iv seminÁrio internacional de polÍticas pÚblicas...
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Marilene Gabriel Dalla Corte
Rosane Carneiro Sarturi
(Organizadoras)
IV SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS DA
EDUCAÇÃO BÁSICA E SUPERIOR, V SEMINÁRIO INTERNACIONAL
DE GESTÃO EDUCACIONAL E X SEMANA ACADÊMICA DO CURSO
DE ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO EDUCACIONAL DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA
Santa Maria, RS, Brasil.
LABORATÓRIO DE PESQ. E DOC. – CE
2016
ORGANIZADORAS
Profª. Dra. Marilene Gabriel Dalla Corte
Profª. Dra. Rosane Carneiro Sarturi
COORDENADORES DOS EIXOS TEMÁTICOS
Eixo 1
Prof. Dra. Graziela Franceschet Farias (UFSM)
Prof. Ms. Andrelisa Goulart de Mello (PPGE/UFSM)
Eixo 2
Prof. Dra. Ana Carla Powaczuk (UFSM)
Prof. Ms. Mônica de Souza Trevisan (PPGE/UFSM)
Eixo 3
Prof. Dra. Gaziela Escandiel de Lima (UFSM)
Prof. Ms. Jucemara Antunes (PPGE/UFSM)
Eixo 4
Prof. Dra. Leandra Bôer Possa (UFSM)
Prof. Dr. Joacir Marques da Costa (PPGE/UFSM/OBEDUC)
COMISSÃO CIENTÍFICA
Alana Claudia Mohr (UFSM)
Alessandra Giuliani Pimenta (UFPB)
Ana Carla Hollweg Powaczuk (UFSM)
Andréa Tonini (UFSM)
Andreia Vedoin (UFSM)
Anie Pereira Goulart Gomes (UFSM)
Antonio Minussi Righes (IFF – São Vicente do Sul)
Aruna Noal Correa (USFM)
Camila Righi Medeiros Camillo (UFSM)
Carla Cristina Dutra Burigo (UFSC)
Cláucia Honnef (UFSM)
Daliana Löffler (UFSM)
Eliana da Costa Pereira de Menezes (UFSM)
Elisane Maria Rampelotto (UFSM)
Elisiane Machado Lunardi (UFSM)
Gabriel dos Santos Kehler (UNIPAMPA)
Gabriela Da Ros de Araújo (UFSM)
Giovana Fracari Hautrive (UNIFRA)
Gislaine Rossetto (UFSM)
Guilherme Howes (UNIFRA)
Halana Garcez Borowsky (UFSM)
Julia Bolssoni Dolwitsch (UFSM)
Juliana Limana Malavolta (IFF – Jaguari)
Karine Sefrin Speroni (UFPel)
Kelly Werle (UFSM)
Laila Azize Souto Ahmad (IFF – Jaguari)
Larissa Freitas (Prof. Educação Básica)
Laura Pippi Fraga (UFSM)
Laura Wunsch (UFRGS)
Leandra Costa da Costa (UFSM)
Liane Teresinha Wendling Roos (UFSM)
Lorena Inês Peterini Marquezan (UFSM)
Marcia Doralina Alves (UFSM)
Márcia Lise Lunardi Lazzarin (UFSM)
Maria Alcione Munhoz (UFSM)
Maria Eliza Rosa Gama (UFSM)
Maria Talita Fleig (UFSM)
Naila Cohen Pominitz (Prof. Educação Básica)
Neusete Machado Rigo (UFFS)
Priscila Arruda Barbosa (UFSM)
Rejane Cavalheiro (UNIFRA)
Sabrina Fernandes Castro (UFSM)
Silvana Zancan (UFSM)
Siméia Tussi Jacques (UFSM)
Taiana Flores de Quadros (Prof. Educação Básica)
Tania Mara Zancanaro Pieczkowski (UNICHAPECÓ)
Taciana Camera Segat (UFSM)
Tatiane Negrini (UFSM)
Valéria Fontoura Nunes (UNIPAMPA)
Valmor Scott Junior (UFPel)
Vanessa Alves da Silveira de Vasconcellos (UFSM)
Vanessa Sandri (UFSM)
Vera Lúcia Morostega (UFSM)
Viviane Kanitz Gentil (URCAMP/UNIPAMPA)
REVISÃO E EDITORAÇÃO
Marilene Gabriel Dalla Corte (UFSM)
Marina Lara Silva dos Santos Teixeira (OBEDUC/CAPES – UFSM)
Raphael Giordano do Nascimento e Silva (OBEDUC/CAPES – UFSM)
APOIO TÉCNICO
Camila Moresco Possebon (OBEDUC/CAPES – UFSM)
Daiane Lanes de Souza (OBEDUC/CAPES – UFSM)
Gabriela Barichello Mello (OBEDUC/CAPES – UFSM)
Marina Lara Silva dos Santos Teixeira (OBEDUC/CAPES – UFSM)
Ticiane de Arruda da Silva (PPGE – UFSM)
Patricia dos Santos Zwetsch (OBEDUC/CAPES – UFSM)
REALIZAÇÃO
Programa Observatório de Educação da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior – CAPES
Grupo de Pesquisa ELOS/CNPq da Universidade Federal de Santa Maria
Programa de Pós-Graduaçao em Políticas Públicas e Gestão Educacional –
PPPG/UFSM
APOIO
Centro de Educação – CE/UFSM
Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Públicas e Gestão Educacional –
GESTAR/CNPq/UFSM
Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Especial e Inclusão –
GEPE/CNPq/UFSM
Associação Desportiva da Universidade Federal de Santa Maria – ADUFSM
SITE
http://coral.ufsm.br/seminariopoliticasegestao/2016/
BASE NACIONAL COMUM E A EDUCAÇÃO BÁSICA: UM OLHAR SOBRE A
AUTONOMIA DO PROFESSOR FRENTE AS ATUAIS MUDANÇAS NO CENÁRIO
EDUCACIONAL BRASILEIRO
Micheli Bordoli Amestoy1
Aline Bona Omelczuk 2
Luiz Caldeira Brant de Tolentino-Neto3
Eixo 2 – Formação de Professores
RESUMO
O objetivo do presente artigo é refletir sobre as atuais mudanças no cenário do currículo escolar brasileiro e como estas mudanças impactarão os cursos de formação inicial e continuada de professores na sua prática pedagógica em sala de aula. Discorreremos também, acerca de questões relacionadas à autonomia do professor frente à Base Nacional Comum (BNC) e como este profissional trabalhará a dicotomia presente neste documento: uma parte comum e uma parte diversificada. Para isso, entenderemos a BNC como um plano de formação para uma determinada etapa da escolaridade, que permita além de definir o que ou não ensinar aos estudantes, deve levar a reflexões sobre o que é conhecimento e o que é conhecimento útil na sociedade atual. Isso porque, na ausência de uma base nacional, são as matrizes curriculares das avaliações externas que acabam determinando o que deve ou não ser ensinado nas escolas. Ações completamente equivocadas, uma vez que a função dessas avaliações deveria ser auxiliar o Estado e a sociedade a verificar se os estudantes tiveram, de fato, seus direitos de aprendizagem garantidos. Essa proposta de reformulação curricular torna-se interessante até chegarmos a grande polêmica que envolve a sua implementação: Será que os professores já em exercício estão preparados para essa mudança curricular e atitudinal? E os futuros professores serão preparados para que tipo de atuação? Serem atores de sua própria prática em sala de aula, ou meros reprodutores de conteúdos que serão (continuarão) sendo cobrados, avaliados externamente e rankiados nacional e internacionalmente?
Palavras-chave: Educação. Formação de Professores. Autonomia. Currículo Comum.
INTRODUÇÃO
O direito à educação é um tema iminente no contexto das atuais políticas
educacionais no Brasil. Embora nas últimas décadas tenha havido avanços
significativos no caminho de universalizar o acesso à escolaridade básica, o desafio
da qualidade da oferta permanece e envolve múltiplos fatores com implicações diretas
nas políticas educacionais. A educação vista do óculos do direito social e da
democratização de um ensino de qualidade constitui um dos maiores obstáculos a
1 Mestre em Educação em Ciências. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação em
Ciências: Química da Vida e Saúde - UFSM. E-mail: [email protected]. 2 Mestranda em Educação em Ciências do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências Química da Vida e Saúde - UFSM. E-mail: [email protected]. 3 Doutor em Educação. Professor do departamento de Metodologia do Ensino - UFSM. E-mail: [email protected].
serem transpostos tanto pelos formuladores das políticas públicas educacionais,
quanto pelos órgãos de fomento a educação básica.
As mudanças relacionadas ao papel da escola e a concepção de conhecimento
escolar, remodelam o modo de conceber a profissão docente e a formação de
professores. Diante da expectativa lançada à escola atual, o professor assume
importante atividade de mediar à aprendizagem dos educandos considerando
diferentes realidades e universos culturais, ou seja, a importante mediação entre a
homogeneização cultural versus o multiculturalismo crítico.
O novo Plano Nacional de Educação (PNE), Lei nº 13.005/2014 tem como foco
planejar e orientar a execução de melhorias no âmbito das políticas públicas
educacionais e, para isso traça diretrizes e metas para a educação brasileira para a
próxima década (2014-2024). Entre suas metas, destaca-se a meta 7, a qual se
relaciona com o fomento da qualidade da Educação Básica, do fluxo escolar e da
aprendizagem.
Uma das estratégias estabelecidas pelo novo PNE é a formulação e
implementação da Base Nacional Comum (BNC) para melhorar a educação básica,
abrangendo a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, tanto de
escolas públicas quanto privadas do país. A proposta de um currículo nacional comum
deve ser encaminhada ao Conselho Nacional de Educação (CNE) até junho de 2016.
Embora prevista na Constituição de 1988 e no Art. 26 da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (LDB 9394/96), a Base Nacional Comum nunca foi implementada,
ainda que seja considerada por alguns especialistas como fundamental para o avanço
educacional e para a garantia da qualidade do ensino.
De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais (2010) - Base
Nacional Comum - significa o conjunto de
“conhecimentos, saberes e valores produzidos culturalmente, expressos nas políticas públicas e que são gerados nas instituições produtoras do conhecimento científico e tecnológico; no mundo do trabalho; no desenvolvimento das linguagens; nas atividades desportivas e corporais; na produção artística; nas formas diversas e exercício da cidadania; nos movimentos sociais” (Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010, Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica, Art. 14).
Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio
devem observar não só a Base Nacional Comum, como também a parte diversificada
que prevê que:
“cada sistema de ensino e estabelecimento escolar complementa a base nacional comum, prevendo o estudo das características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da comunidade escolar, perpassando todos os tempos e espaços curriculares constituintes do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, independentemente do ciclo da vida no qual os sujeitos tenham acesso à escola”. (Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010, Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica, Art. 15).
Diante desse atual contexto educativo, se fazem necessárias discussões e
reflexões acerca das mudanças que estão sendo projetadas para a Educação Básica
e, consequentemente, para a formação dos professores. Além disso, nos leva,
também, a indagarmos sobre as possíveis alterações que se direcionam a partir das
políticas públicas. A Base Nacional Comum impactará não apenas no currículo, mas
no ambiente escolar, na formação de professores e na elaboração de materiais
didáticos. Porém, nesse trabalho nos deteremos apenas nas questões relacionadas à
formação de professores.
BASE NACIONAL COMUM: HÁ UMA NECESSIDADE REAL?
O debate sobre a necessidade de uma base nacional comum curricular no Brasil
não é recente. Segundo a linha do tempo elaborada pelo Ministério da Educação
(MEC), a discussão atual teria se iniciado com a Constituição de 1988, seguindo com
a LDB (BRASIL,1996), a elaboração de Parâmetros Curriculares Nacionais (MEC,
1998a) e culminando com a promulgação das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais
para a Educação Básica e do Plano Nacional de Educação (PNE). (BRASIL, 2010).
Um dos objetivos específicos que se pretende atingir por meio da implementação
da Base Nacional Comum da Educação é assegurar que todo estudante brasileiro,
em todas as regiões do país, tenha garantido o acesso à aprendizagem de
conhecimentos fundamentais, promovendo equidade e maior coerência em todo o
sistema educacional.
Isso significa que, uma vez homologada, a BNC terá de ser adotada por todas
as redes de ensino. Por isso, a definição dos limites do documento é motivo de
grandes discussões. A escolha sobre o que e como ensinar costura uma polêmica e
divide opiniões entre pesquisadores, docentes e políticos em todo o país.
Por um lado, há um grupo de pessoas que não consideram pertinente uma
proposta de base comum, pois levam em conta o tamanho do país e suas diversidades
econômicas, sociais e culturais, além de acreditarem que essa proposta possa vir a
engessar e padronizar o currículo do país.
Por outro lado, há um grupo de pessoas que considera um currículo nacional
como sendo um instrumento importante porque respeita a orientação do artigo 205 da
Constituição Brasileira que estabelece como objetivo da educação “o pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho”, ou seja, explicita os objetivos de duas naturezas
usualmente referidas como cognitivos e não cognitivos, que os alunos devem alcançar
em sua escolaridade básica, etapa por etapa.
Esse grupo de pessoas favoráveis ao currículo nacional vê na base uma
possibilidade (inexistente até o momento) de aproximar realidades diferentes e tentar
organizar um consenso em relação àquilo que se acredita ser essencial a todos os
alunos em todas as escolas do país. Além disso, aos que defendem a criação e
implementação de um currículo nacional está presente também o argumento de que
essa reformulação curricular deverá dialogar com outras políticas públicas como, por
exemplo, a formação de professores.
A discussão torna-se acirrada quando nos deparamos com o fato de não haver
consenso sobre o que ensinar. Porém, a ausência desse consenso não significa que
vale ensinar qualquer coisa. Mas, implica em problematizar e discutir o que
ensinamos, por que ensinamos e como o ensino se conecta com a educação e com a
formação do sujeito educado. A proposta da base nacional comum tem propiciado até
o momento, discutirmos questões importantes para a educação como um todo, uma
vez que se não discutimos as finalidades da educação, podemos até ensinar a ler, a
escrever e a contar, mas deixaremos de problematizar o sujeito que está sendo
educado, e chegaremos a nos perguntar que sujeito é esse que estou ajudando a
formar, que formação é essa que estou fazendo parte?
AUTONOMIA DOCENTE: UMA CAPACIDADE CONCEDIDA, CONSTRUÍDA OU
ALCANÇADA?
De fato, a formação dos professores será atingida diretamente pela base comum,
posto que, a partir de sua implementação, ela deverá servir de guia norteador para
todo o processo de formação inicial, mais voltado para a prática docente e de
formação continuada. Para Moreira (2007),
[...] os conhecimentos pedagógicos [disciplinares] norteadores das decisões curriculares podem inscrever certa seletividade no modo como os docentes pensam, sentem e falam sobre os estudantes. Podem orientar seus discursos no sentido de classificar a criança, construindo-se um espaço em que a criança jamais pode ser uma criança “padrão”, “normal” (p. 287).
A formação de professores vem sendo discutida há algumas décadas, neste
sentido destaca-se os Decretos nº 2.306/1997, nº 3.860/2001/ e, atualmente, o
Decreto nº 5.773/2006, que flexibilizam a estruturação da educação superior no país
e, como decorrência, o princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão como seu parâmetro básico. Tais decretos incidiram, substantivamente, na
organização acadêmica, com desdobramentos efetivos na formação de professores.
Nos dias de hoje, são recorrentes muitos discursos sobre o processo de ensino-
aprendizagem, e com isso, a discussão frente ao papel do professor e da escola, com
relação ao aluno. Menciona-se a necessidade da escola e do professor em não focar
o ensino somente para os conhecimentos conceituais exigidos pelo currículo, mas que
o ensino também tenha como objetivo transformar, educar um cidadão assim como
torná-lo consciente e autônomo.
Nesse sentido, encontramos a autonomia como sendo um tema central,
inicialmente nos Parâmetros Curriculares Nacionais (1997; 1998). Neste documento,
destaca-se a importância de proporcionar ao aluno inserido na escola, uma formação
autônoma, onde, os professores e a escola tem como dever ensinar aos alunos como
se organizar, planejar, trabalhar em grupos e a se responsabilizarem por suas ações.
Desse modo, a autonomia é definida nos parâmetros curriculares da seguinte forma:
A autonomia refere-se à capacidade de posicionar-se, elaborar projetos pessoais e participar enunciativa e cooperativamente de projetos coletivos, ter discernimento, organizar-se em função de metas eleitas, governar-se, participar da gestão de ações coletivas, estabelecer critérios e eleger princípios éticos, etc. Isto é, a autonomia fala de relação emancipada, íntegra com as diferentes dimensões da vida, o que envolve aspectos intelectuais, morais, afetivos e sociopolíticos. Ainda que na escola se destaque a autonomia na relação com o conhecimento - saber o que se quer saber, como fazer para buscar informações e possibilidades de desenvolvimento de tal conhecimento, manter uma postura crítica comparando diferentes visões e
reservando para si o direito de conclusão, por exemplo - ela não ocorre sem o desenvolvimento da autonomia moral (capacidade ética) e emocional que envolvem auto respeito, respeito mútuo, segurança, sensibilidade, etc. (PCN, 1997, p.62).
Nessa perspectiva, ao se indicar que a autonomia deve ser ensinada,
desenvolvida no aluno, como sendo resultado do trabalho do professor, apresenta-se
constante contradição, assim como afirma Hernandes (2002), pois a prática dos
docentes está imposta por imposições e prescrições externas. Nesse sentido, o
professor encontra-se em um momento de reordenação e não de desenvolvimento de
sua própria autonomia.
Nesse ponto de vista é necessário um olhar mais atento a formação de
professores, pois é exigido que o professor não só promova, mas também desenvolva
no aluno a autonomia, sendo que dificilmente, esse educador possui ou foi estimulado
em sua formação a tê-la. Assim como menciona Mello (2000),
Ninguém facilita o desenvolvimento daquilo que não teve oportunidade de aprimorar em si mesmo. Ninguém promove a aprendizagem de conteúdos que não domina, a constituição de significados que não compreende nem a autonomia que não pôde construir. (MELLO, 2000, p.102)
Frente a essa questão buscamos verificar se existem legislações e normas,
quais são elas e o que dizem sobre a formação do professor e a relação com a
autonomia docente. Nesse sentido, a Lei de Diretrizes e Bases (Lei 9394/96) LDB -
traz necessidades e deveres das universidades, escolas, órgãos governamentais,
assim como de cada nível escolar. Frente a essas e inúmeras outras questões, a
formação do professor também é mencionada no documento, porém, o termo
autonomia não é referenciado juntamente com a formação de professores, somente
com menção as instituições de ensino superior.
A formação de professores é prevista pela LDB, tendo como fundamentos a
presença de sólida formação básica, a fim de propiciar o conhecimento de
fundamentos científicos e sociais do meio, assim como realizar associações entre
teorias e práticas, através de estágios supervisionados e capacitação em serviço e o
aproveitamento da formação e experiências anteriores, em instituições de ensino e
em outras atividades.
Neste sentido, o PNE também apresenta considerações semelhantes à LDB,
pois o termo autonomia é apontado somente nas estratégias 19.5 e 19.7, presentes
na meta 19, com relação à promoção e a busca de autonomia nas instituições de
educação básica, através da formação de conselhos e questões administrativas, a
saber:
19.5) estimular a constituição e o fortalecimento de conselhos escolares e conselhos municipais de educação, como instrumentos de participação e fiscalização na gestão escolar e educacional, inclusive por meio de programas de formação de conselheiros, assegurando-se condições de funcionamento autônomo;
19.7) favorecer processos de autonomia pedagógica, administrativa e de gestão financeira nos estabelecimentos de ensino; (BRASIL, 2014, p.60)
Porém, o documento também traz como um dos objetivos a melhora na formação
inicial e continuada dos professores, principalmente nas metas 13 e 14, as quais
buscam:
Meta 13: elevar a qualidade da educação superior e ampliar a proporção de mestres e doutores do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior para 75% (setenta e cinco por cento), sendo, do total, no mínimo, 35% (trinta e cinco por cento) doutores.
Meta 14: elevar gradualmente o número de matrículas na pós-graduação stricto sensu, de modo a atingir a titulação anual de 60.000 (sessenta mil) mestres e 25.000 (vinte e cinco mil) doutores. (BRASIL, 2014, p.43-46)
Tendo inúmeras estratégias para que esse processo se concretize, a maioria se
refere a melhorar a qualidade do ensino, tendo como espinha dorsal dessa melhora,
avaliações e auto avaliações impostas às instituições.
AS RELAÇÕES ENTRE: AVALIAÇÕES EXTERNAS, PNE E FORMAÇÃO
DOCENTE
Embora não tenhamos um currículo nacional obrigatório, temos as matrizes
curriculares elaboradas para as avaliações externas (processo de caráter externo a
escola) que acabam estabelecendo uma configuração curricular e ocupando,
inadequadamente, o lugar do currículo.
Exemplo disso, é a Prova Brasil e o SAEB (Sistema de Avaliação da Educação
Básica) que apresentam apenas um ‘recorte’ do currículo elencado em suas matrizes
e mesmo assim, assumem de maneira equivocada a responsabilidade e o papel de
prescrição curricular nas escolas.
Isso porque, na ausência de uma base curricular comum, determinam o que deve
ou não ser ensinado nas escolas, uma vez que, no atual governo federal, o que
importa são os resultados nos rankings internacionais e nacionais. Quando na
verdade o que deveria ocorrer é que a Prova Brasil, por exemplo, deveria auxiliar o
Estado e a sociedade a verificar se os estudantes tiveram, de fato, seus direitos de
aprendizagem garantidos.
Diante desse cenário, temos no PNE (BRASIL, 2014) algumas estratégias para
a melhoria da qualidade da educação, sendo que para isso é importante à execução
de algumas políticas públicas que dialogue com a elaboração de uma Base Curricular
Nacional, entendendo-a como um plano de formação para uma determinada etapa da
escolaridade, que permita além de definir o que ou não ensinar aos estudantes, refletir
sobre o que é conhecimento e o que é conhecimento útil na sociedade atual.
Outra estratégia presente no PNE é a construção de um Sistema Nacional de
Educação (SNE), uma vez que o que temos até o momento no país trata-se de uma
‘estrutura educacional’ e não um ‘sistema’. Desde a época do Manifesto dos Pioneiros
da Educação (1932) é sabido a dificuldade em se construir um Sistema Educacional,
devido as diversidades existentes no país, ao passo que para se ter um ‘sistema’,
segundo Saviani (2008, p.72) é necessário ter a unidade de vários elementos
intencionalmente reunidos, de modo a formar um conjunto coerente e operante”.
O que temos na verdade, são leis (estruturadas) que funcionam como a coluna
vertebral de nossa educação - a Constituição Federal de 1988 e a LDB/9394/96 -
cercada de políticas públicas que, sem continuidades, muitas vezes, impedem que um
‘sistema’ educacional de fato exista no país.
Outra estratégia tecida pelo PNE é a melhoria da qualidade da formação inicial
e continuada de professores. Para que isso de fato ocorra, é necessário que se
consolide a Política Nacional para a Formação dos Profissionais da educação, bem
como a urgência do estabelecimento de diretrizes nacionais para a carreira docente e
o cumprimento da meta 20 desse plano que estipula 10% do PIB para a educação,
garantindo assim que as políticas públicas aqui descritas articulem-se para uma
melhor organização e execução da gestão educacional.
Ainda sobre a questão da formação de professores, o PNE entre suas
estratégias apresenta a proposta de uma BNC que se consolidada, anunciará algumas
mudanças nos cursos de formação docente para que os futuros profissionais do
magistério tenham uma noção da ‘base’ para assim melhor entendê-la e aplica-la.
Para alguns autores, a garantia de uma BNC é colocada como um requisito para
a melhoria da formação docente, desde que esta respeite a parte diversificada
presente no documento e a autonomia final em sala de aula do professor. Entre as
muitas polêmicas que envolvem a BNC, a autonomia do professor é uma delas.
Muito se pergunta como o professor irá proceder frente aos conteúdos
selecionados para a parte comum do documento, se o professor deverá
obrigatoriamente ensinar todos os conteúdos ali presentes ou haverá liberdade e
flexibilidade para escolhas?!
A resposta para isso ainda é uma incógnita, o que se sabe até o momento é que
para cada área do conhecimento existem algumas ideias e procedimentos que são
fundamentais para qualquer aluno em qualquer escola do país. A questão de como o
professor irá trabalhar os conteúdos considerados da ‘parte comum’ e da ‘parte
diversificada’ dependerá de como esse professor será instrumentalizado para utilizar
ou não a sua autonomia na sua prática diária.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As decisões em torno do currículo incitam posições divergentes, reflexões e
discussões em vários âmbitos, sobretudo no âmbito acadêmico. Diante do atual
cenário educacional brasileiro, das discussões e polêmicas em relação à
implementação ou não de uma Base Nacional Comum para a educação do país,
algumas questões são mais debatidas do que outras, como é o caso da questão das
mudanças curriculares dos cursos de licenciaturas. Isso porque, uma vez essa
proposta em ação, os cursos formadores de professores deverão se adequar as
novidades curriculares para melhor instrumentalizar os futuros profissionais do
magistério da Educação Básica.
Outra questão relaciona-se a autonomia docente frente a um documento que
tem como objetivo universalizar os conteúdos para todos os alunos do país, mas
apresenta uma dualidade em sua estrutura: uma parte comum (60%) e uma parte
diversificada (40%). Os professores já em exercício de sua profissão estão preparados
para essa mudança curricular e atitudinal? E os futuros professores serão preparados
para que tipo de atuação? Serem atores de sua própria prática em sala de aula, ou
meros reprodutores de conteúdos que serão (continuarão) sendo cobrados, avaliados
externamente e rankiados nacional e internacionalmente? Questiona-se o fato de não
estarmos correndo o risco de que o ‘comum’ previsto na base vire o ‘mínimo’ tanto na
educação básica quanto nos cursos de licenciaturas.
Com relação à formação de professores (inicial e continuada), é inevitável que
mudanças deverão acontecer nos cursos de licenciaturas. Porém, pertinente ou não,
a proposta de uma base nacional comum, é inegável até o momento, que essa
proposta tem proporcionado em todo o país discussões sobre a questão curricular,
principalmente ausente nas escolas da educação básica e praticamente inexistente
no ensino superior. Aprovada ou não essa proposta, ela já deixa a sua contribuição
até o momento que é a oportunidade do diálogo entre modalidades distintas da
educação brasileira.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9394/96. 1996. Disponível:<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12907>. Acesso em: 19 abr. 2016.
______. Ministério da Educação. Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino, 2014. Plano Nacional de Educação, Brasília: MEC/SASE, 2014. Disponível em:< http://pne.mec.gov.br/>. Acesso em: 26mar. 2016.
______. Plano Nacional de Educação 2014-2024: Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE) e dá outras providências. – Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2014. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm> Acesso em: 24 abr. 2016.
______. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: introdução aos parâmetros curriculares nacionais. (Ensino de 1ª a 4ª série) - Brasília: MEC/SE, 1997. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf> Acesso em: 20 abr. 2016.
______. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: introdução aos parâmetros curriculares nacionais. - Brasília: MEC/SEF, 1998. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/introducao.pdf> Acesso em: 20 abr. 2016.
HERNANDES, M. L. Q. A professora em constituição nas relações de trabalho: uma aproximação do conceito de autonomia. In: Reunião Anual da ANPED. GT 08. 2002. Caxambú-MG. Disponível em: www.anped.org.br. Acesso em: 20 abr.2016.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Aprova a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Básica. Resolução Nº 4, de 13 de Julho de 2010. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb004_10.pdf. > Acesso em 20 mar. 2016.
MELLO, Guiomar N. Formação inicial de professores para a educação básica: uma (re) visão radical. São Paulo em Perspectiva, vol. 14, n.1, São Paulo, Jan./Mar. 2000.
MOREIRA, Antônio F. B. A importância do conhecimento escolar em propostas curriculares alternativas. Educ. rev. [on line], Belo Horizonte, v. 45, p. 265-290, jun. 2007.
SAVIANI, Demerval. Educação brasileira: estrutura e sistema, 10ª ed. Campinas, Autores Associados, 2008