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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO
COORDENAÇÃO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO Coordenação de Atividades Complementares e Monografia Jurídica
INFLUÊNCIA INTERNACIONAL NO CONFLITO ARMADO DE 1998/1999 NA GUINÉ-BISSAU
Perfirio Mendes Matrícula: 0266656
Fortaleza
2008
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PERFIRIO MENDES
INFLUÊNCIA INTERNACIONAL NO CONFLITO ARMADO DE 1998/1999 NA GUINÉ-BISSAU
Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação de Newton Menezes de Albuquerque.
Fortaleza-Ceará 2008
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PERFIRIO MENDES
INFLUÊNCIA INTERNACIONAL NO CONFLITO ARMADO DE 1998/1999 NA GUINÉ-BISSAU
Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC) adequada e aprovada para suprir exigência parcial inerente à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Aprovada em 13 de junho de 2008.
BANCA EXAMINADORA
Newton Menezes de Albuquerque Professor Orientador da Universidade Federal do Ceará - UFC
Fernanda Cláudia de Araújo da Silva Professora da Universidade de Fortaleza – UNIFOR
Emerson Sipauba Pierote Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará - UFC
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“Djon guilissanar fãn djó kadjaka banhãn”
(Vamos atrás de nossos sonhos, porque amanhã seremos felizes
– Ditado do Dialeto Manjaco, do Norte da Guiné-Bissau)
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DEDICATÓRIA
Dedico em primeiro lugar este trabalho a minha família, nas pessoas dos meus
pais: João Mendes e Cristina Gomes, que sempre se esforçaram ao máximo para que os meus
objetivos pessoais pudessem ser alcançados, e esta monografia de término de curso,
certamente, representa uma conquista não só para mim, mas também para eles.
Aos meus amigos da faculdade, que estiveram presente no meu dia-a-dia, sou
muito grato a: minha namorada Emellin Layana Santos de Oliveira, que me inspirou durante
este trabalho, Cristiane Trindade Cavalcante, Emerson Sipauba Pierote, Maria José Silva dos
Santos, Manoel Ferreira dos Santos, Lai Joãozinho Mendes, Alberto Gomes, Professora Ester
Hauser e Professora Fernanda Cláudia de Araújo da Silva.
Aos meus irmãos que são os meus inspiradores, sou grato a Lucas João Mendes,
Osvaldo João Mendes e Eulino João Mendes, se não fosse eles a incentivarem nos momentos
difíceis, esta monografia não poderia ser concluída.
Não posso deixar de dedicar também esta monografia ao Professor Newton
Albuquerque, que disponibilizou tão prezado tempo para me orientar nesta trajetória
pedregosa de final de curso.
E, aos meus companheiros de estágio: Dr. Paulo Cavalcante, Yandira Mesa
D’Almeida e aos grandes amigos da caminhada jurídica.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço ao ilustre médico, especialista em cardiologia pediátrica e incansável
irmão Lucas João Mendes, ao brilhante engenheiro Osvaldo João Mendes, ao notável
contabilista, especialista em comércio exterior e mestre em agronegócios Eulino Mendes, ao
sagaz trabalhador Ivino João Mendes, ao douto advogado Arlindo João Mendes e
incomparável mãe Emiliana João Mendes, que são os meus admiradores, sendo através deles
que alcancei os meus objetivos.
A minha inestimável e querida namorada Emellin Layana Santos de Oliveira, que
sempre esteve ao meu lado nos momentos difíceis, sou grato a ela. Com ela comecei a amar o
Direito, sendo a minha companheira de luta. Que Deus a dê tamanha saúde e muitos sonhos
realizados.
Aos meus amigos Gamaliel Pina da Silva, Wilson José da Costa, Françuar Alfredo
Chefe e Luis Afonso.
A minha mãe e ao meu pai, Cristina Gomes e João Mendes, que me ensinaram a
conhecer e respeitar o próximo, reconhecendo a dignidade presente em cada um.
A minha avó e ao meu avô, Cecília Gomes e Ucereno Gomes, que deram a
continuidade a essa humilde família, sou grato a eles.
Agradeço também a Mana Domingas que confiou em mim, assinando o termo de
responsabilidade que mudaria a minha vida, dando-me oportunidade única.
Não posso deixar de citar o nome de Bibiana, que alimentou meu corpo para que
pudesse nutri-lo de conhecimento.
Agradeço, ainda, a professora Fernanda Cláudia, que disponibilizou de seu tempo
para me ajudar e participar de minha banca examinadora.
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RESUMO
O conflito na Guiné-Bissau deve-se principalmente às políticas de desenvolvimento erradas
durante os anos de governação do PAIGC. Políticas que visavam à reprodução social dos
dirigentes do partido e da classe-Estado em geral, o que permitiu a participação de países
estrangeiros na política interna. Esse objetivo conduziu o PAIGC à implementação de uma
estratégia de desenvolvimento que não teve em conta a população. Durante esse período, a
maior parte da sociedade, especialmente a residente no interior, foi marginalizada. Na Guiné
pós-colonial, a marginalização esteve ligada, em parte, à continuidade do modelo centro-
periferia herdado do colonialismo. Este modelo rejeita a cultura tradicional, vista pela elite do
país como atrasada. Nesse contexto, o Estado tratou a sociedade periférica como sendo-lhe
exterior. Por seu lado, a grande maioria da sociedade encarou o Estado como uma simples
emanação do centro - uma instituição exclusivamente com raízes na sociedade central. As
práticas do Estado pós-colonial na Guiné-Bissau traduzem os principais interesses dos
dirigentes do PAIGC e da classe-Estado em geral. Para inverter essa tendência, as Forças
Armadas, o elo privilegiado entre a sociedade central e a periférica, reagiu para restabelecer a
igualdade e a justiça social no país. A comunidade internacional também teve uma
participação importante na reconstrução do país e na busca do caminho mais viável para se
alcançar a paz.
PALAVRAS CHAVES: Conflitos; Internacionalização; Solução.
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ABSTRACT
The conflict in Guinea-Bissau is mainly because of the wrong policies which were developed
for PAIGC years of governance. Politics that intended to social reproduce the leaders of the
party and the State-class in general as well, what allows the foreign countries’ participation in
the local politic. This purpose led PAIGC to implement a strategy of autonomous
development, without the population. During this period, the most of society, especially those
in the hinterland, was marginalized. In post-colonial Guinea, this marginalization is related, in
part, to the continuity with the centre-periphery model inherited from colonialism. This model
rejects traditional culture, which has seen considered by the party's elite as a backward. In this
context, the Government has treated the peripheral society as an exterior part. On the other
side, the most of society has seen the Government as only an emanation from the centre - an
institution whose roots are only in the central society. The post-colonial Government’s
practices in Guinea-Bissau translated the main interests of PAIGC’s leaders and the State-
class in general. In order to invert this tendency, the Army, the main link between central and
peripheral society, reacted to re-establish equality and social justice in the country. The
international society also had an important participation in the country re-built and in the
search for a viable way to reach the peace.
KEY WORDS: Conflicts; Internationalization; Solution.
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO: A ORIGEM REAL DOS CONFLITOS NA ÁFRICA............................................................................................................................. 11
2. OS CONFLITOS E A SOCIEDADE INTERNACIONAL............................................................................................................16
3. OS CONFLITOS NA GUINÉ-BISSAU.............................................................................................................................. 22
3.1. A luta de libertação nacional.................................................................................. 22 3.2.O golpe de estado de 14 de novembro de
1980....................................................................................................................... 22 3.3. O início do conflito de 1998/1999........................................................................... 24 3.4. O fim do regime de Nino Vieira.............................................................................. 26
4. OS TRATADOS CELEBRADOS DURANTE O CONFLITO ARMADO NA GUINÉ-BISSAU.............................................................................................................................. 30
4.1. Os efeitos do reconhecimento da Independência..................................................... 30 4.2. A Mediação Internacional....................................................................................... 30 4.3. O Acordo de Paz de Abuja...................................................................................... 30 4.4.Tratados internacionais e o conflito civil
guineense............................................................................................................... 34 4.5. A participação de alguns países africanos nas negociações do conflito
guineense............................................................................................................... 38 4.5.1. Senegal............................................................................................................. 38 4.5.2. Gâmbia............................................................................................................. 38 4.5.3. Guiné-Conakry................................................................................................. 39
4.6. A Carta das Nações Unidas..................................................................................... 40
5. OS EFEITOS DO CONFLITO DE 1998/1999 NA ATUAL GUINÉ-BISSAU................................................................................................................................... 43
6. A POLÍTICA RECENTE NA GUINÉ-BISSAU – UMA ANÁLISE RETROSPECTIVA................................................................................................................. 48
7. CONCLUSÃO..................................................................................................................... 51
8. REFERÊNCIAS....................................................................................................................53
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1. INTRODUÇÃO: A ORIGEM REAL DOS CONFLITOS NA ÁFRICA
Os contornos fronteiriços da maior parte dos países africanos atuais datam de
pouco mais de um século, mais precisamente entre 1884 e 1885, quando foi realizada a
Conferência de Berlim. Esta teve como objetivo resolver as diferenças existentes entre as
potências européias colonizadoras (sendo as principais Grã-Bretanha, França, Portugal e
Alemanha), no que toca à ocupação de territórios africanos e ao estabelecimento de zonas de
controle e exploração econômica para cada uma delas. Um dos conflitos históricos mais
aludidos é o que envolvia o ambicioso projeto do colonizador britânico Cecil Rhodes de ligar,
por linha férrea, a cidade do Cabo (no extremo sul da África) à cidade egípcia do Cairo (no
norte da África), projeto que esbarrava no não menos ambicioso projeto português de
constituir um território que começaria em Moçambique (na costa oriental da África) e
terminaria em Angola (na costa ocidental da África), o chamado mapa cor-de-rosa.
Diferenças desse tipo, a grande diversidade (e às vezes rivalidade) étnica, bem
como as unidades políticas africanas (Estados e Impérios) então existentes, influenciaram no
processo de ocupação e colonização dos diversos territórios africanos, inclusive retardando-o.
O que a Conferência de Berlim se propôs a fazer foi uma delimitação artificial do território de
cada potência colonizadora, muitas vezes sem se ater a questões de natureza prática, como as
das fronteiras étnicas ou das unidades políticas africanas até então existentes. No caso das
fronteiras étnicas, a existência de uma entidade de dominação comum, no caso a potência
colonizadora, facilitou até certo ponto uma convivência que em condições normais se
revelaria insustentável. Essa convivência, muitas vezes baseada na união contra o colonizador
comum, foi um dos alicerces para a formação de alguns movimentos nacionalistas, que
empreenderam as lutas de libertação que conduziram à conquista da independência de vários
países africanos.
Antes de 25 de Abril de 1974, a imagem de Portugal junto da ONU estava
completamente deteriorada. Uma das preocupações do novo regime foi precisamente
recuperar a imagem e estabelecer uma relação mais aprazível com a ONU.
As reações a 25 de Abril em Portugal, por parte da ONU, foram desde logo no
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sentido de fazer pressão para que Portugal iniciasse o processo de descolonização, negociando
com os movimentos de libertação dos territórios reconhecidos pela OUA (Organização da
Unidade Africana). Este processo de pressão foi também influenciado pelo Secretário Geral
da ONU, Kurt Waldheim.
A relativa indecisão sobre o que fazer com os territórios ultramarinos, relativos ao
território da Guiné-Bissau, fez com que começassem a surgir algumas reticências por parte da
ONU que aumentou a pressão sobre Portugal. Contudo, essa posição reticente vai ser
abandonada com o início das negociações entre Portugal e o PAIGC (Partido Africano de
Independência de Guiné e Cabo Verde), que representava um sinal do início do processo de
descolonização.
Mas o marco que levou à melhoria das relações entre Portugal e a ONU foi o
discurso do Presidente da República, António de Spínola, que disse ser favorável à
autodeterminação e independência dos territórios ultramarinos da Guiné-Bissau.
Deve-se salientar que a ONU teve um papel importante na opção descolonizadora
tomada por Portugal, em virtude da pressão que fez para que tal acontecesse, bem como no
reconhecimento e apoio aos movimentos de libertação das ex-colônias portuguesas.
Portugal comprometeu-se a respeitar as resoluções da ONU e as relações foram
melhorando progressivamente, sofrendo vários impulsos com a definição final do calendário
para a independência do território guineense, com a visita do Secretário-geral da ONU a
Lisboa e, em Outubro de 74, com o discurso do então Presidente da República Costa Gomes,
na Assembléia-Geral da ONU, onde reafirmou que o processo de descolonização era
definitivo.
Entretanto, os processos das independências africanas não produziram os efeitos
que seriam esperados, tanto do ponto de vista político como econômico. As terras guineenses
não se viram sossegadas após a independência de seu território do longo e doloroso domínio
português. Guiné-Bissau, um país dividido em várias nações étnicas, teve de presenciar por
muitas vezes ainda a tristeza de seu povo, que diminui intensamente pelas constantes baixas
militares.
Pode-se citar como conseqüência da independência de alguns países africanos a
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autodeterminação que, salvo algumas exceções, não contribuiu muito para a melhoria da
situação do Continente, seja em termos políticos, seja em termos socioeconômicos. No âmbito
político, assistiu-se a uma tendência à instalação de regimes monopartidários de inspiração
marxista-leninista, o que muitas vezes significou o banimento e a repressão de qualquer forma
de contestação aos regimes instalados ou manifestação de pluralismo político.
Embora seja lamentavelmente trivial nesta sofrida África que só em 1998 já
sangrou com abundância e violência em conflitos na Libéria, Serra Leoa e Sudão; em Ruanda,
Angola, Eritréia e Etiópia; no Congo e na Casamansa, os conflitos tiveram início a 7 de junho
de 1998, na Guiné-Bissau, quando o General Ansumane Mané, ex-chefe do Estado-Maior das
Forças Armadas guineenses, amotinou-se contra o governo presidido desde 1980 por João
Bernardo "Nino" Vieira. O que parecia ser, a princípio, um assunto de caserna, um acerto de
contas entre chefes de guerra rivais, ganhou rapidamente contornos de conflito regional,
envolvendo milhares de soldados estrangeiros e uma sofrida população civil.
Rebelando-se contra sua demissão da chefia do Estado-Maior, em meio as
acusações de tráfico de armas para o movimento separatista da Casamansa, no sul do Senegal,
Mané proclamou-se chefe de uma Junta Militar que reivindicava a demissão do Presidente da
República e a realização de eleições parlamentares. Muito popular entre a tropa esfaimada e
sem soldo, especialmente entre os combalidos "Combatentes pela Liberdade da Pátria" que
outrora derrotaram o exército colonial português, Mané tomou rapidamente os principais
quartéis de Bissau. Tão logo se viu isolado em palácio, o presidente buscou auxílio nos países
vizinhos com os quais havia assinado acordos de cooperação militar — o Senegal e a Guiné-
Conakry. Em pouco tempo, desembarcavam em Bissau milhares de soldados estrangeiros. No
auge do conflito, chegou a haver cerca de 4.000 soldados senegaleses e 2.000 da Guiné-
Conakry na capital guineense, além de uma quantidade indeterminada no interior do país.
Inicialmente, os combates ficaram restritos à capital. Centenas de pessoas
morreram cravadas de balas e feridas pela artilharia que destruiu grande parte da cidade já tão
miserável. Bissau tornou-se uma cidade fantasma, uma arena aberta à razia, ao rapto e ao
roubo. Milhares de pessoas abandonaram as suas casas e pertences e fugiram desabaladas,
sem destino nem esperança. As vilas tradicionais no interior do país e as pequenas cidades
crioulas acolheram toda uma multidão de refugiados que, num átimo, chegava faminta, doente
e desolada. As mortes por todo o país alcançaram a casa dos milhares, e por motivos muito
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corriqueiros: fome, cólera, desinteria, malária...
Somente a 3 de novembro, portanto quase quatro meses depois do início das
hostilidades, as partes beligerantes chegaram a um acordo frágil, que talvez conduza à
desocupação da Guiné-Bissau pelos militares estrangeiros. E só o fizeram porque mexeram
com os interesses conflitantes de potências mundiais e coloniais como os Estados Unidos e a
França, além de Portugal, e envolveram recursos e esforços de mais de uma dezena de países
membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e da Comunidade
Econômica para o Desenvolvimento da África Ocidental (CEDEAO).
O conflito na Guiné-Bissau é um interessante caso para a análise das complexas
conexões e conflitos entre as lógicas e interesses de grupos locais, nacionais e continentais.
Em setembro, depois de um cessar-fogo provisório muitas vezes desrespeitado,
funcionários do INEP obtiveram permissão dos invasores para visitar o Instituto. A avaliação
feita depois desta primeira visita assim foi resumida por um de seus diretores, num SOS
enviado ao mundo através da Internet: DESASTRE. O sociólogo Carlos Lopes, idealizador e
primeiro diretor do INEP, resumiu a situação em um lamento: "o centro do saber e memória
coletiva da Guiné-Bissau foi transformado em caserna provisória de militares estrangeiros".
As salas de seminários e os escritórios de trabalho dos investigadores foram
arrombados e transformados em dormitórios para os senegaleses. Dezenas de computadores
abrigando as bases de dados penosamente construídas sobre todos os aspectos da vida do país
foram vandalizados. Centenas de fitas cassetes que continham milhares de horas de gravação
com a memória viva da história da luta de libertação nacional e com o registro das ricas e
variadas tradições orais do país foram pisoteadas, destroçadas ou simplesmente usadas para
um registro menos nobre. O Arquivo Nacional foi completamente dilapidado. As caixas que
guardavam os documentos e contavam a história do país foram para o lixo, levando para o
mesmo destino os anos de trabalho dedicado dos arquivistas do Instituto.
A biblioteca do INEP, embrião da Biblioteca Nacional, a maior do país e a melhor
para o estudo da costa ocidental africana, foi destruída por uma única bomba, que a destelhou
completamente. As chuvas torrenciais de julho e agosto completaram o serviço.
Repetindo tragicamente o enredo narrado pelos rumores que analisei em outra
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ocasião, a ação dos militares estrangeiros mais uma vez atuou para apagar e fragmentar a
memória coletiva e separá-la do corpo social, para assim melhor dominar.
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2. OS CONFLITOS E A SOCIEDADE INTERNACIONAL
A Sociedade Internacional é um ente que se forma através de uma política
organizada voltada para o desenvolvimento dos Estados membros, a fim de resgatar os
valores da comunidade.
A política da Sociedade Internacional consiste na formulação de regras que devem
ser seguidas pelos seus participantes.
Contudo, nem sempre estas normas são cumpridas, o que acarreta os conflitos. A
sociedade tem um papel importante para resolver o impasse que ocasiona os conflitos quando
as partes beligerantes estiverem procurando a solução pacifica.
A sociedade internacional também tem influência nos conflitos internos, nas
chamadas guerras civis. Essa influência pode ser positiva ou negativa. Positiva é quando
pautar para o diálogo, buscando uma solução para a demanda; negativa é quando fomenta a
guerra em busca de privilégios políticos e econômicos.
A Sociedade Internacional, a fim de evitar o surgimento de conflitos, cria
organizações que intervêm na política externa e interna dos Estados. A Organização das
Nações Unidas (ONU) foi criada para promover a paz e resolver os conflitos entre nações.
Antes da ONU, quem era responsável por intermediar nos conflitos internos e
externos era a Liga das Nações. Com o fracasso do desempenho dessa Liga, por não poder
evitar a Segunda Guerra Mundial, foi criada a ONU, que tem hoje um papel importante como
intermediário nas crises entre os Estados.
Atualmente, a ONU tem mais postos concentrados nos países africanos e no
Oriente Médio, onde está a maior quantidade de conflitos armados do mundo.
Na África, por exemplo, os conflitos ocorrem devido a brigas étnicas, políticas,
econômicos e territoriais. Apesar de essas guerras ocorrerem no âmbito interno dos Estados,
há participação dos países estrangeiros que, muitas vezes, não vêm para ajudar na busca da
paz, mas para garantir benefícios econômicos.
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Na Guiné-Bissau, durante a guerra civil de 1998/1999, houve influência de
Portugal e França, que disputavam o domínio político e econômico desse país.
Não se pode deixar de ressaltar que, durante os conflitos da Guiné-Bissau, os
organismos internacionais ligados a ONU tiveram importante papel na manutenção da
sobrevivência da população civil, na questão de doar gêneros alimentícios, no controle da
economia e no tratamento dos feridos.
A Guiné-Bissau, nos anos de 1990, tinha um único partido político. Com a queda
do comunismo soviético, as Nações Unidas pressionaram o país para aderir à democracia,
pois desta forma poderia receber as ajudas das comunidades internacionais.
Nos conflitos em países africanos, verifica-se a falta da democracia e da opinião
pública, que não recebem respeito dos líderes, pois quando estes ganham as eleições,
transformam o Estado em sucessões familiares, sendo esse o fator de origem de várias guerras
civis. A intervenção das comunidades internacionais na viabilização da paz nos conflitos
armados que assolam vários países africanos é a forma de resgatar a cidadania africana e
mostrar que a guerra não é solução para alcançar o desenvolvimento, mas para trazer apenas
retrocesso ao país.
A instabilidade política e a “banalização” dos conflitos armados em muitos países
africanos exigem uma compreensão do papel desempenhado pelos diferentes atores das
sociedades rurais. Em alguns casos, tensões agrárias pré-existentes (e.g. entre jovens e velhos
ou “donos da terra” e “estrangeiros”) servem de rastilho aos conflitos, tornando certos atores
facilmente manipuláveis pelos “senhores da guerra”. Noutros casos, algumas sociedades
agrárias possuem mecanismos eficientes de regulação das tensões internas e conseguem
isolar-se e criar focos de estabilidade durante conflitos armados que afetam grandes regiões de
um país.
Para além dos fatores que condicionam os diferentes posicionamentos e
percepções sobre os conflitos dos atores sociais no campo, outras questões a estudar são as
estratégias de sobrevivência utilizadas pelas populações rurais durante e após os conflitos, os
mecanismos endógenos de reconciliação, o papel da ajuda de emergência e de reconstrução e
a forma como esta se vai convertendo em ajuda ao desenvolvimento.
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A guerra civil de 1998-99 na Guiné-Bissau e a instabilidade política que lhe
sucedeu corporizaram o estudo mais profundo realizado no âmbito desta linha de trabalho.
A sociedade internacional tem acompanhado as situações de crise política e
econômica na África, através dos dados e relatórios fornecidos pelos respectivos Estados.
O que ocorre, por exemplo, no conflito armado na Guiné-Bissau é a saída das
embaixadas de todos os países devido à falta de estabilidade, ocasionada pela perda da
credibilidade internacional.
Mesmo com as regras impostas pela ONU de respeitar os tratados e acordos
assinados, há descumprimento das cláusulas que outrora foram aceitas.
A comunidade internacional no conflito armado da Guiné-Bissau, que durou um
ano de crises econômicas e políticas, deixando centenas de pessoas morrerem por falta de
condições financeiras e habitacionais, e que, até hoje, não têm coragem de retornar e de ajudar
na reconstrução do país, durante todo momento de crise, fez um relatório no qual se concluiu
que o país não respeita a democracia e que não possui condições de reestruturar-se sem ajuda
externa.
Desde a independência da Guiné-Bissau até a data de hoje, o Estado passou por
uma série de golpes, que originaram o conflito de 1998/1999, sendo este fortemente
questionado pela opinião pública internacional.
Estes conflitos na Guiné-Bissau acentuaram-se com a falta de descentralização de
poder, de autonomia. Neste país de trinta e sete grupos étnicos, o presidente eleito
democraticamente é quem nomeia os prefeitos e os demais parlamentares. Esta ausência de
autonomia propicia a concentração de poderes na figura do presidente, que dá ordens sem
sofrer nenhuma oposição. É por isso que há tanta desconfiança da sociedade internacional
com relação à Guiné-Bissau, que só restabelecerá esta credibilidade quando viabilizar uma
política de desconcentração e organização do aparelho estatal.
A influência internacional nos conflitos civis dos países africanos tem aumentado
bastante com o processo de globalização. A troca de experiências bilaterais, multilaterais e os
diversos acordos entre os Estados têm incentivado o desenvolvimento da política no
continente africano. Sobretudo os convênios celebrados com os países da Europa e da
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America Latina, que possibilitam o resgate da educação neste continente, além de fomentar o
mercado através de presentes e futuros quadros profissionais. Ressalta-se que, desde a
escravatura, o povo africano ainda sofre com as conseqüências do domínio colonial, sendo
hoje a situação gradativamente transformada através de gestos de solidariedade e de
compreensão da luta e do sofrimento africano.
A independência dos países africanos ocorreu graças à pressão internacional que
visava libertar estes países do jogo colonial que já se estendia por muito tempo.
As guerras civis que assolaram, e ainda assolam, a África são reflexo de anos de
dominação estrangeira, que até hoje é marcante neste vasto território, dificultando, assim, a
busca de soluções melhores para as crises que teimam em permanecer.
A influência de Portugal, que se intensificou com a guerra da independência da
Guiné-Bissau e foi até a sua guerra civil de 1998/1999, teve repercução negativa na
comunidade internacional, tendo vista o forte interesse econômico que culminou em conflitos
nos quais houve irrecuperáveis perdas humanas.
A França aderiu indiretamente à guerra de Guiné-Bissau em 1998, apoiando as
tropas de Senegal e de Guiné Conakry, onde os soldados foram flagrados na linha de frente de
combate e mortos pela junta militar guineense, o que não foi bem visto pela opinião
internacional.
A França fortaleceu sua cooperação com a Guiné-Bissau quando apoiou a adesão
deste país na UMOA FCFA em 1997. Esta adesão não trouxe significantes benefícios ao país,
porque este não possuía condições econômicas suficientes exigidas pelos países filiados à
UMOA. Ainda, o intenso fluxo migratório não permitiu o acúmulo de riquezas na Guiné-
Bissau, pois os imigrantes não se fixavam no território, apenas trabalhavam, enriqueciam e
voltavam ao seu país de origem com todo o dinheiro acumulado durante todo o tempo de
trabalho no exterior.
Portugal e França foram os países que expressivamente participaram dos conflitos
da guerra civil da Guiné-Bissau, contudo toda a comunidade internacional acompanhou e
participou indiretamente na deflagração e resolução da guerra.
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A ONU somente emitiu comentários a respeito deste conflito armado após o
término dele. A expressa repugnação da comunidade internacional pela guerra e a perda de
credibilidade internacional do país só ocorreram depois de um ano de batalhas entre
compatriotas.
Nos conflitos entre países, a comunidade internacional busca intervir para manter
a paz em detrimento da luta armada. Assim, o objetivo dos órgãos internacionais é
manutenção da paz no mundo.
Os conflitos armados africanos, normalmente, acontecem por instigação de países
europeus, que apóiam essas guerras, ditas étnicas, na procura de benefícios econômicos. Esse
apoio indireto possibilita o não conhecimento de sua participação e a conseqüente não-
condenação pela opinião pública internacional. Em 1963, foi criada a Organização da
Unidade Africana, cujos objetivos são evitar conflitos entre os Estados africanos e fortalecer a
cooperação dentro da África. Contudo, as batalhas civis não estão perto de terminar, pois tem
de ressaltar-se que, entre as décadas de 60 e 70, os países africanos começaram a tomar
independência, sofrendo, portanto, ainda com as tentativas de tomadas de poder e com a forte
corrupção.
Nos conflitos internos, entretanto, a intervenção de órgãos que optam por soluções
pacíficas é mais difícil, tendo em vista que muitos países almejam fomentar a situação
conflituosa a fim de obter benefícios econômicos e políticos com a situação de caos e
desorganização que se encontra o Estado.
A deliberação da ONU retrata a timidez do direito das gentes. Se as sanções
decretadas pela ONU não foram cumpridas, a esperança da paz desaparecerá e teremos a
guerra, que é a negação mesma do direito.
Mas, apesar das violações excessivas das normas internacionais, a existência do
direito das gentes não pode ser contestada. São os próprios Estados que o reconhecem e se
subordinam às suas regras. Dois exemplos comprovam o nosso pensar – na carta da ONU os
estados que a subscreveram prometeram “manter a paz e a segurança internacionais... de
conformidade com os princípios da justiça e do direito internacional” (art.1◦), enquanto a
carta da OEA afirma na letra “a” do art. 3◦ que “o direito internacional é a norma de conduta
dos Estados em suas relações recíprocas”.
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3.OS CONFLITOS NA GUINÉ-BISSAU
Os homens são por sua natureza livres, iguais e independentes, e por isso nenhum pode ser expulso de sua propriedade e submetido ao poder políticos de outrem sem dar seu consentimento. O único modo legitimo pelo qual alguém abre mão de sua liberdade natural e assume os laços da sociedade civil consiste no acordo com outras pessoas para se juntar e unir-se em comunidade, para viverem com segurança,conforto e paz umas com as outras, com a garantia de gozar de suas posses, e se maior proteção contra quem não faça parte dela. Qualquer número de homens pode fazê-lo, porque não prejudica a liberdade dos demais que ficam como estiverem, livres no estado de natureza. Quando certo número de homens acordou assim em construir uma comunidade com governo, ficam, de fato, fazendo parte dela e formando um corpo político, no qual a maioria tem a prerrogativa de agir e resolver por todos.
Quando certo número de homens constitui uma comunidade através do consentimento individual de todos, faz com isso dessa comunidade, um corpo com poder de agir como um corpo, o que apenas ocorre pela vontade e resolução da maioria.
Apenas o consentimento dos indivíduos leva a comunidade a agir, e é necessário, para que um corpo se mova em certo sentido que o faça movido pela força maior, ou seja, a do consentimento da maioria; se assim não fosse, seria impossível que uma comunidade agisse ou conservasse sua identidade de corpo, que a aquiescência dos indivíduos que a formaram concordou em que fosse por isso todos ficam obrigados pelo acordo estabelecido pela maioria.
E assim o indivíduo, concordando com outros em formar um corpo político sob um governo, assume a obrigação para com os demais membros dessa sociedade de submeter-se à resolução que a maioria decidir. Se assim não fosse, o pacto inicial que o liga aos outros e o incorpora a uma sociedade nada significaria, e nem mesmo seria pacto se aquele individuo ficasse livre e sem nenhum outro vinculo, diferente do estado de natureza.1
2.1. A LUTA DE LIBERTAÇÃO NACIONAL
1 LOCKE, Jonh. Segundo Tratado sobre o Governo. São Paulo: Martin Clarent, 2002. Pag.: 16-17.
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21
Os conflitos fazem parte integrante da história moderna de Guiné-Bissau,
assumindo a forma, quer de resistência contra a sua potência colonizadora, Portugal, quer de
lutas e tensões de ordem interna, de diversas tendências políticas, baseados na luta pelo poder.
O nacionalismo e a luta anti-colonial na Guiné e Cabo Verde estiveram
profundamente ligados a figura carismática de Amilcar Cabral. Este dirigente africano
dedicou sua vida a libertação do seu povo e a luta contra o colonialismo português.
As forças armadas portuguesas, a mediada que o conflito se intensificava, foram
também, de uma forma crescente, utilizando um maior número de africanos em suas fileiras,
aproveitando o seu conhecimento sobre o terreno, os hábitos, as línguas e até a sua adaptação
ao meio. A criação de emprego de militares africanos na Guiné, nomeadamente comandos
africanos, começou por ser um processo, no início da guerra, que apenas integrava um
pequeno número de militares africanos, de milícias e de tropas de segunda linha, que já
colaboravam com as unidades metropolitanas, estes militares iriam ser, na fase pós-
independência, uma das fontes de conflitos entre guineenses.
2.2. O GOLPE DE ESTADO DE 14 DE NOVEMBRO DE 1980
Em 1980, a situação econômica na Guiné-Bissau era muito má. A diferença entre
uma classe de dirigentes, vivendo num luxo ostensivo, e a população desprovida de gêneros
de primeira necessidade, era inaceitável num país que tinha efetuado inúmeros sacrifícios na
luta de libertação nacional. O Estado tinha revelado uma total incapacidade de resolver os
principais problemas da população, e as tarefas políticas se tornaram cada vez mais
complexas.
Apesar da rejeição de muitos dos “representantes do povo”, a assembléia nacional
popular, em sessão extraordinária, de 12 de novembro de 1980, aprovou o texto da nova
constituição. Este fato, adicionado ao depauperamento do país, e também ao crescente mal-
estar social, traduzida em desconfianças mútuas e ódios, resultantes das perseguições, os
órgãos da segurança do Estado seriam a base da crescente instabilidade política. Neste
ambiente de permanentes conflitos internos no PAICC (Partido Africano de Independência de
Guiné e Cabo Verde), a Guiné-Bissau, seis anos após a independência, conheceu um golpe de
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22
estado a 14 de novembro de 1980, liderado pelo então comissário principal equiparado ao
primeiro ministro, o Comandante João Bernardo “Nino Vieira”.
As razões do descontentamento de Nino Vieira relacionavam-se com a introdução
de patentes militares no sei das Forças Armadas em 1979. Os antigos combatentes sentiam
uma profunda injustiça com relação ao sistema de cotas, que permitia promover jovens cabo-
verdianos recém-chegados de Portugal ou Cabo-Verde sem uma legitimidade militar para
comandarem os verdadeiros combatentes da liberdade da pátria. Quanto a Nino Vieira,
considerou não ter sido promovido de forma justa, tendo em conta o seu passado na luta de
libertação, acabando por reagir de uma forma que os juristas qualificam como de legítima
defesa.
O “movimento reajustador”, de 14 de novembro de 1980, como ficou conhecido,
soube explorar a seu benefício a velha e profunda clivagem entre as elites negras e mestiças
na Guiné-Bissau. O ressentimento em face aos cabo-verdianos nasce com a história e um
modelo de dominação colonial. Por causa da origem sócio-cultural e do acesso à educação de
que puderam beneficiar os cabo-verdianos, estes colaboraram ativamente com o poder
colonial, tendo-se revelado como preciosos auxiliares e intermediários entre os autóctones e
as autoridades coloniais na gestão da administração e na supervisão dos trabalhos forçados.
Mesmo levando em cota que os mestiços forneceram aos movimentos
nacionalistas os seus melhores quadros, esse passado incômodo ressurgiu logo que a elite
mestiça cabo-verdiana começou a ganhar posição logo depois da conquista da independência.
A assembléia nacional foi dissolvida e Nino Vieira assumiu a posição de presidente do
conselho da revolução, afastando do partido a grande maioria dos dirigentes.
A ala cabo-verdiana do PAIGC reagiu e declarou a ruptura e cisão do partido. Na
seqüência, foi constituído em Cabo-Verde o Partido Africano de Independência de Cabo-
Verde (PAICV). Na seqüência do golpe de estado de 1980, o sonho da união entre Cabo-
Verde e Guiné-Bissau desapareceu de vez, o golpe provocou o corte de relações entre os dois
países.
2.3. O INÍCIO DO CONFLITO DE 1998/1999
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23
As primeiras notícias sobre os confrontos militares mostraram que se trataria de
um incidente de proporções relativamente reduzidas.
Surge de novo outro conflito, o que ilustra que esse país vive em constante
instabilidade política, agora no meio militar. No mês de junho do mesmo ano (1998), o
presidente Nino Vieira afasta, por decreto presidencial, o Chefe do Estado Maior General das
Forças Armadas, o general Ansumane Mané, acusado de favorecer o tráfico de armas para os
“Rebeldes Separatistas” de Casamansa, Senegal. O general Mané não só refutou as acusações
como considerou inaceitável a forma arbitrária da sua demissão. Ele então constituiu uma
Junta Militar para enfrentar o presidente, o que precipitou uma guerra civil (1998/1999) na
Guiné-Bissau. Nino Vieira chama em seu auxílio tropas do Senegal e da República da Guiné-
Conakry, em abrigo de acordo de assistência militar assinados por esses países, já que a
maioria absoluta dos militares guineenses ficou do lado do Chefe do Estado-Maior General
das Forças Armadas destituído. Esse conflito foi ápice de um longo processo de
enfrentamento interno na caserna. Desde o governo Luis Cabral (primeiro presidente da
republica), que os presidentes interferem na composição da hierarquia das forças armadas e na
distribuição de comandos estratégicos. Foi essa intromissão malsucedida do presidente Luis
Cabral que precipitou o golpe liderado por Nino Vieira.
Quando o general Vieira chegou à presidência da República, não confiou na
hierarquia dos seus colegas de armas. Procedeu, imediatamente, a transferência de comandos
e nomeação para postos relevantes os oficiais de sua absoluta confiança. Depois do
afastamento e morte, sob acusação de tentativa de golpe, do único oficial general da etnia
balanta (coronel Paulo Coréia), o presidente Nino Vieira decidiu afastar a maioria de oficiais
dessa etnia, enviando-os para a guarnição de fronteira e/ou para comporem as forças de paz
solicitadas pelas Nações Unidas (ONU). Ao mesmo tempo, iniciou a política de
rejuvenescimento do oficialato das forças armadas, promovendo jovens oficiais que tinham
terminado a Academia Militar para oficias superiores no exterior. Muitos desses jovens eram,
na ocasião, tenentes e foram promovidos para majores e tenentes-coronéis e, paralelamente,
os antigos oficiais da época de libertação foram progressivamente perdendo comando; alguns
ficaram nas forças sem funções específicas e boa parte dos antigos oficiais foi
compulsoriamente para a reserva, sem remuneração condigna. Essas medidas eram mais
cautelares do que a efetiva renovação do comando; visavam, principalmente, a inviabilizar
qualquer articulação dos oficiais oriundos da luta de libertação contra o presidente Nino
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24
Vieira. Essa era a situação do general Ansumane Mané. Ele ocupava a chefia do Estado Maior
General das Forças Armadas em 1990/1992; foi, então, demitido e colocado na reserva. Mas
como era amigo e confidente do presidente Nino Vieira, este recorreu a ele para preencher a
vaga aberta com a morte súbita do então oficial da geração intermediária, coronel Saco
Câmara, que o havia substituído no comando do Estado Maior General das Forças Armadas.
Esse oficial foi nomeado para a chefia do Estado Maior não só por ser homem de confiança
do presidente, mas, também, porque transitava bem entre a geração antiga e a nova em
ascensão.
Numa entrevista concedida ao jornal português, o general Nino se referiu
jocosamente ao seu antigo amigo e confidente, comandante Ansumane Mané, por este ter
assumido a liderança da rebelião militar contra o governo. Ele disse que o líder da Junta
Militar não tinha capacidade para a liderança e que era uma pessoa complexada, o que
dificultava o seu relacionamento com os outros oficiais, principalmente os mais jovens, o que
tinha afetado a sua função de mando. Acrescentou, ainda, que os jovens oficiais tinham
maiores capacidades do que ele e isso lhe criou dificuldade em responder às exigências do
cargo.
É estranha essa opinião do presidente porque, se fosse verdade, como entenderia a
mesma pessoa ser designada por duas vezes para ocupar o mais alto comando da hierarquia
militar (chefia de Estado Maior General das Forças Armadas). O problema principal estaria na
confiança depositada no general Ansumane Mané que começara a ser abalada, na medida em
que este não aceitou assumir sozinho a responsabilidade do tráfico de armas para os rebeldes
senegaleses. O presidente, que não aceitava ser contrariado, demitiu o Chefe do Estado Maior
das Forças Armadas sem maior explicação, o que provocou a eclosão do conflito latente entre
as gerações dos oficiais jovens que ficaram ao lado do governo, enquanto a geração de luta
armada e todos os reservistas se juntaram ao general Ansumane Mané, para juntos formarem
“A Junta Militar”, força rebelde contra o governo.
O conflito guineense e o seu desfecho eram particularmente importantes para o
Senegal que via numa eventual vitória da Junta Militar o aumento, desta vez aberto, do apoio
da Guiné-Bissau ao MFDC (Movimento Frente Democrática de Casamansa). A intervenção
senegalesa ficou conhecida com o nome de “Operação Gabú”, tendo o contingente senegalês
sido comandado pelo coronel Abdoulaye Fall. No caso da Guiné-Conakry, a intervenção ficou
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a dever-se às boas relações entre o presidente Nino Vieira e o presidente Lansana Conté e o
chefe da força, Comandante Samy Tambá, foi morto em combate.
Como era previsível, a conseqüência imediata de chamar tropas estrangeiras
provocou o gradual aumento do apoio popular aos seus chefes, transformando o que era no
início um ato de rebeldia estritamente militar num movimento essencialmente político.
2.4. O FIM DO REGIME DE NINO VIEIRA
Uma série de coincidências fez com que fossem poupadas as vidas de Nino Vieira
e de seus admiradores mais diretos, bem como dos nacionais franceses (militares e
diplomatas), encurralados nas instituições do Centro Cultural Francês. O pedido de ajuda do
Governo Francês à Portugal para que esse contatasse a Junta Militar exigindo a segurança de
seus nacionais, foi executada imediatamente, o que evitou uma eventual intervenção militar
francesa em larga escala.
Pelo que foi referido, pode dizer-se que, na conjuntura complicada na relação de
influência externa sobre a crise na Guiné-Bissau, não constituiu a novidade de que Portugal e
França tivessem adotado posições, por vezes, bastante diferentes sobre os acontecimentos que
se sucedem a 7 de junho de 1998. Foi, sem dúvida, um período de alguma complexidade
intensa entre os dois Estados, após cerca de um mês na Embaixada Portuguesa em Bissau,
Nino Vieira pediu asilo político à Portugal.
O argumento oficial para abandonar a Guiné-Bissau foi a necessidade de cuidados
médicos, comprometendo-se Nino Vieira de retornar ao país para defender-se das acusações
que lhe foram imputadas.
O conflito político-militar de 1998/1999 foi um teste favorável á
responsabilização e compromisso da Sociedade Civil (SC), que se organizou no denominado
Movimento da Sociedade Civil para Consolidação da Paz e Democracia e teve como
propósito a mediação do conflito entre as partes beligerantes e, simultaneamente,
sensibilizando a comunidade internacional sobre a necessidade de continuar a apoiar a
população e os esforços da consolidação da paz.
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Com o fim do conflito político-militar e com a esperança reforçada, a economia
guineense começou a apresentar avanços positivos que auguravam um futuro confiante.
A guerra civil terminaria em maio de 1999 com a vitória da Junta Militar sobre
Nino Vieira, que parte para o exílio em Portugal. Malam Bacai Sanha, Presidente da
Assembléia Nacional Popular (parlamento local), assume interinamente a chefia do Estado até
a eleição prevista para o final do mesmo ano. Ele passa a exercer o poder presidencial em
sintonia com o Comando Supremo da Junta Militar. Francisco Fadul foi nomeado primeiro-
ministro do GUN – Governo de Unidade Nacional - desde o acordo de Abuja, capital política
da Nigéria. É importante sublinhar que durante o conflito houve várias tentativas de
negociações diplomáticas para se chegar a um acordo, o que poria fim à guerra civil. Foi em
Abuja, no final do ano de 1998, que se chegou a um acordo de cessar-fogo e de formação de
um governo de transição até a nova eleição geral no país.
Mas esse acordo não perdurou por muito tempo; ambas as partes desobedeceram
algumas cláusulas do acordo, o que os levou de volta à guerra até ao exílio em Portugal de
Nino Vieira.
A eleição geral foi realmente convocada para o final do ano de 1999. O general
Ansumane Mané, comandante supremo da Junta Militar, depois de vencer as forças
governamentais, recusou-se a candidatar para qualquer cargo político e manifestou a sua
disposição de passar para a reserva assim que a estabilidade política fosse garantida. Depois
da eleição, o comando da Junta Militar não só relutou em dissolver a Junta, como tentou
tutelar o governo, criando um comando paralelo e exigindo a garantia de privilégio durante
dez anos, através da publicação da chamada “Carta Magna”, enviada para os órgãos dos
poderes constituídos e partidos políticos locais. Entre outras exigências, a Junta queria a
prerrogativa de nomear e exonerar, durante dois mandatos presidenciais (10 anos), o
procurador-geral da República e ser ouvida na nomeação e demissão do governo. Contudo,
essa tentativa dos militares não progrediu, porque o comando supremo da Junta reafirmou
numa conferência de imprensa a sua disposição de regressar ao quartel após a normalidade
institucional; além disso, o comandante supremo da Junta morreu misteriosamente; para
alguns, foi assassinato, para o governo, foi uma revolta interna.
As eleições gerais e simultâneas foram realizadas em 28 de novembro de 1999.
Para o parlamento, registraram-se 13 partidos e, para a presidência, foram 12 candidatos,
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sendo 6 mais expressivos. O antigo partido único (PAIGC) teve como candidato no pleito o
presidente interino Malam Bacai Sanha. Kumba Yala, do Partido de Renovação Social (PRS),
que havia enfrentado o antigo presidente Nino no pleito de 1994, agora se elege com
facilidade no segundo turno dessa eleição. O quadro eleitoral foi o seguinte: Kumba Yala teve
38,8% no 1º turno e 72% no 2º turno de votos válidos; Malam Bacai Sanha teve 23,4% no 1º
turno e no 2º turno obteve 28,0% de votos válidos. Com esse resultado, mudam
profundamente as personalidades mais expoentes no Estado, mas a debilidade administrativa
e a instabilidade política continuam.
A vitória do candidato Kumba Yala e do partido para Renovação Social (PRS)
deu início a um novo ciclo na Guiné-Bissau, que depressa ficou marcado pelo agonizar da
crise econômica e social, pela perda da credibilidade da Guiné-Bissau ao nível internacional,
pelo declínio das instituições, pela desresponsabilização das autoridades, pelo desrespeito pela
constituição e pela crise entre a presidência e os órgãos da justiça e assembléia.
O presidente Kumba não conseguiu até agora apresentar um programa ou uma
estratégia política para a recuperação do país. Três governos sucessivos foram nomeados pelo
presidente sem que nenhum deles tenha se revelado eficiente e convincente na execução dos
programas propostos. Aliás, a presidência e o governo não apresentaram nenhuma estratégia
consistente para a reabilitação do país; ou seja, na palavra de Carlos Lopes (sociólogo
guineense), ainda não existe “um projeto democrático” para alavancar o desenvolvimento da
Guiné-Bissau e, muito menos, uma política de inserção social dos excluídos, sobretudo a
inserção da comunidade rural na tomada de decisão política e de desenvolvimento, ainda que
seja a nível local, inexiste. O denominador comum dos três governos sucessivos da era
Kumba é a inexperiência política e administrativa.
Kumba tem, pelo menos, um importante mérito, isso deve ser reconhecido. Ele
estava promovendo uma abertura de oportunidade a muitos quadros técnicos qualificados, que
nunca tiveram oportunidade nos sucessivos governos do PAIGC. Ele estava conseguindo
desarticular, ou diluir, a aliança dos luso-africanos com algumas lideranças etno-rurais que,
juntos, acostumaram a extrair para benefício próprio vantagens significativas dos parcos
recursos públicos, com o agravante de muitos luso-africanos repatriarem esses recursos para
suas poupanças externas em detrimento do progresso do país. Pela primeira vez, os balantas (a
despeito de balantinização do governo e da administração pública) e outras etnias
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tradicionalmente marginalizadas estão tendo oportunidade de ingressarem no seleto grupo da
sociedade elitizada de Bissau, ainda que seja na condição de novos ricos, mas acéfalos do
“capital cultural” na leitura dessa elite.
O seleto grupo da burguesia burocrática, que surgiu ainda que inorganicamente na
época colonial, e ampliou seus membros com a inclusão da nomenclatura do PAIGC, depois
da independência e durante muito tempo, vem se dedicando à organização e consolidação do
grupo em um impenetrável e poderoso “Bissau lobby” e enfrentou um forte oponente. Kumba
identificou uma parte do grupo incrustado no aparelho do Estado e abriu uma guerra
incessante contra ele. Essas pessoas decidiram fazer o que mais sabem fazer, desorganizar a
administração pública, inviabilizar a administração dos sucessivos governos do PRS e
desacreditá-los junto à opinião pública nacional e internacional. A presidência de Kumba foi
se consumindo no enfrentamento da forte e persistente pressão do “Bissau lobby” em favor da
defesa do grupo e da abertura de um canal de interlocução e negociação para uma alternativa
conciliadora. O governo de gestão chefiado por Mario Pires, um membro da elite luso-
africana (facção da burguesia burocrática), parece sinalizar isso.
Neste contexto, o mandato do presidente da república guineense, Kumba Yala
(2000-2003), interrompido por um golpe de Estado, pôs em evidência todas as debilidades
existentes no país e ficou marcado por uma enorme instabilidade política e social. Desta
forma, podemos considerar a Guiné-Bissau como um país “frágil”, onde os conflitos militares
e político-sociais são constantes, dilacerando e destruindo a estrutura da sociedade guineense.
Apesar do tempo decorrido, a Guiné-Bissau continua a sentir, de um modo muito
marcado, os efeitos dos conflitos. As vidas perdidas, o deslocamento de populações e a
destruição de várias infra-estruturas econômicas, administrativas e sociais foram aspectos
críticos que fragilizaram o já débil tecido produtivo herdado do período colonial.
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4. OS TRATADOS ASSINADOS DURANTE OS CONFLITOS
ARMADOS NA GUINÉ-BISSAU
4.1. OS EFEITOS DO RECONHECIMENTO DA INDEPENDÊNCIA
Na seqüência da revolução de 25 de Abril de 1974, Portugal, através da lei n◦
7/74, reconheceu o PAIGC como único e legítimo representante do povo da Guiné-Bissau e,
nessa qualidade, iniciou negociação com vista à celebração de um acordo que formalizasse a
independência do território. As negociações foram rápidas e, a 26 de agosto de 1974, foi
assinado o acordo de Argel. A transformação do PAIGC de movimento de libertação em
partido dirigentes da Guiné-Bissau trouxe alguns problemas de adaptação, agravados pelos
conflitos latentes entre cabo-verdianos e guineenses e pela existência de uma camada da
população, nomeadamente em guiné e Bafata, que não apoiava o partido.
4.2. A MEDIAÇÃO INTERNACIONAL
Os esforços destinados a restaurar a paz entre os beligerantes começaram a
surgir dos mais variados quadrantes. Para além de iniciativas internas 25, de autoridades
religiosas, tradicionais e parlamentares, surgiram também iniciativas externas, sendo de
destacar ao nível bilateral as contribuições da Gâmbia, Angola e Portugal e ao nível
multilateral a Comunidade dos Países de Língua Português (CPLP) e a Comunidade
Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO).
4.3. O ACORDO DE PAZ DE ABUJA
Durante a cimeira de chefes de Estados e de governos da CEDEAO, realizada em
Abuja (Nigéria), os dois lideres beligerantes, Nino Viera e Ansumane Mané, foram ouvidos
pelos chefes dos Estados presentes, tendo esta ronda negocial surtido efeitos. Assim, no dia 1◦
de Novembro, sob os auspícios da CEDAO, as partes assinaram um acordo que estipulava o
seguinte: a reabilitação do acordo de cessar-fogo assinado em 26 de agosto de 1998 na cidade
da Praia; a retirada total da Guiné-Bissau das tropas estrangeiras; esta retirada será efetuada
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simultaneamente com o envio de uma força de intervenção da ECOMOG que substituía as
tropas retiradas; a força de interposição garantirá a segurança ao lado da fronteira entre
Guiné-Bissau e o Senegal, que manterá as partes separadas e permitirá às organizações e
agências humanitárias o livre acesso ás populações civis afetadas; ao mesmo tempo, o
aeroporto internacional Osvaldo Viera e o porto de Bissau serão imediatamente abertos; a
criação de um governo de unidade nacional, que em conformidade com as posição do acordo
já assinado pelas duas partes compreenderá entre outros os representantes da auto-proclamada
junta militar.
A organização de eleições gerais e presidências o mais tardar até fim de março de
1999, as eleições serão supervisionadas por observadores das comunidades econômicos dos
estados da África Ocidental (CDEAO), da comunidade internacional.
Para a implementação do acordo, foi criada a comissão executiva conjunta para a
implementação do acordo de paz de Abuja, que integrou seis elementos da junta militar e
cinco elementos do governo guineense. Com observadores, contava com os (uma das pessoas
mais ativas na procura de uma solução nesta altura foi o bispo de Bissau, D’Artur) elementos
diplomáticos da troika (Portugal, França e Suécia), o delegado da União Européia em Bissau
e o representante da comissão mediadora de boa vontade.
De todos os acordos e negociações assinados durante o conflito armado na Guiné-
Bissau, nenhum desses acordos surtiu efeito até o fim do regime de Nino Viera.
Em face de recusa de desarmamento, no âmbito do que estava estabelecido no
acordo de Abuja, a junta militar lançou uma operação militar em Bissau com objetivo de
derrubar Nino Viera. A população manifestou a sua alegria pelo derrube do regime e
descarregou a sua fúria sobre a Embaixada e Centro Cultural Francês, assim como sobre a
Embaixada Senegalesa. Os nacionais destes dois países tiveram que recorrer à proteção da
Embaixada Portuguesa, a qual foi respeitada pela população.
Na seqüência do acordo de Abuja, deu-se início na Guiné-Bissau, em janeiro de
1999, a preparação do processo eleitoral, tendo em vista a realização das segundas eleições
presidenciais e legislativas democráticas daquele país. No dia 3 de março, o Conselho de
Segurança das Nações Unidas aprovou a criação da Comissão das Nações Unidas para Apoio
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à Reconstrução da Paz na Guiné-Bissau (UNOGBIS), a ser chefiada por um representante
especial do Secretário-Geral.
A UNOGBIS foi criada com função de coordenar todo o trabalho do sistema das
Nações Unidas na Guiné-Bissau durante o período de transição até á realização das eleições,
no âmbito da implementação do acordo de Abuja.
Reiterando todo o apoio ao processo de reconciliação nacional, o Conselho de
Segurança das Nações Unidas aprovou, por unanimidade, a 6 de abril, a resolução n◦
1.233/99, que incentiva as partes a aplicarem os pontos do acordo de Abuja, designadamente a
adoção de todas as medidas para funcionamento do novo governo, para o melhoramento da
confiança internacional e para o regresso dos refugiados.
O restabelecimento da normalidade democrática concretizou-se com a realização
de eleições legislativas e presidenciais em Novembro de 1999 e janeiro de 2000, que
contaram com largo apoio internacional expresso nos comunicados conjuntos dos
observadores internacionais
Resolução sobre a Guiné-Bissau O Parlamento Europeu, - Tendo em conta as suas resoluções anteriores sobre a Guiné-Bissau, - Tendo em conta a Resolução nº 1216 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, de 21 de Dezembro de 1998, A. Considerando que em 1◦ de Novembro de 1998 foi assinado em Abuja um acordo de paz para pôr fim ao conflito que grassa desde 7 de Junho de 1998 na Guiné-Bissau entre o Presidente Nino Vieira e o General Ansumane Mané, B. Recordando que o referido acordo de paz assinado pelo Presidente Nino Vieira e o General Ansumane Mané em 1◦ de Novembro de 1998 em Abuja prevê a retirada das tropas estrangeiras e a instalação da ECOMOG, força de interposição da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), composta por forças do Níger, do Benin e do Togo, C. Considerando que, pouco antes do envio das tropas da ECOMOG, registrou-se uma nova eclosão das hostilidades na capital da Guiné-Bissau, aparentemente causada por certas forças que apóiam o Presidente Nino Vieira, D. Considerando que, em 3 de Fevereiro de 1999, foi assinado sob os auspícios da CEDEAO um novo cessar-fogo entre as partes em conflito, E. Considerando que só será possível encontrar uma solução
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para o conflito mediante a reconciliação e a plena implementação do acordo de Abuja, F. Considerando que, devido à nova vaga de violência, milhares de civis fugiram da capital em busca de refúgio, G. Extremamente preocupado com as ameaças à vida e as violações dos direitos humanos de que é vítima a população civil, em resultado das operações militares que violam o direito internacional humanitário fundamental, H. Preocupado com o permanente envolvimento de tropas estrangeiras, essencialmente do Senegal e da República da Guiné, as quais foram acusadas por organizações internacionais de direitos do Homem de cometerem violações dos direitos humanos contra a população civil, I. Preocupado com a ameaça de fome que pende sobre a população do país em geral e de Bissau em particular, J. Salientando, além disso, que a economia do país, que se encontra entre os mais pobres de África, foi devastada por vários meses de conflito armado, K. Alertando para o perigo de internacionalização do conflito, 1. Condena a nova vaga de violência na Guiné-Bissau e exorta as partes em conflito a implementarem plenamente o cessar-fogo acordado em 3 de Fevereiro de 1999; 2. Lamenta e condena a irresponsabilidade política, a cegueira histórica e a completa insensibilidade humana dos dirigentes políticos e militares que, contra os interesses do seu povo, recomeçaram esta guerra; 3. Solicita às partes em presença que se empenhem sem reservas na aplicação integral dos acordos de paz de Abuja, nomeadamente mediante a formação de um governo de união nacional e a organização de eleições presidenciais e legislativas, no respeito pela independência e integridade territorial da Guiné-Bissau; 4. Denuncia o papel desestabilizador de todas as tropas estrangeiras no conflito e solicita a sua retirada, com a exceção das tropas acordadas por ambas as partes no âmbito da ECOMOG, como condição prévia para a aplicação do acordo de paz e para a instauração de um novo governo; 5. Solicita à União Européia que forneça apoio técnico e financeiro à força de interposição da África Ocidental encarregada de manter a paz; 6. Solicita à Comissão que envie a ajuda humanitária necessária, e convida as partes em conflito a respeitarem rigorosamente as disposições aplicáveis do direito internacional humanitário e a garantirem às organizações humanitárias que trabalham na Guiné-Bissau um acesso seguro e livre às vítimas do conflito; 7. Solicita ao Conselho que preste um contributo mais ativo para a resolução pacífica e duradoura do conflito, e pede aos Estados-Membros que atuem como uma entidade única; 8. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução
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à Comissão, ao Conselho, à OUA, à CEDEAO, aos Co-Presidentes da Assembléia Paritária ACP-UE e aos Governos do Senegal e da República da Guiné, bem como à Assembléia Nacional, ao Primeiro-Ministro indigitado e ao Presidente da República da Guiné-Bissau.
4.4. TRATADOS INTERNACIONAIS E O CONFLITO CIVIL GUINEENSE
Tratado é um ato jurídico segundo o qual os Estados e organizações internacionais
que obtiveram personalidade por acordo entre diversos Estados, criando, modificando ou
extinguindo uma relação de direito existente entre eles.
Convenção e tratados são expressões sinônimas. Antigamente, empregava-se o
termo convenção para indicar os acordos entre Estados, objetivando assuntos de natureza
econômica, comercial ou administrativa; e a designação tratados, para os acordos de caráter
político, hoje não se faz mais tal desconformidade.
Os tratados constituem o direito internacional escrito. Existem duas espécies de
tratados: os tratados-contratos, que são pactuados entre um número limitado de Estados, com
o objetivo de deliberar questões de caráter peculiar que somente interessam aos contratantes,
pois demandam concessões mútuas; e os tratados normativos, que formulam preceitos de
ordem geral pretendendo nortear relações entre diversos Estados.
Para os romanos não havia regras específicas de direito internacional para a
guerra.Existiam, contudo, para a sua terminação.Ela findava ou por um tratado de paz, que era
sempre de amizade, ou pela rendição (reditio), ou pela conquista do país inimigo (occupatio).
A rendição poupava a vida e bens do inimigo. Na hipótese de conquista, porém, estes, na suas
pessoas e bens, ficavam à discrição dos vencedores.
Hoje o tratado se extingue pelo:
a) Cumprimento da obrigação estipulada;
b) Decurso do prazo estabelecido pelas partes;
c) Impossibilidade de execução;
d) Acordo entre os interessados;
e) Renúncia – quando o Estado desiste de algum direito que
o outro membro da comunidade internacional era coagido a conceder-lhe;
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f) Denúncia unilateral – ato pelo qual o Estado resolve
rescindir unilateralmente um convênio ou dele se afastar sponte sua, isto é,
sem necessidade de declinar o motivo do retraimento. Essa modalidade, no
entanto, somente será permitida se no tratado constar a cláusula de
denúncia ou após um pré-aviso aos demais pactuantes. Acrescente-se, por
oportuno, que denunciado o acordo, restabelecer-se a vigência das normas
internas anteriores que haviam sido postas de lado;
g) A guerra sobrevinda entre as partes suspende as
convenções entre os beligerantes, os quais, no entanto, devem observar os
preceitos do direito humanitário.
Em todo tratado está implícito que o mesmo perderá a sua vigência quando as
condições que o motivaram deixaram de existir. Em outras palavras, as circunstâncias que
ensejaram a assinatura do convênio se modificaram para um dos signatários, o qual ficou em
posição inferior ao outro contratante. Permanecer válido esse acordo seria não só injusto
como prejudicial à paz que deve reinar na comunidade internacional.
A convenção sobre o direito dos tratados (Viena, 1969) preceitua que um Estado
pode invocar a impossibilidade de executar um tratado, como motivo para por termo à
vigência ou para a ele retirar-se, se essa impossibilidade originar-se da desaparição ou
destruição duradoura de um objeto indispensável à execução do pactuado. No caso dessa
impossibilidade for transitória, apenas pode ser invocada como motivo de suspensão da
aplicação do convencionado.
Não constitui fundamento para um Estado pôr fim à vigência do tratado ou dele se
esquivar, se a impossibilidade resulta de uma violação pela parte que invoca, de uma
obrigação nascida do estipulado ou de outra obrigação internacional referente a qualquer outra
parte no mesmo.
A modificação fundamental nas circunstancias que não tenham sido previstas
pelos contratantes não justifica o término do convênio nem para deixar de ser parte, exceto se:
a) A existência de mencionadas condições possa
considerar-se como um requisito essencial das partes para obrigar-se;
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b) Essa alteração tiver por modificar radicalmente a
natureza das obrigações assumidas no pactuado.
É corrente também que os Estados têm o dever de resolver seus conflitos
internacionais por meio pacífico. Esse dever, inicialmente de caráter moral, já se encontra em
vários atos internacionais, desde as Convenções de Haia, de 1899 e 1907, sobre as soluções
pacíficas das controvérsias internacionais até a Carta das Nações Unidas e a Carta dos Estados
Americanos.
Do ponto de vista propriamente do direito das gentes, o fato mais importante do
começo do século passado foi a conferência de paz reunida em Haia. Os resultados de seus
trabalhos foram consignados no Ato Final e constam de treze convenções, uma declaração e
alguns votos, além do reconhecimento do princípio da Arbitragem Obrigatória e a
confirmação de que a esta pode ser submetida, sem aplicação das estipulações convencionais
internacionais. As treze convenções aprovadas e assinadas dizem respeito, respectivamente,
aos seguintes assuntos: solução pacífica dos conflitos internacionais; limitação do emprego da
força para a cobrança de dívidas contratuais; abertura das hostilidades; leis e costumes da
guerra terrestre; direitos e deveres das potências e das pessoas neutras, no caso de guerra
terrestre; regime dos navios mercantes inimigos no começo das hostilidades; transformação
dos navios mercantes em vasos de guerra; colocação de minas submarinas automáticas de
contato; bombardeamento por força naval em tempo de guerra; adaptação à vida marítima dos
princípios da convenção de Genebra “relativa aos feridos e enfermos nos exércitos em
campanha”; restrições ao exercício de direito de captura na guerra marítima; estabelecimento
de uma corte internacional de presas; direitos e deveres das potências neutras em caso de
guerra marítima. A declaração trata da proibição de lançar projéteis e explosivos dos balões.
O acordo de cessar fogo assinado em Gâmbia entre Nino Viera e Ansumane Mane
não foi cumprido, principalmente as partes que abordavam sobre a retirada de tropas
estrangeiras, o cessar fogo e a formação do governo de transição.
Estas fases, definidas por Koudawo, dizem respeito à primeira transição política
de acordo com alguns autores, ao nível político, na Guiné-Bissau. Este período transcorre de
1974 a 1991, culminando com o início do regime de partido único, que se manteve no poder
entre 1991e 1999.
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Em face da recusa de desarmamento, o âmbito do que estava estabelecido no
acordo de Abuja, a junta militar lançou uma operação militar em Bissau com o objetivo de
derrubar Nino Viera. Passadas pouco mais de 24 horas, os homens fiéis a Nino Viera
renderam-se. As forças da CDEAO não se intrometeram no conflito. Após a tentativa de
refúgio na Embaixada Francesa e, em seguida, na Senegalesa, Nino Viera foi acolhido, a
conselho dos próprios dirigentes da junta militar, na Embaixada Portuguesa.
Durante o conflito armado na Guiné–Bissau, todos os acordos e negociações
feitos, tanto nos países estrangeiros, como no nacional, acordos estes que evidenciavam todo
o esforço para encontrar a paz no território guineense, não foram obedecidos por nenhum dos
beligerantes.
A comunidade internacional acompanhou passo a passo do conflito na Guiné-
Bissau. Apesar de participação indireta de Portugal na demanda, não se pode negar a sua
contribuição, enviando o Ministro de Negócio Estrangeiro Português à Guiné-Bissau a fim de
negociar com a junta militar e o governo no intuito de resolver as crises política e econômica
que assolavam o país. Todos os lados beligerantes aceitaram negociar e assinar vários
acordos: o de cessar fogo, o da retirada de tropas estrangeiras e o de formação do governo
nacional. Contudo, todos os acordos e negociações foram desobedecidos, voltando-se sempre
ao ponto-de-partida, qual seja: a guerra.
4.5. A PARTICIPAÇÃO DE ALGUNS PAÍSES AFRICANOS NAS
NEGOCIAÇÕES DO CONFLITO GUINEENSE
4.5.1. SENEGAL
Duas missões do ministro senegalês do Interior, general Lamine Cissé, a Bissau,
no período de uma semana, a entrega ao Presidente Nino Vieira e ao líder da Junta Militar,
Ansumane Mané, de uma mensagem pessoal do Presidente Abdou Diouf e o longo encontro
entre Cissé e Mané em Bissalanca, pouco antes da chegada de Jaime Gama, Ministro do
Negócio Estrangeiro de Portugal, foram os sinais visíveis do novo posicionamento de Dakar.
Mas a esta evolução não foram decerto alheios os esforços concertados de Paris e
de Lisboa. Assim, assegurado do apoio político, diplomático e militar da França - reafirmado
solenemente durante a visita do Presidente Abdou Diouf a Paris -, o Governo de Dakar pôde
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encarar com outra serenidade a evolução da crise em Bissau. A demora do conflito e as
pesadas baixas sofridas pelo contingente senegalês - quarenta mortos e três centenas de
feridos, segundo o balanço oficial - começavam a minar a autoridade do Governo e o prestígio
do Presidente, acusados de terem agido de forma irrefletida e de sonegarem informações
sobre a realidade da situação.
O triunfalismo dos rebeldes guineenses, ameaçando infligir uma “derrota militar
humilhante” aos senegaleses em Bissau, e “declarar guerra ao Senegal”, apoiando
militarmente os independentistas da Casamansa, lançaram mais achas na fogueira. Os mais
conservadores do Conselho Nacional de Segurança começaram a exigir uma intervenção em
força para salvar os “djaambars” (guerreiros valentes, em “ouolof”) dos conflitos em Bissau.
O contato com Mané estabeleceu um canal de negociação, criando possibilidades de paz.
Nino deixou de ser o único interlocutor.
4.5.2. GÂMBIA
Primeiro país da região a oferecer os seus “bons ofícios” para uma solução
negociada do conflito na Guiné-Bissau, a Gâmbia já cobrou alguns dividendos da sua ação
apaziguadora.
O Presidente Yaya Jammeh rompeu o isolamento a que esteve sujeito desde o
golpe de Estado de Julho de 1994, que pôs termo a uma das mais antigas democracias do
continente africano, e a comunidade internacional aceitou-o como interlocutor válido.
O restabelecimento da ajuda internacional e das trocas comerciais com os países
vizinhos podem ser a contrapartida deste reconhecimento.
A ajuda de Yaya Jammeh ao seu “irmão de sangue” Ansumane Mané foi também
uma forma de afirmação da Gâmbia face ao poderio senegalês. Ressuscitou, em Dakar, o
fantasma do “eixo Conacry-Banjul-Bissau”, de apoio aos independentistas da Casamansa,
para a constituição de um “estado étnico diola” nas duas margens do rio Casamansa.
4.5.3. GUINÉ- CONAKRY
A importância do “fator Conakry” tem sido subestimada desde o inicio do conflito
na Guiné-Bissau. A escassa ou nula combatividade das tropas que o Presidente Lansana Conte
enviou em socorro do Presidente Nino Vieira é uma das razões que levaram os rebeldes e seus
apoiadores a apontar o contingente senegalês como “inimigo principal”. Velhas amizades do
tempo da guerra colonial, fatores étnicos e o comum receio da hegemonia de Dakar estão na
base da (relativa) tolerância em relação à presença das tropas da Guiné-Conakry.
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O que não significa que Lansana Conté não tenha interesse a defender, e motivos
para querer participar nas negociações. A menos de dois meses das eleições presidenciais no
seu país, Conté precisou, para garantir a sua reeleição, de sair rapidamente de Bissau, e de
provar que soube defender o prestígio e os interesses da Guiné-Conakry na região.
Vencedor de duas rebeliões militares em 1996, Lansana Conté sabe também que o
derrube de Nino Vieira pode incitar os seus opositores internos a tentar um novo golpe de
força.
Por isso, foi o primeiro a sugerir a Nino a pedir a intervenção da CEDEAO e o
envio de uma força de interposição da ECOMOG. E continua a exigir da CEDEAO que seja
intransigente na defesa da ordem constitucional e dos governos legitimamente eleitos.
4.6. A CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS
CAPITULO I - PROPÓSITOS E PRINCÍPIOS
Artigo 1◦ - Os propósitos das Nações Unidas são:
1. Manter a paz e a segurança internacional e, para esse fim: tomar coletivamente,
medidas efetivas para evitar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão ou outra
qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e de conformidade com os
princípios da justiça e do direito internacional, a um ajuste ou solução das
controvérsias ou situações que possam levar a uma perturbação da paz;
2. Desenvolver relações amistosas entre as Nações, baseadas no respeito ao princípio de
igualdade de direito e de autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas
apropriadas ao fortalecimento da paz universal;
3. Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de
caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o
respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção
de raça, sexo, língua ou religião;
4. Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses
objetivos comuns.
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Artigo 2◦
1. A organização é baseada no principio da igualdade de todos os seus membros.
2. Todos os membros, a fim de assegurarem para todos em geral os direitos e
vantagens resultantes de sua qualidade de membros, deverão cumprir de boa fé as
obrigações por eles assumidas de acordo com a presente carta.
3. Todos os membros deverão resolver suas controvérsias internacionais por meio
pacifico, de modo que não sejam ameaçadas a paz, a segurança e a justiça
internacionais.
4. Todos os membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o
uso da força contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer
Estado, ou qualquer outra ação incompatível com os propósitos das Nações Unidas.
(...)
Artigo 24
A fim de assegurar pronta e eficaz ação por parte das Nações Unidas, seus Membros
conferem ao conselho de Segurança a principal responsabilidade na manutenção da
paz e da segurança internacionais e concordam em que no cumprimento dos deveres
impostos por essa responsabilidade o Conselho de Segurança aja em nome deles.
(...)
O Conselho de Segurança submeterá relatórios anuais e, se necessário, especiais à
assembléia geral para sua consideração.
(...)
Artigo 33
1. As partes em uma controvérsia, que possa vir a construir uma ameaça à paz e
segurança internacionais, procurarão, antes de tudo, chegar a uma solução por
negociação, inquérito, arbitragem, solução judicial, recursos a entidades ou acordos
regionais, ou a qualquer outro meio pacifico a sua escolha.
2. O Conselho de Segurança convidará, quando julgar necessário, as referidas partes a
resolver, por tais meios, suas controvérsias.
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(...)
Artigo 102
1. Todo tratado e todo acordo internacional, concluídos por qualquer membro das
Nações Unidas depois da entrada em vigor da presente carta, deverão, dentro do
mais breve prazo possível, ser registrados e publicados pelo secretariado.
Artigo 103
No caso de conflito entre as obrigações dos membros das Nações Unidas, em
virtude da presente carta e as obrigações resultantes de qualquer outro acordo
internacional, prevalecerão as obrigações assumidas em virtude da presente carta.
Os objetivos da carta da ONU são preservar as gerações vindouras dos flagelos da
guerra, que duas vezes, no espaço da nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade,
e reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano,
na igualdade de direito dos homens, assim como das nações grandes e pequenas, e estabelecer
condições sob as quais a justiça e o respeito às obrigações decorrentes de tratados e de outras
fontes do direito internacional possam ser mantidos, e a promover o progresso social e
melhores condições de vida dentro de uma liberdade ampla.
E para tais fins, praticar a tolerância e viver em paz, uns com os outros, como
bons vizinhos, e unir as nossas forças para manter a paz e a segurança internacional, e
garantir, pela aceitação de princípios e a instituição dos métodos, que a força armada não seja
usada a não ser no interesse comum, a empregar um mecanismo internacional para promover
o progresso econômico e social de todos os povos.
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5. OS EFEITOS DO CONFLITO DE 1998/1999 NA ATUAL GUINÉ-
BISSAU
O Estado de Guerra é uma condição de inimizade e destruição; e, portanto, um estado que declara intenção ponderada e fria com relação à vida de outrem, por meio de palavra ou ação, não movida por paixão ou precipitada, e o coloca, pois em guerra contra aquele a quem declarou tal intenção, expondo assim a vida ao poder do outro, vida que lhe poderá ser arrebentada por aquele ou por qualquer outro que a ele se alie para defendê-lo, esposando-lhe a causa; é, pois, razoável e justo que eu possa ter o direito de aniquilar aquilo que ameaça destruir-me, ora pela lei fundamental da natureza, deve-se preservar o homem tanto quanto possível, quando nem tudo se pode preservar ,devendo dar-se preferência à segurança do inocente; e pode destruir-se alguém que nos nova a fazer a guerra ou que manifeste inimizade á nossa existência, pelo mesmo motivo que se pode matar um lobo ou um leão, uma vez que tais pessoas não se sujeitam à lei comum da razão, e não outra lei que não a força e a violência, podendo assim ser tidos e tratados como feras, criaturas perigosas e nefastas que certamente nos destruiriam se lhes caíssemos nas mãos.
Disso resulta que aquele que tenta impor a outro o poder absoluto, põe-se em estado de guerra com ele, devendo isso ser entendido como declaração de intenções contra a vida do próximo, donde há motivos para concluir que quem a outrem subjuga, dele usará segundo lhe aprouver, quando o tiver cativo, chegando mesmo a aniquilá-lo, se lhe der na veneta; não há quem desejo ter outrem sob seu poder absoluto senão para coagi-lo á força ao que é contrario à liberdade, isso é, torná-lo escravo. Escapar de semelhante opressão é a única certeza de preservação; e a razão nos diz para ter como inimigo da própria preservação aquele que tolher a alguém a liberdade que a garante, de sorte que quem tenta escravizar a outrem põe-se com ele em estado de guerra. Aquele que, no estado de natureza tira a liberdade que cabe a todos nesse estado, deve forçosamente ser tido como suspeito de querer arrebatar tudo o mais. Essa liberdade é fundamental de todo o resto; assim aquele que, no estado de sociedade, tirasse a liberdade aos membros dessa sociedade ou comunidade, deve supor-se querer apossar-se de tudo deles, tendo de considerar-se, portanto, como em estado de guerra.
Desaparecendo o uso da força, desfaz-se o estado de guerra entre os que pertencem a uma sociedade, cada qual por seu lado sujeito à determinação imparcial da lei, quando então torna-se patente o recurso do apelo pelo dano sofrido e a
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preservação do dano futuro, todavia, quando não há tal possibilidade, como no estado de natureza, por falta de lei positivas e da autoridade de juízes a quem apelar, uma vez instalado o estado de guerra, continua com o direito do inocente de aniquilar a outra parte sempre que puder, at