identidade e tradição: ctg galpão de estância e seus legados...
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Identidade e Tradição: CTG Galpão de Estância e seus legados nas Missões1
Bibiana Melo Ramborger2
Schirley Anita Bueno Ferrari3
RESUMO: Ao longo dos anos ocorreram significativas transformações na sociedade e
principalmente no que tange a cultura em suas mais variadas formas. As organizações sociais como
os Centros de Tradições Gaúchas e demais entidades desse propósito estiveram à frente de muitas
dessas. O presente trabalho tem como objetivo analisar a atuação e as ações centrais desenvolvidas
pelo CTG Galpão de Estância do município de São Luiz Gonzaga. Para tanto, fundamentou-se
teoricamente nas concepções e definições de cultura, nativismo, tradicionalismo, folclore bem como
nas abordagens sobre os princípios e as ações desenvolvidas pela organização ao longo dos últimos
anos, principalmente no que tange a cultura Missioneira e seus ícones que fizeram e fazem parte do
legado histórico. A pesquisa foi realizada através de trabalho de campo, tendo por base o método
dialético-crítico, trazendo detalhes e analisando os aspectos de historicidade, totalidade e
contradição, respaldados na teoria marxista, com revisão referente ao tema. Constata-se que os
Centros de tradições são expressões culturais com respaldos nas manifestações como forma de
preservar as origens e raízes que no caso em questão deu-se início com um programa radiofônico
comandado por Jayme Guilherme Caetano Braun, até o surgimento de uma entidade afim de reunir
pessoas com interesse comum em vivenciar essas culturas que fazem parte de características
1 Grupo de Trabalho 02: História e Patrimônio 2 Assistente Social, Mestranda em Agronegócios pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS) - Programa de Pós Graduação em Agronegócios/ Centro de Estudos e Pesquisas em Agronegócios
(PPG Agronegócios/CEPAN). E-mail: [email protected]
3 Pesquisadora Regionalista, Licenciada em Técnicas Comerciais e Artes Práticas pela Universidade
de Passo Fundo. E-mail: [email protected]
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regionais e sua identidade. Os movimentos e as organizações tradicionalistas que antes tinham
como principal papel o preservar e cultuar as tradições regionais, nas últimas décadas passaram a
atuar também no processo de difundir a cultura e projetar o futuro formulando ações públicas
voltadas para que sejam deixados registros e marcos históricos, bem como debates sobre a história,
música, folclore, cavalgadas, fandangos, jovens, família, valores, princípios, crenças, entre outros.
Os mesmos têm atuado fortemente na inserção, social de seus associados, bem como desenvolvendo
trabalhos e projetos na comunidade local para colaboração com a sociedade. Ao longo dos anos,
intermediando as relações do Estado e sociedade, as organizações buscam traduzir e divulgar a
memória cultural do povo, principalmente missioneiro que tem em suas raízes particularidades que
caracterizam a região e que trazem arraigadas ideias, costumes, recordações, símbolos e artes
nativas, bem como a eterna vigilância cultural e nativista.
PALAVRAS-CHAVE: Tradições, Missões, Cultura gaúcha e Organizações.
INTRODUÇÃO
No ano de 1947, um grupo de jovens nascidos no campo encontrava-se desgarrados na
capital gaúcha, se de um lado Porto Alegre oferecia-lhes o estudo, de outro a saudade do pago, das
lides, dos bailes de campanha, era imensa. Naqueles anos era determinantemente proibido qualquer
manifestação regional.
Em agosto de 1947, um grupo de jovens alunos do Colégio Júlio de Castilhos,
oriundos do interior do Estado, liderados por João Carlos D’Avila Paixão Cortes, criam um
Departamento de Tradições Gaúchas em seu colégio com a finalidade de revitalizar e preservar a
cultura gaúcha. Entusiasmados, entram em contato com a Liga de Defesa Nacional, especificamente
com o Major Darcy Vignolli, responsável pela organização das festividades da “Semana da Pátria”.
Falaram da vontade de participarem dos festejos e propuseram retirar do “Fogo Simbólico” uma
centelha, para transformá-la em “Chama Crioula”, como símbolo da união indissolúvel do Rio
Grande do Sul ao Brasil.
Nessa oportunidade Paixão Cortes recebeu o convite para montar uma guarda de
gaúchos pilchados em honra ao herói farrapo David Canabarro, cujos restos mortais seriam
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transladados de Santana do Livramento para Porto Alegre. Paixão Cortes reuniu um piquete de oito
gaúchos para atender o convite e no dia 05 de setembro de 1947, prestaram a homenagem a
Canabarro. Esse piquete é conhecido como Piquete da Tradição ou Grupo dos oito. No dia o7 de
setembro, antes da extinção do “Fogo Simbólico”, Paixão Cortes, Fernando Machado Vieira, e
Cyro3 Dutra Ferreira, retiraram a centelha, que levada para o Júlio de Castilhos ardeu até a meia
noite do dia 20 de setembro data magna para os gaúchos. Assim nasceu a “Chama Crioula”.
E com este acontecimento deu prosseguimento a iniciativas em todo o estado do Rio
Grande do Sul de organizações em prol do que podemos considerar Nativismo, o qual é valorizar a
cultura local, o que até então não se podia ser realizado tendo em vista que o estrangeirismo tinha
tomado conta do povo brasileiro. Formaram-se então as organizações sociais que no decorrer das
décadas foram se tornando cada vez mais fortes e suas representatividades sendo espalhadas a nível
de Brasil e de mundo, onde o culto as tradições e costumes do povo gaúcho está a cada dia mais
preservada e cultuada.
Contudo nossa região Missioneira não é diferente pois o legado que temos oriundo
das reduções jesuíticas de alguma forma está presente em nosso cotidiano pois, as raízes deixadas
nesta terra ainda rebrotam nos corações e nas diversas expressões culturais, sendo um diferencial a
ser explorado e divulgado para que saibamos nossas origens e preservamos para passar para as
próximas gerações.
Neste contexto, no ano de 1954, no município de São Luiz Gonzaga, nasce o CTG
Galpão de Estância, o qual ainda permanece com suas cancelas abertas para receber turistas, ser um
patrimônio local e o lugar onde as mais diversas faixas etárias se reúnem em busca de aprimorarem
seus conhecimentos, trabalharem pela comunidade e cultuarem suas tradições regionalistas. E é
deste palco que vamos trazer um pouco de sua história, fazendo um paralelo teórico para reflexão
das mudanças causadas através dos anos e suas estruturações.
1. SURGIMENTO DO CTG GALPÃO DE ESTÂNCIA
Para iniciarmos as andanças em tempos passados e descobrir as raízes de um Centro
de Tradições Gaúchas, temos que ver como bem se refere os antropólogos e sociólogos as
influências que levaram a estruturação deste espaço.
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Para isso temos então que nos remeter aos programas de rádio dos anos 50 em que
levavam através de suas ondas informações, músicas, notícias e muitas vezes até mesmo cultura
como é o caso do programa que era realizado por Jaime Guilherme Caetano Braun, o qual com seus
versos conseguia filosofar de uma forma e de entendimento ao mais longínquo rincão, pois seu
modo de falar era regional, o qual era de entendimento da maioria dos ouvintes da rádio que fazia a
transmissão, que era a Rádio São Luiz.
O historiador Pedro Marques dos Santos discorre sobre a primeira reunião referente
ao início de um centro para que as tradições fossem cultuadas, foi realizada nas dependências do
prédio da Rádio São Luiz, no dia 09 de maio de 1954. Neste ato foi acordado uma comissão
constituída pelos Srs Elias Possap, Darcírio Dutra, e Vidal Bocacio, com a responsabilidade de
tomarem todas as providências necessárias à fundação da nova entidade. Na época havia um
programa na Rádio São Luiz que exaltava o telurismo campeiro com o nome de Galpão de Estância,
cuja criação e execução era dos Srs. Jaime Caetano Braun, Elias Possap, Walter Medeiros,
Dangermon Flores, Otacílio Rosa e Darcírio Dutra, desse programa originou-se o nome: Galpão de
Estância.
Uma nova reunião foi realizada nas dependências da Rádio São Luiz, onde se
fizeram presentes grande número de simpatizantes do movimento tradicionalista, que decidiram
concretizar a ideia de fundação do CTG Galpão de Estância e aclamaram como seu primeiro patrão
o Sr. Antônio Caetano Sobrinho.
Desde então até os dias de hoje o CTG mante-se vivo preservando o nativismo, o
telurismo ao regionalismo missioneiro, sendo uma organização social, o qual acima de tudo respeita
e preserva sua história Missioneira. E sobre esses aspectos vamos respaldar nosso referencial
teórico para então discutir sobre nuva visão dialética o que se tem feito pela cultura local e sua
identidade.
2. RAÍZES MISSIONEIRAS E O REGIONALISMO
Há construção da identidade missioneira definida e perpassada pelas disputas entre
os grupos sociais que se formaram, quando desejam impor sua supremacia, nas relações de poder
que se estabelecem, ajustando o ser humano a um sistema social, através de regras, de símbolos, de
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instrumentos de comunicação, do sentir e do pensar como membros pertencentes dessa sociedade
(BOTTESELLE, 2010).
Ainda corre vivo o sangue guarani nas lendas, na linguagem, na medicina de ervas,
nas cuias e sacas de erva mate que ganharam importância econômica em todo o Sul. E a criação de
gado introduzida pelos jesuítas tornou-se básica na economia do Rio Grande do Sul, assim como na
Argentina e Uruguai. Conforme:
O gaúcho missioneiro é o elemento cultural típico da região conhecida como Missioneira.
Entendemos que sua principal diferença em relação ao gaúcho da campanha possa ser
explicada pelo uso de referências ao passado reducional, apresentado para ser seu, e que
elabora uma relação muito peculiar com a terra.
O gaúcho missioneiro tende a se apresentar, através de cantos, contos, lendas e poesias,
como um elemento fortemente ligado à região e à defesa da terra, requerendo-a como
propriedade histórico-cultural. Um exemplo dessa relação dos grupos locais com a terra
encontra-se na repetição constante do que teria sido a figura e o grito de Sepé Tiaraju: “Esta
terra tem dono"! (POMMER, 2009, p. 62-63).
Esta herança realimenta hoje as pesquisas científicas, a literatura e as canções, o
teatro, o cinema e as artes plásticas. É uma das raízes da cultura regional sul-rio-grandense, uma
parte da variedade de culturas que integram a identidade brasileira.
É então que percebemos que o nativismo é o que mais se adéqua as nossas
influências na identidade pois é vista como a qualidade ou característicos do lugar. É exatamente
daqui, é aquele que tem aversão ao estrangeiro. É um aspecto do regionalismo. O nativismo está
dentro de um espaço menor do que o regionalista. Pois este vive atua, reverencia uma região que
pode ter uma abrangência além do seu território nato, enquanto que o nativista tem a mesma
atuação exclusivamente dentro da área que ele delimita como sendo nativo.
Já nossas bases trazidas pelo regionalismo pode ser compreendida como o
movimento que trata dos interesses de uma região, que registra a maneira de falar, de declamar, de
cantar, de vestir , de cumprimentar, de se alimentar. São os mais diversos aspectos de procedimento
dos habitantes de uma região. O regionalismo envolve todas as particularidades econômicas,
culturais e procedimentais de uma região.
Um lado bastante interessante do regionalismo é a busca de levar adiante aspectos de
uma cultura local e não permitir que ela seja completamente submergida na padronização proposta
pela globalização econômica e cultural. Não sentir vergonha de nossas especificidades culturais e
permitir que elas floresçam é algo importante para a manutenção da riqueza cultural que reside na
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diversidade. Porém, um problema sério aparece quando, associado ao regionalismo, vem se colando
um bairrismo que é cada vez menos inocente.
Não se trata de querer acabar com as mitologias. Todos nós as temos, elas nos
ajudam a dar sentido ao mundo. Muito menos é o caso de pretender colocar o conhecimento
histórico no lugar delas. Afinal, este também não está isento de mistificações e armadilhas. Trata-se,
apenas, de oferecer à sociedade outras representações do passado e novas linhas de raciocínio que
possam exercitar a reflexão e fundamentar posicionamento.
As tradições, que podem ser inventadas ou não, se estruturam a partir de referenciais
do passado que, por sua vez, também pode ser produzido para ser aceito como o vivido de um
determinado grupo social. Hobsbawm conceitua tradição inventada como sendo “(...) o conjunto de
práticas normalmente reguladas por regras tácita ou abertamente aceitas (...) de natureza ritual ou
simbólica, visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição, o que
implica, automaticamente, uma continuidade com um passado histórico apropriado”. Não com um
passado efetivamente legitimado, mas com base em um passado construído sob os efeitos de um
presente que lhe dá sentido, para parecer legítimo aos olhos do grupo social ao qual se quer
referenciar.
O CTG Galpão de Estância, foi a primeira entidade tradicionalista fundada na cidade
e teve entre seus fundadores um dos ícones da música missioneira , o payador Jaime Caetano Braun,
um dos troncos missioneiros, conforme disco “Troncos Missioneiros”. Jaime, Cenair, Noel e Pedro
Ortaça são considerados pioneiros na construção de uma identidade missioneira, através da música
onde são abordadas temáticas de um passado rural, da fronteira, das reduções guaraníticas e suas
ruínas, a integração latino-americana.
Temos também outros nomes que nesta jornada de existência também contribuem com seus
talentos para continuar o legado e difundir a cultura como por exemplo Luiz Carlos Borges, Érlon
Péricles, Ângelo Franco, Yuri Menezes, Ricardo Comassetto, Glauco Vieira, entre outros.
Baszko defende que é através dos seus imaginários sociais que os grupos designam
sua identidade, elaboram certa representação de si mesmos, estabelecem e distribuem os papéis
sociais, criam crenças comuns e regras de comportamento através da instalação de modelos, de
arquétipos que deverão nortear as ações do grupo para a manutenção de uma determinada ordem
social. Dessa forma, os imaginários sociais são operados através de um sistema simbólico, cuja
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função é estabelecer o controle da vida coletiva, legitimando o poder e sendo comunicável pelo
discurso.
Para Woodward o processo de globalização tem levado os grupos sociais a se
posicionar de forma ambivalente frente à questão das identidades. Ao mesmo tempo em que a
uniformidade cultural imposta pelas relações econômicas mundializadas pode distanciar a cultura
local dos seus elementos de origem, é capaz de provocar “(...) uma resistência que pode fortalecer e
reafirmar algumas identidades nacionais e locais, ou levar ao surgimento de novas posições de
identidades”.
3. ORGANIZAÇÕES SOCIAIS
O conceito de sociedade civil já passou por várias concepções e significados no
Brasil e na América Latina. De uma forma geral, ele surge no período denominado trajetória, das
transições democráticas. O final dos anos 70 destaca-se nesta trajetória porque o termo foi
definitivamente introduzido no vocabulário político corrente e passou a ser objeto de elaboração
teórica. Um dos principais eixos articuladores da sociedade civil, foi dado pela noção de autonomia:
tratava-se de organizar- se independentemente do Estado. Na realidade, a autonomia também era um discurso estratégico para evitar alianças
consideradas espúrias para que o perfil de certos grupos da sociedade civil fosse configurado
segundo alguns princípios para que não houvesse reprodução de práticas autoritárias estatais e nem
práticas consideradas como superadas, como baseadas no centralismo democrático das correntes de
esquerda mais radicais ou tradicionais.
Houve uma ampliação e uma pluralização dos grupos organizados, que redundaram
na criação de movimentos, associações, instituições e ONGs. Nos anos 70 a expressão sociedade
civil tornou-se sinônimo de algo bom e positivo e contrapunha-se ao Estado; este sendo identificado
como poder militar, ou seja, era ao contrário de militar. O paradigma vigente nos trabalhos com os
movimentos populares nos anos 70-80 estruturava-se segundo fundamentos semelhantes ao da
Educação Popular, quais sejam: a valorização da cultura popular, a centralidade atribuída ao
diálogo, a ética e a democracia no processo de construção de relações sociais mais justas; a
necessidade de ter como referências constante, ao longo de qualquer processo pedagógico ou de
mudanças sociais a realidade de vida dos educandos e a forma como eles encaram a realidade.
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Ao longo dos anos 90 campo da sociedade civil ampliou-se na prática e nos
discursos, conferiu um outro conceito de cidadania: a mesma relevância que tinha o conceito de
autonomia nos anos 80. A cidadania nos anos 90 foi incorporada nos discursos oficiais e
ressignificada na direção próxima a ideia de participação civil de exercício da civilidade de
responsabilidade social dos cidadãos como um todo ela trata não apenas dos direitos mas também
dos deveres.
No novo cenário, a sociedade civil se amplia para entrelaçar com a sociedade
política, colaborando para o caráter contraditório e fragmentado que o Estado passa a ter nos anos
90. Desenvolve-se o novo espaço público denominado público não-estatal, onde irão situar-se os
conselhos, fóruns, rede e articulações entre a sociedade civil e representantes do poder público para
a gestão de parcelas da coisa pública que dizem respeito ao atendimento das demandas sociais.
Presume-se que os movimentos sociais são tentativas coletivas e organizadas que têm a
finalidade de buscar determinadas mudanças ou até mesmo estipular a possibilidade de construção
de uma nova ordem social.
Como propôs Oliven, uma região somente pode ser pensada na sua articulação com o
todo, fortalecendo as suas especificidades nas diferenças culturais relativas às demais partes da
totalidade. Assim, entende-se que as especificidades regionais, dentre elas os caracteres identitários,
acabam se fortalecendo nas situações particularizadas que seus espaços assumem, nas suas
individualizações em relação à totalidade. Elas expressam-se através de determinadas paisagens
enquanto símbolos de uma cultura específica, pois, “(...) a cultura resulta da capacidade de os seres
humanos se comunicarem entre si por meio de símbolos.”
4. METODOLOGIA
O trabalho foi realizado através de coleta de dados em pesquisa de campo, tendo por
base o método dialético crítico, trazendo detalhes e analisando os aspectos de historicidade,
totalidade e contradição, respaldados na teoria marxista, com revisão bibliográfica, abordando
livros, artigos e teses referentes ao tema.
O método dialético é aplicado no tratamento dos problemas da produção, consumo,
distribuição e troca, em uma determinada época histórica, em um momento dado do processo
histórico total, ou seja, a época da sociedade atual.
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Para trabalhar com os fenômenos sócios-históricos, tem-se de levar em conta as
relações entre as partes, isto é, tem-se de relacionar o fenômeno em tela, que constitui a parte, com
o todo da existência social, entendendo-se a sociedade como composto de complexos e a totalidade
ordenado de relações em processo.
Um processo sócio-histórico não constitui algo acabado, pronto, imutável, mas algo
dinâmico, mutável. Além disso, um complexo não existe isoladamente, separado e independente
dos demais complexos, porém numa ação recíproca com o todo. Desse modo, a categoria da
totalidade assume uma posição central na metodologia dialética marxiana para o conhecimento da
totalidade do processo histórico.
4.1 Tipo de Pesquisa
A pesquisa teve seus princípios baseados no tipo qualitativa, utilizando as técnicas de
entrevista semiestruturada e observação assistemática para a coleta de informações e análise de
conteúdo (BARDIN, 1977) para o processo analítico.
4.2 Coleta de Informações
A apreensão constitui-se como um modo de desvendar a realidade a partir das
categorias centrais do método dialético crítico, que são a historicidade, a totalidade e a contradição.
Existem diferentes níveis de apreensão e de intervenção que explicitam as interações entre as
situações particulares e as mais amplas (BAPTISTA, 2002).
A apreensão requer fundamentos teóricos que orientam a leitura da realidade. Faz
parte da instrumentalidade, pois esta abarca tanto os procedimentos técnicos (entrevistas, visitas
domiciliares, etc.) como as estratégias articuladas e as mediações teóricas (GUERRA, 2002).
A questão teórico-metodológica diz respeito ao modo de ler, de explicar a sociedade,
e a proposta de formação, que não separa história, teoria e método, é própria da matriz crítico-
dialética (SIMIONATTO, 2004).
Pastorini (2004) reforça que a realidade precisa ser apreendida a partir de uma
perspectiva de totalidade, que está em movimento. Somente a partir de cortes históricos é possível
entender esse movimento, mas não pensando linearmente no passado e no futuro, no novo e no
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velho e sim apreendendo a história a partir de uma relação dialética composta por continuidades e
rupturas.
4.3 ANÁLISE DE CONTEÚDO
Buscando alguns autores para o embasamento científico dos dados coletados
encontramos Bardin (1979), o qual nos apresenta várias técnicas de análise de conteúdo e
Minayo(1992), faz uma proposta para análise de conteúdo em dois níveis:
- No primeiro, apresentar a conjuntura socioeconômica e política da qual faz parte o grupo de
entrevistados, sua história e inserção no contexto sócio-histórico mais geral;
- No segundo, apresentar as observações de condutas, costumes, o teor das comunicações de cada
indivíduo.
A análise é um processo de descrição dos dados coletados e a interpretação é um
processo de reflexão sobre o que foi descrito, à luz de conhecimentos mais amplos para finalizar o
relatório dos dados constando de um paralelo entre as organizações para que assim seja constatado
suas peculiaridades e seus dados qualitativos.
5. AUTORES E ATORES DA HISTÓRIA
Conseguimos através de diálogos com as mais diferentes faixas etárias que fizeram e
fazem parte desta entidade e por também ter participado de fatos históricos e mudanças
contemporâneas que passaram por esta casa.
Sabemos que muito se tem batalhado para que o acesso a cultura chegue as mais
diferentes escalas da sociedade e que para isso conta-se com projetos onde os integrantes de todos
os departamentos se mobilizem para que isso seja possível.
Através de eventos como o Natal Galponeiro, crianças e adolescentes participam das
comemorações natalinas missioneiras onde além de poderem degustar de pratos típicos também
aprendem noções de como em nosso pago é registrado esse momento e culturalmente difundido.
Com projetos levando as tradições as escolas, diversas prendas e peões puderam
adentrar no ensino de crianças e adolescentes e demonstrar um pouco das nossas raízes históricas,
com isso também trabalhando a questão de inclusão, pois foi um dos pioneiros em trabalhar com
classes especiais e conseguir construir grupos de danças gaúchas fazendo com que a integração e
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valorização desses alunos tivesse uma característica especial com reconhecimento dos demais
membros escolares.
Sem contar que nas comemorações farroupilhas, as quais depois de muitos anos se
conquistou, leva-se as diversas faixas etárias para uma aventura histórica e cultural para que os
valores preservados possam ser discutidos, aprendidos e aprofundados e tenham noção de como
realmente funciona um Centro de Tradições Gaúchas e conquistar possíveis novos simpatizantes da
causa que queiram participar de invernadas de danças, serem prendas e peões, participarem de
invernadas campeiras e de esportes.
Os integrantes dos departamentos tem o dever como cidadãos de saberem e
auxiliarem a sociedade nos seus mais variados problemas, bem como criarem mecanismos de se
fazerem presentes para que tenham participação e demonstrar que juntos são capazes para que a
realização e amenização das desigualdades sociais.
Também pode-se dizer que muitas vezes, ocorre neste município os mutirões entre as
entidades culturais para que os ícones locais possam ter o devido reconhecimento e espaço para que
as novas gerações conheçam o seu legado, como foi com um dos patronos do CTG, Jayme Caetano
Braun, o qual depois de muito debate e a comunidade se mobilizar tem tanto na entidade quanto em
um dos acessos a cidade um pouco de sua história, pois este grande mestre levou através de seus
versos a cidade na qual nasceu e cantou ao mundo inteiro.
E com todo esse percurso nas mais variadas atividades em que a integração entre
todas as idades e fazendo com que todos sejam incluídos e participem, o que para como ser humano
é um extraordinário crescimento tanto social quanto intelectual, pois todos tem direito a seus
espaços e conseguem aprimorar seus talentos e descobri-los.
6. CONSIDERAÇÕES
A identidade cultural é um conjunto vivo de relações sociais e patrimônios
simbólicos historicamente compartilhados que estabelece a comunhão de determinados valores
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entre os membros de uma sociedade. Sendo um conceito de trânsito intenso e tamanha
complexidade, podemos compreender a constituição de uma identidade em manifestações que
podem envolver um amplo número de situações que vão desde a fala até a participação em certos
eventos.
De acordo com Bordenave (1983), a participação incita a organização e esta promove
e conduz à participação, de modo que a medida que a participação é promovida, pode ocorrer uma
transformação das pessoas. Isso quer dizer que pessoas que antes eram passivas e resignadas, depois
de um processo participativo, muitas vezes podem se tornar ativas e críticas.
A partir da representatividade que determinados monumentos assumem, enquanto
documentos, para o estabelecimento do núcleo mnemônico da comunidade idealizada, é possível
descobrir os significados teóricos de que estão investidos, para podermos entender a articulação, na
memória coletiva, dos elementos históricos selecionados para serem lembrados como constituintes
de um passado próprio. Este passado será a base imaginária para o estabelecimento de uma
identidade singularmente diferenciada de seu entorno.
A globalização é uma nova e intensa configuração do globo, a resultante do novo
ciclo de expansão do capitalismo não apenas como modo de produção mas como processo
civilizatório de alcance mundial, abrangendo a totalidade do planeta de forma complexa e
contraditória. O Estado-nação, símbolo da modernidade, entra em declínio. Como consequência, os
mapas culturais já não coincidem com as fronteiras nacionais, fato acelerado pela intensificação das
redes de comunicação que atingem os sujeitos de forma direta ou indireta.
Para construir uma forma unificada de identificação a partir das tantas diferenças
existentes no interior da “nação”, homogeneizando os traços constitutivos da identidade nacional, já
que como afirma Bauman (2003, p.84) “dentro das fronteiras do Estado só havia lugar para uma
língua, uma cultura, uma memória histórica e um sentimento patriótico”, o projeto de construção do
Estado-nação necessitava, portanto, erradicar as diferenças e/ou os diferentes, fosse por meio da
“assimilação” ou por meio da “eliminação/exclusão”.
A identidade cultural é vista como uma forma de identidade coletiva característica de
um grupo social que partilha as mesmas atitudes. Está apoiada num passado com um ideal coletivo
projetado e se fixa como uma construção social estabelecida e faz os indivíduos se sentirem mais
próximos e semelhantes. É ela responsável pela identificação e diferenciação dos diversos
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indivíduos de uma sociedade, sendo está comparada em diversas escalas. A identidade cultural de
determinado povo está intimamente ligada à memória deste, mas não pode ser vista como sendo um
conjunto de valores fixos e imutáveis que definem o indivíduo e a coletividade a qual ele faz parte.
Faz parte do processo de sobrevivência das sociedades a incorporação de elementos novos e isso é o
que as mantêm ao longo do tempo.
Grandes conceitos que informavam a construção das identidades culturais, como
nação, território, povo, comunidade, entre outros, e que lhe davam substância, perderam vigor em
favor de conceitos mais flexíveis, relacionais. Segundo Teixeira Coelho, as identidades, que eram
achadas ou outorgadas, passaram a ser construídas. As identidades, que eram definitivas, tornaram-
se temporárias. A diversidade cultural que o mundo apresenta hoje, as múltiplas e flutuantes
identidades em processo contínuo de construção, a defesa do fragmentário, das parcialidades e das
diferenças, trouxeram, como corolário, uma volatilidade das identidades que se inscrevem em uma
outra lógica: da lógica da identidade para a lógica da identificação.
Acredita-se que, não se deve pregar o isolamento cultural, se fechando em guetos. O
individuo deve estar aberto e receptível ao novo. Deve-se conhecer e experimentar as outras
culturas como forma de valorizar a diversidade cultural dos povos e como enriquecimento cultural.
Supõe-se que, para conhecer e assimilar a história da construção da cultura de outros
povos, deve-se primeiro conhecer a história da própria cultura, saber como se deu essa construção e
como foi o processo de evolução e desenvolvimento da mesma. Só assim, pode-se conhecer e
entender outras culturas. Conhecendo a própria cultura, o individuo compreenderá a importância de
mantê-la viva na memória, protegê-la e valorizar a cultura como forma de preservar o que somos,
nossas características, nossa identidade. Segundo Barros (2008). “proteger não significa defender o
isolamento ou o fechamento ao diálogo com outras culturas, mas sim encontrar meios de promover
a sua própria cultura”.
Então para finalizar é pertinente citar Pedroso (1999) que afirma um com altives e
fica de reflexão: “Um povo que não tem raízes acaba se perdendo no meio da multidão. São
exatamente nossas raízes culturais, familiares, sociais, que nos distinguem dos demais e nos dão
uma identidade de povo, de nação”. Percebe-se a importância de se conhecer as raízes da própria
cultura para que haja a formação de identidade, no propósito de se definir enquanto cidadão
sabendo situar-se na sociedade.
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REFERÊNCIAS
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2002.
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