lei de introduÇÃo Às normas do direito brasileiro...
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TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL - DIREITO CIVIL I Prof. Me. Adeilson Freitas
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LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO – LINDB
1. INTRODUÇÃO
Foi o Decreto-lei 4.657/42 que institui a Lei de Introdução, sendo ela
uma norma de “sobredireito”, eis que disciplina as próprias normas jurídicas,
estabelecendo regras sobre a emissão e aplicação de todas as normas. É ainda, uma
norma autônoma, independente e aplicável a todas as normas do ordenamento
jurídico.
Dessa forma, enquanto as demais normas tratam do comportamento
humano (ex.: crimes; relações civis; relações de trabalho, etc.), a Lei de Introdução
trata das próprias normas, sendo este o seu objeto.
Assim, a Lei de Introdução não se aplica apenas ao Direito Civil, tendo
aplicação em diversos ramos do direito, por tal razão a referida norma é uma “lei de
introdução às leis”, expressão utilizada pela professora Maria Helena Diniz.
Em razão de sua (Lei de Introdução) aplicação aos diversos ramos do
direito (e não só ao Direito Civil), isto é, de sua grande abrangência no mundo jurídico,
recentemente foi editada a Lei 12.376/2010, que alterou o seu nome de “Lei de
Introdução ao Código Civil” (LICC) para “Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro” (LINDB).
Com essa alteração, a Lei de Introdução passou a ter um nome
compatível com a sua atuação e importância.
É importante destacar que a referida lei alterou somente o nome, de
forma que a norma permanece intacta em todos os seus artigos.
2. FONTES DO DIREITO:
As fontes são o ponto de partida ou de origem do surgimento do direito
e seu estudo.
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2.1. Fontes Formais: são formadas pela lei, analogia, costumes e princípios gerais
do direito, pois constam expressamente do art. 4º da LINDB. A lei é principal fonte,
as demais são fontes acessórias.
1ª) LEI
2ª) ANALOGIA
3ª) COSTUMES
4ª) PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO
2.2. Fontes não formais: “Constituídas, basicamente, pela doutrina e jurisprudência,
que não geram por si só regra jurídica, mas acabam contribuindo para a sua
elaboração. Esses institutos não constam da lei como fontes do direito de forma
expressa” (TARTUCE, 2013, p. 04).
5ª) JURISPRUDÊNCIA (são as decisões reiteradas dos tribunais)
6ª) DOUTRINA (são obras/textos dos estudiosos do direito sobre os mais variados
assuntos jurídicos)
3. VIGÊNCIA DAS NORMAS:
3.1. Sistema de vigência:
Dois são os sistemas de vigência:
a) Sistema do prazo de vigência único ou sincrônico ou simultâneo: significa
que a lei entrará em vigor na mesma data em todo território nacional. Há uma sincronia
na entrada em vigor da lei.
b) Sistema do prazo de vigência sucessivo ou progressivo: significa que a lei
entrará em vigor no país aos poucos.
O Brasil adotou o primeiro sistema, conforme previsto no art. 1º da Lei
de Introdução (art. 1.º Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o
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País....). Nada impede, porém, a adoção do segundo sistema, desde que haja menção
expressa no texto da lei. No silêncio do texto legislativo, a lei entrará em vigor em todo
o território nacional (sistema único – regra!).
3.2. Vacatio legis
É o período compreendido entre a publicação da lei e a sua entrada
em vigor.
PUBLICAÇÃO VIGÊNCIA
Vacatio legis
Tem por finalidade fazer com que os destinatários da lei a conheçam
e se preparem para cumpri-la. Exemplo: Código Civil de 2002 que teve um período
de vacatio legis de um ano antes de entrar em vigor (“Art. 2.044. Este código entrará
em vigor 1 (um) ano após a sua publicação”).
CÓDIGO CIVIL
PUBLICAÇÃO VIGÊNCIA
11/01/2002 11/01/2003
Vacatio legis
Como regra geral, não há exigência de que todas as leis tenham,
obrigatoriamente, período de vacatio legis. Tanto é assim, que poderá o legislador
dispor expressamente que a lei entrará em vigor na mesma data de sua
publicação.
No entanto, temos duas exceções na Constituição Federal, ou seja,
temos duas situações em que o período de vacatio legis é obrigatório:
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I – Lei que cria ou aumenta TRIBUTO = só poderá entrar em vigor
depois de 90 dias de sua publicação (art. 150, inciso III, alínea “c”,
da Constituição Federal).
II – Lei que cria ou aumenta CONTRIBUIÇÃO SOCIAL, para a
seguridade social = no mínimo 90 dias (art. 195, §6º, da
Constituição Federal).
3.3. Cláusula de vigência
É aquela que indica expressamente a data a partir da qual a lei
entrará em vigor, podendo prever ser a própria data da publicação ou outra data
posterior, assegurando um período de vacatio legis.
No silencio (omissão) da lei esta começará a vigorar em todo o país
em 45 dias depois de oficialmente publicada (art. 1º, LINDB).
Nos Estados estrangeiros, quando admitida a aplicação da lei
brasileira, esse prazo será de três meses, após a publicação oficial em nosso país
(art. 1º, §1º da LINDB).
3.4. Forma de contagem do prazo da vacatio
A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam
período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e a do último
dia do prazo, devendo a lei entrar em vigor no dia imediatamente subsequente (art.
8º, §1º da Lei Complementar nº 95/98).
O prazo é contado continuamente, considerando inclusive os
sábados domingos e feriados. Da mesma forma, não importa que o prazo termine em
sábados, domingos e feriados, a norma entrará em vigor no dia seguinte ao último dia
de vacância.
Exemplo: se a lei foi publicada no dia 01 de março, o primeiro dia do prazo será 01
de março e o último dia, sendo o prazo de 15 dias, 15 de março, e norma entrará em
vigor no dia 16 de março, independentemente de ser dia útil ou não.
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De acordo com essa linha de raciocínio, que é acompanhada pela
maioria da doutrina (embora haja discussão doutrinária neste aspecto), o Código Civil,
que foi publicado em 11/01/2002, com um período de vacatio legis de um ano após a
sua publicação, entrou em vigor no dia 11/01/2003 (sábado).
3.5. Local de publicação da lei
Para que tenha início à contagem do prazo de vacatio legis,
considera-se a publicação da lei no Diário Oficial do Executivo.
3.6. Lei corretiva
Pode ocorrer de uma determinada lei ser publicada contendo erros
materiais ou falhas ortográficas em seu texto. Neste caso, duas situações deverão
ser analisadas:
I – Se a lei foi publicada com incorreção, mas ainda não entrou
em vigor: neste caso, basta a repetição da publicação, sanando-se os erros e
reabrindo o prazo de vacatio para os artigos republicados (art.1º, §3º, LINDB);
II – Se a lei foi publicada com incorreção e já entrou em vigor:
neste caso será necessária a edição de uma nova lei denominada Lei Corretiva. (art.
1º, §4º, LINDB).
3.7. Princípio da Continuidade das Leis
Previsto no caput do artigo 2º da Lei de Introdução, informa que a lei
terá vigor até que outra a modifique ou revogue. Portanto, só lei revoga lei. Assim,
lei não pode ser revogada por ato do Executivo ou decisão judicial.
Exceção: as leis temporárias.
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3.8. Princípio da obrigatoriedade das leis
Previsto no artigo 3º da Lei de Introdução, segundo o qual ninguém
pode deixar de cumprir a lei alegando que não a conhece.
4. Eficácia das normas
A norma jurídica perde a sua validade em duas hipóteses, ou seja,
nos casos de “revogação” (que está ligado ao tempo/período de duração da norma)
e pela “ineficácia” (que está ligada a qualidade da norma, ou seja, se ela está apta
para produzir efeitos) (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 111-112).
4.1. Revogação
É a cessação definitiva da validade de uma lei em razão da edição de
uma nova lei (é tornar sem efeito uma norma!). Decorre do princípio da continuidade
das leis. A revogação pode ser:
a) Revogação TOTAL: também denominada “ab-rogação” – é a supressão total
(integral) da norma anterior;
b) Revogação PARCIAL: também denominada “derrogação” – ocorre quando
uma lei nova torna sem efeito uma parte da norma anterior.
As duas formas de revogação estudadas acima podem ser
classificadas em:
c) EXPRESSA ou DIRETA: ocorre quando a lei textualmente declara a lei velha
extinta em todos os seus dispositivos (revogação total expressa) ou aponta os
dispositivos que está revogando (revogação parcial expressa).
d) TÁCITA ou INDIRETA: ocorre quando a lei nova é incompatível com a lei
anterior, contrariando de forma absoluta. Neste caso não há previsão expressa
no texto quanto à revogação.
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Estas regras de revogação encontram-se previstas no §1º do art. 2º
da LINDB.
4.2. Repristinação
É a restauração da vigência de uma lei anteriormente revogada em
razão da revogação da lei revogadora (art. 2º, §3º, Lei de Introdução).
Para GAGLIANO e PAMPLONA FILHO a repristinação pode ser
entendida como “a restauração da lei revogada pela revogação da sua lei revogadora”
(2017, p. 125).
Contudo, no Brasil, a lei revogadora de outra lei revogadora não tem
efeito repristinatório sobre a velha lei abolida, exceto quando houver menção
expressa do legislador a esse respeito.
Exemplo:
Repristinação
REVOGOU REVOGOU
PERGUNTA: A norma A (revogada) volta a valer com a revogação (por C) da sua
revogadora (B)?
RESPOSTA: Não. Porque no Brasil não se admite o efeito repristinatório automático.
Norma A Norma B NORMA C
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4.3. Princípio da segurança e da estabilidade social
Segundo o professor Flávio Tartuce:
A norma Jurídica é criada para valer ao futuro, não para o passado.
Entretanto, eventualmente, pode uma determinada norma atingir
também os fatos pretéritos, desde que sejam respeitados os
parâmetros que constam da Lei de Introdução e da Constituição
Federal. Em síntese, ordinariamente, a irretroatividade é regra e a
retroatividade, a exceção (TARTUCE, 2013, p. 41).
Assim temos como regra, em prol da segurança jurídica, que a lei em
vigor terá efeito IMEDIATO (art. 6º, caput, LINDB) e será IRRETROATIVA (art. 5º
XXXVI, CF), não podendo prejudicar o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa
julgada.
Excepcionalmente a retroação poderá ocorrer, porém, nesse caso,
a Constituição Federal impede que referida retroação venha a ofender o direito
adquirido (é aquele que pode ser exercido por seu titular, encontrando-se
incorporado, definitivamente, ao seu patrimônio e personalidade), o ato jurídico
perfeito (é aquele que já se consumou segundo a lei vigente ao tempo em que se
efetuou) e a coisa julgada (é a decisão judicial em que não caiba mais recurso).
Para que a retroação seja possível, dois requisitos são necessários:
a) Clausula expressa de retroação, portanto, a retroação não se
presume e tampouco é automática. Exceção: lei penal benéfica,
cuja retroação é automática e atinge, inclusive, a coisa julgada.
b) Respeito ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e a
coisa julgada.
Temos três hipóteses de retroatividade:
1ª) lei penal benéfica;
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2ª) lei com clausula expressa de retroatividade (no silêncio da lei
aplica-se a regra da irretroatividade), desde que não haja ofensa ao direito adquirido,
ao ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
3ª) lei interpretativa: é aquela que tem por finalidade única
esclarecer o conteúdo de outra lei, tornando obrigatória uma interpretação que já era
possível antes mesmo da sua edição. Trata-se de interpretação autêntica ou
legislativa. Referida lei não cria situação nova e retroage até a data da entrada em
vigor da lei que está sendo interpretada, podendo ser aplicada aos casos pendentes
de julgamento, porém, deve ser respeitada a coisa julgada.
4.4. Ineficácia
Ocorre quando a lei perde a sua validade, deixando de ser aplicada
ao caso concreto, porém, conserva a sua vigência em razão de inexistir lei revogadora.
Algumas situações de ineficácia do ponto de vista técnico:
a) Caducidade: ocorre pela superveniência de uma situação
cronológica ou factual que torna a norma inválida sem que ela tenha sido revogada.
Ex.: Leis temporárias.
b) Decisão do STF declarando a lei inconstitucional em ação direta
de inconstitucionalidade (ADI ou ADIN).
5. Mecanismo de integração do ordenamento jurídico
O direito vive com a sociedade, que está em constante mutação. Tal
fato exige que o direito seja dinâmico e que acompanhe as mutações da sociedade.
No entanto, por mais efetivo que seja o legislador, é impossível que o direito anteveja
estas mutações. Por tal razão, as normas são sempre insuficientes para solucionar os
infinitos e novos casos que surgem.
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Assim, a norma acaba adquirindo lacunas. Essas lacunas são
sempre provisórias, e serão (ou deverão) supridas definitivamente pelo Poder
Legislativo.
Enquanto isso não acontece, o Poder Judiciário deve resolver as
lacunas dos casos sub judice. E como resolver isso?
O próprio direito anteviu a possibilidade de surgirem lacunas nas
normas e criou regras para supri-las, que estão previstas no art. 4º da LINDB e art.
140 do CPC, ou seja, a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito,
que já estudamos por ocasião do tópico “fontes do direito”.
A essas fontes formais (supletivas), somam-se as fontes não formais,
onde temos a doutrina e a jurisprudência. Pode-se acrescentar a “equidade”.
Portanto, é correto dizer que a lei pode ser omissa, mas o direito não,
pois ele (direito) não se manifesta apenas por meio dela (lei), mas também por meio
dos mecanismos mencionados.
5.1. Analogia
É a aplicação ao caso não previsto em lei de lei reguladora de caso
semelhante. Tem por fundamento o argumento pari ratione, ou seja, da lógica
dedutiva, segundo o qual, para a solução do caso omisso, aplica-se o mesmo
raciocínio do caso semelhante.
5.2. Costume
É a repetição da conduta de maneira uniforme e constante (requisito
objetivo), com a convicção da sua obrigatoriedade (requisito subjetivo).
5.3. Princípios gerais de direito
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São premissas éticas que inspiram a elaboração das normas
jurídicas. Ex.: ninguém pode ser condenado sem ser ouvido.
5.4. Equidade
Segundo Miguel Reale, equidade é a justiça prudentemente aplicada
ao caso concreto.
É o ideal de justiça, a justiça no caso concreto.
A equidade está ínsita nos artigo 4º e 5º da LINDB, que estabelecem
a obrigatoriedade de julgar, por parte do juiz, em caso de omissão ou defeito legal.
6. Interpretação das normas
Interpretar é descobrir o verdadeiro sentido e alcance da norma
jurídica. Devido à ambiguidade do texto, imperfeição e falta de terminologia técnica,
má redação, o operador do direito está a todo instante interpretando a norma,
pesquisando o seu verdadeiro significado. E, é a hermenêutica que contém as regras,
que fixam os critérios e princípios da interpretação.
São técnicas de interpretação: a gramatical; a lógica, a sistemática; a
histórica; e a sociológica (ou teológica).
QUESTÕES PARA A DIVERSÃO
1. O que é vacatio legis? Quais as hipóteses em que a Lei exige período vacatio?
2. O que é repristinação? No Brasil, as leis possuem efeito repristinatório?
3. Quais são os mecanismos de integração da norma jurídica?
4. O que é lei corretiva?
5. Quais os requisitos para retroação da lei no tempo?
REFERÊNCIAS
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DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2012. v.1.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: parte geral
e LINDB. São Paulo, 2015. v.1.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil.
São Paulo: Saraiva, 2017. v.1.
TARTUCE, Flávio. Direito civil: Lei de introdução e parte geral. São Paulo: Método,
2013. v.1.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral. São Paulo: Atlas, 2015. v.1.