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  • EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS: EXPECTATIVAS E DIFICULDADES

    Ioneide Sales Soglia 1

    Cleide Selma Pereira dos Santos 2

    RESUMO: Neste trabalho apresentamos dados coletados em entrevistas e observao realizadas

    numa sala de aula de Jovens e Adultos, analisando as necessidades educacionais destes alunos e as

    dificuldades encontradas por eles no processo de aprendizagem, bem como a motivao que os levou a

    retornarem sala de aula e as expectativas destes em relao ao curso, pontuando os avanos e

    retrocessos ocorridos nessa modalidade de ensino. A partir da observao e das entrevistas realizadas

    constatamos que, no obstante a Educao de Jovens e Adultos ter obtido avanos ao longo de sua

    histria e apesar das garantias institudas por lei, o seu cumprimento no ocorre efetivamente, pois, as

    instituies no tm oferecido um ambiente propcio para a aprendizagem e permanncia desses

    alunos, os recursos didticos utilizados na aula so escassos, no h materiais especficos para esse

    pblico e os contedos trabalhados no so contextualizados com a realidade dos alunos. Com isso, as

    dificuldades encontradas so muitas e acabam por provocar um alto ndice de evaso, e o

    desenvolvimento desses sujeitos ficam aqum das suas expectativas e da proposta da EJA.

    Palavras-chave: Dificuldades. Educao de Jovens e Adultos. Expectativas.

    Introduo

    Ao refletirmos sobre a Educao de Jovens e Adultos (EJA), podemos perceber que no

    decorrer de sua histria houve alguns progressos no que se refere legislao que rege esta

    modalidade de educao, especialmente nas ltimas duas dcadas com a promulgao da

    Constituio Federal de 1988 e a LDB 9394/96. Contudo, apesar dos amparos legais, que

    determinam as caractersticas e objetivos desta modalidade de ensino, sabemos que a mesma

    ainda no garante uma educao de qualidade para os sujeitos que buscam na EJA uma

    oportunidade de ascenso social melhores empregos e salrios , ou mesmo uma satisfao

    pessoal em elevar o nvel de conhecimento.

    1 Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia UESB, Professora do Ensino Fundamental I na Escola Municipal Dom Jairo. Jequi-BA. E-mail: [email protected]. Lattes:

    http://lattes.cnpq.br/9622588173749319

    2 Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia UESB. Assistente de alunos IFBA. Jequi-BA. E-mail: [email protected]. Lattes: http://lattes.cnpq.br/2628188379664604

  • Buscando compreender melhor a realidade do funcionamento desta modalidade de

    ensino, escolhemos uma escola para realizar um estudo de caso, porque quando queremos

    estudar algo singular, que tenha um valor em si mesmo, devemos escolher o estudo de caso

    (LDKE e ANDR, 1986, p.17). A escola escolhida para realizao da pesquisa uma

    instituio pblica localizada no municpio de Jequi, que atende alunos desta modalidade da

    5 a 8 sries do nvel fundamental no turno noturno. A turma na qual se realizou a pesquisa

    possui 44 alunos matriculados, sendo que apenas 27 continuam freqentando as aulas. Porm,

    na ocasio da entrevista apenas 8 alunos estavam presentes. No que se refere formao

    docente, de acordo com o relato da professora, esta tem formao em Magistrio e fez

    especializao para trabalhar com Educao de Jovens e Adultos.

    O trabalho teve como objetivo, coletar informaes acerca das expectativas e

    dificuldades dos alunos da modalidade de Educao de Jovens e Adultos (EJA) desta escola,

    bem como, descobrir a motivao que os levou a retornarem escola, os avanos alcanados

    por essa modalidade de ensino e as dificuldades encontradas para a efetivao do acesso e

    permanncia destes alunos na escola.

    A metodologia utilizada para a produo deste trabalho foi a pesquisa qualitativa,

    sendo que a coleta de dados foi feita por meio de observao das aulas ministradas e do

    espao fsico da escola especialmente as salas reservadas EJA , entrevistas com a

    professora, em que foram pesquisados os contedos trabalhados em classe, a metodologia

    aplicada no curso, o material didtico utilizado, a formao do professor que atua nessa

    modalidade de ensino, a assiduidade dos alunos e a questo da evaso, e com o pblico alvo

    (os alunos da EJA), foi aplicado um questionrio para analisar as expectativas e dificuldades

    encontradas pelos alunos e tambm a motivao que os levou a retornarem escola.

    Como j foi dito anteriormente a Educao de Jovens e Adultos obteve alguns avanos

    em termos legais, pois, tornou-se um direito garantido na Constituio Federal de 1988, onde

    foram estabelecidas algumas diretrizes para esta modalidade de ensino, assim enunciadas:

    [...] garantia de educao bsica, para os jovens e adultos das camadas populares; insero orgnica da educao de jovens e adultos no sistema de

    ensino do pas; a locao de dotao oramentria para o desenvolvimento

    dos servios educacionais para jovens e adultos no conjunto do sistema

    nacional de ensino; construo da identidade prpria da educao de jovens e adultos; garantia de habilitao e profissionalizao dos educadores de

    jovens e adultos; exerccio da gesto democrtica na educao de jovens e

    adultos (Fundao Educar, 1988, p.18-19).

    A Lei de Diretrizes e Bases da Educao (LDB 9394/96) tambm contribui para a

    implementao da Educao de Jovens e Adultos definindo-a como a educao destinada

  • queles que no tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e mdio na

    idade prpria e tambm ao afirm-la como uma modalidade de ensino, conforme est

    estabelecido no Art. 4, inciso VII:

    O dever do Estado com educao escolar pblica ser efetivado mediante a garantia de [...] oferta de educao escolar regular para jovens e adultos, com

    caractersticas e modalidades adequadas s suas necessidades e

    disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condies de acesso e permanncia na escola (LDB 9394/96).

    Com isso, podemos compreender que a educao de jovens e adultos estabelecida

    como uma modalidade de ensino lhe confere uma identidade prpria, em que toda a sua ao

    deve ser elaborada e posta em prtica pensando nas necessidades dos sujeitos a que essa

    educao se destina, conforme o artigo 37, inciso II, que estabelece que os sistemas de ensino

    devam assegurar gratuitamente aos jovens e adultos, que no puderam efetuar os estudos na

    idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as caractersticas do

    alunado, seus interesses, condies de vida e de trabalho. Nesse sentido, a EJA no

    considerada apenas um nvel de ensino, mas uma categoria especfica que abrange diversos

    nveis, como explica Mamed:

    [...] a existncia de uma modalidade pressupe a existncia de uma

    organizao maior qual pertena, pois modalidade significa modo particular de ser, uma subcategoria dentro de uma categoria. Entender a EJA

    como uma modalidade, ou uma subcategoria, do ensino fundamental ou

    mdio assumir que ela faz parte de um ou outro nvel e abord-la como possuidora de todas as qualidades e benefcios que caracterizam estes nveis,

    mas que no ferem suas especificidades garantidas em Lei [...] (MAMED,

    2004, p.161).

    A LDB ainda garante, no artigo 37, que o Poder Pblico viabilizar e estimular o

    acesso e a permanncia do trabalhador na escola, mediante aes integradas e

    complementares entre si. No entanto, verificamos que, nesse aspecto, o poder pblico tem

    garantido apenas o acesso desses sujeitos escola, mas no a sua permanncia, uma vez que o

    ndice de evaso tem sido muito alto (cerca de 39% na escola pesquisada), sendo que, dos

    61% que continuam freqentando no h assiduidade, ou seja, uma freqncia contnua.

    Segundo o diretor da escola, todos os anos mais da metade dos matriculados evadem,

    principalmente aps o perodo de recesso junino, e a escola no tem nenhuma estratgia que

    busque sanar esse problema. A causa desta evaso se encontra muitas vezes no fato de a

    escola no atender s expectativas do pblico de EJA, como assevera Naif (2005, p. 402):

  • [...] a escola muitas vezes encontra dificuldades para compreender as

    particularidades desse pblico, no qual os motivos que os levam evaso,

    ainda no incio da juventude, e as motivaes que envolvem sua volta sala de aula so informaes preciosas para quem lida com a questo. Deix-los

    escapar leva inadequao do servio oferecido e a um processo de excluso

    que, infelizmente, no ser o primeiro na vida de muitos desses alunos.

    De fato esses aspectos parecem no ser levados em considerao, pois, verificamos

    por meio das observaes realizadas, que a instituio no tem oferecido um ambiente

    propcio para a permanncia dos alunos nesta escola no que diz respeito infra-estrutura e

    metodologia pedaggica. O perfil dos alunos entrevistados de pessoas jovens, entre 22 e 35

    anos, sendo que todos j passaram pela escola e retornaram motivados pela famlia ou pela

    necessidade de se qualificarem para o mercado de trabalho. No entanto, as aulas so

    ministradas de forma mecnica e repetitiva, o que pode estar contribuindo para desestimular

    estes alunos e para a no permanncia destes na escola. Alm disso, o espao fsico e os

    materiais (melhor dizendo, a falta deles) tambm so fatores relevantes para justificar a

    grande evaso desses sujeitos.

    Um dos aspectos observados que chamou especial ateno foi a localizao e a

    estrutura da sala destinada turma de EJA. A sala visitada fica localizada em um poro no

    fundo da escola, com iluminao insuficiente, onde h uma coluna de sustentao no centro

    da sala, o que impossibilita a organizao do grupo em crculo para uma melhor socializao

    dos saberes, dificultando tambm a viso do quadro negro e da professora.

    Alm dessas problemticas, a localizao da sala no subsolo faz com que esta sofra

    interferncia com o barulho da sala situada no pavimento acima. Da v-se a necessidade de

    investimento no espao fsico da escola para que proporcione um ambiente agradvel e

    propicio para a permanncia desses sujeitos e tambm uma aprendizagem mais significativa,

    que atraia a ateno do aluno e os instigue para a busca do conhecimento. Corroborando com

    este pensamento, Morales (2000, p.56) afirma que um ambiente de segurana, de paz, de

    confiana necessrio para aprender e internalizar o que vai aprendendo

    Os recursos didticos utilizados na maioria das aulas so apenas quadro negro e giz,

    no se faz uso de recursos tecnolgico, apesar de a escola possuir alguns. O retroprojetor, por

    exemplo, fica na sala e no pode ser utilizado por falta de instalao eltrica adequada,

    necessitando utilizar outra sala quando se quer fazer o uso deste recurso.

    O horrio estabelecido para a aula das 19h00min s 22h00min, mas, de acordo com a

    professora, os alunos s assistem aula at s 21 horas, pois os mesmos acabam saindo antes

    do trmino da aula alegando estarem cansados. Nesse contexto, consideramos ser necessrio

  • oferecer-lhes uma aula dinmica, contextualizada e significativa, de forma que contribua para

    a motivao dos alunos no que se refere a sua permanncia e sucesso na vida escolar.

    Vale ressaltar, contudo, que nosso objetivo com este trabalho no culpabilizar os

    educadores pelo fracasso da aprendizagem e no permanncia desses alunos na escola, mas

    sim, revelar as dificuldades ainda existentes no que se refere Educao de Jovens e Adultos

    e que acabam interferindo na motivao dos alunos e consequentemente os levando a

    desistirem diante das muitas dificuldades encontradas. Com isso, compreendemos que

    colocado um grande desafio para os professores de EJA, pois precisam inovar suas aulas

    tornando-as atrativas e motivadoras para que ajude o aluno a vencer essa dificuldade e isso

    no tarefa fcil devido s dificuldades de espao e recursos pedaggicos como j foi

    exposto.

    Apesar dos desafios encontrados, imprescindvel que o educador assuma uma

    postura radical frente educao burguesa que se efetua no sistema de ensino, a qual promove

    a reproduo das desigualdades sociais, utilizando como estratgia o sucateamento da

    educao, em especial da modalidade EJA, que consequentemente repercute na motivao dos

    educandos fazendo com que estes desistam do seu direito a uma educao de qualidade. Dessa

    forma, tambm incumbncia dos educadores buscarem inculcar nos educandos a

    importncia da educao para a sua formao pessoal, social e poltica.

    Segundo Canrio (2006) desde 1960 tem se generalizado um sentimento de

    insatisfao em toda a sociedade com relao educao, pois as reformas educacionais

    ocorridas nas ltimas quatro dcadas no conseguiram traduzir-se em uma resposta pertinente

    aos problemas educacionais. A educao tem vivenciado uma crise, onde no epicentro desta

    se encontram os professores que veem abalados a sua identidade profissional, a

    desvalorizao docente e a sua responsabilidade tem crescido intensamente.

    Neste contexto, imposto educao o desafio de propor novas concepes e prticas

    pedaggicas que valorizem uma funo crtica e emancipatria. No entanto, para que isso

    acontea faz-se necessrio uma ruptura com a concepo bancria de educao, que por sua

    vez implica uma superao da forma escolar e do modo como esta concebe os processos de

    aprender e ensinar.

    Voltando a ateno especificamente para a educao oferecida aos jovens e adultos,

    percebemos que alm de no haver uma preocupao com uma educao que forme um

    sujeito crtico, verificamos ainda que a educao oferecida a esses sujeitos est referenciada

    no currculo elaborado para crianas e adolescentes, o que contraria a sua especificidade

    estabelecida nas leis que regem a Educao de Jovens e Adultos. Nesse contexto, o principal

  • objetivo da EJA que deve ser formar indivduos emancipados e atuantes na sociedade, por

    meio da promoo da dialogicidade de contedos relevantes e atuais, buscando um

    aprimoramento do senso crtico de cada sujeito no se concretiza. Esse outro fator que

    inviabiliza uma educao adequada e de qualidade para o pblico da EJA, conforme afirma

    Pierro.

    Ao focalizar a escolaridade no realizada ou interrompida no passado, o paradigma compensatrio acabou por enclausurar a escola para jovens e

    adultos nas rgidas referncias curriculares, metodolgicas, de tempo e

    espao da escola de crianas e adolescentes, interpondo obstculos flexibilizao da organizao escolar necessria ao atendimento das

    especificidades desse grupo sociocultural (PIERRO, 2005)

    Em relao aos alunos, foi pesquisada a motivao que os levou a retornarem escola

    e as suas expectativas em relao ao curso, suas dificuldades e participao nas atividades.

    Atravs dos relatos dos alunos, pode-se constatar que as transformaes ocorridas na

    sociedade tm influenciado para que as pessoas retornem escola, pois, no atual mundo

    globalizado, no h mais possibilidade de se manter inserido no mercado de trabalho sem ser

    escolarizado. Aqui percebemos que h uma contradio na ideologia do sistema capitalista,

    pois no so oferecidas condies adequadas de aprendizagem e permanncia na escola,

    porm, h uma exigncia para que no apenas os indivduos saibam ler e escrever, mas

    tambm que se eduquem ao longo da vida. Quanto a isso, Delors coloca que:

    [...], o progresso cientfico e tecnolgico e a transformao dos processos de produo resultante da busca de uma maior competitividade fazem com que

    os saberes e as competncias adquiridos, na formao inicial, tornem-se,

    rapidamente obsoletos e exijam o desenvolvimento da formao profissional

    permanente (DELORS, 2001).

    Outra razo que colabora para o regresso destes alunos escola o desejo de realizao

    pessoal. Segundo Delors (2001, p.103) ningum pode pensar adquirir, na juventude, uma

    bagagem inicial de conhecimentos que lhe baste para toda a vida, porque a evoluo rpida do

    mundo exige uma atualizao contnua dos saberes. Percebe-se assim, que estes sujeitos

    esto vencendo o estigma da vergonha e da culpa, que so fatores que muitas vezes impede

    estes sujeitos de retornarem escola.

    As expectativas desses alunos ao buscarem a EJA so de avanar nos nveis de

    conhecimento que eles j possuem e tambm se sentirem preparados para alcanar melhores

    lugares no mercado de trabalho. Entretanto, compreendemos que educao seja muito mais do

    que simplesmente adquirir o conhecimento das disciplinas constantes no currculo, como; ler,

    escrever e realizar clculos matemticos para conseguir empregos, mas , principalmente,

  • desenvolver as competncias de compreender, analisar, refletir, transformar o conhecimento e

    saber fazer o uso social desses saberes. Para isso, o conhecimento deve ser concebido como

    um movimento dialtico, como explica Ferreira (1990):

    O conhecimento o movimento da sncrese (sensorial-concreto), passando

    pela anlise (abstrao), chegando sntese (o concreto-pensado, um novo

    concreto mais elaborado). A atividade analtico-sinttica indispensvel ao avano do conhecimento. A anlise a separao dos elementos particulares

    de um todo. A sntese a reunificao dos elementos analisados.

    (FERREIRA, 1990, p. 51)

    Nesse sentido, percebemos que a educao oferecida para esses sujeitos est muito

    aqum do que esperado para eles, pois a metodologia aplicada nas aulas no levam os

    educandos reflexo das suas realidades enquanto sujeitos histricos e transformadores da

    sociedade. Embora a professora tenha especializao em Educao de Jovens e Adultos, a

    metodologia aplicada nas aulas no condiz com a necessidade desses educandos. A educadora

    afirma que trabalha as disciplinas de Lngua Portuguesa, matemtica, cincias, geografia e

    histria, sendo que esta ltima aborda apenas as datas comemorativas. Compreendemos que o

    fato de ser trabalhado apenas com datas comemorativas ou outros contedos que exigem

    apenas memorizao torna os contedos das disciplinas mecnicos e superficiais, no

    contribuindo para a formao de cidados crticos, uma vez que, para se compreender as

    questes sociais fundamental que se conhea o contexto histrico dos fatos. Para isso,

    necessrio elaborar todo um processo de problematizao do conhecimento que, ainda

    segundo Ferreira, ocorre em trs etapas assim classificadas:

    1 - Partir da prtica concreta - Perguntar, problematizar a prtica. So as

    necessidades prticas que motivam a busca do conhecimento terico. Tais

    necessidades constituem o problema, aquilo que necessrio solucionar.

    Supe, pois, identificar fatos e situaes significativas da realidade imediata.

    2o

    - Teorizar sobre a prtica - Ir alm das aparncias imediatas, desvelar,

    refletir, discutir, estudar criticamente, buscando conhecer melhor o tema problematizado.

    3o

    - Voltar prtica para transform-la - Voltar prtica com referenciais tericos mais elaborados e agir de modo mais competente. (FERREIRA,

    1990, p. 52.53)

    Outra questo que abordamos se refere s dificuldades encontradas por esses sujeitos

    na escola e que os levaram a parar com os estudos. Segundo os relatos dos alunos

    entrevistados, eles deixaram a escola por motivo de trabalho, os horrios incompatveis com a

    escola, as dificuldades de acesso ou o fato de a escola no atender s suas expectativas, e

    esto retornando por necessidade de adquirir novos conhecimentos, pela vergonha de se

  • perceberem analfabetos numa sociedade letrada, pelas novas exigncias do mercado de

    trabalho, e pela cobrana ou estmulo da famlia. Podemos constatar que apesar da educao

    desta faixa etria no ser mais de responsabilidade da famlia, esta ainda influi

    significativamente para que os jovens e adultos retornem escola.

    Quanto s disciplinas trabalhadas nesta modalidade de educao, as maiores

    dificuldades relatadas pelos alunos so referentes leitura e operaes matemticas. Em se

    tratando de leitura, Silva (1991, p. 79-80) afirma que A leitura crtica condio para a

    educao libertadora, condio para a verdadeira ao cultural que deve ser implementada

    nas escolas.

    Dessa forma, compreendemos que a leitura, tambm a escrita e a fala, so habilidades

    de extrema relevncia na formao do sujeito, pois so atividades que podem promover a

    formao do sujeito crtico e reflexivo, uma vez que atravs do desenvolvimento dessas

    habilidades que os estudantes podem posicionar-se em situaes, sejam elas cotidianas ou

    no, com autonomia e em seu benefcio. Alm disso, a leitura e interpretao so habilidades

    que proporcionam ao indivduo aquisio de saberes de outras disciplinas, inclusive, a

    matemtica, a qual requer interpretao de dados. Nesse sentido, Ferreira (1990) assevera que

    a alfabetizao, enquanto aquisio da lngua escrita, no simplesmente um ato mecnico de

    decodificao do cdigo escrito, mas ocorre numa construo do conhecimento que envolve

    questes de ordens diversas e exige uma postura crtica para que se concretize plenamente.

    Alfabetizao a aquisio da lngua escrita, por um processo de construo do conhecimento, que se d num contexto discursivo de interlocuo e

    interao, atravs do desvelamento crtico da realidade, como uma das condies necessrias ao exerccio da plena cidadania: exercer seus direitos

    e deveres frente sociedade global [...] A alfabetizao passa por questes

    de ordem lgico-intelectual, afetiva, Scio-Cultural, poltica e tcnica

    (FERREIRA, 1990, p. 60).

    Nesse sentido, outra caracterstica observada na maioria dos alunos, e que dificulta a

    formao do sujeito crtico, a timidez, o que pode servir de obstculo para que eles

    socializem suas ideias, dificultando, assim, o processo de aprendizagem. Ao serem

    questionados a respeito do curso mostraram-se acrticos e com respostas repetitivas. Logo,

    necessrio refletir quanto ao papel da educao, especificamente na modalidade de EJA, aqui

    referenciada. Ser que a educao tem atendido necessidade de se estar formando cidados

    crticos, ou tem contribudo para a reproduo do status quo de uma sociedade que produz e

    reproduz desigualdade social?

  • Outro aspecto que chamou nossa ateno foi o fato de que a escola no oferece

    material didtico como livros ou apostilas. Alm disso, outro fator que pode estar

    contribuindo para as dificuldades de aprendizagem dos alunos a restrio de atividades

    somente em sala de aula, porque, segundo o relato da professora, os alunos no fazem

    atividades extra-classe alegando falta de tempo. Tambm no se renem em grupos em outros

    espaos e no tem o hbito de ler nem de escrever. A docente afirma que os alunos tm um

    bom relacionamento com a professora e entre si, porm, h uma falta de compromisso quanto

    assiduidade e um grande ndice de evaso que ocorre com maior freqncia nos perodos de

    festas, acentuando-se aps o recesso escolar.

    Consideraes Finais

    Diante do que foi observado e relatado pelos alunos e professora, podemos perceber

    que a modalidade de Educao para Jovens e Adultos ainda continua margem das polticas

    pblicas, pois h muitas questes a serem revistas pelos rgos competentes. A localizao da

    sala visitada evidencia a excluso desses sujeitos do convvio escolar de forma mais

    integrada; os contedos trabalhados e a metodologia aplicada no contribuem para formar um

    sujeito reflexivo, crtico, participativo e autnomo; a falta de material didtico adequado

    tambm contribui para as dificuldades de aprendizagem e a escola no trabalha de forma a

    motivar esses sujeitos a permanecer na escola o ndice de evaso evidencia isso.

    Percebemos tambm que ser educador nesta modalidade de ensino se torna um

    desafio, uma vez que sem material e metodologia adequados o aluno perde o interesse pela

    aprendizagem. Assim, a educao impe responsabilidades ao professor, pois sua a

    incumbncia de buscar outras estratgias para utilizar em sala de aula para motivar seus

    alunos e tambm conscientiz-los da importncia da educao, desvelar qual e o real sentido

    do que , para qu e porqu estudar, revelando-lhes que a educao no serve apenas para

    conseguir um trabalho melhor, mas para formar cidados conscientes de seus direitos e

    capazes de exigi-los quando no efetivados.

    Nesse contexto, pode-se ver que apesar dos avanos garantidos EJA, por meio das

    leis estabelecidas, esta modalidade de ensino no tem garantido as prioridades da educao

    bsica, que so a leitura, a escrita e a interpretao textual, uma vez que estes trs aspectos da

    educao constituem o passo mais significativo para a insero do indivduo em um ambiente

    letrado. Sem a aquisio do hbito da leitura dificilmente estes alunos tero desejo de educar-

    se por mais tempo, alm de interferir na aprendizagem de outras disciplinas, como por

    exemplo, a matemtica que exige, antes de tudo, a interpretao de dados.

  • fundamental que se oferea condies para que ocorra uma educao emancipatria,

    atendendo s necessidades especificas desses sujeitos e procurando formar cidados crticos,

    participativos e conscientes de seus direitos, para que estes lutem pela efetivao das leis

    estabelecidas no somente para a educao, mas tambm pelos direitos sade, moradia,

    segurana, ao lazer e a tudo o mais que o sujeito necessita para ter uma vida ntegra e feliz.

    A partir da observao e das entrevistas realizadas pde-se constatar que, no obstante

    a Educao de Jovens e Adultos ter obtido avanos ao longo de sua histria, ainda h muitos

    aspectos a serem melhorados, pois o que foi alcanado ainda insuficiente para atender s

    necessidades desses sujeitos. Apesar dos direitos institudos por lei, o seu cumprimento no

    ocorre efetivamente, pois, para que o direito se faa prtica preciso mais que uma declarao

    legal, imprescindvel que as polticas pblicas disponibilizem verbas suficientes para a

    estruturao dos espaos fsicos destinados EJA, para a aquisio de materiais especficos

    para a prtica pedaggica e tambm oferea formao continuada para os educadores que

    atuam nessa modalidade de educao, a fim de que seja garantido no somente o acesso, mas

    tambm a permanncia desses alunos na escola e fomente nesses sujeitos a motivao para

    prosseguir com os estudos por todo o tempo necessrio para uma formao plena.

    Vale ressaltar que a postura do educador como um transgressor da ideologia burguesa,

    atravs do discurso em coerncia com a prtica em prol de uma mudana qualitativa nessa

    modalidade de ensino, assumem tambm um papel primordial na educao dos sujeitos da

    EJA, pois a sua conduta poltica e pedaggica influenciam significativamente na formao

    desses indivduos.

    Enfim, a Educao de Jovens e Adultos pode concretizar seus objetivos legais se

    houver compromisso tico profissional dos educadores em um maior engajamento poltico em

    busca da efetivao dos direitos dos educandos, buscando promover nestes o sentimento de

    indignao e mobiliz-los em um movimento de luta contra o sistema vigente, garantindo de

    fato seus direitos institudos por lei. Para isso, prticas pedaggicas voltadas para a leitura e

    interpretao de textos, debates acerca de problemticas que permeiam a sociedade se

    constituem em elementos fundamentais para a formao do indivduo crtico e reflexivo.

    Referncias:

    BRASIL, Constituio da Repblica Federativa do Brasil Normas Jurdicas em Texto Integral. Constituio de1998. Braslia-DF.

  • BRASIL, Ministrio da Educao. Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional LDB.

    Lei Darcy Ribeiro n 9.394/96. Braslia-1998.

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