW THE CHILDREN'S ACCESS ON THE INTERNET AT AN EARLIER AGE CONTRIBUTED TO THE VIOLATION OF THEIR FUNDAMENTAL RIGHTS

Gabriela Rangel Aguiar

Resumo

O presente artigo tem como objetivo a discussão sobre como o acesso cada vez mais precoce

das crianças aos meios tecnológicos tem impactado suas vidas. A principal abordagem é em

relação a como esse acesso tem contribuído para a violação de direitos fundamentais que lhes

são garantidos no Estatuto da Criança e do Adolescente, na Constituição Federal e na

Convenção da ONU sobre os Direitos das Crianças.

Palavras-chave: Crianças, Internet, Direitos fundamentais

Abstract/Resumen/Résumé

This article aims to discuss how children's increasingly early access to technological means

has impacted their lives. The main approach is in relation to how this access has contributed

to the violation of fundamental rights guaranteed to them in the Statute of Children and

Adolescents, in the Brazilian Federal Constitution and in the UN Convention on the Rights of

Children.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Children, Internet, Fundamental rights

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1.Introdução

Atualmente, vivemos na chamada Quarta Revolução Industrial ou Indústria 4.0., onde tudo se

baseia na tecnologia, até mesmo áreas que nunca foram ligadas diretamente a tecnologia, hoje

necessariamente precisam deste meio para perpetuar. O termo Quarta Revolução Industrial foi

desenvolvido por Klaus Schwab, diretor e fundador do Fórum Econômico Mundial, que afirma

que: "Estamos a bordo de uma revolução tecnológica que transformará fundamentalmente a

forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos. Em sua escala, alcance e complexidade,

a transformação será diferente de qualquer coisa que o ser humano tenha experimentado antes".

Assim, essa tecnologia, que está presente em todos os ramos causará impactos antes nunca

vividos pelo ser humano, afetando até mesmo a forma como se relaciona e o entendimento de

que se tem sobre o que somos.

Por isso, é importante observar que também serão afetados grupos que antes não lidavam com

a tecnologia de forma tão direta, sem um limite e sem um real controle das consequências de

que esta pode acarretar a eles. Nesse trabalho, analisar-se-á, os impactos que a Quarta

Revolução Industrial pode trazer para a vida de uma criança.

Observar-se-á os impactos em relação aos pontos específicos dos direitos fundamentais que

possuem fulcro no Estatuto da Criança e do Adolescente, diploma legal referência do tema no

Brasil. Visa-se buscar entender principalmente a relação entre a violação dos direitos

fundamentais das crianças e o amplo acesso à tecnologia que estas tem tido cada vez mais cedo.

2. A definição de criança no Direito Brasileiro

Primeiramente, é necessário ter conhecimento do significado do termo ‘‘criança’’ no Direito

Brasileiro. Para entender o sujeito que será citado nesta problemática, serão analisados dois

diplomas legais sobre o tema. O mais conhecido no Brasil, é o Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA - LEI Nº 8.069/90), que define em seu artigo 2º que ‘‘considera-se criança,

para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela

entre doze e dezoito anos de idade.’’

Já na Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente, ratificada pelo Brasil em 24

de setembro de 1990, em seu artigo 1º define que: Para efeito da presente Convenção, considera-

se como criança todo ser humano com menos de 18 anos de idade, salvo quando, em

conformidade com a lei aplicável à criança, a maioridade seja alcançada antes.

Assim, no presente trabalho o termo criança será utilizado amplamente, como o definido na

Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente, que é o instrumento de direitos

humanos mais aceito da história, sendo 196 países signatários. Criança é todo ser humano com

menos de 18 anos de idade, tendo em vista o objetivo finalístico da lei, a proteção dos vistos

como minoria e como hipossuficientes, sendo assim, o termo mais abrangente assegura tal

proteção.

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3. O acesso cada vez mais precoce da criança com a tecnologia na era da tecnologia – no

mundo 4.0.

Na era da Quarta Revolução Industrial tem-se o acesso cada vez mais precoce das crianças com

os meios tecnológicos. Isso fez com que os conteúdos fossem cada vez mais destinados a um

público específico. É o que acontece com o entretenimento voltado para as crianças, como em

programas de televisão, publicidade infantil e canais do YouTube voltados totalmente para o

público infantil.

Ainda não se sabe as implicações que esse acesso, que é cada vez mais incentivado pelo

conteúdo específico, pode trazer para a vida da criança. Principalmente para as crianças que

trazem e trabalham com esse conteúdo.

É possível citar pontos positivos de ter essa acessibilidade cada vez mais cedo, que é inevitável

na Quarta Revolução Industrial, e também os pontos negativos.

Alguns dos pontos positivos que podem ser citados são a possibilidade de aprender de forma

lúdica, testar a habilidade de concentração, despertar o interesse em novos temas, como novos

idiomas, desenvolver a autonomia, a velocidade, abrangência e inovação. Já alguns pontos

negativos que podem ser observados são a dificuldade de saber se o que está por trás da tela é

real, como a identidade de alguém, a perda da privacidade, o isolamento, a sobrecarga de

informações a todo momento, a limitação à estímulos pobres, que limitam o desenvolvimento

físico, mental e psicológico da criança, que está em fase de aprendizado.

Pode-se citar Paulo Freire para demonstrar a importância para o desenvolvimento da criança,

que esta conviva no mundo real também, não podendo ser a escola totalmente substituída pelos

meios tecnológicos, devido a sua capacidade de desenvolver a habilidade de socialização e a

“pedagogicidade indiscutível da materialidade do espaço”.

O ponto negativo específico que será tratado nesse artigo será a relação desse acesso a

tecnologia e a violação dos direitos fundamentais das crianças.

4. Os direitos fundamentais das crianças previstos na CF/88 e no ECA e a sua violação

pelo meio tecnológico

É necessário analisar se ao colocar uma criança para produzir conteúdo em meios tecnológicos

não se violará os direitos fundamentais previstos na legislação brasileira para tal grupo. Alguns

dos diplomas legais que podem ser citados são o art. 227/CF e o art. 4º do ECA, que garantem

que:

Art. 227/CF. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança,

ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à

dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,

além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,

exploração, violência, crueldade e opressão.

Art. 4º/ECA É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do

poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos

referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à

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profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à

convivência familiar e comunitária.

Especificamente, no que se refere à temática de crianças e aos meios de comunicação, merecem

destaque os artigos. 17 e 31 da Convenção sobre os Direitos das Crianças (1990).

Os direitos que mais devem ser ligados com tal situação é a preservação do direito da imagem,

o direito ao lazer e o direito a educação. Pois ao colocar uma criança para produzir conteúdo

virtual, ela passa a ter outra prioridade que não é intrínseca da infância, sendo os direitos ao

lazer e a educação os mais propensos a serem violados.

É preciso também se atentar ao crescimento dos excessos dos responsáveis que controlam a

produção de tal conteúdo, como para canais no Youtube, pois muitas crianças tem sido

erotizadas precocemente, principalmente as meninas, e muitas crianças tem sido controladas

para não crescerem de forma natural, pelo não aceitamento dos pais delas deixarem de sair da

fase infantil, já que são utilizadas para produzirem conteúdos infantis, e poderiam perder

engajamento deixando de ser crianças. São dois extremos que devem ser combatidos: a ‘‘saída’’

forçada da fase infantil e o contrário, a intervenção para que a criança não passe a próxima fase

de desenvolvimento, para que ela não ‘‘cresça’’. E isso interfere em relação a preservação ao

direito da imagem, que é um direito da personalidade da criança e deve ser objeto de proteção

integral.

É necessário analisar se tal situação coloca a criança em situação de trabalho infantil, ou em

uma situação de exploração e abuso infantil, que podem ser alavancadas pela utilização do meio

tecnológico para sua maior ocorrência. Por isso, deve-se penalizar os responsáveis envolvidos

nessas práticas.

5. A penalização dos responsáveis

A criança é integralmente protegida, principalmente com a ratificação do Estatuto da Criança e

do Adolescente, em 1990, ano de sua criação. Sua criação teve o intuito de trazer efetivação aos

direitos fundamentais das crianças e assim, uma vez desrespeitados, são previstas penas aos

responsáveis das crianças que praticam atos que não respeitam tais direitos e não praticam seus

deveres.

Assim, em caso de desrespeito ou abuso dos responsáveis em relação aos direitos fundamentais

das crianças, como no caso do controle irresponsável das crianças que produzem conteúdo

virtual, é possível que estes sejam responsabilizados, com a perda, a suspensão ou extinção do

poder familiar como previsto nos artigos 1.635, 1.637 e 1.638 do Código Civil. Além dessas

penas citadas, é possível aplicar outras previstas no ECA.

É necessário que a sociedade também participe ao combate a essas práticas, através da

conscientização de que certos atos não são coerentes para a infância. Sendo dever da sociedade

de cuidar das crianças e de denunciar práticas que estas são obrigadas a fazer pelos país, que

não são saudáveis para o seu desenvolvimento.

6. Conclusão

Na contemporaneidade os meios tecnológicos têm estado cada vez mais presentes em todas as

áreas das nossas vidas. Assim, é inevitável que estes também se tornem meios para a prática de

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violação de direitos fundamentais. É necessário, portanto, que se tenha a penalização dos

responsáveis por essas práticas da mesma forma.

É necessário tal penalização, principalmente quando a violação dos direitos fundamentais diz

respeito aos direitos das crianças, que possuem em nosso ordenamento jurídico proteção

integral. É necessária uma proteção especial para tal grupo, visto sua hipossuficiência, como é

previsto no preambulo da Convenção sobre os Direitos das Crianças (1990):

Lembrando que na Declaração Universal dos Direitos Humanos as Nações

Unidas proclamaram que a infância tem direito a cuidados e assistência

especiais;

Conscientes de que, conforme assinalado na Declaração dos Direitos da

Criança, "a criança, em virtude de sua falta de maturidade física e mental,

necessita de proteção e cuidados especiais, incluindo a devida proteção legal,

tanto antes quanto após seu nascimento";

Levando em consideração que as formas de se praticar tais violações mudaram, é necessário

que o Direito evolua e esteja atento a tais transformações, para que continue efetuando o papel

de proteger tal grupo que necessita de assistência e cuidados especiais.

Assim, tendo em foco nesse trabalho, principalmente a questão das crianças que produzem

conteúdo midiático, principalmente através do Youtube, é necessário que estas tenham a

garantia de que seus direitos fundamentais próprios da infância sejam protegidos, para que essas

se desenvolvam de forma saudável, como lhes é assegurado.

As crianças devem aproveitar seu direito de ser criança, de forma plena. Devem ser protegidas

da violência da obrigação de trabalhar ou a "adultização precoce", como previsto no Capítulo

V, artigo 60 do ECA. "É muito importante para uma criança poder ser criança e ter seu

desenvolvimento social e psicológico no tempo considerado adequado", disse a ministra do

TST Kátia Magahães Arruda, uma das gestoras da campanha de combate ao trabalho infantil.

Por isso, as crianças precisam ter tempo para estudar, descansar e principalmente brincar. Pois

devem viver a fase da infância para seu desenvolvimento integral.

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7. Referências Bibliográficas

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BRASIL. Decreto nº No 99.710, de 14 de setembro de 1990. DECRETA: Art. 1° A Convenção

sobre os Direitos da Criança, apensa por cópia ao presente Decreto, será executada e cumprida

tão inteiramente como nela se contém. Art. 2° Este Decreto entra em vigor na data de sua

publicação. Art. 3° Revogam-se as disposições em contrário. Convenção sobre os Direitos da

Criança., Brasilia, ano 1990, 21 nov. 1990.

BRASIL. Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do

Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,

Brasília, DF, 16 jul. 1990. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm#art266>. Acesso em: 10 de junho de

2020.

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Gráfico, 1988

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo:

Paz e Terra, 1996.

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subsídios generosos, que tiveram maus resultados, está esgotado. [S. l.], 2 maio 2019.

Disponível em:

http://conexaocorporativa.com.br/fundacredrs/site/m012/noticia.asp?cd_noticia=60001133.

Acesso em: 6 set. 2019.

LOPES, Guilherme Cano. . In: SILVEIRA, Cristiano Bertulucci. O Que é Indústria 4.0 e

Como Ela Vai Impactar o Mundo. [S. l.], 15 set. 2017. Disponível em:

https://www.citisystems.com.br/industria-4-0/. Acesso em: 6 set. 2019.

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criada por Klaus Schwab é uma mudança de paradigma que está transformando a forma como

consumimos e nos relacionamos – entenda os impactos para o seu emprego e para a economia.

[S. l.], 1 fev. 2019. Disponível em: https://www.startse.com/noticia/nova-

economia/60414/industria-4-0-entenda-o-que-e-quarta-revolucao-

industrial#targetText=A%20quarta%20revolu%C3%A7%C3%A3o%20industrial%2C%20ou,

por%20diversos%20te%C3%B3ricos%20da%20%C3%A1rea. Acesso em: 5 set. 2019.

PERASSO, Valeria. O que é a 4ª revolução industrial - e como ela deve afetar nossas vidas.

[S. l.], 22 out. 2016. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-37658309. Acesso

em: 5 set. 2019.

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1 Graduando em Direito - modalidade Integral - na Escola Superior Dom Helder Câmara.

2 Graduanda em Direito - modalidade Convencional - na Escola Superior Dom Helder Câmara

1

2

DIREITO AMBIENTAL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: QUESTIONAMENTOS ACERCA DOS MEIOS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL

BRASILEIRO

ENVIRONMENTAL LAW AND SUSTAINABLE DEVELOPMENT: QUESTIONS ABOUT BRAZILIAN ENVIRONMENT TACTICS OF PROTECTION.

Gabriel Morais de Souza Santos 1Pamela Almeida de Magalhães 2

Resumo

Situada na área de Direito Ambiental, subárea desenvolvimento sustentável, a presente

pesquisa busca demonstrar a importância da tutela ambiental como forma de garantia dos

direitos básicos do homem moderno e os impactos da degradação ambiental decorrentes dos

meios exploratórios de produção. Não obstante, visa declarar a perspectiva antropocêntrica

que o conceito de desenvolvimento sustentável adota a fim de constatar que o homem é o

objetivo centro dos meios de proteção ambiental, e não somente o meio ambiente.

Palavras-chave: Direito ambiental, Proteção ambiental, Desenvolvimento sustentável

Abstract/Resumen/Résumé

Situated in the Environmental Law, sub-area sustainable development, the present research

seeks to demonstrate the importance of environmental protection as a way of guaranteeing

the basic rights of modern man and the impacts of environmental degradation resulting from

exploratory means of production. Not only, seeks to declare the anthropocentric perspective

that the concept of sustainable development adopts aiming to constate that the man is the

main goal of the means of environmental protection, instead of only the environment.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Environmental law, Environmental protection, Sustainable development

1

2

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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Hodiernamente, a política ambiental brasileira encontra-se em uma dualidade. Esta

situação advém de fatores como a morosidade e precariedade de atitudes estatais em face de

problemáticas envolvendo o meio ambiente. Não somente, a falta de mecanismos estatais que

busquem proteger este bem jurídico de maneira mais célere coopera com a falta de punibilidade

daqueles que o prejudicam. Tais afirmações podem ser observadas, inclusive, quando se coloca

em contraste sinistros ambientais que não tiveram resolução imediata e tampouco efetiva.

Com isso, a análise do papel do Estado em face do meio ambiente torna-se necessária.

Não somente, é imprescindível que entenda-se o que é o desenvolvimento sustentável e o fim

a que se propõe. Por isso, a leitura crítica dos dispositivos constitucionais tal qual das origens

internacionais do direito ambiental são fontes primárias e de grande destaque na produção da

presente pesquisa. O entendimento do papel e função do homem em face de problemas

ambientais é de grande importância para a compreensão, também, de como a atitude do Estado

pode estar sendo tangenciada.

Não obstante, a análise da omissão estatal em alguns fatores é fundamental para a

constatação de até qual ponto o Estado está disposto a interferir na industrialização a fim de

proteger o meio ambiente. Destaca-se, contudo, que a pesquisa não possui conclusões

definitivas, sendo todas as presentes neste resumo expandido somente parciais.

Ademais, situada na área de direito ambiental, subárea desenvolvimento sustentável,

a presente pesquisa busca demonstra a importância da tutela ambiental como forma de garantia

dos direitos básicos do homem moderno e os impactos da degradação ambiental decorrentes

dos meios exploratórios de produção. Pertencente a vertente jurídico-sociológica, o tipo de

investigação escolhido, na classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), foi o tipo jurídico-

propositivo, com a técnica de pesquisa teórica. O raciocínio desenvolvido será

predominantemente dialético.

2. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

O desenvolvimento sustentável é objeto de inúmeros debates e estudos. Tal conceito,

apesar de ser o objetivo de diversos Estados, possui certas questões a serem elucidadas. A priori

é necessário entender as origens e objetivos do que foi determinado enquanto direito sustentável

e, por consequência, observar qual bem jurídico ele quer realmente proteger. Correntes do

direito ambiental divergem sobre o objeto deste direito ser efetivamente o meio ambiente ou se

o ser humano é, na realidade, o bem jurídico a ser realmente protegido.

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Como muito bem destacou Fábio Comparato em seu livro “A afirmação histórica dos

direitos humanos”, a campanha por tal espécie de desenvolvimento se iniciou com a

Conferência de Estocolmo de 1972, e teve continuação vinte anos após, na conferência Rio

+20, em que políticas públicas foram adotadas a fim de proteção ambiental. (COMPARATO,

2003). O conceito de desenvolvimento sustentável foi feito no Relatório “Nosso Futuro

Comum” em que, segundo site da ONU, se dispôs que:

O desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que encontra as

necessidades atuais sem comprometer a habilidade das futuras gerações de

atender suas próprias necessidades. [...]. O desenvolvimento sustentável

requer que as sociedades atendam às necessidades humanas tanto pelo

aumento do potencial produtivo como pela garantia de oportunidades iguais

para todos. [...] No mínimo, o desenvolvimento sustentável não deve pôr em

risco os sistemas naturais que sustentam a vida na Terra: a atmosfera, as águas,

os solos e os seres vivos. [...]. Na sua essência, o desenvolvimento sustentável

é um processo de mudança no qual a exploração dos recursos, o

direcionamento dos investimentos, a orientação do desenvolvimento

tecnológico e a mudança institucional estão em harmonia e reforçam o atual e

futuro potencial para satisfazer as aspirações e necessidades humanas. (ONU,

2019).

Afirma-se, portanto, que o desenvolvimento sustentável deve se preocupar com a

exploração, fazendo-a de modo consciente a fim de não comprometer a matéria prima existente

para futuras gerações. Contudo, como muito bem elucida Fábio Comparato:

Insista-se no fato de que o ser humano é, sempre, o foco central das ações de

preservação do meio ambiente. Só ele representa, como mostrou Kant, um fim

em si mesmo, não podendo ser utilizado como meio ou instrumento para a

consecução de outros fins. Algumas vezes, no entanto, a preocupação em

preservar a biodiversidade tende a nos fazer esquecer o princípio de que o

homem é o ponto culminante da evolução biológica e que, embora dependente

do equilíbrio ecológico para sobreviver, sua posição ética não se iguala à de

nenhum outro ser vivo. (COMPARATO, 2003).

Determina-se, então, que a política ambiental tem um viés antropocêntrico, sendo o

homem o fim a que se destina a proteção do meio ambiente. Em outros termos, o objetivo

central de se haver um desenvolvimento sustentável é para garantir o bem-estar humano, sendo

a proteção ambiental somente o meio para que este fim ocorra.

Não obstante, a Constituição Federal brasileira de 1988 adotou o desenvolvimento

sustentável, em seu art. 225 que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao

Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras

gerações.” (BRASIL, 1988). Não somente a adoção, mas é possível observar, em uma leitura

crítica do dispositivo, que ele possui um caráter antropocêntrico na medida em que designa o

direito ao meio ambiente e sua preservação como objetivo a fim de que as futuras gerações

tenham acesso a este.

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Todavia, questões acerca do órgão que seria responsável pela proteção ambiental é

levantada. De acordo com a CF/88, em seu art. 24, inciso VI, cabe concorrentemente à União

Estados e Distrito Federal legislar sobre meios de proteção do meio ambiente, não interferindo,

contudo, no fato de ser dever, também, do Município de protegê-lo, ainda que não legisle.

(BRASIL, 1988). Declara-se, portanto, que é dever de todas as instâncias da federação proteger

o meio ambiente, ainda que nem todas possam legislar.

Ainda neste sentido, o art. 170, CF/88 dispôs a proteção ao meio ambiente como uma

das bases da fundação da ordem econômica.

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e

na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme

os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: VI - defesa

do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o

impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração

e prestação. (BRASIL, 2003).

A proteção ambiental é reiterada ao longo da Carta Constitucional, também, em seu

art. 225, §3º, declarando que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente

sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,

independentemente da obrigação de reparar os danos causados.” (BRASIL, 1988). Demonstra-

se que a União, no que tange a seu âmbito constitucional, dá elevada importância a proteção

ambiental. Contudo, quando se contrasta com os óbices, dúvidas acerca do seu

comprometimento com o meio ambiente urgem.

3. ÓBICES NA POLÍTICA AMBIENTAL BRASILEIRA

Em meio à complexidade social, ao fenômeno da globalização e ao modelo industrial

capitalista adotado pelo mercado internacional, tem-se como regra os meios de produção de

técnica exploratória e a danificação extensiva de ecossistemas, quais as consequências não se

restringem a determinados limites territoriais, mas sim se propagam e geram impactos em toda

a comunidade global. Nesse contexto, ressalta-se a importância do investimento em um sistema

de proteção ambiental brasileiro eficiente, onde o controle, a fiscalização e a reparação devem

ser realizados pelo Poder Público a fim de que se evitem maiores calamidades. Procura-se

perante a tutela jurisdicional do meio ambiente resguardar não só os princípios estabelecidos

pela Constituição Federal, tais como o princípio do desenvolvimento sustentável, pautado no

caput de seu artigo 225, mas também preservar a qualidade de vida e salubridade do próprio

homem moderno, seu direito individual a uma vida sadia e proteger o meio-ambiente como um

bem qual a coletividade possui direito de usufruto.

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Como medida de redução dos impactos causados pela indústria petrolífera ao meio-

ambiente, foi proposto no ano de 2013, por meio do Decreto 8.127, o Plano Nacional de

Contingência (PNC) para incidentes decorrentes da poluição por óleo em águas sob jurisdição

nacional. (BRASIL, 2013). O PNC tinha como objetivo a fiscalização e controle da poluição

causada nas águas por lançamento de petróleo, definindo a atuação de órgãos do governo

federal e estabelecendo sanções de indenização e reparação aplicáveis ao poluidor. Entretanto,

mesmo com o amparo legislativo fornecido pelo ordenamento vigente, tem-se a morosidade do

Poder Público como uma ferramenta que age em favor de um sistema produtivo potencialmente

degradante. Por meio de artifícios como as recentes alterações realizadas pelo Decreto

Presidencial 9.759/19, facilita-se a omissão e pouca transparência dos órgãos estatais ao tratar

de casos mais gravosos, como as manchas de óleo identificadas no litoral do nordeste brasileiro

em 2019, extinguindo os comitês Executivo e de Suporte da estrutura basilar do plano, que são

fundamentais para sua execução e efetivação. Em resposta, o Supremo Tribunal Federal

questionou, por meio da ADI 6.121, a constitucionalidade da extinção dos colegiados

pertencentes à administração pública.

Diante dessa mesma ótica, Alves constata:

[...] finalmente, a triste constatação que o Estado Brasileiro, essencialmente

na sua esfera executiva – Poder Executivo – na regulação, ou atuando como

agente direto de desenvolvimento, é o nosso maior poluidor, e que somente a

sociedade civil organizada poderá, através dos instrumentos jurisdicionais de

tutela coletiva, além da atuação na esfera administrativa, permitir a

consecução de políticas públicas que traduzam efetivamente os direitos

constitucionais, individuais e coletivos, assegurados pelo poder constituinte

de 1988, além de assegurar efetiva tutela do bem de uso comum do povoado

bem ambiental. (ALVES, 2003).

Assim, a pouca efetividade jurisdicional na esfera do Direito Ambiental demonstra a

fragilidade da proteção ambiental perante os avanços da indústria de “produção pacífica dos

meios de destruição” (MARCUSE, 1973), que, sob a proeminência do império mercantilista

norte-americano, busca cada vez mais o acúmulo de mercadorias, capital e, principalmente, de

lucro, expondo a sociedade ao perigo, perpetuado por suas ações de destruição crescente.

Acidentes críticos ocorridos, como o rompimento de barragens de Mariana e Brumadinho nos

respectivos anos de 2015 e 2019, exemplificam bem as consequências de proporção elevada e,

muitas vezes, irreparáveis, que a indústria exploratória dos meios pode acarretar, escolhendo o

baixo custo em termos econômicos e alto benefício lucrativo na construção de barragens,

assumindo-se o risco de vida humana anteposto à perda do lucro e à lógica mercantil de

expansão “ilimitada". Infere-se, portanto, que no tocante a totalidade do processo, a baixa

onerosidade nas minas ativas com sistema de barragem é, de fato, mais atrativa para a lógica

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industrial capitalista, admitindo que a falta de monitoramento e regulação fiquem em uma

análise secundária.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proteção jurídica ao meio ambiente visa garantir a todos um meio de vida

ecologicamente equilibrado, evitando-se o esgotamento dos recursos naturais e preservando a

qualidade de vida daqueles que dependem de seus elementos. De fato, é inegável que a

degradação do meio ambiente, quer seja por ação humana ou por outras causas, compromete

gravemente o direito à qualidade de vida da sociedade, expondo a humanidade a consequências,

imediatas ou não, fruto da violenta alteração de seu território.

Não obstante, a adoção expressa da CF/88 pelo desenvolvimento sustentável enquanto

técnica para garantia do bem jurídico meio ambiente a futuras gerações, torna imprescindível

que se reflita os efeitos da exploração capitalista em face de um bem coletivo. A alteração dos

mecanismos para ativação do PNC gera dúvidas quanto ao comprometimento estatal mediante

tal dispositivo. A dificuldade em acionar este recurso administrativo gera prejuízos diretos aos

mecanismos de proteção ambiental.

Sendo o crescimento econômico um dos pilares para atingir o desenvolvimento, não é

possível fugir de processos como a globalização que, por consequência, dita as regras do mundo

comercial. Entretanto, é crucial por meio da sustentabilidade ambiental reduzir grande parte dos

impactos causados por estruturas empresariais nocivas ao meio ambiente. O desenvolvimento

sustentável, dessa maneira, busca resguardar não somente os recursos naturais de quais somos

dependentes para nossa subsistência, como também garantir a gerações futuras o direito de

usufruto dos bens naturais. Para sua implementação, porém, o desenvolvimento sustentável

depende da ação do Poder Público como artifício chave, cumprindo o que se dita na legislação

brasileira ambiental para a efetividade do sistema legal, de modo a agir em equivalência a

mecanismo que previna e repare danos ambientais decorrentes.

Conclui-se, então, por meio da presente pesquisa, que a mera declaração constitucional

de preocupação ambiental não é suficiente para o Estado cumprir com seu papel de proteção

ambiental. É primordial que este aja a fim de garantir aquilo que sua Carta Magna promete,

evitando ações que dificultem as técnicas já consagradas pelo ordenamento jurídico, como o

PNC. A ação morosa e ineficaz em face de sinistros como o caso das barragens de Brumadinho

e Mariana fazem com que o Estado busque novos mecanismos que enfrentam diferentes

desastres e que garantem a proteção eficiente do bem jurídico ambiental.

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Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Águas sob Jurisdição Nacional, altera

o Decreto nº 4.871, de 6 de novembro de 2003, e o Decreto nº 4.136, de 20 de fevereiro de

2002, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Decreto/D8127.htm>. Acesso

em: 2 abr. 2020.

BRASIL. Código de Penal. Decreto nº 9.759, de 11 de abril de 2019. Extingue e estabelece

diretrizes, regras e limitações para colegiados da administração pública federal. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Decreto/D9759.htm>.

Acesso em: 2 abr. 2020.

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GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)pensando a pesquisa

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PARTIDO questiona decreto presidencial que extingue conselhos da administração pública.

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WITKER, Jorge. Como elaborar uma tesis en derecho: pautas metodológicas y técnicas

para el estudiante o investigador del derecho. Madrid: Civitas, 1985.

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DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO E À SAÚDE VERSUS O USO DE AGROTÓXICOS NO BRASIL CONTEMPORÂNEO

THE RIGHT TO AN ECOLOGICALLY BALANCED ENVIRONMENT AND HELTH VERSUS THE USE OF PESTICIDES IN CONTEMPORARY

Gabriela Carvalho Erbetta

Resumo

Este projeto de pesquisa pretende analisar as consequências do uso de agrotóxicos, tanto no

âmbito ambiental quanto no que tange à saúde dos indivíduos que se alimentam dos produtos

contaminados. Nesse contexto, sabe-se que o presidente eleito no Brasil, Jair Bolsonaro,

liberou em 2019 aproximadamente 410 novos agrotóxicos para uso no país, os quais têm

como proposta aumentar a quantidade e a qualidade da produção agrícola. Entretanto, mesmo

com os benefícios dessas ferramentas, deve-se considerar que o solo, o ar e a água das áreas

em que foi realizado a aplicação dos agroquímicos retêm as substâncias tóxicas presentes

nesses produtos.

Palavras-chave: Agrotóxicos, Meio ambiente, Saúde

Abstract/Resumen/Résumé

This research project aims to analyze the consequences of the use of pesticides, both in the

environmental sphere and in terms of the health of individuals who consumes contaminated

products. In this context, it is known that the president-elect in Brazil, Jair Bolsonaro,

released in 2019 approximately 410 new pesticides for use in the country, which aim to

increase the quantity and quality of agricultural production. However, even with the benefits

of these tools, it should be considered that the soil, air and water in the areas where the

agrochemicals were applied retain the toxic substances present in these products.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Pesticides, Environmental, Helth

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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A presente pesquisa apresenta seu nascedouro no tema que aborda a questão do uso

deliberado de agrotóxicos no campo, na perspectiva ambiental e da saúde dos indivíduos, os

quais acabam por consumir alimentos que contém alguma porcentagem de resíduo tóxico desses

produtos. De fato, o uso dos agroquímicos impacta positivamente no aspecto físico e na

produtividade das lavouras, mas é necessário ponderar sobre os impactos que a natureza sofreu

para que determinada mercadoria chegasse a mesa do consumidor, o qual também poderá ser

prejudicado por consumir tais produtos.

No contexto brasileiro atual, o presidente eleito, Jair Messias Bolsonaro, segundo

dados do Greenpeace, liberou cerca de 410 novos agrotóxicos para uso no país em 2019

(GREENPEACE, 2019). Tal liberação deve ter seus impactos analisados nos âmbitos

econômicos, da saúde e sob uma perspectiva ambiental, buscando verificar se essa mudança é

benéfica ou não para a vida dos cidadãos brasileiros, uma vez que pode gerar importantes

consequências na saúde e no meio em que vivem, e no qual viverão também seus descendentes.

Desse modo, a temática ambiental tem sido uma preocupação para a humanidade, uma

vez que os indivíduos precisam da natureza para não só para ser usada como matéria prima

industrial, mas para sobreviver. Assim, se as interferências humanas modificarem o ambiente

de forma que esse não consiga mais sustentar os seres que vivem nela, todos os tipos de vida

do planeta irão sofrer as consequências, incluindo os homens. Portanto, fica claro que a

preservação ambiental é necessária para que a humanidade possa usufruir dos recursos naturais

disponíveis, de forma racional e sem que aja o esgotamento dos mesmos.

A pesquisa que se propõe pertence à vertente metodológica jurídico- projetivo. No

tocante ao tipo de investigação, foi escolhido, na classificação de Witker (1985) e Gustin

(2010), o tipo jurídico-interpretativo. O raciocínio desenvolvido na pesquisa será

predominantemente dialético. Dessa maneira, a pesquisa se propõe a analisar quais as

consequências da aprovação em massa de agrotóxicos pelo governo, na saúde da população e

no meio ambiente.

2. RESPONSABILIDADE AMBIENTAL, DIREITO À SAÚDE E A QUESTÃO DOS

AGROTÓXICOS

O artigo 225 da Carta Magna Brasileira assegura que todos possuem o direito ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade

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de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de protegê-lo e preservá-lo para

usufruto das presentes e futuras gerações. Assim, é notório que a responsabilidade ambiental

deve ser exercida por todos, uma vez que os indivíduos dependem da natureza para a

manutenção da vida.

O filósofo Hans Jonas, em uma de suas assertivas, presente no livro “ O Princípio da

Responsabilidade: ensaio para uma ética da civilização tecnológica”, aborda sobre a

necessidade de proteção do meio ambiente pela sociedade. Segundo o autor:

O enorme impacto do Princípio Responsabilidade não se deve somente

a sua fundamentação filosófica, mas ao sentimento geral, que até então

os mais atentos observadores poderão permitir cada vez menos de que

algo poderia ir mal para a humanidade, inclusive o tempo poderia estar

em posição no marco de crescimento exagerado e crescente das

interferências técnicas sobre a natureza, de pôr em jogo a própria

existência. Entretanto, se havia comentado que era evidente a vinda da

chuva ácida, o efeito estufa, a poluição dos rios e muitos outros efeitos

perigosos, fomos pegos de cheio na destruição de nossa biosfera

(JONAS, 2005).

A teoria conceitual proposta pelo autor procura demonstrar que o desenvolvimento

tecnológico foi um dos fatores que agravou as destruições ambientais. Nesse sentido, o homem

como responsável pelas suas ações deve perguntar-se se diante dos avanços inevitáveis da

tecnologia ele tem o direito de colocar em risco a vida futura da humanidade e do planeta.

Assim, o Jonas propõe que os cientistas busquem se pautar na ética e no princípio da

responsabilidade, a fim de combinar as ações dos seres humanos com a preservação ambiental.

Sob essa perspectiva, é notório que várias inovações científicas provocam efeitos

nocivos para o ser humano e para a natureza. Desse modo, é necessário discutir a questão de

como os agrotóxicos interferem na saúde dos seres vivos e no âmbito ambiental, visto que esses

produtos degradam o habitat natural de diversos animais, o que acaba rompendo a cadeia

alimentar e acabando com o equilíbrio natural da região.

Sob esse viés, uma vez dentro do organismo os agroquímicos podem causar câncer,

intoxicações generalizadas, problemas endócrinos e de má formação, além de ficarem retidos

no organismo e poderem ser passados de mãe para filho por meio do leite materno. Nesse

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sentido, a filósofa Hannah Arendt escreveu em seu texto “A Condição Humana” sobre como o

homem influência no meio em que vive. Segundo a autora:

A primeira perda que sofreram essas pessoas privadas de direito não foi

a da proteção legal mas a perda dos seus lares, o que significava a perda

de toda a textura social na qual haviam nascido e na qual haviam criado

para si um lugar peculiar no mundo. Essa calamidade tem precedentes,

pois na história são corriqueiras as migrações forçadas, por motivos

políticos ou econômicos de indivíduos ou de povos inteiros. (ARENDT,

2011, p. 327)

A partir do que foi exposto pela autora, é notório que a partir do momento que o homem

passou a viver em sociedade, ele adaptou o meio em que vivia para melhor se desenvolver. Sob

essa perspectiva, os indivíduos têm a capacidade de alterar a natureza, tanto de forma negativa

quanto positiva, assim, tais interferências antrópicas, que podem ter diversas motivações, como

o interesse econômico, são capazes de mudar não só a realidade das pessoas que vivem

atualmente na área modificada, mas também a das futuras gerações que lá viverão.

Nesse contexto, os agroquímicos, ou seja, os agrotóxicos e fertilizantes químicos,

possibilitaram que o cultivo de uma espécie possa ser feito fora da sua área de origem, mas para

isso é necessário usar uma maior quantidade desses produtos, assim, não afetam somente a área

onde ele é pulverizado, mas o seu entorno também, uma vez que ele se espalha com o vento,

podendo afetar as cidades vizinhas, mudando a realidade dos indivíduos e dos animais que ali

vivem e suas futuras gerações.

Sob esse viés, conforme Reis (2008) o “Princípio da Prevenção” visa evitar os impactos

de uma determinada ação, uma vez que as suas consequências são conhecidas. Para isso, é

preciso adotar medidas preventivas, as quais poderão mitigar ou extinguir as causas de um

futura dano, a fim de evita-lo. Tal abordagem deve ser levada em consideração quando se trata

da problemática ambiental dos agrotóxicos, visto que se faz necessário o estudo dos ricos

provocados por tais produtos ao meio ambiente e à saúde humana.

Ademais, Hammerschmidt (2010) destaca que é função dos especialistas ambientais

buscarem medidas que visem prevenir potenciais danos aos ecossistemas naturais. Por outro

lado, a sociedade deve reivindicar políticas públicas que adotem o “Princípio da Prevenção”,

ou seja, que possuem como objetivo a prevenção de riscos ao meio ambiente. Assim, tais

medidas seriam úteis para mitigar os impactos da latente crise ecológica brasileira.

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3. O VIÉS ECONÔMICO DOS AGROTÓXICOS CONTRA O DIREITO A SAÚDE

Sob um viés econômico, os agrotóxicos são usados para buscar os benefícios do “tripé

da eficiência”, definidos por Newman como sendo: o incremento da produção das safras; o

aumento da qualidade da produção; e a redução de gastos com mão de obra e energia dentro da

agricultura (NEWMAN, 1978). Desse modo, na maioria dos casos, o preço final dos alimentos

nos quais foram utilizados agrotóxicos são menores, comparados aos dos produtos orgânicos,

ou seja, os quais não receberam agrotóxicos em seus plantios.

Nesse contexto, a população em geral compra mais produtos que contém agroquímicos

por serem mais baratos, mas muitas vezes não sabem se tal ação irá prejudicar sua saúde. Por

isso, é necessário discutir e informar os indivíduos sobre os impactos dos agrotóxicos nos seus

direitos, como à saúde e ao meio ambiente equilibrado, para que, assim, cada um possa avaliar

os prós e contras do consumo de alimentos com certa porcentagem desses produtos.

Sob essa perspectiva o Brasil, de acordo com a Revista Pesquisa Fapesp

(BOMBARDI, 2017), é uma das maiores potencias mundiais no que tange ao setor

agropecuário e a comercialização de agrotóxicos, o qual movimenta cerca de US$ 10 bilhões

por ano. Sob esse ponto de vista, é possível dizer que o uso intenso desses produtos está

relacionado com fatores climáticos, uma vez que o Brasil é um país tropical, o que favorece o

ciclo de reprodução de pragas e insetos nas plantações. Além disso, a agricultura brasileira faz

uso em larga escala da monocultura, outro fator que contribui com o ciclo de pragas e leva ao

esgotamento do solo, o qual precisa ainda mais de agroquímicos para se tornar mais produtivo.

Ademais, a bancada ruralista no Congresso Nacional é responsável por propor políticas

públicas que incentivam a utilização e comercialização de agrotóxicos no Brasil, como o custo

irrisório de registro de produtos na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) (de R$

180,00 a R$ 1.800,00) (SOARES; PORTO, 2012). Desse modo, verifica-se que o Brasil segue

na contramão dos outros países, como os da União Europeia, os quais estão restringindo o uso

de agrotóxicos perigosos, ao contrário de flexibilizar como está sendo feito pelo presidente Jair

Bolsonaro.

Assim, é possível dizer que o uso de agrotóxicos viola o direito à saúde dos indivíduos,

uma vez que resíduos desse tipo de produto permanecem presentes nos alimentos quando

chegam no consumidor final, ocasionando uma insegurança alimentar. Dessa maneira, apesar

do melhor custo e aparência da mercadoria, essa não é segura e não possuem a devida qualidade

para o consumo.

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Por fim, fica claro que mudanças precisam ser feitas na forma como agricultura é feita

atualmente. Nesse sentido, a agroecologia é uma ciência que visa assegurar a sustentabilidade

tanto ambiental como social e econômica nos diversos ecossistemas, por meio de um manejo

responsável dos recursos naturais. De uma forma geral, a agroecologia busca apoiar a transição

dos atuais modelos de desenvolvimento rural e de agricultura convencionais para um tipo de

desenvolvimento rural e de agriculturas mais sustentáveis (Caporal e Costabeber, 2000a;

2000b; 2001; 2002a; 2002b).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir do exposto, verifica-se que o uso dos agrotóxicos é uma ação humana que visa

o retorno econômico do aumento da produtividade agrícola. Entretanto, ao inserir tais produtos

no ambiente cria-se uma pressão química que desestabiliza o equilíbrio ecológico do meio, além

de impactar negativamente a saúde e o bem-estar do próprio ser humano, o qual consome

alimentos contaminados com substâncias tóxicas.

Desse modo, para minimizar os danos que os agroquímicos produzem, é preciso que os

órgãos ambientais e de vigilância sanitária incentivem os produtores a fazerem uso de métodos

agroecológicos, como a agroecologia, já mencionada na presente pesquisa. Além disso, o

governo Bolsonaro deve proibir o uso de princípios ativos que já se demonstraram nocivos à

saúde dos cidadãos e ao meio ambiente.

Sob essa perspectiva, é notório que o sistema de produção agrícola brasileiro é baseado

no uso desmedido de agrotóxicos estimulado pelo Estado e fomentado pelo governo Bolsonaro,

principalmente em 2019 quando o presidente aprovou centenas de novos produtos, o que

contribui para os altos níveis de contaminação do ambiente e da saúde. Assim, a população

sofre com a violação de seus direitos fundamentais, como à saúde e ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado, cenário que deve ser revertido para o efetivo exercício da

cidadania.

5. REFERÊNCIAS

ARENDT, Hannah. A Condição Humana. Tradução de Roberto Raposo. Rio de Janeiro:

Forense Universitária, 2010.

BATTESTIN, C.; Ghiggi, G.. O Princípio Responsabilidade de Hans Jonas: um princípio

ético para os novos tempos. Rio de Janeiro: Contraponto; Ed. da PUC-Rio, 2006.

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BOMBARDI, L. M. Geografia do uso de agrotóxicos no Brasil e conexões com a União

Europeia. São Paulo: Laboratório de Geografia Agrária – FFLCH-USP, 2017.

CAPORAL, F. R.; COSTABEBER, J. A.; PAULUS, G. Agroecologia: matriz disciplinar ou

novo paradigma para o desenvolvimento rural sustentável. In: CONTIN, I. L.; PIES, N.;

CECCONELLO, R. (Org.). Agricultura familiar: caminhos e transições. Passo Fundo: IFIBE,

2006. p. 174-208.

GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)pensando a pesquisa

jurídica: teoria e prática. 3ª. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010.

GREENPEACE. “Dia das Abelhas”. Disponível em:

https://www.greenpeace.org/brasil/blog/governo-bolsonaro-celebra-dia-das-abelhas-

liberando-ainda-mais-agrotoxicos/ [acesso em 2020 maio 5]

HAMMERSCHMIDT, D. O risco na sociedade contemporânea e o princípio da precaução

no direito ambiental. Revista de Direito Ambiental, n. 31, 2005.

NEWMAN, J.F, 1978. Pesticides. In: Wright, S.J.L.; Hill, I.R. Pesticide microbiology. New

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REIS, J. T. Educação Ambiental. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, v. 6, n. 51, mar 2008.

Disponível em: http://www.ambito-jurídico.com.br/site/index.php?n_lin=revista

artigos_leitura&artigoid= 2462 . Acesso em 5 maio 2020.

SOARES WI, PORTO MFS. Uso de agrotóxicos e impactos econômicos sobre a saúde. Rev.

Saúde Pública. 2012; 46(2):209-217.

WITKER, Jorge. Como elaborar uma tesis en derecho: pautas metodológicas y técnicas

para el estudiante o investigador del derecho. Madrid: Civitas, 1985.

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1 Pós graduanda em gerenciamento de projetos pela Fundação Getúlio Vargas, Graduada em engenharia elétrica pela Faculdade Pitágoras unidade Divinópolis.

1

ENERGIA SOLAR FOTOVOLTAICA COMO ALTERNATIVA PARA DIVERSIFICAÇÃO DA MATRIZ ENERGÉTICA BRASILEIRA

PHOTOVOLTA SOLAR ENERGY AS AN ALTERNATIVE FOR DIVERSIFICATION OF THE BRAZILIAN ENERGY MATRIX

Ana Carolina Brandão Gontijo 1

Resumo

O trabalho teve por objetivo apresentar a viabilidade da instalação de sistemas fotovoltaico

para geração de energia elétrica com o intuito de diversificar a matriz energética brasileira e

assim o país não ser dependente de uma fonte principalmente. Para a elaboração desta revisão

bibliográfica utilizou-se de livros, e relatórios governamentais que forneceram informações

para embasar o raciocínio utilizado. O Brasil por ser um país que se localiza próximo aos

trópicos apresenta características favoráveis a geração de energia através do aproveitamento

do potencial solar.

Palavras-chave: Energia solar, Matriz energética, Irradiação solar, Fotovoltaica

Abstract/Resumen/Résumé

The aim of the work was to present the feasibility of installing photovoltaic systems for

generating electricity in order to diversify the Brazilian energy matrix and thus the country is

not dependent on a source mainly. For the elaboration of this bibliographic review, books and

government reports were used, which provided information to support the reasoning used.

Brazil, being a country that is located close to the tropics, presents favorable characteristics

for the generation of energy through the use of solar potential.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Solar energy, Energy matrix, Solar irradiation, Photovoltaic

1

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1. Introdução

A matriz energética brasileira reflete o significativo potencial hídrico brasileiro, por ser uma

fonte abundante em grande parte do país foi incentivado a construção de pequenas usinas hidrelétricas

conhecidas como PCHs (pequenas centrais hidrelétrica) nas cinco regiões e este fator teve como

consequência a predominância da fonte hídrica na matriz energética que continua até a segunda

década do século vinte um. Conforme dados da EPE (empresa de pesquisa energética) no Brasil no

ano de 2018, a participação da fonte hidráulica na matriz energética representava 65,2% do potencial

total, mas este percentual representativo já foi maior em outras décadas. O conceito de recurso

renovável torna-se relevante de ser exposto, portanto conforme definição da EPE (empresa de

pesquisa energética) os recursos desta classe têm características de serem inesgotáveis por se

renovarem constantemente conforme o uso, são consideradas limpas por emitirem menor quantidade

de gases do efeito estufa. O Brasil apresenta grande diferencial em comparação a matriz energética

mundial devido apenas 42% de sua produção de energia advim de fontes não renováveis, sendo que

conforme dados da IEA (agencia internacional de energia) no ano de 2018, a matriz energética

mundial era composta por 81% de fontes não renováveis como carvão, petróleo e gás natural.

Com a implementação de políticas públicas de incentivo a diversificação da matriz energética

e instalação de fontes renováveis como eólica e solar contribuíram com a redução da participação da

fonte hidráulica. Inicialmente quando foram construídas a grande parte das usinas hidrelétricas no

Brasil o efeito estufa não era uma problemática, os períodos longos de estiagem aliado a elevada

demanda por energia elétrica não ocorriam com frequência portanto não havia motivos para buscar

outros modos para a produção de energia elétrica. Os tempos mudaram e devido à ausência de chuva

por longos períodos demanda-se a produção de energia através das termoelétricas o que causa

aumento na tarifa de energia, dependendo do período e das condições para geração pode ser definido

a bandeira verde, amarela ou vermelha que gera um acréscimo na tarifa do consumidor. Contudo a

busca por uma matriz de energética mais equilibradas entre as fontes torna-se uma alternativa a

redução na oscilação no preço da energia elétrica aos consumidores.

2. Metodologia

A pesquisa se caracteriza por ser principalmente descritiva por meio de levantamento

bibliográfico livros, relatórios nacionais, documentos de órgãos públicos e entidades da área.

3. Objetivos

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O objetivo desta pesquisa é apresentar os fatores que tornam relevante ampliação da energia solar

fotovoltaica no Brasil, para tanto explanou-se sobre o cenário brasileiro, apresentou-se a estrela sol e

suas característica para assim chegar ao ponto principal que era a energia solar fotovoltaica.

4. O potencial solar

A estrela Sol produz energia através de reações termonucleares, a temperatura deste corpo se

aproxima de 5800 Kelvin, e a previsão de reserva de matéria prima de hidrogênio se faz suficiente

para continuidade desta reação por mais 5 bilhões de anos. A irradiação solar no planeta terra varia

de acordo com o movimento de translação do mesmo ao entorno do sol, portanto nas estações do

verão e da primavera a intensidade da luz solar juntamente com o calor se faz mais intenso. O

potencial para aproveitamento da luz solar tem relação direta com a linha do equador que é o trecho

conhecido por temperatura mais elevadas, o Brasil por se localizar próximo a esta área se beneficia

no caso do reaproveitamento da luz ou do calor advindos do sol (NASA, 2013a, 2013b).

A energia térmica provida do sol tem longo histórico de aproveitamento. A capacidade de

absorção do calor pelo corpo através da radiação solar tem como objetivo a utilização em coletores

solares. O sistema de aquecimento de agua comumente utilizado em edifícios e residências se utiliza

desta tecnologia, com o aprimoramento de técnicas tornou-se possível a utilização desta fonte para

sistemas de refrigeração de ambientes e também a produção de energia elétrica através de sistemas

ópticos com espelhos ou lentes de modo concentrado que geram o aquecimento de um fluido que em

sequencia gira uma turbina e assim viabiliza a produção de energia elétrica através da energia térmica

do sol (Pinho e Galdino, 2014).

5. A geração da energia solar fotovoltaica

O aproveitamento do potencial fotovoltaico se iniciou através de missões espaciais, torres de

comunicação em locais remotos, em pequenos dispositivos para aeroportos, focando principalmente

em locais remotos e que o custo para instalação elétrica através da rede existente torna-se muito

oneroso. Através de pesquisas durante o período da crise do petróleo em 1973, com a construção

protótipos e principalmente a redução dos custos constatou-se a viabilidade de produção de energia

solar fotovoltaica para residências e industrias. A tradição no investimento na área fotovoltaica

iniciou-se nos países do hemisfério norte, em locais onde a matriz energética era dependente do

petróleo e o ambiente não oferecia muitas opções para geração de energia elétrica através de outras

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fontes. Portanto países como China, Alemanha, Japão, Estados Unidos da América lideram no

ranking de potência elétrica através da energia solar fotovoltaica (Nascimento, 2017).

Conforme informações da ABSOLAR (associação brasileira de energia solar fotovoltaica),

2020 o início da popularização dos sistemas fotovoltaicos no Brasil ocorreu no ano de 2014, e com o

aumento da competitividade no mercado da produção dos sistemas houve redução no preço gerando

assim aumento no número de instalações. A energia solar fotovoltaica no Brasil ultrapassou a energia

nuclear na matriz energética e tem perspectivas para os próximos anos aumentar mais seu percentual.

De acordo com estudos apresentados no atlas brasileiro de energia solar, (Pereira et al, 2017) o Brasil

apresenta elevado potencial para a geração de energia através da forma solar fotovoltaica devido ao

potencial de irradiação solar, em comparação com outros países como Itália, Alemanha, Espanha,

Portugal o Brasil supera todos de modo significativo demonstrando seu alto potencial de geração.

Os tipos de sistemas para geração de energia elétrica a partir da energia fotovoltaica auxiliam

residências isoladas em zonas rurais ou locais remotos através dos sistemas isolados onde os

componentes para este sistema são o inversor solar, as placas, o controlador de carga e a bateria

portanto torna-se possível o acesso a energia elétrica para regiões onde não é interessante para a

concessionaria de energia investir em infraestrutura elétrica, o ideal nestes casos seria o incentivo

governamental para instalação dos sistemas visto que na maioria dos casos o custo para a compra dos

equipamentos apresenta valor significativo. O armazenamento de energia na bateria significa a

alternativa para dias chuvosos onde não há presença de irradiação solar, pois mesmo em dias nublados

o sistema gera energia elétrica porém com menor intensidade, os moradores da residência podem ter

energia por vários dias se manterem apenas a utilização mínima dos equipamentos que necessitam de

energia elétrica (Pereira et al, 2017).

No centros urbanos o sistema fotovoltaico conectado torna-se a escolha mais implementada

em residências e industrias, este sistema pelo painel fotovoltaico, o inversor e neste caso não se faz

necessário o controlador de carga e as baterias pois o mesmo conecta-se diretamente ao medidor de

energia que deve ser bidirecional em momentos de geração injeta na rede e durante a noite ou períodos

chuvosos a concessionaria que fornece a energia elétrica. Este tipo de sistema torna-se atrativo para

as empresas fornecedoras de energia pois significa uma alternativa para regiões onde há alta demanda

de energia elétrica e seria necessário investimento por parte da empresa para suprir esta necessidade,

o consumidor tem o abatimento em sua conta do valor gerado, uma informação relevante em relação

a conta de energia é que não há possibilidade de zerar a conta pois a taxa mínima considera-se como

o valor necessário para a manutenção do sistema elétrico (Pereira et al, 2017).

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6. Considerações Finais

A diversificação da matriz energética brasileira se faz necessária devido aos fatores

apresentados pois a dependência principal de uma fonte gera instabilidade no sistema caso haja

qualquer instabilidade com a mesma. Portanto como o Brasil apresenta uma matriz focada em

energias renováveis, a alternativa de diversificação através da energia solar fotovoltaica se apresenta

dentro desta linha ecológica e o país seria favorecido a utilizar esta fonte de energia devido ao seu

alto potencial de irradiação solar.

Uma vantagem da energia solar fotovoltaica é a alternativa para geração descentralizada de

energia elétrica permitindo assim a instalação de sistemas em locais remotos onde concessionárias de

energia não apresentam interesse em expandir suas linhas e ao mesmo tempo com a geração em

grande centros possibilita-se o aumento na oferta de energia da concessionaria reduzindo sobrecarga

na rede e possíveis oscilações de energia.

Referências bibliográficas

EPE – Empresa de pesquisa energética. Matriz energética e elétrica. Disponível em:

https://www.epe.gov.br/pt/abcdenergia/matriz-energetica-e-eletrica. Acessado em: 09 jun. 2020.

EPE – Empresa de pesquisa energética. Fontes de energia. Disponível em:

https://www.epe.gov.br/pt/abcdenergia/fontes-de-energia#FONTES-RENOVAVEIS. Acessado em:

09 jun. 2020.

NASCIMENTO, Rodrigo Limp. Energia solar no brasil: situação e perspectivas. Consultoria

legislativa para o senado – estudo técnico. 2017

NASA – National Aeronautics and Space Administration. Cosmicopia. Disponível em:

https://cosmicopia.gsfc.nasa.gov/. Acessado em: 10 jun. 2020.

NASA – National Aeronautics and Space Administration. Imagine the Universe! Disponível em:

https://imagine.gsfc.nasa.gov/science/index.html. Acessado em: 10 jun. 2020.

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PINHO, João Tavares, GALDINO, Marcos Antônio. Manual de engenharia para sistemas

fotovoltaicos. CEPEL – CRESESB. Edição 2014. Rio de Janeiro -RJ.

PEREIRA, Enio Bueno; Et al. Atlas brasileiro de energia solar. 2.ed. ‐‐ São José dos Campos :

INPE, 2017. 88p.: il.

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1 Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Ciência Jurídica - UENP. MBA em Gestão de Negócios – USP/ESALQ (cursando). Especialista em Direito Ambiental – UFPR. Especialista em Direito Aplicado EMAP/PR, Advogada.

1

EQUILÍBRIO ECOLÓGICO, NEGÓCIOS E OS IMPACTOS DA COMPUTAÇÃO QUÂNTICA

ECOLOGICAL BALANCE, BUSINESS AND THE IMPACTS OF QUANTUM COMPUTING

Késia Rocha Narciso 1

Resumo

O equilíbrio ecológico é fundamental para proteção de todas as formas de vida, ante a

utilização dos recursos naturais em uma sociedade imediatista, visualiza-se a necessidade

premente de mudança de paradigmas e modelos de negócios com valor ecológico. A

transformação digital e novas tecnologias impactam diversos setores refletindo na mudança

da legislação ou alteração de sua interpretação. A computação quântica de maneira disruptiva

impactará os negócios e trará desafios para o direito. O objetivo da pesquisa é demonstrar os

impactos da computação quântica visando modelos de negócios ecológicos. Adotou-se a

metodologia de pesquisa bibliográfica e o método dedutivo de abordagem.

Palavras-chave: Equilíbrio ecológico, Modelo de negócio, Computação quântica, Impactos legais

Abstract/Resumen/Résumé

Ecological balance is fundamental for the protection of all forms of life, in view of the use of

natural resources in an immediate society, there is an urgent need to change paradigms and

business models with ecological value. The digital transformation and new technologies

impact several sectors, reflecting the change in the legislation or alteration of its

interpretation. Quantum computing in a disruptive way will impact business and bring

challenges to law. The objective of the research is to demonstrate the impacts of quantum

computing aiming at ecological business models. The bibliographic research methodology

and the deductive method were adopted.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Ecological balance, Business model, Quantum computing, Legal impacts

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1 INTRODUÇÃO

O progresso tecnológico trouxe inúmeros benefícios para as relações sociais e

empresariais, no entanto, a legislação não consegue acompanhar as transformações no mesmo

ritmo e a ciência jurídica precisa de critérios para sua efetivação.

Com a modernização o uso e descarte de produtos ante aos recursos naturais finitos

demonstraram que os modelos de negócios precisam reinventar-se para atendimento do

princípio constitucional do meio ambiente ecologicamente equilibrado, como também, o

consumidor demanda por empresas com consciência ecológica.

A transformação digital proporcionou avanços nas diversas esferas da sociedade, que

demanda por pensamentos disruptivos, como também, para auxiliar os negócios que

compactuam com a proteção ecológica, diante disso, a problemática dá-se pelos impactos da

computação quântica na construção de modelos de negócios ecológicos.

A importância da discussão justifica-se pelo fato de que haverá impactos da

computação quântica na esfera jurídica, nas profissões e nos negócios. Há que se considerar

ainda, que além de otimização na esfera digital, pode auxiliar modelos de negócios com valor

ecológico agregado e os ideais de economia circular.

O objetivo da pesquisa é demonstrar os impactos da computação quântica visando

modelos de negócios ecológicos para atendimento do princípio constitucional do meio

ambiente ecologicamente equilibrado.

Utilizou-se a metodologia de pesquisa bibliográfica, materiais tais como: livros,

artigos científicos, legislação, textos disponíveis em meio físico ou online e o método de

abordagem dedutivo para realização.

2 EQUILÍBRIO ECOLÓGICO

Desde o surgimento do Direito Ambiental e da proteção constitucional ao ambiente

ecologicamente equilibrado, novos aspectos têm sido acrescidos para atendimento da visão

ampla da natureza para garantia de proteção.

Este capítulo pretende pontuar alguns marcos históricos e demonstrar apontamentos

que agregam a dimensão ecológica ao direito ambiental para atender aos atuais paradigmas e

hermenêutica relacionadas à matéria.

2.1 Contexto Histórico

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Dentre os diversos marcos históricos (POTT; ESTRELA, 2017) destaca-se a década

de 1960 e 1970 como início dos questionamentos ambientais – em 1960 timidamente na

Europa e EUA e em 1970 de maneira mais marcante.

Em 1962 tem-se a publicação do livro primavera silenciosa de Rachel Carson como

propulsor do movimento ambiental, projetando para a visão do público o debate sobre a

responsabilidade da ciência, os limites do avanço tecnológico e a relação homem-natureza.

Tem-se em 1972 a publicação do relatório limites do crescimento para o projeto do

clube de Roma sobre o dilema da humanidade e esgotabilidade dos recursos naturais, e no

mesmo ano tem-se ainda a Conferência das Nações Unidas em Estocolmo como marco

normativo inicial de proteção ambiental.

Em 1981 como marco inicial do Direito Ambiental brasileiro tem-se Lei Federal n.º

6.938 - Política Nacional do Meio Ambiente, iniciando-se a implementação da matéria e a

partir dela oportunizou o avanço das questões ambientais.

Em 1987 tem-se a publicação do relatório de Brutland “Nosso futuro comum”,

destacando o ideal de desenvolvimento sustentável - contrapondo crescimento econômico e

equilíbrio ambiental.

Já em1988, a Constituição da República, em seu artigo 225, passa a estabelecer que:

“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do

povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o

dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (BRASIL, 1988).

E no artigo 170 da carta constitucional, dispõe que “A ordem econômica, fundada na

valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência

digna, conforme os ditames da justiça social” (BRASIL, 1988) e institui a defesa ao ambiente

como princípio da ordem econômica.

Dentre os instrumentos mais atuais pode-se citar os Objetivos de Desenvolvimento

do Sustentável – Agenda 2030 (ONU) como propulsores para da proteção ambiental e

equilíbrio ecológico aliados à prática e desenvolvimento de modelos de negócios com valor

ecológico em garantia à dignidade humana.

2.2 Doutrina Moderna

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A matéria ambiental passa por mudanças de paradigma resultantes das implicações

das ações do homem na natureza e demandam por adequação do direito e da legislação frente

aos processos ecológicos para resguardo, proteção ao ambiente e equilíbrio ecológico.

Ponderando as diversas mudanças e interferências ecológicas decorrentes das ações

humanas e o papel do Estado, o acompanhamento interpretativo no mundo jurídico perante as

constatações prementes quanto ao valor intrínseco para além do ser humano no Antropoceno

(era dos seres humanos), impulsionaram o entendimento de Sarlet e Fensterseifer no sentido

de considerar o Direito Ambiental como Direito Ecológico, partindo da ética em sua

perspectiva ecocêntrica (abarcando a natureza e influências a ela de maneira ampla) e valores

ecológicos (como também a integridade ecológica como norma fundamental) como

fundamento do constitucionalismo contemporâneo (2019, p. 58; 68; 76).

As teorias sobre estado de direito ambiental (inserção do meio ambiente no Estado)

de Kloepfer e estado de direito ecológico (busca do equilíbrio ecológico) de Bosselmann têm

impulsionado a matéria ante a crise ambiental que vem se vivenciando no intuito de repensar

as teorias e as leis para proteção dos processos ecológicos (LEITE; SILVEIRA; BETTEGA,

2017, p. 167 e 169).

Considerando a dignidade da pessoa humana, a falta dessa dimensão ecológica

violaria o seu núcleo essencial como a dignidade da vida, para tutela integral do ser humano

no plano existencial. Integram o princípio da dignidade humana a qualidade, equilíbrio e

segurança ambiental que são correlatos ao bem-estar existencial/ambiental e da realização da

vida em níveis dignos, e dentre eles destaca-se o equilíbrio ecológico como fundamental para

manutenção de todas as formas de vida e dos aspectos abióticos de maneira integralizada

advinda da teoria do ecocentrismo (SARLET; FENSTERSEIFER, 2019, p. 68; 77 e 239).

A perspectiva ampliada da dignidade da pessoa humana, amparada pelo texto

constitucional quanto às futuras gerações pressupõe ainda o entendimento de resguardo da

dignidade das pessoas não nascidas (MARCHESAN, 2017, p. 288; SARLET;

FENSTERSEIFER, 2019, p. 79).

A integridade ecológica contempla o direito a ter e exercer os demais direitos, no

sentido da existência e desenvolvimento humano em toda a sua potencialidade, já que, um

desequilíbrio ambiental pode afetar diversos direitos e sem um mínimo ecológico não é

possível falar ou até mesmo resguardar direitos intrínsecos ao ser humano (SARLET;

FENSTERSEIFER, 2019, p. 241).

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A preocupação com a integralidade do ser humano e com os processos ecológicos

refletem na necessidade de adequação na esfera do direito ambiental, da legislação, e ainda,

há que se buscar a modulação de negócios que visam o equilíbrio ecológico.

3 NEGÓCIOS ECOLÓGICOS

O Estado tem a responsabilidade de promover instrumentos jurídicos para condução

da ordem social e econômica visando à proteção ambiental, e o poder público e a coletividade

quando amparados pela dimensão ecológica ampliam o vislumbre das relações e impulsionam

os processos de mudança.

Os direitos fundamentais econômicos, sociais, culturais e ambientais foram

ampliados para uma tutela ampla e qualificada da dignidade humana em sua dimensão

comunitária e ecológica, buscam por meio da sustentabilidade pautar-se na isonomia e

equilíbrio nos eixos econômico, social e ambiental em especial quanto ao eixo ecológico

(SARLET; FENSTERSEIFER, 2019, p. 206).

A proteção da natureza é a proteção do ser humano e das formas de vida para as

presentes e futuras gerações, e a existência digna demanda por um ambiente saudável e é

promovida se observadas todas as dimensões, pois, qualquer prática econômica contrária à

proteção do mínimo existencial é constitucionalmente ilegítima. Diante disso, o capitalismo

ecológico e a economia ecológica de mercado visam uma compatibilização da livre-iniciativa,

da autonomia e da propriedade privada com a proteção ecológica (SARLET;

FENSTERSEIFER, 2019, p. 216; 218).

Dentre os fatores que determinam a escolha de um produto ou serviço está o viés

ambiental, o compromisso ambiental é um dos critérios avaliados pelos consumidores ante

aos novos hábitos e consciência de consumo.

Dentro da proposta de adoção de um modelo de negócio com valor ecológico

agregado, há que se considerar a proteção ampla e integrada da natureza, como também a

sustentabilidade social e econômica, gerando valor ecológico de ordem comportamental, ética

e inovadora, em uma contínua espiral econômica, social e ecológica.

Nesse sentido, os princípios que visam à circularidade para: regenerar os sistemas

naturais, mantendo produtos e materiais em uso, como também a retirada da poluição e

resíduos desde o início da cadeia (FOUNDATION, 2015, p. 3) - são de grande auxílio para a

espiral de negócio com agregação de valor ecológico utilizando-se da análise ecossistêmica

para integração de serviços e benefícios sustentáveis (PARIDA et al., 2019).

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Diversas tecnologias são auxiliares na esfera ambiental, no entanto, há potencial de

exploração do ambiente digital e da inteligência artificial para acelerar a proteção ambiental

por meio dos dados, da ciência, da internet das coisas aliada aos princípios da indústria 4.0

(DEV et al., 2020; ZHOU et al., 2018), como também, a computação quântica mostra-se

oportuna para mudanças futuras.

4 COMPUTAÇÃO QUÂNTICA

O atual cenário econômico vê-se tomado pela crise ambiental e as novas tecnologias

precisam de visualização positiva para mitigação e dissipação de problemas no sistema

ecológico, e, para tanto, novas tecnologias desafiam o direito para adequação dos processos.

Dentre elas tem-se a computação quântica que poderá trazer benefícios em muitas

disciplinas computacionais, solucionando problemas, acelerando processos e resultados que

demorariam significativamente em um computador clássico, porém, com grande impacto

social, já que, implica em questões como: privacidade, cibersegurança e ética, pois, rompe

sistemas de criptografia (MÖLLER; VUIK, 2017; MARTINS, BIAGINI, 2020).

Com o avanço da computação quântica será inevitável uma nova revolução frente ao

potencial de transformações e oportunidades para a sociedade e para utilização em benefício

ambiental que a tecnologia proporcionará, possibilitando a otimização de processos e

acelerada demonstração de resultados.

Diversos desafios serão enfrentados tanto pela ciência, pela ética, pelo direito, pelos

modelos de negócios, como também para os profissionais dos diversos setores, inclusive na

advocacia, para adaptação nesta revolução em andamento (MÖLLER; VUIK, 2017;

MARTINS, BIAGINI, 2020).

O potencial da computação quântica, embora de elevado custo, é uma realidade em

ascensão que impactará na reformulação do pensamento e dos sistemas, dentre eles o jurídico,

impulsionando avanços legais e oportunamente sua utilização para sistemas de proteção

ecológica e garantia do ambiente ecologicamente equilibrado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A computação quântica rompeu as perspectivas e trará impactos significativos para o

direito e para a sociedade, adotar negócios com valor ecológico aliados a esta tecnologia é um

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desafio a ser explorado para auxiliar em sistemas de proteção ecológica e a evolução da

legislação será necessária para auxiliar estes processos.

O equilíbrio ecológico depende da atuação e compromisso do poder público e da

coletividade pela proteção ambiental, no âmbito dos negócios aliar a tecnologia aos valores

ecológicos podem contribuir para a circularidade, resguardo dos recursos naturais e benefícios

econômicos.

REFERÊNCIAS

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1 Doutorando em Memória: Linguagem e Sociedade, pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.

2 Profº DSC. do Programa em Memória: Linguagem e Sociedade da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.

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ESTADO E SOCIEDADE SOB A ÓTICA DA BIOPOLÍTICA E DA ECOGOVERNAMENTALIDADE EM MICHEL FOUCAULT.

STATE AND SOCIETY FROM THE POINT OF VIEW OF BIOPOLITICS AND ECOGOVERNAMENTALITY IN MICHEL FOUCAULT.

Thiago Souza Silva 1Elton Moreira Quadros 2

Resumo

Este trabalho apresenta uma construção estritamente teórica, atinente à aplicação conceitual

das categorias da biopolítica e da governamentalidade, sob a perspectiva de abordagem

predominantemente foucaultiana, as quais são temáticas que encerram substantiva

importância na análise e na compreensão da dinâmica social hodierna e das interferências do

Estado nesse contexto, ao exercer o seu controle velado, tendo por corolário o governo dos

viventes, sob a égide do capitalismo. Assim, perceber-se-á, nas ponderações a serem

arroladas, que, para Foucault, os indivíduos estão insertos num campo de subjetivação, onde

circulam inúmeros dispositivos de dominação e relações de poder.

Palavras-chave: Socioambientalismo, Governança, Epistemologia

Abstract/Resumen/Résumé

This work presents a strictly theoretical construction, related to the conceptual application of

the categories of biopolitics and governmentality, under the perspective of a predominantly

Foucauldian approach, which are themes that have substantial importance in the analysis and

understanding of today's social dynamics and State interference. in this context, when

exercising its veiled control, having as corollary the government of the living, under the aegis

of capitalism. Thus, it will be noticed, in the considerations to be enumerated, that, for

Foucault, individuals are inserted in a field of subjectivation, where numerous devices of

domination and power relations circulate.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Socio-environmentalism, Governance, Epistemology

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ESTADO E SOCIEDADE SOB A ÓTICA DA BIOPOLÍTICA E DA

ECOGOVERNAMENTALIDADE EM MICHEL FOUCAULT.

RESUMO

Este trabalho apresenta uma construção estritamente teórica, atinente à aplicação conceitual das categorias da

biopolítica e da governamentalidade, sob a perspectiva de abordagem predominantemente foucaultiana, as quais

são temáticas que encerram substantiva importância na análise e na compreensão da dinâmica social hodierna e

das interferências do Estado nesse contexto, ao exercer o seu controle velado, tendo por corolário o governo dos

viventes, sob a égide do capitalismo. Assim, perceber-se-á, nas ponderações a serem arroladas, que, para

Foucault, os indivíduos estão insertos num campo de subjetivação, onde circulam inúmeros dispositivos de

dominação e relações de poder.

Palavras-Chave: Socioambientalismo; Governança; Epistemologia

1 Introdução

Pondera-se, neste trabalho, a imprescindibilidade que reside no emprego das

categorias da biopolítica e da governamentalidade, conceitualmente exploradas e difundidas

por Michel Foucault, com vistas ao entendimento de diversas nuances, tais como: a política

ambiental da conformação urbana; a compreensão da complexa relação de poder, que

perpassa o governo da natureza e das camadas populacionais; e a identificação dos

mecanismos aplicados ao controle da vida na atualidade.

O monitoramento das massas humanas foi possibilitado pela formulação de

dispositivos, que propositavam a regulação dos fatores exógenos, os quais interferem na vida

social. Assim, o desiderato técnico e político, incurso na noção de regência do ambiente, deve

ser vislumbrado como um prolongamento do raciocínio da biopolítica, idealizado no

repertório teórico foucaultiano.

A partir deste viés, é possível discorrer a respeito da maneira como as questões

ambientais são operacionalizadas sob a perspectiva da biopolítica. A análise desse

pressuposto conduz à compreensão da abrangência da terminologia biopolítica, a qual abarca

tudo que seja indispensável para a manutenção da vida, por intermédio das inúmeras ações e

regulações de cunho ambiental.

A abordagem atinentente a governamentalidade, inserta na linha de intelecção de

Foucault, e mais pontuamente, sobre a influência da biopolítica, pode ser referendada como

um estudo da ecopolítica, que está vinculada às estratégias mais eficientes de gerenciar toda a

vida, com o desenvolvimento de racionalidades ecológicas de governo.

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2 A confluência entre as relações de Poder e o Sujeito pela via da Análise Foucaultiana

A proposta de análise foucaultiana situa o sujeito num campo de dominações e

poderes, os quais estão submissos à disciplinaridade exercida pela governamentalidade. Deste

modo, suas obras apresentam o poder como um campo estratégico de concentração de forças

subjetivadas, os quais manifestam influência sobre os indivíduos, de forma coletiva ou

individualizada, cuja intencionalidade mantém uma relação de dependência com os objetivos

grupais hegemônicos, institucionais, políticos, e, até mesmo, históricos (FOUCALT, 1997).

Nota-se, nessa linha de pensamento, uma exposição crítica sobre a supremacia estatal,

tão incorporada ao discurso filosófico de Thomas Hobbes, quando relaciona o Estado com o

Leviatã. Quando há concordância com os padrões específicos de subjetivação, o indivíduo

acaba por cooptar-se às expensas de sua própria subjetividade.

Sendo, pois, o sujeito, elemento de interesse de ação do Estado, vai ser submetido às

ações inerentes ao trabalho, à vida, à produção, ao consumo, bem como a morte

(FOUCAULT, 2003). Segundo Fonseca (2003), Foucault atrela as microrelações ao poder

disciplinar, que está presente de maneira engenhosa nos diversos seguimentos da realidade

social. Foucault discorre sobre o poder disciplinar de forma mais profícua em Vigiar e Punir,

considerando o suplício e a prisão como modalidades de punição. Desta última, derivou-se a

disciplina, que funciona como uma sistemática de polícia, no sentido de controlar as ações dos

indivíduos.

No período inicial do século XVII, aplicava-se o suplício como penalidade expositiva,

devido ao cometimento de graves contravenções. Foucault (2008) tece críticas ao assunto,

tratando a consternação como sanções eivadas de barbáries e atrocidades, e que habitam o

fértil terreno do imaginário humano. Um traço expressivo do suplício era o fato de

proporcionar um tipo de flagelo progressivo, tais como vestígio de violência e mutilação

corporal, podendo até se encaminhar para um homicídio.

O enclausuramento surge como uma reação antagônica ao suplício, e emerge no

cenário de aceitação dos fundamentos humanistas. Foucault (2004), realiza um estudo

demonstrando como a onisciência e a onipresença do poder ostensivo de polícia se articula de

forma meticulosa e estratégica para cumprir o monitoramento dos indivíduos.

Esse raciocínio possui afinidade com o modelo panóptico, definido por Jeremy

Benthan, e se revela como dispositivo disciplinar presente em múltiplas ambientes, como, por

exemplo, nas forças armadas, nos manicômios, nas instituições mercantis e de ensino, que

norteiam, veladamente, a rotina e comportamento social das pessoas.

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Assim, o poder disciplinar transmuda a sua intencionalidade, e passa a se estribar não

mais na supressão de vidas, mas se fixa no domínio dos corpos. O emprego de força física,

que antes transformava pessoas em vassalos, vai ser substituído pela manipulação do arbítrio.

Na percepção de Fonseca (2003), o escopo das correções disciplinares não se resume à

imposição de obrigações, mas implica num amoldar comportamental dos desviantes às

doutrinas do sistema de recompensas, a qual qualifica as condutas e homogeneíza os

indivíduos, padronizando-os. Na sociedade disciplinar, o poder está vinculado à

superintendência das ações de outrem, quer seja este representado por grupos ou indivíduos.

Portanto, não está, forçosamente, atrelado com o uso da pujança, ou ao ato de dar ordens.

3 Biopolítica, Governamentalidade e Ecogovernamentalidade na Perspectiva

Foucaultiana

No entendimento de Foucault (2008a, 2008b), o conceito de biopolítica e de

governamentalidade orbita em torno da ideia de população, como elemento crucial para a

prática de governo, e é construído sobre uma perspectiva histórica. A partir do século XVII,

essa concepção aparece nas abordagens de Foucault (2005), e a mesma qualifica o

empoderamento da razão de existência de um Estado, cujo sentido precípuo seria o de

governar os viventes, sob a égide do modelo econômico do capitalismo.

Para Duarte (2008), a biopolítica trata-se de um dos eventos teóricos mais relevantes

com grande repercussão nas últimas décadas, tanto no campo político quanto no filosófico. De

acordo com Castro (2012), o conceito de biopolítica comporta uma multiplicidade de

significações, as quais perpassam por uma diversidade de contextos. Em face disso, a

biopolítica se debruça sobre a análise, a compreensão e o conhecimento de toda a prática de

governar, não sendo, pois, limitada ao sentido de governar um determinado Estado.

Apesar de o termo biopolítica ter sido largamente disseminado por Foucault (2008a,

2008b), não foi este autor quem o idealizou. Castro (2007) revela que, a citação pioneira

desse termo deve ser atribuída a Rudolf Kyellen, que o empregou, em 1905, para traduzir a

ideia de um Estado que se comportava como um organismo vivo. Esta versão foi,

posteriormente, reformulada, e passou a ser aplicada para aludir aos esforços do Estado

visando governar o homem, enquanto integrante de uma massa populacional.

Através das obras de Foucault, percebe-se que, desde a época do feudalismo, os

dispositivos de poder no ocidente sofreram intensas transformações. De igual modo, foi

concedida ao Estado a capacidade de governar a vida, e não apenas de eliminá-la, como

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mecanismo de controle, conforme lhe era permitido no século XVI, em concordância com a

relação de soberania por ele exercida.

Foucault (2005) argumenta que, o século XVII assinala o ingresso da vida na história,

ou seja, a introdução dos episódios intrínsecos à vida humana na ótica do saber e do poder. O

enfoque sobre as questões da vida adquiriu robustez, e as questões associadas à morte

passaram a ter menos importância. Justamente por isso que todos os fenômenos vinculados ao

controle e a modificação da vida humana começaram a ser vislumbrados sob a lógica do

poder. Assim, a intervenção estatística estruturou um campo inovador de mediação dos

poderes estatais sobre o tecido social. Para ilustrar esse diálogo, é salutar considerar o que diz

Danner (2010, p.52):

para compreender e conhecer melhor esse corpo, é preciso não apenas

descrevê-lo e quantificá-lo – por exemplo, em termos de nascimento e de

mortes, de fecundidade, de morbidade, de longevidade, de migração, de

criminalidade, etc. –, mas também jogar com tais descrições e quantidades,

combinando-as, comparando-as e, sempre que possível, prevendo seu futuro

por meio do passado. E há aí a produção de múltiplos saberes, como a

Estatística, a Demografia e a Medicina Sanitária.

Danner (2010) demonstra, portanto, que Foucault atrelava o surgimento da biopolítica

à oportunidade de se compreender a vida como um processo formatado pela ação do Estado,

haja vista que, cada território é composto por pessoas, as quais são sujeitas às ocorrências

naturais da vida, tais como a natalidade, a mortalidade, as moléstias, e congêneres. Disto,

decorre a valorização da interferência do método estatístico, imprescindível ao governamento

populacional.

Em suma, o conceito de biopolítica, explicitado por Foucault, pode ser sintetizado

como um dispositivo político do Estado, que possui como fito a garantia da vida biológica dos

indivíduos, e que, para a sua efetivação, se vale de mecanismos de quantificação, regras e

formas de controle (VEIGA-NETO, 2013).

A palavra ecogovernamentalidade, apresentada por Malette (2011), sistematiza a tríade

conceitual proposta por Foucault, para caracterizar a governamentalidade, sob uma

perspectiva racional, no que tange a problemática ecológica, qual seja: população, segurança e

economia política. Segundo o autor, todas as problemáticas, emergentes no contexto

ambiental, que afetam a vida humana, podem ser incluídas no rol de abordagem normativa e

taxativa, e são capazes de incentivar a adoção de novas posturas ambientais.

Nessa esteira de pensamento, entende-se que a ecogovernamentalidade adquire

múltiplos aspectos, tanto políticos, quanto discursivos e práticos, os quais interagem entre si

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para conduzir a forma como os atores sociais devem pensar e se comportar, de modo a

promoverem o desenvolvimento sustentável, a segurança ambiental, dentre outros aspectos

ecológicos.

Acrescenta-se, ainda, que, a ecogovernamentalidade está intimamente relacionada com

a construção introspectiva e consciente sobre as formas como o indivíduo interage com o seu

meio, tanto na esfera privada quanto coletiva. Essas ações são devidamente ilustradas através

das formas de habitação, de consumo dos recursos naturais e da exploração energética. Daí,

entende-se que a ecogovernamentalidade interfere na proposição de estratégias que visem o

estabelecimento de novos conceitos, para se refutar as práticas errôneas do homem frente à

natureza, realidade esta fortemente percebida na atualidade.

4 Conclusão

A partir da apreciação da obra de Foucault e das inferências argumentativas externadas

pelos autores alternativos, que se debruçaram sobre o estudo e a análise do legado

foucaultiano, pode-se depreender que a biopolítica emerge da oportunidade de se assimilar a

vida como sendo um processo amoldável, suscetível de monitoramento exercido pela

engrenagem estatal. Isto equivale a dizer que o termo biopolítica referencia uma tipologia

política capaz de controlar os indivíduos. Esta definição, apregoada por Foucault, é, desse

modo, um princípio que tem por escopo a compreensão de como se articulam as seguintes

vertentes: os poderes, a racionalidade governamental e os protagonistas sociais.

Todo esse diálogo tem haver, portanto, com a circulação e manifestação das relações

de poder na conjetura social, e os modos como esses dispositivos foram se incorporando, se

consolidando e sendo validadas no decurso temporal. Trata-se, pois, de uma atividade

governamental que possui por objetivo elementar o gerenciamento do corpo populacional.

Esta ação é efetuada por intermédio de estratégias de governamentalidade, que comportam um

conjunto de instrumentos de que se utiliza o poder para o cumprimento do propósito de

controle.

Averiguou-se, também, que a governamentalidade representa um agrupamento de

instituições, de cômputos e métodos capazes de propociarem a atuação da biopolítica.

Notadamente, delineou-se que, a governamentalidade se utiliza de um complexo de

normativas positivadas no âmbito jurídico, principalmente, e de diligências e recursos que

visam à superintendência das pessoas. Além disso, tenciona a concepção e a aplicação de

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saberes direcionados à classificação e ao diagnóstico das massas sociais, e dos aspectos

condicionantes que atuam sobre as mesmas.

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1 Graduanda em Direito, modalidade Integral, pela Escola Superior Dom Helder Câmara.1

EXPERIMENTOS CRUÉIS E A VIOLAÇÃO DO DIREITO DOS ANIMAIS NA INDÚSTRIA DE COSMÉTICOS

CRUEL EXPERIMENTS AND THE VIOLATION OF ANIMAL RIGHTS IN THE COSMETICS INDUSTRY

Munique Villela Gerth 1

Resumo

A atual pesquisa propõe demonstrar a crueldade dos testes em animais que é omitido pelas

grandes indústrias de cosméticos. Analisando dados e informações, o artigo visa à abolição

da experimentação animal, por meio da inserção de métodos alternativos. Pretende-se

concluir no final que a permanência dessa prática é devido ao especismo e a falta de

conhecimento da população. A pesquisa proposta pertence a vertente metodológica jurídico-

sociológica, a técnica trata-se de pesquisa teórica, usando do raciocínio dialético. Quanto à

investigação, pertence à classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), o tipo jurídico-

projetivo.

Palavras-chave: Direito ambiental, Testes laboratoriais, Direito dos animais, Maus- tratos, Experimentos em animais

Abstract/Resumen/Résumé

The current research proposes to demonstrate the cruelty of animal testing that is omitted by

the major cosmetic industries. Analyzing data and information, the article aims to abolish

animal experimentation by inserting alternative methods. It is intended to conclude in the end

that the permanetia of this practice is due to the speciesism and lack of knowledge of the

population. The proposed research belongs to the legal-sociological methodological aspect,

the technique is theoretical research, using dialectical reasoning. As for the investigation, it

belongs to the classification of Witker (1985) and Gustin (2010), the legal-projective type.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Environmental law, Laboratory tests, Animal rights, Mistreatment, Animal experiments

1

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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A atual pesquisa pretende abordar sobre o uso de animais para a experimentação de novos

produtos de cosméticos e a adoção de novas práticas para a substituição deles. Durantes anos

as indústrias de beleza utilizam os animais como cobaias para testarem a toxicidade das

substâncias dos produtos a serem lançados, contudo a maneira como esses testes ocorrem

violam os direitos dos animais e prejudicam a saúde deles, gerando a morte de milhões de

seres por ano. Dessa forma, nota-se a urgência da substituição desse método por outros mais

modernos.

Primeiramente, a abolição da experimentação animal para as indústrias de cosméticos é um

tema de suma importância, visto que essa prática antiga agride fisicamente muitos bichos, sem

mencionar o constante estresse e traumas irreversíveis que eles sofrem. Há uma atenção maior

para as empresas de cosméticos, por serem as que mais agridem os animais e que tem fins

relativamente fúteis, por se tratar de estética. Assim, é preciso refletir sobre a questão ética

por trás dessa ação e se ela é necessária para a sociedade a ponto de sacrificar vidas.

Além disso, a substituição dos testes em animais por métodos alternativos é algo positivo, não

só para os animais, mas também para os seres humanos, uma vez que são mais eficazes na

produção dos produtos. Por utilizarem uma tecnologia avançada e, em alguns métodos,

células e tecidos humanos, há uma aproximação maior com o organismo humano. Logo, gera

resultados mais precisos e reduz os possíveis acidentes com os clientes.

A pesquisa que se propõe pertence à vertente metodológica jurídico-sociológica. No tocante

ao tipo de investigação, foi escolhido, na classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), o

tipo jurídico-interpretativo. O raciocínio desenvolvido na pesquisa será predominantemente

dialético. Dessa maneira, a pesquisa tem o objetivo de desvendar a forma que os testes em

animais ocorrem e apontar os motivos pelo qual estes devem ser abolidos e substituídos por

outros métodos que não envolvem nenhuma crueldade animal.

2. A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DOS ANIMAIS EM EXPERIMENTOS

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU) (1978), em sua Declaração Universal dos

Direitos dos Animais, no artigo 4º, a) Nenhum animal será submetido a maus-tratos e a atos

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cruéis; b) Se a morte de um animal é necessária, deve ser instantânea, sem dor ou angústia.

Nessa perspectiva, analisando os testes laboratoriais que são feitos nos animais, pode se

afirmar que há uma serie de violações desses direitos. Sendo necessária a abolição deles.

Contudo, mesmo os testes laboratoriais só causarem danos aos animais, eles ainda persistem

na sociedade atual, sendo negligenciados por grande parte da população. De acordo com Peter

Singer (1975, p. 59), “Não deveria ser difícil acabar com este desperdício de vidas animais e

de dor se as pessoas estivessem realmente interessadas nisso”. Junto com essa perspectiva de

Peter Singer, pode-se acrescentar que mais um dos motivos para permanência dos testes em

animais seria omissão das empresas sobre a verdadeira face dos experimentos.

Assim, sem o conhecimento e/ ou interesse da população dificulta a extinção dessa prática,

mesmo ela sendo uma discussão relevante, uma vez que os testes laboratoriais são uma

espécie de violência em massa de animais. Baseado em modelos matemáticos feitos por Katy

Taylor, diretora de ciência da Coligação Europeia para Fim das Experiências em Animais,

estima-se que, anualmente, 115 milhões de animais são usados em pesquisa em todo o

mundo. Segundo Ebel (2013), “A ONG Pessoas pelo Tratamento Ético dos Animais (PeTA)

estima que, desse total, 3 milhões acabam mortos por ano”.

Primordialmente, cada produto possui uma finalidade e cada um deles tem a sua maneira

exata de se usufruir, por exemplo, maquiagens tem um local do rosto pré-determinado para se

usar. Todavia, alguns testes são feitos por via oral nos animais, no qual a substância não é

comestível, logo tem um grau a mais de toxicidade. Essa forma por via oral, também nomeada

de dose letal mediana, claramente não é dada ao animal com delicadeza, muitas vezes os

cientistas fazem o animal ingerir a força ou colocam um tubo na garganta do ser.

Outros modos de ser testar a toxicidade de um produto são: por aplicação nos olhos ou na

pele. A aplicação na parte ocular, na maioria dos casos, leva a cegueira completa do animal,

além de ter que aprisiona-lo em um dispositivo que não permite que ele se mova, com o

objetivo que ele não coce a região. A segunda forma, que é a de aplicação na pele necessita

que o animal seja todo tosado para que o produto tenha um contato maior, em outras

situações, há a imersão direta do corpo do animal na substância.

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Há também a inalação como teste de toxicidade, que pode ser outra forma de testar produtos

dermatológicos. “Durante os estudos de inalação, por exemplo, os animais são colocados em

câmaras e obrigados a inalar pulverizações, gases e vapores” (IKEDA; SMOLAREK, 2015, p.

7). Por fim, tem pesquisas que são feitas a partir de injeções, em que se aplica a substância,

possivelmente tóxica, no corpo do animal por via intramuscular ou subcutânea.

Após esse esclarecimento de como são desenvolvidos os testes em animais, é preciso refletir

se é ético e justo fazer vidas inocentes passarem por essas experiências dolorosas e

traumáticas. Pensa-se que se o produto é exclusivamente para os seres humanos, então não há

motivos para envolver outras espécies em testes de toxidade, a não ser que a questão maior

seja de discriminação com a espécie alheia. O professor e filósofo australiano, Peter Singer,

em seu livro “Libertação animal”, afirma:

Quando se toma conhecimento da realização de tais experiências em seres humanos,

geralmente assiste-se de imediato a uma violenta reação pública contra os

experimentadores, e justamente. Estes constituem, muitas vezes, exemplos da

arrogância do investigador que justifica tudo com base no aumento de conhecimento.

Mas se o experimentador afirma que a experiência é suficientemente importante para

justificar a inflicção de sofrimento aos animais, por que não é suficientemente

importante para justificar a inflicção de sofrimento a seres humanos com nível mental

semelhante? Que diferença há entre os dois? Apenas que um é membro da nossa

espécie e o outro não? Fazer apelo a essa diferença é revelar um enviesamento tão

defensável como o racismo ou qualquer outra forma de discriminação arbitrária.

(SINGER, 1975)

Percebe-se então que o uso de animais como cobaias em testes de produtos de cosméticos tem

uma séria relação com o especismo. Tal pensamento de que a espécie humana é superior às

outras e, por isso tem o direito de escraviza-las, impede que os seres humanos tenham empatia

pelos animais, além de dificultar a abolição desse método de experimentação que é tão cruel.

Dessa forma, a permanência dessa prática implica em mais mortes e agressões de milhões de

animais anualmente, logo a violação dos direitos deles.

3. VANTAGENS DOS METÓDOS ALTERNATIVOS

Atualmente, as empresas de cosméticos possuem diversas opções para substituírem os testes

em animais, dentre eles tem: os sistemas in vitro, os modelos de computador, os tecidos

humanos, os estudos voluntários e muitos outros. Esses métodos por utilizarem células e

tecidos humanas e/ ou sistemas computacionais garantem um resultado da pesquisa mais

seguro. Desse modo, nota-se a importância de implantar uma dessas opções nos laboratórios

das empresas.

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A modernização da forma de experimentação beneficia não só os animais, diminuindo os

maus tratos e as mortes, mas também a sociedade. Em primeiro lugar, os métodos alternativos

possuem vantagens às empresas, uma vez que eles são mais precisos, logo se diminui as

chances de um possível acidente com um cliente especifico não detectado antes, e ao mesmo

tempo prejudicar a imagem da marca. Além disso, é relevante ressaltar que os métodos

alternativos são de baixo custo e mais rápidos do que a experimentação animal.

Constata-se que, por exemplo, o uso de culturas de células e tecidos proporcionam uma

compatibilidade maior com o organismo humano, visto que as células totipotentes possuem a

capacidade de se transformarem em qualquer órgão ou que aquele material que esta ali

presente já faz parte do corpo humano. Ademais, o tempo de pesquisa e o gasto são muito

menores, já que nos animais precisa-se de um grande número de seres e um maior tempo de

observação de cada. Então, nos quesitos empresariais, os métodos alternativos proporcionam

muitas vantagens e aos consumidores mais segurança.

A partir dessas considerações, o Conselho Nacional de Experimentação Animal (CONCEA),

visando reduzir os testes em animais, aprovou, recentemente, 17 métodos alternativos que

devem ser utilizados pelas empresas caso servirem para a comprovação da segurança e

eficácia dos seus produtos. Logo em seguida, a ANVISA, órgão regulamentador da produção

de cosméticos no Brasil, produziu uma norma, em 2015, afirmando que a agência aceitará

qualquer um desses métodos e que, portanto deve-se abandonar o uso seres vivos quando há

possibilidade. Assim, a substituição dos testes em animais já é uma possibilidade.

Dessa forma, após apresentar todos esses benefícios, é possível afirmar que não há porque

uma empresa não querer abandonar os testes em animais. Porém, como já dito antes, se trata

de uma questão especista e de omissão a população, que deve ser alterada. A evolução dos

recursos para pesquisa já é uma realidade, o que falta agora é a mudança da mentalidade.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se então que, os testes em animais são extremamente cruéis, devido às situações que

os animais são obrigados a se submeterem e que provocam danos colaterais sérios à saúde

física e mental deles. Além de gerarem milhões de mortes anualmente só para contribuir com

a produção das grandes empresas de cosméticos. Logo, a exterminação e a violação dos

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direitos, postos na Declaração Universal dos Direitos dos Animais, de varias vidas inocentes

são provocadas pelas finalidades fúteis dos seres humanos.

Outrossim, a discriminação e a negligência com a vida e a saúde das outras espécies é

comprovada ao verificar o posicionamento das empresas e uma parte da população que se diz

contra aos novos métodos alternativos, por ineficaz. Sendo que tais métodos, como foi

fundamentado anteriormente, são benéficos para a sociedade e já possuem a capacidade de

substituírem os animais na maioria dos experimentos. Assim, nota-se que essa resistência é,

na maioria das vezes, por causa do pensamento especista.

Por fim, é imprescindível destacar que os animais não estão a serviço do ser humano e que a

abolição dos testes em animais só vai ser uma realidade se tiver um interesse popular. Mas

antes, é preciso que a população tome consciência das atrocidades que acontecem em alguns

laboratórios de empresas, para que provoque um sentimento de empatia e compressão de que

nenhuma vida tem mais valor que as outras. E então, uma cobrança maior das autoridades.

5. REFERÊNCIAIS

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=column-

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aceitacao-de-metodos-alternativos-ao-uso-de-

animais&redirect=http%3A%2F%2Fportal.anvisa.gov.br%2Fresultado-de-

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GOVERNANÇA SUSTENTÁVEL E BLOCKCHAIN: PROJETO DE UMA REDE DE MONITORAMENTO DA QUALIDADE DAS ÁGUAS DE UM MUNICÍPIO

SUSTAINABLE GOVERNANCE AND BLOCKCHAIN: PROJECT FOR A WATER QUALITY MONITORING NETWORK IN A MUNICIPALITY

Rodrigo Luiz GuarnettiJosé Roberto Anselmo

Resumo

O presente trabalho apresenta os resultados preliminares do projeto de uma rede de

monitoramento da qualidade das águas de um município utilizando blockchain. As medições

da qualidade da água são disponibilizadas em uma plataforma virtual de acesso livre. O uso

dessa tecnologia contribui com a transparência e a segurança das informações divulgadas

pela gestão pública. Pelo fato de as informações ficarem eternamente registradas, é possível

apontar responsabilidades e monitorar a gestão hídricas do município.

Palavras-chave: Governança, Blockchain, Sustentabilidade, Água

Abstract/Resumen/Résumé

This paper presents the preliminary results of the design of a water quality monitoring

network in a municipality using blockchain. Water quality measurements are made available

on a virtual platform with free access. The use of this technology contributes to the

transparency and security of the information disclosed by the public management. In fact the

information is forever recorded, it is possible to point out responsibilities and monitor the

municipality's water management.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Governance, Blockchain, Sustainability, Water

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1. Introdução

O acesso à água potável e ao saneamento básico é um direito humano essencial, fundamental e

universal, indispensável à vida com dignidade e reconhecido pela Organização das Nações

Unidas (ONU) como “condição para o gozo pleno da vida e dos demais direitos humanos”

(Resolução 64/A/RES/64/292, de 28.07.2010).

A contaminação e poluição dos afluentes conhecidos como córregos têm se tornado cada vez

mais frequentes, devido à pressão que estes corpos d’água de pequeno porte, sofrem e o

crescimento desordenado urbano em que se inserem. Apesar deste caráter regional, poluir ou

contaminar estas áreas significa afetar várias outras localidades.

Percursos de desenvolvimento insustentável e falhas de governança têm afetado a qualidade e

disponibilidade dos recursos hídricos, comprometendo a geração de benefícios sociais e

econômicos. A demanda de água doce continua aumentando. A não ser que o equilíbrio entre

demanda e oferta seja restaurado, o mundo deverá enfrentar um déficit global de água cada vez

mais grave (UNESCO, 2015).

Considerando a importância dá divulgação de informações atualizadas relativas à qualidade da

água em um município, esse trabalho propõe criação uma rede de monitoramento da qualidade

da água de uma cidade utilizando blockchain.

Blockchain que é uma rede descentraliza utilizada para registrar e validar as transações em

moeda virtual Bitcoin, sendo possível a movimentação de outros ativos como documentos e

arquivos digitais (KRISTIAN 2017).

A pesquisa se justifica pois vai de encontro como conceito de desenvolvimento sustentável,

atuando nas dimensões ambiental, social e econômica.

Como resultado da pesquisa, espera-se estimular a participação da sociedade tanto na

preservação dos recursos hídricos, como no acompanhamento e fiscalização de informações

divulgadas pelos agentes envolvidos na plataforma virtual, permitindo que usuários acessem a

plataforma virtual (aplicativo) e acompanhe a evolução dos indicadores ambientais referentes

a cada ponto analisado, podendo sugerir novas ações e até mesmo contribuir financeiramente

em eventuais causas ambientais.

2. Objetivos

• Realizar estudo bibliográfico sobre o uso de blockchain e Governança Sustentável

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• Apresentar os resultados preliminares referentes a implantação de uma rede de

monitoramento da qualidade de água no município de Bauru, São Paulo, Brasil.

3. Desenvolvimento da Pesquisa

3.1 Método

Para atingir os objetivos propostos, inicialmente foi realizado o estudo bibliográfico

considerando as palavras: governança sustentável e blockchain.

Empregou se a base de dados científica DIMENSION para o levantamento de recentes

publicações.

O trabalho apresenta resultados preliminares referente ao estudo de caso de implantação deu

uma rede de monitoramento da qualidade das águas na cidade de Bauru, São Paulo, Brasil.

3.2 Estudo de caso - Projeto de extensão universitária

O projeto de extensão universitária chamado de Monitoramento da Qualidade das Águas da

Cidade de Bauru, iniciado em 2019 foi realizado por alunos, professores e parceiros da

Instituição Toledo de Ensino, sendo divido em 3 etapas:

a) Implementação dos do sistema coletas e análise das amostras

A primeira etapa do projeto consistiu na realização do monitoramento da qualidade de água dos

córregos da cidade de Bauru, e posteriormente disponibilizadas em endereço na internet para

acesso livre.

A coleta de água é feita em pontos específicos nos córregos previamente definidos em função

de provável poluição. Depois as amostras são encaminhadas para o laboratório e analisadas em

termos de: potencial hidrogeniônico, fosfato, nitrogênio amoniacal, oxigênio dissolvido,

demanda química de oxigênios e coliformes totais.

b) Implementação e tecnologia blockchain no projeto

Atualmente o projeto encontra-se nessa etapa, sendo os estudos concentrados no

desenvolvimento da plataforma.

c) Criação dos aplicativos de acesso livre.

A criação dos aplicativos será a última etapa do processo. Nessa etapa, os participantes,

prefeitura, órgãos de classe, entre outros, definem em conjunto o a forma com que ou usuário

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final, ou seja, as pessoas terão acesso às informações, sendo definidas as melhores tecnologias

para a aplicação.

3.3 O que é Blockchain?

Blockchain é uma tecnologia de registro de informação que se vale de uma rede descentralizada

peer to peer (P2P) para gerar consenso entre seus participantes acerca das informações

armazenadas e das que se pretende armazenar. Para tanto, seus participantes (nodes),

compartilham um “livro de registros” (public ledger) a fim de possibilitar a verificação da

compatibilidade das informações entre os nodes, gerando a confiança necessária para o

funcionamento desta tecnologia.

Desenvolvimentos recentes permitiram que a blockchain incorporasse em si qualquer forma de

conteúdo ou informação. Seu funcionamento inviabiliza economicamente a sua falsificação, na

medida em que o custo necessário para quaisquer fraudes em seu registro ultrapassa possíveis

vantagens obtidas. Dessa maneira, a blockchain permite a interação autônoma entre os pares,

dispensando a figura do terceiro de confiança, uma vez que esta é assegurada pela própria

arquitetura do sistema. Isso proporciona maior fluidez nas relações, assim como um rol

praticamente inesgotável de utilizações (S471a, 2017).

As transações com blockchain são verificáveis por meio de um uso de criptografia de chave

pública. Cada usuário possui duas “chaves”, uma privada, secreta, como uma senha pessoal e

intransferível, e outra pública, que pode ser compartilhada com todos e identifica as transações

realizadas por esse determinado usuário. Além disso, nas chaves públicas, qualquer um pode

verificar que a transação foi de fato assinada com uma chave privada, sendo, portanto, uma

troca autêntica que passa a ser registrada de forma perene, identificada com data e hora e

divulgada no banco de dados que arquiva todos os registros de transações feitas, como se fosse

um grande um livro-razão, chamado de blockchain (DNNY, 2017)

4. Resultados

O estudo bibliográfico considerando as palavras chaves “blockchain e governança sustentável”

registraram aumento no número de publicação nos últimos anos. Em 2016 apareceu apenas uma

publicação, já em 2019, foram quatorze, refletindo o interesse de diferentes pesquisadores pelo

tema.

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O projeto de extensão universitária apresentou resultados bastante satisfatórios, pois envolveu

a comunidade acadêmica, além de gestores municipais em torno do tema governança

sustentável e tecnologia.

Quando optamos pela blockchain, as falhas de governança que têm afetado a qualidade e

disponibilidade dos recursos hídricos, tendem a diminuir consideravelmente, afinal, todas ações

e informações fornecidas pelos gestores públicos ficaram registrados eternamente,

possibilitando qualquer pessoa verificar as informações, tendo a certeza da veracidade dos

dados.

A utilização de blockchain no monitoramento da qualidade das águas de uma cidade contribui

com transparência e segurança das informações enviadas pelos gestores públicos. Pelo fato de

essas informações ficarem eternamente registradas, é possível apontar responsabilidades dos

agentes públicos na gestão hídricas do município.

A utilização de uma plataforma capaz de autenticar as informações disponibilizadas transmite

maior credibilidade para a sociedade, que podem acompanhar em tempo real o desempenho das

ações voltadas à proteção dos mananciais é qualidade da água.

Os sistemas de monitoramento existentes a qualidade das águas de municípios teria a ganhar se

fossem integradas a blockchain. O sistema pode ser alimentado por diversos membros:

departamentos governamentais, organizações multilaterais, agências governamentais

municipais, agências reguladoras, entre outras.

5. Considerações Finais

A transparência é essencial para promover equidade e justiça no processo decisório, com base

num processo que informe adequadamente o público. Esse pode ser entendido como a

participação do cidadão na gestão pública: fiscalização, monitoramento e controle das ações da

Administração Pública. Nesse sentido, o monitoramento do comportamento das bacias

hidrográficas proporciona projetos para evitar acidentes como, por exemplo, as inundações,

além de maximizar o aproveitamento desse recurso (água) para o abastecimento de cidades,

atividade industrial, entre outras.

O projeto de criação da plataforma informativa tornando a medições da qualidade água

utilizando blockchain apresenta a vantagem de ser transparente, pois as informações que serão

lançadas na rede deverão ser confirmadas pelos integrantes previamente cadastrados como

agentes públicos.

O acesso à informação por si só não garantirá o acesso universal à água. É preciso

entendermos os processos que ocorrem na disponibilização de tais dados, a sua qualidade e

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consequências. Ainda há muito o que avançar em termos de governança da água, diante da

deterioração dos mananciais, é necessário monitorar a eficiência dos tratamentos de água, de

forma a garantir saúde pública. Somente um amplo acesso e transparência das informações

hídricas e ambientais podem contribuir para a melhoria nos indicadores de qualidade da água.

6. Referências:

DENNY, Danielle Mendes Thame; PAULO, Roberto Ferreira; CASTRO, Douglas de.

Blockchain e Agenda 2030. Rev. Bras. Polít. Públicas, Brasília, v. 7, nº 3, 2017 p. 121-141.

ONU. Declaração da “ONU Água” para o Dia Mundial da Água - 2010. Disponível em:

https://www.un.org/waterforlifedecade/pdf/human_right_to_water_and_sanitation_media_bri

ef_por.pdf. Acesso em: 02 mar. 2019.

S471a Seminário Governança das redes e o Marco Civil da Internet (2. : 2016 : Belo Horizonte,

MG) Anais [recurso eletrônico]: globalização, tecnologias e conectividade / Fabrício Bertini

Pasquot Polido, Lucas Costa dos Anjos, Luiza Couto Chaves Brandão, organizadores. Belo

Horizonte: Instituto de Referência em Internet e Sociedade, 2017. 442 p. - Inclui bibliografias.

KRISTIAN, Lauslahti, Juri Mattila and Timo Seppala, ‘Smart contracts – How will blockchain

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