j. w. rochester (wera krijanowskaia) - os legisladores

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  • 7/27/2019 J. W. Rochester (Wera Krijanowskaia) - Os Legisladores

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    W. I. KRYJANOVSKAYA(ROCHESTER)

    OS

    LEGISLADORESRomance

    1930

    Editora M. GudchovRiga Letnia

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    Captulo I

    O sol punha-se, coruscando os raios purpreos sobre a vasta plancie

    ladeada pelos paredes escuros da floresta e das montanhas arborescentes.

    O denso e alto mato vicejava por toda a campina; aqui e ali, viam-se

    espalhados grupos de rvores de troncos enormes e folhagens exuberantes, que

    formavam no local uma copa praticamente impenetrvel.

    Animais de tamanho descomunal e aspecto estranho podiam ser vistos

    correndo ou esticados pachorrentos, aquecendo-se ao sol. Seus corpos compridos e

    flexveis findavam em cauda, como a de drago; dois pares de ps curtos e grossos

    serviam-lhes de locomoo, e as enormes asas, to possantes como as de uma

    guia, possibilitavam-lhes alarem vo; as cabeas estreitas, com grandes olhos

    sugerindo inteligncia, assemelhavam-se s de aqunios. Eram animais totalmente

    negros, como as asas de um corvo, ou de um branco prateado, ou, ainda, de um

    vermelho-ruivo aurifulgente, com matiz esverdeado.

    No muito longe daquele incomum rebanho, embaixo da folhagem densa,

    estava reunido um grande grupo de homens, de estatura colossal. Suas nicas

    vestimentas eram peles de animais que cobriam os quadris cprico-avermelhados.

    Os cabelos negros, rijos e desgrenhados, caam sobre os ombros; seus rostos de

    feies grosseiras e maxilares salientes eram imberbes. Estavam armados de paus

    grossos, nodosos, e machados curtos de pedra, enfiados atrs dos cintos;

    empunhavam uma corda comprida enrolada, e uma das pontas amarrada a uma

    pedra. Ajeitados nos tocos das rvores ou no relvado, eles conversavam; suas vozes

    guturais podiam ser ouvidas de longe. Eram, pelo visto, pastores.

    Subitamente, um dos homens ergue-se e apontou para um grupo de

    mulheres, reconhecveis por seus cabelos longos e seios avantajados; elasacabavam de sair da floresta e se aproximavam lpidas em direo aos homens.

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    semelhana deles, suas vestes resumiam-se a uma nica pea: uma espcie de

    tanga de folhas tranadas, de cana de acar. Dentro de suas cestas rsticas e

    toalhas de palha, elas levavam o almoo para os pastores. Compunha-se este de

    vrios tipos de frutas, razes, e peixe cru; dentro de recipientes de casca de btula,

    havia um lquido amarelado de odor aromtico.

    Aps depositarem a comida aos ps dos homens, as mulheres prostraram-se

    em deferncia diante deles, depois, levantaram-se rapidamente e comearam a

    contar rapidamente alguma coisa, provocando muita agitao entre os pastores.

    - O homem da caverna est nos chamando! Por que ser? surpreendeu-se

    um dos homens, visivelmente perturbado.

    - E os outros tambm foram chamados? interessou-se um deles.

    - O mensageiro nos disse que alguns mensageiros partiram para os vales e

    florestas. Mas a reunio, marcada no Vale da Pedra Salgada, somente para os

    mais velhos e alguns convidados especiais asseverou uma das mulheres.

    Aps comerem rapidamente, todos se puseram a caminho.

    Depois de uma caminhada bastante longa, a multido saiu numa ampla

    campina margeada de rvores colossais; seus troncos eram ocos por dentro e

    serviam de moradia aos aborgenes.As singulares tocas eram atapetadas por dentro com peles de animais; ali

    mesmo, viam-se utenslios domsticos, feitos de cascas de rvores, e

    aprovisionamentos alimentares. Enquanto as mulheres cuidavam da casa, as

    crianas, completamente nuas, corriam alegres ao ar livre. Havia pelo menos uma

    centena daquelas casas arbreas.

    Entre os moradores a agitao era visvel. Reunidos em pequenos grupos,

    discutiam algo em voz alta; os recm-chegados participavam imediatamente daconversa.

    Depois, da multido adiantaram-se cerca de cinqenta homens e mulheres e

    dirigiram-se pela trilha em direo mata.

    Aps caminharem por um longo tempo, deram num amplo vale cercado nos

    flancos pela floresta e montanhas pontiagudas, sulcadas por uma infinidade de

    fissuras.

    No centro do vale, sobre um montculo erguia-se uma colossal rocha cbica,e, em cima dela, repousava outra pedra de formato cnico, lembrando um pequeno

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    obelisco. Ao redor daquele cone de basalto preto, polido e refulgente, amontoavam-

    se ramagens resinosas.

    O local estava apinhado de gente. Homens e mulheres, formando um bloco

    compacto, apertavam-se junto aos ps do montculo; a luz avermelhada e fumacenta

    dos archotes lanavam clares purpreos sobre aquela estranha reunio.

    Subitamente a multido se agitou e se apertou para formar uma passagem,

    ouvindo-se o rolar de um sussurro:

    - O homem da caverna...! O homem da caverna...!

    Pela passagem formada entre a multido, vinha chegando um homem de

    aspecto bastante estranho. Era de uma estatura descomunal e magra feito um

    esqueleto. O rosto oblongo e ossudo, lbios grossos, nariz chato e fronte baixa, era

    lvido e reverberava em tonalidade azul, como se o sangue que corria debaixo da

    pele fosse da mesma cor. Seus olhos assentavam-se fundos nas orbitas e estavam

    incrivelmente esbugalhados; entretanto, o mais surpreendente nele era a existncia

    de um terceiro olho, localizado na nuca, enquanto que a cabea era praticamente

    desprovida de cabelo. Vestia uma tnica de pele de animal; seus braos e pernas de

    tamanho desproporcional estavam desnudados.

    Com a sua chegada, a multido caiu genuflexa e comeou a baterrepetidamente a testa na terra. Respondendo saudao com uma leve inclinao

    da cabea, o homem foi para o montculo, galgou os degraus, deu sete voltas ao

    redor da pedra, reverenciou-a, inclinando-se at o solo, e prostrou-se diante dela,

    recitando frmulas mgicas em sua voz gutural.

    A seguir, jogou sobre a folhagem ali preparada um lquido denso como

    alcatro, tirou de um saquinho amarrado atrs da cintura duas pedras de formato

    chato, e comeou a friccion-las uma na outra, at que delas salpicassem fascas,que acenderam as ramagens em volta da pedra cnica.

    Ouviu-se nesse instante, um barulho estridente e uma fumaa densa

    subiu s alturas. O homem de trs olhos comeou a urrar e a rodopiar com rapidez

    extraordinria, sendo imitado pela multido, Homens e mulheres dando-se as mos

    formavam uma corrente em volta da rocha, rodopiando numa dana tresloucada em

    meio a urros selvagens o que deveria, provavelmente, constituir uma espcie de

    canto, uma vez que as vozes soavam alto, ora baixo, sem nenhum ritmo, entretanto,ou melodia determinada.

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    No dia marcado, tardezinha, toda a populao estava de p; o nervosismo

    crescia a cada hora, e a ansiedade pr aquele extraordinrio acontecimento parecia

    tomar conta no s de pessoas, mas de toda a natureza.

    A impacincia da turba selvtica crescia; alguns jovens dos mais corajosos e

    argutos, tendo j domesticado animais alados, anteriormente descritos, montaram-

    lhes o lombo e alaram s alturas para assistirem, entre os primeiros, aos deuses

    aguardados.

    Finalmente, pelo cu derramou-se uma luz rosada, reverberando ao amarelo

    dourado, e naquele fundo radioso comeou a desenhar-se a frota enigmtica,

    descendo velocidade estonteante das alturas celestes.

    De cada nave, feito sis, dardejavam correntes de luz ofuscante; aos ouvidos

    de todos chegavam acordes de msica inaudita.

    Os sons harmnicos, suaves e ao mesmo tempo indescritivelmente

    poderosos, faziam estremecer cada fibra daqueles humanos, desde os mais rudes;

    calados, atnitos e trmulos, eles deslumbravam-se por aquele extraordinrio

    espetculo.

    A msica das esferas causou ainda outro fenmeno bem inesperado; das

    profundezas dos pntanos e rios, das montanhas e florestas, saram as maisvariadas espcies de animais e monstros, grandes e pequenos todos que

    anteriormente provocavam grande medo nas pessoas, fazendo-as fugir apavoradas.

    No obstante, as terrficas feras no tinham inteno, aparentemente, de causar

    algum mal aos humanos, enfeitiadas que estavam, ouvindo a melodia mgica que

    parecia envolver todos os homens e animais, acalmando-os.

    Entrementes, a frota espacial aproximou-se mais da terra. As luzes que dela

    rutilavam tornaram-se multicoloridas, e os vales e as montanhas viram-se inundadosalternadamente de azul safira, verde esmeralda e vermelho rubi; o ar saturou-se de

    fludos aromticos, maravilhosos.

    Agora j se podia vislumbrar, nitidamente, na ponta de cada aeronave uma

    portinhola aberta, onde se perfilavam seres humanos, altos e esbeltos, trajando

    vestes brancas ou envoltos em vus que mais pareciam nvoas prateadas. Seus

    semblantes eram de beleza celestial e, de fato, aos rudes seres primitivos eles,

    pareciam divinos.

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    Com ar sereno e pensativo examinavam os adeptos aquela terra nova seu

    futuro campo de batalha e aquela massa humana, junto da qual foi convocados

    para reformar, fornecer luz espiritual e calor humano, ministrar os fundamentos da

    magnitude do Criador, os princpios da ordem e da orientao para o caminho da

    perfeio.

    Silente como embalada pelas ondas melodiosas, passou a frota area por

    sobre os vales e as florestas, e, alando vo para as alturas, desapareceu atrs das

    montanhas.

    A turba primitiva parecia estar em letargia. Apoderou-se dela um sentimento

    novo, um misto de encantamento, exaltao diante daquela beleza perfeita, e o

    reconhecimento de sua fealdade. No era um sentimento eivado de inveja, pois que,

    para eles, eram deuses aqueles seres de beleza extraterrestre.

    Assim, exaltados, num estado jamais vivido, olhavam os selvagens

    impressionados em direo cordilheira, atrs da qual deveriam estar os deuses.

    Um temor supersticioso dominou-os, quando, de repente, acima dos pncaros das

    montanhas comearam a surgir tringulos gneos e depois se assomou a imagem

    colossal de uma criatura alada, empunhando espada flamejante. E todos

    compreenderam que aqueles stios se tornaram sagrados e que nenhum doshabitantes dos vales, montanhas e florestas poderia ousar aproximar-se daquela

    morada dos deuses.

    Numa das montanhas a margear a rea onde havia descido a frota dosadeptos, havia uma enorme gruta formada em parte pela prpria natureza, e, em

    parte, pelas mos humanas. Ali se reuniram cerca de vinte pessoas. Alguns dos

    paredes do salo subterrneo estavam ornados por esculturas; uma esfera

    luminosa, acoplada parede divisria, lanava sobre o ambiente uma luz

    suavemente azulada. Numa depresso profunda, lembrando um nicho, via-se um

    enorme bloco de pedra rubra esculpido em forma de tringulo, que tinha ao cesso

    assegurado por alguns degraus. O bloco, encimado por uma grande cruz em ouro

    macio, refulgia em clares fosfricos; do teto pendiam sobre a cruz sete lmpadas

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    de ouro, finamente trabalhadas, e, em cada uma, cintilava chama de cor diferente,

    correspondendo tonalidade do arco-ris. As luzes multicolores reverberavam

    pictoricamente sobre o ouro e o grande clice de cristal, junto base da cruz; de

    ambos os lados do clice, repousavam enormes livros encadernados em metal.

    Numa gruta contgua menor, tambm iluminada por uma esfera fixada

    parede, havia uma mesa e alguns bancos de pedra.

    Algumas pessoas ardorosas de p diante do nicho. Aps se curvarem por trs

    vezes ao solo, elas entoaram um hino em coro, imponente e melodioso, e passa

    para uma pequena gruta ao lado, onde uns se sentaram mesa, outros ficaram

    caminhando de um lado para o outro. Todos pareciam visivelmente perturbados e

    envoltos em pensamentos profundos.

    Eram homens belos, no desabrochar da juventude, de feies variadas, ainda

    que magras e aparentando serem ascetas. Em todos cintilava, invariavelmente, uma

    luz interna que parecia filtrar-se da pele, iluminando parcialmente seus rostos

    enrgicos; seus olhares denotavam muita inteligncia e vontade frrea, ainda que

    dessem a impresso de estarem acometidos de uma profunda tristeza.

    Trajavam o mesmo tipo de vestes longas, de couro escuro, cingidas por

    cordo, e calavam sandlias de palha.Finalmente, um homem aparentemente superior quebrou o silncio.

    - Irmos, o nosso trabalhou acabou, assim como a nossa expiao, eu

    espero... anunciou ele. chegada a hora de nos apresentarmos diante de

    nossos antigos mestres e juzes, para prestarmos conta da colossal misso a ns

    confiada. Parece-me oportuno juntarmos os documentos que constituem os

    resultados de nossa obra para lev-los aos nossos mestres.

    - O sino ainda no repicou, mas concordo com voce. bom estarmosprontos! Anuiu um dos homens erguendo-se.

    Eles foram buscar uma quantidade enorme de pergaminhos e colocaram-nos

    sobre a mesa. Estavam neles registradas as evolues astronmicas, as posies

    das constelaes e o movimento dos planetas desde os tempos imemorveis; outros

    continham a histria da evoluo do planeta e das raas que o habitaram; outros,

    finalmente, continham um relato detalhado do trabalho de cada um e os resultados

    obtidos.

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    Mal eles acabaram de arrumar e amarrar os pacotes dos valiosssimos

    documentos ouviu-se claramente trs repiques sonoros de sino. Todos

    estremeceram, alguns coraram de nervosismo.

    - Vamos fazer uma ltima abluo e elevar uma orao purificadora antes de

    nos apresentarmos aos nossos juzes tornou a falar o primeiro.

    Calados, um aps o outro, aproximaram-se da fonte que jorrava um jato fino

    de gua nas paredes da gruta, formando um tanque; lavaram em gua limpa o rosto

    e as mos, e, depois, retornaram para a gruta maior, onde pronunciaram uma

    orao e cantaram um hino. O imponente cntico, executado em grande jbilo e f

    ardorosa, louvava as foras do bem e a bem-aventurana da purificao; enquanto

    durou aquele grandioso louvor, o nicho inundou-se de maravilhosa luz rosada, o

    clice coriscou em feixes radiosos e encheu-se pela metade de um lquido dourado.

    J ubilosos e como que transfigurados, contemplavam os presentes aquele

    espetculo mgico. Depois um deles subiu os degraus, pegou o clice, tomou dele e

    passou aos outros para que tambm bebessem do contedo enigmtico. Em

    seguida, aquele que parecia o superior, pegou o clice nas mos, outro ergueu a

    cruz, os restantes dividiram entre si os livros e os pergaminhos e, segurando cada

    um na mo uma carga e na outra uma vela de cera acesa, todos se dirigiram escada esculpida na rocha e escondida atrs de uma salincia.

    Saram numa ampla rea cercada por altas montanhas; ali, entre uma

    vegetao luxuriante, erguia-se um enorme prdio de arquitetura mpar. Uma grande

    escadaria levava a uma galeria com colunas em forma de troncos de rvores, onde

    em enormes taas esculpidas de pedra ardiam ervas aromticas. Foi ali que eles se

    postaram em suas vestes simples e escuras de trabalho.

    Daquela altitude, diante deles se descortinava um panorama surpreendente.No longe da escada, descia uma trilha ladeada por arbustos floridos, que levava

    para uma campina larga, na qual estavam pousando os adventcios do planeta

    morto, Uma aps a outra ancoravam as aeronaves, e delas desciam os seus

    passageiros, que depois se reuniam

    Em grupos. Um dos grupos constitua-se de pessoas totalmente cobertas por

    longos vus; por entre aquele tecido prateado filtrava-se uma luz intensa, como se

    vinda de metal incandescido, enquanto que ao redor de suas cabeas irisavam halosaurifulgentes. Um pouco frente, agrupavam-se os magos em suas vestes alvas e

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    fachos na testa, denotando o seu grau, em insgnias, fulgindo nos peitos; mais

    adiante feito vises radiosas estavam as magas; os cavaleiros do Graal,

    lembrando colmia prateada; os adeptos de patente inferior e, finalmente, um

    grande nmero de terrqueos, que mereceram se transferidos para o novo planeta.

    Os ltimos pareciam tontos, tremiam agrupados sob a guarda dos seguranas.

    Os grandes servidores da luz, encabeados pelos hierofantes, carregando

    clices encimados por cruzes, dirigiram-se ao palcio, onde eram esperados pelos

    pioneiros do jovem planeta. Estes se lhes prostraram aos ps e, levantando-se,

    juntaram-se a eles. Entraram no enorme salo apenas os magos superiores, as

    magas, os cavaleiros do Graal, ficando em semicrculo no fundo. No centro, diante

    dos magos superiores, cobertos por mantos, postou-se, ento, o pequeno grupo de

    obreiros do novo mundo. Estes imediatamente entregaram aos adeptos a cruz, o

    clice e os livros encadernados em capas metlicas.

    Ouviu-se ento na sala, mergulhada em silncio, a voz estentria de um dos

    homens, cujo rosto estava coberto por um mato.

    _ Gloria a voces, meus filhos! O trabalho rduo expiou seus pecados. Que se

    rompam as correntes que os prendem ao passado! Que retornem os ex-expurgados,

    j purificados, ao seio dos servidores da luz e que se celebre a sua ressurreioespiritual.

    Clares coruscantes dardejaram dos magos superiores, cobrindo com

    pelcula gnea os obreiros como se os calcinando. E quando a nvoa avermelhada

    se dissipou, viu-se que uma incrvel transfigurao se havia dado. Em vez das

    antigas vestes de couro, os obreiros do novo planeta estavam trajando vestes alvas;

    seus semblantes de incrvel beleza agora estampavam uma alegria jubilosa e em

    suas frontes surgiu o primeiro facho da coroa dos magos.Os recm-chegados da Terra cercaram, abraaram e felicitaram-nos. Entre

    eles havia velhos amigos e foi grande a alegria do reencontro.

    Os transfigurados, entretanto, no se esqueceram de seu papel de anfitries

    e trataram de acomodar as visitas no novo planeta. Primeiramente, eles levaram os

    magos superiores para um lugar especialmente preparado, enquanto os outros

    viajantes eram convidados para um enorme salo, onde por eles aguardava uma

    grande mesa com repasto trivial: leite, mel, frutas e po.

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    Ebramar tambm achou entre os expurgados um velho companheiro e o fez

    sentar-se junto de si mesa.

    - Estou realmente feliz que as suas provaes tenham fim, Udea! Ficamos

    muito gratos a voce e a seus amigos por este maravilhoso palcio que nos

    prepararam como abrigo, e to confortvel confessou Ebramar.

    Udea, um jovem belo de feies srias e grandes olhos negros e pensativos,

    suspirou.

    - Tivemos bastante tempo para constru-lo. E, mesmo assim, ele no

    suficiente para acomodar todos, ainda que tenhamos adaptado muitas grutas, onde

    podero ser instalados os magos inferiores. Quanto ao conforto, este o mnimo

    aceitvel, do mesmo modo que o repasto. No temos recursos alimentcios e s

    pudemos oferecer-lhes do que dispnhamos. Cada bloco de pedra deste prdio foi

    para ns uma luz de esperana de que voces viessem para c e ns voltssemos ao

    convvio de nossos semelhantes; de que voces nos trouxessem as relquias do

    passado, lembranas vivas da Terra morta, outrora nosso bero.

    Oh!, Ebramar! Que terrvel pesadelo tem sido esta vida desde o momento em

    que me vi neste planeta selvagem, povoado por seres inferiores incapazes de me

    entender. Decerto, eu tinha amigos de infortnio, mas o ambiente era insuportvel. Ea conscincia de que ramos ns mesmos os culpados por esta nossa dura sina...

    Arrependimento e remorsos nos oprimiam a alma! Pois, positivamente, ficamos

    privados de tudo; tnhamos to somente os nossos conhecimentos, nosso nico

    divertimento era o enorme trabalho que tnhamos pela frente. Foi duro. s vezes, eu

    achava que no ia agentar, de to difcil que era. E, infelizmente eu era imortal...!

    Sofrimentos vividos traduziam-se na voz de Udea; Ebramar apertou-lhe

    fortemente a mo.- Espante as ms lembranas, tanto mais que estas so inoportunas! A

    grandiosidade do dever cumprido e o brilho da merecida recompensa faro com que

    voce se esquea das amarguras do passado. O facho dourado em sua fronte,

    smbolo da imortal coroa de magos reconquistada, apagou todos os seus equvocos

    e sofrimentos. Este lhe iluminar o futuro lmpido e depois... Caminharemos juntos.

    Os olhos de Udea

    Brilharam de amor e reconhecimento profundo.

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    - Voce est certo, Ebramar! Espero trilhar, sem mais sustos, o caminho da

    perfeio, sob a sua tutela e liderana. Quero lhe agradecer, meu amigo, por tudo

    que fez por mim.

    Voce nunca me abandonou e, em momentos mais difceis, vinha da Terra

    longnqua o emanar tpido de seu amor para consolar-me, apoiar e diminuir os

    sofrimentos do expurgado!

    Ebramar sorriu e balanou a cabea.

    - Voce no pode enaltecer o que foi para mim um prazer. E agora, repito,

    expulse essas lembranas! Teremos tempo de sobra para conversar. Bem, o repasto

    acabou, Venha, eu quero que conhea alguns amigos meus!

    Eles aproximaram de um pequeno grupo que conversava junto da janela e

    Ebramar apresentou-lhe Nata e outros discpulos seus.

    - Eis aqui dois valorosos obreiros da cincia: Supramati e Dakhir. Tive muita

    satisfao em orient-los no caminho do desenvolvimento. E este Narayana, meu

    filho prdigo, que por fim retornou ao lar paterno; verdade, ele me causou

    enormes aborrecimentos, mas tambm me trouxe muitas alegrias. Eu lhe apresento

    o mais alegre e humano dos magos, e tenho certeza de que ns ainda o veremos

    conquistando e fundando algum grande reino, com um nome lendrio quepermanecer na memria popular infinitamente.

    Todos desataram a rir e, aps conversarem jovialmente, cada um foi cuidar

    de sua acomodao.

    Para se ter uma idia das circunstncias que motivaram os fatos

    anteriormente narrados, e explicar a presena no novo planeta dos membros da

    irmandade dos imortais, faz-se necessrio certa explanao.

    Apesar da disciplina rgida e trabalho rduo exigido dos membros da

    irmandade secreta, os adeptos continuam sendo homens comuns e, nenhum deles,

    apesar dos conhecimentos adquiridos, consegue dominar por completo as fraquezas

    que se espreitam no recndito de suas almas. Tais seres ficam sujeitos, por vezes,

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    s paixes desenfreadas, em conseqncia das quais cometem atos indignos a um

    adepto que a sua expulso da comunidade se torna inevitvel.

    No obstante, a simples excluso deles apresenta um perigo, pois possuem

    grandes poderes, cujo abuso pode trazer muitos males; alm disso, por terem sido

    iniciados em grandes mistrios da cincia, eles podem influir no prprio curso dos

    acontecimentos, ao difundirem prematuramente seus conhecimentos entre uma

    turba bastante desenvolvida intelectualmente para aplic-los, entretanto ainda muito

    ignorantes para abster-se de no us-los para o mal. Mas, como proceder para ficar

    livre destes sujeitos perigosos? Tirar a vida daqueles que esto saturados com a

    matria primeva no uma tarefa fcil. Por isso, aos transgressores oferecem-se

    duas opes: ou a morte voluntria, muito dolorosa, por meio da decomposio do

    corpo vivo, ou a ida, na qualidade de iluminador e, para outro planeta, local da futura

    permanncia dos legisladores, onde o nvel de progresso bem incipiente. Ali eles

    podem trabalhar com um prazo marcado pelos mestres, ou at que estes se dirijam

    para l.

    A expiao dura, mas ela purifica o desterrado, repara seus antigos erros e,

    simultaneamente, serve-lhe de ascenso.

    Os sentenciados que optam pela expiao atravs de trabalhos duros sodeixados pelo Conselho Superior em estado letrgico, e os iluminados, ento,

    levam-nos para um planeta distante: campo do futuro trabalho dos grandes

    hierofantes dos mundos extintos.

    Os expurgados equipam-se com o mais indispensvel: instrumentos mgicos,

    aprovisionamento para quaisquer eventualidades e uma biblioteca especialmente

    composta no s de obras cientificas, mas tambm das que possam contribuir para

    um relaxamento mental. A pedido dos amigos, os desterrados podem levaradicionalmente alguns objetos de luxo e, por fim, tudo o que for indispensvel para a

    realizao dos ofcios religiosos, a fim de atrair fludos puros, necessrios para a

    obteno do equilbrio das correntes atmosfricas e para o controle das foras

    caticas.

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    CAPTULO II

    A partir daquele mesmo dia, no novo planeta iniciou-se uma atividade febril.

    Enquanto alguns discpulos dos grandes magos se esforavam para concluir ainstalao dos laboratrio de seus mestres, ajustar a aparelhagem de pesquisa,

    entre outras tarefas, outros supervisionavam o desempacotamento e a arrumao

    dos valiosssimos manuscritos, contendo a histria e as obras cientficas do planeta

    extinto. Todos aqueles tesouros do passado eram guardados em salas

    subterrneas, especialmente preparadas pelos adeptos expurgados.

    Os terrqueos estavam soturnos. Segregados de seus lares, costumes e bens

    terrenos, pareciam uma manada tonta, apertando-se assustados uns aos outros; oaspecto inspirava pena. Seus protetores perceberam a tempo a baixa moral dos

    espritos fracos, e logo tomaram providncias enrgicas para tir-los do torpor e do

    desespero. Cientes de que o melhor remdio, os magos dividiram-nos inicialmente

    em grupos e mandaram que cada um cuidasse de sua prpria instalao, em grutas

    especialmente preparadas, ou que ajudassem os adeptos em tarefas menos

    complexas.

    Os terrqueos mais ativos e desenvolvidos intelectualmente logo se

    adaptaram e chegaram concluso de que a situao no estava to ruim como

    parecia no comeo. O lugar era um verdadeiro paraso terrestre pela impressionante

    beleza, riqueza indescritvel da fauna exuberante, e clima agradvel. Assim, os

    terrqueos mais enrgicos conseguiram com sua animao influenciar os outros,

    menos ativos e menos desenvolvidos mentalmente; logo, todo aquele pequeno

    exrcito iniciou febrilmente a construo de residncias temporrias e a ordenao

    do enorme inventrio, trazido pela frota espacial.

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    Nem bem passaram trs semanas e os primeiros trabalhos j estavam

    concludos. Os laboratrios dos magos funcionavam em perfeita ordem; seus

    discpulos labutavam passando ordens dos mestres aos magos de nvel

    imediatamente inferior.

    Marcou-se, ento, uma reunio para discutir e analisar algumas medidas

    especiais e secretas, que iriam definir o destino e a formao de futuras raas.

    - Irmos! O nosso compromisso maior com as pessoas que trouxemos, as

    quais formaro o ncleo de novas raas e civilizaes declarou um dos hierofantes

    que presidia a reunio. Por enquanto, elas apenas esto armadas de f, pela qual

    foram salvas, mas isso pouco em funo do trabalho a ser feito. No ser tarefa

    fcil estabelecer um relacionamento com os povos selvagens, ilumin-los para

    incutir-lhes as primeiras noes de artes e ofcios, desenvolver a mente vulgar e fixar

    novos princpios de freios de seus costumes cruis e selvagens. Mesmos os

    terrqueos, em face dos sofrimentos pelos quais passou a sua civilizao, qua

    alcanou o apogeu, mas consignou ao tmulo as rgidas, porm justas leis de seus

    antepassados -, tm muito que aprender sobre a justia e a bondade autnticas.

    Para formarmos instrutores das raas embrionrias, a partir de seus prprios

    representantes, precisamos de escolas e de tempo. Este ltimo no nos falta.Comearemos com a construo da cidade que ir abrigar as escolas de iniciao e,

    para a construo da cidade divina, foram distribudas, com base nas habilidades de

    cada um, as suas respectivas tarefas, e a reunio foi encerrada. O restrito grupo de

    nossos amigos, convergiu para o terrao. Narayana convidou todos, inclusive Udea,

    para se dirigirem ao terrao, anexo sala ocupada por ele; com Udea ele encontrou

    uma amizade sincera. Durante toda a viagem ao novo planeta, Narayana tinha

    permanecido taciturno, fora-lhe por demais doloroso deixar a Terra; mas, naqueledia, voltou ao alegre mago o seu habitual bom humor.

    Uma mesa repleta de pratos magnificamente preparados, a partir de frutas e

    legumes, esperava pelas visitas no terrao. Estas no se fizeram de rogadas e

    renderam

    A devida honra ao repasto. Ebramar perguntou sorrindo se no era o prprio

    Narayana responsvel por aqueles manjares, obras de um grande chef de cuisine.

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    - Deus me livre sujar as mos com isso! Brincou Narayana, cheio de

    satisfao. Eu trouxe um cozinheiro e um servial comigo e... Como, podem ver, o

    resultado at que no dos piores.

    Diante da surpresa de Supramati e de outras visitas exceto de Ebramar, que

    ria por trs da barba este acrescentou com bonomia que Narayana no perdera

    suas aptides administrativas. Narayana, ento, ajuntou em tom jovial:

    - Ouam, amigos, como isso aconteceu! No ltimo dia, quando a nossa

    velhota Terra gemia at no poder mais, eu estava prestes a embarcar na minha

    aeronave para ir ao local de encontro combinado. Confesso que o meu humor

    estava to negro quanto o ambiente em volta. De repente, dois homens

    ensandecidos de pavor, jogaram-se aos meus ps, agarraram-me as vestes e

    imploraram que eu os safasse, jurando-me gratido eterna. Eu j ia dar um safano

    naqueles chatos, quando, surpreso, reconheci neles os servos do ricao Salomo,

    por mim apelidado de novo Lucullus. Um deles, eu at conhecia: era um cozinheiro

    sem par. Logo atinei que, para onde amos, um empregado assim seria

    indispensvel. S de imaginar que teria de comer algum ragu de razes, talvez

    preparado por um maado ou um monstro qualquer, eu ficava arrepiado; a idia de

    cozinhar, eu mesmo, no me animava. Da mesma forma, ter por servial um sujeitocom um ou trs olhos... Um servial assim ou viu coisas demais ou de menos... O

    que tambm no me agradava. Assim, aparecimento deles veio a calhar; quanto

    carga... Os coitados no pesavam muito.

    - Voces acreditam em Deus? Inquiri em tom bravo.

    - Como no crer em castigo de Deus diante dos terrveis efeitos de sua ira?

    Espantaram-se eles, em pranto.

    - E em J esus Cristo, nosso Senhor, voces acreditam? Continuei indagando.Eles se persignaram e, continuando a se agarrar feito carrapatos, juraram

    pela cruz que a nica esperana deles era a misericrdia do Salvador.

    Ento tirei rapidamente do bolso o frasco com a essncia primeva e fiz com

    que ambos tomassem um gole, acomodando-os previamente na aeronave.

    - Como eles so rapazes espertos, logo se familiarizaram com o que existe

    por aqui e o cozinheiro me apresentou uma relao de produtos comestveis, alguns

    dos quais voces acabam de provar. Quanto ao servial, ele muito solcito e

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    extremamente religioso. Estou muito feliz, amigos, em poder oferecer-lhes algo

    comestvel.

    E agora, caro Udea, expresso aqui meus agradecimentos a voce e seus

    amigos por terem arranjado um belo abrigo para os desafortunados navegadores

    espaciais.

    Num mpeto, ele estampou alguns beijos em Udea, sentado a seu lado, para

    o gudio dos presentes e de seu novo amigo, que h muito tempo no ria tanto. At

    os outros magos, compenetrados e srios em virtude dos acontecimentos vividos, se

    descontraiam e riram a valer.

    Ao se levantarem da mesa, Ebramar colocou a mo no ombro de Narayana e

    disse-lhe afetuosamente:

    - Meu filho prdigo, voce realmente o mais terrestre dos magos! Apesar

    do tempo e da existncia dos anos vividos, apesar do seu grau de conhecimento e

    perfeio, voce conservou a juvenil alegria de viver. Conserve esta ddiva celeste e

    passe-a a todos que o cercam, pois que a alegria serve de apoio no trabalho e torna

    menos rdua qualquer tarefa.

    Os olhos negros de Narayana brilharam de satisfao e agradecimento.

    - Obrigado, meu querido mestre, tentarei ser sempre assim, mesmo depois deganhar meu stimo facho, o que no ser logo. Agora tenho pela frente uma

    agradvel tarefa, que me ocupar por muito tempo: a construo do palcio. Fao

    votos de que este seja um dos mais bonitos da cidade.

    - No me parece difcil o seu desejo de erguer um castelo encantado

    observou Udea. Todos os metais aqui no planeta ainda se encontram em estado

    semi lquido ou, na pior das hipteses, bem maleveis. Temos por perto cristais de

    tonalidades incrveis, que podem de um modo geral, satisfazer todos os gostos eexigncias, e o seu faro decerto lhe ser til.

    - Obrigado Udea. Mais tarde voce me mostrar a fonte desses recursos. E

    voce, Ebramar. Quando que iniciar a construo de sua casa? Um

    empreendimento inadivel e to prazeroso!

    - No nego que a construo do prprio lar uma experincia muito

    gratificante, no entanto acredito que outras obras so mais urgentes objetou o

    mago balanando a cabea. No se esquea de que estamos aqui no paradiverso, mas para cumprirmos uma grandiosa misso: benfeitorizar o planeta. Dos

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    que trouxemos conosco, formaremos reis, sacerdotes, colaboradores de futuros

    governos, artistas, trabalhadores comuns e especializados. No ser fcil formar

    essa fora de trabalho, de modo que cada um cumpra escrupulosamente, o seu

    papel de iluminador das tribos brbaras e selvagens nossa volta. Assim, considero

    como prioridade maior a construo de escolas e templos de iniciao, e, s depois,

    dar incio constituio de naes.

    Narayana coou atrs da orelha.

    - Voce a prpria personificao do despreendimento, Ebramar! Por um

    acaso no ficou hoje decidido que iramos primeiro iniciar a construo da cidade?

    Onde que ento vamos morar?

    - Acalme-se, alma impaciente! Voce sempre se esquece de que a pressa a

    inimiga da perfeio. Tudo ser feito h seu tempo, pois temos condies de

    simplificar os trabalhos ao mnimo. Ou ser que voce se esqueceu de que dispomos

    de poderes e ferramentas que cortam granito, como cera, transforma em cinzas

    qualquer obstculo, iam pesos equivalentes aos das pirmides, com um fardo de

    palha? Com estes poderes transportaremos blocos, e com eles ergueremos as

    paredes dos palcios e escolas, talharemos os templos subterrneos nas

    montanhas, ornando-os com majestosas esculturas, escavaremos grutas e galerias.E, nos longnquos sculos vindouros, homens-pigmeus vislumbraro

    desconcertadas estas cidades subterrneas e obras ciclpicas, perguntando-se

    intrigados que mos humanas, que geraes de gigantes puderam, em tempos

    imemorveis, cavar, esculpir, recortar dos macios rochosos tais maravilhas

    artsticas de propores extra-humanas?

    A nossa pobrezinha Terra rota tambm possua monumentos arquitetnicos

    semelhantes; mas os homens da cincia, em sua ignorncia absurda, no sabiam aque poca relacion-los. Sim, os monumentos foram erguidos por gigantes, mas

    gigantes do conhecimento nos primrdios da civilizao!

    - Claro mestre, como sempre voce est certo! Ajuntou Narayana. Assim, o

    mais majestoso, o mais belo e o mais luxuosos dos reinos por ns fundados, ser os

    eu, Ebramar.

    Ebramar sorriu e olhou afetuosamente para Narayana.

    - Agradeo-lhe pela sua exaltao impetuosa, ainda que no tenha a mnimavontade de reinar; servirei nossa causa comum na qualidade de sacerdote, mestre

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    e iluminador, no grande templo da nossa futura cidade: a Cidade dos Deuses,

    como est ser lembrada na memria popular, l, onde, desceram os visitantes

    celestes e que deram origem s geraes divinas que governaram os povos do

    sculo de ouro. L, como rezaro as crenas populares, vagamente guardadas na

    memria, era o palcio terrestre, onde florescia a rvore do conhecimento do bem e

    do mal.

    Nos dias que se seguiram, o trabalho continuou sem cessar. Uma parte dos

    adeptos ocupou-se em dividir os terrqueos em equipes de trabalhadores, segundo

    as suas habilidades e conhecimentos, para a construo da cidade dos magos. Ao

    mesmo tempo, os adeptos de grau superior montaram o projeto da cidade alta e o

    da subterrnea, onde ficariam os templos dos sacramentos misteriosos onde

    seriam guardados os documentos e os tesouros antigos, junto com os monumentos

    da Terra morta. As magas, por sua vez, tambm distriburam as mulheres em

    brigadas e lhes estabeleceram tarefas para a futura implantao de colnias e

    escolas.

    Todas as obras eram restritas regio montanhosa, onde desceram os

    refugiados do planeta extinto; entre os habitantes das florestas e vales, a agitao

    prosseguia. A notcia da vinda dos deuses continuava a correr solta e os que noparticiparam daquele extraordinrio acontecimento se informavam, sfregos, junto s

    testemunhas afortunadas.

    Todos relancearam olhares curiosos em direo s montanhas, atrs das

    quais desaparecera a frota area; ningum, entretanto, ousou aproximar-se do local,

    por medo supersticioso. Por vezes, os curiosos conseguiam vislumbrar sobre os

    picos certos sinais estranhos em meio a feixes gneos, ou, de tempos em tempos,

    por ali aparecia um cavaleiro inslito montando um drago alado, que logo sumia aolonge. Ento, segredava-se: Olhe, um dos deuses saiu para dar o seu passeio

    dirio!

    Um novo sentido de vida descortinava-se aos povos selvagens e apticos;

    suas mentes pesadas e obtusas mo estavam em condies de compreender o

    motivo da chegada dos adventcios. Quem era eles e de onde vieram?

    Sem obterem uma resposta para as suas indagaes, alguns dos mais

    vivazes iam procurar os homens de trs olhos. Este pouco tinha a acrescentar e

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    limitava-se a repetir que os deuses chegaram para trazer novos conhecimentos e

    prodigalizar benefcios aos povos que habitavam as florestas e os vales.

    Os homens de trs olhos eram representantes do gnero quase extinto dos

    gigantes primitivos. Durante a lenta evoluo da raa humana, o seu aspecto fsico

    modificou-se: a gigantesca estatura diminuiu, o terceiro olho comeou a enfraquecer

    e, por fim, desapareceu por completo, deixando como nico vestgio de sua

    existncia a glndula pineal, a qual at a cincia formal admite ser o resqucio do

    olho desaparecido.

    Entretanto, a natureza apaga tudo o que tenha sido gerado de forma lenta e

    gradual. Indivduos isolados da espcie dos gigantes de trs olhos ainda existiam

    entre os povos em regenerao; no entanto, a prpria raridade deles cercou-os de

    aurola mstica, sendo eles considerados como seres superiores.

    Entrementes, um acontecimento inesperado jamais antes vivido, abalou a

    populao, afastando para segundo plano os demais interesses. Numa das tribos

    que habitavam as rvores ocas, uma criana teve uma enfermidade na garganta,

    vindo a falecer, no dia seguinte, em dores horrveis; me e

    Alguns membros da famlia morreram em seguida da mesma doena, e o

    contgio espalhou-se com rapidez incrvel, apanhando tribos e tribos, e fazendonumerosas vtimas.

    Um pnico ensandecido apoderou-se daqueles seres simples e primitivos,

    que desconheciam qualquer mtodo de acabar com a epidemia, cuja prpria

    ignorncia propiciava o aumento do contgio. Em desespero, nada lhes restava,

    seno irem pedir auxlio e conselhos aos gigantes de trs olhos, ou como eles os

    denominavam homens das cavernas. Um deles teve a seguinte idia:

    Faamos como daquela vez, quando nos anunciaram a vinda dos deuses.Lembram que os gigantes nos ajudaram? Vamos cham-los para que eles espantem

    a morte que os ronda.

    noite, uma enorme multido reuniu-se junto da pedra cbica, com cone

    basltico no cimo. Como da primeira vez, eles acenderam galhos resinosos,

    danaram e puseram-se de joelhos; mas, como aquela viso de ento no

    reaparecera, Ipaksa (o homem de trs olhos) ordenou que todos gritassem, o mais

    alto que podiam, para que os deuses ouvissem os seus clamores. Urros e gritosinumanos fizeram-se ouvir por todo o vale, feito um furaco esbravejante;

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    subitamente felicidade! Sobre as montanhas, envoltas em escurido noturna,

    fulgiu um claro, como que de relmpago. Significava que os deuses os ouviram!

    Receios e esperanas agitavam a multido dispersada; mas, mal o sol

    apontara no horizonte, sobre as casas do povoado se que assim podiam ser

    chamados aqueles buracos nas rvores comeou a descer um drago alado,

    montado por uma mulher em vestes brancas.

    Um vu prateado envolvia-a feito nvoa; duas chamas aurifulgentes

    adornavam-lhe o diadema de ouro, a cingir-lhe os cabelos bastos. Trazia na mo

    uma caixeta de forma estranha e adornos maravilhosos. Uma aura azulada rodeava-

    lhe a cabea, e das mos e vestes irisava-se uma luz fosfrica. Feito uma viso

    radiosa, foi ela visitando as moradias atingidas pela doena; as pessoas

    atemorizadas escondiam-se ou at fugiam dela; mas, vendo como a donzela clarifica

    se curvava meiga e humilde sobre os enfermos, tirava da caixeta frascos coloridos e

    brilhantes, untando em alguns a garganta e, em outros, o peito, enquanto aos

    moribundos gotejava um lquido na boca ou impunha as mos sobre a cabea, todos

    se acalmaram.

    Assim, com sofreado interesse ela visitou todas as moradias e, em todas elas,

    os resultados da medicao eram miraculosos: a rouquido sumia, a respiraotornava-se desimpedida e as foras restabeleciam-se. Quando ela saiu da ltima

    casa e o drago alado levou embora a benfeitora desconhecida, os aborgenes

    prostraram de joelhos na terra e, ento, talvez pela primeira vez em suas almas

    primitivas agitou-se um sentimento de adorao. A partir daquele dia, a epidemia

    comeou a ceder rpida e, algum tempo depois, simplesmente deixou de existir;

    algumas chuvas torrenciais limparam o ar.

    Aos poucos vieram notcia que a deusa benfeitora esteve em todas as regiesatingidas pelo contgio, e que ningum, a quem ela tocara, morreu da doena. Nos

    povoados, correram boatos dos mais estranhos. Os curados pela deusa afirmavam

    serem suas mozinhas como as de um beb, parecidas com as ptalas de flores

    perfumadas; e que, por entre os seus dedos, derramava-se um calor vivifico; ainda,

    que ela andava sem tocar os ps no cho e que em seus frascos havia fogo.

    Entre os terrqueos rapidamente adaptados ao novo planeta e que se

    esforavam para serem teis comunidade, encontrava-se um jovem cientista, o

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    astrnomo Andrei Kalitin, convertido por Dakhir em sua estada na Rssia e levado

    para o planeta novo.

    Acostumado a trabalhos mentais srios, ele soube reconhecer a incrvel sorte

    que o salvaguardara da terrvel catstrofe que aniquilou o mundo terrestre, por isso a

    sua gratido ao seu salvador no tinha limites.

    Assim como os outros, ele havia despertado ao chegar ao local do destino e,

    no incio, o fato de estar num mundo estranho deixava-o oprimido; mas, passadas as

    primeiras impresses, ele manifestou a Dakhir, com lgrimas nos olhos, sua

    gratido, implorando que este permanecesse seu protetor e mestre e o aceitasse na

    qualidade de discpulo.

    - Agora compreendo quo ignorante fui, mas varri da minha mente tudo o que

    havia concebido antes. Anseio trabalhar sob sua orientao, e serei um aluno

    obediente e aplicado, acrescentou ele.

    - Assim est decidido, meu jovem amigo! Disse Dakhir sorrindo

    afetuosamente e apertando-lhe a mo. A partir de hoje voce meu discpulo. No

    considero, entretanto, os seus conhecimentos anteriores como inteis; apenas

    faremos uma reavaliao para separar o falso e o mal compreendido.

    Neste mesmo dia Dakhir instalou o seu novo discpulo perto de sua casa e,mesmo assoberbado de trabalho, pois era o responsvel pela anlise e classificao

    dos documentos reunidos pelos ex-expurgados, sempre encontrou uma horinha para

    estudar com ele. Dakhir apontava os equvocos de Kalitin ou dava uma interpretao

    mais correta das questes cientficas. s vezes, ele o levava em suas viagens de

    trabalho, proporcionando-lhe uma oportunidade para conhecer melhor o seu novo

    lar.

    A construo do primeiro templo fora confiada a Narayana; Supramati, emcuja alma despertou a paixo do antigo escultor, aceitou prontamente a tarefa de

    guarnec-lo de ornamentos. Em vista do desejo dos magos superiores de se concluir

    o mais rpido possvel aquele primeiro santurio, os trabalhos contavam com o

    auxlio de um poder misterioso, que s os magos de nvel superior sabiam controlar.

    Certa vez, tendo um assunto para tratar com Supramati, Dakhir convidou

    Kalitin para acompanh-lo cidade em construo.

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    O caminho para o santurio cruzava as galerias engenhosamente ocultas

    atrs de adereos artsticos; uma luz suave e azulada iluminava as passagens ao

    enorme salo, de altura estonteante, onde trabalhavam os dois magos.

    Vestido numa blusa de linho, Narayana trabalhava no fundo do recinto;

    Supramati prximo da entrada. Entretidos, eles no notaram a chegada de Dakhir

    com seu discpulo, que param em silncio. Dakhir que no queria atrapalhar os

    amigos, esperando que eles lhe notassem a presena, se ps a examinar o

    ambiente, onde j estivera por inmeras vezes.

    Katilin ficou observando boquiabertos os magos, sem entender o que estavam

    fazendo. Na mo estendida para cima Supramati empunhava um basto metlico,

    brilhante feito ao polido, que ele movimentava ora para baixo ora para cima, ora

    esticando-o ora encurtando-o; da ponta do basto vertiam-se fagulhas que se

    projetavam para o alto e desapareciam no ar; cada movimento do basto era

    acompanhado por uma leve vibrao sonora de modulaes incrveis. Outro

    fenmeno intrigava ainda mais Kalitin; sem que houvesse o menor contato com o

    paredo rochoso, dele ia-se recortando uma figura humana de dimenses colossais.

    Parecia que o artista apenas retocava sua obra a distncia, ora acentuando a

    profundidade ou a expresso do rosto, ora dando um acabamento nos detalhes dotraje ou dos cabelos.

    O trabalho de Narayana parecia ainda mais surpreendente. Nada se via em

    suas mos; somente, de tempos em tempos, por entre seus dedos cintilava uma luz

    metlica, derramando-se em correntes faiscantes. Ao mesmo tempo, por uma fora

    invisvel, do paredo no fundo da gruta desprendiam-se enormes blocos de granito

    e, ao invs de carem no cho, derretiam-se no ar sem deixar vestgios.

    Kalitin ficou abismado de ver aquilo e soltou um grito surdo. Os dois adeptosinterromperam o trabalho.

    - Desculpem se o meu discpulo os atrapalhou; que ele est inteiramente

    estupefato explicou Dakhir, abraando os amigos.

    - Sim, realmente para algum que no seja iniciado, o nosso trabalho capaz

    de causar tal exclamao de assombro observou Narayana rindo.

    Ao notar o vido interesse com que Kalitin olhava para sua mo. Narayana

    estendeu- a ele e mostrou sobre a palma um estranho objeto. Era um anel componteiros cintilante, porm, Kalitin no conseguia definir em meio a sai agitao.

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    . Os pensamentos rodopiavam em turbilhes e ele parecia nada ouvir em

    volta; suma sonora risada de Narayana e um leve toque da mo de Dakhir fizeram-

    no retornar realidade. Sem jeito, ele desculpou-se, sem conseguir, entretanto,

    eximir-se de um pedido: que lhe explicassem o funcionamento do aparelho.

    - noite, na hora de nossa palestra, eu lhe explicarei tudo o que voce est

    vendo aqui; por enquanto tenha pacincia, pois esta a principal virtude dos que

    buscam o conhecimento disse Dakhir, despedindo-se dos amigos e saindo da

    gruta.

    J amais Kalitin ficara aguardando a chegada de uma noite com tanta

    ansiedade. Ele era bastante estudioso para entender que os adeptos se utilizam das

    poderosas foras da natureza, mas, o que eram aquelas foras? Ele no

    conseguia discernir, tentando inutilmente compar-las a uma que conhecesse.

    Entrando no gabinete de Dakhir, ele observou satisfeito que em cima da mesa

    do mago estavam dois instrumentos idnticos aos de Narayana e Supramati.

    Dakhir iniciou a palestra explicando a composio da atmosfera e completou:

    - A fora estranha que o deixou to curioso no nada mais do que a fora

    vibratria do ter; seu manejo encerra o sentido arcano de todas as foras fsicas.

    Conforme j lhe disse, o som a mais terrfica das foras ocultas. Som agrega edesagrega; o som, tal qual o aroma, na realidade que uma substncia

    incrivelmente tnue, tirado dos corpos com o auxilio de um empuxo ou batida. Os

    sons, produzidos num determinado volume e combinao, de forma que possam

    gerar certos acordes etreos, penetram em tudo que podem. O mesmo princpio

    explica o poder da msica, que tanto pode irritar como levar a um estado de xtase,

    ou acalmar, isto : ela age sobre o estado espiritual, podendo fornecer a devida

    fora s frmulas mgicas. As frmulas, assim como a melodia, constituem-se devibraes especiais, de acordo com os objetivos pretendidos.

    Para que voce tenha uma pequena idia da tenuidade da corrente etrea,

    basta lhe dizer que a sua densidade, comparada com a da atmosfera, tal qual a do

    hidrognio em comparao com a da platina, ou a de um gs e o mais pesados dos

    metais.

    Todos os corpos, animais, plantas, vegetais e minerais foram formados

    basicamente desse ter diludo; significa que toda a diversidade das espcies, nasquais se manifestam as foras da matria, possuem uma origem comum e se

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    encontram em dependncia mutua, podendo transformar-se de uma em outra.

    Aqueles que se utilizam da vibrao etrea conseguem manipular qualquer matria.

    - Permita-me mestre, fazer mais uma pergunta disse Kalitin, meio indeciso.

    Pelo que entendi, a fora vibratria, empregada por nossos amigos, possui a

    capacidade de decompor e agregar os tomos da matria; no entanto, eu presenciei

    algo ainda mais fenomenal. Parecia que no era uma corrente de alguma fora, mas

    a mo de um artista esculpindo.

    - No entanto, isso muito simples, como uma ao de qualquer outra fora

    natural. O minrio, assim como as demais matrias, constitudo de partculas

    isoladas que se encontram em contnuo movimento, as quais se submetem s foras

    atuantes. O calor, pro exemplo, exerce um efeito dos mais rpidos e visveis, mas a

    corrente de ter, controlada pela vontade consciente. ainda mais poderosa e sutil.

    O movimento interno da massa rochosa ou metlica permite que ela se submeta

    fora mental do hbil artfice, a manipul-la. Quando esta manipulao aliada

    poderosa fora da corrente etrea, a matria submete-se sua vontade, como que a

    uma simples fora material visvel. Resumindo: a matria animada

    temporariamente pelo esprito que nela penetra, a subjugando sua vontade.

    - Agradeo-lhe a explicao. Ainda no consigo entender o mecanismo peloqual os blocos so destacados do paredo. Acabei de ver um bloco imenso separar-

    se da rocha e desaparecer imediatamente, sem deixar vestgios.

    - A fora da corrente etrea, ao recortar da rocha um bloco necessrio ao

    artfice. Decompe-lhe os tomos, dissolvendo as molculas.

    - Mas, ento, por Deus, em que eles so transformados por essa fora

    miraculosa?

    - Em ter, um protoplasma comum a todos respondeu Dakhir sorrindo. devo dizer que a aplicao da fora vibratria do ter so infinitamente variadas. Ela

    tanto pode fulminar como um raio, como curar diversos tipos de molstias, beneficiar

    um organismo fsico, restabelecendo-lhe as foras exauridas, ou ainda, com a

    mesma facilidade, devolver a vida a uma pessoa morta, deque o seu corpo astral

    ainda no se tenha separado definitivamente, pois a vibrao acstica combina

    elementos numa espcie de oznio, impossvel de ser produzido por qumica

    comum, que possui, entretanto, propriedades vivificadoras extraordinrias. Agora eulhe mostrarei alguns instrumentos com os quais temos trabalhado. bvio que

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    possumos muitos outros, mas deles falaremos mais tarde. Pegue o basto! No

    tenha medo, ele no est ativado!

    Kalitin o pegou com reverncia supersticiosa o basto metlico e examinou-o.

    Parecia oco por dentro, possua um cabo com muitas travas, botes de controle e

    molas, e estava provido de um mecanismo de movimento telescpico.

    Dakhir explicou que, manuseando os botes, era possvel ajustar a potncia

    ou a direo da fora, e, dependendo de como era usado, o instrumento servia de

    extrator. Em seguida, Kalitin passou a examinar outro aparelho. Como j se

    mencionou antes, este era uma espcie de aro oco. Acoplado a um gancho; em seu

    interior havia dezoito ressonadores. Em cima do aro, localizavam-se, em tamanho

    decrescente, diversas agulhetas ou hastes vibratrias, dispostas em crculos sobre

    trs ressonadores externos, ligados entre si por filamentos metlicos.

    No centro havia outro aro oco, uma espcie de tambor, com duas fileiras de

    tubinhos circulares, nem visveis a olho nu, e dispostos como tubulao num rgo.

    Bem no centro do segundo aro havia um disco giratrio, e, na parte inferior do

    aparelho, estava afixada uma pequena esfera, oca por dentro, de onde saam os

    condutores de fora.

    - Quando o aparelho est ativado, o disco gira a uma velocidade espantosa; apotncia deste motor praticamente ilimitada. Agora vou ativ-lo e, para tanto, basta

    apertar com a unha este boto. Assim! Fez Dakhir. Agora vou mostrar-lhe como

    ele funciona. Est vendo ali aquele pequeno animal morto, na cadeira junto da

    porta? Traga-o para mais perto, ns vamos decomp-lo em elementos nfimos e

    invisveis.

    Kalitin tornou a examinar, distncia, o animal por ele colocado no meio da

    sala. Subitamente, um feixe gneo faiscou de dentro do aparelho e atingiu obichinho, que foi literalmente projetado para cima, sumindo sem deixar qualquer

    vestgio, como se no tivesse existido.

    Dakhir colocou trs filamentos sobre a lmina di microscpio e, quando Katilin

    observou curioso o objeto aumentado em milhares de vezes, o mago acrescentou:

    - Voce se lembra daquele aparelho com u auxlio do qual se podia enxergar o

    estado de decomposio da nossa desditosa Terra moribunda? Pois , ele tambm

    estava carregado com a fora vibratria etrea.

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    Quisesse eu enrolar com o filamento energizado qualquer coisa, ainda que

    pesando toneladas, esta poderia ser suspensa no ar sem qualquer dificuldade, e ser

    transportada, por exemplo, para outra ponta do jardim. Mais ainda... As naves

    espaciais que nos trouxeram para c tambm eram equipadas com estes aparelhos.

    Devidamente polarizadas, elas podem carregar pesos enormes, alcanar grandes

    altitudes e velocidades incrveis, em qualquer direo.

    - Meu Deus! Quanta coisa interessante! Tenho a impresso de que voces

    jamais me revelaro a forma de controlar esta fora queixou-se Kalitin.

    - Tem razo, filho! No basta muito trabalho e estudo, voce ter de disciplinar

    ainda a sua alma e dar provas de total controle sobre si.

    - Oh! Sobreviverei a tanto tempo? Suspirou Kalitin.

    - Um sorriso maroto estampou-se no rosto de Dakhir.

    - Quanto a isso, no se preocupe, voce ter tempo de sobra! Quero fazer-lhe

    uma confisso. Em nosso primeiro encontro, eu lhe dei um lquido para tomar. Voce

    o tomou achando que era veneno e aguardou a morte, mas depois sobreviveu.

    Aquilo era a essncia primeva, o elixir da longa vida, e quem a tomasse na nossa

    malfadada Terra teriam uma longa vida planetria. Aqui, em nosso novo lar,

    tornamo-nos, assim como os que trouxemos conosco, novamente mortais. Aindaque com as condies de sobrevivermos todos por mais alguns milnios. A razo

    disso simples: devido rdua misso que temos pela frente, uma existncia curta

    no teria sentido. Os adeptos que estamos educando sero os nossos sucessores e

    futuros guardies de nossos mistrios. Desta forma, como v, voce dispe de muito

    tempo; nada, nenhum inimigo de mortais comuns, que seja a velhice ou o fraquejar

    das foras, poder impedir a realizao deste grandioso e bem-aventurado destino.

    Lvido feito cadver e tremendo como vara verde, ouvia-o Kalitin. Sua menterecusava-se a compreender aquela nova e espantosa revelao; s depois de uma

    longa conversa com o seu protetor, voltou a Kalitin a relativa serenidade.

    Sua melancolia, porm, perdurou ainda por alguns dias. Uma existncia to

    longa pela frente o assustava; aos poucos, no entanto, seu esprito forte dominou

    esta fraqueza e ele decidiu firmemente se tornar digno daquele extraordinrio

    destino urdido pelo Pai Celeste. Atendendo s determinaes de Dakhir, ele

    comprometeu-se a no revelar nada a quem quer que fosse sobre o que viera aconhecer.

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    Aps ter readquirido o equilbrio espiritual, a fora etrea, cujas propriedades

    intrigavam Kalitin, voltou a ser objeto de suas reflexes. Certa noite, conversando

    com Dakhir, ele voltou a tocar no tema.

    - Diga-me mestre, ao que tudo indica esta maravilhosa fora sempre foi

    guardada sob vu de segredo pelos magos. Na Terra jamais se suspeitou de sua

    existncia, caso contrrio eu teria ouvido falar dela e do que ela era capaz. Imagino

    o tipo de avanos ela poderia proporcionar indstria, cincias e artes!

    - Voce est certo! Sua idia era conhecida, pelo menos em parte. Sabe voce

    o suficiente sobre o passado do nosso antigo lar, a Terra? Ento deve ter ouvido

    sobre um continente chamado de Atlntida, sugado pelo oceano.

    - Claro que ouvi, inclusive estudei a matria.

    - Pois bem! Os Atlantes conheciam a fora etrea e dela se utilizavam. Temos

    um atlante entre ns, seu nome Tlavat. Ele era de uma escola de hierofantes

    egpcios; aposso apresent-lo depois a voce. Mas voltemos ao assunto! Os atlantes

    chamavam essa fora etrea de Mach-ma, e o seu terrvel poder astral contribui em

    muito para a extino do prprio continente.

    Nos livros hindus fala-se tambm de uma fora vibratria; assim, em Ashtar-

    Vidya, consta que uma mquina carregada com essa fora. Colocada numa navevoadora e orientada contra um exrcito, podia transform-lo, com todos os seus

    elefantes, num monte de cinzas, feito um feixe de palha.

    Num outro antigo livro hindu, Vishnu Purana, a mesma fora etrea

    mencionada de uma forma alegrica e compreensvel para os profanos: o olhar de

    Kapila, um sbio que transformou em cinzas os seiscentos mil filhos do rei Sagar,

    apenas com um olhar.

    - Entendo que os conhecimentos dos atlantes pereceram junto com o seucontinente; no entanto, houve sobreviventes da catstrofe. Como se poderia perder

    para sempre um segredo to importante?

    Dakhir meneou a cabea.

    - A experincia mostrou que a posse desse segredo poderia trazer catstrofes

    inenarrveis e tornou-se necessria uma cautela maior. O uso desta perigosa fora,

    envolta em trplice vu de mistrio, foi guardado em forma de smbolos indecifrveis

    e s era confiado aos iniciados superiores. Entretanto, por mais estranho que possaparecer, na segunda metade do sculo XIX ela foi descoberta por um homem, que

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    encontrou tambm um mtodo, atravs de aparelhos engenhosos, de utilizar

    algumas de suas propriedades, mas isso no levou a nada.

    - Quem era esse homem e quais foram s causas do fracasso que levaram ao

    esquecimento essa descoberta fenomenal? Perguntou Kalitin excitado. O sculo

    XIX entrou para a histria como uma poca de elevada cultura e de grandes

    descobertas cientficas, que prepararam o terreno para o grande progresso da

    humanidade sustentou Kalitin.

    - Voce me formulou muitas perguntas, que tentarei responder na medida do

    possvel. O nome dele era J ohn Worrel Kelly; sua vida cheia de sacrifcios constitui-

    se de uma sucesso de episdios dos mais trgicos de um gnio. Tudo que a inveja,

    o rancor mesquinho, a calnia, o desdm e o escrnio podem urdir, tudo foi

    interposto no caminho de Kelly. Era um trao caracterstico da poca em que ele

    viveu; no houve nenhum cientista capaz de lhe entender a obra colossal e, no

    seio daquela sociedade, jamais se encontrou algum industrial, literato ou

    representante do clero, bastante iluminado e altrusta, capaz de ajudar

    materialmente o pobre inventor, que se viu no rastro de um dos maiores mistrios da

    natureza. Tentaram envenen-lo, ele era perseguido, chamado de trapaceiro e

    charlato; os vendilhes, vidos em obter vantagens com suas descobertas, masfrustrados em suas intenes, ameaavam-no com a cadeia. Por fim, levado ao

    desespero, ele destruiu a maior parte de seus aparelhos e a sua descoberta foi por

    gua abaixo.

    Mas isso revoltante! Indignou-se Kalitin.

    - A questo no to simples como parece. Ainda no se pode afirmar que a

    descoberta de Kelly pudesse trazer algum benefcio humanidade ao se tornar um

    patrimnio das massas. poca ruim era aquela, o sculo XIX, que voce qualificacomo altamente culta! Sem dvida a cincia experimentou xitos notveis, houve

    muitas descobertas, incluindo a de Kelly, mas o perodo foi marcado pelo

    florescimento dos piores vcios humanos: o egosmo selvagem, a busca renhida e

    impiedosa pelos prazeres da e a rejeio da divindade, o que fez o mundo

    mergulhar num profundo materialismo, cuja conseqncia foi paralisia de todos os

    sentimentos sublimes. Foi justamente no sculo XIX que nasceu o paradoxo, o pior

    de todos que a humanidade poderia ter conhecido: a tese pseudo-humanitria quejustificava os crimes mais hediondos, acobertando-os sob o vu da loucura, neurose,

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    degenerescncia e assim por diante. Praticava-se uma verdadeira incitao

    crueldade, quer seja atravs de vivisseces, homicdios polticos, armas abjetas de

    extermnio, tais como balas explosivas etc. Foi a partir do sculo XIX que o atesmo

    ganhou impulso, iniciou-se o declnio moral, e o cinismo desmedido, que levou

    desagregao da sociedade, gerou epidemias fludicas de loucura, suicdios,

    homicdios estpidos, evocando do caos as foras lgubres, as quais levaram o

    planeta destruio antecipada. Imagine ento a descoberta de Kelly disposio

    daqueles indivduos; anarquistas, psicopatas violentos, e assim por diante, os

    Caim do gnero humano. Pudessem eles dispor da fora etrea, teriam aniquilado,

    em sua fantasia vida de sangue, milhes de pessoas, pulverizando o continente em

    tomos e perpetuando inmeras hecatombes. Isso no poderia ser permitido. Os

    Servidores Divinos, que vigiam os destinos do mundo, no podiam deixar que a

    humanidade maliciosa e pervertida tivesse sua disposio uma fora que, em suas

    mos sujas, seria capaz de se tornar realmente diablica. A descoberta de Kelly

    deu-se h muitos milnios antes do seu tempo e por isso foi fadada ao

    esquecimento, devido, principalmente ao desconhecimento de que no prprio

    homem que reside justamente o princpio controlador da fora etrea vibratria. Kelly

    nem sequer imagina ser uma daquelas pessoas raras, detentoras de habilidadespsquicas especiais; e no era capaz de transmitir a outros o que eram atributos de

    sua prpria natureza. Como prova disso, sabe-se que os instrumentos de Kelly no

    funcionavam quando operados por outros. S isso j era um entrave para que a sua

    descoberta vingasse. Os iluminados sabem que por trs dos fenmenos visveis da

    natureza esto os entes racionais, chamados por humanos de foras ou leis, que

    operam essas ltimas, as quais, por sua vez, submetem-se aos entes de nvel

    superior, tidos para os iluminados como a fora e a lei.

    Apenas para efei to de um maior conhecimento por parte do lei tor, estou co locando no final dolivro, um anexo, com informaes coletadas sobre este personagem JOHN KELLY. Nota dodigitador.

    Esta conversa impressionou Kalitin ainda mais que a anterior. Sua mente

    comeou a ter uma nova viso do Universo, de suas leis, do Ser Divino e

    Inescrutvel, do Qual tudo emanava. Toda vez que diante de sua mente se

    descortinava um horizonte novo, sua f mais se acendia, e ento ele orava fervoroso

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    e singelo, agradecendo ao Ser Superior, o Pai misericordioso de todo o existente,

    pelas graas que Ele lhe concedia.

    Por conta de diversos recursos e expedientes especiais disponveis para a

    realizao dos trabalhos, a construo do templo subterrneo chegava ao fim e os

    magos preparavam-se para sagr-lo com o primeiro ofcio. Para a solenidade,

    reuniram-se no local os iniciados de todos os graus. Os terrqueos foram levados

    para uma sala contgua. J que no conseguiriam suportar a atmosfera do santurio,

    saturado de fortes aromas.

    Uma luz plida e suavemente azulada derramava-se pelo interior do templo;

    os contornos irisantes dos sinais cabalsticos e hierglifos salpicavam as paredes,

    como uma retcula fosfrica.

    O templo findava em semicrculo, sete degraus levavam para uma plataforma,

    ainda vazia, que se destinava ao altar.

    No fundo escuro da rocha, ardia um crculo de chamas multicolores; no centro

    dele, um disco de dois metros de dimetro dardejava feixes cintilantes. Em torno

    daquela espcie de estrela, estava gravado em hierglifos gneos o misterioso e

    terrfico ttulo do Inefvel e Inescrutvel Ser, em derredor do qual se alicera e gira o

    universo.Concentrados e austeros postaram-se os iniciados em semicrculo diante do

    nicho; de um lado os magos, de outro os as magas todos em vestes alvas de linho.

    Primeiramente, eles ele levaram genuflexos, uma fervorosa e silenciosa orao; em

    seguida, ouviu-se um majestoso cntico que soou num crescendo.

    A bela melodia, ora brusca, ora suave, foi-se avolumando at que a sua

    imponncia parecia sacudir toda a montanha, at a sua base. Rajadas de vento

    varreram o templo; ouviu-se, ento, um estrondo surdo, como se o trovejar rolassepelas salas e galerias subterrneas; raios gneos riscaram o ar em ziguezagues.

    Subitamente, aos silvos e estrondos, uma massa gnea projetou-se das

    abbadas e atingiu a plataforma elevada no fundo do templo.

    Quando a chama se extinguiu, por trs da fumaa em dissipao,

    descortinou-se um bloco de pedra, o mesmo que havia servido de altar junto ltima

    fonte da substncia primeva na Terra. Transferido pelos magos, o valiosssimo

    smbolo reminiscncia sagrada do mundo destrudo novamente serviria de altardo primeiro santurio, edificado pelos refugiados da Terra no novo mundo.

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    Trs dos hierofantes mais velhos, adereados por coroas lucilantes de

    magos, depositaram sobre aquele altar mstico um grande clice de cristal com

    crucifixo no alto. Dentro do clice borbulhava flamejante a matria primeva, colhida

    de uma das Nove fontes do novo mundo.

    Da pira escavada na rocha, diante do clice, uma chama que jamais se

    apagaria reverberou todas as cores do arco-ris.

    Findo o primeiro ofcio, os iniciados fizeram um juramento: cumprir fielmente a

    tarefa confiada, doar todas as foras e o amor nova terra, sua ltima morada.

    No fim da cerimnia, foi cantado o hino de ao de graas, a multido se

    dispersou lentamente e os sinais fosfricos apagaram-se com exceo do circulo

    com o nome do Inefvel.

  • 7/27/2019 J. W. Rochester (Wera Krijanowskaia) - Os Legisladores

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    CAPTULO III

    A construo da cidade dos magos prosseguia rapidamente. Os adeptos

    construtores eram de primeira linha, tanto mais que sua disposio havia recursosincrveis, pois grande parte dos metais e dos outros materiais ainda se encontrava

    em estado malevel, o que simplificava significativamente a sua utilizao em

    esculturas. E a cidade de conto de fadas, a sede do legendrio paraso terrestre

    verificou-se ser de fato um milagre de beleza harmnica e arte refinada!

    No meio de vastos jardins coloridos por uma infinidade de flores e avivados

    por chafarizes, erguiam-se os palcios dos magos verdadeiras obras de arte, tanto

    interna como externamente.Os nossos velhos amigos instalaram-se perto um do outro; seus palcios

    eram algo de extraordinrio.

    A residncia de Ebramar ficava no centro e, ao redor, ligando-se pro longas

    colunatas, num retngulo perfeito, localizavam-se os palcios de Supramati, Dakhir e

    Narayana e Udea; todos eram de cores diferentes.

    O palcio de Ebramar e as galerias contguas, imitando quatro fachos, eram

    da brancura da neve. O palcio de Supramati parecia executado em ouro; o de

    Dakhir vermelho-rubi; o de Narayana azul-celeste como safira e o de Udea

    verde-esmeralda.

    Porm aquelas edificaes no se destinavam to-s para atenderem s

    humildes necessidades dos magos; elas iriam fornecer abrigo a um grande nmero

    de discpulos e familiares tutelados pelos grandes adeptos. To logo a cidade fosse

    oficialmente inaugurada, promover-se-ia a organizao de ncleos de famlias, o

    incio de aulas nas escolas de iniciao e em estabelecimentos de ensino de ofcios,

    agricultura e arte de governar as hordas incultas de aborgenes.

  • 7/27/2019 J. W. Rochester (Wera Krijanowskaia) - Os Legisladores

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    Os terrqueos no viam a hora de se iniciarem as grandes festividades da

    inaugurao da cidade; a liberao dos casamentos era motivo de grande ansiedade

    para muitos. Nem todos aceitavam a castidade imposta durante os anos de

    construo. O belo sexo, isolado do convvio com os homens, ficava sob vigilncia

    especial das iniciadas, passando por uma educao preparatria para o papel de

    esposas e donas-de-casa, em condies bem distintas das que estavam

    acostumadas na Terra.

    De um modo geral, a educao daquela massa diversificada de terrqueos

    era difcil e complexa, vistos composta de pessoas de diferentes categorias, tanto

    em termos tnicos, como em termos de carter, posio social e evoluo

    intelectual. Eram crentes em Deus e suficientemente bem intencionados, mas, a

    despeito dessas virtudes, era gente de sua poca, eivada de ideais errneos e

    cultura viciada, por demais

    Refinada e pervertida. Independentemente disso a essncia ministrada

    produziu uma estranha e miraculosa cura em seus organismos; seus corpos sem

    vio, desnutridos, com nervos abalados, adquiriram vigor e a vida palpitava

    impetuosa, ou seja, eles tornaram-se artfices ativos, aptos para construrem as

    futuras civilizaes e serem ancestrais das raas mais civilizadas.Numa bela tarde, depois do almoo, os nossos velhos amigos estavam

    reunidos num dos terraos do palcio de Ebramar, especialmente construdo pelos

    expurgados para os refugiados da Terra. Falou-se de diversas catstrofes e

    cataclismas que seriam utilizados no futuro como forma de aproximao com a

    populao local. Mais tarde, esta seria socorrida e, assim, se colocaria a primeira

    pedra no alicerce para o conhecimento de Deus e a realizao de cultos religiosos,

    ainda que incipientes.Aos poucos o tema da conversa tomou outro rumo. Abordou-se o assunto das

    futuras festividades e, sobretudo o do matrimnio dos magos (somente os iniciados

    de grau superior permaneciam solteiros). As cerimnias se realizariam no templo

    subterrneo, onde se achava a misteriosa pedra cbica, aps o que os adeptos com

    as esposas se instalariam em suas novas casas. A bno do ato de unio dos

    adeptos de graus inferiores tinha sido marcada para os dias seguintes.

  • 7/27/2019 J. W. Rochester (Wera Krijanowskaia) - Os Legisladores

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    Udea no estava participando da ltima parte da conversa. Com o olhar triste

    e pensativo, recostou-se no corrimo, e pela expresso de seu rosto plido e belo e

    de seus olhos sonhadores, parecia estar longe com os pensamentos.

    Narayana que o observava, bateu-lhe fortemente com a mo no ombro e este,

    estremecendo, empertigou-se e ficou to desconcertado, que todos os presentes

    riram.

    - Em que est pensando, ermito incorrigvel? O tema no lhe agrada? Existe

    algo melhor no mundo que as mulheres? Isso vale tanto para um mago como para

    um mortal comum. Vejam voces, ele fica contando os dedos e no d a mnima para

    a conversa! Acorde, meu amigo, e viva a vida! O que lhe falta? As provaes

    terminaram, o passado foi riscado, diante de ns se descortina um futuro sem

    nuvens, e em sua fronte brilha o primeiro facho da coroa de mago. evidente que

    tudo isso bonito, mas um lar com todo o conforto, uma linda dona-de-casa que o

    ame, mime e cuide para que voce esteja bem alimentado, tudo isso importante e

    fcil de se conseguir. No se esquea disso!

    O discurso do incorrigvel Narayana mostrou uma nova exploso de risos,

    desta vez acompanhada por Udea, que logo percebeu que tendo Narayana por

    amigo ele no corria perigo de esquecer o sentido real da vida.Quando os risos cessaram, Ebramar disse em tom jovial:

    - Apesar da sugesto pouco comum, devo admitir meu amigo, que Narayana

    est certo; Ser sensato de sua parte arrumar uma companheira de vida. Voce fica

    remoendo o passado, seus tempos difceis de trabalho, desterrado neste planeta.

    Voce tem que sacudir a poeira; o amor reconforta e o melhor blsamo para uma

    alma enferma.

    - Basta me ordenar... suspirou Udea.- Como posso ordenar coisas desse tipo?

    - Por que no? Voce meu melhor amigo, um protetor incansvel, que me

    conseguiu trazer para c, a este planeta perdido. Voce me apoiou, minorou meus

    sofrimentos, consolou o banido em piores momentos de seu desterro. Quem poderia

    aconselhar-me melhor? Assim, torno a repetir; se voce acha que isso se faz

    necessrio, ele uma maga que queira ser minha esposa.

    - Isso no ser difcil! Aposto que muitas suspiram em segredo por um partidoassim como Udea. Difcil vai ser escolher intrometeu-se Narayana.

  • 7/27/2019 J. W. Rochester (Wera Krijanowskaia) - Os Legisladores

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    - Se voce conhece to bem os anseios ntimos de nossas moas, ento o

    ajude nessa questo delicada observou Ebramar zombeteiro. Com sua

    permisso, Udea, posso apenas sugerir algum que considero a mais digna; mas

    voce que dar a ltima palavra para eleger a companheira que lhe tratar as feridas

    do passado.

    - Sabe mestre, se voce tivesse uma filha, eu teria suspeitado de que voce

    est querendo arrumar um casamento vantajoso com o nosso misterioso irmo de

    pouca conversa gracejou Narayana, rindo e fitando maroto os olhos de Ebramar.

    - mesmo uma pena Ebramar no ter uma filha; eu a teria desposado certo

    de que tudo que tem origem em nosso inigualvel amigo traz muita sorte redargiu

    Udea.

    -Tm razo! Foi por isso que eu logo gostei de voce. Ao perceber seu apreo

    por Ebramar exclamou num mpeto Narayana. E em seus grandes olhos negros

    brilhou o arrebatamento que lhe era caracterstico. Vejam s! Todos que esto

    aqui reunidos so seus filhos espirituais, uma criao, que por assim dizer -, de um

    mestre que no tm paralelos. Sua afeio, erudio, pacincia incansvel, fizeram

    o que somos agora. Devemos ento como uma famlia, cerrar fileiras em torno dele,

    unidos em amor e gratido.Com os olhos marejados, Narayana pegou a mo de Ebramar e a beijou. Este

    a arrancou rapidamente.

    - Pare com isso, seu pndego, e chega de cantarolar-me louvao imerecida!

    Como podemos atribuir mritos a um pai que se esfora por seus filhos? Este tipo de

    amor, um disfarce de egosmo e vaidade, no mereceria qualquer elogio. Mas eu j

    entendei, Narayana, aonde quer chegar com esse seu discurso sutil. Voce est

    curioso de conhecer a histria de Udea, as circunstncias que motivaram as durasprovaes por ele suportadas com tanto brilho.

    Voce l meu corao como um livro aberto, oh, o melhor e mais perspicaz dos

    pais espirituais! Riu Narayana. A minha curiosidade no leviana; ela fruto da

    sincera

    Afeio e da certeza de que ele necessita abrir-se com seus irmos e amigos.

    E para completar, meu amigo, eu juro, apesar da minha curiosidade, abster-me de

    ouvir qualquer coisa que lhe possa causar algum sofrimento, pois sei o quanto so

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    dolorosas as lembranas, mesmo para o corao perfeito de um mago ajuntou

    Narayana, apertando a mo de Udea.

    Udea levantou-se e seus olhos escuros lanaram um olhar afetuoso para

    Narayana.

    - Voce tem razo, irmo, no tenho motivos para ocultar o passado! Meu

    delito justifica a punio severa do banimento e, assim, a quem mais seno a voces

    eu posso confiar histria da minha decadncia e expiao?

    Gloria ao Inefvel, cuja sabedoria e misericrdia fizeram de um criminoso um

    ser til, permitindo-lhe evoluir e beneficiar-se das ddivas do Pai celeste.

    verdade, os sacrifcios foram enormes, mas s assim possvel afluir s

    riquezas espirituais, ocultas nos recnditos do ser humano, desenvolver-lhe o

    intelecto mope e ignaro, prov-lo de fora de vontade consciente e arm-lo de

    poderes sobre os elementos da natureza. justamente na fornalha das provaes,

    na batalha alternada de derrotas e vitrias, que se forma um ser novo que comea a

    intuir o seu Criador, e venerar-lhe a imensurvel sabedoria e a tentar cumprir

    judiciosamente a Sua vontade. Antes de passar narrativa de minhas vicissitudes,

    gostaria de dizer que a maior desgraa da humanidade, a pior provao para os

    homens, e que desencadeia neles os mais nocivos instintos, impele-os para oprecipcio e retarda-lhes por muito tempo o avano para a perfeio a injustia.

    - Concordo com voce. Entretanto, a primeira noo da justia, inata ao

    homem, no se baseia em seu compromisso de justia em relao a outros, mas o

    que ele acha uma prerrogativa passvel de ser exigida de outros em relao sua

    pessoa sustentou suspirando Ebramar.

    - Isso uma conseqncia de sua fraqueza e imperfeio. Todo ser, criado

    por Deus, carrega na alma uma noo clara do princpio imutvel da J ustia Divina,e, se este princpio desrespeitado, a vtima da injustia se rebela e sem eu corao

    comea a espumar a blis da hostilidade, crueldade, desejo de vingana ou

    retaliao. Do mago trbido do homem afluem suas piores paixes, que o

    transformam em demnio. diferente para os seres evoludos em esferas

    superiores, conscientes da Lei do Karma, que pode desabar-lhes em situaes

    semelhantes; eles resistem em silncio; mas o que dizer daqueles que esto nos

    degraus inferiores da ascenso? Um ser humano simplrio alimenta uma finabalvel em seus direitos, sugerida pela voz incorruptvel do instinto; o

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    degradamento moral inicia-se a partir do momento da conscientizao de que a lei

    da justia no impede que o mais forte oprima o mais fraco. A raiz de todas as

    revolues e desatinos a injustia. Ela a origem da decadncia dos povos, que

    leva inevitavelmente ao desencadeamento das leis, idnticas s que regem o

    Universo.

    Basta violar as leis qumicas ou csmicas e logo surge a desagregao, o que

    um desequilbrio, uma desestruturao dos elementos, ou seja: a ordem s

    vivel mediante um esforo obstinado. Os elementos devem ficar em harmonia, o

    equilbrio s atingido se cada tomo executa a sua funo, predeterminada. A

    injustia, pois, um principio dissonante, que quebra a harmonia, arruna naes

    inteiras e povoa o mundo com seres demonacos.

    Desculpem irmos, por esta digresso, fruto de lembranas amargas. Foi

    justamente a injustia a razo dos meus delitos e sofrimentos justificou-se Udea,

    mal contendo a emoo.

    Eu nasci como herdeiro de um poderoso rei, chamado Pulstia. A natureza

    fora generosa comigo, mas eu tinha um gnio explosivo, era arrogante ao extremo,

    rebelde e por demais ambicioso. Adorava minha me, uma mulher humilde e bela; a

    ela eu devo todos os germens do bem semeados em minha alma. Ela no era felizno casamento. Irascvel, pervertido e rude, beirando a crueldade, o rei no dava o

    devido valor minha me, uma pessoa de moral irrepreensvel, beleza encantadora

    e dona de uma inteligncia rara. Eu era seu filho nico e, naturalmente, ela me

    amava com todas as foras da alma.

    Com o pai, ao contrrio, eu no tinha um relacionamento amistoso. Ele no

    me amava e fazia questo de demonstrar isso. Qualquer travessura era punida

    cruelmente; por vezes em seus momentos de mau humor, eu simplesmente acabavasendo um bode expiatrio. Tais injustias e muitas outras coisas mais tarde deram

    lugar em minha alma a um sentimento maldoso, quase hostil em relao a ele.

    Meu pai tinha um filho bastardo, mais jovem, fruto de uma relao com a

    criada do squito da minha me. Que feitios utilizara Suami, assim ele era chamado,

    para conquistar o corao de meu pai, eu no sei dizer, j que ele era horroroso,

    soturno, falso e de m ndole. A mim ele odiava, invejando-me a posio de

    sucessor do trono, e sempre conseguia engendrar uma srie de vilanias, cujasconseqncias eram duros castigos a mim aplicados. Alm disso, se por um Aldo

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    Suami me invejava a posio de prncipe sucessor, meu pai odiava a popularidade

    que eu tinha entre o povo, devido aos atos filantrpicos junto aos meus futuros

    sditos menos afortunados, quando eu buscava minorar os males causados pelas

    injustias e ilegalidades do rei, para quem no havia outra lei seno sua vontade ou

    caprichos. Imbudo de valores de justia. Transmitidos por minha me desde a tenra

    idade. Eu tentava ser o mais justo possvel, pois achava que isso era a principal

    virtude de um rei.

    O ambiente pesado na corte, criado pela hostilidade surda de meu pai e pelo

    dio disfarado de Suami, agravavam a minha irritao. Para ficar longe dos

    dissabores, dediquei-me apaixonadamente caa e ao estudo de cincias ocultas,

    ministradas no nosso templo. S mais tarde compreendi que aquilo no passou de

    um reles abecedrio da notvel cincia; entretanto, as fraes do conhecimento

    obtidas fizeram despertam em mim um enorme interesse pela matria e eu buscava

    avidamente alcanar os misteriosos poderes, cuja fora pressentia vagamente.

    Quando completei vinte anos, os conselheiros comearam a insistir junto ao rei para

    que eu me casasse; meu pai, a contragosto, mandou que se iniciassem os

    entendimentos com a casa vizinha.

    Naquela ocasio, eu estava me distraindo ao caar nas montanhas de umade nossas longnquas provncias. Corajoso e gil desconhecia o medo e gostava de

    me aventurar em empreendimentos perigosos. Naquele dia a sorte no me sorria.

    Minha arma no atingiu mortalmente o animal caado, este se lanou ferido em

    minha perseguio, mordeu-me o ombro e dilacerou com as garras o meu brao.

    Perdi muito sangue e desmaiei. Quando acordei, estava muito fraco; sa pela floresta

    e acabei perdendo-me ao entardecer. Foi realmente um milagre no ter sido

    devorado pelos predadores; a eminncia do perigo deu-me foras para prosseguir.J comeava a clarear, quando vi uma grande casa habitada, cercada no vale pelas

    montanhas. Arrastei-me at ela com as derradeiras foras.

    Naquele abrigo perdido entre as montanhas, vivia uma pequena comunidade

    de mulheres dedicadas venerao de uma deusa, e cujo culto lembrava o de

    Vesta. Todas elas haviam feito votos de castidade, mantinham o fogo sagrado para

    a deusa e dedicavam o tempo restante s oraes e cincias ocultas. Numa gruta,

    nas vizinhanas, habitava um velho sbio responsvel pelos estudos das virgens.Fui bem recebido e tratado; ningum sequer me perguntou quem eu era. O velho

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    sbio revelou-se um mdico magnfico e os meus ferimentos logo sararam. A maior

    parte das mulheres da comunidade era de idade avanada, salvo algumas jovens

    muito bonitas. Por uma delas de nome Vaikhari, uma moa de beleza estonteante,

    eu me apaixonei perdidamente e, apesar de seu retraimento, resolvi despos-la

    logo. Ao retornar apressadamente para casa, anunciei ao meu pai a deciso de me

    casar com Vaikhari, descartando com veemncia outra pretendente.

    No incio, ele ridicularizou-me; mas depois de ouvir uma extasiada descrio

    da beleza da moa, ponderou e anunciou a sua deciso de viajar comigo at a

    comunidade para pedir a Vaikhari que aceitou ser minha esposa. Eu estava muito

    feliz , e assim partimos para l em companhia de numeroso squito, protegidos

    por um forte destacamento de exrcito.

    Ficamos acampados nas vizinhanas da comunidade; um dos conselheiros

    de meu pai foi enviado com o pedido de casamento. Mais tarde, o prprio velho

    mdico-sacerdote veio at o rei para dizer-lhe que a jovem sacerdotisa havia feito

    votos de servir divindade e deveria permanecer junto ao templo. Entretanto, o meu

    pai no era homem de se submeter s decises alheias; exigiu prontamente uma

    respos