impressos no maranhão: uma primeira leitura sobre a fundação da
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II Encontro Nacional da Rede Alfredo de CarvalhoFlorianópolis, de 15 a 17 de abril de 2004
GT História das Mídia Impressa
Coordenação: Prof. Luís Guilherme Tavares (NEHIB)
Impressos no Maranhão: uma primeira leitura sobre a fundação da imprensa local
Roseane Arcanjo PinheiroAssociação Maranhense de Imprensa
Resumo
Realiza-se uma breve leitura sobre o contexto histórico no qual foi fundada imprensa no
Brasil. Comenta-se sobre os fatores socioculturais que retardaram a chegada dos
primeiros prelos no Maranhão, contextualizando-se com a fundação do jornal O
Conciliador, que começou a ser impresso no dia 10 de novembro de 1821. Aborda-se a
história do primeiro jornal maranhense, que circulou até 1823, em São Luís. Apresentam-
se reflexões sobre o desenvolvimento da imprensa maranhense.
Palavras-chaves: história, imprensa, Maranhão, desenvolvimento
1.A imprensa na colônia portuguesa
Cerca de 300 anos separam a chegada dos portugueses à colônia da fundação das
primeiras tipografias. Em 1808, junto a bagagem da Corte havia 2 prelos e 26 volumes
de material tipográfico comprados na Inglaterra para a Secretaria dos Negócios
Estrangeiros e da Guerra Civil. Esse material gráfico foi utilizado na montagem da
Impressão Régia, a primeira tipografia instalada no Brasil, onde foi impresso o jornal A
Gazeta do Rio de Janeiro. No mesmo ano, foi editado o jornal Correio Braziliense, em
Londres, sob a direção de Hipólito da Costa.
Para compreendermos os fatores que propiciaram a chegada da imprensa,
buscamos as reflexões dos pesquisadores Nelson Werneck Sodré, Juarez Bahia e José
Marques de Melo. A partir dessas luzes, tencionamos entender o nascimento da
imprensa no Maranhão. Ressaltamos que trata-se de um primeiro olhar sobre os fatores
que propiciaram a vinda das tipografias e o relacionamento desse fato com a vida
política, cultural, social e econômica da Província.
Nas análises sobre a chegada da imprensa no Brasil, as causas políticas
geralmente foram destacadas como preponderantes para explicar o atraso em relação às
demais colônias. Na ótica de BAHIA, o freio político emperrou a vinda dos primeiros
prelos e a liberdade de expressão. O autor entendeu as iniciativas do Governo português
como uma política sistemática contra o desenvolvimento da imprensa. “A administração
pombalina impede a tipografia e o jornalismo (...) o domínio português, de 1500 até o
desembarque da comitiva de D. João VI, se exerce para asfixiar toda e qualquer
manifestação livre do pensamento” (1990: 9-10).
Para o estudioso, a transferência da Família Real e as necessidades advindas
desse momento político são os fatores determinantes para a instalação dos primeiros
prelos no Brasil. Na Metrópole, ressaltou BAHIA, os jornais podiam circular, o mesmo
não acontecendo nas terras americanas, porque o controle não seria possível, permitindo
brechas perigosas e tais falhas poderiam contrariar os interesses lusitanos. Destacou que
a ação da imprensa tornou-se, com a vinda da Corte, fundamental para o
desenvolvimento da vida brasileira.
Sob o espectro das questões econômicas, SODRÉ associou o progresso da
imprensa ao capitalismo. Em sua análise, atribuiu o atraso da imprensa, em relação aos
demais territórios, à ausência da burguesia e daquele sistema econômico na colônia. A
censura oficial e a força da ideologia dominante foram outras causas que determinaram o
progresso da imprensa: “Só nos países em que o capitalismo se desenvolveu, a imprensa
se desenvolveu...” (1990: 33).
Acreditamos que uma visão mais abrangente sobre a chegada das tipografias
pode explicar a totalidade da conjunta na qual surgem os impressos pioneiros. Uma
cadeia de fatores socioculturais, explicitada pelo professor José Marques de Melo em
sua análise sobre a implantação da imprensa no Brasil, à luz da interpretação
funcionalista, nos possibilitou ter acesso a uma perspectiva mais ampla sobre o
acontecimento. “O retardamento não se aplica por uma única causa (política ou
econômica), mas por um conjunto de circunstâncias causais, que se inter-relacionam e se
influenciam mutuamente. A essas causas chamaremos de socioculturais”. (2003:112).
A natureza feitorial da colonização, atraso das populações indígenas, predominância
do analfabetismo, ausência de urbanização, precariedade da burocracia estatal, insipiência
das atividades comerciais e industriais e o reflexo da censura e do obscurantismo
metropolitanos são os fatores socioculturais que explicam o atraso na chegada da imprensa,
segundo o professor José Marques de Melo, na primeira tese do Jornalismo Brasileiro.
O primeiro fator a contribuir para o atraso foi a ocupação do território brasileiro, onde
ocorreu uma transferência quase forçada de pequenos contingentes populacionais, sem
praticamente ônus para a Coroa Portuguesa, que não desejava instalar na colônia cidades ou
estruturar melhores condições de vida. A exploração econômica, comandada por
particulares, aconteceu à margem de um povoamento lento e com poucas incursões pelo
interior.
Em um contexto parco economicamente, a implantação da imprensa esbarrou ainda
na cultura indígena incipiente, ao contrário do que encontraram os espanhóis, as
civilizações mais adiantadas – os maias, astecas e incas. Por sinal, os conquistadores
portugueses relegaram a colônia a segundo plano e nem mesmo se interessaram em impor
sua língua, o que ocorreu de fato após três séculos de ocupação. O analfabetismo da
maioria da população da colônia firmou-se como outro entrave ao desenvolvimento da
imprensa. Numa cultura onde o verbal tomava o espaço da cultura escrita, as tipografias
não tiveram vez. Acomodando-se às condições locais, o verbal transformou-se em
indispensável instrumento de propaganda ideológica.
A falta de urbanização e a vida predominantemente rural estancaram o crescimento
econômico da colônia portuguesa, possuidora de poucas cidades. A vida resumia-se às
fazendas de engenho e seus habitantes tinham uma postura quase reclusa e conviviam com
um tímido comércio e um reduzidíssimo funcionalismo. Quanto à administração
portuguesa, a ausência da Coroa refletiu-se no marasmo e na incompetência do
funcionalismo, coordenado a distância pelo Conselho Ultramarino.
A falta de pulso firme dos governantes portugueses no comando da ocupação
desmembrou-se ainda no fraco desenvolvimento comercial e industrial, privilégio das elites
colonizadoras. “Não havendo necessidade dos usuais expedientes burocráticos-mercantis
(...), pelo primitivismo dos métodos comerciais imperantes e pela atuação precária da
máquina estatal, a imprensa não teria utilidade maior em terras brasileiras”(MELO,
2003:136).
O pesquisador frisou outra razão para o não-florescimento da imprensa no Brasil
Colônia: a censura empreendida de forma acentuada a partir do século XVI, conforme
interesses dos detentores do poder e da Igreja Católica. As idéias nocivas ao poderio
português eram barradas pelos censores. Nenhum livro ou publicação circularia no Reino
ou na colônia sem a autorização das instâncias encarregadas da censura prévia.
Por fim, do povoamento escasso à mão-de-ferro da censura, a cadeia de fatos
estudada pelo professor José Marques de Melo nos permitiu visualizar com maior
amplitude o processo histórico que resultou na instalação tardia das tipografias no Brasil.
2.A chegada da imprensa no Maranhão: panoramas sócio-econômico e político
A Capitania do Maranhão foi criada em 1534, quando o território até então era ocupado
por índios que viviam da agricultura, caça, pesca e coleta de frutas. A capitania não foi
ocupada de imediato pelos proprietários, João de Barros, Fernand’Álvares de Andrade e
Aires da Cunha. Eles enviaram nas décadas seguintes frotas e colonos para ocupá-la. O
grupo fundou o vilarejo de Nazaré, onde provavelmente está localizada hoje a capital
São Luís, mas a falta de apoio oficial, as dificuldades de acesso à ilha e a resistência dos
índios contribuíram para que abandonassem o empreendimento.
No século XVII, o Brasil já tinha cidades ricas, como Salvador, porém tratava com
descaso toda a costa Norte, o que despertou a cobiça de outros países. Em 1612, tropas
francesas fundaram no Maranhão a França Equinocial. Comandada por Daniel de La
Touche, o Senhor de La Ravardiére, acompanhado por 500 homens, a expedição ergueu
o Forte e Vila São Luís no dia 08 de setembro. Tendo os índios como aliados, os
franceses lutaram contra os portugueses, que vindo de Pernambuco, derrotaram os
invasores.
Motivada por questões econômicas e políticas, a Metrópole criou em 1621 o Estado
Colonial do Maranhão e Grão-Pará. As prováveis causas para a decisão foram a
localização estratégica do território, as facilidades da rota São Luís-Lisboa, além da
tentativa de criação de uma entrada para o Atlântico, permitindo à Coroa vislumbrar a
expansão espanhola no Peru.
Com o desenvolvimento de São Luís, nome mantido mesmo após a saída das forças
francesas, chegaram na cidade colonos açorianos, braços para o cultivo de algodão e
açúcar, produtos de exportação que sustentavam uma economia com estrutura
escravista e baseada na monocultura. Além dos açorianos, os índios foram usados como
mão-de-obra nas lavouras, posteriormente os negros – das costas de Mina e Angola –
tornaram-se escravos.
As invasões estrangeiras não cessaram no século XVII. Mais um exemplo são as
tropas holandesas, chefiadas por Mauricio de Nassau, que invadiram o Maranhão, desta
vez em 1641. Logo são expulsos pelos portugueses. Como explicou Antonio
Bernardino Pereira Lago: “... tornou o Maranhão a ser invadido pois, a 22 de novembro,
apareceram na baía do Araçagi (...) fundeadas, 22 embarcações holandesas (...) e com a
maior parte dos navios foi dar fundo defronte, donde hoje é a ermida do desterro, e
desembarcando a tropa sem lhe oporem resistência, saquearam a povoação com
vergonha e desonra do seu governador” (2001: 67).
Sem os invasores de outros países, o comando político e econômico seguiu sob as
ordens de Portugal, que criou a Companhia de Comércio do Estado do Maranhão, em
1682. Dessa forma, a economia local passou a integrar o sistema comercial mantido por
Portugal. A Companhia teria a responsabilidade de adquirir a produção açucareira do
Estado e fornecer gêneros metropolitanos e escravos. Mantido por negociantes
portugueses, o sistema, que não sofreu fiscalização da Corte, foi alvo de reclamações
por parte dos colonos por não cumprir com os compromissos firmados, gerando a
primeira rebelião na colônia contra Portugal – a revolta de Beckman. O movimento foi
vitorioso em São Luís, sem entanto se estender ao restante do território. O líder Manuel
Beckman, senhor de engenho na região do Mearim, foi preso e condenado à forca.
Na segunda metade do século XVIII, o Maranhão tornou-se fornecedor de algodão
para a Inglaterra, por conta da interrupção do fornecimento pelos Estados Unidos, palco
da Guerra de Secessão. O fato inaugurou um período de crescimento econômico
vertiginoso. Em 1755, foi fundada a Companhia Geral do Comércio do Grão Pará e
Maranhão, que durou 20 anos. A cidade de São Luís recebeu melhorias, como
canalização da rede de água e esgotos e sua população cresceu.
A presença de religiosos se acentuou – vieram carmelitas, jesuítas e franciscanos –
que integraram uma estrutura social escravocrata e excludente. De acordo com
MEIRELES, (1994:303), o censo de 1779 apontou no Estado uma população formada
por negros (40,28%) e cafuzos (23,53%), ou seja, 63,81% dos habitantes integravam as
camadas mais pobres, em sua maior parte analfabeta. Apenas 36,19% eram brancos de
um total de 78.860 mil habitantes em todo o Estado.
Antonio Bernardino Pereira do Lago, em sua obra sobre as estatísticas histórico-
geográficas da Província do Maranhão, apontou que as condições sociais eram
precárias. Apesar do crescimento econômico, o quadro é crítico. Há grande mortandade
de crianças e moléstias “que por diferentes modos abreviam a vida” (2001: 25). Sobre
os escravos, ainda conforme o autor, as atribulações são mais pesadas, “miséria, vício e
castigo, pois bem é sabido é que não há classe mais desprezada e miseravelmente
tratada e que sofre castigos mais duros e caprichosos” (2001: 25).
No período que compreende o fim do século XVIII e meados do século seguinte, a
economia exportadora do Maranhão entrou em declínio, em função do restabelecimento
da produção norte-americana. Com o fim da escravidão, em 1888, a decadência
econômica se acentuou e, como apontou TRIBUZI, o Estado só conseguiria recuperar-
se em meados do século XX, graças às condições externas, ligadas à II Guerra Mundial,
e à elevação da produção de algodão, tecidos e babaçu. (apud TONIAL, 2001: 87).
As dívidas internas e externas, de acordo com MEIRELES, assombraram o
Maranhão no novo século, exaurindo suas forças econômicas, a tal ponto que a
Associação Comercial dirigiu reclamação aos prefeitos municipais, na década de 30,
chamando a atenção para a falta de qualidade das mercadorias exportadas: “a situação
precária excepcional que o mercado de nossos produtos vem atravessando pela má
qualidade dos gêneros (...) está exigindo que cada município do Estado venha em
auxílio do levantamento econômico do Maranhão” (1992, 14).
É a partir dessa primeira leitura dos contextos social, político e econômico no
Maranhão, à época da fundação do jornal pioneiro, em 1821, que nos remetemos a
alguns indícios que podem apontar fatores que retardaram a chegada das tipografias
naquele território:
As formas de ocupação e as invasões - As primeiras tentativas de ocupação da
capitania do Maranhão ocorreram 112 após a chegada dos portugueses à colônia.
Foram resultado das invasões de franceses e holandeses, atraídos pelas riquezas do
território. A Coroa portuguesa tratou com descaso o desenvolvimento da colônia e,
por conseguinte, suas capitanias, sendo obrigada a rever sua posição quando acuada
pela forças estrangeiras.
Atraso econômico – Até meados do século XVIII, o Maranhão sobrevivia
economicamente das exportações de produtos. Apenas na metade do século XVIII,
em decorrência da Guerra de Secessão nos Estados Unidos, quando passou a
fornecer algodão para a Inglaterra, São Luís iniciou surto de desenvolvimento
econômico, com melhorias para a cidade. Em 1755, foi criada a Companhia Geral
do Comércio do Grão Pará e Maranhão dinamizando as atividades econômicas.
A forte influência dos negociantes lusitanos – Os comerciantes portugueses
comandaram o modelo econômico adotado pela colônia na província, a partir do
incremento da ocupação do território. A insatisfação da aristocracia rural frente a
essa situação foi freqüente, gerando o primeiro movimento na colônia contra
Portugal, a Revolta de Beckman. A participação desses negociantes na vida política
local era decisiva, a tal ponto que o Maranhão foi praticamente obrigado a
reconhecer a Independência do Brasil, após o envio de tropas do governo,
responsáveis pela repressão aos grupos que defendiam a manutenção do pacto
colonial, mantenedor de uma estrutura social conservadora e escravocrata.
Maior parte da população iletrada - O censo de 1779 aponta uma população
formada predominantemente por negros (40,28%) e cafuzos (23,53%), ou seja,
63,81% dos habitantes integravam as camadas mais pobres e excluídas, em sua
maior parte analfabeta. Apenas 36,19% eram brancos de um total de 78.860 mil
habitantes em todo o território..
3. O Conciliador, o jornal pioneiro
O Conciliador foi o primeiro jornal do Maranhão, transformando São Luís na
quarta capital do país a ter imprensa. Financiado pelo governador da Província, Bernardo
da Silveira Pinto da Fonseca, o jornal foi fundado em meio à luta entre brasileiros e
portugueses, divididos quanto à Independência do Brasil. Chegou às ruas em 15 de abril de
1821, no entanto, somente a data de 10 de novembro de 1821 é considerada o Dia da
Imprensa Maranhense. Trata-se do primeiro número impresso, pois as edições
anteriormente foram feitas a bico de pena (JORGE, 2000: 17).
O nascimento do jornal pioneiro, propagador do discurso oficial, é marco da
chegada da primeira tipografia, como nos conta FRIAS: “...E essa improvisada
tipocaligrafia durou até 31 de outubro de 1821, em que chegou da Europa e, por conta da
Fazenda Nacional, a primeira tipografia que possuiu o Maranhão, a qual continuou a
publicação daquele jornal”. (2001: 16).
À revelia do seu nome, o primeiro jornal maranhense semeou a discórdia entre os
grupos políticos da capital, dado o quadro em andamento no país. A Revolução do Porto,
ocorrida em Portugal em 1820, obrigou D. João VI a voltar à Metrópole em decorrência da
insatisfação dos negociantes lusos frente às medidas econômicas que beneficiavam o Brasil
e prejudicam a economia portuguesa. As contradições da política econômica e o retorno do
soberano a Lisboa provocaram a divisão da colônia em dois grupos: o partido português
(integrado por comerciantes e militares portugueses, contrários à autonomia administrativa)
e o partido brasileiro (formado principalmente pela aristocracia rural).
Os ânimos também estavam exaltados no Maranhão em função da crise regencial.
Os cabanos ou conservadores e os bem-te-vis ou liberais disputaram o poder político local.
Os enfrentamentos políticos, somados ao momento de instabilidade econômica da
Província, cujos produtos de exportação perdiam valor no mercado externo, geraram
revoltas. Em 1831, foi desencadeada a Setembrada, movimento que reuniu populares e
tropas em São Luís em torno da expulsão de portugueses e religiosos e a demissão de
brasileiros não-natos, considerados “inimigos da independência”.
Em 1838, a Balaiada, revolta desencadeada pela briga entre os grupos políticos,
sintetizou uma conjuntura de problemas econômicos, desmandos e exclusão social. A
mobilização, liderada por Manuel Francisco dos Anjos Ferreira, o Balaio, e Raimundo
Gomes, teve o apoio dos liberais e ganhou caráter popular com a adesão de homens livres e
dos negros, comandados por Negro Cosme, que entrou para a história como uma das
importantes lideranças negras do Maranhão. Sem almejar mudar a estrutura social da
Província, o movimento foi sufocado, após penetrar em algumas cidades do interior, como
Caxias.
Neste contexto sócio-econômico e político, o historiador Luís Antônio Vieira da
Silva (apud JORGE, 2000:17), comentou sobre a atuação do primeiro periódico do
Maranhão e seu discurso favorável à manutenção do sistema colonial: “... foi o facho de
discórdia que para logo dividiu portugueses e brasileiros (...) não poupando sarcasmos e
injúrias contra aqueles que presumia ligados à causa da Independência”.
Com formato de papel almaço comum, O Conciliador foi jornal oficial e noticioso
(SERRA, 2001: 23) e de linguagem agressiva e inconseqüente na defesa de seus interesses
enquanto órgão áulico (JORGE, 1998: 17).
Os primeiros jornalistas da Província foram portugueses - Antônio Marques da
Costa Soares e o padre José Antônio Ferreira Tezinho - o que reforça o poderio dos
interesses lusos na condução deste primeiro momento da imprensa em São Luís. Eles foram
autores de ataques desmedidos contra seus opositores em O Conciliador. Por isso Tezinho
foi indiciado em processo por crime de imprensa (JORGE, 2000:18).
O primeiro número do jornal, como ressaltou o pesquisador Sebastião Jorge, fez
alusão à vocação de periódico oficial: “Se empenhava junto ao público pedindo-lhe
colaboração no sentido de que lhe levasse todo e qualquer fato acontecido na cidade –
‘assim como as idéias tendentes ao bem Nacional e à justa Causa’- A causa de que fala
tem relação com as bases constitucionais de Portugal, promulgada a 9 de março de 1821”
(1987: 20).
Sobre o conteúdo de O Conciliador, o pesquisador Manoel Santos Neto, autor do
estudo inédito A imprensa e a escravidão, concorda com Sebastião Jorge acerca do
posicionamento político do primeiro jornal do Maranhão: “Este periódico era favorável à
Constituição portuguesa, defendendo o seu cumprimento à risca e recomendando fidelidade
às ordens emanadas de Portugal”. (2002: 03).
Consultamos as páginas do jornal pioneiro, nascido no entrelaçamento de interesses
portugueses e de grupos econômicos e políticos no Maranhão, encontramos notícias que
confirmam esse ponto de vista. Vejamos a edição de número 01, de 15 de abril de 1821:
Raio nos horizontes de Maranhão hum dia, que será para
sempre memorável nos Faustos da sua historia; e com elle
brilhou aquelle enthusiasmo de Fidelidade e Patriotismo, que
em todos os factos, e épocas caracterizou os Portugueses de
ambos os Mundos. A fausta noticia da Regeneração Política
acontecida em Portugal (...)
A figura de D. João VI, Rei de Portugal, é exaltada em suas páginas, assim como as
medidas que mantinham a ordem estabelecida, como prega em texto da edição número 02
de 19 de abril de 1821, cujo autor é o major da Cavalaria Rodrigo Pizarro:
“... o nosso compacivo, e Paternal Monarcha hade ver com
jubilo o Manifesto sagrado da Nossa obediência e amor a
sua Real pessoa, e da nossa adhesao aos Princípios
Constitucionais dos nossos Irmãos da Europa, e do Brazil.
Cidadãos, concórdia, e submissão as Leis existentes, em
quanto outras não forem promulgadas; seria delírio alluir o
edifício, que nos abriga sem haver levantado nova habitação.
Viva El Rey, a Religião, a Pátria, e a Constituição...”
Em uma pesquisa de fôlego sobre os primeiros jornais do Maranhão, o professor
Sebastião Jorge abordou a linguagem empregada pelos chamados pasquins, de tom
geralmente exaltado, com textos marcados por agressões verbais, insultos e ódio contra
seus adversários políticos. O Guajajara, que pertencia à família de Ana Jansen, foi um dos
mais violentos. Outros de nomes estranhos, como Cacete, Jararaca, Arre e Irra, Patusco,
Palmatória e Figa, contribuíram para a história dos jornais incendiários, que deixaram em
polvorosa seus opositores políticos.
O Conciliador, jornal pioneiro, não escapou da chaga de seu tempo. Seus excessos
era tantos, conta o pesquisador, que geraram uma representação de 65 cidadãos de São
Luís, enviada a D. João VI com reclamações contra as injúrias publicadas pelo referido
periódico. “O documento reclamava ainda contra o governador da província, marechal
Bernardo da Silveira Pinto da Fonseca (...) com acusações de que o mesmo estava
patrocinando os insultos, ao pagar com dinheiro públicos os mencionados redatores. Em
troca merecia elogios de tudo o que fazia e até do que deixava de fazer” (1998:18).
O Jornal O Conciliador deixou de circular em 16 de julho de 1823, após 210
números. Na mesma época, outros jornais se aventuraram na Província, em ebulição
política, dirigida por liberais e conservadores. Entre eles, O Censor, do português João
Antônio Garcia de Abranches, opositor do jornal O Argos da Lei, do maranhense Manoel
Odorico Mendes, um dos mais importantes jornalistas da Província, ao lado de João
Francisco Lisboa. Abranches e Odorico Mendes travaram duelos memoráveis na imprensa,
nos quais pontuavam suas opiniões sobre os acontecimentos e o destino da Nação.
Na segunda metade do século XIX, a história do jornalismo no Maranhão conheceu
grandes jornalistas. Na obra Sessenta Anos de Jornalismo – A Imprensa do Maranhão,
Joaquim Serra cita vários deles (2001:77). Vamos conhecê-los:
João Lisboa - De marcante eloqüência, João Lisboa, aos 20 anos, fundou O
Brasileiro, “folha independente e justa”. O jornalista trabalhou no Farol
Maranhense, Eco do Norte, Crônica Maranhense, Publicador Maranhense e
no Jornal de Timon. Travou duelos nas páginas de Eco do Norte contra
Sotero dos Reis (O Investigador) e o deputado Cajueiro (jornal Cacambo).
Francisco Sotero dos Reis – Escritor e educador, fundou O Maranhense.
Trabalhou em O Constitucional, O Investigador Maranhense, Revista,
Correio de Anúncios, O Observador e Publicador Maranhense. Muitos de
seus artigos influenciaram os acontecimentos na Província.
José Cândido de Moraes e Silva - Rude e com linguagem exagerada, fundou
somente um jornal, o Farol. Atacou com energia o lusitanismo e os
desmandos do governo local, chegando a ser perseguido. O Farol foi um dos
jornais que mais influenciou o povo maranhense naquele período.
Odorico Mendes – Escritor de talento colossal, Odorico Mendes esteve a
frente do jornal Argos da Lei, de 1825. Travou batalha inesquecível contra O
Censor, de Garcia de Abranches, por conta dos posicionamentos políticos
divergentes. “O jornalismo maranhense com justa razão ufana-se de ter,
entre os seus fundadores, esse venerando mestre, tão glorioso nas lutas
políticas do Império (SERRA, 2001: 90).
Gentil Braga – Com vigoroso talento, escreveu no Publicador Maranhense,
Ordem e Progresso, Coalição (sic) e no Seminário Maranhense. Poeta e
apaixonado pela forma, apresentava humorismo fino, fidalgo e cheio de
cintilações.
Marques Rodrigues - Com linguagem severa e sóbria, redigiu em O Globo e
no Publicador Maranhense. Trabalhou em Pernambuco com Nascimento
Feitosa em O Cidadão. Em Coimbra, trabalhou no célebre periódico
Trovador.
Celso Magalhães – Começou no Semanário Maranhense ainda menino,
quando teria então 16 anos. Possuidor de estilo condensado, rara lucidez e
imaginação vivaz, o jornalista trabalho em O País, onde discutiu com
solidez e estilo temas ligados às letras, indústria, comércio e artes.
A imprensa maranhense, sob o peso das dificuldades econômicas da Província e dos
debates políticos, adentrou o século XX, carente de pesquisas sobre o progresso de seu
jornalismo. Acreditamos que as feições dessa imprensa demoraram a serem alteradas, em
função da lenta caminhada da história sócio-econômica do Maranhão.
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