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IMPASSES E DESAFIOS DA POLÍTICA DE CARREIRA DOCENTE NA UNIVERSIDADE
DO ESTADO DO PARÁ
Emerson Duarte Monte1 Giselle dos Santos Ribeiro2
Resumo O presente texto versa sobre os históricos impasses e atuais desafios em torno da política de carreira docente na Universidade do Estado do Pará. Trata-se de uma análise documental dos planos de carreira da universidade, de documentos do sindicato dos docentes da universidade e de dados estatísticos e salariais. Constatam-se avanços no histórico de desenvolvimento da carreira docente, sempre articulados e condicionados com as mobilizações docentes. Entretanto alguns impasses históricos ainda se colocam, precisamente, a política de reajuste salarial, o acesso ao regime de dedicação exclusiva e a progressão vertical na carreira. Palavras-chave: Política de Educação Superior; Carreira do Magistério Superior; Universidades Estaduais; Universidade do Estado do Pará. Abstract This paper deals with the historical impasses and current challenges regarding the career policy of the University of Pará. It is a documentary analysis of the university's career plans, documents of the University Teachers' Union and data Statistics and salaries. There are advances in the history of the development of the teaching career, always articulated and conditioned by the teacher mobilizations. However, some historical impasses still include, precisely, the policy of salary readjustment, access to the regime of exclusive dedication and vertical progression in the career. Keywords: Higher Education Policy; Career of the Higher Magisterium; State Universities; University of the State of Pará.
I. INTRODUÇÃO
Este artigo trata da organização da carreira docente na Universidade do Estado
do Pará (UEPA), dos processos de luta travados pelos docentes no particular da carreira
desde a sua estruturação organizacional, em 1997, até 2016 quando ainda residem alguns
impasses históricos os quais se colocam como desafios a serem superados por meio da
1 Licenciado em Educação Física. Doutor em Educação. Universidade do Estado do Pará (UEPA).
E-mail: [email protected]. 2 Licenciada em Educação Física. Mestranda em Educação. Universidade Federal do Pará (UFPA).
E-mail: [email protected].
organização sindical e da luta dos docentes desta universidade, que se expressaram nas
greves de 2015 e 2016.
Os estudos acerca da carreira docente que motivaram a publicação do artigo
“Política de Carreira Docente na Universidade do Estado do Pará (UEPA) de 1997 a 2012:
estruturação, processos de luta e perspectivas”, na VII Jornada Internacional de Políticas
Públicas, instigaram a continuidade do debate tendo em vista que as perspectivas
apontadas ao final daquele artigo, de intensificação das lutas, confirmaram-se, porém,
diferentemente dos processos de lutas até o ano de 2012, as greves de 2015 e 2016 não
geraram ganhos significativos à categoria, sobretudo no que tange a atualização do plano
de carreira e rejuste salarial.
Neste sentido, tornou-se imperioso questionar: Que mudanças ocorreram para
que atualmente o governo do estado se tornasse ainda mais intransigente frente à pressão
exercida pela categoria e não atendesse suas demandas, como fizera outrora,
especialmente acerca da atualização do plano de carreira?
A partir dessa pergunta científica este artigo objetiva apresentar, em perspectiva
histórica, de que modo se deu a organização da carreira docente, o desenvolvimentos das
lutas atuais, as principais transformações na carreira docente e os atuais impasses e
desafios da política de carreira docente na UEPA.
O referencial teórico utilizado para localização e análise no plano geral das
contradições sociais, políticas e educacionais consolidou-se autores de elaboram sobre
política educacional e o corpo documental constituiu-se dos planos de carreira, notas
públicas dos processos de luta dos docentes e dados do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP).
II. A CONDUÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO SUPERIOR NO
BRASIL
A delimitação que se faz nesse artigo acerca do marco regulatório das políticas
públicas para a educação superior no Brasil é, precisamente, a Reforma do Aparelho de
Estado, iniciada em 1995 e consolidada ao longo do século XXI. É sabido que as medidas
de ajustes na superestrutura jurídico-política para implementar o receituário Neoliberal,
como política adequada à América Latina, tiveram início, de acordo com Silva Júnior e
Sguissardi (1999), no Governo Collor de Mello, em 1990, na tentativa de se iniciar a reforma
do “Aparelho do Estado”. Todavia, a necessária “reforma” só decolou em 1995, com o
primeiro Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC).
O Plano Diretor da Reforma do Estado (PDRE) constituiu a materialização, para
a realidade brasileira, do projeto Neoliberal de enfrentamento à crise da década de 1970, ou
de suas possíveis raízes. A concepção de público e de privado desenvolvida pelo PDRE
elimina a contradição subjacente a estes dois âmbitos da sociedade, a oposição entre
Estado e Mercado, quando se visualiza no primeiro o ente garantidor de direitos
fundamentais e universais. Diluindo, ainda que fantasiosamente, a polaridade entre os dois
campos é que se consolida a ideia de um espaço público em que transitam as ações do
público e do privado, com finalidades equivalentes – atender ao público. (BRASIL, 1995)
Com isso, ficou delimitado o novo campo de organização das relações jurídicas
entre o Estado e o Mercado, com grandes possibilidades de crescimento de novos tipos de
mercadorias, a exemplo da Educação Superior, e de relações simbióticas do modus
operandi da administração científica forjada pelo toyotismo na dinâmica do espaço estatal,
contudo, não necessariamente apenas gestado pelo setor público e suas relações jurídicas.
Esse movimento se expressou no crescimento do setor privado da educação
superior ante o setor público. Um primeiro movimento, vigoroso, é identificado no período
1995-2002. Nele, o crescimento das matrículas em cursos de graduação presenciais e a
distância, no setor privado, fechou em 129,8%, um salto de 1.059.163 para 2.434.650
(INEP, 2000; 2003), enquanto que no setor público esse valor ficou na ordem de 55,0%,
ampliando de 700.540 para 1.085.977, numa clara demonstração das prioridades do
governo FHC alinhado às orientações determinadas no Consenso de Washington, nos
documentos do Banco Mundial (BM) e pertencente ao corpo teórico da Reforma do Estado.
As orientações do Banco para a reforma da Educação Superior se expressam na
atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) (Lei n. 9.394/1996) e nas
legislações que a sucederam. Sguissardi (2006) faz alusão ao documento “Higher
education: the lessons of experience”, publicado em 1994, como a mais importante
publicação do Banco das duas últimas décadas.
Neste documento, a equipe do BM realiza uma caracterização dos desafios e
das limitações das políticas de reformas educacionais para os países em desenvolvimento,
em seguida, aponta a sua política nos seguintes tópicos: 1. Maior diferenciação das
instituições; 2. Diversificação do financiamento das instituições estatais e adoção de
incentivos para o seu desempenho; 3. Redefinição da função do governo; e 4. Enfoque na
qualidade, na adaptabilidade e na equidade. (BANCO MUNDIAL, 1995)
Portanto, na perspectiva das diretrizes do BM, a política para o ensino superior,
no período FHC, foi de facilitar a expansão do ensino privado, reduzir os investimentos
públicos para as IES Públicas, em específico para as IFES e, com isso, aplicar uma política
de contenção salarial dos docentes, e implementar uma política de avaliação dos resultados.
A educação superior estatal foi vítima de um amplo processo de sucateamento das suas
instalações e das condições de trabalho e completamente aberta (autônoma) para captar
recursos no setor privado.
Essa nova realidade para o trabalho docente é parte do conjunto de reformas
empreendidas no Brasil para modificar a estrutura estatal, conforme destaca Alves (2007) ao
definir o Estado neoliberal:
O Estado neoliberal é a forma de Estado político que se surge com a mundialização do capital. É o elemento político constitutivo da lógica da precarização do trabalho que hoje se impõe à reprodutibilidade capitalista. O neoliberalismo não é apenas uma forma de governo, mas uma forma de Estado político. Por isso é que, entra governo e sai governo, a dinâmica neoliberal continua se impondo. A constituição da precariedade e o processo de precarização do trabalho é reflexo da nova estatalidade política neoliberal que surge com o capitalismo global. (ALVES, 2007, p. 149).
Em fins da década de 1990, após a aprovação da LDB, a construção de um
Plano Nacional de Educação (PNE) passou a ser o centro da intervenção dos movimentos
sociais, sindicatos e partidos que defendiam outra política para a educação superior. Nessa
disputa, o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-
SN) em conjunto com diversas organizações e partidos políticos do campo da esquerda
formularam uma proposta, democraticamente construída, da Sociedade Brasileira. Nesta
estava previsto, também, um plano para a Educação Superior que foi sintetizado na
consigna do “Padrão Unitário de Qualidade”, que consistia de:
[...] carreira unificada, isonomia salarial, estabilidade no emprego, estrutura curricular, regime de contratação, concurso público de provas e títulos para ingresso na carreira, critérios transparentes para aprovação de projetos de pesquisas, política de capacitação de técnico-administrativos e docentes. (PNE, 2000, p. 19).
Contudo, o plano aprovado pelo governo, materializado por meio da Lei n.
10.172, de 9 de janeiro de 2001, deixou de fora a estruturação da Carreira Docente para a
Educação Superior (BRASIL, 2001). A resposta do movimento docente, reunido no 42º
Conselho Nacional das Associações de Docentes (CONAD), foi uníssona: denúncia aos
vetos presidenciais ao PNE aprovado e defesa do PNE da Sociedade Brasileira. (ANDES-
SN, 2001, p. 77)
A partir de 2003 com a chegada à direção política do Brasil da Frente Popular
petista, encabeçada por Lula, o que se processou foi a continuidade da política para a
educação superior, com ausência de mudanças estruturais profundas. Arcary (2014)
destaca que se trata de um governo populista com discurso sicofanta. O sustentáculo das
campanhas presidenciais de 2006, 2010 e 2014 estruturou-se em uma falsa realidade,
reproduzida pelo conjunto da base de sustentação política do PT: 1. Redução do
desemprego; 2. Recuperação do salário médio; 3. Aumento da mobilidade social; 4.
Elevação do salário mínimo; e 5. Ampliação dos benefícios do Bolsa Família. (ARCARY,
2014, p. 11)
O posicionamento aqui defendido é o de que, desde 2003, visualiza-se a
manutenção da contrarreforma da educação superior. A concepção de educação superior
defendida pelo Governo Lula era de ampliar o processo de privatização interna das
instituições público, elevar a proporção entre estudantes e professores, impulsionar o
desenvolvimento do setor privado e garantir crédito educativo. Essa constatação ficou
explícita quando da publicização dos primeiros documentos sobre a (contra)Reforma
Universitária oriundos do governo.
Acerca dessa reforma o ANDES-SN expressou posição contrária, conforme
segue:
Essa reforma favorece os empresários da educação em crise em busca de novos campos de exploração, tornando a educação um dos mais lucrativos setores de investimentos para empresários brasileiros e estrangeiros. [...] É nesse sentido que a privatização por dentro das instituições públicas e o estímulo ao empresariamento da educação estão colocados. (ANDES-SN, 2004, p. 22).
Para o sindicato, a Contrarreforma da Educação Superior do governo Lula,
estruturada nos dois primeiros anos do primeiro mandato presidencial, possuía várias
frentes que são articuladas: “o conteúdo político-pedagógico; a estrutura departamental; o
financiamento; a avaliação; a gestão; a autonomia universitária; e a carreira docente”.
(ANDES-SN, 2004, p. 22)
O período 2003-2015 manteve a dinâmica de fortalecimento da educação
superior privada em detrimento das instituições públicas. As matrículas presenciais e a
distância nas instituições privadas saltaram de 2.760.759 para 6.075.152, totalizando uma
ampliação na ordem de 120,0%. Nas instituições públicas essa ampliação ficou em 65,9%,
uma elevação de 1.176.174 para 1.952.145 (INEP, 2003; 2015). Logo, o movimento é
idêntico ao do período anterior, 1995-2002, sob a lógica dos governos de FHC.
Chaves (2015) deixa claro que se trata de uma ação política de continuidade
para a educação superior no Brasil. A expansão e o financiamento percorreram caminhos
próximos ao longo do grande período de implementação e consolidação do neoliberalismo
no Brasil – 1995-2012. Grande prioridade para o fortalecimento do setor privado, com
políticas bem delimitadas no âmbito do financiamento, tais como Programa Universidade
Para Todos (PROUNI) e o Financiamento ao Estudante de Ensino Superior (FIES), e uma
paulatina redução dos recursos para o setor público proporcionalmente ao número de
instituições, tanto do sistema federal quanto dos distintos sistemas estaduais da educação
superior.
Mancebo, Silva Júnior e Schugurensky (2016) salientam que a natureza das
políticas públicas para a educação superior no Brasil, nos primeiros anos do século XXI, são
amplamente dependentes da lógica global de mundialização do capital e de financeirização
das economias nacionais. Isso tem conduzido dois processos articulados: 1. Precarização
das relações de trabalho e das condições de trabalho para os docentes do magistério
superior; 2. Mercantilização paulatina da produção do conhecimento, com forte avanço nas
relações público-privadas sobre a inovação tecnológica.
Portanto, as políticas para a educação superior no Brasil continuam a seguir os
pressupostos internacionais para a periferia do capitalismo. O conteúdo das reformas,
materializado por meio das políticas do governo, expressam as orientações, por exemplo, do
Banco Mundial para a educação superior no mundo. E nesse caso, o espaço para a lógica
pública e gratuita é limitado, contudo o fortalecimento da estrutura mercantil é largamente
valorizado.
III. POLÍTICA DE EXPANSÃO DA UEPA: movimento docente em luta pela efetivação da
carreira
A UEPA foi criada em 1993 a partir da fusão de Escolas e Faculdades
Superiores existentes em Belém (PA)3. Apenas quatro anos depois de sua criação é que
ficou definida sua Estrutura Organizacional e o Plano Especial de Cargos e Salários (PECS),
com a Lei Estadual n. 6.065, de 01 de agosto de 1997. (UEPA, 2007; PARÁ, 1997)
Ribeiro e Monte (2015) destacam que o PECS definiu a carreira docente em
quatro classes: Auxiliar, Assistente, Adjunto e Titular. Cada uma delas foi estratificada em
3 Cf. Lei Estadual n. 5.747, de 18 de maio de 1993.
quatro níveis, com exceção à classe de Titular4. Dessa forma, a política de carreira docente
desenvolveu a progressão de duas maneiras: entre níveis (horizontal) 5 e entre classes
(vertical)6 como é possível melhor compreender por meio do Quadro 1:
Quadro 1 – Estruturação, vagas e progressão salarial da Carreira Docente na UEPA nos planos de 1997 e 2006
PECS 1997
P
rog
ressã
o e
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lasses:
au
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de
10
% n
o
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ncim
en
to b
ase
PCCS 2006
Classe Nível Qtd.
Vagas Classe Nível Qtd. Vagas
Progressão entre níveis: aumento de
5%
no venciment
o base
Progressão entre níveis: aumento
de
5%
no vencimento
base
Auxiliar I, II, III, IV
550
Auxiliar I, II, III, IV 225
Assistente I, II, III, IV Assistente I, II, III, IV 490
Adjunto I, II, III, IV Adjunto I, II, III, IV 200
Titular Titular 35
Total 550 Total 950
Fonte: Ribeiro e Monte (2015, p. 6).
O PECS além de prever a forma de progressão na carreira, entre níveis e
classes, estabeleceu um quantitativo de vagas para o quadro docente efetivo. No momento
de sua criação o total de 550 vagas era livre entre as classes, o que significa dizer que
poderiam existir 550 auxiliares ou adjuntos, 200 assistentes e 350 adjuntos, ou ainda
diversas possibilidades com o número de 550. A reestruturação do plano que aconteceu em
2006, por meio da Lei Estadual n. 6.839, de 15 de março de 2006, estabeleceu limites de
vagas entre as classes, impedindo, por exemplo, que uma determinada classe que
preenchesse seu quantitativo de vagas recebesse novos docentes titulados, aptos para a
progressão vertical.
Acerca disso, Ribeiro e Monte (2015, p. 8) afirmaram que:
Naquele momento essa condição não se colocava como um impedimento para a progressão vertical dos docentes, tendo em vista que em 2006 a Universidade contava com apenas 315 docentes titulados entre mestres e doutores, e as vagas para estes titulados no âmbito das classes em que cabiam (assistente e adjunto), somavam 690.
4 À classe de Titular não foi atribuída níveis, pois é o último nível da carreira e para ascender a tal
classe é necessário se submeter a Concurso Público de Provas e Títulos. 5 Realizada a cada 2 anos entre os níveis de uma classe, com o acréscimo de 5% no vencimento
básico. 6 Ascensão de classe por meio do critério de titulação, independente do intervalo de tempo. O
acréscimo na mudança de uma classe para a outra superior é estabelecido em 10% sobre o vencimento básico.
Entretanto, a realização de três concursos públicos (2007, 2010 e 2012),
conquistados por meio de greves, colocou um quadro problemático na perspectiva da
carreira. Na medida em que as vagas ofertadas foram prioritariamente para mestres e
doutores, o que alocou os novos docentes efetivos nas classes de assistente e adjunto, as
vagas para tais classes foram se tornando escassas para aqueles que estavam na carreira
desde a classe de auxiliar construindo, paulatinamente, sua ascensão. Tal problemática se
deu, centralmente, da classe de assistente para adjunto, pois para esta segunda classe o
quadro de vagas estava delimitado em 2007.
A ampliação no quadro geral de vagas para docentes da UEPA, por meio da
reestruturação da PECS que se tornou em 2006, Plano de Carreira, Cargos e Salários
(PCCS), não ocorreu como uma concessão do governo. Foi conquistada por meio da
organização e luta dos docentes frente às precárias condições que a universidade vivia
diante de seu processo de expansão não planejada.
O processo de expansão vivenciado na UEPA trouxe impactos significativos
para a categoria docente, com impactos na qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão
nessa instituição. Dados da expansão de 1997 a 2015 são apresentados na Tabela 1, com
os números dos cursos e matrículas, na graduação presencial, e de funções docentes em
exercício e afastados.
Tabela 1 – Expansão de cursos, das matrículas e das funções docentes em exercício e afastados na graduação presencial – UEPA – 1997, 2006 e 2015
Ano Cursos Matrículas
[A] Funções
Docentes [B] A/B
1997 17 3.852 752 5,1
2006 73 10.345 761 13,6
2015 104 12.604 1.316 9,6
∆ (%) 97-06 329,4 168,5 1,2 -
∆ (%) 06-15 42,4 21,8 72,9 -
∆ (%) 97-15 511,7 227,2 75,0 -
Fontes: INEP (1997; 2006; 2015).
Ao longo do desenvolvimento do PECS (1997-2006) o número de docentes ficou
estagnado, ao passo que os cursos e as matrículas cresceram significativamente. O
segundo período, que marca a implementação do PCCS (2006-2015), expressa um
crescimento menor nos cursos e matrículas e uma ampliação significativa no número de
7 Em fevereiro de 2017 a lista de espera para realizar a progressão vertical de assistente para adjunto
já somava 104 professores.
docentes. Contudo, isso ocorre à custa de um conjunto de problemas no âmbito da carreira
docente.
Destaca-se que dentro desse quantitativo de funções docentes, há um quanto
significativo de substitutos. Como o atual PCCS limita o quantitativo de docentes efetivos em
950, a média de substitutos, com vínculos precários de diversas formas8, fica na ordem de
328 professores. Os dados expressos na Tabela 2 apresentam esses números.
O movimento do quadro docente da UEPA indica situações de extrema
precariedade. Nos anos de 2010 e 2011 o percentual de substitutos se eleva acima de 30%
do total de docentes. Esses dados indicam a necessidade de se ampliar o quadro docente
em, pelo menos, o dobro do número de substitutos, tendo em vista que os professores que
se encontram com esse vínculo trabalhista não realizam pesquisa ou extensão, são lotados
exclusivamente para suprir as necessidades do ensino de graduação.
Tabela 2 - Total de docentes efetivos e substitutos – UEPA – 2009-2015
Ano Efetivos Substitutos Total Proporção Substitutos
2009 693 226 919 24,6%
2010 647 391 1.038 37,7%
2011 766 356 1.122 31,7%
2012 831 293 1.124 26,1%
2013 986 322 1.308 24,6%
2014 920 330 1.250 26,4%
2015 921 322 1.243 25,9%
Fontes: INEP-Microdados (2009-2015).
Em 2011, por meio da Resolução do CONSUN/UEPA n. 2.339, de 24 de agosto
de 2011, foram modificados os critérios para distribuição da carga horária docente no
processo de lotação. O principal objetivo da resolução foi o de ampliar a carga horária em
sala de aula. Dentro de organização da carga horária de ensino, antes da resolução, era
possível distribuir a hora de planejamento no interior da carga horária total de ensino, que
era de 24 horas para os docentes em jornada de trabalho de 40 horas. Após a resolução, a
carga horária de planejamento ficou fora das 24 horas totais, de modo que os docentes
passaram a ter preencher 24 horas de sala de aula, principalmente os substitutos.
Por fim, o problema objetivo da remuneração continua presente no PCCS da
UEPA. Apesar das conquistas ao longo dos anos de sua implementação, três problemas
precisam ser destacados: 1. Reajuste salarial; 2. Regime de trabalho em Dedicação
Exclusiva; 3. Progressão Funcional.
8 Destaca-se a pesquisa realizada por Tavares (2011) sobre a contratação temporária de docentes na
UEPA.
No que diz respeito a política de reajuste salarial, logo após a aprovação do
PCCS, em 2006, os docentes vivenciaram longo período de ausência de reajuste. Apenas
em 2012, em virtude de forte movimento grevista, é que foi reajustada a remuneração dos
docentes. Como produto da greve o movimento docente conseguiu garantir rejustes salariais
anuais, vinculado percentualmente ao Piso Nacional do Magistério Público.
Essa política de reajuste anual ocorreu entre os anos de 2012 a 2015,
garantindo a recuperação salarial que fora perdida entre 2006 e 2012. Contudo, em 2016
não houve reajuste, apesar de o Estado do Pará arrecadar mais do que gasta, ou seja, suas
finanças são superavitárias e, em 2017, no processo de negociação, o governo do PSDB,
por meio da Secretaria de Administração, já anunciou que não haverá qualquer aumento
para o funcionalismo estadual.
Na Tabela 3 é possível visualizar a política salarial para os docentes da UEPA,
considerando o Regime de Trabalho de 40 horas.
Tabela 3 – Remuneração Docente em Regime de 40h, conforme as classes – UEPA – 1997, 2006 e 20159
Nível/Referência 1997 2006 2015 Variação (%)
97-06 06-15 97-15
Auxilia I 2.956 4.005 4.287
35,5 7,0 45,5 Assistente I 4.404 5.967 6.637
Adjunto I 6.903 9.352 10.011
Titular 8.790 11.909 12.748
Fontes: Pará (1997; 2006).
Destaca-se na análise da Tabela 3 a valorização que ocorreu ao longo do
período 1997-2015, na ordem de 45,5% acima da inflação, ou seja, um crescimento real.
Contudo, considerando o atual PCCS fica explícita a estagnação salarial. Com a inflação do
ano de 2017 os docentes vão iniciar 2018 com o salário equivalente ao ano de 2006, um
atraso histórico de 12 anos, produto da política de arrojo salarial do PSDB no estado do
Pará.
A política de fixação docente por meio do Regime de Trabalho de Tempo
Integração e Dedicação Exclusiva (TIDE) é desastrosa na UEPA. Apesar de ser um regime
de trabalho previsto do PCCS, não se configura como uma opção do docente, trata-se de
conquista meritocrática. Para conseguir adentrar a esse regime de trabalho os docentes se
submetem a edital específico para tal, e disputam, entre si, por uma vaga disponibilizada
entre as oferecidas por meio do edital.
9 Valores corrigidos para janeiro de 2017 pela inflação medida pelo IPCA.
Os dados expressos por meio da Tabela 4 explicitam a elevação de 1,8% de
docentes em Regime de Trabalho TIDE, em 2009, para 10,7%, em 2015. Dessa forma,
configura-se como uma política insuficiente para garantir a fixação do quadro docente na
instituição, com impactos diretos para o desenvolvimento da pós-graduação stricto sensu,
grupos de pesquisa e pesquisas nas diversas áreas do conhecimento.
Tabela 4 – Total de docentes por Regime de Trabalho – UEPA – 2009-2015
Regime de Trabalho 2015 2014 2013 2012 2011 2010 2009
TIDE 133 114 145 94 38 55 17
40H 824 846 949 897 963 908 800
20H 152 68 68 68 60 41 96
Horista 134 222 146 65 61 34 6
Total 1.243 1.250 1.308 1.124 1.122 1.038 919
Proporção de TIDE 10,7% 9,1% 11,1% 8,4% 3,4% 5,3% 1,8%
Fontes: INEP-Microdados (2009-2015).
Por fim, a cena catastrófica no interior da UEPA acerca do PCCS se localiza no
processo de progressão na carreira. Desde 2014, os docentes com título de doutor não
progridem mais para a classe de adjunto, e os docentes com título de mestre deixaram de
progredir para a classe de assistente em 2016. O movimento docente, por meio do Sindicato
dos Docentes da UEPA (SINDUEPA), tem lutado pela ampliação das vagas no atual PCCS
com o objetivo de garantir a progressão vertical na carreira, enquanto não se aprova um
novo plano de carreira.
CONCLUSÃO
Diante da atual política para a carreira docente na UEPA fica o grande desafio
em se garantir a aprovação de um novo Plano de Carreira. Contudo, não é suficiente se não
existir, por parte do Estado, uma política clara de financiamento da UEPA, que inexiste até
então. Os recursos para o seu financiamento são definidos sem planejamento e a liberação
segue critérios políticos, logo a autonomia universitária preconizada pela Constituição de
1988 é negligenciada.
O movimento docente, de outro modo, tem realizado um conjunto de ações em
direção a denuncia do processo de privatização interna da instituição e da precarização das
relações de trabalho, como produto da política nacional para a educação superior, como
abordado aqui.
A garantia de um projeto de Universidade pública e gratuita, democrática e
socialmente referenciada necessita de uma política ampla de fortalecimento das suas
estruturas internas, o que implica na efetiva implementação de um Plano de Carreira, e em
uma política robusta de financiamento.
Fora desses marcos, o que se visualiza é o aprofundamento da precarização e
intensificação das condições de trabalho, o paulatino sucateamente da estrutura da
universidade pública, o abandono desse espaço pelo quadro docente e, no horizonte
imediato, a possibilidade da completa privatização e terceirização, inclusive na oferta de
docentes.
REFERÊNCIAS
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