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Livro 1
4ª EDIÇÃO · 2014
REVISADA E AMPLIADA
Edgar Nunes de MoraesFlávia Lanna de Moraes
Avaliação M
ultidimensional do Idoso
Coleção Guia de Bolso em Geriatria e Gerontologia
Livro 1. Avaliação Multidimensional do Idoso
Livro 2. Incapacidade Cognitiva: Abordagem Diagnóstica e
Terapêutica das Demências no Idoso
Livro 3. Estratégias de Prevenção de Doenças e Gestão da Clínica
Livro 4. Instabilidade Postural, Imobilidade e
Incontinência Esfincteriana
Livro 5. Iatrogenia e Gerenciamento da Polipatologia:
Guia de Terapêutica Geriátrica
Livro 6. Cuidado Paliativo
Coleção Guia de Bolso em
Geriatria e Gerontologia Avaliação Multidimensional do Idoso
Disponível também na versão ebooka partir de julho/2014
Disponível apartir de Julhode 2014 naiBooks Store
Disponível apartir de Julhode 2014 naiBooks Store
Projetado exclusivamente para o iPad da Apple, Avaliação Multidimensional do Idoso contém galerias, vídeos, quadros animados e muito mais. Este livro digital dá vida ao conteúdo de um jeito que seria impossível na forma impressa, facilitando o ensino e a aprendizagem dos principais aspectos da Geriatria e da Gerontologia. Nesta versão, há possibilidade de visualização de filmes que mostram a aplicação dos principais instrumentos de avaliação do idoso em pacientes reais, exemplificando testes normais e alterados. Todos os filmes são legendados e contêm a discussão dos erros e acertos mais frequentes na sua realização.
Avaliação Multidimensional do Idoso agora também no iPad!
Belo Horizonte, 2014
Edgar Nunes de MoraesFlávia Lanna de Moraes
Avaliação Multidimensional do Idoso
4a edição
Coleção Guia de Bolso em Geriatria e Gerontologia
Avaliação Multidimensional do Idoso 4a EdiçãoSérie: Coleção Guia de Bolso em Geriatria e Gerontologia, 1
Edgar Nunes de MoraesFlávia Lanna de Moraes
Todos os direitos autorais estão reservados e protegidos pela Lei nº 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. É proibida a duplicação ou reprodução desta obra, no todo ou em parte, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia ou outros), sem a permissão prévia, por escrito, da Editora.
Direitos exclusivosCopyright © 2014 byFolium EditorialAv. Carandaí, 161 - sala 70230130-060 - Belo Horizonte - MGTel. (31) 3287-1960e-mail: [email protected]
M827a Moraes, Edgar Nunes
Avaliação multidimensional do idoso Edgar Nunes Moraes, 4. ed.Belo Horizonte: Folium, 2014.200p. il (Coleção Guia de Bolso em Geriatria e Gerontologia, 1).
ISBN 978-85-88361-74-41.Geriatria. I. Título. II. Série. III. Moraes, Flávia Lanna.
NLM WT 100CDU 616-053.9
Ficha catalográfica
Autores
Edgar Nunes de Moraes, MD, PhD
• Professor Associado do Departamento de Clínica Médica da UFMG
• Mestre e Doutor em Medicina pela UFMG
• Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia
• Coordenador do Núcleo de Geriatria e Gerontologia da UFMG
• Coordenador do Instituto Jenny de Andrade Faria de Atenção à Saúde do Idoso
• Coordenador do Programa de Residência Médica em Geriatria do HC-UFMG
• Coordenador do Estágio Longo em Geriatria e Gerontologia do HC-UFMG
• Comitê Assessor da Coordenação de Saúde da Pessoa Idosa / Ministério da Saúde
E-mail: [email protected]
Flávia Lanna de Moraes, MD
• Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia
• Especialista em Medicina de Família e Comunidade pela UFMG e pela Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade
• Mestrado em Medicina Molecular pela UFMG
• Membro Titular do Núcleo de Geriatria e Gerontologia da UFMG
• Preceptora da Residência Médica em Geriatria do HC-UFMG
• Médica da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte
E-mail: [email protected]
AgradecimentosAgradecemos a toda equipe interdisciplinar do Núcleo de Geriatria e
Gerontologia da UFMG e, em especial, aos colaboradores que contribuíram com a elaboração, revisão e aperfeiçoamento deste material:
• Adriana Kakehasi (Reumatologia)• Adriano Max Moreira Reis (Farmácia)• Antônio Carlos Correa (Psicogeriatria)• Bernardo de Matos Viana (Psicogeriatria)• Breno Satler (Psicogeriatria)• Caio Moreira (Reumatologia)• Carla Jorge Machado (Epidemiologia/Demografia/Saúde Pública)• Dália Elena Romero (Demografia/Sociologia)• Denise Utsch (Otorrinolaringologia)• Dorotéia Fernandes Silva (Serviço Social)• Érica Araújo Brandão Couto (Fonoaudiologia)• Érika de Oliveira Hansen (Geriatria)• Eugênio Vilaça Mendes (Consultor em Saúde Pública)• Flávio Chaimowics (Geriatria)• Gelson Ruben Almeida (Geriatria)• Gisele de Cássia Brandão (Fisioterapia)• Janine Gomes Cassiano (Terapia Ocupacional)• João Luís Cioglia Pereira Diniz (Otorrinolaringologia)• João Marcos Dias (Fisioterapia)• Jonas Jardim de Paula (Neuropsicologia)• Juliana Alves do Carmo (Geriatria)• Lafaiete Moreira dos Santos (Neuropsicologia)• Leandro Malloy (Neuropsicologia) • Leani Souza Máximo (Fisioterapia)• Luciene Chaves Fernandes (Oftalmologia)• Lygia Paccini (Fisioterapia)
• Maira Toninandel (Geriatria)• Marcela Tirado (Terapia Ocupacional)• Marco Túlio Gualberto Cintra (Geriatria)• Marco Túlio Freitas (Odontogeriatria)• Maria Aparecida Camargos Bicalho (Geriatria)• Maria Cristina Correa Lopes Hoffmann ( Coordenação da Área Técnica de
Saúde da Pessoa Idosa / Ministério da Saúde)• Maria Cristina Costa de Arrochela Lobo (Coordenação da Área Técnica de
Saúde da Pessoa Idosa / Ministério da Saúde)• Maria da Conceição de Oliveira (Serviço Social)• Maura Aparecida Meira Maia (Geriatria)• Maurício Viotti Daker (Psicogeriatria)• Mauro Cunningham ( Neurologia - Distúrbios do Movimento)• Mozart Vidigal (Arquitetura)• Paulo Caramelli (Neurologia Cognitiva)• Polyana Mota (Nutrição)• Raquel Souza Azevedo (Enfermagem)• Renato Veras (Geriatria)• Rodrigo Megale (Geriatria)• Rodrigo Ribeiro dos Santos (Geriatria)• Rosângela Correa Dias (Fisioterapia)• Silvana Araújo Silva (Geriatria)• Soraya Coelho Costa (Farmácia)• Ulisses Vasconcelos Cunha (Geriatria)• Valéria Passos (Geriatria)• Wagner Vieira Fonseca (Ortopedia)
Aos colegas e alunos que participaram intensamente na elaboração dos vídeos educativos e, em especial, à Mariana Christine Assis Faria Medeiros pelo empenho e dedicação.
E, finalmente, agradecemos aos amigos e familiares que continuam apoiando todas as nossas iniciativas na assistência e ensino da Geriatria e da Gerontologia.
PrefácioEsta 4ª edição do guia de bolso Avaliação Multidimensional do Idoso apre-
senta-se, agora, em seu apogeu, graças à revisão dos autores: mais aprimorada, mais atualizada e mais contextualizada. Revela a compreensão do Prof. Edgar sobre a geriatria e gerontologia, bem como a filosofia do serviço de geriatria da UFMG. Mostra a necessidade absoluta de avaliar o idoso de forma holística, cuja base é a capacidade funcional.
Os idosos constituem uma população heterogênea. Distinguir os mais vul-neráveis e estratificá-los por meio de critérios funcionais e de risco é uma neces-sidade. Esta obra apresenta a Classificação Clínico-Funcional do Idoso. Pela contextualização crítica apresentada sobre o conceito de fragilidade, entende-se que este modelo utiliza o Fenótipo de Fragilidade de Fried como um dos pilares centrais, acrescido da abrangência do modelo de déficits cumulativos do Índice de Fragilidade de Rockwood. Essa união em um modelo único, viável e opera-cional é uma vitória.
A esse respeito, vale lembrar a experiência da autora Dra. Flávia Lanna, que trabalha na atenção primária à saúde há anos, foi decisiva para transformar o modelo em algo aplicável nos diferentes níveis de atenção. Sua participação foi também decisiva na criação do instrumento de rastreio (Índice de Vulnerabilidade Clínico Funcional - IVCF) para os profissionais da atenção primária que não tem formação em geriatria e gerontologia. Enfim, trata-se de índice que permite ao não-especialista detectar quais pacientes precisam ser avaliados pelos profissio-nais especialistas. Esse índice possibilita também um acompanhamento longitu-dinal do idoso. É a união da simplicidade, abrangência e operacionalização!
Com efeito, o presente guia prima pela abordagem moderna do processo de entrevista médica (Modelo de Calgary-Cambridge) ao incorporar ferramentas e técnicas de comunicação que aumentam a eficiência e favorecem um atendi-mento mais humanitário.
Não se trata, pois, de mais um manual com instrumentos de rastreio, mas de sugestão de modelo de avaliação multidimensional aplicável a diferentes situações, de forma didática e de fácil assimilação.
Rodrigo Ribeiro dos SantosProfessor Adjunto do Departamento de Clínica Médica da UFMG
Presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia - MG
ApresentaçãoO Guia de Bolso Avaliação Multidimensional do Idoso está na sua 4ª
edição e bem mais robusto. Apresentamos os conceitos mais atuais de fragilida-de, aplicados à prática clínica e inseridos no Modelo Multidimensional de Saúde do Idoso, elaborado pela equipe interdisciplinar do Núcleo de Geriatria e Gerontologia da UFMG e testado ao longo dos últimos 15 anos no Instituto Jenny de Andrade Faria de Atenção à Saúde do Idoso do HC-UFMG. A partir dele, construímos uma proposta de Classificação Clínico Funcional do Idoso, que se mostra extremamente útil para a gestão clínica e para a hierarquização do aten-dimento nos diversos sistemas de saúde. Esta classificação é também apresen-tada na forma de uma Escala Analógica de Fragilidade, que permite a visualiza-ção da saúde do idoso e a definição de metas terapêuticas individualizadas.
Todos os instrumentos mais utilizados na Avaliação Multidimensional do Idoso são minuciosamente discutidos, sempre destacando a interpretação críti-ca das escalas e sua utilização na prática clínica.
Outra grande novidade é a versão eletrônica do livro, disponível para o sis-tema operacional iOS (iPad), que permite maior interação com leitor, facilitando o ensino e a aprendizagem dos principais aspectos da Geriatria e da Gerontologia. Nesta versão, há possibilidade de visualização de filmes que mostram a aplica-ção dos principais instrumentos de avaliação do idoso em pacientes reais, exemplificando testes normais e alterados. Todos os filmes são legendados e contêm a discussão dos erros e acertos mais frequentes na sua realização.
Sumário
1. Bases Conceituais da Saúde do Idoso ........................... 1Modelo Multidimensional de Saúde do Idoso ..................................... 1
Fragilidade: uma nova proposta conceitual e operacional ................. 6Fragilidade Clínico-Funcional .............................................................................. 12
Fragilidade Sócio-Familiar ................................................................................... 16
Glossário Geriátrico-Gerontológico .................................................... 23
2. A Entrevista Geriátrico-Gerontológica ........................... 27
3. Avaliação Multidimensional do Idoso ............................ 35Funcionalidade Global .......................................................................... 37
Sistemas Funcionais............................................................................. 42Cognição ............................................................................................................. 43
Humor / Comportamento .................................................................................... 61
Mobilidade ........................................................................................................... 72
Comunicação ...................................................................................................... 90
Sistemas Fisiológicos ........................................................................... 99Saúde bucal ....................................................................................................... 105
Sono ................................................................................................................... 106
Nutrição .............................................................................................................. 108
Avaliação Sócio-Familiar ..................................................................... 115
Exame Físico do Idoso ........................................................................ 116
Ectoscopia .......................................................................................................... 118
Sistema cardiovascular ...................................................................................... 127
Sistema respiratório ............................................................................................ 132
Sistema gênitourinário ........................................................................................ 132
Sistema gastrointestinal ..................................................................................... 132
Sistema nervoso ................................................................................................. 135
Sistema músculo-esquelético ............................................................................ 143
4. Diagnóstico Geriátrico-Gerontológico e Plano de Cuidados .........................................................157
5. Índice de Vulnerabilidade Clínico-Funcional (IVCF) ........171
Referências bibliográficas .................................................. 181
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1. BASES CONCEITUAIS DA SAÚDE DO IDOSO
Modelo Multidimensional de Saúde do Idoso
O envelhecimento rápido da população brasileira traz profundas consequ-ências na estruturação das redes de atenção à saúde, com maior carga de doenças crônicas e incapacidades funcionais. Consequentemente, constata-se o surgimento de novas demandas e o uso mais intensivo dos serviços de saúde (Veras, 2009). A transição epidemiológica do nosso país foi verificada pelo Ministério da Saúde Brasileiro, ao realizar, em 2006, um estudo no qual analisou--se a população brasileira de acordo com os indicativos propostos pelo ‘’Global Burden of Disease Study’’ (GBD) (Brasil, 2006) (Murray, 1994). Os resultados desse estudo mostraram que, embora ainda persista uma morbidade por doen-ças infecto-contagiosas (12,5%), a morbimortalidade dessa população por doen-ças crônicas não transmissíveis já chega a 61,8%.
Todavia, envelhecimento não é sinônimo de incapacidades e dependência, mas de maior vulnerabilidade. A heterogeneidade entre os indivíduos idosos é marcante e progressiva ao longo do processo de envelhecimento. As doenças são mais frequentes nesta faixa etária, mas nem sempre estão associadas à dependência funcional. Como resultante deste fato, não basta para o profissional da área do envelhecimento a “antiga informação”, que informa se o paciente tem ou não doenças, pois 90% as têm (Ramos, 2003). Envelhecer sem nenhuma doença crônica é mais uma exceção do que a regra (Veras, 2012). Deste modo, esta é uma informação que não agrega possibilidades de mudança e é por este motivo que introduzimos um novo indicador de saúde, a capacidade funcional. Embora seja muito importante o diagnóstico clínico registrado na Classificação Internacional de Doenças-CID (não negamos a importância do diagnóstico cor-
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reto e bem feito), esta informação isolada não deixa claro o quadro funcional do idoso. Indivíduos com o mesmo diagnóstico clínico podem ter a capacidade funcional absolutamente distinta um do outro. Assim, a fronteira entre os concei-tos de saúde, doenças, dependência e incapacidades deve estar bem definida.
Na tentativa de contribuir para a elucidação desse contexto, em 2001 a Organização Mundial de Saúde, responde a essa demanda e aprova, em sua 54ª Assembléia, a utilização da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), em complementação à CID. Além de estabelecer uma linguagem comum e internacional entre os profissionais na clínica e em pesquisas, a CIF tem a proposta da compreensão da saúde e da funcionalida-de a partir de três componentes inter-relacionados: estrutura e função do corpo (refere-se às partes anatômicas e as funções fisiológicas e psicológicas dos sistemas corporais), atividade (capacidade de realizar ações e tarefas em diferentes contextos) e a participação social (envolvimento do indivíduo na sociedade). Nesse modelo, o processo de saúde e funcionalidade é resultante da interação dinâmica entre estas três dimensões, que são influenciadas pelos fatores contextuais, pessoais, sociais e ambientais do indivíduo (Organização Mundial da Saúde, 2003). Assim o modelo teórico proposto pela CIF possibili-ta a compreensão do impacto do processo de envelhecimento nas diferentes dimensões da saúde e suas consequências funcionais, para que os profissio-nais da saúde possam direcionar suas intervenções de acordo com as neces-sidades específicas do indivíduo.
Dessa forma, a saúde pode ser definida como uma medida da capacidade de realização de aspirações e da satisfação das necessidades e não simples-mente como a ausência de doenças. A maioria dos idosos tem doenças ou disfunções orgânicas que, na maioria das vezes, não estão associadas à limita-ção das atividades ou à restrição da participação social. Assim, mesmo apresen-tando doenças, o idoso pode continuar desempenhando as suas atividades e os papéis sociais. O foco da saúde está estritamente relacionado à funcionalidade global do indivíduo, definida como a capacidade de gerir a própria vida e de cuidar de si mesmo. A pessoa é considerada saudável quando é capaz de reali-zar as tarefas do cotidiano, de forma independente e autônoma, mesmo na presença de doenças (Moraes, 2009; Ramos, 2003). Faz-se necessário definir também a diferença entre capacidade funcional e desempenho funcional. A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) utiliza os termos desempenho funcional para descrever o que o indivíduo consegue fazer no seu ambiente habitual, ou seja, no contexto real que vive, já a capacida-
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de funcional é testada por instrumentos ou testes específicos em ambientes controlados (CIF, 2003).
A portaria que institui a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa consi-dera que “o conceito de saúde para o indivíduo idoso se traduz mais pela sua condição de autonomia e independência do que pela presença ou ausência de doença orgânica” (Brasil, 2006). Bem-estar e funcionalidade são complementa-res. Representam a presença de autonomia (capacidade individual de decisão e comando sobre as ações, estabelecendo e seguindo as próprias convicções) e independência (capacidade de realizar algo com os próprios meios), permitindo que o indivíduo cuide de si e de sua vida. Cabe ressaltar que a independência e a autonomia estão intimamente relacionadas, mas são conceitos diferentes. Existem pessoas com dependência física, mas capazes de decidir e escolher com autonomia as atividades de seu interesse. Por outro lado, há pessoas que têm condições físicas para realizar determinadas tarefas do cotidiano, mas não têm condições de decidir e escolher com segurança sobre como, quando e onde se envolver nestas atividades. A perda da independência nem sempre vem asso-ciada com a perda de autonomia: um idoso com perda da capacidade de deam-bular, pode perfeitamente gerenciar sua vida com autonomia e participação social. Assim, a funcionalidade global é a base do conceito de saúde do idoso. O declínio funcional é a perda autonomia e/ou da independência, pois restringe a participação social do indivíduo. Por sua vez, a independência e autonomia estão intimamente relacionadas ao funcionamento integrado e harmonioso dos seguintes sistemas funcionais principais (Moraes, 2012).
• cognição: é a capacidade mental de compreender e resolver adequada-mente os problemas do cotidiano;
• humor/ comportamento: é a motivação necessária para a realização das atividades e/ou participação social. Inclui também o comportamento do indivíduo, que é afetado pelas outras funções mentais, como a senso--percepção, o pensamento e o nível de consciência.
• mobilidade: é a capacidade individual de deslocamento e de manipula-ção do meio. Por sua vez, a mobilidade depende quatro subsistemas fun-cionais: a capacidade aeróbica e muscular (massa e função), o alcance/preensão/pinça (membros superiores) e a postura, transferência e mar-cha. A continência esfincteriana é também considerada um subsistema da mobilidade, pois a sua ausência (incontinência esfincteriana) é capaz de interferir na mobilidade, restringindo a participação social do indivíduo;
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• comunicação: é a capacidade estabelecer um relacionamento produtivo com o meio, trocar informações, manifestar desejos, ideias e sentimen-tos. Depende de três subsistemas funcionais: visão, audição e produção/motricidade orofacial. Este último é representado pela voz, fala e masti-gação/deglutição.
A perda da independência e/ou autonomia é causada pelas principais sín-dromes associadas ao envelhecimento, conhecidas como as “Grandes Síndromes Geriátricas” ou “Gigantes da Geriatria”: a incapacidade cognitiva, instabilidade postural, incontinência esfincteriana, imobilidade e a incapa-cidade comunicativa. A presença destas condições crônicas de saúde aumen-ta a complexidade do manejo clínico e o risco de iatrogenia. Além disso, estão associadas a maior demanda de cuidados de longa duração, usualmente reali-zados pela família, que, na maioria das vezes, não se encontra preparada para esta nova função, quando se apresenta a insuficiência familiar (Figura 1).
A presença de declínio funcional, capaz de restringir a autonomia e a inde-pendência do indivíduo, não pode ser atribuída ao envelhecimento normal, mas sim à presença de incapacidade funcional, resultantes das Grandes Síndromes Geriátricas, de forma isolada ou associada (poli-incapacidades). Este declínio funcional não deve ser considerado “normal da idade”, pois representa o princi-pal determinante de desfechos negativos, como o desenvolvimento de outras incapacidades e piora funcional, institucionalização, hospitalização e morte (Ramos 2001). Usualmente as causas são múltiplas e multifatoriais, frequente-mente associadas à presença de doenças crônico-degenerativas, polifarmácia, sarcopenia e alto risco de iatrogenia.
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Figura 1. Modelo Multidimensional de Saúde do Idoso.
FUNCIONALIDADEAtividades de Vida Diária (AVD básicas, instrumentais e avançadas)
AUTONOMIA (DECISÃO)É a capacidade individual de decisão
e comando sobre as ações, estabelecendoe seguindo as próprias convicções.
COGNIÇÃO HUMOR/COMPORTAMENTO
MOBILIDADE COMUNICAÇÃO
INDEPENDÊNCIA (EXECUÇÃO)Refere-se à capacidade de realizar
algo com os próprios meios.
INCAPACIDADECOGNITIVA
AlcancePreensão
Pinça
Postura Marcha
Transferência
Capacidadeaeróbica/muscular
Continênciaes�ncteriana
Visão AudiçãoProdução
Motricidadeorofacial
INSTABILIDADEPOSTURAL
INCONTINÊNCIAESFINCTERIANA
INCAPACIDADECOMUNICATIVA
IMOBILIDADE
IATROGENIA INSUFICIÊNCIA FAMILIAR
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Fragilidade: uma nova proposta conceitual e operacional
O termo fragilidade é utilizado para representar o grau de vulnerabilidade do idoso a desfechos adversos, como institucionalização, dependência ou morte. Todavia, apresenta várias definições, dificultando sua aplicação na prática clíni-ca. O desafio atual é a operacionalização do conceito de fragilidade, a fim de permitir o seu reconhecimento e estabelecer intervenções capazes de maximizar a independência e autonomia do indivíduo e impedir ou retardar o surgimento de desfechos adversos (Clegg, 2013; Cesari, 2014; Gordon, 2014).
Fried, em 2001, definiu fragilidade (frailty) como sendo uma síndrome geriátri-ca, de natureza multifatorial, caracterizada pela diminuição das reservas de energia e pela resistência reduzida aos estressores, condições essas que resultam do declínio cumulativo dos sistemas fisiológicos. A partir deste conceito, desenvolveu o “fenótipo da fragilidade”, caracterizado pela presença de três ou mais dos seguin-tes critérios: perda de peso, fatigabilidade (exaustão), fraqueza (redução da força muscular), baixo nível de atividade física e lentificação da marcha. A presença de três ou mais parâmetros definiu o “idoso frágil”, e a presença de dois parâmetros definiu o idoso “pré-frágil”. Os idosos que não apresentaram nenhuma destes parâmetros são considerados robustos. Para a definição deste fenótipo, os autores realizaram um estudo de base populacional, onde foram excluídos os idosos por-tadores de doença de Parkinson ou usuários de Levodopa, acidente vascular cerebral (AVC), Mini Exame do Estado Mental (MEEM) menor que 18 pontos, uso de anticolinesterásicos para demência de Alzheimer (Donepezil) e de antidepressi-vos. Este fenótipo da fragilidade ou “frailty” esteve presente em cerca de 7% dos idosos e foi maior com o aumento da idade, sexo feminino, baixo nível sócio-eco-nômico, presença de comorbidades, particularmente, o diabetes mellitus, doenças cardiovasculares, respiratórias e osteoarticulares. A prevalência de idosos “pré--frágeis” e “robustos” foi de 47% e 46%, respectivamente. O fenótipo da fragilidade foi um preditor independente para o risco de quedas, piora da mobilidade, depen-dência funcional, hospitalização e morte (OR: 1,86 a 4.46) (Fried, 2001; Fried, 2004).
Em 2004, FRIED fez uma distinção entre fragilidade, comorbidades e depen-dência (incapacidade). Estas três condições crônicas de saúde são caracteriza-das por uma maior vulnerabilidade e maior complexidade clínica, exigindo cuida-dos especializados. Incapacidade funcional ou dependência foi definida como a dificuldade para a realização de tarefas essenciais para uma vida independente, incluindo as atividades de auto-cuidado e as domiciliares, com necessidade da ajuda mecânica ou de outra pessoa. O nível dependência para a realização des-
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sas tarefas é variável para cada indivíduo, podendo ser parcial ou total. Além de um fenômeno social, a incapacidade funcional pode ser considerada como um complexo problema no qual todos os profissionais de saúde deveriam estar envolvidos e comprometidos em sua resolução. Estima-se que 20 a 30% dos idosos residentes na comunidade apresentem dependência para as atividades instrumentais de vida diária (preparo de refeições, fazer compras, cuidar das finanças, etc) ou para as atividades básicas de vida diária (tomar banho, vestir-se, uso do banheiro, etc). Esta prevalência aumenta progressivamente com o passar dos anos. Alto grau de dependência em AVD básicas está presente em 5% dos idosos. A incapacidade funcional é resultante de doenças ou comorbidades mais frequentes nos idosos e de alterações fisiológicas do envelhecimento, que atuam de forma independente ou, mais provavelmente, têm um efeito sinérgico. Cerca de 50% das causas de dependência funcional desenvolvem-se agudamente, de forma catastrófica, como o acidente vascular cerebral ou a fratura de fêmur. A incapacidade funcional é também um fator de risco para desfechos negativos ou eventos adversos, como a piora da mobilidade (“imobilidade gera imobilidade”), maior risco de hospitalização, maior custo e maior mortalidade. Por sua vez, a síndrome da fragilidade é um estado fisiológico de alta vulnerabilidade para des-fechos negativos, como incapacidades, dependência, quedas, institucionaliza-ção e morte. É a expressão do acúmulo de déficits múltiplos associados ao envelhecimento fisiológico ou de doenças subclínicas, capazes de comprometer os sistemas fisiológicos, reduzindo a reserva homeostática. A prevalência desta síndrome também aumenta com o envelhecimento e está presente em cerca de 30% dos octagenários. A definição de comorbidades utilizada pela autora é a presença simultânea de duas ou mais doenças no mesmo indivíduo, com base em critérios diagnósticos bem estabelecidos, dentre nove doenças pré-defini-das: hipertensão arterial (HAS), diabetes mellitus (DM), doença pulmonar obstru-tiva crônica (DPOC), doença arterial periférica, câncer, artrite, insuficiência car-díaca (ICC), doença arterial coronariana e infarto agudo do miocárdio (IAM). Nos EUA, aproximadamente 48% dos idosos são portadores de artrite, 36% de HAS, 27% de ICC, 10% de diabetes mellitus e 6% de AVC. Desta forma, cerca de 35,3% dos idosos americanos com idade entre 65 e 79 anos são portadores de duas ou mais doenças. Após os 80 anos, a prevalência de comorbidades chega a cerca de 70,2%. Estima-se que dois terços dos idosos apresentem duas ou mais comorbidades, e um terço tenha quatro ou mais comorbidades.
Fried demonstrou que a superposição entre estas três entidades foi elevada. No entanto, a diferenciação entre elas é fundamental para a definição do plano de
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cuidados, com intervenções específicas para cada uma delas, seguindo uma priorização de cuidados. Intervenções direcionadas a uma comorbidade podem afetar negativamente outra comorbidade (American Geriatrics Society, 2012). O idoso frágil apresenta menor reserva homeostática e é mais vulnerável a reações adversas a drogas, a procedimentos médicos invasivos e a internação hospitalar. Assim, fragilidade e comorbidades são preditores de incapacidade funcional. Por sua vez, o nível de dependência pode exacerbar a fragilidade e as comorbidades. E ainda, as comorbidades podem contribuir para o desenvolvimento da fragilida-de. Esta interdependência caracteriza a síndrome de fragilidade como multifatorial e com desenvolvimento em espiral. A coexistência de fragilidade, comorbidades e dependência foi observada em 21,5% dos idosos (Fried, 2004). A autora chama atenção para o fato de que 26,6% dos idosos apresentavam a fragilidade de forma isolada, sem comorbidades ou dependência, justificando a necessidade de ser entendida como uma síndrome clínica específica. No modelo que propomos, a dependência, as comorbidades e a “fragilidade física” estão incluídas na Fragilidade Clínico-Funcional. Por sua vez, a fragilidade clínico-funconal e a sócio-familiar são partes indissociáveis da fragilidade multidimensional (Figura 2).
Figura 2. Dependência, comorbidades e fragilidade (frailty) de Fried 2004, modificado por Moraes E.N.
Dependência
FRAGILIDADEMULTIDIMENSIONAL
Comorbidades
Fenótipo da FragilidadeFragilidade física
Frailty
FragilidadeClínico-Funcional
FragilidadeSócio-Familiar
(Incapacidades)
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O mecanismo fisiológico discutido e descrito por Fried, justificando o fenótipo de fragilidade, tem como principal determinante a sarcopenia e as alterações imunológi-cas e neuroendócrinas. Neste caso, a síndrome de fragilidade está também associa-da à presença de alterações nos índices dos marcadores inflamatórios como o aumento da interleucina-6 (IL-6), proteína C reativa (PCR) e fator de necrose tumoral (TNF-α), e de marcadores hormonais como a redução do hormônio do crescimento (Insulin-like-growth-factor/ IGF-1), do sulfato de dehydroepandrosterona (DHEA) e dos hormônios esteroidais (estrógeno e testosterona). A fragilidade seria resultante do processo de envelhecimento e representaria a fronteira entre o envelhecimento fisiológico (senescência) e patológico (senilidade). Todavia, esta abordagem fenotípi-ca defendida por Fried valoriza excessivamente a dimensão física (Lacas; Rockwood, 2012) e o conceito de fragilidade foi encapsulado no fenótipo da fragilidade, limitando sua utilização e aplicabilidade clínica (Martin, Brighton, 2008).
Por outro lado, o modelo de fragilidade desenvolvido por Rockwood, em 2005, no Canadian Study of Health and Aging , tem como princípio a importância da presença de déficits cumulativos, expressados através do Índice de Fragilidade (IF) e apresenta caráter multidimensional. O IF é uma medida ponderada do acúmulo individual de 30 a 70 déficits clínicos, que incluem doenças específicas (insuficiência cardíaca congestiva, hipertensão arterial, acidente vascular encefálico, infarto agudo do miocárdio, doença de Parkinson, câncer, etc), sinais e sintomas (tremor, bradicinesia, cefaleia, síncope, etc), perdas funcionais (dependência nas atividades de vida diária, problemas de memória, problemas de humor, alterações da marcha e equilíbrio, quedas, imobilidade, incontinência urinária, etc). Cada item recebe um “peso”, que varia de zero a um, representando a sua frequência ou gravidade. O índice é calculado dividindo-se o número de índices presentes pelo total de índices considerados. A presença de IF maior ou igual a 0,25 define o idoso frágil. IF entre 0,09 e 0,25 define o idoso pré-frágil, e IF menores ou iguais a 0,08 definem o idoso robusto. A prevalência de idosos frágeis foi de 22,7%. Os autores sugerem sua aplicação junto com a Avaliação Geriátrica Ampla (Song, 2010).
É crescente a ideia de que a fragilidade é multidimensional e que sua operacionalização deve considerar componentes sócio-demográficos, médicos, funcionais, afetivos, cognitivos e físicos (Lacas; Rockwood, 2012). A inclusão de incapacidades e comorbidades é também recomendada, pois tais componentes contribuem para o maior risco de desfechos adversos. Dentro desta perspectiva, Ravaglia e cols, em 2008, sugeriram nove preditores independentes fragilidade: idade maior ou igual a 80 anos, sexo masculino, baixa atividade física, comorbi-dades, déficits sensoriais, circunferência da panturrilha menor que 31 cm,
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dependência nas AVD instrumentais, desordens da marcha e equilíbrio e pessi-mismo quanto à própria saúde. A presença destes indicadores foram relaciona-dos a maior risco de internação hospitalar, fraturas e piora funcional.
Em 2012, Theou e cols mostraram uma estreita correlação entre depen-dência funcional e comorbidades com a presença de maiores níveis de fragili-dade. Menos de 10% dos idosos frágeis não apresentavam dependência fun-cional ou comorbidades, diferentemente do que foi observado no Cardiovascular Health Study (Fried, 2004). A proposta de exclusão da dependência funcional dos critérios propostos para avaliar a síndrome de fragilidade é mais semântica do que real. É difícil encontrar idosos frágeis que não tenham comorbidades e dependência funcional, da mesma forma que é raro a presença dependência e comorbidades, sem a síndrome da fragilidade. Desta forma, os autores suge-rem a aplicação do termo fragilidade para aqueles indivíduos com maior risco de desfechos negativos.
A prevalência de fragilidade em idosos residentes na comunidade é de 10,7%, variando de 4,0% a 59,1%, conforme o critério utilizado (Collard, 2012). O fenótipo de fragilidade de Fried é o critério mais utilizado e, nestes casos, a pre-valência foi menor, variando de 4 a 17%. A utilização de modelos multidimensio-nais aumenta a prevalência da fragilidade (4,2% a 59,1%). Outros achados rele-vantes são: aumento da prevalência com o passar dos anos e maior ocorrência entre as mulheres. Assim, Collard e cols (2012) propõem a utilização do modelo proposto por Linda Fried (2001) e daquele proposto por Rockwood (2005), da seguinte forma: o modelo fenotípico (Fragilidade física) seria mais útil para pes-quisas clínicas, enquanto que o modelo multidimensional seria mais adequado para a organização e planejamento de sistemas de saúde.
Entendemos que ambos os modelos são complementares, com aplicabili-dade distinta e integrantes do espectro da fragilidade (Figura 3).
É crescente a ideia de que a fragilidade é multidimensional e que sua operacionalização deve considerar componentes sócio-demográficos, clínicos,
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funcionais, afetivos, cognitivos e físicos (Lacas; Rockwood, 2012). Assim, o con-ceito de fragilidade pode ser definido como a redução da reserva homeostáti-ca e/ou da capacidade de adaptação às agressões biopsicossociais e, consequentemente, maior vulnerabilidade ao declínio funcional (Figura 4). Apresenta um componente clínico-funcional e outro sócio-familiar.
FUNCIONALIDADEAtividades de Vida Diária (AVD básicas, instrumentais e avançadas)
AUTONOMIA (DECISÃO)É a capacidade individual de decisão
e comando sobre as ações, estabelecendoe seguindo as próprias convicções.
COGNIÇÃO HUMOR/COMPORTAMENTO
MOBILIDADE COMUNICAÇÃO
INDEPENDÊNCIA (EXECUÇÃO)Refere-se à capacidade de realizar
algo com os próprios meios.s
Perdade peso
AlcancePreensão
Pinça
PosturaMarcha
Transferência
Capacidadeaeróbica/muscular
Continênciaes�ncteriana
Visão AudiçãoProdução
Motricidadeorofacial
Fatigabilidade(Exaustão)
Baixo nível deatividade física
Fenótipo da Fragilidade(Fried 2001)
Fraqueza( Força muscular)
Lenti�caçãoda marcha
Figura 3. Espectro da Fragilidade.
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Fragilidade Clínico-Funcional
O componente clínico-funcional tem o declínio funcional como a principal manifestação de vulnerabilidade e é o foco da intervenção geriátrica e geron-tológica, independente da idade do paciente. Pode ser estabelecido ou iminen-te. Declínio funcional estabelecido é a presença de incapacidade funcional ou
FRAGILIDADE MULTIDIMENSIONAL
FRAGILIDADE SÓCIO-FAMILIAR
FRAGILIDADE CLÍNICO-FUNCIONAL
COMORBIDADESMÚLTIPLAS
É a redução da reserva homeostática e/ou da capacidade de adaptação às agressõesbiopsicossociais, e, consequentemente, maior vulnerabilidade ao declínio funcional
Declínio FuncionalIminente
Declínio Funcional Estabelecido
Presença decondições crônicas preditoras
de dependência funcional,institucionalização e/ou óbito
Presença de dependência funcional
estabelecida
SARCOPENIA
IDOSO EM RISCODE FRAGILIZAÇÃO
IDOSOFRÁGIL
Figura 4. Conceito de Fragilidade.
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de dependência propriamente dita. Declínio funcional iminente é a presença de condições crônicas preditoras de dependência funcional, como idade avança-da, comorbidades múltiplas (polipatologia, polifarmácia e sarcopenia). O modelo de classificação clínico-funcional proposto é baseado em uma visão de saúde pública, fortemente ancorado na multidimensionalidade dos determi-nantes da saúde do idoso, sem desprezar a importância das doenças ou das alterações físicas, como a sarcopenia (Morley, 2013). Nele, o termo fragilidade é utilizado para representar as seguintes situações: a) Presença de condições crônicas preditoras de declínio funcional, institucionalização e/ou óbito; b) Dependência funcional estabelecida (Figura 4). Desta forma, os idosos podem ser classificados em (Figura 5):
• Idoso Robusto: é o idoso capaz de gerenciar sua vida de forma independente e autônoma e não apresenta incapacidade funcional ou condição crônica de saúde associada a maior vulnerabilidade;
• Idoso em Risco de Fragilização: é o idoso capaz de gerenciar sua vida de forma independente e autônoma, todavia encontra-se em um estado dinâmico entre senescência e senilidade, resultando na presença de li-mitações funcionais (declínio funcional iminente), mas sem dependência funcional. Apresenta uma ou mais condições crônicas de saúde preditoras de desfechos adversos, como: a) Evidências de Sarcopenia: presen-ça de alterações da massa e da função muscular (força e desempenho muscular). Os critérios de operacionalização do diagnóstico de sarco-penia são variáveis e incluem o fenótipo de fragilidade descrito por Fried (emagrecimento significativo não intencional, fatigabilidade, fraqueza, baixo nível de atividade física e lentificação da marcha) e os critérios ba-seados na medida quantitativa da massa muscular, associadas medidas de função muscular, como a força de preensão palmar e a velocidade da marcha. A lentificação da marcha é o principal determinante de sarcope-nia/dinapenia e pode ser definida quando for igual ou menor que 0,8 m/s (distância padronizada de quatro metros, com velocidade pouco acima da usual, sem distância para aceleração ou desaceleração) (Sayer, 2013). Outro bom indicador de sarcopenia é o perímetro da panturrilha menor ou igual a 31 cm. Também podem ser preditores de sarcopenia a perda significativa de peso não intencional de 4,5kg ou 5% do peso corporal no último ano, 6 kg ou mais nos últimos seis meses ou 3 kg ou mais no último mês, além do IMC < 22 kg/m2 (Cruz-Jenkoft, 2010; Fielding, 2011);
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b) Presença de comorbidades múltiplas representadas por polipatolo-gia (presença simultânea de cinco ou mais condições crônicas de saúde, acometendo sistemas fisiológicos diferentes) ou polifarmácia (uso regular e concomitante de cinco ou mais medicamentos por dia para condições crônicas diferentes) ou história de internações recentes (≤ 6 meses) e/ou pós-alta hospitalar.
• Idoso Frágil: é o idoso com declínio funcional estabelecido e incapaz de gerenciar sua vida, em virtude da presença de incapacidades únicas ou múltiplas, como incapacidade cognitiva (demência, depressão e “doen-ça mental”); instabilidade postural (história de duas ou mais quedas nos últimos seis meses e/ou dificuldades da marcha caracterizada por dese-quilíbrio e alterações no padrão da marcha, capazes de restringir a partici-pação social do indivíduo); imobilidade parcial ou completa; incontinência esfincteriana capaz de restringir a participação social do indivíduo; incapa-cidade comunicativa (distúrbios da comunicação oral/escrita, da audição e da visão, capazes de restringir a participação social do indivíduo). Por sua vez, os idosos frágeis podem ser subdivididos em:
• idoso frágil com declínio funcional estabelecido: apresenta dependência funcional nas atividades de vida diária e encontra--se estável clinicamente, sem apresentar dúvidas diagnósticas e/ou terapêuticas.
• idoso frágil de alta complexidade: apresenta dependência fun-cional nas atividades de vida diária associada a condições de saúde de difícil manejo clínico (dúvida diagnóstica, terapêutica ou reabilitacional).
• idoso frágil em fase final de vida: apresenta alto grau de de-pendência funcional e sobrevida estimada menor que seis me-ses (cuidados paliativos).
O envelhecimento está intimamente associado ao processo de fragilização, mas não há uma relação de causa e efeito direta, pois não seguem um padrão homogêneo de evolução, justificando a heterogeneidade presente em indivíduos idosos da mesma idade cronológica. Para expressar de forma mais clara os vários subtipos de idosos, sugerimos a adoção de uma estratificação clínico--funcional mais detalhada, com base na funcionalidade do indivíduo (Escala Analógica da Fragilidade Clínico-Funcional). Assim, os idosos robustos podem
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ser subdivididos em três estratos (1, 2 e 3), os idosos em risco de fragilização em dois estratos (4 e 5) e os frágeis em cinco estratos (6, 7, 8, 9 e 10), conforme pode ser visto na figura 6 e quadro 1.
O termo fragilidade inclui o idoso em risco de fragilização e o idoso frágil propriamente dito. Esta proposta de classificação clínico-funcional do idoso não nega a importância do diagnóstico correto e bem feito das doenças, dentro da complementariedade proposta pela Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF) e das morbidades, como registrado na Classificação Internacional das Doenças (CID). Ela propõe ampliar a importância da funcionalidade, no contexto do envelhecimento, sabendo-se que, sendo idosa, a pessoa provavelmente vive com alguma ou com um conjunto de patologias.
Fragilidade Sócio-Familiar
O componente sócio-familiar da fragilidade multidimensional resgata a impor-tância de outros determinantes da saúde, como sexo, raça/cor, escolaridade, estado civil, arranjos familiares, viuvez recente, idoso cuidador, participação e apoio social, acesso a serviços e situação laboral (Gobbens, 2010). A importância destes marcadores e as justificativas para a sua importância são apresentados no quadro 2. A avaliação da saúde do idoso deve, portanto, utilizar informações sobre os aspectos clínico-funcionais e sócio-familiares, resgatando o conceito de saúde como sendo “o estado de mais completo bem estar biopsicossocial, e não, simplesmente, a ausência de doenças” (Organização Mundial da Saúde, 1947).
Como vimos, o envelhecimento é o principal fator de risco para as grandes síndromes geriátricas, como a incapacidade cognitiva, a instabilidade postural, a imobilidade, a incontinência urinária, a incapacidade comunicativa e a iatrogenia. Mais comumente, estas incapacidades apresentam-se de forma associada, condição que denominamos de poli-incapacidades. A dependência ou incapaci-dade funcional é a grande consequência das síndromes geriátricas, que exige cuidados diferenciados e por longo tempo. O cuidado de longa duração é o “apoio material, instrumental e emocional, formal ou informalmente oferecido por um longo período de tempo às pessoas que o necessitam, independentemente da idade” (Camarano, 2010). Estes serviços podem ser oferecidos no domicílio, na comunidade ou em instituições de longa permanência. Habitualmente, estes cuidados são prestados pela família. Famílias despreparadas para este cuidado de longa duração podem desencadear ou perpetuar a perda de autonomia e independência do idoso.
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